para o que der vier!...que a minha melhor amiga ou quando discutimos por causa daquela mentira que...
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Para o queder e vier!
Enquanto as estruturas tradicionais estremecem e os novosvaiores se definem, há emoções que se mantêm inabaláveis. No século
de todas as liberdades, estará a amizade a esgotar-se tão rapidamentequanto o amor ? Ou, pelo contrário, a ocupar um lugar ainda mais
importante na vida das mulheres 7 Por Rosário Mello e Castro.
de se transforrn^^Mm lendas de Holl^-ood, Elizabeth
e Debbie Reynol^^^Klharam a adolescência na mesma sala
Waula do liceu. Entt^^^mgs e participaçõ^ran filmes, as jovensErizes ouviam atenl^Mitc a professora Jrcicavam dicas sobre os
'trabalhos de casa^^Braavam juntas paira os testes de Inglês e de
Matemática. (^^^Kvançaram e a^fuas carreiras também, mas
Elizabeth eJret^Bcontinuaramißeparáveis. A amizade teve um
fim inejpmdo^B9s9, quanta já viúva Elizabeth Taylor se apai-
bp^^elo mar^Meß^lrolds. O casamento entre os dois durou
apenas quatro anos, mas foi preciso esperar mais de uma década para
que as duas amigas voltassem a encontrar-se. Juntas por acaso num
navio com destino à Europa, enterraram o passado com um jantar e
muitos copos. "Tudo voltou a ser como antes", contou Reynolds
após a morte de Taylor, o ano passado." Ficámos amigas até ao fim."
A ideia de que os amantes vão e vêm e as amizades permanecem
pode soar a mito, mas em tempos tão frenéticos como os que vive-
mos, as amigas são das poucas certezas que ainda temos. "Na sua
essência, a amizade entre as mulheres não mudou", descansa-nos
Isabel Feio depois de nos receber no seu luminoso consultório no
centro de Lisboa. Até porque nasce de uma necessidade básica de
partilha, primeiro dos segredos e amores da adolescência, depois
dos problemas e das alegrias da idade adulta. "A novidade", conti-
nua a psicóloga, "está nos moldes em que a construímos e nas novas
oportunidades que temos de a cultivar". Uma rápida análise às
minhas amizades parece corroborar a teoria. Afinal, lamentei-me
muito mais quando deixei de viverna mesma casa (e no mesmo país)
que a minha melhor amiga ou quando discutimos por causa daquela
mentira que ela disse para me proteger do que por qualquer namo-
rado ou emprego.Mário Boto Ferreira, doutorado em Psicologia Social e professor
da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da
Universidade de Lisboa, também defende que a amizade tem uma
capacidade única de resistência social. "Sobretudo se falarmos de
amizades verdadeiras, que criam ligações afetivas intensas, íntimas
e privadas entre as pessoas." Mesmo em contextos históricos e cul-
turais diferentes, as relações mantém-se únicas, definindo-se mais
pelos critérios pessoais das personalidades envolvidas do que por
qualquer outro fator. Ainda assim, não há dúvidas de que a proximi-dade feminina mudou (e muito) ao longo das últimas décadas. "No
século XVI, as relações de amizade romântica (mesmo apaixonada)
entre mulheres, começaram a ser reconhecidas pela sociedade oci-
dental", descreve o professor. Em certos contextos, as mulheres
eram até encorajadas a procurar a sua alma gémea numa amiga, quedeveria ser mantida em paralelo com as suas responsabilidades ma-
ternas e conjugais. Precisámos de esperar até meados do século pas-
sado, foi "quando o papel das mulheres começou a mudar, ganhando
o estatuto e o poder de pessoas tão adultas como os homens, que a
perspetiva sobre estas amizades começou a alterar-se", acrescenta
Mário Boto Ferreira.
Hoje, são cada vez menos as mulheres que se definem peloshomens que têm ao seu lado, sejam eles o pai ou o marido, e cada vez
mais as que agarram a possibilidade de criarem amizades sinceras,
livres da competição e dos preconceitos sociais. Mais: se no passa-
do, os grupos de amigas femininas se restringiam a familiares e vizi-
nhas, a cujas casas faziam visitas quase sempre em casal e cujas con-
versas limitavam a partilha de quaisquer emoções, no presente as
mulheres, solteiras ou não, podem sair com as amigas sem que isso
ponha em causa a sua reputação social e muito menos a sua vontade
de manter uma relação amorosa feliz. "Não é que as amizades cele-
bradas pelas novas gerações sejam mais genuínas", continua Isabel
Feio. "Mas, ao abandonarem a esfera privada, tanto física como
emocionalmente [já não é preciso escondermos os problemas, falar
deles até nos ajuda a exorciza-los], não há dúvidas de que o espaço
que têm para crescer é muito maior."
Andreia Vale e Rita Ferro Rodrigues, jornalistas da SIC, e amigashá mais de 10 anos, conhecem bem os desafios que a vida coloca às
amizades femininas. "Quando cheguei à equipa, ainda como estagiá-
ria, a Ritajá lá estava", lembra Andreia. "Tornámo-nos próximas, t>
porque os nossos namorados faziam parte do mesmo círculo, masambas as relações acabaram por terminar." O mesmo não aconteceu
com a ligação entre as duas, incentivada por grav idezes simultâneas
e muitas características em comum. "As amigas são a nossas maio-
res confidentes e eu e a Rita sempre conversámos sobre tudo sem
tabus. . . e foram muitos os períodos em que o fizemos todos os dias",conta Andreia. Numa altura em que as amizades ocupam um lugar
especial nas nossas vidas (muitos investigadores vêm-nas como a
base das novas famílias), não é de admirar que as discussões e as
dúvidas ganhem novo significado. Andreia Vale fala na importânciade uma certa compatibilidade de feitios, tão essencial como em qu
quer relação. "Enquanto eu tenho alguma tendência para evitar
flitos, a Rita é muito maternal e muito defensora dos seus a
Claro que há aspetos em que chocamos, mas no geral, há esse
equilíbrio entre as duas."
