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nova Economia_Belo Horizonte_18 (2)_293-313_maio-agosto de 2008 Padrões de eficiência no comércio: definições e implicações normativas Marcilene Martins Professora Adjunta do Departamento de Economia da UFRGS Resumo O presente artigo discute a relação entre pa- drões de eficiência no comércio e especializa- ção comercial. Partimos da hipótese de que a perspectiva de se qualificar a especialização comercial remete à necessidade de alguma noção prévia de eficiência econômica. O argu- mento central é o de que tal especificação é condição necessária ao propósito de avaliar as implicações alocativas e técnico-produtivas dinâmicas associadas a um dado qualquer pa- drão de especialização, inclusive no que diz respeito à possibilidade de trade-offs entre os distintos critérios de eficiência no comércio. Abstract This paper discusses the relationship between efficiency standards and specialization in trade. The assumption is that in order to define trade specialization, it is necessary to have a prior idea of economic efficiency. The main argument is that this background knowledge is a necessary condition in order to appreciate the allocation and dynamic technical-productive implications associated with any given specialization standard, including with regards to the possibilities of trade-offs between different criteria of efficiency in trade. Palavras-chave comércio internacional, padrões de especialização, eficiência econômica. Classificação JEL B50, F10, O33. Key words international trade, patterns of specialization, economic efficiency. JEL Classification B50, F10, O33.

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Page 1: Padrões de eficiência no comércio - SciELO · 2008. 11. 17. · nova Economia_Belo Horizonte_18 (2)_293-313_maio-agosto de 2008 2 Paul Krugman chega a conclusões semelhantes,

nova Economia_Belo Horizonte_18 (2)_293-313_maio-agosto de 2008

Padrões de eficiência no comércio:definições e implicações normativas

Marcilene MartinsProfessora Adjunta do

Departamento de Economia da UFRGS

ResumoO presente artigo discute a relação entre pa-drões de eficiência no comércio e especializa-ção comercial. Partimos da hipótese de que aperspectiva de se qualificar a especializaçãocomercial remete à necessidade de algumanoção prévia de eficiência econômica. O argu-mento central é o de que tal especificação écondição necessária ao propósito de avaliar asimplicações alocativas e técnico-produtivasdinâmicas associadas a um dado qualquer pa-drão de especialização, inclusive no que dizrespeito à possibilidade de trade-offs entre osdistintos critérios de eficiência no comércio.

Abstract

This paper discusses the relationship between

efficiency standards and specialization in trade.

The assumption is that in order to define

trade specialization, it is necessary to have a prior

idea of economic efficiency. The main

argument is that this background knowledge

is a necessary condition in order

to appreciate the allocation and dynamic

technical-productive implications associated

with any given specialization standard,

including with regards to the

possibilities of trade-offs between different

criteria of efficiency in trade.

Palavras-chavecomércio internacional,padrões de especialização,eficiência econômica.

Classificação JEL B50, F10,O33.

Key words

international trade,

patterns of specialization,

economic efficiency.

JEL Classification B50, F10,

O33.

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Introdução

Quando fazemos referência ao padrão deespecialização comercial de um país, pen-samos na composição setorial do seu co-mércio exterior vis-à-vis a estrutura setorialdo comércio mundial. E, quando indaga-mos se um padrão de especialização é deboa ou má qualidade, tendemos a compa-rá-lo a determinado padrão de comérciointernacional, avaliado como desejável se-gundo algum critério previamente defini-do. Importa também frisar que a adjetiva-ção de um padrão de comércio como bomou ruim, dinâmico ou inerte, traz embuti-da uma opção teórico-metodológica porum dado critério definido de eficiência eco-nômica. Ocorre que nem sempre essa op-ção conceitual adotada é devidamente ex-plicitada, o que acaba por induzir à falsaidéia de que existiria algo como um crité-rio universal de eficiência, contribuindotambém para obscurecer a possibilidade deuma análise efetiva das prescrições e im-plicações normativas que submergem a ca-da dado padrão de especialização.

As considerações acima sintetizamo eixo de interpretação deste artigo, cujoargumento central é o de que a perspectivade se qualificar o padrão de especializaçãocomercial remete à necessidade de algumanoção prévia de eficiência econômica, sen-do tal especificação imprescindível ao ob-

jetivo de se avaliar as implicações alocativase técnico-produtivas dinâmicas associadasa um dado qualquer padrão de especializa-ção comercial.

Além desta introdução, o artigo com-põe-se de mais quatro seções. A seção 1discute três noções alternativas de eficiên-cia no comércio, demarcando suas diferen-ças conceituais e de caráter normativo. Aseção 2 complementa essa discussão, aten-tando para algumas dificuldades relaciona-das à operacionalização de tais conceitosde eficiência. A seção 3 caracteriza os pa-drões de especialização comercial defini-dos em correspondência aos distintos con-ceitos de eficiência, enfocando a questão dapossibilidade de trade-offs entre eles e as im-plicações daí decorrentes. A seção 4 apre-senta as considerações finais do artigo.

1_ Critérios alternativosà definição de eficiênciano comércio

Ao buscarmos por um embasamentoteórico que permita uma discussão con-ceitual e com base nisso uma análise dasimplicações normativas associadas a umdado padrão de especialização comercial,deparamo-nos com a necessidade de al-guma noção prévia de “progressiveness”, nosentido de eficiência no comércio. A lite-

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ratura econômica oferece três possibili-dades de onde apoiar tal definição: eficiên-

cia Ricardiana (Ricardian efficiency), eficiência

em Crescimento (Growth efficiency) e eficiência

Schumpeteriana (Schumpeterian efficiency) (Do-si, Tyson e Zysman, 1989; Dosi, Pavitt eSoete, 1990).

A eficiência Ricardiana inscreve-se nocampo da teoria ortodoxa; remete, pois, àsabordagens Clássica (Modelo Ricardiano)e Neoclássica (Modelo de Heckscher-Ohlin)do comércio internacional, que têm comoponto de partida o conceito de vantagemcomparativa de custos. Tal conceito nosdiz que um país possui vantagem compara-tiva na produção de um bem se o custo deoportunidade da produção desse bem emtermos de outros é mais baixo do que oobtido em outros países.

Partindo desse conceito, a eficiência Ri-

cardiana baseia-se na idéia-chave de que osrecursos produtivos estarão sendo empre-gados com a máxima eficiência (alocativa), sedistribuídos em consonância à estrutura in-tersetorial de vantagens/desvantagens com-parativas de custos do país. A teoria pres-creve que cada país deve se especializar emproduzir bens nos quais apresente vanta-gem comparativa de custos. Tal condiçãoocorre quando o custo de oportunidade deproduzir um bem em termos de outrosbens é mais baixo que em outros países,

donde se pode concluir que são as diferen-ças internacionais na produtividade do tra-balho que definem a condição de vanta-gem/desvantagem comparativa de custose, por conseguinte, os padrões de especiali-zação produtiva e comercial do país.

