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#20 Editorial Nohemí Ibáñez Brown Textos a psicanalista, a mulher, a interpretação Jorge Forbes (AMP/EBP) Passe e Autoridade no Século XXI Angelina Harari (AE, membro da EBP-AMP) Mulheres na Cidade A MULHER DE ROXO Julia Solano (Parcipante EBP-Ba) WiFi A ESCRITURA DO FEMININO Maria Carolina Schaedler (Parcipante da Delegação Paraná) Comissão Cienfica Feminino e o Feminismo. Notas Sobre Simone de Beauvoir e J. Lacan Crisna Duba (AMP/EBP) LACAN FEMINISTA OU O FEMININO EM LACAN Ondina Maria Rodrigues Machado (AMP/EBP) Comissão de Finanças FÉ!... menino! Fest Cien Ausmo Índice

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#20

EditorialNohemí Ibáñez Brown

Textosa psicanalista, a mulher, a interpretação

Jorge Forbes (AMP/EBP)

Passe e Autoridade no Século XXIAngelina Harari (AE, membro da EBP-AMP)

Mulheres na CidadeA MULHER DE ROXO

Julia Solano (Participante EBP-Ba)

WiFiA ESCRITURA DO FEMININO

Maria Carolina Schaedler (Participante da Delegação Paraná)

Comissão CientíficaFeminino e o Feminismo. Notas Sobre Simone de Beauvoir e J. Lacan

Cristina Duba (AMP/EBP)

LACAN FEMINISTA OU O FEMININO EM LACANOndina Maria Rodrigues Machado (AMP/EBP)

Comissão de FinançasFÉ!... menino! Fest

CienAutismo

Índice

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TEXTOS Editorial

Sem deixar de lado as referências tradicionais da psicanáli-se, com textos breves e precisos, o Boletim Outras Palavras nos tem convidado, ao longo dos diferentes números, a um esforço a mais. A um mais ainda. A produzir Outras Palavras colocando à prova os conceitos a partir de referências contemporâneas.

Assim, este número se inicia com dois textos cuja enuncia-ção já nós chama de entrada e nos convoca à reflexão. Ange-lina Harari abre o boletim com a instigante questão sobre a autoridade no século XXI. Com um belo depoimento nos trans-mite a invenção que seu trabalho como AE possibilitou. O que resulta na autoridade como uma invenção feminina que não passa pelo universal, mas pelo singular.

Por outro lado, com seu estilo marcante, Jorge Forbes re-lata um encontro com Françoise Dolto, conhecida psicanalista de crianças. A tocante anedota transmite, entre outras coisas, que a posição do analista com relação às crianças não passa nem pela maternagem, nem pelo apelo à criança como ser em desenvolvimento, mas sim, como nos ensina Lacan, convoca a criança enquanto sujeito inclusive no trato com os pais. Falan-do em crianças, a contribuição de Tânia Abreu relata o recente trabalho de colegas da AMP em Paris sobre a clínica e a política do Autismo, e propõe pontos precisos e can-dentes a serem debatidos na Conversação sobre o Autismo, considerando a particularidade brasileira e o que a Clínica com o sujeito Autista ensina. Um debate que promete!

Para Mulheres na cidade, Julia Solano nos presenteia com uma lenda urbana que marcou Salvador: A mu-lher de roxo, cujo interesse é baseado na curiosidade que essa figura feminina desperta na cidade. A mulher de roxo se apresenta como um enigma encarnado e que se mantém aberto apesar das muitas respostas esboçadas.

Já Carolina Schaedler, para o sinal de WiFi, traz a questão da passagem do silêncio à escritura, onde o fe-minino se apresenta pelo que acontece no corpo, por um silêncio vivo que toca o corpo. Nesse texto, Barthes e Lispector nos ensinam sobre essa articulação.

Avançando mais ainda sobre a arte, a resenha de Lívia Pereira transmite o vivo debate entre Tânia Abreu e o dramaturgo Luiz Marfuz sobre A voz da Mulher no teatro. Desde o início se apresenta uma precisão insti-gante: “a voz da mulher no teatro é a voz do silêncio”. Assim, apesar das grandes figuras do feminino no tea-tro, como Antígona e Medeia, a mulher estava ausente nas encenações até a figura da Diva. Nessa passagem, se pontua uma articulação sobre a mulher e o feminino.

