passos em volta - edição 5 (outubro 2015)
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Jornal ISPATRANSCRIPT
Passos em Volta | 5ª Edição
Passos em Volta
Alexandre Magalhães Vaz
Rafael Martinez Cláudio
José Candeias
Margarida Bessa Monteiro
Tereza Bínová
Raquel Matos
Diogo Vilaça Santos
Alexandre Magalhães Vaz
José Candeias
Paula Cortes
Rafael Martinez Cláudio
Tiago A. G. Fonseca
Ana Carla Nunes
Rita Alves
Jornal Académico do ISPA
Fundado por alunos da faculdade em colaboraçãocom a Associação de Estudantes (AEISPA)
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Imagem de Capa: Francesca Woodman, "Untitled" (1977)
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C O N T A C T O S
ÍNDICE
POESIA E PSICOLOGIA GUIA PRÁTICOPARA PROCRASTINARMELHOR
HERBERTO HELDER
01 EDITORIALPor Alexandre Vaz
Por Alexandre Vaz e Tiago A. G. Fonseca
Por Paula Cortes
Por José Canderias
07 09
02 RELAXA QUE ENCAIXA
05
03
SOCIEDADE E PSICOLOGIA
ENTREVISTA A DANIEL SOUSA
À CONVERSA SOBREA CLÍNICA ISPA
06 PARA O PRÓXIMO MÊS PROMETOQUE O SARTRE SALVA ISTO
FACEBOOK.COM/JORNALISPA
INTEGRAÇÃO E INVESTIGAÇÃO EM PSICOTERAPIA
ALBERT ELLIS
PENSAR COM BYUNG-CHUL HAN: POSITIVIDADE
ISSUU.COM/JORNALISPA
Por Rafael Martinez Cláudio
08 O TESTEMUNHO DE GROSS
Por Tiago A. G. Fonseca e Ana Carla Nunes
10 PSICOLOGIA PARA PSICÓLOGOS
PASSOS EM VOLTA | 1
O estudo da consciência assemelha-se a isto: agarrar água, naesperança de perceber o rio. Qualquer psicólogo - seja ele clínico, organizacional, de saúde oueducação - vive no centro de um horror científico: estudar fenómenoscom um número infinito de variáveis. A psicologia não é um acto de fé,mas requer uma boa dose dela para tolerar a lentidão dos seusprogressos. Fé, ou a sua variante mais simpática, teimosia.
Aos teimosos: Daniel, Zé, Paula, Rafael, Tiago (e Herberto).
Editorial
A L E X A N D R E V A Z
© Francesca W
oodman
RELAXA QUEENCAIXAI n tegração e I nves t igação em Ps ico te rap ia
R U B R I C A
Responsividade: a característicabase de um psicólogo integrativo.
A responsividade é o resultado daaceitação de que cada pessoa temnecessidades diferentes em momentosdiferentes da vida, precisando derespostas diferentes consoante assituações pelas quais vaiatravessando. Porque haveria deser diferente em terapia?
Ao ser responsivo, o terapeuta nãoestá a seguir apenas a estrutura dasua orientação teórica comotambém o pedido latente dopaciente, isto é, o que este precisano momento. Esta avaliação dasnecessidades do paciente ocorreprincipalmente pela empatia, outroconceito central à psicoterapiaintegrativa – arriscaríamos dizerque é fulcral a todos os psicólogos –e que representa uma qualidade dequem está, de corpo e alma, com apessoa à sua frente. Sendoempático, o terapeuta sustenta arelação terapêutica, atribui-lhesignificado e, acima de tudo, estácom o paciente, em cada momentoterapêutico. Só assim aresponsividade tem o seu resultado.
Por Alexandre Vaz e T iago A . G. Fonseca
Não dizemos, com isto, que cadapsicólogo não deva ter a suaframework, a sua base teórica, algoque lhe faça mais sentido e que lheforneça as ferramentas base dasua acção. O que dizemos, deforma peremptória, é que isto,por si só, não chegará. Énecessário um conhecimentoalargado do funcionamento e dassuas formas, disrupções eevoluções, para que se possaresponder à altura da situação.
Vários estudos (e.g. Owen &Hilsenroth, 2014) mostram queexistem melhores resultadosterapêuticos para os pacientescujo terapeuta é mais flexível e,por isso, com maior nível deresponsividade, em detrimentodos terapeutas menos responsivose mais focalizados na estrutura doprocesso terapêutico em si.