Tais comparações entre sentimentos como a amizade c o amor
podem parecer ingratas, mas ajudam-nos aperceber como o primei-ro está em desvantagem em relação ao segundo. "As amizad
como tudo na vida, têm altos e baixos", explica-nos Carol S
socióloga e professora na Universidade de Manchest&
Inglaterra, que acaba de publicar um estudo sobre o impacto emo-cional dos amigos nas nossas vidas. "A diferença é que temos mais
facilidade em aceitar essa volatilidade nos
nossos amantes do que nos nossos ami-
gos." Por outras palavras, até estamos pre-
paradas para sofrer no amor, mas o mesmo
não se aplica à pura e inabalável amizade.
"Há mesmo uma certa obrigação moral
conotada com a amizade, em especial entre
as mulheres, que nos leva a ter problemasde consciência porque não ajudámos a
nossa amiga ou porque fomos ríspidas e
por aí fora", remata Carol. Como acontece
com a família, há desgastes a controlar e
conflitos a gerir. Até porque, por muito que
consigamos escolher as nossas amigas, há
qualidades (e defeitos) que inconsciente
mente nos atraem.
amizade é mais difícil de ultrapassar do que a traiçãoi l Feio. E a própria gestão da verdade é feita
íferentes nos dois tipos de relações. Somos
.ente cruéis com quem amamos do que com uma
mesmo, a amizade transmite-nos muito mais segu-um namoro. Ainda assim, a ideia de que os amigos, tal
como o amor, são para a vida, também perdeu parte do seu sentido.
"As nossas amizades são como o guarda-roupa", compara a psicó-
loga clínica. "Tal como vestimos esta ou aquela peça consoante a
ocasião, escolhemos com quem estar conforme a nossa disposiçãoe as nossas necessidades." Se uma saída à noite pede uma compa-nhia divertida, desabafar sobre a nossa vida profissional implica umouvido mais atento. Há ainda as amizades que fazemos no trabalho,as amigas que só vemos de vez em quando, as conhecidas e, claro,
aquelas com quem estamos sempre.
Numa semana ou numa vida, as nossas vontades estão em constan-
te mutação. Nada que nos impeça de nos voltarmos a identificar com
aqueles que peidemos de vista. "A questão dos reencontros entre
amigas é especialmente curi osa", explica Carol Smart que se deparoucom vários testemunhos sobre esta questão, ao longo do seu estudo.
"Ou porque conseguimos recuperar ligações perdidas, e percebemoso quanto evoluímos, ou porque a perda de características em comum
se tornou tão evidente que sentimos um certo desconforto."
jà. às diferenças entre homens e mulheres,
tue não se confirmam. Mário Boto Ferreira
ara a maioria dos investigadores, não há fator
tante para explicar as variações na amizade do que
jianto as mulheres tendem a estabelecer relações a dois
proximidade, conhecendo-se uma à outra, procurando
preensão e segurança, os homens procuram relações de grupo,,om menos ênfase na natureza da relação e mais enfoque nas ativi-
dades realizadas em conjunto; sejam sair à noite ou praticar despor-
to. Nem no local de trabalho, reforça ainda Mário Boto Ferreira, as
coisas mudam muito de figura, com a maioria das mulheres a des-
tacar os benefícios das amizades laborais pelo seu suporte emocio-
nal e social em momentos de stress e a maioria dos homens a focar-
-se "sobretudo nos benefícios para a sua car-
reira e nos aspetos funcionais destas relações,
por exemplo, a forma como os ajudam a con-
cretizar objetivos, a cumprir prazos, etc."
Na sua experiência enquanto psicóloga clí-
nica, Isabel Feio identifica divergências
igualmente marcantes e não hesita em apon-tá-las. "Os homens têm quatro assuntos-base
de conversação: futebol, política, carros e
mulheres. Para elas, todo e qualquer tema
serve desde que as distinga, de preferência se
as sobrevalorizar em relação às demais."
As invejas femininas, tão enraizadas na
imagem que a sociedade tem de nós, tam-bém se alteraram. Salvo raras e pouco hon-
rosas exceções, hoje já não lutamos pelomelhor marido nem pelas melhores capacidades domésticas, masainda são muitos os especialistas (e os homens) que nos acusam de
insistir numa certa competição. "Por um lado, virámo-nos para o
exterior das nossas emoções, o que é muito positivo, por outro encon-
tramos mais razões para nos compararmos umas com as outras,sobretudo no que toca à imagem corporal", analisa Isabel.
O aparecimento das redes sociais, em especial do Faccbook, podeser um acontecimento recente, mas já baralhou completamente as
contas do nosso comportamento. "Inaugurou-se uma nova era",
avança Isabel Feio, sublinhando que ainda são poucos os dados con-
cretos sobre o assunto. "Algumas relações passaram a estabelecer-
-se no virtual, mas as amizades que delas resultam podem ser tão ou
mais gratificantes do que as travadas no mundo real." Até porque, ao
contrário do que o senso comum nos diz, o ecrã do computador reve-la muito mais do que esconde. E não será esse o segredo das grandes
cumplicidades? ¦