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1 Batata-doce biofortificada João Bosco Carvalho da Silva 1 Sumário Segurança alimentar ................................................................................................ 1 Biofortificação ........................................................................................................... 5 A batata-doce como hortaliça de base familiar ......................................................... 6 Composição da raiz da batata-doce ....................................................................... 13 Bioforticação da batata-doce como fonte de pró-vitamina A .................................. 13 A batata-doce na Embrapa Hortaliças .................................................................... 15 Produção de farinha ............................................................................................... 17 Uso da farinha de batata-doce ............................................................................... 19 Disseminação da tecnologia ................................................................................... 20 BIBLIOGRAFIAS .................................................................................................... 20 Segurança alimentar A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, tendo como base, práticas alimentares promotoras de saúde. Além desses princípios, os programas de alimentação não devem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais e devem respeitar a diversidade cultural (Consea, 2007). Segundo dados publicados pelo IBGE, relativos à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada em 2002/2003, estima-se que no Brasil, em 65,2 % dos cerca de 52 milhões de domicílios particulares, residem pessoas em situação de Segurança Alimentar, ou seja, seus moradores tiveram acesso aos alimentos em quantidade e qualidade adequadas, enquanto nos outros 34,8% dos domicílios foi relatada a situação de insegurança alimentar, atingindo aproximadamente, 72 milhões de pessoas que vivem em condição de insegurança alimentar leve, moderada ou grave. A estimativa é que 12,3% e 6,5% são percentuais de domicílios onde residem pessoas com insegurança 1 Eng. Agrônomo DSc. - Pesquisador da Embrapa Hortaliças – C. postal 218 CEP 70.359-970 – Brasília-DF www.cnph.embrapa.br – [email protected]

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1

Batata-doce biofortificada

João Bosco Carvalho da Silva1

Sumário

Segurança alimentar ................................................................................................ 1

Biofortificação ........................................................................................................... 5

A batata-doce como hortaliça de base familiar......................................................... 6

Composição da raiz da batata-doce ....................................................................... 13

Bioforticação da batata-doce como fonte de pró-vitamina A .................................. 13

A batata-doce na Embrapa Hortaliças.................................................................... 15

Produção de farinha ............................................................................................... 17

Uso da farinha de batata-doce ............................................................................... 19

Disseminação da tecnologia................................................................................... 20

BIBLIOGRAFIAS .................................................................................................... 20

Segurança alimentar

A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao

acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, tendo

como base, práticas alimentares promotoras de saúde. Além desses princípios, os

programas de alimentação não devem comprometer o acesso a outras necessidades

essenciais e devem respeitar a diversidade cultural (Consea, 2007).

Segundo dados publicados pelo IBGE, relativos à Pesquisa Nacional por Amostra

de Domicílios realizada em 2002/2003, estima-se que no Brasil, em 65,2 % dos cerca de

52 milhões de domicílios particulares, residem pessoas em situação de Segurança

Alimentar, ou seja, seus moradores tiveram acesso aos alimentos em quantidade e

qualidade adequadas, enquanto nos outros 34,8% dos domicílios foi relatada a situação

de insegurança alimentar, atingindo aproximadamente, 72 milhões de pessoas que vivem

em condição de insegurança alimentar leve, moderada ou grave. A estimativa é que

12,3% e 6,5% são percentuais de domicílios onde residem pessoas com insegurança

1 Eng. Agrônomo DSc. - Pesquisador da Embrapa Hortaliças – C. postal 218 CEP 70.359-970 – Brasília-DFwww.cnph.embrapa.br – [email protected]

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alimentar moderada e grave, respectivamente, (Figura 1).

A Região Nordeste é a que apresenta os piores índices de segurança alimentar,

onde cerca de 53,5% dos domicílios foi constatada a situação de insegurança alimentar,

sendo 12,4% considerados como submetidos à insegurança alimentar grave. (Figura 2).

Figura 1 – Prevalência de situação de segurança alimentar em domicílios brasileiros.

Figura 2 – Situação de segurança alimentar em domicílios brasileiros, por Região.

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Deve-se enfatizar que esta situação, na forma como foi medida, é relacionada à

falta de recursos dos moradores para a aquisição de alimentos e que a insegurança

alimentar moderada ou grave significa limitação de acesso quantitativo aos alimentos,

com ou sem o convívio com situação de fome.

Os dados retratam a fome e os problemas decorrentes dela, mas não dimensiona

os aspectos da má alimentação, tanto pelo consumo exagerado de alimentos calóricos

causadores da obesidade, quanto das deficiências de vitaminas e minerais que causam

grandes prejuízos à saúde.

A boa nutrição envolve diferentes aspectos biológicos e comportamentais. Para

que ela seja adequada é necessário que a alimentação contenha todos os nutrientes e em

quantidade adequada para que o corpo humano não acumule reservas e nem sinta

deficiência dos nutrientes, o que significa uma alimentação equilibrada. Entretanto certos

nutrientes nem sempre estão disponíveis para a população, ou nem todos podem ter

acesso a eles, envolvendo aí questões relativas ao custo da aquisição, hábitos e

educação alimentar.

