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A IMPORTÂNCIA DOS GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA OS PACIENTES PSIQUIÁTRICOS Karllen Rodrigues Ferreira Raminho * Orientadora: Solange Nunes Leite Batista Coelho * RESUMO O presente trabalho visa abordar uma reflexão acerca da atuação da assistência social na área da Saúde Mental, bem como identificar a importância do atendimento humanizado dos Grupos de Convivência do Serviço Social para os pacientes psiquiátricos. Daí ser fundamental que o trabalho em equipe busque identificar papéis, atribuições, de modo a estabelecer objetivamente quem dentro da equipe encarrega-se de determinadas tarefas. É um grupo que tem a responsabilidade de construir com os pacientes psiquiátricos e seus familiares vínculos através de diálogos dinâmicos e contínuos. Nessa perspectiva, é importante a participação dos assistentes sociais, psicólogos, terapeutas ocupacionais familiares e usuários no trabalho conjunto da convivência de forma a garantir direitos, apoiar-se mutuamente e provocar mudanças nas políticas públicas e na cultura de exclusão do louco da sociedade. Afinal, o grande desafio da Reforma Psiquiátrica é construir um novo lugar social para os “loucos”. Palavras-chave: Grupos de Convivência. Pacientes Psiquiátricos. Serviço Social INTRODUÇÃO A proposta é analisar a importância dos Grupos de Convivência dentro da política de Assistência Social aos pacientes psiquiátricos. A pesquisa justifica-se pela oportunidade de se discutir a articulação das propostas na sustentação do trabalho em equipe e na construção coletiva deste trabalho. * Graduada em Psicologia pela Universidade Vale do Rio Doce de Governador Valadares. Aluna do curso de Pós-Graduação em Saúde Mental e Intervenção Psicossocial da Universidade Vale do Rio Doce de Governador Valadares. * Psicóloga Especialista em Saúde Mental e Mestre em Ciências da Educação.

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A IMPORTÂNCIA DOS GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DA ASSISTÊN CIA SOCIAL

PARA OS PACIENTES PSIQUIÁTRICOS

Karllen Rodrigues Ferreira Raminho∗

Orientadora: Solange Nunes Leite Batista Coelho∗

RESUMO

O presente trabalho visa abordar uma reflexão acerca da atuação da assistência social na área da Saúde Mental, bem como identificar a importância do atendimento humanizado dos Grupos de Convivência do Serviço Social para os pacientes psiquiátricos. Daí ser fundamental que o trabalho em equipe busque identificar papéis, atribuições, de modo a estabelecer objetivamente quem dentro da equipe encarrega-se de determinadas tarefas. É um grupo que tem a responsabilidade de construir com os pacientes psiquiátricos e seus familiares vínculos através de diálogos dinâmicos e contínuos. Nessa perspectiva, é importante a participação dos assistentes sociais, psicólogos, terapeutas ocupacionais familiares e usuários no trabalho conjunto da convivência de forma a garantir direitos, apoiar-se mutuamente e provocar mudanças nas políticas públicas e na cultura de exclusão do louco da sociedade. Afinal, o grande desafio da Reforma Psiquiátrica é construir um novo lugar social para os “loucos”. Palavras-chave: Grupos de Convivência. Pacientes Psiquiátricos. Serviço Social

INTRODUÇÃO

A proposta é analisar a importância dos Grupos de Convivência dentro da

política de Assistência Social aos pacientes psiquiátricos. A pesquisa justifica-se

pela oportunidade de se discutir a articulação das propostas na sustentação do

trabalho em equipe e na construção coletiva deste trabalho. ∗Graduada em Psicologia pela Universidade Vale do Rio Doce de Governador Valadares. Aluna do curso de Pós-Graduação em Saúde Mental e Intervenção Psicossocial da Universidade Vale do Rio Doce de Governador Valadares. ∗Psicóloga Especialista em Saúde Mental e Mestre em Ciências da Educação.

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Nesse sentido, o interesse pela pesquisa reside em buscar maiores

entendimentos nessa área, que possibilite reflexões acerca da necessária invenção

e reinvenção dos participantes dos Grupos de Convivência como operários na obra

que produz o cuidado humanizado, no campo estratégico de mudanças propostas

pela Reforma Psiquiátrica, a qual estabelece a reestruturação da atenção

psiquiátrica, cujo horizonte é lidar com a complexidade do fenômeno “loucura”, sem

a visão excludente, dispensando maior respeito às diferenças e singularidades das

pessoas.

A reforma psiquiátrica vem em busca de transformação do modelo clássico,

da desconstrução dos manicômios e criação dos denominados Centros de Atenção

Psicossocial (CAPS), que constitui um serviço comunitário com o papel de cuidar

pessoas que sofrem com transtornos mentais severos e persistentes, no seu

território de abrangência. A partir deste contexto redefine-se inclusive o conceito de

saúde mental que pela Organização Mundial de Saúde - OMS como a capacidade

de estabelecer relações harmoniosas com os demais e a contribuição construtiva

nas modificações no ambiente físico e social, alguns autores ainda definem como

concepção integral do ser humano, uma entidade biopsicossocial e indissolúvel.

(TOSCANI, 2009).

