pagina 1

1
EDITORA-COORDENADORA: SIMONE RIBEIRO / [email protected] SEG SALVADOR 23/6/2014 HOJE VIAJAR TER POP QUA VISUAIS QUI CENA / GASTRONOMIA SEX FIM DE SEMANA SAB LETRAS DOM TELEVISÃO atarde.com.br/caderno2mais TELEVISÃO A CANTORA KARLA DA SILVA (FOTO) É UMA DAS CONVIDADAS DO PROGRAMA ESTÚDIO MÓVEL QUE VAI AO AR HOJE, NA TV BRASIL 5 ENTREVISTA ACADÊMICO FALA SOBRE MUDANÇAS DA FESTA DE SÃO JOÃO 3 Divulgação PERFIL Um instrumento musical capaz de traduzir diferentes culturas, povos e tradições do Brasil e do mundo Sanfona 2 Dona “Ela é tão desafiadora que você fica cada vez mais apaixonado” PEDRO VIEIRA, sanfoneiro “Sem dúvida o peso da sanfona é a maior dificuldade para tocá-la” LÍVIA MATOS, sanfoneira GISLENE RAMOS Pesada, gorda, parruda. No Nordeste, ela é a musa dos fes- tejos juninos, famosa por seu resfolego no forró. Mas no Sul, também está presente nas fes- tas. Até em São Paulo aparece, em shows de rock e jazz. Não é qualquer um que se atreve a tocá-la. É preciso ter paixão. Custa caro e, para cui- dar bem dela, é preciso de mui- to trabalho. Além de tudo, quanto mais velha, melhor. Chamada de sanfona, acor- deom sete baixos, gaita e tan- tos outros, já no nome ela pro- va o quanto é diversa. Um ins- trumento musical secular de in- finitas possibilidades sonoras e que representa inúmeras cul- turas no Brasil e no mundo. Pluralidade Dona Sanfona é composta por três elementos básicos: o fole, os baixos e os botões; e as possibilidades de combinação entre eles são infinitas. Daí a sua flexibilidade sonora e a ca- pacidade de adaptação a di- ferentes povos e culturas. As- sim explica o sanfoneiro e apai- xonado por ela, Pedro Vieira: "A maneira como se faz o de- dilhado no teclado influencia, a maneira como se abre o fole e a maneira como se usa o baixo influencia e, por fim, a combinação entre essas três características dá uma infini- dade de sons". Múltipla, Dona Sanfona tem um rico histórico em diferentes culturas. Seja na Europa, Nor- deste, Centro-Oeste e Sul do Brasil. A sua mecânica não di- fere quase nada em relação às regiões do país; mas a dife- rença mesmo está na forma de tocar. "É uma coisa inexplicá- vel, 13 quilos vibrando no seu peito com todos aqueles har- mônicos. Ela é tão desafiadora que você fica cada vez mais apaixonado”, declara Vieira. Os primeiros gêneros musi- cais que chegaram ao Brasil com os imigrantes, como fado, valsa, polca, bugiu, caijun, re- tratavam o folclore de portu- gueses, alemães, italianos, franceses e espanhóis. Nesse período, ela ainda se chamava Concertina. Já no Nordeste, onde san- fona é seu nome mais famoso, o rei do baião, Luiz Gonzaga popularizou o instrumento e a forma nordestina de tocar. No Sul, além de acordeom, san- fona é chamada de gaita. Quando chegou ao Sul, a sanfona estava presente nas grandes famílias tradicionais e nos festejos folclóricos. Mas outras musicalidades também são exploradas. A exemplo do Quinteto Persch, do Rio Gran- de do Sul, que usa o instru- mento na música de câmara, demonstrando sua versatilida- de com o repertório erudito. Muitos foram ou são discí- pulos da sanfona. Além dos mestres Sivuca e Luiz Gonzaga, há nomes como Domingui- nhos, Mário Zen, Toninho Fer- ragutti, com um tom jazzístico, Oswaldinho do Acordeon, com a mistura da música popular mundial e o rock, que fazem da sanfona um instrumento mais urbano e contemporâneo. “A sanfona usada no filme Luiz Gonzaga, de Pai pra Filho foi dessa fábrica aqui no Brasil. Eu não sabia o quão grande era a diversidade de aplicação do acordeom no Brasil. Eu fiquei impressionado”, diz Mano Mon- teiro, o único fabricante de san- fona no Brasil pela Todeschine. Em média a sanfona pesa en- tre 8 e 12 quilos e, em alguns casos, 18 quilos. Lívia Matos, que toca sanfona há 11 anos, conta as dificuldades: "Coordenação é a primeira que se pensa para quem olha de fora. Mas sem dúvida o peso é a maior". Não é fácil lidar com Dona Sanfona. O professor do Con- servatório de Música de Per- nambuco, Júlio Cesar, defende a possibilidade de se estudar a sanfona com atenção técnica. "É perfeitamente possível es- crever um forró numa partitura, exatamente como se toca, com indicação de fole e tudo", diz. Para ele, o ensino através de leitura e escritas de partituras e teoria musical sofre muito pre- conceito com autodidatas. "Tem muita gente que acha que es- tudar teoria é uma coisa que vai tirar a intuição, vai desaprender a tocar forró, e isso é uma coisa que eu ainda hoje escuto muito dos meus alunos". Custa caro. “Eu costumo di- zer que a primeira e mais com- plicada questão é ter uma san- fona”, diz Júlio César, já que um instrumento de boa qualidade sai em média por R$ 8 mil. Na Itália ainda é onde se fabricam as melhores sanfonas. Por outro lado, sanfona velha é que faz música boa. Assim, é muito comum sanfoneiros com- prarem instrumentos usados, porém, de boa qualidade. História e tradição Surgido há 2.700 anos antes de Cristo, o cheng foi inventado na China – uma espécie de ór- gão portátil tocado pelo sopro da boca, ancestral do acor- deom. O dia nacional do sanfoneiro é o 26 de maio, em home- nagem a Sivuca. E o dia mun- dial, 6 de maio. Mano Monteiro conta que na, década de 60 e 70, diversas fábricas de safona faliram. Desse período em diante, co- meçaram a chegar no país san- fonas de produção chinesa, que, apesar de não serem de grande qualidade, serviram para facilitar a compra e po- pularizar o instrumento. Para a sanfoneira Lívia Ma- tos, a sanfona vem se forta- lecendo, sobretudo entre as mulheres. "Acredito que cada vez mais estão aparecendo sanfoneiras que estão mos- trando a coragem e serviço com o instrumento". Fernando Vivas / Ag. A TARDE