Cada grupo de plantas é considerado uma fonte de alguns nutrientes essenciais.

Por exemplo, os grãos são fontes de carboidratos, proteínas, lipídios e vitaminas solúveis

em gorduras, porém possuem baixas concentrações de cálcio e ferro. Os vegetais

folhosos são boas fontes de vitaminas e sais minerais, porém são pobres em

macronutrientes. As frutas possuem carboidratos, vitaminas solúveis em água e

carotenóides, porém não são boas fontes de proteína e certos minerais. Esta é a razão

principal de os profissionais de nutrição recomendarem uma diversificação da dieta

alimentar.

Porém, em muitas situações as famílias não têm acesso a uma alimentação

diversificada, envolvendo aí múltiplas questões tais como: a) falta de água para irrigação

nas propriedades rurais ou em hortas urbanas; b) indisposição ou falta de mão-de-obra na

família para cultivar hortas domésticas; c) falta do conhecimento das técnicas de plantio;

d) falta de conscientizarão e educação alimentar; e) priorização pelo volume de comida

em detrimento da qualidade; f) perdas pela dificuldade de armazenamento doméstico com

refrigeração; g) indisponibilidade dos produtos diversificados para a venda; h) custo; i)

hábitos alimentares; j) questões culturais.

Independentemente das causas, o fato é que existe populações inteiras que

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baseiam sua alimentação quase que exclusivamente em mandioca, arroz, milho e feijão.

Nestas condições, mesmo que tenha alimento em quantidade, a população se encontra

sob insegurança alimentar. A esta situação se denomina de FOME OCULTA.

Por meio de programas de educação alimentar, suplementação com medicamentos

e fortificação de alimentos têm sido feitos esforços para equilibrar e garantir uma

alimentação saudável. Entretanto, grande parte da população não tem acesso a estes

programas, especialmente quando o alimento é produzido pela própria família.

A deficiência de vitaminas e minerais é um grave problema de nutrição pública em

todo o Mundo e principalmente em países em desenvolvimento como o Brasil, atingindo,

principalmente, crianças, adolescentes, gestantes e mulheres em idade fértil. Agravados

pelos problemas de falta de saneamento e higiene, as principais conseqüências diretas

são: anemia; raquitismo; deficiência neurológica; deficiência de visão; deficiência

imunológica e várias outras conseqüências a longo prazo.

A fortificação ou enriquecimento de alimentos, que consiste na adição de nutrientes

aos alimentos de ampla utilização, é uma maneira de suprir a deficiência, sendo uma

alternativa de intervenção recomendada principalmente para programas emergenciais em

localidades onde se encontram elevadas prevalências de deficiência nutricional.

A fortificação apresenta como vantagens: a alta possibilidade de cobertura

populacional; o fato de não modificar os hábitos alimentares; apresentar baixo risco de

toxicidade. As dificuldades estão ligadas à: viabilidade da adição do nutriente ao alimento,

em termos de quantidade, compatibilidade e preservação; quantidade consumida do

alimento fortificado; ocorrência do consumo massivo do alimento; a distribuição; o custo; a

aceitação do produto.

A alternativa de fortificação de alimentos funciona portanto muito bem quando se

trata de aditivos estáveis, que não altere as propriedades do alimento e que possam ser

inseridos em produtos industrializados de amplo uso pela população, como é o caso da

adição de iodo no sal de cozinha.

Para as populações de países em desenvolvimento, especialmente em locais em

que a maioria vive na área rural, ocorrem limitações de acesso aos alimentos fortificados

industrializados. Em certas regiões, a comercialização desses produtos é pequena e,

muitas vezes, não existem mercados ou postos de distribuição, onde os alimentos

fortificados possam ser encontrados.

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A recente introdução da biofortificação pode, nesses casos, representar um novo e

importante papel, como parte de um processo integrado em que o sistema produtivo gera

alimentos de consumo regional, favorecendo a disponibilização do nutriente sem alterar a

dieta da população.

Biofortificação

Biofortificação é o desenvolvimento de alimentos naturais que contenham

quantidades de nutrientes capazes de suprir a necessidade do corpo humano ao ser

inserido na dieta alimentar da população.

Os produtos biofortificados com minerais e vitaminas podem ser usados no

consumo direto ou na produção de alimentos enriquecidos, tendo como principais alvos o

suprimento de micronutrientes como ferro e zinco e pró-vitamina A (caroteno).

A biofortificação é uma estratégia cientificamente possível e de baixo custo, tendo

como maior vantagem o fato de não requerer mudanças no comportamento de produtores

e consumidores. As mudanças no conteúdo dos produtos, necessariamente, não

modificam a aparência, o gosto, a textura ou a forma de preparo do alimento.