Lembramos, no parágrafo anterior,que as teorias Ricardiana e Neoclássica docomércio internacional têm como pontode partida comum o conceito de vantagemcomparativa de custos. Ressalte-se agoraque as hipóteses formuladas por uma e ou-tra teoria, sobretudo no que diz respeito àtecnologia, são bastante distintas.1 Daí ob-servar-se que essas teorias tomam rumosdiferentes quando se trata de descrever o me-canismo básico de operação do conceitode vantagens comparativas conquanto de-terminante da especialização no comércio.

A teoria Ricardiana explica o comér-cio entre países em termos estritamentedas diferenças internacionais na produtivi-dade do trabalho, do que resulta a condiçãode vantagem ou desvantagem comparativade custos de um dado país na produção deum bem qualquer. As diferenças na produ-tividade do trabalho entre países se expli-cam pela hipótese de que as tecnologiassão não-uniformes, até mesmo no interiorde um mesmo país.

Já a teoria Neoclássica enfoca as di-ferenças de recursos entre países, relacio-

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1 As hipóteses básicas dosmodelos Ricardianos podemser resumidas nos seguintestermos: o fator de produção,trabalho, é perfeitamentemóvel no interior de um país,e imóvel externamente;existem distintas tecnologiasno interior de um mesmo país;de modo que a possibilidadede diferenças intersetoriais naprodutividade do trabalho ficadefinida em função daexistência de diferentestecnologias; a produção estásujeita à ocorrência derendimentos constantes deescala. Já os modelos Neo-clássicos (Heckscher-Ohlin)distinguem-se dos Ricardianosao suporem a existência dedois fatores de produção,capital e trabalho, cujadotação relativa difere de paíspara país; que os paísesempregam uma mesma dadatecnologia; e que os padrõesde preferência dosconsumidores situados emdiferentes países sejamidênticos (Gonçalves et al.,1998, p. 14-24).

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nando-as à abundância relativa dos fatoresdomésticos de produção e à intensidade re-lativa com a qual diferentes fatores de pro-dução são usados na produção de bens dis-tintos. A proposição central é de que os pa-íses tendem a se especializar na produçãode bens cuja produção requeira maior quan-tidade do fator relativamente abundanteem termos domésticos.

Ambas as teorias concluem pela exis-tência de diferentes custos de oportunidadeem cada país, mas, enquanto a teoria Ricar-diana explica essas diferenças como decor-rência da existência de diferentes tecnolo-gias, para a teoria Neoclássica o que asexplicam são as diferentes dotações de fa-tores de produção.

Demarcadas as diferenças de fundoentre as teorias Ricardiana e Neoclássica,cumpre agora esclarecer que, quando fala-mos da eficiência Ricardiana, é dos modelosde comércio desenvolvidos na tradição dopensamento Neoclássico que estamos fa-lando. Tais modelos se baseiam na hipótesede que os mercados operam sob concor-rência perfeita. Supõem, portanto, retornosconstantes de escala, pleno emprego e livremobilidade dos fatores de produção e fun-ções de produção e de demanda “bemcomportadas” (tecnologia uniforme e pre-ferências dos consumidores estáveis) e idên-ticas entre países. Satisfeitas essas condi-

ções, supõe-se a ocorrência de ajustamen-tos (via preços relativos) suficientes paragarantir ex hypothesi o equilíbrio dos merca-dos de bens e fatores (Dosi e Soete, 1988,p. 403). Essas hipóteses desembocam naassertiva de que a especialização comercialguiada pela eficiência Ricardiana constitui umacondição necessária e suficiente para o paísobter ganhos no comércio, independente-mente da magnitude absoluta dos seus cus-tos de produção. Dito de outro modo,

De acordo com a teoria da vantagem com-

parativa, mesmo um país com uma desvan-

tagem absoluta de produção, no sentido de

custos de produção domésticos mais eleva-

dos para todas as mercadorias comerciali-

zadas, se beneficia do comércio pela ex-

portação daquelas mercadorias em relação

as quais suas desvantagens de produção são

menores (Dosi, Tyson e Zysman, 1989, p. 6).

Como resultado, em qualquer dadomomento, a estrutura intersetorial de van-tagens/desvantagens comparativas de cus-tos, que é definida pela disponibilidade re-lativa dos fatores de produção, determina acomposição e a participação do país no co-mércio internacional. Os agentes econômi-cos responderão invariável e imediatamen-te a essa estrutura, desde que disponhamde um sistema de incentivos (preços) quefuncione a contento. Guerrieri (1994) des-creve esse processo nos seguintes termos:

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O pensamento ortodoxo vê a mudança es-

trutural como um suave e contínuo processo

decorrente de uma correta estrutura de in-

centivos (preços) desfrutada por economias

abertas. Nesta perspectiva, mudanças ao

longo do tempo na estrutura industrial são

meramente vistas como um sub-produto au-

tomático de mudanças em termos de vanta-

gem comparativa. No curso do desenvolvi-

mento, a vantagem comparativa é assegura-

da buscando-se por ‘fundamentos corretos’

[‘getting fundamentals right’] através de

fortes vínculos com o mercado internacio-

nal (Guerrieri, 1994, p. 171).

O relaxamento de algumas hipóte-ses do modelo neoclássico padrão, isto é,nos termos acima descritos, é suficiente pa-ra romper com a simplicidade do mecanis-mo de ajustamento e o automatismo dosresultados nele previstos. Assim, admitin-do-se, por exemplo, a possibilidade de fun-ções de produção variáveis (diferentes) en-tre países, a equalização de preços deixa deser automática; admitindo-se a possibilida-de de economias de escala e, por conse-guinte, retornos crescentes de escala, há quese relativizar a hipótese de que as vantagensdo comércio se distribuem de forma iguali-tária entre os países; admitindo-se a exis-tência de “imperfeições” de mercado, a hi-pótese de modelos de equilíbrio “geral”para o comércio não mais se sustenta. Comefeito, tais condições apontam para resulta-

dos que contrastam com os previstos pelomodelo neoclássico padrão. Nesse sentido,poder-se-ia concluir, por exemplo, que