Upload: sergyo-vitro

Post on 27-Jun-2015

87 views

Category:

Documents


4 download

TRANSCRIPT

Page 1: Pagina   1

EDITORA-COORDENADORA: SIMONE RIBEIRO / [email protected]

SEGSALVADOR23/6/2014

HOJE VIAJARTER POPQUA VISUAISQUI CENA / GASTRONOMIASEX FIM DE SEMANASAB LETRASDOM TELEVISÃO

atarde.com.br/caderno2mais

TELEVISÃO A CANTORA KARLADA SILVA (FOTO) É UMA DASCONVIDADAS DO PROGRAMAESTÚDIO MÓVEL QUE VAIAO AR HOJE, NA TV BRASIL 5

ENTREVISTA ACADÊMICO FALA SOBREMUDANÇAS DA FESTA DE SÃO JOÃO 3

Divulgação

PERFIL Um instrumentomusical capaz detraduzir diferentesculturas, povos etradições do Brasile do mundo Sanfona

2

Dona

“Ela é tãodesafiadora quevocê fica cadavez maisapaixonado”

PEDRO VIEIRA, sanfoneiro

“Sem dúvida opeso da sanfonaé a maiordificuldade paratocá-la”

LÍVIA MATOS, sanfoneira

GISLENE RAMOS

Pesada, gorda, parruda. NoNordeste, ela é amusa dos fes-tejos juninos, famosa por seuresfolego no forró.Mas no Sul,também está presente nas fes-tas. Até em São Paulo aparece,em shows de rock e jazz.

Não é qualquer um que seatreve a tocá-la. É preciso terpaixão. Custa caro e, para cui-darbemdela,éprecisodemui-to trabalho. Além de tudo,quanto mais velha, melhor.

Chamada de sanfona, acor-deom sete baixos, gaita e tan-tos outros, já no nome ela pro-va o quanto é diversa. Um ins-trumentomusicalsecularde in-finitaspossibilidadessonoraseque representa inúmeras cul-turas no Brasil e no mundo.

PluralidadeDona Sanfona é composta portrês elementos básicos: o fole,os baixos e os botões; e aspossibilidades de combinaçãoentre eles são infinitas. Daí asua flexibilidade sonora e a ca-pacidade de adaptação a di-ferentes povos e culturas. As-simexplicaosanfoneiroeapai-xonado por ela, Pedro Vieira:

"A maneira como se faz o de-dilhado no teclado influencia,a maneira como se abre o folee a maneira como se usa obaixo influencia e, por fim, acombinação entre essas trêscaracterísticas dá uma infini-dade de sons".