Nos últimos vinte anos a área de saúde mental, no contexto nacional, vem se

conduzindo em um processo complexo de auto-afirmação por um saber/fazer que

supere o modelo biomédico, medicalizante e hospitalocêntrico; busca-se sustentar-

se sobre dispositivos de atenção comunitária, territoriais, focalizados na pessoa em

sofrimento psíquico e sua família, por meio de uma práxis transformadora e em

constante construção. Em construção por estarmos, afirma Lucchese et al. (2009),

diante do novo e desconhecido modo de fazer saúde mental na perspectiva

psicossocial, remetendo-nos à necessidade de constituir um saber/fazer não

reproduzido, que atenda demandas não declaradas anteriormente, pois a práxis

fundamentada no modelo biomédico e a lógica de ser dos hospitais psiquiátricos era

e é de domínio dos profissionais que atuavam na psiquiatria; vigiar, excluir, isolar e

ofertar medicamentos são saberes que atendem ao tratamento da doença mental.

Já atender o sujeito em sofrimento psíquico e sua família nas dimensões

sociais, de inclusão, reabilitação psicossocial, inserção comunitária e na produção

social de vida, integrando trabalho, lazer, cultura, educação e saúde não são ações

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naturalmente prescritas nos compêndios e manuais de saúde mental e psiquiátrica.

(LUCCHESE et al., 2009).

Assim, alguns questionamentos ou problemas merecem serem investigados

no presente artigo, quais sejam: Qual o método e a forma mais indicada para melhor

inserir o paciente psiquiátrico nos Grupos de Convivência do Serviço Social? O que

pode o Grupo de Convivência oferecer aos envolvidos nesse processo de

desencadeamento mental a superar os valores que foram a eles atribuídos,

permitindo a participação do paciente e da família na construção de estratégias entre

diferentes formas de saber e fazer?

Dessa forma, como respostas prévias aos problemas supra apresentados, ou

seja, como hipóteses, têm-se as seguintes: Acredita-se que o trabalho dos Grupos

de Convivência com os pacientes psiquiátricos, deve levar em conta os diversos

elementos que compõem suas vidas, que podem produzir ou agravar o sofrimento

mental, demandando um cuidado que considere o modo como são produzidas as

condições de existência do sujeito, estratégia que depende da rede de relações

estabelecidas entre os trabalhadores do serviço, porque as novas práticas em

saúde, com vistas à integralidade da atenção, exigem uma interação entre diferentes

saberes e fazeres.

Nesse sentido, buscando-se colher conhecimentos e informações sobre o

assunto proposto, o presente estudo utiliza-se da pesquisa bibliográfica.

Segundo Caldas (1999, p. 15):

A pesquisa bibliográfica representa a coleta e armazenagem de dados de entrada para a revisão, processando-se mediante levantamento das publicações existentes sobre o assunto ou problema em estudo, seleção, leitura e fichamento das informações relevantes.

Andrade (2001, p. 124) relata que:

Na pesquisa descritiva os fatos são observados, registrados, analisados, classificados e interpretados, sem que o pesquisador interfira neles. Isto significa que os fenômenos do mundo físico e humano são estudados, mas não são manipulados pelo pesquisador.

Minayo (1999) lembra que o produto final da análise de uma pesquisa, por

mais brilhante que seja, deve ser sempre encarado de forma provisória e

aproximativa. Assim compreende-se que para uma análise eficiente e palpável é

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necessário um pesquisador que pensa, pesquisa, decifra a realidade, analisa e

avalia suas ações.

Quanto à estrutura do artigo, destaca-se, de forma sintética, o seguinte:

O trabalho foi dividido em três momentos, sendo:

• Saúde Mental e o Serviço Social.

• Considerações sobre os Grupos de Convivência do Serviço Social.

• Método e forma de inserção do paciente psiquiátrico nos Grupos de

Convivência do Serviço Social.

Assim, a resposta às questões levantadas revelou-se gradativamente através

da busca literária realizada nesse estudo.

2 GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DA ASSOSTÊNCIA SOCIAL PARA OS

PACIENTES PSIQUIÁTRICOS

2.1 A SAÚDE MENTAL E A ASSISTÊNCIA SOCIAL

E em se tratando de Serviço Social, Bisneto (2005), coloca que à profissão

cabe incorporar o material crítico de suas contribuições, de seu projeto profissional

de modo a conjugá-las com a efetividade metodológica de expressões tão caras à

atual assistência psiquiátrica brasileira.

Assim, o Serviço Social, enquanto profissão que não dispõe de uma teoria

própria, de um sistema original de saber, mas recorre às contribuições de diversos

saberes e metodologias para sistematizar uma prática. Ou seja, é partidário de uma

subalternidade teórica que se manifesta em sua prática na medida em que tem que

se inserir em projetos coletivos de intervenção, em que entre em contato com

profissões cujo acervo teórico advém de um sistema original de saber. (SOARES,

2006).

Em se pensando o caso da Saúde Mental e o tipo de intervenção que vem

sendo requerido a seus trabalhadores, os tipos de saber da psiquiatria, psicologia e

psicanálise vêm possibilitando uma inserção diferenciada no campo já que

tradicionais no trato com a loucura, através de seus marcos teóricos, o que não pode

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ser dito do Serviço Social, embora atue no campo psiquiátrico desde seus

primórdios. Ou seja, temos profissões cujos saberes possuem objetos mais bem

definidos e sólidos, “contrapondo-se” ao Serviço Social que vivencia uma histórica

relação com outras áreas de conhecimento como a Psicologia, Sociologia,

Antropologia, Filosofia, Economia, das quais “absorvem” conhecimentos a fim de dar

maior base as suas próprias reflexões teóricas, o que também ocorre na Saúde

Mental quando os profissionais necessitam compreender questões “psi” para poder

debater sobre elas. Esta colonização acaba sendo reforçada diante do novo

paradigma da Saúde Mental. (SOARES, 2006).