É como se caminhássemos lado alado com o paciente, ao invésdeste ter de nos seguir para ondequeremos ir. No final de contas, éo terapeuta que tem de seadaptar ao paciente, e não ocontrário.
Owen, J., & Hilsenroth, M. J. (2014). Treatment adherence: The importance of therapistflexibility in relation to therapy outcomes. Journal of counseling psychology, 61(2), 280.
PASSOS EM VOLTA | 2
ENTREVISTA
Daniel SousaP S I C Ó L O G O , P S I C O T E R A P E U T A , P R O F E S S O R ,
D I R E C T O R D A C L Í N I C A I S P A
Quando começou a Clínica ISPA e por que fasespassou até hoje?
Os trabalhos da Clínica começaram no ano de2011. Primeiro estiveram presentes váriosprofessores do ISPA, criou-se uma comissãoinstaladora para começarmos a pensar sobre osvários aspectos que poderiam ser importantesna clínica universitária. A fase seguinte, quedecorreu daí, foi a eleição de uma direcçãoexecutiva com três docentes. Essa primeiradirecção existiu até ao final do ano de 2014.
No fundo, essa primeira fase foi experimental.Quisemos abrir uma clínica que pudesseconsiderar uma abertura à comunidade.Queríamos também associar à Clínica linhas deinvestigação que fossem prementes e quefizessem parte tanto dos departamentos comode professores e investigadores do ISPA, queencontrassem aqui um espaço para desenvolveralguns trabalhos. Também queríamosencaminhar de forma adequada alunos quepudessem procurar apoio ou ajuda, tal comofuncionários do ISPA, ou familiares dosfuncionários e dos alunos.Às vezes precisamos de uma recomendação, ede certa forma a Clínica pode ser um pólo deconfiança para as pessoas poderem procurarinformações e ter um encaminhamentoseguro.
Esse acompanhamento e intervenções podem agoraser feitas na própria Clínica.
Sim, nessa primeira fase não estava a ser feito, eagora está. Para além dos serviços na área dapsicologia clínica e das psicoterapias, tambémtemos aqui intervenções na área da psicologiaeducacional, por exemplo – temos aqui criançasa serem acompanhadas em áreas como a
À conversa sobre a Clínica ISPA
aprendizagem. Muitas vezes esse trabalho éfeito de um modo integrado entre os colegas daárea educacional e a da clínica.
Outra área de trabalho, e que tem tido umgrande crescimento, tem que ver com aorientação vocacional. Temos aqui a trabalhar oprofessor doutor Jorge Camarate, que tem umaabordagem muito adequada às orientaçõesvocacionais. Entendemos que estas intervençõesestão, por vezes, massificadas, e temos algumapreocupação pelo modo como estas sãorealizadas. Mas o importante é o modo comopensamos que estão a ser feitas aqui, na ClínicaISPA. E o doutor Jorge Camarate tem umaabordagem muito personalizada ao jovem, emque o grande objectivo é ajudá-lo a encontrar,por ele próprio, as suas respostas. Isto é umaárea interessante que tem tido muitocrescimento. Os jovens que têm vindo cá têmapreciado francamente a abordagem.
Que outras áreas de intervenção existem na ClínicaISPA?
Consultas de psicologia clínica e psicoterapiapara crianças, adolescentes e adultos, terapia decasal e de família, avaliações psicológicas,consultas da área educacional, psicoterapia degrupo.
De que modo vê as intervenções psicológicas epsicoterapias breves, que são hoje o modelopredominante de intervenção nos serviços de saúde?
É um assunto complexo. Por um lado, temosserviços com capacidade para dar resposta aintervenções mais breves. Aliás, estamos a fazerarticulações com instituições, companhias deseguros, redes de seguradoras – e, nessecontexto, pedem-nos exactamente intervenções
PASSOS EM VOLTA | 3
ENTREVISTA
breves. Por outro lado, temos ainda assim de terum papel de sensibilização e pedagógico perantea sociedade em geral. Até porque as intervençõespsicológicas e a psicoterapia são uma das áreasmais estudadas do ponto de visto científico, enem as instituições nem a própria sociedade estãomuito sensibilizadas para isso. E aí nós devemosfazer um certo papel pedagógico e dizer: "atenção,isto está amplamente estudado, e sabemos que éeficiente e eficaz", por exemplo. Temos tambémde sensibilizar para o facto de muitas pessoas nãobeneficiarem de intervenções breves.