Com suporte do programa internacional denominado de HarvestPlus, várias

atividades têm sido conduzidas com sucesso, tanto no desenvolvimento de materiais

geneticamente melhorados quando no uso e aceitação dos produtos biofortificados de

milho, arroz, feijão, mandioca e batata-doce. Essas culturas compõem a dieta básica de

populações que praticam a agricultura de subsistência nas regiões mais pobres do

mundo, como África, Ásia, América Latina e Caribe.

A iniciativa partiu do Grupo Consultivo sobre Pesquisa Agrícola Internacional

(CGIAR), entidade americana, e com a aliança mundial de diversas instituições de

pesquisa e entidades executoras, entre elas a Empresa Brasileira de Pesquisa

Agropecuária (Embrapa). O projeto é coordenado pelo Centro Internacional de Agricultura

Tropical (CIAT) e o Instituto Internacional de Pesquisa sobre Políticas Alimentares

(IFPRI).

As ações do projeto são desenvolvidas nos mais diversos níveis de intervenção,

através de um sistema alimentar integrado envolvendo desde o desenvolvimento de

tecnologias para o sistema produtivo até a avaliação do consumo e da redução dos

índices de desnutrição das populações alvo. Desta forma, com pouca intervenção e com

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intensa participação das comunidades carentes são obtidos resultados de longa duração.

Os trabalhos de melhoramento genético são a base do projeto, pois os produtos

fortificados devem conter maior quantidade de vitaminas e minerais, mas devem gerar

produtos de aparência, sabor e textura semelhantes aos alimentos tradicionais.

A batata doce é uma das espécies alvo, por ser um alimento importante para

muitas populações que vivem no Centro e no Leste da África, na América Latina e

Central, onde a deficiência de provitamina A é endêmica.

A batata-doce como hortaliça de base familiar

O cultivo de hortaliças em pequena escala ainda é uma atividade múltipla de

produção agrícola exercida com baixo nível de profissionalismo e com pouco uso de

tecnologia. As culturas são geralmente conduzidas sem orientação técnica adequada,

percebendo-se também que um grande número de opções tecnológicas não são de

conhecimento da classe produtora. Essa constatação explica, pelo menos em parte, os

baixos índices de produtividade e a baixa qualidade dos produtos obtidos pelos pequenos

produtores, tendo em vista que as espécies olerícolas se caracterizam pelo cultivo de

plantas tenras, com ingredientes atrativos para pragas e patógenos, e também por serem

geralmente exigentes em água e fertilizantes.

A cultura de batata-doce é um exemplo dessa situação pois, ao longo do tempo,

tem sido cultivada de forma empírica pelas famílias rurais, em conjunto com diversas

outras culturas, visando a alimentação da família, principalmente na primeira refeição

diária, utilizada na forma de raízes cozidas, assadas ou fritas. Com o crescente êxodo

rural, grande parte do consumo de batata-doce foi substituído pelo pão e por hortaliças de

mais fácil preparo e de maior atratividade, como batata, cenoura e tomate, que eram

hortaliças anteriormente pouco consumidas pela família rural, por serem de difícil cultivo

no sistema de produção em hortas domésticas.

Estas afirmativas têm base na análise do histórico da produção que revela um

declínio de produção brasileira nas últimas décadas (Figuras 3 e 4). Por outro lado,

percebe-se também que o índice de produtividade tem sido crescente nos últimos anos,

revelando que o sistema de produção tem sofrido mudanças que indicam uma evolução

do nível tecnológico, embora muitas tecnologias disponíveis ainda sejam raramente

aplicadas nessa cultura.

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Figura 3. Área cultivada com batata-doce no Brasil (FAO, 2007)

Apesar da grande decadência sofrida durante as últimas décadas, verifica-se pelos

dados estatísticos, que a batata-doce ainda detém o 6° lugar entre as olerícolas mais

plantadas no Brasil, correspondendo a uma produção anual de 484.000 toneladas,

obtidas em uma área estimada de 44.000 hectares.

A batata-doce é plantada em 111 países, sendo que aproximadamente 90% da

produção são obtidos na Ásia, 5% na África e 5% no restante do mundo. Apenas 2% da

produção está em países industrializados como os Estados Unidos e Japão. A China é o

país que mais produz, com 100 milhões de toneladas (FAO, 2001)

Em termos de volume de produção mundial, a cultura ocupa o sétimo lugar entre as

olerícolas, mas é a décima quinta em valor da produção, o que indica ser universalmente

uma cultura de baixo custo de produção.

A batata-doce é cultivada desde a longitude de 42 ºN até 35 ºS do equador, desde

o nível do mar até 3000 m de altitude. Ou seja, é cultivada em climas diversos como no

das Cordilheiras dos Andes; em regiões de clima tropical, como o da Amazônia;

temperado, como no do Rio Grande do Sul e até desértico, como o da costa do Pacífico.

