pagamento por serviÇos ecossistÊmicos em perspectiva comparada: recomendaÇÕes para tomada de...

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  • 7/21/2019 PAGAMENTO POR SERVIOS ECOSSISTMICOS EM PERSPECTIVA COMPARADA: RECOMENDAES PARA TOMADA D

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    PROJETO APOIO AOS DILOGOS SETORIAISUNIO EUROPEIA - BRASILAo Dilogo Brasil-Unio Europeia Sobre Pagamento por Servios Ecossistmicos

    PAGAMENTO PORSERVIOS ECOSSISTMICOSEM PERSPECTIVACOMPARADA:

    RECOMENDAES PARA TOMADA DE DECISO

    Agosto de 2012

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    PARCEIROS INSTITUCIONAIS RESPONSVEIS PELA AO:

    MINISTRIO DO MEIO AMBIENTE DO BRASIL

    IZABELLA TEIXEIRAMinistra

    FRANCISCO GAETANISecretrio-Executivo

    FRANCISCO J. B. DE OLIVEIRA FILHODiretor do Departamento de Polticas para o Combate ao Desmatamento

    JULIANA SIMES

    Gerente de Projeto do Departamento de Polticas para o Combate ao Desmatamento

    DIREO-GERAL DE MEIO AMBIENTE DA COMISSO EUROPEIA

    KARL FALKENBERGDiretor-Geral

    PIA BUCELLADiretora, Diretoria B: Natureza, Biodiversidade e Uso da Terra

    FRANOIS WAKENHUTChefe da Unidade de Biodiversidade

    LAURE LEDOUXOficial de Polticas Pblicas da Unidade de Biodiversidade

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    CONTATOSDireo Nacional do Projeto+ 55 61 2020.4906/4928/5082/[email protected]

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    FICHA TCNICA

    AUTORES:

    RUI FERREIRA DOS SANTOS, Professor Associado da Faculdade deCincias e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, Coordenadordo Grupo de Economia Ecolgica e Gesto do Ambiente do Centro deInvestigao em Ambiente e Sustentabilidade (CENSE).

    JORGE LUIZ VIVAN, Consultor e Bolsista de Ps-Doutorado

    associado ao Programa de Ps-graduao em Cincias Sociais emDesenvolvimento, Agricultura e Sociedade do Instituto de CinciasHumanas e Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

    COLABORADORES:

    THAS RIBAS, Pesquisadora do Grupo de Economia Ecolgica eGesto do Ambiente do Centro de Investigao em Ambiente eSustentabilidade (CENSE).

    PAULA ANTUNES, Professora Catedrtica da Faculdade de Cincias eTecnologia da Universidade Nova de Lisboa, Coordenadora do Centrode Investigao em Ambiente e Sustentabilidade (CENSE).

    PETER H. MAY, Coordenador do Componente 3 Biodiversidade,Recursos Naturais e Culturais da iniciativa do Instituto Nacionalde Cincia e Tecnologia em Polticas Pblicas, Estratgias eDesenvolvimento.

    ESPECIALISTAS CONSULTADOS:

    ALOSIO MELO, Coordenador Geral, Secretaria de Poltica Econmica,Ministrio da Fazenda.

    ARNALDO JARDIM, Deputado Federal, relator do Projeto de Lei n792/2007 sobre a criao de uma poltica nacional de pagamento porservios ambientais.

    CARLOS AUGUSTO KLINK, Secretrio de Mudanas Climticas eQualidade Ambiental, Ministrio do Meio Ambiente.

    DEVANIR GARCIA, Gerente do Programa Produtor de gua, Agncia

    Nacional de guas (ANA).

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    HELENA CARRASCOSA VON GLEHN, Coordenadora deBiodiversidade e Recursos Naturais, Secretaria do Meio Ambiente doEstado deSo Paulo.

    JAN BRNER, Pesquisador em Servios Ambientais, CentroInternacional para Pesquisa Florestal (CIFOR).

    JORGE MADEIRA, Pesquisador, Departamento de Economia,

    Universidade de Braslia (UnB).KATIA KAROUSAKIS, Economista, Diviso de Mudana Climtica,Biodiversidade e Desenvolvimento, Organizao para CooperaoEconmica e Desenvolvimento (OCDE).

    LAURE LEDOUX, Oficial de Polticas Pblicas, Unidade deBiodiversidade, Direo Geral de Meio Ambiente, Comisso Europeia.

    LUDIVINE ELOY COSTA PEREIRA, Pesquisadora, Centro deDesenvolvimento Sustentvel, Universidade de Braslia (UnB).

    LUS MENESES, Diretor de Programa, Global Canopy Programme.

    MARCO ANTNIO FUJIHARA, Conselheiro, Conselho Superior deMeio Ambiente, Federao das Indstrias do Estado de So Paulo(FIESP).

    MARYANNE GRIEG-GRAN, Economista, International Institute forEnvironment and Development (IIED).

    PAULO SINISGALLI, Pesquisador, Universidade de So Paulo (USP).

    RONALDO SEROA DA MOTA, Pesquisador, Instituto de PesquisaEconmica Aplicada (IPEA), Secretaria de Assuntos Estratgicos daPresidncia da Repblica.

    COORDENAO DO ESTUDO:

    Mauro Oliveira Pires (MMA), Francisco J. B. de Oliveira Filho e CarlaLeal (MMA).

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    EQUIPE TCNICA ENVOLVIDA NA CONCEPO E NOACOMPANHAMENTO DO ESTUDO:

    Ana Luza Champloni (MF), Antnio Tafuri (MMA), Gustavo dos Anjos(MMA), Jorge Hargrave (IPEA),Lvia Borges (MMA), Marcelo Aguiar(GIZ), Natalie Unterstell (MMA), Renato Rosenberg (MMA), SrgioCarvalho (MMA), Susan Seehusen (GIZ), Vandr Monteiro (MMA).

    REVISO:

    Carla Leal (MMA), Lvia Borges (MMA), Rafael Pereira (MMA) e RalphAlbuquerque (MMA).

    CITAO:

    SANTOS, Rui Ferreira; VIVAN, Jorge Luiz. Pagamento por ServiosEcossistmicos em perspectiva comparada: recomendaes paratomada de deciso. Braslia: Projeto Apoio aos Dilogos Setoriais UE-Brasil, 2012.

    As opinies emitidas nesta publicao so de exclusiva e inteiraresponsabilidade dos autores, no exprimindo, necessariamente,o ponto de vista do Governo Brasileiro e da Comisso Europeia. permitida a reproduo deste texto e dos dados nele contidos, desdeque citada a fonte. Reprodues para fins comerciais so proibidas.

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    SUMRIO

    APRESENTAO...................................................................................11

    INTRODUO ......................................................................................13

    CAPTULO 1LIES DE EXPERINCIAS INTERNACIONAIS DE PAGAMENTOPOR SERVIOS ECOSSISTMICOS ...................................................15Rui Ferreira dos Santos

    Introduo ...................................................................................16

    Base conceitual ...........................................................................16

    Experincias internacionais de PSE analisadas ..........................19

    Aspectos relevantes de contexto e desenho dosprogramas de PSE ......................................................................22

    Questes fundamentais ...................................................22

    Contexto ...........................................................................25

    Servios ambientais objetivos, valoraoe monitoramento ..............................................................31

    Atores envolvidos .............................................................41

    Financiamento ..................................................................47

    Desempenho dos programas de PSE ........................................52

    Eficcia ..............................................................................52

    Eficincia e custo-eficcia.................................................68

    Aspectos sociais: equidade e combate pobreza ...........79

    Consideraes finais ...................................................................86

    Referncias .................................................................................89

    CAPTULO 2PAGAMENTO POR SERVIOS ECOSSISTMICOSNO BRASIL EM PERSPECTIVA COMPARADAAOS CASOS INTERNACIONAIS ........................................................103Jorge Luiz Vivan

    Introduo .................................................................................104

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    Metodologia e estrutura de anlise ..........................................106

    Descrio dos casos brasileiros................................................110

    PSE-Carbono ...................................................................110

    Amaznia e Cerrado .............................................110

    Caatinga ................................................................117

    Mata Atlntica .......................................................120 PSE-gua ........................................................................126

    Certificao ...........................................................131

    Produtos Florestais e Agropecurios ...................131

    Indstrias de Cermica .........................................134

    Anlise comparada das experincias brasileiras

    e dos casos internacionais ........................................................138

    Contexto e desenho dos esquemas de PSE..................139

    Contexto institucional ...........................................139

    Servios ambientais objetivos, valorao

    e monitoramento .................................................139

    Atores envolvidos .................................................140

    Natureza jurdica do instrumento..........................143

    Fontes de Financiamento .....................................144

    Avaliao do desempenho .............................................145

    Eficcia ..................................................................145 Equidade e justia social.......................................146

    Consideraes finais .................................................................147

    Referncias ..............................................................................148

    CAPTULO 3

    REFLEXES E RECOMENDAES FINAIS PARA

    TOMADORES DE DECISO ..............................................................153

    Jorge Luiz Vivan

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    Introduo .................................................................................154

    O papel de uma estratgia nacional de PSE ............................154

    Modelos de PSE .......................................................................156

    Sistemas de gesto ..................................................................158

    Monitoramento .........................................................................159

    Mecanismos de financiamento................................................160

    Referncias ...............................................................................161

    ANEXOS .............................................................................................163 Anexo I - Listas de casos brasileiros

    de PSE analisados .....................................................................165

    Anexo II - Lista de siglas e acrnimos ......................................176

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    APRESENTAO

    Esta publicao consolida os trabalhos produzidos ao longo da primeiraetapa do Dilogo Brasil-Unio Europeia sobre Pagamento por ServiosEcossistmicos (PSE), realizada de outubro de 2011 a junho de 2012no contexto dos Dilogos Setoriais UE-Brasil sobre a DimensoAmbiental do Desenvolvimento Sustentvel. A Ao foi iniciada a partirda 4aconvocatria do Projeto Apoio aos Dilogos Setoriais UE-Brasile teve sua continuidade aprovada.