Segundo Costa et al. (2009) o Serviço Social na área de Saúde Mental teve

início em 1940, onde a classe atuava de forma higienista, influenciada pelo

movimento de higiene mental da Europa, ou seja, atendia a uma parcela da

população de forma asilar, como jovens e crianças através de instituições como o

COI (Centro de Orientação Infantil) e o COJ (Centro de Orientação Juvenil). O

trabalho do assistente social nessas instituições consistia em fazer estudo de caso,

orientação familiar e comunitária e entrevistas terapêuticas, lidando com crianças

ditas problemáticas. A partir de 1973, o Ministério da Previdência Social demonstrou

relevância de se ter uma equipe multiprofissional no trato da Saúde Mental, assim,

efetivando-se a presença do Serviço Social em hospitais psiquiátricos atendendo a

uma necessidade do INPS no sentido de controlar assistência psiquiátrica e não

com uma proposta terapêutica propriamente dita (devido ao regime militar). Sendo

assim, o Serviço Social no pós-64 atendia aos manicômios com a perspectiva de

oferecer serviços necessários ou benéficos para legitimá-los.

Com o advento do Movimento Antimanicomial ou Processo de Reforma

Psiquiátrica, houve um avanço na área de Saúde Mental no tocante ao Serviço

Social. Houve a contratação de novos assistentes sociais, ao passo que se

percebeu que o tratamento social dos usuários deveria dar-se através de ações nas

áreas de trabalho, habitação, lazer, ou seja, em práticas voltadas aos portadores de

Saúde Mental, como programas de atenção ao usuário, sua reabilitação social e

cidadania, que não são práticas específicas da área médica ou psicológica.

(BISNETO, 2005).

Os novos moldes da assistência psiquiátrica necessitam de equipes

multiprofissionais que dêem conta das demandas em todos os seus níveis e

especificidades. Dentro dessas novas modalidades de serviços de Saúde Mental

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encontra-se CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), que se configura num espaço

de atuação da Assistência Social.

Nas instituições, a prática de ações terapêuticas é realizada pelo conjunto de

profissionais para que se alcance resultados que possam contribuir para a Saúde

Mental do usuário, em sua inserção na cidadania, pois apenas a interdição oferecida

pela medicina psiquiátrica não soluciona a problemática. Ou seja, ainda que o

Serviço Social seja subordinado à Psiquiatria, trabalha com as famílias

proporcionando suporte acerca do transtorno e ações terapêuticas dentro da

instituição, visando, principalmente, a manutenção dos usuários dentro dos moldes

do tratamento atribuídos pelos profissionais de psiquiatria, através de terapias que

contemplem as questões sociais, pois estão alheias das teorias biológicas e

psicológicas. (COSTA et al., 2009).

Costa et al. (2009) consideram que é necessário que a assistência social no

âmbito da psiquiatria possua subsídios com relação à Saúde Mental, discutindo a

necessidade de se buscar soluções quanto aos interesses do portador de transtorno

mental quer seja na saúde psicossocial, como também ter conhecimentos acerca

dos direitos de cidadania, que vão de encontro às concepções de outras práticas

políticas que respondem à política neoliberal. Assim sendo, A assistência Social em

Saúde Mental precisa estar atrelado a outras áreas do conhecimento, fazendo uma

leitura crítica destas para dar conta das demandas institucionais sem perder de vista

a criticidade e a visão histórica dos processos que envolvem a problemática do

usuário para que se coloque em prática suas proposições voltadas à recuperação do

sujeito no âmbito familiar, previdenciário, assistencial, ou seja, em todas as

instâncias de sua vida social.

Portanto, para responder às particularidades, faz-se inevitável uma análise

crítica da prática do assistente social, de modo que englobe os usuários, familiares,

equipamentos institucionais e também uma análise macro das questões políticas,

econômicas, sociais e ideológicas que permeiam a dimensão micro da instituição, a

fim de buscar uma melhor prestação de serviços aos usuários de Saúde Mental,

bem como assistência a seus familiares. Logo, a atuação da assistência social deve

contemplar tanto a área da psiquiatria quanto a do Serviço Social, realizando

acolhimento, oficinas, redes de atenção, visando a cidadania, a autonomia do sujeito

e inserção na família, considerando sua totalidade social.

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O Serviço Social enquanto especificidade profissional tem como uma de suas

funções principais a execução de políticas sociais, mas, como coloca Iamamoto

(2004, p. 20-21):

Um dos maiores desafios que o Assistente Social vive no presente é desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Enfim, ser um profissional propositivo e não só executivo. [...] Este profissional deve ir além das rotinas institucionais, buscando compreender o movimento da realidade para detectar tendências e possibilidades nela presentes passíveis de serem impulsionadas pelo profissional.