Existe algum público-alvo específico da Clínica ISPA?
Qualquer pessoa pode requisitar os serviços daClínica: adultos, crianças, famílias. A comunidadeacadémica do ISPA pode procurar e socorrer-sedos nossos serviços, de duas formas fundamentais:como garantia de indicação, isto é, umarecomendação de confiança; e um segundo aspectoé poder beneficiar de valores mais baixos daquiloque são os valores mais comuns do chamadomercado privado. Finalmente, os alunos efamiliares podem ter aqui um ponto de referência,por exemplo, para orientações vocacionais,avaliações psicológicas…
Existe, portanto, uma tabela de preços diferente para osalunos do ISPA que procurem os serviços da Clínica?
Existe, sim. Existem valores protocolares: o valorde consulta para um aluno é mais baixo que ovalor de uma consulta para o público geral.
Que mais novidades traz esta nova etapa da ClínicaISPA?
Existem duas ou três novas áreas de importância.Uma delas foi a abertura na Clínica de um novogabinete de avaliação forense. Vamos articularcom tribunais, com advogados e com a populaçãono geral, que nos poderá consultar relativamente acoisas como o poder parental, as avaliações desaúde mental, eventuais pedidos de reformaantecipada… As áreas de intervenção são múltiplas,e dirigem-se a várias áreas do mercado, como àsinstituições, tribunais, gabinetes de advogados e àpopulação no geral.
Acrescentámos também uma área nova que é a dasavaliações neuropsicólogicas, que vem acrescentaràs avaliações psicológicas que já fazíamos.
De que modo está constituída a equipa da ClínicaISPA?
É muito importante termos um ConselhoConsultivo, que para nós sido absolutamentecrucial de modo a reflectirmos sobre as nossasáreas de acção. Neste conselho estão incluídos osprofessores António Coimbra de Matos, EduardoSá, a Isabel Leal e Júlia Pimentel. Fazem parte daequipa no sentido em que nos ajudam a pensareste projecto, e estamos muito gratos por podercontar com a sua colaboração.
A nossa equipa é multidisciplinar. Na área daintervenção clínica, uma componente importantepara nós é que os colegas são todos membrosefectivos da Ordem dos Psicólogos e comformação em psicoterapia, sendo a equipa clínicaconstituída por pessoas de várias abordagensteóricas. Temos pessoas que trabalham na área dapsicologia e psicoterapia infantil. Temosprofissionais ligadas à intervenção de grupo e decasal, como já disse. Temos pessoas da área daintervenção educacional, por exemplo ligadas aintervenções sobre as dificuldades naaprendizagem. Temos uma equipa de psicólogosligada às questões da área da psicologia forense,coordenada pelo professor Vitor AmorimRodrigues. Também já referi as intervenções naárea da neuropsicologia.
Gostaria de acrescentar umas últimas palavras?
Era interessante e importante combinarmosalgumas sessões públicas, mas internas, para osalunos, para apresentar o projecto. Para que osalunos do ISPA possam conhecer bem o projectoda Clínica do ISPA, saber o que se faz aqui. Outroaspecto, a propósito de áreas novas, é que vamosquerer fazer uma articulação com unidadescurriculares. Pode passar pelo mestrado integradode psicologia, mas também por outros cursos –temos no ISPA uma pós-graduação na área dapsicocriminologia, e claramente este gabinete deavaliação forense poderá ser uma ponte da teoriapara a prática.
Queremos fazer algumas acções de modo a nosenquadrarmos mais na própria comunidadeispiana. Queria deixar esta nota aos colegas ealunos do ISPA: venham conhecer a Clínica doISPA, porque podem usufruir dela e dá-la aconhecer aos outros.
Tel: 218 811 7102ª a 6ª - 10:00h às 13:00h
e das 15:00h às 20:00h
Email: [email protected]: Rua Jardim do Tabaco, 74, 2º
1149-041 Lisboa
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PENSAR COMBYUNG-CHUL HAN
POSITIVIDADE
De dentro de um alçapão ouve-se amáxima “nada é impossível”.Em contraponto e no limite, podemospensar por exemplo alguém que seencontra deprimido e enredado nopensamento “nada é possível”. Esta que éuma das perturbações paradigmáticas doséculo XXI, à semelhança da ansiedade.Para Byung-Chul Han, estas podem servistas como expressão de uma sociedadeque se adorna de positividade.