    A iniciativa foi coordenada em conjunto pelo Ministrio do MeioAmbiente do Brasil e pela Direo-Geral de Meio Ambiente daComisso Europeia e contou com vrios parceiros nacionais einternacionais. O objetivo foi contribuir para a construo de uma basede referncia para orientar a tomada de deciso sobre o uso de PSEcomo um instrumento de polticas pblicas ambientais no Brasil, bemcomo identificar possibilidades de cooperao com a Unio Europeianesse tema.

    Durante a primeira etapa do Dilogo sobre PSE, foram elaboradosdois estudos o primeiro contendo anlise de cinco experinciasinternacionais de PSE, com foco na UE e em pases com florestastropicais ou savanas, bem como lies, oportunidades e desafiospara as polticas pblicas no Brasil; e o segundo sistematizando oestado da arte de experincias de PSE no Pas comparadas aos casosinternacionais. Esses estudos serviram de referncia para debatesque ocorreram em uma oficina em Braslia, no dia 24 de abril de 2012,em que participaram cerca de 100 tcnicos, especialistas e dirigentesde diversas instituies nacionais e internacionais, dos quais 22 eram

    palestrantes ou debatedores.

    As reflexes e as recomendaes decorrentes dos debates na oficinaforam incorporadas a este livro, que, embora no tenha a ambiode esgotar o assunto, oferece a tcnicos, especialistas e dirigentesenvolvidos na formulao de polticas pblicas ambientais, algumasorientaes sobre o uso de PSE de maneira efetiva e complementara polticas j existentes, com foco na reduo da taxa de perda dabiodiversidade e das emisses de gases de efeito estufa provenientesde desmatamento e degradao florestal.

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    Finalmente, destacamos que esta obra o resultado da dedicaodos dois autores Rui Ferreira dos Santos e Jorge Luiz Vivan edas valiosas contribuies de diversos especialistas e tcnicos quegentilmente aceitaram nosso convite para participar do Dilogo Brasil-UE sobre PSE, enriquecendo as reflexes com diferentes pontosde vista. Agradecemos o entusiasmo e a colaborao de todos quefizeram parte desta iniciativa.

    Departamento de Polticas para o Combate ao DesmatamentoSecretaria ExecutivaMinistrio do Meio Ambiente do Brasil

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    INTRODUO

    O Pagamento por Servios Ecossistmicos (PSE1) tem ganhadorelevncia no mundo todo na ltima dcada, sendo apontado comoinstrumento promissor para a gesto ambiental em diferentes escalase complementar aos tradicionais mecanismos de comando e controle,revertendo benefcios diretos para pessoas ou instituies privadas egovernamentais que proveem esses servios.

    O Brasil abriga diferentes biomas cujos ecossistemas quandopreservados ou bem manejados geram servios em escalas locais,regionais, nacionais e internacionais. Esse cenrio traz especialrelevncia ao potencial de PSE como instrumento de conservaoambiental e desenvolvimento sustentvel. No Brasil, existemvrias iniciativas de PSE pulverizadas na forma de projetos-piloto,normalmente financiados por recursos governamentais, em diferentesbiomas.

    A Unio Europeia possui estratgias de carter supranacional,

    internalizadas por seus pases-membro, conforme suasespecificidades. O conhecimento dessa experincia, alm de outrasinternacionais, contribui para compreender melhor os problemas eas potencialidades de dar escala nacional a sistemas de PSE, um dosdesafios para o governo e a sociedade brasileiros.

    Com o intuito de contribuir para o debate sobre o tema, o presenteestudo encontra-se organizado em trs captulos, conforme descrito aseguir:

    Captulo 1 contm anlise e lies aprendidas de

    experincias internacionais relacionadas PSE na Unio Europeia(particularmente na Finlndia e em Portugal), na Costa Rica, emMoambique e na China;

    1 - O termo Pagamento por Servios Ecossistmicos (PSE) ser utilizado como sinnimo de Pagamento porServios Ambientais (PSA) nesta publicao. Embora haja diferenas conceituais na literatura, as duas expressesso utilizadas comumente para designar uma transao voluntria na qual um servio ecossistmico (ou ambiental)bem definido ou uma forma de uso da terra que possa assegurar esse servio comprado por pelo menos umcomprador, de pelo menos um provedor, sob a condio de que o provedor garanta a proviso desse servio. NaUnio Europeia, o termo mais usado Pagamento por Servios Ecossistmicos, enquanto no Brasil e na Amrica

    Latina utiliza-se com mais frequncia Pagamento por Servios Ambientais.

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    Captulo 2 apresenta categorias de casos de PSE emdiferentes biomas brasileiros e uma anlise comparada dasexperincias nacionais e internacionais levantadas neste estudo;

    Captulo 3 traz reflexes e recomendaes finais para aformulao de uma estratgia brasileira de PSE, com base nosresultados do estudo e nas contribuies dos debates realizados naOficina do Dilogo Brasil-Unio Europeia sobre PSE, ocorrida emabril de 2012.

    As concluses apontam que PSE no deve ser consideradocomo a nica soluo para polticas de conservao ambiental edesenvolvimento sustentvel, nem mesmo utilizado como substitutode instrumentos de comando e controle existentes e adequados,mas apenas no devidamente executados ou cumpridos. Por outrolado, o estudo ressalta o papel importante do PSE como parte de umacombinao de polticas pblicas em vrias escalas e o potencial dessemecanismo para criar e desenvolver mercados para alguns serviosecossistmicos e promover a participao voluntria de fornecedores

    ou compradores desses servios.

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    CAPTULO 1

    LIES DE EXPERINCIAS

    INTERNACIONAIS DE PAGAMENTOPOR SERVIOS ECOSSISTMICOSRui Ferreira dos Santos

    PAGAMENTO POR SERVIOS ECOSSISTMICOS EM PERSPECTIVA COMPARADA 15

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    INTRODUO

    Este captulo analisa oportunidades e desafios para polticas pblicas noBrasil, tendo como subsdios cinco experincias internacionais sobre ouso de Pagamento por Servios Ecossistmicos (PSE) selecionadas nocontexto do Dilogo Brasil-Unio Europeia sobre PSE, quais sejam:

    Finlndia: METSO Forest Biodiversity Program for SouthernFinland;

    Unio Europeia (foco em Portugal): Medidas Agroambientais;

    Costa Rica: PPSA Programa de Pagos por ServiciosAmbientales;

    Moambique: SOFALA The SOFALA Community Carbon Project;

    China: Grain for Green Slope Land Conversion Program (SLCP).

    Por limitao de tempo e recursos disponveis, foram escolhidasessas cinco experincias internacionais de PSE, sendo duas delas

    europeias. No desenvolvimento deste trabalho, optou-se por adicionarcontribuies relevantes apresentadas na literatura para facilitar aanlise das experincias em questo.

    BASE CONCEITUAL

    Os programas de PSE tm um papel potencialmente importante napoltica de conservao da biodiversidade. Vrias experincias tmdemonstrado que possvel criar e desenvolver mercados para alguns

    servios dos ecossistemas e promover a participao voluntria defornecedores ou compradores desses servios. Mas a literaturaexistente tambm torna claro que o conceito de PSE pode ser muitoamplo, sendo classificados como experincias de PSE instrumentoscom caractersticas diversas, em alguns casos bem diferentes dadefinio dada por Wunder (2007). Isso torna o conceito difcil de serutilizado em um contexto de desenvolvimento de polticas. A suaconcretizao, no entanto, pode ser realizada por meio de diferentesiniciativas de poltica, com diferentes graus de envolvimento dosetor privado, com maior ou menor dependncia do financiamento

    pblico e integrao com outras polticas setoriais, dependendo muito

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    do contexto de aplicao e dos objetivos especficos da poltica deconservao.

    De fato, de acordo com Wunder (2007), os PSEs contemplavamsituaes envolvendo contratos voluntrios entre pelo menos umfornecedor e um consumidor/beneficirio de servios ambientais,com sistemas de pagamento direto2. Essa definio enquadra-se nalgica econmica de promoo da eficincia, tal como apresentadano Teorema de Coase, que diz que, se os direitos de propriedade

    estiverem bem definidos e os custos de transao forem nulos,a livre negociao entre as partes permite atingir o resultadoeconomicamente eficiente. Contudo, existem mecanismos decompensao dos fornecedores de servios ambientais que aparecemintegrados em outras polticas pblicas em curso e em diversasescalas, como REDD, REDD+3e Medidas Agroambientais da PolticaAgrcola Comum (PAC) da Unio Europeia (UE), ou associados aprojetos demonstrativos ou experincias municipais/regionais, em querequisitos como o carter de voluntariedade da deciso do fornecedor/

    consumidor ou a existncia de um pagamento direto entre essesatores no se verificam. Se um proprietrio receber um pagamentodo Estado para melhorar a proviso de um servio ambiental, oscontribuintes ou utilizadores de um dado servio podem estar pagandosem o fazerem de uma forma voluntria. Por essa razo, Muradian etal. (2010) propem uma definio alternativa de PSE:

    PES is a transfer of resources between groups to create incentives to alignindividual and/or collective land use decisions with the social interest in themanagement of natural resources (p. 1205)

    Essa definio descreve melhor a enorme variedade de programas2 - A definio formal de PSE dada por Wunder (2007) : A PES scheme, simply stated, is a voluntary, conditional

    agreement between at least one seller and one buyer over a well defined environmental service or a land usepresumed to produce that service. A International Union for Conservation of Nature (IUCN) tambm adota umadefinio muito semelhante: PES is a voluntary transaction whereby a well-defined ecosystem service, or a land-use likely to secure that service, is being bought by at least one buyer from at least one provider if, and only if, the

    provider secures the provision of the service.

    3 - O conceito de REDD (Reduo de Emisses por Desmatamento e Degradao Florestal)surgiu na Confernciadas Partes (COP) da Conveno-Quadro das Naes Unidas sobre Mudana do Clima (UNFCC), em 2003, comoum mecanismo de reduo compensada das emisses de carbono na atmosfera. Nas conferncias seguintes, oconceito foi ampliado para REDD+, que alm das redues por desmatamento e degradao, passou a abrangera tarefa da conservao florestal, do manejo sustentvel e do aumento dos estoques de carbono. Para mais

    informaes sobre aes de REDD+ no Brasil, consulte: http://www.florestal.gov.br/redd.