Avaliando a situação, que foi pontuada, sabe-se que a relação do assistente

social no acompanhamento das famílias é algo intrínseco à profissão. É nesse

espaço que a Assistência Social é reconhecida como especialidade capacitada para

atuar nesse âmbito, de modo que a imagem tradicional da profissão é positiva.

Adverte Soares (2006), o que não pode ser deixado de lado é que a família se

apresenta como foco de trabalho de diferentes grupos profissionais, e cada um vai

atuar a partir de suas atribuições privativas, de suas competências, das

particularidades dos serviços que são capazes de prestar e da leitura que fazem da

família em decorrência de sua formação. Isto tudo só torna bastante questionável os

intentos tanto da Assistência Social, quanto da Psicologia de criar uma reserva de

mercado para a atuação na área, posto que cada profissão tem uma contribuição e

um trabalho diferenciado junto à família.

2.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DA

ASSISTÊNCIA SOCIAL

Para entender o que é Grupo de Convivência da Assistência Social, é

imprescindível ressaltar que a Política Nacional de Saúde Mental, apoiada na Lei n.

10.216/02, busca consolidar um modelo de atenção à Saúde Mental aberto e de

base comunitária, com uma rede de serviços e equipamentos variados tais como os

Centros de Atenção Psicossocial - CAPS, os Serviços Residenciais Terapêuticos -

SRT, os Centros de Convivência e Cultura. Dentro desta proposta da política

Nacional de Saúde Mental inclui-se o Centro de Referência da Assistência Social-

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CRAS, que tem se apresentado como um poderoso dispositivo para os pacientes

psiquiátricos de cidades que não disponibilizam dos diversos equipamentos aqui

citados. (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME,

2009).

Assim, este modelo de atenção à Saúde Mental, teve início a partir de 1970, a

experiências de transformação da assistência, pautadas no começo pela reforma

intramuros das instituições psiquiátricas (comunidades terapêuticas) e mais tarde

pela proposição de um modelo centrado na comunidade e substitutivo ao modelo do

hospital especializado. Com a proclamação da Constituição, em 1988, cria-se o

Sistema Único de Saúde - SUS e são estabelecidas as condições institucionais para

a implantação de novas políticas de saúde, entre as quais a de Saúde Mental.

(EFOS, 2009).

Nesse contexto, novos conceitos e novos modelos de assistência social

passaram a vigorar no Brasil, sendo definida como política para assegurar o direito

da cidadania, com vistas a garantir o atendimento as necessidades básicas dos

segmentos populacionais vulnerabilizados pela pobreza e pela exclusão social.

Os Centros de Atenção Psicossocial - CAPS são serviços de Saúde Mental,

abertos e comunitários do SUS, destinados a prestar atenção diária a pessoas com

transtornos mentais severos e persistentes. Seu objetivo é oferecer atendimento à

população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a

reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos

civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. (MINISTÉRIO DO

DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, 2009).

Em contrapartida, o Centro de Referência de Assistência Social - CRAS é

uma unidade pública da política de Assistência Social, de base municipal, integrante

do SUAS, localizado em áreas com maiores índices de vulnerabilidade e risco social,

destinado à prestação de serviços e programas socioassistenciais de proteção social

básica às famílias e indivíduos, à articulação destes serviços no seu território de

abrangência e uma atuação intersetorial na perspectiva de potencializar a proteção

social. (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME,

2009).

Segundo Sales (2009) diversos fatores relacionados aos mecanismos da

Política de Saúde Mental junto à população atendida pelo CRAS, está à relevância

quanto ao nível de sobrecarga atribuída a família como fardo a carregar, as diversas

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formas de preconceito, bem como o isolamento social e a função do

familiar/cuidador, o qual por vezes também se acham excluídos da sociedade. Esta

realidade se agrava diante do fato de que as famílias são predominantemente

destituídas de conhecimento das formas de tratamento da doença mental, como

também, apresentam dificuldade de convivência com em processo de adoecimento

mental.

Segundo Campos e Domitti (2007) milhões de pessoas do mundo inteiro

sofrem de algum tipo de transtorno mental severo e persistente, mas além do

sofrimento provocado pela doença estas pessoas sofrem com o preconceito, o

descrédito e a estigmatização. O portador de transtorno mental é excluído da

categoria de pessoa normal. Além disso, os indivíduos estão repletos de idéias pré-

concebidas e por isso um diagnóstico psiquiátrico faz com que as pessoas tenham o

preconceito de que o portador de transtorno mental não é normal, ou seja, é pior do

que aqueles que seguem este padrão.

Para Ciampa (1984), estes efeitos aparecem de forma muito diversa afetando

a constituição da identidade do indivíduo, pois esta está sempre em constituição e

se dá por meio das relações. O homem constitui sua identidade a partir das relações

que estabelece com os outros e com o mundo e acaba por interiorizar valores que

foram a ele atribuídos. É também através das relações que se tem a idéia do que é

igual e do que é diferente e durante a vida um indivíduo vai se diferenciando ou se

igualando aos grupos aos quais pertence. Ao ser visto como “doente mental” o

indivíduo pode acabar se identificando com estes rótulos, atributos que a ele estão

atrelados.

Desse modo, verifica-se a grande importância do Grupo de Convivência do

CRAS, que apesar do paciente psiquiátrico para ajudá-lo a vencer este estigma e

preconceito e seja visto como um cidadão comum.