Além dessas contribuições, a comissão científica propôs dois textos que fazem dobradiça e que esclare-cem a relação entre psicanálise e feminismo. Mais especialmente, entre feminismo e feminino. Tanto o texto de Ondina Machado como o de Cristina Duba colocam a histeria como ponto de partida para a psicanálise e para o feminismo. Porém, as pontuações de cada uma são diferentes. Através de 4 aforismos que, aparente-mente, fazem convergir psicanálise e feminismo, Ondina pontua os entrecruzamentos e distâncias entre os dois, trazendo precisões epistêmicas ao longo da obra de Lacan. Cristina trata a problemática a partir da obra de Simone de Beauvoir, O Segundo Sexo. Retomando o valor e a riqueza desta obra, ela consegue situar be-lamente que, justo no ponto onde este escrito fracassa como movimento político, ele surge como literatura. Lugar onde o feminino pode ser pensado.

“É desse encontro com o silêncio que possivelmente surge uma literatura inesquecível”. Finalizo com esta tocante frase de Cristina e que de alguma maneira interroga e enlaça os trabalhos deste número.

Espero que cada um destes textos os toque e lhes abra questões. Como estamos às portas do XIX Encontro Brasileiro, avançaremos nelas, no Encontro dos corpos, nas mesas, nas conferências e até nas festas, porque não!

Como aperitivo, recordo-os da conferência de Éric Laurent: “A disposição feminina do gozo”. E logo de-pois desta, o lançamento de seu último livro: “A psicanálise e a escolha das mulheres”.

Missing Letter by NotBlackEnough

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Os títulos já animam e empolgam. E para estar à altura desta empolgação a comissão preparou um vivo e festivo lançamento, na sexta-feira, dia 23, às 20 horas, no Hotel Pestana. Preparem-se para o autógrafo!

Aguardamos vocês em Salvador!Não esqueçam que a festa Fé-menino é no dia 24. Para ficarem atualizados, acessem o site www.mulhe-

resdehoje.com.br e o facebook. Aqueles que ainda não fizeram sua inscrição, devem ficar atentos aos novos valores.

AVISO IMPORTANTE: Lembramos a mudanças nos horários dos eventos CIEN e AUTISMO. CIEN – sexta-feira, dia 25/11, de 8h às 12h.Conversação sobre AUTISMO – domingo, dia 25/11, de 12h às 1430 h.Lembrando que mesmo que a Conversação sobre Autismo seja gratuita para quem se inscrever no evento

do CIEN e do NR-CEREDA, é necessário confirmar a inscrição nos três eventos.Até em breve,

Nohemí Ibáñez Brown

TEXTOS

a psicanalista, a mulher, a interpretação.Françoise DoltoJorge Forbes (AMP/EBP)

O que vou lhes contar ocorreu na Maison Verte, instituição parisiense de acolhimento de crianças de zero a três anos, criada pela psicanalista Françoise Dolto. Quando na juventude de minha formação psicanalítica, tive a oportunidade de passar algumas tardes naquele local, acompanhando o trabalho de Dolto, já, então, ícone da psicanálise dita infantil.

Em uma tarde, um casal relativamente jovem chegou para a consulta com cara de desespero. Tra-ziam um bebê nos braços, o qual aparentava uma fraqueza importante. Deveria ter uns três ou quatro meses de vida.

Dolto, cheia de atenção vigilante e afetuosa, ficou sabendo dos pais que ao desespero diante da criança que não comia, razão por estar esquálida, somava-se a preocupação com o desemprego do pai, a sobrecarga da mãe, e as contas que não fechavam no mês.

Assisti, em seguida, Françoise Dolto se dirigir diretamente ao bebê, sem qualquer atenção ao fator com-preensão, e lhe explicar, olhos nos olhos, que ela, Dolto, entendia muito bem que ele não quisesse comer, uma vez que sua chegada poderia ser pensada como em má hora, e que o melhor talvez fosse desaparecer. Contestou, no entanto, afirmando que ele estava enganado, pois sendo tão querido e esperado, sua morte precoce retiraria dos seus pais o único efetivo alento naquele momento difícil de vida. E assim se despediu dos três – filho, mãe e pai – marcando um retorno para a semana seguinte. Quando saíram, Dolto me disse: “Você vai ver só o que vai acontecer”.

No segundo encontro, confirmando a previsão da analista, eram outras pessoas que estavam ali. O bebê estava comendo, e bem.