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    de PSE existentes. De acordo com essa abordagem, podem serconsiderados esquemas de PSE tanto iniciativas em que as motivaesculturais e sociais so mais importantes que o incentivo econmicopara influenciar as decises sobre o uso do solo, quanto situaesem que os proprietrios recebem um pagamento indireto por meiode investimentos em bens pblicos, como sade e educao, queconstituem um incentivo sem ter de existir um pagamento diretoe individual. Nesses casos, deixa de ser exigvel a medio direta

    dos resultados em termos de proviso dos servios, bastando oestabelecimento de um conjunto de hipteses acerca da relao entreos usos do solo e essa proviso.

    No presente captulo, so identificados e discutidos aspectosrelevantes sobre oportunidades e desafios para as polticas pblicasno Brasil sobre pagamento por servios ecossistmicos, adotando-se essa perspectiva mais abrangente de PSE. Na primeira seo,so abordadas algumas caractersticas das cinco experinciasinternacionais que tornam a sua anlise particularmente interessante.

    O restante do captulo est organizado por tpicos que correspondemaos seguintes aspectos:

    A. Contexto e desenho dos programas de PSE:

    Questes fundamentais;

    Contexto;

    Servios ambientais objetivos, valorao e monitoramento;

    Atores envolvidos;

    Financiamento.

    B. Resultados/avaliao do desempenho:

    Eficcia;

    Eficincia/custo-eficcia;

    Aspectos sociais: equidade e combate pobreza.

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    EXPERINCIAS INTERNACIONAIS DE PSE ANALISADAS

    As cinco experincias internacionais referidas foram selecionadasde acordo com um conjunto de critrios que visavam garantira representatividade espacial, incluindo diferentes contextoseconmicos, sociais, culturais e polticos, bem como um foco emdiferentes tipos de servios ambientais ou ecossistmicos, comaplicao em diferentes escalas (desde projetos de natureza localou regional, at outros de mbito nacional ou supranacional), e que

    tivessem um potencial interesse para o desenvolvimento de polticaspblicas nessa rea no Brasil.

    Para dar cumprimento a esses objetivos, o Ministrio do MeioAmbiente (MMA), como responsvel pela coordenao do estudo,participou da escolha das cinco experincias a serem analisadas, apartir de uma amostra inicial de treze casos, de modo a assegurar queno estava omissa qualquer experincia que fosse particularmenterelevante, permitindo ainda incorporar uma indicao sobre os casosconsiderados prioritrios para a partilha de experincias e para fornecer

    subsdios s polticas pblicas brasileiras. Resultou desse processo aescolha de dois casos europeus (METSO-Finlndia e Agroambientais-UE), um caso africano (SOFALA-Moambique), um caso da AmricaLatina (PPSA-Costa Rica) e um caso asitico (Grain for Green-China),garantindo o objetivo de representarem diferentes contextos sociais,econmicos, culturais e polticos.

    Os casos incluem uma experincia supranacional (MedidasAgroambientais-UE), uma experincia nacional (PPSA-Costa Rica), duasexperincias com incidncia focada em uma escala regional (METSO,

    florestas da regio sul da Finlndia incluindo a zona oeste da provnciade Oulu e o sudoeste da Lapnia; e Grain for Green-China, com focoprincipal nas bacias hidrogrficas dos rios Yangtze e Amarelo), e umaexperincia em escala local (SOFALA, comunidades florestais da regiocentral de Moambique). Os casos selecionados contemplam diversostipos de servios ambientais ou ecossistmicos, incluindo serviosindividuais, em pacote, ou com ambas as vertentes.

    Alguns dos instrumentos podem ser classificados em uma categoriahabitualmente designada de PES-like, uma vez que no tm as

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    caractersticas puras de um PSE. o caso, por exemplo, do METSOque prev quatorze medidas de ao e, de certa forma, pode serentendido como uma agregao de instrumentos para a conservao.As diferenas para um PSE puro so igualmente evidentes nasMedidas Agroambientais da UE ou no caso chins, que constituempolticas de subsdio que se baseiam exclusivamente no financiamentopblico, mas tm um elevado potencial para se reorientarem eintegrarem uma poltica de promoo da proviso de servios dos

    ecossistemas. Dada a natureza e diversidade dos objetivos a serematingidos na poltica de conservao da biodiversidade, bem como adificuldade de garantir o financiamento dos programas exclusivamentepor meio do mercado, a discusso de casos que no configuram umPSE puro traz vantagens na medida em que exige que se considerea concepo e a aplicao de pacotes de instrumentos (policymixes)flexveis e articulados, que garantam o cumprimento de uma funoadequada a cada um dos instrumentos.

    Outras caractersticas peculiares das experincias selecionadas so

    descritas a seguir, considerando a relevncia para o contexto brasileiro: METSO (Finlndia): dirige-se a uma regio onde a maioriadas florestas se encontra distribuda em pequenas propriedadesprivadas, sendo a rede de reas protegidas insuficiente para garantir aconservao de todas as espcies locais. Essa caracterstica remete situao de diversos biomas brasileiros, com exceo da Amaznia.Um aspecto marcante na aplicao do instrumento , ainda, o uso deconhecimento cientfico para a seleo das reas prioritrias.

    Medidas Agroambientais (UE): trata-se de um instrumento

    supranacional inserido na Poltica Agrcola Comum (PAC) da UE, comflexibilidade de aplicao em mbito nacional e com um impactopotencialmente elevado na conservao da biodiversidade e naproviso de servios ambientais devido escala em que se concretizae aos recursos financeiros disponveis. Embora o aumento da provisode servios ambientais no esteja entre os principais objetivos atuaisdo programa no mbito da UE, como as medidas so concebidas emescala nacional e podem ser adaptadas a objetivos especficos decada pas, muitos dos programas nacionais incluem nas suas metasa manuteno ou o aumento da proviso desses servios. Em uma

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    futura reviso do programa, h um elevado potencial de melhoriado foco da PAC, no sentido de assegurar a proviso de serviosecossistmicos.

    PPSA (Costa Rica): instrumento que assume o pagamentodireto a proprietrios em escala nacional e que contempla trstipos de modalidades de uso da terra (conservao de florestas,reflorestamento e agrofloresta). Alm disso, considera quatro tiposde servios ambientais e a compensao tanto dirigida a servios

    individuais como a servios em pacote. A criao do Fondo Nacionalde Financiamiento Florestal(FONAFIFO) como plataforma dedicada gesto do programa PPSA igualmente relevante. Por ltimo, umcaso da Amrica Latina, uma regio onde a experincia de PSE muitorelevante, e que tem um interesse particular para o Brasil.

    SOFALA (Moambique): o projeto tem como principal objetivoa proviso do servio de regulao do clima, mas utiliza o conceito dePSE para financiar alteraes no uso da terra, associando ao objetivocentral o combate pobreza e a conservao da biodiversidade. O

    principal ecossistema abrangido pelo projeto a floresta do Miombo,que tambm corresponde maior parte da cobertura vegetalde Moambique, mas abrange ainda outros tipos de vegetao,principalmente as savanas. Possui ainda como caracterstica relevanteter sido desenvolvido por entidades externas, como a EnvirotradeLimitada. O fato de o projeto se desenvolver a uma pequena escalaespacial, com baixa abrangncia e incluindo aes pontuais, foi umfator negativo ponderado na deciso, mas ainda assim no suficientepara a sua eliminao da amostra final.

    Grain for Green(China): um dos maiores esquemas de PSEdo mundo em termos de recursos financeiros, com forte suporte dogoverno chins. considerado um PSE excepcional, devido ambiodos seus objetivos biofsicos e socioeconmicos em uma larga escalade ao e ao nmero de atores envolvidos. Tem como populao-alvomilhes de pequenos proprietrios de terras propensas eroso e combaixa aptido agrcola, que so incentivados a converterem as suaspropriedades em florestas e pradarias. Esta medida um caso distintoda realidade brasileira, em que geralmente as reas relevantes para aconservao correspondem a terras com potencial agropecurio, onde

    se pretende incentivar a converso de uso.

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    ASPECTOS RELEVANTES DE CONTEXTO E DESENHO DOSPROGRAMAS DE PSE

    QUESTES FUNDAMENTAIS

    A concepo de qualquer instrumento econmico de conservao dabiodiversidade deve ser baseada no conhecimento prvio da naturezae da magnitude da(s) falha(s) de mercado que impedem que se

    atinjam os objetivos pretendidos, ou seja, das causas que impedemo alinhamento dos interesses individuais dos atores envolvidos comos interesses da sociedade. Esse conhecimento particularmenterelevante no caso dos PSEs, na medida em que for entendido comoum instrumento de mercado (Porras et al., 2011). De fato, as causasdos problemas podem ser muito diversas, incluindo indefinies nosdireitos de propriedade sobre o solo, a incapacidade para gerir e fazercumprir as decises sobre o uso do solo, falhas de informao acercade potenciais ganhos privados que decorreriam de uma melhoria nagesto, ou problemas no funcionamento dos mercados de capitais

    que impedem os agricultores ou proprietrios de adotar tecnologiasou prticas que seriam rentveis do ponto de vista privado e quemelhorariam a proviso de servios dos ecossistemas.

    Se o conhecimento das condicionantes econmicas fundamental,o mesmo se aplica s dimenses ecolgica e social. Nas fases deconcepo e implementao de programas de PSE normal existiremsituaes de informao incompleta, obrigando as decises a seremtomadas com um elevado grau de incerteza acerca da proviso deservios ambientais (Muradian et al., 2010). Por essa razo, diversos

    autores recomendam que se proceda a uma fase de coleta de dadosintensiva antes de se implementar um programa (Asquith et al., 2008),sendo particularmente relevante a contribuio do conhecimentocientfico existente, designadamente para a seleo de reasprioritrias, como se verificou no METSO.