em geral, os preços dos fatores não estão

equilibrados, existem rendas oligopólicas,

os padrões de comércio não dependem ape-

nas das dotações de fatores dos países, os

graus e formas de ‘imperfeições´ de merca-

do tornam-se um determinante por si mes-

mos da localização da produção e do co-

mércio (Dosi e Soete, 1988, p. 406).2

O conceito de eficiência em Crescimen-

to, ainda que nomeado e operacionalizadopor autores da vertente neo-schumpeteria-na (Dosi, Pavitt e Soete, 1990; Dosi, Tysone Zysman, 1989), remete à teoria Kaldoria-na.3 Recuperando alguns principais argu-mentos de Kaldor acerca da relação entrepadrão de comércio exportador e cresci-mento econômico, sintetizamo-los nos se-guintes pontos: i) o crescimento econômi-co é induzido pela demanda (demand-indu-

ced), ao invés de restringido pelos recursos(resource constrained), com a demanda externavindo a cumprir o papel de principal fatorpropulsor do crescimento da taxa de pro-duto; ii) variações das importações se ex-plicam em função mais de variações darenda real do que dos preços; iii) a elastici-dade-preço da demanda é um fator que im-porta no que tange à exportação de “benstradicionais”, isto é, no caso daqueles pro-

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2 Paul Krugman chega aconclusões semelhantes, aindano início da década de 80, aointroduzir a concorrênciaimperfeita e as economias deescala na teoria neoclássica docomércio, dando origem àdenominada “Nova Teoria doComércio Internacional”. Cf.Krugman (1979 e 1980). Vertambém Krugman e Obstfeld(2001, cap. 6).3 Com destaque para acontribuição de A. P.Thirlwall. Ver, por exemplo,Thirlwall (1979, 1980 e 1986)e também McCombie eThirlwall (1994).

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dutos para os quais as inovações tecnológi-cas se mostrem de menor importância; iv)o crescimento das exportações de um paísé resultado dos esforços feitos no sentido dabusca de novos mercados potenciais e dacapacidade em adaptar sua estrutura pro-dutiva ao perfil da demanda internacional.Depende, assim, da elasticidade-renda dademanda internacional por seus produtos,a qual será tanto mais alta quanto maioresforem as capacidades inovativa e adaptati-va dos exportadores; v) os países desenvol-vidos apresentam elevadas elasticidades-renda das exportações e baixas elasticida-des- renda das importações, o que refletesua liderança no desenvolvimento de no-vos produtos (Kaldor, 1981, p. 339-340).

A noção de eficiência em Crescimento

apóia-se inteiramente nessa visão Kaldori-ana do comércio, da qual incorpora a hipó-tese de uma relação positiva entre a magni-tude da elasticidade-renda da demanda in-ternacional, a capacidade de expansão dasexportações e a taxa prospectiva de cresci-mento econômico. A variável-chave que de-fine tal noção de eficiência no comércio é aelasticidade-renda das mercadorias corres-pondentes a um dado padrão de especiali-zação no comércio.

A eficiência em Crescimento no comér-cio prescreve que as exportações de umpaís tenderão a crescer tanto mais rápida e

firmemente quanto mais elevados os seuscoeficientes de elasticidade-renda, e que opadrão de especialização no comércio serátão mais eficiente quanto maior a participa-ção relativa de exportações de elevada elas-ticidade-renda da demanda internacional.É então afirmada a hipótese de uma intera-ção positiva entre expansão das exporta-ções e crescimento econômico, assumin-do-se que uma estrutura exportadora decaráter market-dynamic pode favorecer mai-ores taxas de crescimento econômico, per-mitindo, com isso, um deslocamento “paraa frente” da restrição ao crescimento im-posta pelo desequilíbrio do balanço de pa-gamentos; mesmo na hipótese de uma ele-vação do coeficiente de importações indu-zida pelo crescimento da renda real (Dosi,Pavitt e Soete, 1990, p. 208).

Do ponto de vista normativo, o con-ceito de eficiência em Crescimento converge pa-ra a preocupação em avaliar como o poten-cial de crescimento de longo prazo podeser afetado pela composição do produto edo comércio nacionais. A resposta a essaquestão remete aos elementos considera-dos nos dois parágrafos precedentes, po-dendo ser sistematizada nos seguintes ter-mos: tudo o mais constante, quanto maiore mais veloz a taxa de crescimento da de-manda internacional pelos produtos de umpaís em resposta ao crescimento da renda

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mundial, maior a perspectiva de se obteremelevadas taxas de crescimento econômico.Considerando que os produtos/setores di-ferem entre si no tocante à elasticidade-renda, um padrão de especialização efici-ente será aquele que se faça basear na ex-portação de produtos market-dynamics ou dealta elasticidade-renda (de longo prazo) nocomércio mundial. Em perspectiva dinâ-mica, uma trajetória de especialização comer-cial convergente para o padrão de deman-da internacional caracterizar-se-á por umaelevação do grau de similaridade entre as es-truturas de exportação nacional e mundial.

Voltando ao esquema teórico deKaldor, vale ressaltar a importância neleconferida ao desenvolvimento tecnológicoe à habilidade inovativa dos agentes econô-micos, como fatores explicativos dos dife-renciais de elasticidade-renda das exporta-ções. Nesse sentido, ao identificar na con-traposição entre alta elasticidade-renda dasexportações versus baixa elasticidade-rendadas importações, uma situação característi-ca aos países desenvolvidos e um reflexode sua liderança no que concerne ao desen-volvimento de novos produtos, Kaldor ex-plica que

o progresso tecnológico é um processo contí-

nuo e em grande parte adquire a forma do

desenvolvimento do marketing de novos

produtos, os quais proporcionam uma no-

va forma preferida de satisfazer alguma

demanda existente. Tais novos produtos,

se bem sucedidos, gradualmente substitu-

em o produto pré-existente que serve às

mesmas necessidades, e no curso desse pro-

cesso de substituição, a demanda pelo novo

produto cresce acima do crescimento geral

da demanda resultante do crescimento eco-

nômico. Como resultado, os exportadores

mais bem sucedidos estarão aptos a alcan-

çarem maior penetração tanto nos merca-

dos internacionais quanto nos domésticos,

porque seus produtos substituirão os pro-

dutos existentes (Kaldor, 1981, p. 340).