Ao final do atendimento, a doutora me falou: “Você viu como os bebês falam? Você viu a prova?”. Aí, para mim, foi demais. Com a delicadeza devida, contestei que não era que bebês falassem, mas que – como Lacan havia demonstrado no estádio do espelho... – ao falar com o bebê, ela estava realmente falando a seus pais que, por conseguinte, tinham mudado sua posição e possibilitado a alteração sintomática.

Dolto não me deixou avançar muito em minha peroração: “Sim, sim – me retorquiu – eu também conheço o ‘seu Lacan’ e bastante bem. Além de companheiros de toda uma vida, somos mesmo muito amigos. Agora, que ele o diga com o espelho, é interessante, quanto a mim, digo e mostro – como você viu – que os bebês compreendem e sabem falar”.

Pano rápido.

Françoise Dolto © Jean-Régis Roustan, Roger-Viollet

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PASSE E AUTORIDADE NO SÉCULO XXI*Angelina Harari (AE, membro da EBP-AMP)

A autoridade do século XXI será mas-culina ou feminina? Abordarei a ques-tão do passe e da autoridade no séc. XXI a partir de uma entrevista com Éric Laurent feita por um jornalista de Bue-nos Aires em dezembro último.1 Nessa entrevista, Laurent extrai uma questão relativa às mulheres: em que podem elas encarnar uma solução para a cri-se global da autoridade? De saída, ele especifica que as mulheres não virão a ocupar o lugar vazio deixado pelo declí-nio da figura paterna. A psicanálise bus-ca inventar outras figuras da feminilida-de. Uma mulher pode particularmente encontrar um modo de se alojar no fan-tasma de um homem, pelo fato de que é sensível ao que ele tem de singular. Esta invenção feminina apresenta um traço específico: as mulheres, ao se interes-sarem pela singularidade, dedicam-se à particularidade do homem. Não é este o caso de figuras bastante conhecidas como a da virgem, da dama de ferro, ou ainda a da mãe.

No meu caso o significante-mestre, a mulher dura, a patroa, constituía uma identificação maior. Entrando em opo-sição com um gozo da clandestinidade, um gozo clandestino, esse significante--mestre estava no cerne de um conflito freudiano clássico entre desejo e ideal. A mulher dura teria particularmente a oportunidade de se manifestar na vida institucional. Ela representava, como tal, uma saída, uma solução possível para sair do gozo clandes-tino, ocupando posições nas instâncias, na organização das atividades da EBP, ou mesmo na AMP. Isto cons-tituía, deste modo, uma via para mim viável, mas fundada na dureza e na solidez.

No momento de minha nomeação como AE, concluía meu mandato na presidência da EBP. Já fizera parte de todas as instâncias, no âmbito local, nacional e internacional. Presidi o Congresso da AMP em Comanda-tuba, o primeiro Encontro Americano, com Flory Krüger e Maria Hortênsia Cárdenas etc., etc..

Ora, depois da queda deste significante-mestre, a ‘dama de ferro’, uma nova autoridade surgiu, o AE em exercício, que se dedica às questões fundamentais, aos problemas cruciais da psicanálise. Com as aporias da singularidade feminina, trata-se de outra forma de autoridade, a analítica, eu diria.

Tal foi minha experiência, que não é universal, mas singular. Dizendo de outro modo: disjunta do universal. Não é para todo AE, não se pretende o mesmo para todo AE, diferente desta minha experiência, marcando bem a distinção, um AE nomeado na mesma época, ora, preside a AMP.

Eis como, em meu caso, se marcou a ligação entre a saída de uma experiência de passe e a autoridade no séc. XXI: a resposta da psicanálise à crise global da autoridade jamais será universal.

*Extrato de uma apresentação sobre o tema ocorrida em mesa redonda na ECF, no dia 31/01/2012.1 Entrevista publicada na Revista de Cultura Ñ, Clarin, Buenos Aires, dezembro de 2012.

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A MULHER DE ROXOJulia Solano (Participante EBP-Ba)

Rua Chile, segunda metade do século XX, antigo e badalado centro comercial de Salvador. Eis que sur-ge uma mulher descalça com uma longa manta roxa, usando um torço e um enorme crucifixo dourado. Por vezes aparecia vestida de noiva, carregando um bu-quê de flores, véu e grinalda.