    Contudo, no existe consenso sobre as exigncias de informaopara o incio de um programa. Diversas experincias consideraramque uma estrutura de PSE pode ser melhor aprendida, e a coleta dedados facilitada, se for adotada uma estratgia de gesto adaptativa ede se aprender fazendo (learning by doing). Foi o que aconteceu com a

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    Fundacin Natura(Bolvia) ou em outros esquemas de grande dimensocomo o Programa Nacional de PSE no Mxico, onde o mecanismofoi iniciado sem que estivesse concludo um estudo aprofundado. Aestratgia de tentar aprender algumas lies quando o programa j estem andamento, em vez de aprofundar o conhecimento previamente,tem a vantagem de promover rapidamente a ao, embora aumente osriscos de insucesso.

    A literatura sobre PSE chama a ateno para um conjunto de questes

    de natureza diversa que devem ser colocadas na fase de concepode um programa de PSE, de modo a garantir o seu sucesso face complexidade que lhe est subjacente. A ttulo de exemplo, destacam-se algumas questes:

    Quais os objetivos ambientais do programa? Quais os serviosambientais em que se pretende focar (servio-alvo)? Existem sinergiasou conflitos potenciais entre esses objetivos? Pretende-se associaroutros objetivos socioeconmicos aos servios ambientais?

    Que conhecimento existe sobre os sistemas ecolgico esocioeconmico?

    So conhecidas as causas para no se atingirem os objetivospretendidos, incluindo as designadas falhas de mercado, mas tambmoutras causas no econmicas, como culturais e institucionais?

    J existe legislao ou instrumento dirigido a esses objetivos?De que tipo e desde quando? Qual o seu papel funcional na poltica deconservao? So aplicados e cumpridos? Qual o seu desempenho?

    Qual o mbito espacial que se pretende adotar para o programa?Qual a dimenso adequada para evitar problemas na sua gesto(Fisher et al., 2010)?

    Os proprietrios ou agricultores reconhecem que osecossistemas esto mal geridos? Tm a noo de que muitos dosbenefcios de um adequado uso do solo so externalidades positivase que a mera garantia de direitos de propriedade e o aumento daconscientizao ambiental, ou outros instrumentos existentes, no sosuficientes para tornar a conservao como uma opo atrativa de usodo solo (Engel et al., 2008; Palmer and Engel, 2007)?

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    Os utilizadores ou beneficirios dos servios so fceisde serem identificados e envolvidos no esquema? Os potenciaiscompradores dos servios esto perto dos fornecedores, reconhecemos benefcios e tm disposio e capacidade para pagar?

    Qual a capacidade de gerar financiamento por meio dosmercados? A dependncia de financiamento pblico ser grande? Casoseja necessrio, qual a capacidade de financiamento pblico?

    Est garantida a existncia de capacidade e autoridade paratomar decises sobre o uso da terra? Existem direitos de propriedade,legais ou de fato, que permitem garantir o cumprimento de condiesde uso do solo durante a vigncia do contrato (Porras et al., 2011)?

    Est garantida a transparncia na contratao da proviso dosservios? As regras foram discutidas com as partes interessadas e aaceitao social est assegurada (Fisher et al., 2010)?

    Como se valoram e se monitoram os servios ambientais? Qualo horizonte temporal a ser considerado na valorao dos benefcios?

    possvel obter a informao necessria? H conhecimento cientficosuficiente? O monitoramento exige muitos recursos? prefervelbasear o monitoramento nos servios ambientais propriamente ditosou nos usos do solo e prticas que garantem a sua proviso potencial?

    As entidades que gerem o programa de PSE tm capacidadeinstitucional para implementar um monitoramento efetivo e paratransmitir os resultados a todas as partes interessadas (incluindo osdecisores polticos) de modo a mobilizarem vontades e demonstrarema eficcia do programa (Fisher et al., 2010)?

    Os custos de transao esperados para os diversos atoresenvolvidos so baixos ou gerenciveis, quando comparados comos custos de outras opes? Qual a magnitude dos custos deoportunidade e dos custos de gesto?

    possvel controlar os comportamentos de free riding? Aexternalidade suficientemente grande para gerar um incentivo demudana de comportamentos e prticas no gestor da terra?

    Existe capacidade para enfrentar as barreiras adoo de

    usos da terra e prticas que permitem gerar a proviso de servios

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    ambientais, incluindo a falta de crdito, a indefinio na posse da terraou o conhecimento insuficiente (Pagiola et al., 2007)?

    Muitas outras questes poderiam ser colocadas. De fato, a concepoe a aplicao de um programa de PSE exige a considerao demltiplos aspectos. No sendo possvel fazer uma discusso exaustivade todos os aspectos relevantes, a seguir so apresentados algunstpicos, de contexto ou de funcionamento dos instrumentos,que decorrem da literatura e das experincias analisadas, e so

    considerados contribuies relevantes para a reflexo que se pretendefazer.

    CONTEXTO

    A concepo e a aplicao com sucesso de um programa de PSErevestem-se de uma significativa complexidade, sendo fundamentaldar ateno ao contexto em que se desenvolvem. Os mecanismos dePSE no podem ser desenvolvidos em um vcuo e no constituemuma soluo adequada a qualquer circunstncia (Echavarria et al., 2003;Engel et al., 2008).

    Assim, fundamental analisar os programas de PSE no contextoda poltica de conservao nacional e internacional, bem como asua integrao (existente ou potencial) com outros instrumentos deconservao, mitigao de efeitos da ao humana sobre o climaou desenvolvimento sustentvel em implementao ou em fasede concepo, tais como aqueles ligados a estratgias de REDD,Objetivos de Desenvolvimento do Milnio (ODM), mitigao de Gasesde Efeito Estufa (GEE) e agricultura de baixo carbono.

    Nas experincias internacionais analisadas, o contexto ambiental,socioeconmico, cultural e institucional muito diverso, concluindo-se que o estabelecimento de PSEs pode ter um papel relevante naspolticas de conservao, sendo particularmente importante analisar asua contribuio no mbito daspolicymixesexistentes.

    Na Finlndia, o governo decidiu criar um plano de ao especficopara diminuir a perda da biodiversidade florestal na regio sul do pas,considerada a mais representativa, onde, contraditoriamente, as reas

    protegidas so escassas (representam apenas 2%). O programa

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    METSO foi concebido para complementar o Programa Nacionalde Florestas 2010, iniciado em 1999, o qual contm as principaisdiretrizes para a poltica florestal da Finlndia (Finish Government,2002).O METSO tambm parte integrante da implementao devrios acordos internacionais na Finlndia, incluindo a Convenoda Diversidade Biolgica (CDB), o Frum das Naes Unidas sobreas Florestas (UNFF) e as Conferncias Ministeriais para a Proteodas Florestas na Europa (MCPFE) (Ministry of Agriculture and Forestry

    and Ministry of the Environment, 2008). Outro fator que desencadeoua criao do METSO foi a dificuldade de implementar a rede Natura2000 no pas, devido necessidade de estabelecer reas protegidasem propriedades privadas, o que gerou forte oposio, principalmenteno sudoeste do pas (Paloniemi & Vilja, 2009). O METSO proporcionaa oportunidade de compensao dos proprietrios de terra (contratosvoluntrios) para que a Finlndia possa cumprir o seu compromissoperante a UE.

    Como a maioria das florestas da regio sul da Finlndia esto

    distribudas por pequenas propriedades privadas (Mayer et al., 2006),o METSO segue uma tendncia global de estender as polticas deconservao ambiental para reas privadas, complementando assim osesforos em reas pblicas. O programa representa uma importantemudana e complemento da tradicional poltica de comando e controle,evoluindo da criao de reas protegidas para aes de conservaovoluntrias, incentivadas por compensaes financeiras.

    Dessa forma, na Finlndia concretiza-se uma combinao de polticas(policymix) em que diversos tipos de instrumentos so aplicadossimultaneamente de uma forma estruturada, sendo um bom exemplodo papel que um sistema de compensaes financeiras voluntriaspode ter nesse mbito. Destaca-se, ademais, o foco do programa empequenas propriedades privadas, demonstrando que um sistema dePSE no tem que se focar apenas em grandes propriedades.

    As Medidas Agroambientais na UE operam em um contextocompletamente diferente. A modernizao da agricultura na Europaocorreu no perodo ps-guerra, quando os pases-membro comearama adotar polticas de incentivo intensificao agrcola e mudana nosmeios de produo, com o intuito de garantir a produo de alimentos

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    para as populaes. As medidas adotadas foram efetivas do pontode vista social e econmico, mas resultaram, em alguns casos, emelevado custo ambiental (Dobbs & Pretty, 2004). Alm do declnio deespcies e habitats, a modernizao da agricultura europeia tambmproduziu impactos negativos na proviso de bens e servios ambientais(Berger et al., 2006; Garrod, 2009).

    Por meio do incentivo econmico para a modernizao da agricultura, aPAC desempenhou um papel importante nas transformaes referidas

    (Dobbs & Pretty, 2004). No entanto, o posterior reconhecimento dediversos problemas causados pela agricultura moderna conduziu introduo de medidas agroambientais no mbito da prpria PAC,com o objetivo de reduzir a perda da biodiversidade e mitigar outrosimpactos ambientais negativos da agricultura (Concepcin et al., 2008).

    Atualmente, as Medidas Agroambientais encontram-se inseridas nosProgramas de Desenvolvimento Rural de cada Estado-membro daUE. Por exemplo, a maioria das medidas implementadas em Portugalcontinental tem sido focadas na extensificao ou na manuteno

    dos sistemas agrcolas tradicionais extensivos, procurando incentivarprticas compatveis com a conservao do ambiente e aliviartendncias sociais e demogrficas que ameaam o meio rural (Patricioet al., 2008).

    As Medidas Agroambientais da UE so um exemplo de uminstrumento voluntrio de PSE que se justifica em um contextoparticular e se integra em uma poltica setorial (nesse caso, a PolticaAgrcola Comum), mostrando uma vez mais, o potencial de definiode um papel especfico e complementar dos PSEs como parte de

    policymixes. Trata-se de um caso em que parece existir um elevadopotencial de melhoria, na medida em que a proviso de serviosambientais no constitui um foco do programa atualmente.