Adapta-se melhor, entretanto, em áreas tropicais, onde vive a maior proporção de

populações pobres. Nestas regiões, além das vantagens que tem como alimento humano

de bom conteúdo nutricional, principalmente como fonte de energia e de proteína, a

cultura tem grande importância na alimentação animal e na produção industrial

principalmente de amido e álcool. É considerada uma cultura rústica, pois apresenta

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pouca resposta à aplicação de fertilizantes e cresce em condições de solos pobres e

degradados.

Figura 4. Produção de batata-doce no Brasil (FAO,2007)

Comparada com outras culturas como arroz, banana, milho e sorgo, a batata-doce

cultivada em regiões tropicais é mais eficiente em termos de quantidade de energia

líquida produzida por unidade de área e por unidade de tempo. Isso ocorre porque produz

grande volume de raízes em um ciclo relativamente curto a um custo baixo, durante o ano

inteiro.

No Brasil, o investimento na cultura de batata-doce é muito baixo, e o principal

argumento contrário ao investimento em tecnologia é que a lucratividade da cultura é

baixa. Isso decorre do pequeno volume individual de produção, ou seja, os produtores

ainda tendem a plantar a batata-doce como cultura marginal, com o raciocínio de que,

gastando-se o mínimo, qualquer que seja a produção a cultura constitui um ganho extra.

Dessa forma, é obtido um produto de péssima qualidade, que sofre grande restrição no

momento da comercialização, tanto por parte dos atacadistas que tendem a reduzir o

preço, quanto por parte do consumidor que refuga boa parte do produto exposto à venda.

Ao se compararem os custos de produção e os índices de produtividade, percebe-

se que uma questão básica é a falta de determinação, por parte do produtor, em

pesquisar mercados e descobrir oportunidades de estabelecer compromissos de

produção com alta qualidade, para se ter um canal seguro de comercialização, com

possível regularidade de uma produção programada. Isto requer que a cultura seja tratada

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com mais profissionalismo, pois a grande limitação de ordem econômica ocorre na

comercialização.

A produtividade média brasileira é menor que 10 t/ha (500 caixas/ha), enquanto

que, utilizando-se apenas cerca de R$3400/ha ou Us$1300, que é o custo médio para

adotar um sistema tecnológico razoável, obtém-se com relativa facilidade, a produtividade

de 22 t/ha (1.100 caixas/ha). Considerando o preço médio de R$9,50 por caixa, estima-se

o retorno do triplo do capital investido em apenas quatro ou cinco meses, o que raramente

se obtém em outra atividade produtiva. Além do bom nível de retorno econômico, o uso

da tecnologia resulta na melhoria substancial da qualidade do produto, melhorando a sua

aceitação e aumentando o poder de barganha no momento da comercialização.

Para o Brasil, a batata-doce é uma cultura de grande interesse social, pois se

adapta a amplas condições de clima, solo e topografia, podendo ser cultivada em todas

as regiões. Embora bem disseminada no país, está mais presente nas regiões Sul e

Nordeste, notadamente nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná,

Pernambuco e Paraíba (Tabela 1).

Na região Nordeste, a cultura assume maior importância social, por se constituir em

uma fonte de alimento de fácil acesso, levando-se em conta a grande limitação na

disponibilidade de outros alimentos em períodos críticos de estiagem prolongada.

Paradoxalmente, é nesta região e na Região Norte, mais carentes e com melhor clima,

que a produtividade é mais baixa.

Os dados de consumo de hortaliças, relacionados com quantidade adquirida per

capita (Tabela 2) indicam que as regiões Nordeste e Sul consomem três a quatro vezes

mais batata-doce que demais regiões. Considerando o consumo de tuberosas, na região

Nordeste a batata-doce representa 13,07% e na região Sul 7,12%, enquanto nas demais

regiões corresponde à cerca de 3% da quantidade consumida.

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Tabela 1. Área, produção e produtividade da batata-doce em alguns estados e nas

regiões brasileiras (dados de 2004).

Estados Área(ha)

Produção(t)

Produtividade(t/ha)

Rio Grande do Sul 13.554 147.430 10,9

Paraíba 6.441 59.971 9,0

Paraná 3.860 68.653 17,8

São Paulo 3.020 53.000 14,2

Pernambuco 2.455 23.113 9,4

Santa Catarina 2.343 41.818 17,8

Regiões

Sul 21.046 258.558 12,2

Nordeste 15.559 126.228 8,1

Sudeste 5.853 82.004 14,0

Norte 398 1.370 3,4

Centro-Oeste 302 4.262 14,1

Brasil 43.158 472.422 10,36

Fonte: IBGE, 2007.

Tabela 2 – Aquisição de produtos hortícolas, das hortaliças tuberosas e de batata-doce

pelas famílias brasileiras em 2002/3003.