Para o filósofo coreano, a nossa sociedadeactual tende para uma supressão daestranheza e da alteridade. “Todosdiferentes, todos iguais”, cuja diferençanão é senão o idêntico. A alteridade não éconcordante com uma sociedade daglobalização como a nossa. O que é queindica este desaparecimento daalteridade? A presença de uma épocapobre em negatividade que se revertenum excesso de positividade.
Afinal, qual o problema quando se fala em“positivo”, se é “positivo”? Seespartilharmos algumas zonas (negras!) daPsicologia encontramos, infelizmente,esta modalidade revertida num discursode “pensar positivo”, cujoponto primordial é o problemadesvanecer-se da percepção, o que noslança para a lisura do banal e, por
conseguinte, para uma outramodalidade da violência – quenão supõe qualquer hostilidade, masantes uma incapacidade derepresentarmos o que se passaconnosco ou com o outro. Como dizWalter Benjamin, ficamosimpossibilitados da forma original dacontemplação que nos permiteregressar minuciosamente a cada coisa,numa espécie de respiração incansável,que em última instância nos faz querercompreender. Sem o negativo, cadapaisagem distinta e singular, abre-se naclareira igual, ordinária, einevitavelmente tornar-se-à rarefeita.
O olhar, emparedado na positividade,torna-se errante quando abdica de ver epensar sobre as formas da negatividade.No contexto clínico, estar com o outropressupõe a negatividadeda interrupção, do deter-se, do escolhermergulhar além da superfície brilhanteque eriça o olho, em caminho a umacompreensão e procura de sentido aovivido. A alteridade é simultaneamenteespaço e ponte, condição de relação eencontro terapêutico, pois é por não sero outro que posso imaginar-me sê-lo àdistância de o ser na expressão ônticaface ao plano ontológico.
RUBRICA | Sociedade e Psicologia
Por Paula Cortes
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Cumprimento-vos terráqueos. Casoainda não tenham percebido, serterráqueo significa habitar umaglomerado de minerais que gira a107 200 km/h à volta de uma fusãoconstante de hidrogénio e hélio àqual chamamos Sol. A existência éabsolutamente absurda e isso é umbom ponto de partida para areflexão que vos trago hoje.A esmagadora maioria da literaturacientífica aborda a existênciaenquanto mecanicista. Uma causa,ou um conjunto de causas, conduz aum efeito. E para estarmos segurosque aquelas causas conduziramàquele efeito é requerido que arelação seja reproduzível: ou seja,que perante as mesmas causas, oefeito ocorra da mesma forma. Nocaso da história pessoal de umindividuo, por muito complexa queseja, é sempre possível encontrarpadrões recorrentes tantode comportamento quanto depensamento; assim comodesconstruir as causas e os efeitossubjacentes. E existe também apossibilidade de encontrar padrõesrecorrentes dentro da humanidadeem geral. Se não aceitarmos estesdois pressupostos a Psicologia
deixa basicamente de ser umaciência e passa a estar na boacompanhia da astrologia e dosunicórnios.
Adoptando aqueles doispressupostos enquantoverdadeiros seria entãoteoricamente possível predizer ofuturo de um individuo a partir dequalquer momento da sua vida;isto caso não existissemdemasiadas variáveis a ter emconta (além de variáveis que pelasua natureza estão "ocultas" aosnossos instrumentos, como referiaDavid Bohm). Esta linha depensamento está alinhada com oDeterminismo Físico, que afirmaque a partir do Big Bang o universose tem desdobrado em causas eefeitos cuja sentido já estavaoriginalmente definido; porque cáestá, perante a mesma causaoriginal surgirá o mesmo efeitooriginal e por ai adiante.
Enfim, tanto palavra epistemológicapara dizer que o paradigmacientifico dominante rejeitacategoricamente a possibilidade deos humanos possuírem livre
Para o próximo mêsprometo que oSartre salva isto
arbítrio. Os seres humanossão aglomerados de átomos, e osátomos seguem padrõescomportamentais determinados. Nuncaouvi nenhum físico dizer: "O átomo dehidrogénio segue este comportamentona molécula complexa à qual chamamoscafeína, A NÃO SER que seja ingerida porum humano; nesse caso terá querespeitar e desdobrar-se pelo comandodo seu livre arbítrio".