A construção dos Grupos de Convivência é um processo a ser construído

coletivamente dentro da Política de Assistência Social. Funcionam como recurso

terapêutico a ser utilizado em diferentes tipos de serviços - nos CAPS, nos Centros

de Convivência, nas Unidades Básicas de Saúde, conforme as possibilidades da

rede de Saúde Mental de cada município.

Souza (2007) adverte que os Grupos de Convivência enquanto um

empreendimento dos usuários, deve se apoiar e incentivar o máximo possível, ao

lado deles, mas que não se pode fazer por eles. Geralmente, tem como objetivos

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vivenciar fatores terapêuticos grupais; facilitar a interação social; proporcionar que a

interação social se estenda à comunidade.

2.3 MÉTODO E FORMA DE INSERÇÃO DO PACIENTE PSIQUIÁTRICO NOS

GRUPOS DE CONVIVÊNCIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

Afirma Firmino (2009), passar do lugar de “louco” excluído para a posição de

sujeito que se articula e produz laços em seu território parece uma tarefa difícil para

o portador de sofrimento mental. No entanto, baseados nos ideais da Reforma

Psiquiátrica e tendo em vista a construção de um mundo mais suscetível à

diferença, que respeite a singularidade, aqueles que decidirem trabalhar no campo

da Saúde Mental deverão buscar novas estratégias, novos dispositivos que possam

tornar a proporção de (re) inserção uma realidade.

Nesse sentido, pensar a (re) inserção social do paciente psiquiátrico é pensar

outras propostas, é manter “os pés no chão” e entender que esta, além de ser uma

luta política, se transforma numa luta contra nossas próprias dificuldades em lidar

com o diferente, com o dito excêntrico e bizarro. Do contrário, a lógica da exclusão

sempre estará presente. Como comenta Paulo Amarante (1995, p. 85) apud Firmino

(2009):

Os novos serviços apesar de serem externos não garantem sua natureza não manicomial. Participação, por si só, não é garantia de democratização ou de opção pelos caminhos mais corretos e melhores para os sujeitos portadores de sofrimento psíquico (...).

Adverte Pereira (2003), um programa de reabilitação psicossocial introduz

novos recursos e diversos sujeitos no percurso terapêutico. Cabe ao Serviço de

Saúde Mental identificar à rede de relações sociais passível de reintegrar a pessoa

que requer ajuda, construindo estratégias que venham propiciar intervenções reais

concretas, claras e objetivas. Com a criação de novos Serviços de Saúde Mental,

que oferecem um atendimento mais abrangente, ou menos reducionista, mais

adequado ao processo de existir humano, evidencia-se a multiplicidade de fatores e

de atores, favorecendo uma ampliação entre as relações do serviço de saúde, seus

usuários, famílias e comunidade.

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Na perspectiva de ampliação e transformação da assistência, inicia-se o

processo de reabilitação psicossocial que traz e propicia, em sua essência, as trocas

afetivas e materiais dos seres humanos. Segundo Pereira (2003), este processo

constitui uma reconstrução, num exercício pleno de cidadania e contratualidade nos

cenários do habitat, da rede social e do trabalho com valor social. Este autor ressalta

a importância da apreensão do sentido e do significado desta reabilitação, nesses

cenários, para sua reconstrução. Assim, a reabilitação é um processo amplo, sem

delimitação de chegada, direto e contínuo, ligado ao cuidar e ao assistir a pessoa.

Esse percurso propicia a descoberta de recursos e potencialidades adormecidas e,

no seu desenvolvimento, deve oferecer todas as possibilidades de tratamento

disponíveis.

Assim, o apoio do Grupo de Convivência pode ser um recurso facilitador

deste processo, caso consiga auxiliar na transformação do imaginário social a

respeito da loucura.

Vasconcelos (2002) sistematiza as diversas arenas político-institucionais e

societárias, onde vêm se dando a militância e a luta dos movimentos sociais e das

pessoas comprometidas no campo da Saúde Mental, dentre elas na sociedade civil,

os movimentos sociais e associações civis de trabalhadores, usuários e familiares

específicos do campo da Saúde Mental, visando estimular a militância, a troca de

experiências, o suporte mútuo, a auto-ajuda, ou mesmo a execução de programas e

serviços terceirizados em Saúde Mental, com ou sem financiamento públicos.

Também, na vida social dispersa e nas relações familiares e interpessoais, visando

desenvolver uma atitude acolhedora e não discriminatória para com as pessoas

“diferentes”, e buscando ser solidário na produção do cuidado informal em relação

àqueles com algum nível de dependência.

A atual proposta comunitária, humanizadora e reintegradora do homem no

seu contexto traz uma nova significação individual e social para as pessoas que

freqüentam os novos serviços de assistência em Saúde Mental. O estar-com a

pessoa que apresenta no momento o transtorno mental proporciona possibilidades

de convivência solidária, para ouvir “aqui e agora” seus sentimentos, criando espaço

para a subjetividade e intervenções mais humanas e concretas. E isso é

fundamental para ultrapassar, ir além de respostas que se revelem apenas como

administração das necessidades das pessoas, negando a complexidade inerente à

própria existência. (PEREIRA e CAIS, 2001).