A transcrição acima evidencia a per-cepção acurada de Kaldor acerca do papelcentral cumprido pelo progresso técnicona redefinição dos padrões de demanda ede produção nacionais. Ocorre que nem opróprio Kaldor nem os autores que sua te-oria inspirara deram seqüência à análise daspropriedades e características do progressotecnológico e seus impactos dinâmicos so-bre o padrão de especialização. A supera-ção dessa lacuna pressupõe incorporar-seao conceito de eficiência em Crescimento o ca-ráter endógeno e dinâmico do progressotécnico. É precisamente este o ponto departida ao conceito de eficiência Schumpeteria-

na, o qual pode ser considerado

[...] um desdobramento e uma sofistica-

ção da contribuição de Kaldor, através da

agregação do aporte teórico encontrado em

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Schumpeter – destacando-se, a este respei-

to, a introdução de uma distinção crucial

entre os conceitos de ‘eficiência em Cresci-

mento’ e ‘eficiência Schumpeteriana’ [...]

que tem como raiz a endogeneização do

progresso técnico feita por estes últimos

(Baptista, 2000, p. 24-25).

A distinção entre as noções de efi-

ciência em Crescimento e eficiência Schumpeteriana

pode ser demarcada nos seguintes termos:a eficiência em Crescimento se preocupa emavaliar a alocação de recursos com ênfaseem seus efeitos sobre a taxa de crescimentoeconômico de longo prazo; a explicaçãopara as diferenças intersetoriais de cresci-mento constitui o ponto de partida da efi-

ciência Schumpeteriana, que considera o de-senvolvimento tecnológico como o princi-pal fator explicativo daquelas diferenças e omotor do crescimento econômico, enfati-zando-se ainda a relação entre padrões cor-rentes de especialização e mudança tecno-lógica, através dos efeitos dos primeiros so-bre o ritmo e a direção desta última (Dosi,Tyson e Zysman, 1989, p. 13).4

A definição de eficiência Schumpeteria-

na prescreve um padrão de especializaçãobaseado na exportação de produtos paraos quais se identifique um elevado grau deoportunidade, apropriabilidade e cumulati-vidade tecnológica.5 A idéia de oportunida-de tecnológica diz respeito às possíveis ro-

tas de desenvolvimento tecnológico – emtermos da possibilidade de aperfeiçoamen-tos e/ou ampliação do leque de “artefatos”tecnológicos e do seu escopo de aplicação– associadas a um dado paradigma tecno-lógico. Um grau elevado de oportunidadetecnológica significa um campo mais am-plo de possibilidades de introdução de ino-vações. Mas tal condição não é suficientepara justificar a decisão de inovar. A dispo-sição dos agentes econômicos privados deinvestirem recursos na exploração de opor-tunidades tecnológicas depende ainda decomo avaliam o retorno econômico espera-do com a inovação e a sua capacidade deapropriar-se deles. Quanto mais favoráveisforem as expectativas de “lucros monopó-licos” associados à inovação, menores se-rão as chances de que essas sejam facil-mente imitadas por terceiros, mais elevadoserá o grau de apropriabilidade privada dosretornos econômicos a elas associadas emaior será o estímulo à inovação.

Além da ênfase nos aspectos deoportunidade e apropriabilidade tecnoló-gica, a noção de eficiência Schumpeteriana ba-seia-se na hipótese de que o padrão de mu-dança tecnológica não é exógeno aos pa-drões correntes de especialização produtivae comercial. Estes últimos condicionarãoaquele primeiro, positiva ou negativamen-te, a depender do que ofereçam, em ter-

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4 É interessante observar quea reintrodução do tema datecnologia como fatorexplicativo dos padrões deespecialização no comérciosignifica a retomada de umapreocupação que já fora deRicardo. A diferença está emque esse autor tinha umavisão estática da tecno-logia, ao passo que osevolucionistas partem deuma concepção dinâmica.5 Os conceitos de oportuni-dade, apropriabilidade ecumulatividade tecnológicaperpassam grande parte daliteratura neo-schumpeteriana.Entre as referências básicas,destacam-se Dosi (1982,1984, 1987 e 1988), Nelsone Soete (1988) e Nelsone Winter (1982).

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mos de externalidades positivas, oportuni-dades e grau de aprendizado tecnológico.Isso significa dizer que a evolução dos pa-drões de especialização encerra um ele-mento de cumulatividade (“cumulativeness”),no sentido de que o padrão corrente dealocação de recursos – ao qual correspon-derá um determinado padrão de desenvol-vimento tecnológico – condiciona as pos-sibilidades futuras de especialização.

A eficiência Ricardiana é conceitual-mente incompatível com as noções de efi-

ciência Kaldoriana e Schumpeteriana. Funções deprodução e demanda homogêneas e “bemcomportadas” intra-setores e entre paísessão contrárias à idéia de que as atividadeseconômicas diferem entre si quanto às ca-racterísticas da tecnologia, aos atributos es-téticos e funcionais (reais ou imaginários)dos produtos e ao correspondente retornoeconômico, corrente e prospectivo, associ-ado a cada produto/setor de atividade.

Já a possibilidade de complementa-ridade entre as noções de eficiência Kaldoriana

e schumpeteriana parece evidente, desdeque se aceite a hipótese de uma vinculaçãodireta entre comércio exterior e progressotécnico. Assumindo que os produtos sãonão-homogêneos, ao que se associa a exis-tência de preferências não-uniformes noconsumo, não é forçosa a hipótese de umacorrelação positiva entre maior grau de di-

ferenciação dos produtos e maior propen-são a consumir quanto mais elevado o nívelde renda. Admitindo-se que a possibilidadede tornar a demanda positivamente maiselástica em relação à renda depende muitofortemente da capacidade dos produtoresde diferenciarem seus produtos, e, associan-do-se tal capacidade à introdução de mu-danças técnicas na produção, decorre logi-camente a proposição de uma interação po-sitiva entre dinamismo da demanda (internae externa) e capacidade de inovação.6

A hipótese de uma vinculação posi-tiva e direta entre comércio exterior e pro-gresso técnico acha-se explícita no clássicoartigo de Burenstam-Linder (1961), poden-do ser também notada em Kaldor (1981).Ela estabelece uma vinculação direta entreo potencial de expansão das exportações eo grau de diferenciação de produtos, com aimplicação, para a teoria do comércio, deque a contribuição das exportações para ocrescimento econômico será então consi-derada como forte dependente da capaci-dade dos produtores de inovar continua-mente seus produtos a fim de alcançar osmercados dos países de renda mais eleva-da. Essa idéia de uma complementaridadeentre as noções de eficiência Kaldoriana eschumpeteriana será retomada e aprofun-dada por Reinert (1994). Partindo da ob-servação de que todas as experiências bem-

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6 Ainda que tal interação nãoocorra sempre e nem demaneira automática, hárazoável evidência empíricaem respaldo à hipótese deuma convergência entre osprodutos/setores intensivosem tecnologia e aqueles cujademanda internacionaltende a crescer a taxas maiselevadas e a produzir maiorefeito positivo sobre ocrescimento econômico.A esse respeito, ver Fagerberg(1995), Amable (1996),Dalum, Laursen e Verspagen(1996), Ross (2001).