Aquisição alimentar domiciliar per capita anual (kg)Grandes RegiõesProdutos

Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul C.OesteHortaliças 29,002 19,73 22,352 32,425 39,298 23,277

Hortaliças tuberosas 13,089 8,529 8,665 14,499 21,557 9,375

Batata-doce 0,749 0,256 1,133 0,385 1,536 0,317

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2004.

Vantagens e desvantagens da cultura

É resistente à seca – a cultura de batata-doce necessita de cerca de 500 mm de

lâmina de água durante o ciclo produtivo para que apresente um índice elevado de

produtividade. As raízes de reserva se formam já no início do desenvolvimento da planta,

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e estas estruturas, além de se constituírem reserva para a própria planta, são unidades de

reprodução capazes de emitirem novas brotações se a parte aérea da planta for eliminada

ou se ressecar pela deficiência hídrica prolongada. Nesse caso, o ciclo cultural se

prolonga, mas raramente ocorre perda total da lavoura, como é comum ocorrer com

outras espécies, nessas condições.

É de fácil cultivo – Embora existam diversas técnicas aplicadas desde o preparo

do solo até o processamento pós-colheita, a cultura pode ser conduzida de forma

rudimentar, sem utilização de fertilizantes, agrotóxicos ou irrigação.

Tem baixo custo de produção – Ao se comparar com diversas outras olerícolas,

a batata-doce demanda menos fertilizantes, irrigação e mão-de-obra, o que resulta em

baixo custo relativo de produção.

Permite colheita prolongada – A parte comercial se constitui de raízes de reserva

que se formam ao longo do ciclo da planta, sem apresentar um momento específico de

colheita, tratando-se portanto de uma planta de ciclo perene. Assim sendo, a colheita

pode ser escalonada, antecipada, ou retardada, de acordo com a conveniência do

produtor, levando-se em conta porém, que a antecipação corresponde à produção de

raízes de menor tamanho e que o retardamento implica em maior incidência de pragas,

além da formação de raízes acima dos padrões comerciais.

Apresenta resistência a pragas e doenças – O fato de a batata-doce ter sido

uma das olerícolas mais cultivadas em décadas passadas, quando não se utilizavam

agrotóxicos, é um comprovante de sua resistência natural a pragas e doenças. Esta

característica foi comprovada em várias pesquisas.

É mecanizável – A horticultura é uma atividade que geralmente consome grande

quantidade de mão-de-obra. Esta característica tem a vantagem da utilização de mão-de-

obra familiar e favorecer a fixação do homem no campo. Entretanto, o uso de serviço

mecanizados reduz o custo de produção e aumenta a possibilidade de lucro para o

produtor. Nesse sentido a cultura da batata-doce tem a vantagem de ser adaptada a

ambos sistemas de produção, podendo ter diversas etapas mecanizadas, especialmente

o plantio e a colheita.

É protetora do solo – A cultura é instalada em camalhões ou leiras que devem ser

construídas em nível, formando um eficiente sistema de controle da erosão, podendo

portanto ocupar áreas marginais e de topografia acidentada. A planta apresenta ainda um

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crescimento rápido, cobrindo completamente o solo a partir de aproximadamente 45 dias

do plantio.

A despeito de tantas vantagens, como hortaliças destinada ao consumo humano

apresenta uma série de desvantagens ou barreiras que são:

É de difícil preparo – As hortaliças são geralmente preparadas em curto tempo,

sendo diversas delas simplesmente picadas ou raladas. A batata-doce entretanto,

necessita ser picada, descascada e cozida, exigindo certo esforço e tempo que nem toda

dona-de-casa moderna está disposta a despender.

Tem aparência ruim – Por se tratar de uma raiz tuberosa, o crescimento das

batatas é geralmente afetado pela presença de torrões, pedras e fendas do solo,

formando um produto tortuoso. O ataque de larvas de insetos, mesmo que não

danifiquem severamente as batatas, causam pequenos orifícios e galerias superficiais que

depreciam muito a sua aparência. Além disso, das variedades cultivadas apresenta altos

teores de produtos fenólicos que, embora úteis por aumentar a resistência a pragas,

causam o escurecimento da polpa quando exposta ao ar, constituindo alimentos menos

atrativos.

Forma manchas – A planta da batata-doce produz látex que se fixa facilmente na

pele e em tecidos formando manchas de difícil remoção.

Causa “pesadez” no estômago e forma gases – A batata-doce possui um

inibidor da digestão que reduz a ação de enzimas digestivas como a tripsina e

quimotripsina. A redução do tempo de digestão favorece a fermentação dos alimentos no

trato intestinal, com aumento na formação de gases.

É “comida de pobre” – A batata-doce tem sido tradicionalmente consumida por

famílias de baixa renda, especialmente as do meio rural. Uma constatação disso é que

raramente faz parte da pauta de produtos de exportação. Ou seja, nos países ricos não se

consome batata-doce. Outra constatação é que, embora possa ser utilizada em inúmeras

receitas, tanto de doces como de salgados, raramente é citada como ingrediente, em

livros de receitas.