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Rotelli et al (1990) apud Vasconcelos (2002), não fala da negação da doença

mental, mas da negação da possibilidade de a psiquiatria dar conta do fenômeno

complexo do existir, o que requer que ela seja capaz de criar novas práticas e

conceitos para lidar com a loucura/sofrimento/existência, e que estas sejam não um

instrumento de segregação, opressão e controle, mas de produção de vida e de

novas possibilidades. Esta ótica nos mostra que para saber é preciso escutar,

porque a escuta propicia o rompimento do muro de silêncio no qual vive a pessoa

que apresenta o transtorno mental, abafado e constrito com o seu sofrimento

psíquico. Na escuta, emergem teorias vivas, próprias, com sentidos e dimensões

pessoais inseridas nas experiências de cada sujeito.

Assim, segundo Pereira e Cais (2001) a este novo olhar acrescenta-se o

ouvir, ou seja, a escuta, que contribui para maior compreensão do ser, de modo que

consiga decifrar as necessidades e desejos subjetivos, não-declarados, mas de

alguma forma expressos pelos pacientes.

Como bem considera Rotelli et al. (1990, p. 30) apud Vasconcelos (2002, p.

41):

O novo paradigma, em oposição, coloca sua ênfase na “reinvenção da saúde”, na “existência-sofrimento dos pacientes”, no sentido da produção de vida, de sentido de sociabilidade, a utilização de formas (dos espaços coletivos), que amplia e complexifica o objeto de conhecimento e intervenção.

Portanto, a nova abordagem insere a Saúde Mental no campo da conquista e

reinvenção da cidadania, que passa pelos tradicionais direitos civis, políticos e

sociais, mas implicando uma luta mais específica pelo reconhecimento de direitos

particulares dos usuários dos serviços e seus familiares. (BEZERRA JR., 1992 apud

VASCONCELOS, 2002).

Por isso, a importância de dispositivos coletivos e grupais de tratamento,

sociabilidade, suporte mútuo e de ação concreta no tecido social, particularmente

aquele utilizados pelos atuais movimentos e associações de usuários e familiares.

(LANCETTI, 1994 apud VASCONCELOS, 2002).

Vale ressaltar aqui, que não há modelo padrão para a família do portador de

sofrimento mental ou para a forma de lidar com ele. Há apenas alguns aspectos que

costumam ser comuns a todas elas. Um deles é o desnorteamento diante de uma

situação difícil de compreender e de lidar - que pode parecer como angústia ou

perplexidade, mas também como impaciência ou irritação. O outro é a vergonha ou

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culpa que podem se manifestar de formas diversas - diante dos preconceitos que o

sofrimento mental costuma suscitar. Neste contexto, a equipe de Saúde Mental tem

um importante papel de mediação nas tensões e conflitos, muitas vezes freqüentes,

entre o portador de sofrimento mental e seus familiares. (SOUZA, 2007).

Portanto, alguns aspectos da atenção à família devem fazer parte dos Grupos

de Convivência, aqui estudados, conforme Souza (2007, p. 160-161):

• Sempre quando a família procurar o serviço convém recebê-la e escutá-la

- preferencialmente, com o conhecimento e o acordo do paciente.

• Escutar e orientar a família não significa ensinar-lhe o que ela deve fazer.

• O mais importante não é dizer-lhes como agir, e sim ajudá-los a pensar

nas próprias ações.

• A parceria com a família é uma meta essencial num projeto terapêutico.

Contudo, parceria não é sinônimo de cumplicidade: não devemos

associar-nos à família em qualquer tipo de ação que desrespeite os

direitos do paciente, mesmo que as intenções sejam boas.

• Mostrar para a família que não só por palavras, mas por atitudes, que

existem outras saídas, viáveis e melhores do que a internação.

• Embora a equipe possa partilhar certos cuidados com a família, ou mesmo

assumi-los temporariamente, não deve isentá-la das responsabilidades

que lhe cabe.

Nesse sentido, observa-se que as relações humanas, interpessoal e

terapêutica podem ser os veículos para a compreensão das necessidades sentidas,

que se constituem num leque amplo e plural. Elas possibilitam a dimensão simbólica

do sofrer para, quem sabe, integrá-lo e elaborá-lo.

Adverte Vasconcelos (2002), apesar de todas as dificuldades, o atual esforço

para recolocar novas bases teóricas e práticas em Saúde Mental e a proposição de

novos postos de trabalho e equipes multiprofissionais mais democráticos, tendo

como um dos objetivos o desenvolvimento de práticas interdisciplinares, vêm

criando condições bastante favoráveis para os profissionais reelaborarem a sua

cultura e identidades profissionais, que constituem o componente mais flexível do

profissionalismo. Para o autor, não há a menor sombra de dúvida de que o setor

Saúde Mental, dentro do conjunto do setor saúde, é reconhecido hoje no país

como o que mais avançou na direção da interdisciplinaridade.

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Sustenta Rivera (2001), para que a interdisciplinaridade ocorra de fato e

contribua para aumentar a eficácia das intervenções, é importante não somente se

facilitar a comunicação entre distintos especialistas e profissionais, como também

montar um sistema que produza um compartilhamento sincrônico e diacrônico de

responsabilidades pelos casos e pela ação prática e sistemática conforme cada

projeto terapêutico específico. O papel de cada instância, de cada profissional, deve

ficar bem claro. Em geral, esse papel cabe a integrantes da equipe de referência.

Como comentam Campos e Domitt (2007, p. 404). “o trabalho interdisciplinar

depende também de certa predisposição subjetiva para se lidar com a incerteza,

para receber e fazer críticas e para tomada de decisão de modo compartilhado”.