Múltipla,DonaSanfona temumricohistórico emdiferentesculturas. Seja na Europa, Nor-deste, Centro-Oeste e Sul doBrasil. A sua mecânica não di-fere quase nada em relação àsregiões do país; mas a dife-rençamesmoestána formadetocar. "É uma coisa inexplicá-vel, 13 quilos vibrando no seupeito com todos aqueles har-mônicos. Ela é tão desafiadoraque você fica cada vez maisapaixonado”, declara Vieira.

Os primeiros gêneros musi-cais que chegaram ao Brasilcomos imigrantes, como fado,valsa, polca, bugiu, caijun, re-tratavam o folclore de portu-gueses, alemães, italianos,franceses e espanhóis. Nesseperíodo, ela ainda se chamavaConcertina.

Já no Nordeste, onde san-fona é seu nomemais famoso,o rei do baião, Luiz Gonzagapopularizou o instrumento e a

forma nordestina de tocar. NoSul, além de acordeom, san-fona é chamada de gaita.

Quando chegou ao Sul, asanfona estava presente nasgrandes famílias tradicionais enos festejos folclóricos. Masoutras musicalidades tambémsão exploradas. A exemplo doQuinteto Persch, do Rio Gran-de do Sul, que usa o instru-mento na música de câmara,demonstrando sua versatilida-de com o repertório erudito.

Muitos foram ou são discí-pulos da sanfona. Além dosmestres Sivucae Luiz Gonzaga,há nomes como Domingui-nhos, Mário Zen, Toninho Fer-ragutti, comum tom jazzístico,OswaldinhodoAcordeon, coma mistura da música popularmundial eo rock, que fazemdasanfona um instrumento maisurbano e contemporâneo.

“AsanfonausadanofilmeLuizGonzaga, de Pai pra Filho foidessa fábrica aqui no Brasil. Eunão sabia o quão grande era adiversidade de aplicação doacordeom no Brasil. Eu fiqueiimpressionado”,dizManoMon-teiro, o único fabricante de san-fona no Brasil pela Todeschine.

Emmédia a sanfona pesa en-

tre 8 e 12 quilos e, em algunscasos,18quilos.LíviaMatos,quetoca sanfona há 11 anos, contaas dificuldades: "Coordenação éa primeira que se pensa paraquem olha de fora. Mas semdúvida o peso é a maior".

Não é fácil lidar com DonaSanfona. O professor do Con-servatório de Música de Per-nambuco, Júlio Cesar, defendea possibilidade de se estudar asanfona com atenção técnica."É perfeitamente possível es-creverumforrónumapartitura,exatamente como se toca, comindicação de fole e tudo", diz.

Para ele, o ensino através deleitura e escritas de partituras eteoria musical sofre muito pre-conceitocomautodidatas."Temmuita gente que acha que es-tudar teoria éuma coisaque vaitirar a intuição, vai desaprendera tocar forró, e isso é uma coisaque eu ainda hoje escutomuitodos meus alunos".

Custa caro. “Eu costumo di-zer que a primeira emais com-plicada questão é ter uma san-fona”,dizJúlioCésar, jáqueuminstrumento de boa qualidadesai em média por R$ 8 mil. NaItália ainda é onde se fabricamas melhores sanfonas.

Poroutrolado,sanfonavelhaé que faz música boa. Assim, émuitocomumsanfoneiroscom-prarem instrumentos usados,porém, de boa qualidade.

História e tradiçãoSurgido há 2.700 anos antesdeCristo,ochengfoi inventadona China – uma espécie de ór-gão portátil tocado pelo soproda boca, ancestral do acor-deom.

Odianacionaldosanfoneiroé o 26 de maio, em home-nagem a Sivuca. E o dia mun-dial, 6 de maio.

Mano Monteiro conta quena,décadade60e70,diversasfábricas de safona faliram.Desse período em diante, co-meçarama chegar nopaís san-fonas de produção chinesa,que, apesar de não serem degrande qualidade, servirampara facilitar a compra e po-pularizar o instrumento.

Para a sanfoneira Lívia Ma-tos, a sanfona vem se forta-lecendo, sobretudo entre asmulheres. "Acredito que cadavez mais estão aparecendosanfoneiras que estão mos-trando a coragem e serviçocom o instrumento".

Fernando Vivas / Ag. A TARDE