A principal conseqüência destes entraves é a restrição na comercialização. O

volume de venda nos supermercados e nos atacadistas é relativamente pequeno. Com

isso, não se formou, ao longo do tempo, um canal de comercialização e não se conhecem

casos de produção programada ou organizada em forma de cooperativas ou associações.

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O maior volume de venda ocorre em mercados de periferia, como as feiras e quitandas,

que é individualmente pequeno, formando-se então um ciclo vicioso de baixa qualidade

do produto, baixo valor pago ao produtor, pouco investimento, baixo nível tecnológico.

Composição da raiz da batata-doce

A batata-doce é um produto basicamente energético (Tabela 3). Ao ser colhida

apresenta cerca de 30% de matéria seca que contém em média 85% de carboidratos,

cujo componente principal é o amido. Comparada com outras estruturas vegetais

amiláceas, a raiz da batata-doce possui mais matéria seca, carboidratos, lipídios, cálcio e

fibras em relação à batata e mais proteína e vitaminas que a mandioca.

Tabela 3. Composição nutricional de 100 gramas de raiz de batata-doce crua.

Componente Quantidade

Água 72,8 (g)Calorias 102 calFibras digeríveis 1,1 (g)Potássio 295 (mg)Fósforo 53 (mg)Sódio 43 (mg)Cálcio 39 (mg)Magnésio 10 (mg)Ferro 0,9 (mg)Manganês 0,35 (mg)Zinco 0,28 (mg)Cobre 0,2 (mg)Pró-vitamina A – retinol 300 (mg)Vitamina B – tiamina 96 (mg)Vitamina B2 – riboflavina 55 (mg)Vitamina C – ácido ascórbico 30 (mg)Vitamina B5 – niacina 0,5 (mg)

Fonte: Luengo at al., 2000

Bioforticação da batata-doce como fonte de pró-vitamina A

A vitamina A é encontrada nos organismos dos animais. Portanto, os alimentos de

origem animal são fontes naturais desta vitamina na forma de nutriente prontamente

assimilável. Quando se trata de alimento de origem vegetal, o organismo humano

inicialmente assimila os compostos do grupo denominado de carotenóides que são

convertidos em vitamina A durante o processo digestivo. Daí o termo pró-vitamina A.

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Dentro grupo de carotenóides os compostos com maior atividade são os carotenos,

sendo que a fração beta-caroteno possui o dobro da atividade do alfa-caroteno. Este

composto tem coloração alaranjada, o que facilita muito a identificação de alimentos

enriquecidos.

O valor de pró-vitamina A apresentado na tabela 3 representa uma média entre as

variedades de batata-doce encontradas no mercado. Entretanto, as variedades de polpa

branca contém teores insignificantes de caroteno, enquanto que em variedades com

polpa de coloração alaranjado-intenso apresenta valores superiores aos encontrados em

cenoura, que é o alimento mais citado como fonte de caroteno.

Como visto nos itens anteriores, a batata-doce apresenta muitas vantagens para

ser utilizada como fonte de disponibilização de pró-vitamina A para as comunidades

carentes, aliando-se as facilidades do ponto de vista agronômico com a facilidade de

identificação de produtos naturalmente enriquecidos, pelo fato da coloração da polpa

alaranjada ser um indicador de fácil visualização.

Outra grande facilidade é o processo de multiplicação por meio vegetativo. A

batata-doce é geralmente plantada por meio de ramas-semente que são segmentos de

ramas contendo seis a oito nós (30 – 40 cm) retirados de plantas em lavouras em

crescimento, com aproximadamente 90 dias de cultivo. Neste procedimento obtêm-se em

média, cinco ramas por planta, sem prejuízo para a produção da lavoura doadora.

Quando se necessita de alta taxa de multiplicação, cada nó pode dar origem a uma

nova planta. Neste caso é feito o pré-enraizamento dos nós em água por dois ou três dias

e depois são transplantados para bandejas altas de isopor (72 células e 11 cm de altura),

cultivados em ambiente de viveiro de mudas por cerca de 30 dias e então transplantados

em campo. Neste processo a taxa de multiplicação depende do vigor e tamanho da

planta-matriz, podendo-se obter 20 a 30 mudas por planta.

Outra forma de obter material propagativo consiste em utilizar raízes tuberosas.

Cada raiz produz de 15 a 20 brotações que podem ser utilizadas nos processos de

multiplicação descritos nos parágrafos anteriores.

Além destes três procedimentos bastante práticos, a batata-doce pode ser

vegetativamente multiplicada por enraizamento de folhas isoladas e por técnicas de

cultivo in vitro.

O fato de ser possível utilizar infinitas gerações no processo de multiplicação

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vegetativa significa que, a partir de uma única planta que contenha um conjunto de

características desejadas, pode-se ter uma nova variedade, utilizando o método de

seleção.