É de facto complicado pensar nasociedade sem o livre-arbítrio. Éestranho pensar no sistema judicial ondese procuram culpados caso não seassuma que as acções tiveram origem naliberdade de acção do condenado. Écomplicado não olhar para osucesso/fracasso dos outros sem colocarum julgamento em relação à suaessência. Há psicólogos evolucionistasque defendem que esta ilusão sóacontece porque é “vantajosa” de umponto de vista evolutivo. O processo dejulgar as acções dos outros permitiu-noseliminar comportamentos indesejadosdas nossas sociedades. Se alguémpraticou um crime hediondo que ameaçaa estabilidade da tribo, como mataralguém ou rezar ao deus de outra tribo,é vantajoso existirem mecanismos queeliminem a pessoa responsável por essamesma acção. Seria desvantajoso pensarque ela não está no controlo total dassuas acções.
Em certa medida o nosso trabalhoenquanto psicólogos entra aqui. Se há 10mil anos atrás a forma de eliminarcomportamentos indesejados seria, seilá, condenar o culpado à morte numafogueira para depois os restantesmembros da tribo comerem a carne dosacrificado num ritual; hoje em diapreferimos deitar as pessoas no divã. Ousentar na cadeira, que também nãoquero discriminar opções estéticasrelacionadas com perspectivas científicasdentro da Psicologia.
Ainda assim, esta história da falta deliberdade sabe muito mal. Prometo quepara o próximo mês o Sartre vem salvaristo.
Por José Candeias
O P I N I Ã O
© Bill Am
end
"Aonde quer que vá, descubro que um poeta esteve lá antes de mim."Sigmund Freud
H E R B E R T OH E L D E R
Vou contar uma história. Havia uma rapariga que era
maior de um lado que do outro. Cortaram-lhe um
bocado do lado maior: foi de mais. Ficou maior do lado
que era dantes mais pequeno. Cortaram. Ficou de novo
maior do lado que era primitivamente maior. Tornaram
a cortar. Foram cortanto e cortando. O objectivo era este:
criar um ser normal. Não conseguiam. A rapariga acabou
por desaparecer, de tão cortada nos dois lados.
Só algumas pessoas compreenderam.
Herberto Helder, in Photomaton & Vox
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Nascido a 26 de Dezembro de 1847 naÁustria, Hans Gross estudouCriminologia e Direito, exercendofunções como examinador do tribunalpenal de Czernovitz. Gross estáumbilicalmente ligado a umaperspectiva que parte do princípio queas pessoas são geralmente (com ousem intencionalidade) falíveis. Partindodesta premissa, Gross empenhou-senum trabalho para a construção deum método sistemático dedeterminação dos factos e escreveuuma obra marcante intituladaPsicologia Criminal (1898) que assumeuma enorme relevância no inicio doestudo da psicologia do testemunho
"Um milhar de erros seriam evitados emcada descrição se as pessoas nãobaseassem as suas conclusões empremissas fornecidas por outros. Nãotomassem como factos assentes meraspossibilidades. Não tomassem comofactos recorrentes ocorrências únicas".
Gross fez esta afirmação na sua obra ecerto é que não tinha como prever quequase 100 anos depois existiria umcaso onde se verificariam todos esseserros.
No dia 5 de Maio de 1993, em WestMemphis, Arkansas, 3 crianças de oitoanos (Steve Branch, Chris Meyers eMichael Moore) desapareceramabruptamente. Após um curto períodode buscas os seus corpos foramencontrados num lago e todos elesevidenciavam sinais de agressão. Umcrime desta violência gerouevidentemente uma forte comoção nacomunidade e as autoridades
esforçaram-se por resolvê-lorapidamente.
Os suspeitos foram identificadosnum ápice: Damien Echols, JasonBaldwin e Jessie Misskelley. Os 3tinham uma coisa em comum,eram membros desintegrados dacomunidade. Echols eBaldwin eram amigos próximos efaziam, alegadamente, parte de umgrupo satânico. Misskelley era umdesadaptado com gravesproblemas de integração social esuspeitas de perturbação mental.