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sucedidas de catching-up tiveram em comumuma estratégia de desenvolvimento nacio-nal que combinava estímulo às atividadeseconômicas consideradas “superiores” coma manutenção de mercados competitivos, eassumindo a hipótese – que é também Kal-doriana – de que algumas atividades sãomelhores que outras em termos da sua ca-pacidade de induzir o crescimento e o de-senvolvimento econômico, Reinert defendea tese de que o desenvolvimento econômi-co é um fenômeno activity-specific. Valendo-se dessa idéia, propõe-se então avaliar a efi-ciência do comércio, conquanto fator indu-tor do crescimento econômico, por meiode um índice de qualidade das atividadeseconômicas que as classifica de acordo comseu potencial de geração de riqueza e suacontribuição para o desenvolvimento eco-nômico. Por esse índice, aquelas atividadespara as quais se identifique a possibilidadede elevado (baixo) grau de oportunidadetecnológica são definidas como superiores(inferiores) (Reinert, 1994, p. 169).

Assim, em vez do critério de efi-ciência relativa, definida em termos de van-tagem comparativa de custos, Reinert pro-põe distinguir entre atividades de boa oumá qualidade segundo o grau de oportuni-dade tecnológica que elas encerram, por-tanto, segundo um critério de eficiência ab-soluta de custos. Trata-se, pois, de uma con-

cepção de eficiência diametralmente opos-ta à da teoria neoclássica, que considera asatividades econômicas como qualitativa-mente homogêneas, em termos dos seusefeitos sobre o crescimento econômico, demodo que seria indiferente ao desenvolvi-mento de um país que ele se especializasseem produzir computadores ou bananas.

2_ Ainda sobre os conceitosde eficiência no comércio:dificuldades operacionais

Deseja-se aqui chamar a atenção para al-gumas dificuldades relacionadas à opera-cionalização dos conceitos de eficiênciaacima discutidos. O ponto em questão éque, rigorosamente falando, nenhum da-queles conceitos se mostra diretamenteaplicável aos dados de comércio.

O conceito de eficiência Ricardiana ba-seia-se na definição de vantagem compara-tiva de custos. Sua aplicação implicaria anecessidade de ter em conta a composiçãorelativa dos preços e salários em cada paísconsiderado na transação comercial. Emtermos práticos, porém, o procedimentoadotado consiste em simplesmente tradu-zir a noção teórica de vantagem comparati-va no conceito empírico de vantagem reve-lada pelo comércio. E, embora existam in-dicadores indiretos de eficiência Ricardiana (p.

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ex., custo unitário do trabalho, produtivida-de total dos fatores), permanece a questãode que o custo de oportunidade da produ-ção local versus demanda externa não podeser diretamente estimado, como sugere a te-oria, posto que o pleno emprego dos fatoresde produção nos países envolvidos na tran-sação comercial nunca é uma hipótese quejamais se verifica.

A eficiência em Crescimento parte da hi-pótese de que os coeficientes de elasticida-de-renda da demanda internacional são di-ferentes de produto para produto, devendoa eficiência exportadora ser analisada à luzdesse critério. Portanto, a rigor, dever-se-iapartir de uma classificação das exportaçõesdefinida em termos de elasticidade-rendados produtos, o que via de regra não ocor-re. O que se faz, concretamente, é substitu-ir o que deveria ser um ordenamento explí-cito dos produtos segundo os coeficientesde elasticidade-renda, pela hipótese intuiti-va de que os produtos que apresentaremmaiores taxas de crescimento no mercadomundial corresponderão aos de mais altade elasticidade-renda.7

Uma segunda qualificação impor-tante é que, além da elasticidade-renda dademanda internacional, condicionam a ex-pansão das exportações: a elasticidade-pre-ço da demanda, os preços relativos (termosde troca) e a taxa de câmbio.8 É possível, as-

sim, que, mesmo um país cujo padrão decomércio seja de baixa qualidade, porquan-to baseado na exportação de bens com bai-xo potencial de crescimento da demandaem termos de elasticidade-renda, ele consiga,a despeito disso, elevadas taxas de cresci-mento das exportações, em decorrência,por exemplo, de uma tendência de quedados preços de seus produtos no mercadointernacional. Logo, sem a especificação dosefeitos preço e renda na explicação da evo-lução das exportações, corre-se o risco detomar por eficiência em Crescimento o que é tão-somente eficiência Ricardiana, ou seja, uma ex-pansão das exportações explicada por umaconjuntura de preços favorável ao merca-do comprador.

A aplicação do conceito de eficiência

Schumpeteriana ao comércio parece ser aindamais complexa. A dificuldade básica estáem conseguir operacionalizar (mensurar)os atributos de oportunidade, cumulativi-dade e apropriabilidade das inovações quecaracterizam o progresso técnico nos pro-dutos/setores exportadores e importado-res. Tal dificuldade decorre da complexida-de inerente aos processos de geração edifusão tecnológica, os quais, por sua natu-reza intrinsecamente dinâmica, envolvemsempre algum grau de incerteza “substan-tiva” (não passível de ser eliminável pormeio de cálculo probabilístico), encerram

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7 A hipótese básica por trásdeste raciocínio é a de que oconsumo de bens de “primeiranecessidade” tende a cair como aumento da renda, e quantomais alto o nível de renda, aopasso que o consumo de bensde “luxo” tende a fazer omovimento inverso.8 Permanecendo constantesestas três últimas variáveis –e somente nesta hipótese –,a elasticidade-renda seráo fator determinante. VerMcCombie e Thirwall (1994).

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determinações que são de natureza path de-

pendent (a direção imprimida ao progressotécnico não é aleatória, mas condicionadapor padrões previamente selecionados) emecanismos que são parcialmente tácitosou específicos aos setores/produtos (as ca-pacitações e os ativos – tangíveis e intangí-veis – são específicos à firma; as estratégiascompetitivas e os condicionantes técnico-produtivos respondem às especificidadesdo padrão de concorrência vigente no se-tor de atuação das firmas; as trajetórias tec-nológicas respondem também às especifi-cidades técnico-científicas colocadas porcada particular paradigma).

Na expectativa de algo que sirva co-mo medida do grau de oportunidade, apro-priabilidade e cumulatividade tecnológica,a alternativa tem sido a construção de indi-cadores de intensidade tecnológica, utili-zando-se geralmente como proxy para atecnologia uma ou mais das seguintes va-riáveis: taxa de desenvolvimento de novosprodutos; aquisição/depósito de patentes;gasto com P&D como proporção da pro-dução/vendas. A hipótese, implicitamenteassumida, é a de que uma maior intensidade

em tecnologia pode ser tomada como si-nônimo de elevada oportunidade, cumula-tividade e apropriabilidade tecnológica.