Para realização dos trabalhos de melhoramento genético são obtidas sementes

botânicas com ampla variabilidade de caracteres, pois se trata de uma hexaploide (n=15).

Portanto são 90 cromossomos com inúmeras possibilidades de combinações genéticas.

A batata-doce na Embrapa Hortaliças

A Embrapa Hortaliças mantém um banco de germoplasma de batata-doce que tem

1024 acessos, sendo 625 mantidos como planta cultivada em vasos, 43 in vitro e os

demais como sementes. Durante o processo de renovação dos acessos foram separados

e multiplicados sessenta acessos mais vigorosos que foram plantados em campo para

avaliação, quando foram obtidos três acessos com coloração alaranjada (Figura 5) que

contém cerca de 65 mg/kg de carotenóides totais.

Embora estes materiais não tivessem o teor tão elevado quanto o encontrado na

variedade Resisto, que tem sido muito disseminada nos países africanos, iniciou-se a

divulgação e disseminação destes materiais, ao mesmo tempo em que se procedia à

introdução de clones, variedades e sementes, através do Centro Internacional de la Papa

Figura 5 – Raiz de batata-doce do acesso 171 do

banco de germoplasma da Embrapa Hortaliças.

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(CIP) localizado no Peru.

Quando o assunto foi apresentado no programa Globo Rural, da Rede Globo de

Televisão, foi solicitado aos produtores o envio de amostras de batatas que tivessem

polpa com coloração alaranjada, visando enriquecer a coleção. Surpreendentemente

foram obtidos 153 materiais com as mais diversas características, incluindo desde batatas

com polpa branca até polpa roxa (Figura 6). Esta nova coleção está sendo caracterizada

por meio de descritores morfológicos e também por análise molecular, visando agrupar e

eliminar as duplicatas.

Os acessos que apresentavam raiz com coloração alaranjado-intenso foram

analisados, obtendo-se valores de 52 a 261 mg/kg de carotenóides totais. Estes dados

indicam um grande potencial para obtenção de variedade de excelentes características e

com boa adaptação às condições de cultivo no Brasil.

Dentre estes acessos foram selecionados 63 que apresentavam as melhores

características em termos de formato, tamanho de raiz, uniformidade, cor e vigor. Este

grupo está sendo avaliado para produtividade, resistência à nematóides e resistência ao

fungo Plenodomus destruens, causador do mal-do-pé.

Dos quarenta e três acessos que vieram do CIP, um grupo é composto por 22

variedades já avaliadas em outros países e os demais são clones elite selecionados no

CIP. Estes materiais foram submetidos à quarentena, multiplicados e plantados em

campo. A primeira avaliação deverá ocorrer em agosto de 2007. Enquanto isso, serão

também submetidos à seleção para resistência à Plenodomus e Nematóides.

Figura 6 – Raízes de acessos do banco de germoplasma de batata-doce da

Embrapa Hortaliças.

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Produção de farinha

A população alvo são as crianças e mães gestantes de comunidades carentes.

Estas categorias sociais são atendidas por programas governamentais, como são os

programas municipais e estaduais de alimentação coordenados pelo Conselho Nacional

de Segurança Alimentar e Nutricional – CONSEA (www.planalto.gov.br/consea/) e o

Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) (www.fnde.gov.br/

programas/pnae/index.html). São também assistidos por organizações não

governamentais, tais como Pastoral da Criança (www.pastoraldacrianca.org.br) e Caritas

do Brasil (www.caritas.org.br).

Por meio de ações conjuntas com as entidades sociais os produtos biofortificados

podem ser introduzidos, atingindo de forma rápida e efetiva à grande parte da população

alvo. Entretanto, para que isso ocorra, é necessário que o produto seja apresentado de

forma que permita o armazenamento sem refrigeração por longo prazo, além de ser de

fácil utilização e de custo competitivo.

Ao se entrevistarem senhoras merendeiras, elas foram unânimes ao afirmar que

não é possível utilizar produtos in natura que demandam tanto tempo para o cozimento

(20 min) para preparar grande número de refeições, mas que como substituta da farinha

de trigo, a farinha de batata-doce seria facilmente utilizada para o preparo das merendas.

Embora seja um produto com teor de umidade relativamente alto (70%), o custo da

fabricação da farinha de batata-doce deve ser competitivo, pois o processamento e as

características das matérias-prima são semelhantes às da farinha de mandioca, que é

amplamente consumida pelas populações de baixa renda. Entretanto, para que os custos

reais sejam avaliados, é necessário haver investimentos em unidade de fabricação, para

que os custos operacionais e financeiros sejam devidamente quantificados.

Como citado, o processamento da farinha é semelhante ao que se faz com outras

matérias-prima. Os dois fatores diferenciais são a temperatura, que não pode ser superior

a 60 ºC e a não exposição ao sol, tanto durante a secagem quando durante o

armazenamento. O calor e a radiação degradam o caroteno.