Misto de santa e dama, sempre se lembrava de re-tocar a maquiagem usando os retrovisores dos carros e chamava a atenção pela forma educada com que pedia dinheiro às pessoas que por ali passavam. Ins-pirava o horror e ao mesmo tempo a fascinação dos baianos, que se perguntavam qual era a história da-quela misteriosa mulher. Isto nunca se soube ao cer-to, mas as hipóteses são muitas. Alguns dizem que ela havia perdido a fortuna e enlouquecido; outros defendiam que ela teria visto a mãe matar o pai e depois suicidar-se; há ainda a versão de que ela teria enlouquecido após ter sido abandonada no altar. No entanto, todas as versões apontam para um sujeito devastado diante do desfalecimento dos semblantes, em pleno deserto do real.

Florinda Santos, que passou a ser conhecida como a “mulher de roxo”, figura lendária do imaginário po-pular baiano, intrigou cineastas, jornalistas e artistas plásticos. Glauber Rocha inspirou nela um de seus personagens. Documentários e entrevistas foram realizados com ela. O seu mistério, porém permanece. Nossa mulher de roxo, portanto, personifica a loucura feminina. Ao mesmo tempo musa, medusa e Medeia, encarna o horror e a fascinação inerentes ao feminino, trazendo de novo a velha pergunta que permanece sem resposta: o que quer uma mulher?

TEXTOS WIFI

A ESCRITURA DO FEMININOMaria Carolina Schaedler (Participante da Delegação Paraná)

Há um grande silêncio dentro de mim. E esse silêncio tem sido a fonte de minhas palavras. E do silêncio tem vindo o que é mais precioso que tudo: o próprio silêncio 1.

Barthes distingue duas vias de acesso ao texto: a do prazer e a do gozo. Enquanto a primeira visa o sentido, a compreensão e a sedução do leitor, a segunda testemunha uma escritura que encerra a “articulação do corpo naquilo que não é do registro do sentido e da linguagem.”2

A operação analítica se constitui como uma experiência ética que se movimenta neste segundo regime de leitura, realizado no espaço de derrocada da estrutura e da gramaticalidade. Ao fazê-lo, permite que o sujeito, mais próximo ao real que o afeta, possa suportar o não lisível.

É nesse sentido que, ao produzir um leitor-letrado – afetado pela letra, esse traço que recorda a impossi-bilidade de tudo dizer e a solidão do gozo – a psicanálise se dirige ao feminino. A posição feminina pressupõe gestar e parir palavra para além do universal, refratária à apreensão pela via da metáfora. Convoca a palavra “atapetada de pele”3, na qual ecoam silêncio e suspiro que carregam, en corps, o gozo do Um.

NOTAS1. LISPECTOR, C. A aprendizagem ou o livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Rocco, 1998, p. 71.2. BARTHES, R. Le plaisir du texte. Paris: Ed. du Seuil, 1982, pp. 104-105.3. BARTHES, R. Op cit.

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Feminino e o Feminismo. Notas Sobre Simone de Beauvoir e J. LacanCristina Duba (AMP/EBP)

A psicanáliseA psicanálise nasce da escuta das

histéricas. Ao reconhecer em seu sofri-mento o peso das palavras, Freud pôde enunciar sua mais célebre frase, aquela que inaugura a psicanálise: “A histérica sofre de reminiscências”. Escutá-las foi dar voz ao enigma que se pôde enunciar para além de seu espetáculo grotesco. Escutá-las em seus lapsos, sonhos, sin-tomas foi dar voz ao que aparecia como escândalo. Escutar as histéricas, mulhe-res histéricas, assim, foi fundar na cultu-ra o inconsciente.

Da escuta das histéricas aos impasses do final de análise, a figura da mulher foi sempre um fio que conduziu o fundador da psicanálise pelas trilhas dessa grande experiência da era contemporânea, seu fio condutor e também sua pedra no caminho. Afinal, em suas úl-timas páginas, no ocaso de sua obra, Freud fazia ressoar a pergunta: “O que quer a mulher?” Freud teve a delicadeza de não respondê-la, e sustentou que a tarefa caberia às gerações vindouras, às analistas mulheres restaria a tarefa de descortinar esse enigma, de forjar respostas ao que não se sabe desse “continente ne-gro”, como o chamou então.1

Já na ordem do saber analítico se introduzia, quanto ao feminino, uma abertura (já anunciada desde a formulação da saída incompleta do Édipo feminino), um desconhecido que, em Lacan, tomará a própria for-ma do impossível de ser dito, que não cessa de insistir no que se diz, que se anuncia nos sintomas e que se presentifica no feminino. O que era então um rochedo, em Freud, resulta, em Lacan, na constatação de um impossível, imposto pela linguagem.