    O Programa de Pagos por Servicios Ambientais (PPSA) da Costa Ricafoi criado com o objetivo de promover a recuperao e a manutenoda cobertura vegetal nacional. O pas j possua nessa altura uma slidaexperincia com sistemas de incentivos, bem como instituies para asua administrao, para atividades de reflorestamento e conservaode floresta, os quais foram criados, primariamente, devido preocupao em garantir a sustentabilidade da explorao da madeira.

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    Essa experincia foi importante para o rpido desenvolvimento doprograma, criando condies mais favorveis concepo e aplicaode um programa de PSE de mbito nacional e de maior complexidade.

    Em 1996, a nova Lei das Florestas (Lei n. 7575) estabeleceu as basespara o PPSA condensando os incentivos econmicos florestais emuma nica poltica nacional (World Bank, 2000), trazendo importantesinovaes, pois: 1) reconhecia os servios ambientais provisionadospor florestas; 2) vinculava os pagamentos aos servios ambientais e

    no mais produo madeireira; e 3) estabelecia a contribuio fiscaldos beneficirios como fonte de financiamento adicional ao oramentogovernamental (Pagiola, 2008).

    A mesma lei que criou o programa, a Lei das Florestas de 1996,tambm estabeleceu a proibio legal da mudana no uso da terrasem autorizao do governo, colocando um fim na prtica de ocupaode terras previamente incentivada pela poltica de colonizao. Maisuma vez, a complementaridade entre instrumentos voluntrios decompensao e instrumentos de comando e controle revelou-se

    fundamental.

    Em Moambique, a rea do Parque Nacional da Gorongosa comeoua ser considerada uma reserva ecolgica em 1921, mas foi apenasem 1960 que o governo colonial de Moambique lhe concedeu oestatuto de Parque Nacional (Parque Nacional da Gorongosa, 2007).Atualmente, o Parque da Gorongosa abriga a maior biodiversidade deMoambique e reconhecido internacionalmente devido sua riquezae abundncia de espcies.

    A regio da Gorongosa foi palco de diversos conflitos durante os quinzeanos de guerra civil que se seguiram independncia do pas em1975, o que prejudicou drasticamente a agricultura e as infraestruturaslocais e expulsou boa parte da populao da regio. Durante esseperodo, o Parque foi invadido e a sua biodiversidade ameaada pelacaa descontrolada, pela explorao ilegal da madeira e por incndiosque impediam a regenerao da floresta. Em 1992, aps o trminoda guerra civil, a administrao do Parque tomou providncias pararetirar as pessoas da rea protegida e delimitou, na regio de influnciado Parque, uma zona de segurana para atividades econmicas e de

    desenvolvimento que deveria amenizar a presso sobre os recursos

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    naturais do Parque (buffer zone) (Plan Vivo & Envirotrade, n.d.).

    Atualmente, cerca de 10 mil pessoas vivem no Parque Nacionalda Gorongosa e na sua zona de segurana, e o grande desafio daadministrao do Parque tentar compatibilizar as prioridades deconservao com as necessidades das comunidades locais. Oprojeto SOFALA foi criado nesse contexto, com o intuito de ajudar areconstruir a economia local promovendo a agricultura e a seguranaalimentar de uma forma que respeite o ambiente (Envirotrade, 2010).

    O projeto SOFALA destina-se a reduzir a pobreza, promover odesenvolvimento sustentvel e a conservao da biodiversidade,ao mesmo tempo em que contribui para a poltica de combate aoaquecimento global. A ideia central do projeto gerar Verified EmissionReduction4(VER) por meio da gesto de sistemas agroflorestais eda Reduo das Emisses por Desmatamento e da DegradaoFlorestal (REDD). Sendo assim, as comunidades locais promovema conservao, a plantao e o crescimento de rvores, que seroparcialmente financiadas com o rendimento proveniente da venda de

    crditos de carbono para compradores voluntrios. O programa operapor meio do sistema Plan Vivo, desenvolvido pelo Edinburgh Centre forCarbon Management (ECCM).

    O mecanismo de PSE aparece assim associado a instrumentos dezoneamento e ao mecanismo REDD, com o objetivo de inverter umatendncia de degradao ambiental e de pobreza verificada em nvellocal, e foca-se em pequenos proprietrios. Tem ainda a caractersticainteressante de ter sido uma entidade externa (Envirotrade) aimpulsionar o incio do programa.

    Do ponto de vista da implementao, igualmente interessante o fatode o projeto ter sido desenvolvido em trs fases: Fase de Teste (2002-2003), Fase Piloto (2003-2008) e Fase Operacional (2008-2013). Emum contexto em que no h experincia anterior dos diversos atorescom o funcionamento de mecanismos de mercado, nem instituiespreparadas para a gesto do programa, fundamental proceder a umaimplementao progressiva, com um calendrio de execuo que sejarealizvel e que no comprometa os objetivos pretendidos, e com um

    4 - O termo Verified Emission Reduction(reduo verificada de emisses) refere-se a crditos de emisso gerados

    fora dos mecanismos do Protocolo de Quioto e que, portanto, se destinam apenas aos mercados voluntrios.

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    grande envolvimento de todas as partes interessadas.

    O governo chins, alarmado com a seca histrica de 1997 e as cheiasdevastadoras de 1998 na bacia do Rio Yangtze e de outros rios,iniciou uma srie de projetos de silvicultura e conservao ambiental.Esses projetos visavam reduo da eroso do solo, a melhoria dacapacidade de reteno de gua e a proteo dos ecossistemas dooeste do pas. Dessa forma, pretendia-se contribuir para o controle decheias, melhoria da eficincia da produo hidroeltrica e impulso do

    ecoturismo, bem como a mudana da estrutura econmica das reasmontanhosas para aumentar a renda das famlias e, simultaneamente,promover o uso sustentvel da terra (Li et al., 2011).

    Esses programas incluam o estabelecimento de novas reasprotegidas e o alargamento das j existentes, bem como doisprogramas de PSE: o Programa de Conservao de FlorestasNaturais (Natural Forest Conservation Program NFCP) e o Programade Converso de Terras em Zonas de Declive (Sloping LandConversion Program SLCP) (Li et al., 2011). Este ltimo difere

    dos demais projetos nacionais de conservao ambiental por sero mais ambicioso esquema de PSE do pas e um dos maiores domundo. Ao contrrio da maioria dos programas de conservaochineses, que so implementados por meio de empresas estatais ouautoridades florestais locais, o SLCP envolve diretamente milhesde famlias rurais como agentes centrais de sua concretizao e,para isso, conta com um esquema de pagamento pblico (SFA, 2003in: Bennett, 2008).

    Salienta-se a extraordinria dimenso do programa e a sua integrao

    em um pacote mais alargado de instrumentos que inclui mecanismosde comando e controle (zoneamento, reas protegidas) e outrosmecanismos de PSE (NFCP). Cabe ainda realar o foco em terrenosdeclivosos de baixa produtividade, o que facilita a adeso dosproprietrios e agricultores, ao contrrio do que acontece em muitosprogramas de PSE em que existe um elevado custo de oportunidadeassociado, porque as reas prioritrias para a conservao soigualmente muito produtivas.

    As experincias internacionais analisadas confirmam assim que os

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    PSEs tm uma vocao particular para complementar legislaoexistente sobre a utilizao e a conservao de ecossistemas.Em qualquer circunstncia, importante que o foco do programaesteja bem definido, sendo claro o papel funcional do instrumentono contexto da poltica ambiental e a sua articulao com os outrosinstrumentos existentes ou a criar.

    A interao entre os PSEs e outros instrumentos mostra-nos que, naconcepo de combinaes de polticas articuladas, podem subsistir

    mecanismos que visam a penalizao ou limitao de comportamentosinadequados (lgica da punio stick) com mecanismos queincentivam positivamente comportamentos e prticas adequadas(lgica da recompensa carrot). Os mecanismos de PSE podemalavancar e potencializar os resultados garantindo adicionalidade. Porvezes, os esquemas de PSE aparecem para substituir instrumentos decomando e controle que no so cumpridos, o que no correspondea uma situao desejvel. Se fosse garantido o cumprimento prvioe em grau razovel dessa legislao, isso iria baixar os custos de

    oportunidade associados ao programa de PSE (Wunder e Albn,2008). Realizar pagamentos para garantir o cumprimento da lei podegerar incentivos perversos quando existe uma parte significativa deproprietrios que j cumprem e que decidem passar a no cumprir demodo a receberem um pagamento.

    A concepo dos PSEs visa geralmente contribuir para mitigar oueliminar prticas inadequadas que resultam de contextos sociais,econmicos e culturais particulares e de polticas de crescimentoanteriores, como exemplo, crescimento da produo agrcola ecolonizao de terras. Embora, em tese, os PSEs privilegiem umaabordagem voluntria e a negociao entre as partes na ausnciade legislao (Porras et al., 2011), verifica-se que nem sempre osmecanismos reais cumprem essas caractersticas.

    SERVIOS AMBIENTAIS OBJETIVOS, VALORAO E MONITORAMENTO

    Os programas de PSE descritos e analisados na literatura apresentamdiferenas significativas no nmero e tipo de servios ambientaiscontemplados, por exemplo, servios em pacote integrado vs.

    servios individuais. Alguns programas deliberadamente optaram

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    por considerar mais do que um servio ambiental para ultrapassarobstculos de financiamento. Asquith et al. (2008) citam o caso daFundacin Natura (Bolvia), que escolheu desenvolver um esquemadual (biodiversidade e proteo de bacia hidrogrfica), de forma agarantir um financiamento inicial de pagamentos para a biodiversidade que cobriram os custos de incio da implementao e de transao,pouco duradouros e complementarmente a contribuio dosutilizadores de servios da gua que garante um fluxo de

    financiamento a mais longo prazo. Contudo, esquemas com diversosservios pagos por diferentes utilizadores/compradores podem ter umelevado potencial de free-riding.