Ocorre que as condicionantes dadinâmica tecnológica apenas se revelam,

em sentido pleno, conquanto expressãodas características essenciais das trajetóriastecnológicas. De modo que a complexida-de inerente ao caráter cumulativo do conhe-cimento tecnológico e à natureza sector-firm-

specific da apropriabilidade e oportunidadetecnológica não parece ser absolutamenteresolvida por meio da utilização de indica-dores de intensidade tecnológica, e isso pe-la razão primeira de que estes não conse-guem ter em conta as diferenças relativasaos mecanismos de introdução e difusãotecnológica no interior e entre setores deatividades.9

Uma segunda dificuldade que seapresenta à aplicação do conceito de eficiên-

cia Schumpeteriana decorre da constatação deque o fato de um país exportar produtosintensivos em tecnologia não é por si só ga-rantia de que ele disponha de uma elevadabase tecnológica, no sentido schumpeteria-no, ou seja, que signifique a construção decapacidade inovativa endógena. A vincula-ção – quantitativa e qualitativa – entre ex-pansão das exportações e das importaçõesdeve ser aqui considerada.10 Ocorrendo dea expansão das exportações ter como con-trapartida elevados coeficientes de impor-tação de insumos (equipamentos, compo-nentes, etc.), e a depender das característi-cas dos ativos tecnológicos adquiridos – emtermos da importância relativa do conteú-

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9 Diversas análises sugeremesta interpretação. Ver, porexemplo, Pavitt (1984), Pavitt(1989), Patel e Pavitt (1994) eGuerrieri (1994).10 Note que tal necessidadese coloca também para osmodelos kaldorianos, daí oporquê de esses consideraremnão apenas a elasticidade-renda das exportações, comotambém a das importações.

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do “público” e “protegido” da tecnologia–, bem como da forma de sua incorpora-ção na economia – no sentido da medidado esforço imitativo/adaptativo/inovativofeito para tal incorporação –, o resultadopode ser uma elevação da restrição externaao crescimento, no sentido Kaldoriano, aoinvés de uma ampliação da base tecnológi-ca endógena, no sentido schumpeteriano.

3_ Padrões de eficiênciano comércio e a possibilidadede "trade-offs": significadoe implicações normativas

A questão essencial implicada na discus-são sobre a possibilidade de trade-offs en-tre os diversos critérios de eficiência nocomércio diz respeito a se os efeitos cu-mulativos associados a um dado padrãode especialização caracterizam interações“virtuosas” de aprendizado tecnológico,ou se, ao contrário, traduzem círculos“viciosos” de eficiência, no sentido de en-cerrarem um baixo grau de aprendizadotecnológico e, por conseguinte, baixa ca-pacidade de aumento da qualidade da es-pecialização no longo prazo.

Parte-se do pressuposto de que a cu-mulatividade, como uma característica in-trínseca à evolução tecnológica, implica tam-bém supor que qualquer dado padrão cor-rente de alocação de recursos produtivos

encerra maior ou menor grau de rigidez(“stubbornness”), no sentido de que

[...] a configuração do perfil de especiali-

zação de determinado país – ou seja, o

tipo e composição das atividades econômi-

cas do país em causa e seu padrão de inser-

ção no comércio internacional – apresenta

uma inércia significativa dados os custos

de entrada, de saída e irreversibilidades...

(Baptista, 2000, p. 56).11

Deve ser notado que a propriedadede cumulatividade da tecnologia, que impri-me à direção do desenvolvimento tecnoló-gico um sentido de dependência à sua tra-jetória passada (“path-dependencie”), depõecontra a hipótese da teoria tradicional docomércio, segundo a qual o mercado por sisó, necessária e automaticamente, conduzi-ria a economia a uma situação de máximaeficiência alocativa, com o significado deque os ganhos no comércio seriam extensi-vos a todos os países que, sintonizados comsuas vantagens comparativas naturais, co-mercializem entre si.

Em realidade, nada garante que aalocação de recursos induzida pela estrutu-ra de vantagens comparativas Ricardianas se-rá igualmente benéfica para todos os parce-iros comerciais. Como observa Dosi (1987,p. 2), muito provavelmente ela não o seráno caso de países que não dispõem de umeficaz regime de apropriabilidade tecnoló-

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11 Ao analisarem a evoluçãodo padrão de exportação de20 países da Organization for

Economic Co-Operation and

Development (OECD), noperíodo 1965-1992, Dalum,Laursen e Villumsen (1996)chegaram a resultados quesustentam esta hipótese.Constataram que os padrõesde exportação analisadosmostraram-se estáveis nolongo prazo, embora tendocombinado um elemento derigidez – caracterizado pelaausência de modificaçõesestatisticamente significativasna composição setorial domarket-share dos países – commudanças incrementais.Concluíram, então, que... estes resultados não deixam,

portanto, dúvidas de que os padrões

nacionais de especialização das

exportações são muito resistentes

ou rígidos. Os padrões nacio-nais deixam suas impressõesdigitais nas prováveis traje-tórias do desenvolvimentofuturo... (Dalum, Laursen eVillumsen, 1996, p. 21)(grifo nosso).

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gica e cujo padrão de especialização se ca-racterize pela ausência de significativas ex-ternalidades positivas e por um baixo graude oportunidade e aprendizado tecnológi-co. Noutras palavras, o “ponto de partida”de cada país, no que tange aos aspectos degeração e difusão de artefatos e conheci-mentos tecnológicos, é um fator que im-porta em termos da capacidade de apropria-ção de ganhos no comércio associada a umdado padrão prevalecente de especialização.

A consideração deste último aspec-to remete a uma discussão importante, emtermos normativos, por suas implicaçõesrelacionadas à definição de estratégias deespecialização, qual seja, a possibilidade detrade-offs entre os critérios de eficiência Ricar-

diana, em Crescimento e Schumpeteriana. Aocorrência de um trade-off pode ser defini-da como descrevendo uma situação emque a condição de máxima eficiência aloca-tiva de curto prazo (Ricardiana) ou não sig-nifique o máximo crescimento econômicode longo prazo ou não corresponda a umpadrão de especialização que mostre umelevado grau de oportunidade e aprendiza-do tecnológicos que o habilite a potenciali-zar o crescimento da economia para alémdo seu nível corrente. Ou seja, a existênciade trade-offs caracteriza uma situação emque os critérios de eficiência no comércionão convergem entre si.