O processo consiste nas etapas: a) descascamento; b) lavagem; b) ralação ou

picagem; c) secagem; d) moagem.

O descascamento consiste na remoção da película e das partes danificadas por

pragas e doenças. Ainda não foram avaliados os processos mecanizados para esta

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operação, mas é muito provável que os descascadores utilizados para a mandioca sejam

facilmente adaptados para a batata-doce. Logo após o descascamento as raízes devem

ser mantidas imersas em água para evitar a oxidação e também evitar a aderência dos

resíduos do descascamento.

A lavagem consiste na remoção se sujeiras e dos contaminantes deixados durante

a operação de descascamento.

A picagem consiste em transformar as raízes em fatias longas e finas para facilitar

o processo de secagem. Deve-se evitar o uso do ralador mandioca, pois com ele se

obtém uma massa compacta que dificulta a passagem do ar durante a secagem. Para

esta operação podem ser utilizados os processadores de alimentos ou construir um

picador semelhante ao mostrado na figura 7, utilizando o disco fatiador com furo de 5 mm.

A secagem deve ser feita à temperatura inferior a 60 ºC até atingir cerca de 10% de

umidade, no menor tempo possível, visando reduzir os processos de oxidação e

fermentação.

Existe no mercado diversos modelos de secadores ou desidratadores utilizando

como fonte de calor a energia elétrica, o gás e ar aquecido por coletores solares.

Geralmente consiste em fazer circular e exaurir o ar aquecido, fazendo retirar a umidade

do produto colocado sobre bandejas perfuradas.

Na Embrapa Hortaliças foram avaliados dois secadores, sendo um elétrico,

contendo seis resistências de 1000 w e capacidade de secagem de 30 kg de material

fresco. O tempo de secagem foi de aproximadamente 10 horas, resultando num consumo

Figura 7 – Picador e secadora de raiz de batata-doce para fabricação de farinha

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máximo de dois kwatts por quilo de material fresco (não foi possível quantificar o tempo

que as resistências permaneciam automaticamente desligadas pelo termostato). O outro

secador a gás (GLP) consumiu em média 2 kg de gás por ciclo de secagem de 10 h, e

capacidade de secagem de 20 kg de material fresco.

Estes parâmetros não devem se usados como cálculo do custo, pois a eficiência de

secagem depende muito das condições ambientais e da eficiência do secador.

Outra opção muito interessante é utilizar equipamentos de leito fluidizado, nestes

equipamentos o ar aquecido circula em alta velocidade fazendo que a massa de material

a ser secado flutue dentro da coluna de secagem, ocorrendo a desidratação em

aproximadamente uma hora, à temperatura de 50 ºC. Com este processo é mantida a

coloração original do produto, resultando numa farinha de ótima aparência. A grande

limitação ainda é o custo do equipamento.

Após a secagem o material pode ser armazenado em embalagens impermeáveis

para posterior moagem.

A moagem pode ser realizada em diversos tipos de moinho, desde que tenha uma

peneira apropriada para que a granulometria da farinha seja fina e uniforme.

Quanto à embalagem, é importante que seja impermeável à luz, para evitar a

degradação do caroteno. Na Embrapa Hortaliças tem sido utilizado o plástico dupla face

(preto e branco) fabricado com produto não reciclado. Outras opções são as embalagens

aluminizadas e as latas.

Quanto à conservação, amostras com 10 % de umidade, mantidas por um ano

embalagens armazenadas em ambiente de laboratório ainda não apresentaram bolores,

insetos ou quaisquer outros sinais de deterioração.

Uso da farinha de batata-doce

Em receitas de bolos, biscoitos e pães caseiros foi possível substituir totalmente a

farinha de trigo. O sabor dos produtos elaborados com esta farinha é um pouco diferente,

mas é agradável e não há repugnância. Mesmo nas receitas mais simples como as de

biscoito que têm como ingredientes a farinha, ovos, margarina e fermento, houve ótima

aceitação por alunos. Quando foram avaliadas receitas contendo chocolate, coco ralado

ou leite condensado, a quantidade consumida foi maior que a habitual.

Em receita de pão-francês o limite de substituição da farinha de trigo foi de 15%,

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sem alteração de estrutura e volume e apresentando sabor suave. Ao adicionar 20%

houve redução de volume e o sabor foi mais acentuado.

Disseminação da tecnologia

A Embrapa Hortaliças está desenvolvendo diversas atividades de disseminação da

batata-doce alaranjada, porém sem utilizar a denominação de variedade biofortificada,

pois o que está disponível ainda não contém o teor de caroteno desejado.

Várias Unidades de Demonstração, Dias-de-campo, já foram realizados e a

Embrapa tem disponibilizado os materiais genéticos para órgãos de pesquisa e

assistência técnica, para grupos de produtores, cooperativas e prefeituras.

BIBLIOGRAFIAS

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