    Em muitos casos, o foco dos programas no est diretamenteassociado aos servios (output-based), mas antes aos usos do soloe prticas agrcolas e florestais (input-based), que consubstanciam ocritrio adotado para o clculo das compensaes e monitoramento dodesempenho. A dificuldade ou o elevado custo associado medioe valorao de forma rigorosa da maioria dos servios ambientaisque constituem os objetivos da poltica de conservao o principalmotivo pelo qual a maioria dos programas seja do tipoinput-based.Nesses casos so definidos objetivos para o uso do solo e prticasagrcolas ou florestais que potencializam a gerao de serviosambientais e no para provimento de servios propriamente ditos.Esse tipo de programas, que se inclui na definio de PSE adotadapor Muradian et al. (2010), tem a vantagem de no requerer a mediodireta dos resultados em termos de proviso dos servios, bastando oestabelecimento de um conjunto de hipteses acerca da relao entreos usos do solo e essa proviso.

    A avaliao de alteraes nos servios ambientais resultante doprograma normalmente complexa. Exige a definio de umalinha de base (baseline) que traduza a situao de partida e permitaavaliar a adicionalidade, tornando-se mais complexa medida que seincorporam escalas espaciais mais alargadas. A avaliao em umaescala que no seja a local, por exemplo, em uma escala da paisagem,coloca grandes desafios, como a identificao dos impactos marginais(Pascual et al., 2010). Alm disso, os modelos de previso falhamfrequentemente na capacidade de antecipar desenvolvimentos sociais

    e tecnolgicos importantes que podem influenciar o valor dos servios

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    no longo prazo (Gowdy, 2007). Assim, a viabilidade de longo prazodos PSEs pode depender, em parte, da evoluo nas tcnicas deestimativa dos servios ambientais a partir de propriedades facilmenteobservveis dos ecossistemas (Jack et al., 2008).

    A concepo dos esquemas de monitoramento dos PSEs dependedas decises adotadas quanto ao foco do programa discutidasanteriormente. Um programa do tipo output-basedtender a ser maisexigente em termos de monitoramento, embora as dificuldades sejam

    muito dependentes do tipo de servios ambientais contemplados e daescala espacial do programa.

    As cinco experincias internacionais analisadas permitem captar adiversidade existente na forma como os servios ambientais socontemplados nos programas de PSE.

    No METSO da Finlndia, as compensaes financeiras paraconservao da biodiversidade no so baseadas em resultadosconcretos em termos de proviso de servios, mas sim na adoo

    de prticas de gesto voltadas para o aumento ou a manutenoda diversidade de espcies (esquema do tipoinput-based). Assim,os servios ambientais gerados no so valorados diretamente eas compensaes financeiras so negociadas entre as duas partesdo contrato tendo em considerao as perdas de rendimentoesperadas em relao a usos do solo e prticas alternativas (custos deoportunidade) e os custos provenientes de atividade de manejo paraconservao (custos de gesto), que so repercutidos nas ofertas dosproprietrios e no interesse ecolgico da rea.

    Para garantir a eficcia dessa abordagem, a seleo das reas elegveispara contratualizao realizada com base em critrios ecolgicosidentificados por meio de pesquisa cientfica, que define os aspectosflorestais prioritrios. O METSO tem um sistema de monitoramentodestinado a avaliar o desempenho geral do programa e, com base nasinformaes geradas, otimizar as aes de conservao e a alocaodos recursos financeiros, envolvendo a produo de relatrios anuaisque compilam dados sobre a implementao de medidas, bem comodos impactos sociais, ecolgicos e econmicos do projeto.

    O impacto ecolgico medido pelo estado dos habitats e espcies

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    florestais. O estabelecimento de uma linha de base para essesparmetros imprescindvel para permitir a interpretao dosresultados obtidos e avaliar a adicionalidade. Para estabeleceressa linha de base, o METSO utiliza a informao disponvel sobrea biodiversidade na Finlndia e aposta na parceria com centrosde pesquisa para melhorar o conhecimento sobre a influncia deprticas de manejo na biodiversidade da regio. Alm de monitoraros resultados do programa, os pesquisadores se encarregam

    de distinguir habitats e espcies prioritrios para conservao edesenvolver inventrios sobre a fauna e flora local. Aproximadamente2 milhes anuais so destinados a pesquisa cientfica, tanto bsicaquanto aplicada.

    No entanto, importante realar que a avaliao de tendnciasna biodiversidade no uma tarefa fcil. Por ser praticamenteimpossvel medir a biodiversidade total de uma regio, as avaliaesdos resultados do programa tm de se basear em amostragenssignificativas feitas periodicamente, as quais geralmente so

    complexas e demoradas. Alm disso, as tendncias no aumentoou no declnio da biodiversidade s podem ser observadas passadoum tempo significativo aps a implementao das medidas. Essaslimitaes tornam difcil o ajustamento do programa com base emresultados de curto prazo.

    O Programa de Medidas Agroambientais da UE tambm do tipoinput-based, no sendo requerida a identificao e a valorao diretados servios ambientais prestados. Apenas se pretende garantirdeterminados usos do solo ou prticas de produo que se considerammais compatveis com uma agricultura sustentvel. Por essa razo, osvalores das compensaes financeiras so calculados de forma a cobrirperdas de rendimento (custos de oportunidade) e custos adicionaisresultantes da adoo das prticas mais favorveis ao ambienteestipuladas nos contratos, incluindo custos resultantes de alteraesnas tcnicas de produo ou no uso do solo (custos de gesto).

    De acordo com o Regulamento da Comisso Europeia (CE) n.1698/2005, a autoridade de gesto do Programa de DesenvolvimentoRural de cada pas responsvel por monitorar o progresso, aeficincia e a eficcia das aes implementadas. Deve ser apresentado

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    anualmente CE um relatrio de execuo contendo a informaoreferida. Para isso, a autoridade de gesto deve definir um conjunto deindicadoresque reflitam a situao inicial e as execues financeiras,bem como as realizaes, os resultados e o impacto do programa.

    Para facilitar o processo de avaliao dos Programas deDesenvolvimento Rural, a CE instituiu um Quadro Comum deAcompanhamento e Avaliao. Esse quadro prev um conjuntolimitado de indicadores para ser aplicado a todas as intervenes

    de desenvolvimento rural, como rea de florestas deterioradasrecebendo apoio e valor do investimento. No entanto, a CE reconheceque os indicadores comuns no podem captar todos os efeitos dasatividades implementadas e prope que as autoridades de gestonacionais definam indicadores adicionais que abranjam prioridadese especificidades de cada pas (Direco-Geral da Agricultura e doDesenvolvimento Rural, 2006), incluindo as referentes a objetivosde conservao. Portugal, por exemplo, acrescenta indicadores maisespecficos como:

    % de povoamentos mistos no total da superfcie arborizada;

    % arborizada com folhosas na rea arborizada;

    Populao de espcies de aves comuns em zonas agrcolas;

    Sequestro de carbono em pastagens e nos povoamentosapoiados.

    O PPSA da Costa Rica tem como alvo quatro servios ambientais,que so claramente identificados: 1) mitigao das emisses de GEE

    (regulao do clima); 2) proteo da gua para uso urbano, rural ouhidroeltrico (qualidade e quantidade de gua); 3) conservao dabiodiversidade; e 4) beleza paisagstica para recreao e turismo. Acomercializao dos servios ambientais pode ser realizada na formade um pacote integrado ou como um servio individual.

    Apesar de estarem estabelecidos os servios-alvo, tambm o PPSA do tipoinput-based, uma vez que os proprietrios de terras recebempagamentos em funo da adoo de prticas de gesto (manejo)que contribuem para manter ou aumentar a proviso dos servios

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    considerados. Assim, existem cinco modalidades de gesto das terrasque so reconhecidas pelo programa: 1) conservao de florestas;2) reflorestamento; 3) regenerao de florestas naturais; 4) sistemasagroflorestais; 5) manejo sustentvel de florestas.

    Os servios em pacote associados aos diversos usos do soloreconhecidos pelo programa so, em parte, vendidos indiretamentea contribuintes costa-riquenhos, que, eventualmente, pagam umimposto sem ter a conscincia de que parte das receitas utilizada

    para financiar esse esquema, constituindo-se como compradoresno voluntrios. Alguns subsdios provenientes de instituiesinternacionais tambm so utilizados para financiar pagamentos porpacotes de servios. Como os pagamentos so feitos em funo daadoo de prticas de gesto (input-based) os servios provisionadosno so valorados individualmente. Os valores pagos atualmente aosfornecedores de servios em pacote derivam de um programa deincentivos antecedente, o Certificado de Abono Florestal (CAF), criadoem 1986. De um modo geral, os valores so uniformes para todo o

    pas, sendo estabelecidos anualmente, tipicamente ajustando o valordo ano anterior de acordo com a inflao verificada.

    O FONAFIFO encarrega-se ainda de procurar compradoresvoluntrios para servios individuais, nomeadamente compradoresespecificamente interessados em servios de proteo da gua emitigao das emisses de GEE (Pagiola, 2006). O preo dos serviosambientais vendidos individualmente tem sido estabelecido com basena criao e transao de certificados.

    Os compradores de servios hidrolgicos so empresas locais como

    a Energa Global, Hidroelctrica Platanara e a Compaa Nacional deFuerza y Luz, que transferem fundos para a execuo de contratos deconservao em bacias hidrogrficas de especial interesse. No incio,a venda dos servios ambientais hidrolgicos era feita por meio de umacordo em que a rea e o valor da contribuio eram negociados entreo FONAFIFO e o comprador interessado. A partir de 2003, o esquemade pagamento foi uniformizado com a criao do Certificado deServicio Ambiental (CSA) que corresponde ao pagamento anual para 1hectare com um valor de cerca de US$64, 00. De modo semelhante,

    o servio de regulao do clima pela mitigao das emisses de GEE

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    vendido na forma de crditos de carbono designados por CertifiableTradable Offset(CTO) (Pagiola, 2008;Blackman & Woodward, 2010),cujo preo varia de acordo com as tendncias do mercado de carbonoe geralmente vendido a instituies internacionais pblicas ouprivadas.

    Na Costa Rica, a maioria dos crditos de carbono gerada pelaconservao de florestas em risco severo de desmatamento (avoideddeforestation). No entanto, tm sido realizados esforos para promover

    a reduo de emisses por meio do sequestro de carbono emreflorestamentos ou novas plantaes (reforestation and afforestation),j que apenas esses tipos de atividades geram crditos reconhecidospelo Protocolo de Quioto (Pagiola, 2008).