De acordo com Conselho Federal de serviço social - CFESS (2007), o

trabalho de assistentes sociais e psicólogos assegura uma intervenção

interdisciplinar capaz de responder a demandas individuais e coletivas. Nessa

perspectiva, é fundamental assegurar a participação desses profissionais que

integram às equipes do CAPS e CRAS, pois, os mesmos têm uma função

estratégica na análise crítica da realidade, no sentido de fomentar o debate sobre o

reconhecimento e defesa do papel da Assistência Social e das políticas sociais na

garantia dos direitos e melhoria das condições de vida.

Portanto, o trabalho em equipe não pode negligenciar a definição de

responsabilidades individuais e competências, e deve buscar identificar papéis,

atribuições, de modo a estabelecer objetivamente quem, dentro da equipe

multidisciplinar, encarrega-se de determinadas tarefas. O funcionamento dialógico e

integrado da equipe de referência pressupõe tomá-la como um espaço coletivo. Não

é simples, no cotidiano, estabelecer-se esse tipo de diálogo, com decisões e tarefas

definidas de modo compartilhado. (CAMPOS e DOMITTI, 2007).

Nessa nova organização de saberes, baseada no diálogo e no trabalho em

equipe, o saber dos profissionais envolvidos, jamais deverá ser deixado de lado. Se

a proposta, a partir dos pressupostos da Reforma Psiquiátrica, é inserir o portador

de sofrimento mental no seio da sociedade, a atenção básica em saúde, localizada

no próprio território do paciente, pode se tornar um mecanismo de referência para

este sujeito. (FIRMINO, 2009).

Assim, para Vasconcelos (2002) a convivência buscada hoje se centra

principalmente no objetivo histórico de revisão de paradigmas que reduziram e

aprisionaram a loucura como objeto de um saber exclusivamente médico e na

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superação das formas assistenciais segregadoras, dentro do sistema público de

saúde, e que desrespeitam a cidadania do louco.

Nesse enquadre, a questão da complexidade e da singularidade do fenômeno

da loucura segundo Castiel (1994) apud Vasconcelos (2002), bem como da

qualidade dos serviços, do respeito aos direitos, e o aumento do poder contratual

(empowerment) dos clientes/consumidores/usuários dos serviços recebem a mesma

ênfase reivindicada pela chamada cultura pós-moderna. Além disso, a convivência

buscada não interfere diretamente na autonomia e na criatividade interna dos vários

campos de conhecimento integrantes. A proposta da interdisciplinaridade, ao

reconhecer a complexidade dos fenômenos, está de modo implícito, reconhecendo

dialeticamente a necessidade de olhares diferenciados para um mesmo objeto e,

dessa forma, não pode prescindir da especialização. Assim, por exemplo, as

neurociências devem continuar a pesquisar e produzir seus novos exames e

psicofármacos, as psicologias e a psicanálise as suas abordagens clínicas no

mercado aberto de oferta de saberes e práticas terapêuticas.

Nesse sentido, conhecendo o território e a dinâmica da comunidade, o Grupo

de Convivência se torna uma espécie de “ponte”. É neste ponto que seu trabalho se

o efetiva: O Grupo de Convivência tem a possibilidade de provocar, fortalecer um

vínculo entre o usuário e o serviço de saúde. A realização de um bom contato com

este usuário pode influenciar não só a implicação deste sujeito em seu tratamento,

mas também de sua família e, ainda, da própria equipe de referência.

No entanto, não podemos esquecer, adverte Firmino (2009) o quanto o

trabalho em equipe é algo de difícil manejo, já que exige a relação de diálogo entre

diferentes saberes e disciplinas, podendo surgir entraves políticos, ideológicos e

subjetivos.

Daí, a necessidade dos Grupos de Convivência da Assistência Social como

suporte pessoal na elaboração das vivências subjetivas, pessoais e coletivas, da

vida diária. Assim, nada é mais salutar do que dar voz aos usuários e seus

familiares, para que reafirmam a complexidade de suas realidades, suas demandas

e suas avaliações sobre a assistência, bem como para construírem junto com os

trabalhadores dispositivos de reinvenção da vida que não se limitem à concepção de

assistência convencional.

Nesse sentido, observa-se a necessidade e a importância dos suportes do

serviço de saúde. O valor dos grupos de convivências em que as trocas podem

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acontecer pelo encontro com “os outros”, pela expressão de emoções e sentimentos

esperados nesses grupos, além do aprendizado de informações que poderão trazer

mudanças de atitude para com a doença mental e, conseqüentemente, para a

pessoa que a sofre.

Por isso, a necessidade de uma equipe de referência atuante torna-se

primordial. Desse modo, afirmam Campos e Domitti (2007), a equipe ou profissional

de referência são aqueles que têm a responsabilidade pela condução de um caso

individual, familiar ou comunitário. Objetiva ampliar as possibilidades de construção

de vínculo entre profissionais e usuários.

Assim, uma vez que a Assistência Social tem como objeto de trabalho o

indivíduo enquanto sujeito de sua própria história social e como agente dentro de

seu grupo, cabe aos seus profissionais trabalhar cada paciente psiquiátrico as

dificuldades e os becos sem saída com que se depara, ao insistir em certas

posições pessoais que aprisionam sua vida num circulo muito estreito. Contudo, ao

invés de querer fazer dele um outro, deve-se ajudá-lo a transformar-se a partir de si

mesmo, explorando as possibilidades que possui, e enfrentando as dificuldades

pessoais, sociais e quaisquer outras, que o impede de exercê-la plenamente.