Durante toda a investigaçãosurgiram fortes indícios queapontavam noutras direções,desde um condutor de umacarrinha de gelados que tinhapedido à família a foto de uma dascrianças poucas semanas antes dodesaparecimento, até um homemque chegou a um restaurante,perto do local, todo ensanguentadoe com lama até aos joelhos. Mas aúnica direção que os investigadoresoptaram por seguir foi a fornecidapor uma criança, que mais tarde secontradisse (“não tomar como certaspremissas fornecidas por outros”) eque referia ter estado no local,apesar de não saber ao certo qualera.
Porquê estes três suspeitos?Porque dois deles (Echols eBaldwin) alegadamente pertenciama um grupo satânico e dizia-se queos satânicos faziam sacrifícioshumanos (“não se tomar como factoassente mera possibilidade”).
O testemunhode Gross
E porque Echols e Miskelley tinham sidoambos condenados, uma vez, porpequenos roubos e vandalismo(respectivamente), o que fazia delesperigosos criminosos (“não tomar comofactos recorrentes ocorrências únicas”).
O interrogatório de Miskelley levou auma confissão, na qual ele assume aautoria dos crimes mas não consegueacertar com o nome das crianças, o localda ocorrência ou a hora do sucedido,todos esses detalhes foram ignorados.Os três foram condenados – Miskelley eBaldwin a prisão perpétua e Echols àmorte, mas os sucessivos adiamentoslevaram a que a execução nunca seconcretizasse – e estiveram presos 18anos e vários dias. Ao fim deste período,o aparecimento de novas provas levou,finalmente, à libertação dos trêshomens e à assunção de vários erros nainvestigação.
Gross havia escrito, quase 100 anosantes, tudo o que poderia ter levado aque estes adolescentes, à data dacondenação, não tivessem perdidoquase metade da sua vida. Tudo issocoube num parágrafo. Mas, mesmoassim, muitos foram os que optarampor milhares de páginas de preconceito,escritas ao longo de séculos.Felizmente para Gross, ele nunca soubedisto. Infelizmente para estes trêsjovens, quem os investigou e julgoununca soube de Gross.
Por Rafael Martinez Cláudio
R U B R I C A : O C R I M E D E S C O M P E N S A
Hans Gross (1847 - 1915)
COMOPROCRASTINARMELHOR
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Em 1998, o psicólogo e psicoterapeuta Albert Ellis delineou afórmula perfeita para o fracasso. Começado este novo ano lectivo,sugerimos o estudo aprofundado dos seguintes pontos.
Acredita piamente que ao evitar situaçõese problemas desconfortáveis, estes irãoeventualmente desaparecer.
Fig. 1: Albert Ellis, conhecido como o "avó" da terapiacognitiva-comportamental, popularizou aimportância das crenças e pensamentosdesadaptativos como um dos factores fulcrais dequalquer perturbação psicológica.
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Assume que é impossível mudar seja o que for.A tua vida é completamente controlada porsituações externas e outras pessoas.
Nunca arrisques na vida.
Exige a aprovação de todas as pessoas quefazem parte da tua vida - e a de mais algumasque não fazem.
Assume que falhar e ser rejeitado é a piorcoisa que te pode acontecer e que nunca oconseguirias aguentar.
Exige 100% de competência em tudo o quefizeres - exige a perfeição. (Bónus: critica-teseveramente no caso de a não atingires.)
7Assume que é impossível aguentar desconfortose que a vida devia ser sempre fácil e justa, pelomenos para ti. Perturba-te por cada vez que avida for difícil ou injusta.
Diz repetidamente "vai tudo correr bem" sem fazerabsolutamente nada de modo a que corra bem.8
9 Não te esforces consideravelmente de modo a aliviar osteus problemas.
10 Encontra uma boa razão que justifique porque és como és,e recusa-te a largá-la.
Fig. 2: O artigo original de Ellis, em "Rational EmotiveBehavior Therapy: A Therapist's Guide" (1998).
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Dando continuidade ao tema daedição anterior, importa referirque nem só de escrita se fazemas partilhas de conhecimento empsicologia. As pontes devem deser feitas entre os psicólogos,profissionais e investigadores, eos estudantes de psicologia, deforma a abarcar todos os eixosda nossa classe.
É necessária uma rede departilha, tanto em publicaçõescomo em comunicações, entre osprofissionais da psicologia que sedisponibilizem a prestarconhecimento aos outros, mastambém no sentido damensagem ser que os própriosreceptores, psicólogos que lêemou ouvem, não se fecham noseu conhecimento, mostrando-se
abertos a novas abordagens,participando na procura activade conhecimento.