    Os engenheiros florestais certificados pelo FONAFIFO (regentes) soos responsveis pelo trabalho de campo de avaliao e monitoramento.A primeira vistoria das propriedades d-se na fase de elaboraoda proposta, na qual os regentes tm um papel fundamental naavaliao da situao atual das florestas e no apoio aos proprietrios nodesenvolvimento dos planos de manejo. Uma vez aprovada a proposta,a fase de monitoramento consiste na realizao de visitas anuais, emque os regentes conduzem a auditoria por amostragem de uma readas propriedades, para verificar se os termos do contrato esto sendocumpridos. Com exceo do primeiro pagamento, que realizado nomomento de assinatura do contrato, os seguintes s so realizadosaps conhecimento dos resultados da inspeo. importante realarque os proprietrios devem arcar com o custo da contratao dosregentes, que representa, em mdia, cerca de 15% do valor dos

    pagamentos (Pagiola, 2008).

    O FONAFIFO tem trabalhado continuamente na construo de umabase de dados para permitir o monitoramento do cumprimento dasprticas estipuladas nos contratos. Caso um participante no cumpraa sua parte, fica privado de futuros pagamentos. Os regentes quecertificarem propriedades irregulares esto sujeitos a perder a licena(Pagiola, 2008).

    Os principais servios-alvo do programa SLCP-Grain for Greenda China

    so o controle da eroso, a regulao das cheias e a estabilizao

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    do leito dos rios Yangtze e Amarelo. No entanto, o SLCP tambmvisa aumentar a proviso de servios ambientais florestais, como aproteo da biodiversidade e a produo de madeira. A proviso demadeira um objetivo importante do projeto, o que evidenciadopelo plantio planejado de espcies madeireiras em 75% da rea a serconvertida em florestas (Bennett, 2008).

    Esse esquema de PSE tambm do tipoinput-based, pois ospagamentos so condicionais converso das terras em sistemas

    florestais ou pastos e no indexados proviso de serviosecossistmicos. Os servios gerados so vendidos como um pacotenico para um comprador nico, o Governo Nacional. Por essa razo,no existe a necessidade de proceder identificao e valoraoindividual dos servios provisionados. O clculo das compensaes baseado no custo de oportunidade dos agricultores, variando de regiopara regio.

    O cumprimento dos compromissos assumidos pelos agricultores verificado por meio de uma srie de inspees conduzidas por

    diversos nveis de governo. Os funcionrios das vilas (aldeias) visitamas propriedades com frequncia para conferir se as aes do programaesto sendo executadas corretamente. Os funcionrios dos municpiosou distritos conduzem inspees mais espaadas (geralmente anuais),mas que so oficialmente responsveis por determinar a conformidadecom o programa. Os funcionrios de nveis mais altos do governoou da Administrao Florestal Nacional tambm podem visitar aspropriedades se considerarem necessrio (Xu & Cao, 2001 citado em:Bennett, 2008).

    A conformidade definida em termos da quantidade, qualidade, tipoe taxa de sobrevivncia das espcies plantadas. Como regra geral, ataxa de sobrevivncia deve ser acima de 75% aps a consolidaoda fase de implementao, mas essa norma parece estar sujeita interpretao dos inspetores locais (Bennett, 2008). Teoricamente, osubsdio deve ser retido no caso da inspeo apresentar resultadosinsatisfatrios, mas essa regra tem sido pouco aplicada (Wunder et al.,2008; Bennett et al., 2008).

    O servio-alvo do SOFALA de Moambique a regulao do clima,

    por meio do sequestro e armazenamento de carbono. Entre as cinco

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    experincias analisadas, o SOFALA a que se aproxima mais dotipo output-based, em que os pagamentos so calculados em funode uma estimativa da proviso do servio desejado e no apenasbaseados na adoo de prticas de gesto. Contudo, a estimativado servio realizada com base em uma relao definida a priori,pelo clculo de coeficientes fixos entre os sistemas de uso da terrae o potencial de sequestro e armazenamento de carbono. Assim,o resultado final acaba por ser semelhante ao verificado com os

    certificados criados para os servios individuais na Costa Rica.O projeto oferece aos agricultores nove opes de sistemas deuso da terra ou gesto de recursos naturais (sete tipos de sistemasagroflorestais, um de sequestro de carbono em solo agrcola e um deREDD-gesto florestal), correspondendo a cada opo especificaesdetalhadas para implementao, manejo, conformao com osistema Plan Vivoe toda a informao tcnica para o clculo dopotencial de carbono.

    As VERs geradas so comercializadas na forma de certificados do

    sistema Plan Vivo, que promove o sequestro e o armazenamentode carbono por meio de atividades que gerem tambm benefciossociais e ambientais, como restaurao de florestas, agroflorestas,melhoramento da qualidade do solo e proteo de recursoshdricos (Plan Vivo, 2009). Sendo assim, apesar de os pagamentosserem baseados na quantidade de carbono sequestrado, cadaVER representa, na verdade, um pacote de servios ambientaise benefcios sociais e ecolgicos. O projeto utiliza o conceito dePSE para associar a regulao do clima ao combate pobreza e

    conservao da biodiversidade.O servio de regulao do clima valorado de acordo com ascondies de mercado, uma vez que o sistema Plan Vivonoestabelece um valor fixo para os certificados emitidos. Cada projetoestabelece o preo das VERs por meio de negociaes com oscompradores voluntrios interessados. O valor pago aos agricultorespelo servio fornecido (US$4,46/tCO2) foi acordado com a EnvirotradeMoambique Limitada e no depende do preo de venda das VERs.Esse valor calculado considerando o potencial de reduo de

    emisses dos prximos 100 anos. A maioria dos pagamentos

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    realizada ex-ante, ou seja, baseada no potencial de sequestro decarbono do sistema implementado e no em medies reais decarbono efetivamente sequestrado. Existe informao que permitefazer a comparao entre as estimativas de custos de investimento emanuteno associados a cada uma das nove opes de envolvimentono projeto e o rendimento recebido pelos proprietrios individualmente.

    O SOFALA construiu linhas de base com dados histricos paraprever cenrios em que o desmatamento e o uso insustentvel dos

    recursos continuassem na regio. A linha de base para sistemas deREDD foi determinada utilizando taxas de desmatamento anteriorescombinadas com o sistema de uso da terra mais provvel de seradotado na ausncia do projeto. A linha de base para agroflorestas foideterminada usando-se a taxa de sequestro de carbono mais provvelpara o sistema em questo na ausncia do projeto (Envirotrade,2010). As metodologias para a quantificao do carbono sequestradoou armazenado nos diferentes sistemas agrcolas e florestais foramconcebidas com apoio de uma calculadora de carbono (Boundary

    version 1) desenvolvida pelo ECCM. Alm disso, os habitantes dascomunidades foram treinados para conduzir avaliaes de biomassasob a superviso de pesquisadores e tcnicos da EnvirotradeMoambique Limitada.

    Em sntese, os programas de PSE tm focos e abordagens muitodiversas na forma como contemplam os servios ambientais,sendo fundamental que a opo adotada esteja alinhada com o(s)objetivo(s) da poltica ambiental e o contexto econmico, social,cultural e institucional. A definio estrita de PSE, em uma perspectivafundamentalmente econmica, requer que exista uma transaovoluntria entre pelo menos um comprador e um vendedor de umservio ambiental bem definido. Essa perspectiva exige a identificaodo(s) servio(s) ecossistmico(s)que ser(o) alvo(s) da interveno,o estabelecimento de uma relao clara e mensurvel entre cada usodo solo e esse(s) servio(s) e um esquema de monitoramento quegaranta que o servio est sendo fornecido e que justifica o pagamentoefetuado. Aponta, assim, para esquemas do tipo output-basedousemelhantes, tendo elevadas exigncias de monitoramento.

    Contudo, a maioria dos programas de PSE, ou melhor, de PES-like,

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    esto mais de acordo com a definio adotada por Muradian et al.(2010), na medida em que visam transferncia de recursos entregrupos de forma a criar um incentivo para alinhar as decises sobreo uso do solo com os benefcios sociais que resultam da provisode servios dos ecossistemas. Nessa perspectiva, deixa de serexigvel a medio direta dos resultados em termos de proviso dosservios para serem pagos por um comprador individual, bastando oestabelecimento de um conjunto de hipteses acerca da sua relao

    com os usos do solo. Os esquemasinput-based, considerando aproviso de servios em pacote valorizados pela sociedade, combase em motivaes econmicas, sociais ou culturais, tornam-separticularmente relevantes nessa abordagem.

    ATORES ENVOLVIDOS

    A complexidade dos programas de PSE depende do nmero e dadiversidade de atores envolvidos. A clara definio do papel de cadaator importante e deve garantir que os objetivos estejam todos

    alinhados, entre compradores/beneficirios, vendedores/fornecedorese intermedirios. Os vendedores e os compradores de servios, bemcomo os intermedirios/facilitadores, variam muito de programa paraprograma, dependendo de opes tomadas na sua concepo.

    Geralmente fundamental assegurar um elevado nvel de participaode fornecedores de servios para garantir a eficcia de um programa,sendo, em alguns casos, uma condio necessria assegurara conexo de reas mais vastas geridas de forma a garantir amanuteno da biodiversidade, dos habitats e das espcies, permitindo

    a implementao de estratgias de conservao na escala da paisagem(van der Horst, 2011). De fato, se os incentivos forem dados aproprietrios individuais, como acontece na maioria dos programasde PSE, e se no for garantida uma elevada participao, h um riscoelevado de no se conseguir garantir a continuidade territorial. Umaforma de garantir um maior envolvimento dos proprietrios passa poraproveitar as relaes e as redes de vizinhana para potencializar acapacidade de liderana e de influncia entre pares (van der Horst,2011), bem como a capacidade de interveno e de mobilizao deorganizaes no governamentais (ONGs), de forma a promover a

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    adeso. A promoo de relaes de confiana na comunidade e oaproveitamento da capacidade de liderana de alguns atores podeser fundamental para a implementao de PSE, sobretudo em reasremotas e com pouco acesso informao.

    muito importante conhecer, entre outros fatores, a distribuiogeogrfica dos atores envolvidos, a sua condio econmica, cultura edinmica social, incluindo as redes de vizinhana, de forma a definir amelhor estratgia de implementao do programa. A implementao

    de um programa de PSE em uma rea remota, onde os proprietriose agricultores so totalmente dependentes dos rendimentos daterra e vivem em pequenas comunidades com fortes relaes devizinhana que influenciam as suas decises, muito diferente do queaconteceria em uma rea de grandes proprietrios que vivem perto dezonas urbanas, tm outras fontes de rendimento e tendencialmentesero menos permeveis a mecanismos de participao e de decisocoletiva (van der Horst, 2011). Assim, deve ser feita uma claraaposta na caracterizao dos atores potencialmente envolvidos nos

    diversos nveis, sendo a utilizao de sistemas georreferenciadosparticularmente adequada para armazenar e gerir a informao,permitindo ter a cada momento uma leitura espacial cruzada de vriascamadas de informao.