Tal discussão pode ser problemati-zada com base na seguinte indagação: sobque condição poder-se-ia esperar que umaalocação de recursos guiada pelos sinais demercado e dirigida pelo objetivo do máxi-mo retorno de curto prazo para o capitalinvestido (eficiência Ricardiana) pudesse coin-cidir com a maximização do potencial decrescimento de longo prazo da economia(eficiência em Crescimento) e da taxa de mu-dança tecnológica (eficiência Schumpeteriana)?Seriam duas as condições requeridas a talconvergência quanto aos critérios de efi-ciência no comércio: que a economia fun-cionasse em condição de concorrência per-feita e, nesse sentido, que qualquer dadopadrão corrente de especialização corres-pondesse à máxima eficiência alocativa decurto prazo; que a lucratividade esperadanos setores de alta-elasticidade renda dademanda internacional e elevada oportuni-dade tecnológica fosse a mesma auferidados setores correntemente explorados pelaespecialização no comércio. Satisfeitas es-sas condições, poder-se-ia supor que a es-pecialização ótima no curto prazo mostrar-se-ia igualmente ótima no longo prazo.

Sob tais hipóteses, variações nospreços de mercado desencadeariam umprocesso de “ajustamento Ricardiano”(Dosi, Pavitt e Soete, 1990, p. 226), à basedo qual as empresas responderiam pronta-

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mente aos novos sinais do mercado, mo-vendo-se na direção das atividades que aten-dessem à condição de máximo lucro/míni-mo custo. Contudo, uma vez que se supõea tecnologia constante, pode-se tambémsupor que eventuais ganhos de eficiênciasurgidos desse processo seriam do tipo“once-and-for-all”.12

Suponhamos, agora, uma situaçãoem que tais condições não se verifiquem,digamos, uma economia cujos mercadosde capitais e de produtos funcionem demodo “imperfeito”. Na hipótese de imper-feições no mercado de capitais,

[...] empresas ou futuros empreendedores

podem ser capazes de levantar fundos pa-

ra investimento em indústrias que ofere-

çam altas taxas de retorno sobre um rela-

tivo curto período de tempo, mas incapa-

zes de levantar fundos para investimento

em indústrias que ofereçam retornos que

são incertos, dadas as condições existentes

do mercado mundial, e recuperáveis so-

mente no longo prazo.

De modo análogo, a existência deimperfeições nos mercados de produtos

[...] torna impossível reconciliar plena-

mente os riscos e os retornos futuros sobre o

investimento corrente em indústrias e tec-

nologias emergentes e incertas. [...] Devi-

do a retornos crescentes, os sinais correntes

de mercado podem ser indicadores engano-

sos de lucratividade futura (Dosi, Tyson e

Zysman 1989, p. 17).

Conclui-se disso que, na ausênciade imperfeições de mercado,13 a especializa-ção ótima no curto e no longo prazo pode-riam convergir entre si, não havendo, po-rém, nenhuma garantia de que tal ocorra,sendo outra a situação.

A teoria evolucionista, por seu tur-no, concebe a tecnologia, o mercado e a re-lação entre ambos, numa visão diametral-mente oposta à da ortodoxia econômica.Os evolucionistas interpretam os fenôme-nos relacionados à mudança técnica e seus

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12 Neste sentido, observa-seque uma deficiência crítica dateoria ortodoxa“[...] é seu tratamento da

informação tecnológica como

exógena ao sistema econômico,

e, conseqüentemente, sua falha

em oferecer qualquer entendimento

de que mudanças na tecnologia

(ou gostos) são mais adequada-

mente descritas como um

processo econômico – uma falha

que está estreitamente ligada à

dependência do método de

análise de equilíbrio de longo

prazo” (Metcalfe, 1999, p. 5).13 Compartilhando dainterpretação evolucionista,entendemos não se tratar aquide “imperfeições de mercado”– uma terminologia cujo

significado conceitualinscreve-se no referencialneoclássico –, mas deassimetrias (nos mercadosde capitais e de produtos)que decorrem decaracterísticas inerentes aoprocesso de inovação e demudança tecnológica, valedizer, da incerteza intrínsecaa esse processo. Não fosseessa incerteza, os capitalistasincluiriam nas suas projeçõesde rentabilidade os diferentesimpactos do potencial deinovações futuras em cadaprojeto de investimento,decidindo então,à base desse cálculoprospectivo, o padrãode especialização corrente.

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efeitos sobre o comércio e o crescimentoeconômico, baseados na concepção de quea tecnologia e sua dinâmica evolutiva sãoendógenas ao sistema econômico; exercemimportante influência na evolução das van-tagens comparativas e constituem a princi-pal fonte de criação de vantagens absolu-tas, portanto, da competitividade estruturalda economia; têm implicações dinâmicassobre o ritmo e a direção do progresso téc-nico e o potencial de longo prazo de cres-cimento econômico, condicionando, por-tanto, as possibilidades futuras de especia-lização produtiva e de inserção comercialdo país.

Afirma-se, assim, o caráter endóge-no e dinâmico da tecnologia e o seu papeldeterminante na obtenção de vantagensabsolutas de custos, e a visão de que o mer-cado, para além de sua função alocativa,constitui-se no principal mecanismo pormeio do qual se processa a “seleção” das es-truturas organizacionais, produtivas e tec-nológicas. Admitindo-se que a economiaopere em condições de mudança tecnoló-gica, isto é, em condições não-estacionári-as, o que se entende por “seleção” envolvefundamentalmente a descoberta e o apro-veitamento de oportunidades geradas ouimpulsionadas pela dinâmica do processoinovativo. Tal processo assume, assim, acaracterística de um “ajustamento dinâmi-

co”, por meio do qual operam as forçastransformadoras da mudança tecnológica(Dosi, Pavitt e Soete, 1990, p. 226).

Ressalte-se ainda que esse processoé não-linear, ou seja, em cada dado mo-mento, e em ritmos diferenciados, setores/países estarão se aproximando ou se afas-tando da fronteira tecnológica internacio-nal, tornando-se relativamente mais ou me-nos competitivos. A pressão exercida poresse “ajustamento dinâmico” sobre as van-tagens absolutas de custos dos setores/paí-ses, sobrepõe-se aos efeitos estáticos do“ajustamento Ricardiano” para definir acomposição do comércio e o nível de com-petitividade internacional de qualquer dadaeconomia (Dosi e Soete, 1983, p. 219).