Daqui, a ponte terá de ir tercom os estudantes. Éimportantíssimo que se passea mensagem da relevância dainvestigação em Psicologia,seja na área que for. Além dedecisões mais informadas, osestudantes de psicologia terãoum molde de visão maisabrangente, não estruturada ede linha recta, prontos aadaptar a Psicologia a cadapessoa, seja nas organizaçõesou na clínica. Se se iniciar aqui oprocesso da evolução emPsicologia, a mesma éassegurada durante váriasdécadas.
Partilhar paraquê?
Um bom exemplo, se me épermitido, é esta mesma revista,que parte de quem sentiunecessidade de partilharinformação, de partilhar opiniõese, com isso, aumentar o léxico dopensamento em Psicologia. Deestudantes para o mundo, nestecaso.
Outro exemplo são as conferênciasque irão surgir agora pelaocorrência do European Semesterem Portugal com a Ordem dosPsicólogos Portugueses. São umconjunto de iniciativas, de diversostemas, pouco mainstream, queabrem as fronteiras da típicaPsicologia em Portugal.
Que não se perca a oportunidadede partilhar e de receber a partilha.Muito sairá daqui, certamente.
Por Tiago A. G. Fonseca e Ana Carla Nunes
R U B R I C A : P S I C O L O G I A P A R A P S I C Ó L O G O S
© Tom
Gauld
O Psicologia para Psicólogos promove serviços eeventos de Psicologia, e aposta na divulgação do
trabalho e opinião de profissionais da classe.
http://psicologiaparapsicologos.pt
O ISPA-Instituto Universitário, entre os dias 19 e 25 de
Outubro de 2015, associa-se às instituições que a nível
mundial promovem a Semana Internacional do Acesso
Aberto, através de um conjunto de actividades, dinamizadas
pela equipa do Centro de Documentação. O programa visa
sensibilizar para os benefícios de disponibilizar os
resultados da investigação científica e das publicações em
acesso aberto como garantia para o progresso científico.
O que é o Acesso Aberto?"Acesso Aberto” (ou “Open Access”) é uma forma de,
através da internet e, em livre acesso, disponibilizar artigos
de revistas científicas revistas por pares (peer-reviewed),
actas e comunicações em conferências, relatórios técnicos,
teses e documentos de trabalho.
O acesso aberto é uma forma de divulgação da ciência a um
maior número de pessoas, permitindo que os investigadores
tornem os resultados das suas investigações acessíveis
livremente.
Quais as vantagens?» Maior impacto das publicações
» Livre acesso aos documentos
» Arquivo (preservação digital dos documentos)
Visite-nos em: http://repositório.ispa.pt
“ESTE ANOSEREMOSAMBICIOSOS”
Pode dizer-se que tem passado despercebida,
mas esta Júnior-Empresa do ISPA está pronta
para fazer mais, não só para os membros da
P.O.W.E.R, mas para a restante comunidade
ispiana.
Queremos contribuir de forma positiva para o
crescimento e desenvolvimento dos alunos do
ISPA através da organização de eventos que
promovam a proactividade, bem como o sentido
de empreendedorismo.
Assim, pretendemos ser mais um meio para que
os alunos se possam tornar jovens competentes
e proactivos, dando ferramentas necessárias
para virem a ser excelentes profissionais
preparados para o mercado de trabalho.
Assim, nas palavras da Directora Geral Executiva Madalena Martins,começou a equipa da P.O.W.E.R. Consulting a projectar uma nova fase.
Isto implica que não estejamos orientados
apenas para o ISPA, mas para o mercado.
Para um mercado que cada vez vê mais valor
nas universidades portuguesas e no
conhecimento que produzem – especialmente
quando se trata da única Júnior-Empresa de
Psicologia em toda a Europa.
Queremos trazer P.O.W.E.R. ao ISPA e levar
P.O.W.E.R às organizações.
A P.OW.E.R. será aquilo que fizermos dela, e
este ano pretendemos que seja de facto uma
Júnior-Empresa activa e de qualidade.
f a c e b o o k . c o m / j o r n a l i s p a | i s s u u . c o m / j o r n a l i s p a
Passos em Volta
Jornal de Psicologia