    As caractersticas dos atores envolvidos nas cinco experinciasinternacionais analisadas so muito diversas, como resultado docontexto de aplicao do programa e da forma como o mecanismo foiconcebido. Nos casos do METSO-Finlndia, Medidas Agroambientais-UE e Grain for Green-China, cabe s entidades pblicas o papelfundamental de garantir a gesto e a capacitao tcnica para aimplementao do programa, bem como os recursos financeiros.J o PPSA-Costa Rica e o SOFALA-Moambique envolvem umamaior participao de ONGs, comunidades e outros atores, tantona implementao quanto no monitoramento, tendo uma estruturainstitucional mais diversificada.

    Os principais fornecedores de servios no METSO so atores privados,isto , proprietrios de terras, companhias florestais, mas tambmso realizados pagamentos empresa estatal Metshallitus que responsvel por desenvolver atividades de conservao e restaurao

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    nas reas pblicas selecionadas (Finish Forest Research Institute, 2010).Em geral, os proprietrios privados possuem pequenas propriedades,mas esto capacitados para apresentar propostas, incluindo ocomponente financeiro, que so avaliadas e entram em competiopelos fundos disponveis para a implementao do programa. Ogoverno finlands o comprador nico do esquema, no existindocompradores privados. Os principais intermedirios do projeto soo Ministrio do Ambiente e o Ministrio da Agricultura e Floresta,

    que administram e coordenam o METSO. Os Centros Florestais eos Centros Ambientais Regionais so responsveis por negociardiretamente com os donos de terras e firmar com estes os contratos deconservao. O monitoramento dos impactos ecolgicos, econmicose sociais assegurado pelo Instituto Finlands de Pesquisa Florestal(Metla) e pelo Instituto Finlands do Ambiente (SYKE). Trata-se deum programa em que existem informao e capacitao tcnica dosdiversos atores, no sendo descrita qualquer relevncia particular dasredes de vizinhana ou de ONGs no seu desenvolvimento.

    Os compradores diretos dos benefcios gerados pelas MedidasAgroambientais da UE so a CE, que financia a implementao demedidas por meio da PAC, e os governos dos Estados-membro,que so responsveis por parte do financiamento dos Programasde Desenvolvimento Rural nacionais, no existindo tambm nestecaso compradores privados. Os benefcios gerados pela adoo deprticas favorveis ao ambiente fluem para os prprios agricultorese comunidades vizinhas, bem como para a populao nacional e acomunidade europeia e mundial, devido ao aumento na proviso dediversos bens pblicos, por exemplo, na proteo da biodiversidade

    e regulao do clima. Os agricultores que recebem pagamentosagroambientais so os fornecedores dos servios ecossistmicos,cuja proviso provavelmente aumentar como consequncia daimplementao das medidas agroambientais nas suas propriedades.Em esquemas agroambientais particularmente relevante assegurara continuidade espacial das propriedades beneficiadas (landscapelevel) para se obterem efeitos relevantes em alguns componentesambientais, como a conservao da biodiversidade. O programa deMedidas Agroambientais da UE no parece estar desenhado de umaforma que promova a conectividade. Por essa razo, o monitoramento

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    da distribuio espacial dos agricultores que se beneficiaram depagamentos particularmente relevante para a eventual correo dasregras em uma futura reviso e para se avaliar a necessidade de sepromoverem redes de vizinhana e a colaborao de ONGs. O principalintermedirio deste esquema a autoridade de gesto do Programade Desenvolvimento Rural de cada pas, que pode ser um organismopblico ou privado que atue em nvel nacional ou regional, ou o prpriogoverno nacional.

    Dos esquemas analisados, o PPSA da Costa Rica o que envolve umamaior diversidade de atores. O esquema tem mltiplos compradores,incluindo os cidados contribuintes da Costa Rica que pagam pelosservios ambientais em pacote por meio da contribuio fiscal(compradores indiretos e involuntrios), e diversas empresas pblicase privadas e outras organizaes, como o Banco Mundial, que socompradores diretos e voluntrios de servios especficos (proteo dagua e regulao do clima). Os benefcios gerados por este esquema,no entanto, no esto apenas restritos aos compradores dos servios

    ambientais devido sua natureza de bens pblicos. Enquanto abeleza paisagstica e a proteo da gua beneficiam essencialmenteos residentes em todo o pas, a regulao do clima e a proteo dabiodiversidade so bens pblicos gerando benefcios em uma escalasupranacional. Os vendedores do esquema, por sua vez, so osproprietrios de terras (a posse legal da terra requerida para quepossam receber a devida compensao), que se comprometem aadotar prticas para aumentar a proviso dos servios-alvo.

    No entanto, a venda dos servios s possvel graas a instituies

    intermedirias e facilitadoras que fornecem o apoio tcnico eadministrativo necessrio para o processo. O FONAFIFO, criado pelaLei das Florestas em 1996, um rgo com autonomia jurdica e quese encarrega de garantir o financiamento para o programa e de searticular com os compradores. As oito sedes regionais do FONAFIFOcontam com o apoio de organizaes locais e ONGs que so muitoimportantes para promoverem a adeso dos proprietrios. A Fundacinpara el Desarrollo de la Cordillera Volcnica Central (FUNDECOR), nasreas sob sua influncia, assume a responsabilidade pelo componente

    tcnico do PPSA, que vai desde o desenvolvimento dos planos de

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    manejo e a inspeo das propriedades, at a criao de bases dedados georreferenciados (Malavasi, 2003). Tambm so consideradosfacilitadores do PPSA as organizaes que contribuem financeiramentepara o seu funcionamento, como o Banco Mundial, que (alm decomprador, sobretudo por meio do Fundo BioCarbon) concedeemprstimos ao governo costa-riquenho para pagar os contratosfirmados, o Global Environment Facility (GEF) e o governo alemo pormeio do banco KfW (Pagiola, 2008).

    A contribuio de atores no governamentais tender a ser mais eficazquando complementa o papel das instituies governamentais (Jack etal., 2011), como parece ser o caso do PPSA.

    Os fornecedores de servios ambientais do SOFALA de Moambiqueso pequenos proprietrios de terras, pertencentes s comunidadeslocais das zonas de segurana do Parque Nacional do Marromeu e,principalmente, do Parque Nacional da Gorongosa. Esses proprietrioscomprometem-se a adotar sistemas de uso da terra que promovamo sequestro e o armazenamento de carbono. Os benefcios deste

    esquema fluem, primariamente, para as comunidades locais devidos melhorias sociais e econmicas geradas pelo projeto. Tambm apopulao local e a populao de Moambique em geral beneficiam-se de outros efeitos positivos indiretos no ambiente e na conservaoda biodiversidade. Alm disso, outros benefcios, como o serviode regulao do clima, promovidos pelo SOFALA e outros impactospositivos na conservao da biodiversidade estendem-se para alm dasfronteiras nacionais.

    Os compradores deste esquema so indivduos ou organizaes

    que pretendem compensar voluntariamente as suas emisses decarbono e, para isso, compram VER na forma de certificados PlanVivo. Atualmente, o principal intermedirio do projeto a EnvirotradeMoambique Limitada, uma organizao sem fins lucrativosresponsvel por todas as operaes tcnicas e administrativas doprojeto. Outros intermedirios que tm sido relevantes ao longodo projeto incluem a empresa Envirotrade Limited, responsvelpela sua concepo e implementao na fase inicial, bem como aUniversidade de Edimburgo, o Centro para Gesto de Carbono de

    Edimburgo (ECCM) e a Universidade Eduardo Mondlane, responsveis

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    por fornecer o apoio cientfico necessrio. O projeto tambm contoucom o apoio de ONGs, como o WWF, e do governo alemo, pormeio de sua agncia de cooperao internacional, a Gesellschaft frInternationale Zusammenarbeit (GIZ), bem como da administraodo Parque da Gorongosa. A Unio Europeia foi a principal fonte definanciamento durante a fase piloto, o que foi de extrema importnciapara impulsionar o projeto.

    Salienta-se ainda a interveno da Fundao Plan Vivo, uma

    instituio de caridade registrada na Esccia, que responsvelpelo desenvolvimento e superviso do Sistema Plan Vivo, que ocarbon standardutilizado no SOFALA. Esse sistema consiste em umaplataforma de apoio a projetos de gesto de terras em pases emdesenvolvimento, baseados em comunidades locais. Alm de facilitara concepo de planos de gesto para os proprietrios, a Plan Vivotambm se encarrega de rever e registrar projetos, emitir certificadosequivalentes a crditos carbono e de interagir com verificadoresexternos.

    O programa Grain for Greenda Chima um esquema de PSE debase pblica, totalmente financiado pelo governo nacional e comoramento programado pelo Ministrio das Finanas chins. Entre asexperincias analisadas, o que envolve um maior nmero de atores.Os fornecedores so proprietrios de terras agrcolas localizadas emencostas, geralmente com baixa produtividade, que se comprometema reflorestar (ou florestar) as suas propriedades (em princpio de formavoluntria, embora o carter de voluntariedade do programa sejacontestado por alguns autores). A dimenso dos recursos disponveis

    no projeto e a forma como a adeso promovida pelas entidadespblicas asseguram a continuidade es