A distinção entre os processos deajustamento “estático” (Ricardiano) e “dinâ-mico” (Kaldoriano e Schumpeteriano) aju-da a melhor perceber as implicações dinâ-micas associadas ao surgimento de trade-offs

entre as diferentes noções de eficiência nocomércio. Comecemos por observar que

[...] enquanto o mecanismo das vantagens

comparativas, baseado nos preços relativos

e na lucratividade relativa, indubitavel-

mente ainda opera e pode explicar a espe-

cialização relativa, [...] qualquer medida

absoluta da competitividade internacional

de um país ou atividade é primariamente

baseada em suas vantagens/desvantagens

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absolutas (em termos da tecnologia dos pro-

dutos e da produtividade do trabalho) (Dosi

e Soete, 1983, p. 211).

Por conseguinte, a composição docomércio e o nível de competitividade in-ternacional de uma economia qualquer de-terminar-se-ão em termos de eficiência Schum-

peteriana, sendo, portanto,

[...] menos uma função de sua dotação na-

cional de fatores e vantagens comparativas

naturais, e mais uma função do complexo

de estratégias comerciais, industriais e tec-

nológicas seguidas por empresas e nações

(Guerrieri, 1994, p. 199).

Assim, adicionalmente ao que já vi-mos discutindo, deve ser notado que, nocaso de não haver uma aderência entre oscritérios de eficiência alocativa estática (Ri-cardiana) e dinâmica (Kaldoriana e Schum-peteriana), a distância entre esses expres-sar-se-á fundamentalmente sob a forma dehiatos tecnológicos. Por outro lado, ressal-ta-se que o padrão futuro de vantagens/desvantagens absolutas é condicionado tam-bém pelo padrão alocativo corrente.

De um ponto de vista normativo, aconsideração desse condicionamento mos-tra-se particularmente importante na situa-ção em que o padrão corrente de alocaçãode recursos tome a forma de uma especia-lização do tipo Ricardiana, quando se su-põe que os padrões de especialização e de

lucratividade setoriais respondam a deci-sões alocativas invariavelmente guiadas pe-la base de vantagens comparativas naturaisdo país. Supõe-se ainda que qualquer queseja o perfil de especialização resultante des-sa orientação, ele terá o significado de umaproveitamento máximo dos recursos eco-nômicos à disposição de cada agente eco-nômico e, por extensão, significará o me-lhor emprego possível dos recursos da eco-nomia (máxima eficiência alocativa). E nãohá por que esperar que, havendo algum tra-

de-off entre tal critério de eficiência, estáti-ca, e os critérios de eficiência dinâmica, osmecanismos endógenos de mercado por sisós conduzam à sua eliminação, já que es-tes (mecanismos de mercado), por hipóte-se, terão desde sempre operado com a má-xima eficiência possível.

Ademais, analisando essa questão sobo prisma dos agentes econômicos indivi-duais, deve ser observado que, mesmo queos empresários pudessem perceber comclareza as implicações definitivas de suasdecisões presentes – por exemplo, que adecisão de não investir ou investir poucoem tecnologia fragiliza suas possibilidadesde retorno futuro –, o caráter cumulativo eirrevogável das decisões anteriores podetornar muito difícil alterar o padrão cor-rente de especialização em direção a ummais eficiente, do tipo Schumpeteriano.

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4_ ConclusõesAs concepções de eficiência no comércioacima discutidas diferem entre si quantoà definição, explícita ou não, do que seja“qualidade” da especialização. A eficiência

Ricardiana, a bem dizer, nem mesmo temqualquer preocupação diretamente rela-cionada à qualidade do comércio. Ques-tões elementares, sob a perspectiva de seavaliar o padrão de comércio, tais como,o que, quanto e como se exporta, não sãocon- sideradas pela eficiência Ricardiana. Ahipótese implicitamente assumida é a deque a satisfação da condição de eficiência

Ricardiana seria também garantia de se-rem exportados os produtos “certos” e nasquantidades “certas”. Já a definição deeficiência em Crescimento baseia-se explicita-men- te na concepção de que um padrãode comércio de boa qualidade é o que secaracteriza pela exportação de produtoscom elevada elasticidade-renda no mer-cado in- ternacional. As questões de o que

e quanto se exporta são então avaliadascom base no critério de sua aderência ounão a essa noção de eficiência no comér-cio. Sob a definição de eficiência Schumpete-

riana, a idéia de um perfil de especializa-ção de boa qualidade se expressa numpadrão de exportação caracterizado porprodutos que signifiquem elevadas opor-tunidades futuras de desenvolvimento tec-

nológico e de expansão das exportaçõesno longo prazo.

As definições de eficiência no co-mércio aqui discutidas envolvem concep-ções distintas sobre o que seja “qualidade”da especialização e diferenciam-se entre sipelo modo como se relacionam com o fa-tor tempo. Há nítida contraposição entre,de um lado, o conceito de eficiência Ricardia-

na, cuja perspectiva de análise é estática ede curto prazo, e de outro, os conceitos deeficiência em Crescimento e Schumpeteriana,

que compartilham da preocupação com asimplicações dinâmicas e de longo prazo as-sociadas a um dado padrão corrente de es-pecialização.

Nos termos da eficiência em Crescimen-

to, trata-se de considerar a interação entremudanças de longo prazo na composiçãoda demanda e da renda internacionais e ca-pacidade de resposta ou de adaptação dospadrões nacionais de especialização comer-cial. A eficiência Schumpeteriana também seocupa dessas questões, mas o faz trazendopara o centro da discussão o papel da tecno-logia na configuração e evolução dos pa-drões de especialização e as implicações di-nâmicas colocadas pela interação entre tec-nologia, comércio e crescimento econômico.

De um ponto de vista normativo, adiscussão em torno da possibilidade de tra-

de-offs entre um padrão de especialização

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que atenda ao critério de eficiência Ricardiana,um que seja aderente ao critério de eficiência

em Crescimento e um que corresponda ao cri-tério de eficiência Schumpeteriana, deixou claraa importância de se conferir à análise dopadrão de especialização uma perspectivade longo prazo. Ressalta-se, nesse sentido,que os efeitos “virtuosos” ou “perversos”que decorrem a um dado padrão correntede especialização não se restringem ao pe-ríodo de curto prazo, vale dizer, à esfera dadistribuição intersetorial dos recursos pro-dutivos disponíveis na economia. Tampoucotem sentido supor que o ganho ou perdade eficiência inerente ao processo de rede-finição do padrão corrente de especializa-ção seja mais bem caracterizado nos termosde um efeito “once-and-for-all”, posto que osefeitos alocativos e técnico-produtivos as-sociados a qualquer dado padrão de espe-cialização são de caráter cumulativo e afetamo ritmo e a direção da mudança tecnológicae do potencial de crescimento econômicono longo prazo.

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Artigo recebido em maio de 2005;aprovado em abril de 2008.