(SOUZA, 2007).

Para isso, a forma de inserção do paciente psiquiátrico nos Grupos de

Convivência da Assistência Social deve prever mecanismos de escuta e participação

ativa dos usuários e seus familiares dentro e fora dos grupos. Assim, requer dos

grupos o estabelecimento de ações para atravessar o cotidiano das desigualdades.

3 CONCLUSÃO Diante de tudo que fora exposto, pode-se considerar o trabalho dos Grupos

de Convivência com o paciente psiquiátrico um desafio, cheio de complexidade, pois

a assistência às pessoas com sofrimento psíquico e familiares requer

responsabilidade, por meio do contínuo aprimoramento profissional no campo

científico de conhecimento e de prática de forma crítica e em consonância com os

princípios do Código de ética. Pois, a partir desses princípios, entende-se que a

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atuação dos profissionais envolvidos nessa área contribuirá para a melhoria da

qualidade de vida dessas pessoas.

Portanto, contribuir efetivamente para o processo de inserção social das

pessoas com transtornos mentais, facilitando o convívio social, assegurando o bem-

estar e estimulando o exercício pleno de seus direitos civis, políticos e de cidadania,

é o que precisa fazer a diferença.

Quanto ao papel da Assistência Social constatou-se que é realmente

importante dentro dos Centros de Referência. É claro que cada profissional tem sua

importância dentro do processo. Através da Assistência Social se faz a ponte entre a

política oferecida e a comunidade. É ela quem busca a inserção do indivíduo na

sociedade permitindo que o usuário restabeleça sua cidadania e sua existência

como ser humano ativo, produtivo e feliz.

Também, no decorrer da pesquisa constatou-se que a atuação do psicólogo

define a partir de um corpo de práticas que busca atender demandas sociais,

baseando o seu trabalho nos princípios fundamentais, ou seja, no respeito e na

promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano,

apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Constatou-se também, que a questão da centralidade na família do paciente

psiquiátrico merece bastante atenção, no sentido de intervir em seu sofrimento

buscando-se apreender o sentido que leva a determinadas direções de

relacionamentos, conflitos e decisões com foco na construção de novas respostas.

Isso requer uma atuação profissional embasada na autonomia, com

independência teórica e política de atuação nas conquistas imediatas por direitos

sociais no horizonte da emancipação humana.

Observou-se que o atual quadro social brasileiro urge por uma atuação

profissional consistente, que intervenha sobre a condição, intervindo sobre os novos

desafios postos a cada dia. Esta categoria que deve estar em permanente

atualização para oferecer respostas aos temas sociais e as novas questões

envolvidas na gestão das políticas sociais.

Nessa perspectiva, pode-se entender a inserção do paciente psiquiátrico nos

Grupos de Convivência da Assistência Social relaciona-se com os pressupostos de

reabilitação psicossocial, quando este afirma que o portador de transtorno mental

pode construir uma vida na sociedade, articulada com as diferentes esferas sociais,

sem perder sua particularidade.

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Daí a importância desses grupos como recursos na construção do modo de

viver dentro das características da estrutura da doença mental, sem ocorrer uma

cisão com o mundo compartilhado, pois, nem sempre o paciente psiquiátrico

consegue se deslocar do espaço de exclusão social para o espaço de inclusão,

havendo uma obstrução na constituição da cidadania destas pessoas.

Assim, para que seja possível a inserção social, é preciso construir caminhos

que respeitem este ritmo do paciente. Portanto, o deslocamento do doente mental

do lugar de incapaz, desacreditado e excluído para o lugar de inclusão social não

ocorre pela simples mudança de espaço físico. É na articulação dos detalhes do

cotidiano, na maneira de agir e lidar com os objetos, espaço e tempo que se imprime

a particularidade no mundo compartilhado. É esta apropriação que irá ordenar para

o sujeito a realidade compartilhada, possibilitando a inclusão na sociedade.

Assim, a presente exposição não tentou ser exaustiva ou completa.

Pretendeu apresentar um estudo dentro da proposta de busca de melhoria de

qualidade de vida para os pacientes psiquiátricos, levando a refletir sobre seu real

significado e como está acontecendo todo o processo.

THE IMPORTANCE OF GROUPS OF COEXISTENCE OF SOCIAL W ELFARE FOR

PSYCHIATRIC PATIENTS

This paper aims to address a reflection on the role of social assistance in the area of Mental Health, as well as identifying the importance of humanized Groups Coexistence of Social Work for psychiatric patients. Hence it is vital that team work seeks to identify roles, responsibilities, in order to establish objectively within the team who is responsible for certain tasks. It is a group that has the responsibility to build with psychiatric patients and their family ties through dialogue dynamic and continuous. From this perspective, it is important to involve social workers, psychologists, occupational therapists, family members and users to work together in harmony to ensure rights, support each other and cause changes in public policy and culture of exclusion from the society mad. After all, the great challenge of psychiatric reform is to build a new social site for the “crazy”.

Keywords: Group of Coexistence. Psychiatric Patients. Social Work.

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