Para Freud, a menina, tal como o menino, cedo se interessa pela diferença sexual, ela faz a primeira cons-tatação da falta, com a qual organiza seu mundo. Na menina, a visão do pênis a confronta com uma inelutável constatação da falta. Isso tem a força de uma certeza que, por mais que ela se defenda, se inscreve como um saber: sabe que não tem e vai em direção a ele. Ao mesmo tempo, duas renúncias e dois deslocamentos se

1 Freud, S. “A questão da Análise Leiga” (1926), vol. 20. Rio de Janeiro: Ed. Imago, 1976.

Simone de Beavour

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impõem a ela no caminho para a feminilidade. Renunciar ao gozo clitoridiano para aceder ao gozo vaginal e renunciar à mãe e se dirigir ao pai. Ao contrário do Édipo masculino, cuja renúncia se faz sob a perspectiva de um adiamento, na menina ela se faz, não só duplamente, como sob o pano de fundo da constatação de que não tem o falo, o que a leva a um ressentimento insuperável em relação a sua mãe. Insuperável e que, portanto, mais a prende a sua mãe, fonte de sua insatisfação, muitas vezes devastadora. Édipos assimétricos, na menina, ao contrário do menino, o Édipo não se conclui, uma renúncia definitiva não se dá sobre esse fun-do de insatisfação e a menina permanece ligada ao pai e, Freud dirá depois, também à mãe. Todo seu longo trabalho de investigação sobre a sexualidade feminina demonstra que esta não é então dada, há um longo percurso que se impõe à menina percorrer, desde a constatação da diferença sexual até as consequências da dedução da castração materna. Percurso edipiano que a seu termo resta inacabado, inconcluso, incompleto.

A menina não nasce mulher, torna-se mulher Três saídas se colocam nessa direção: a inibição da sexualidade, a virilidade e a saída propriamente femi-

nina. Nessa saída está implicado um deslocamento: não renuncia ao falo, mas trata de obter dele um substi-tuto, um filho. A feminilidade em Freud comporta então a solução da maternidade que, Freud não deixa de assinalar, é ativa, fálica. Das vias acenadas por Freud, então, uma é privilegiada, a via da maternidade, esse consentimento que faz a mulher a essa solução masculina, pela via do falo.

Muitas críticas foram feitas a isso, inspiradas pelo movimento e pelos anseios feministas que já se faziam ouvir então, na belle époque freudiana, e diversos analistas pós-freudianos empreenderam formulações revi-sionistas que buscavam resgatar a complementaridade e a simetria que a teoria freudiana sobre a diferença sexual pusera por terra. Jones entre estes.

Foi Lacan que veio resgatar, num esforço de retorno à doutrina freudiana, os fundamentos que animaram essa introdução devastadora da hipótese do inconsciente na cultura. Primeiro, ao fazer valer a radicalidade freudiana da distinção entre pênis e falo, o que afasta de um só golpe críticas ao obscurantismo freudiano machista, posto que o primado do falo está colocado para ambos os sexos – para ambos os sexos então se impõe a tarefa de distinguir pênis de falo. Segundo, que à diferença sexual vem se sobrepor a descoberta da falta, que Freud indicara como castração, que põe em ação o desejo do Outro como formador do sujeito. Fal-ta que só pode ser articulada por um significante, o significante do falo, que responde à dialética do ter e do ser, não à positividade da diferença. Isso se funda pela linguagem, logo pela falta do Outro. Em uma palavra, ao ser mordido pela linguagem, que o constitui, o sujeito se funda na perda de parte do ser. Uma parte de gozo fica então excluída da captura do gozo fálico. É esse gozo do Outro que retorna como um gozo a mais, desfiladeiro aberto do gozo feminino.

O que fazer com isso então que não se deixa recobrir pelo significante, que atinge a todos os mortais, ou seja, os seres vivos, e que é o que lança a mulher no sexo, sem o suporte no corpo onde encarnar essa alteridade, à diferença do homem que pode dispor do ciclo da detumescência, e que a faz viver a partir de seu corpo essa infinitização do gozo, para os lados de sua passividade? Se o homem encontra do lado do falo como circunscrever seu gozo a partir de seu corpo, uma saída então universal, a mulher está referida tanto a esse gozo fálico, como a um gozo a mais, com o qual ela tem que se virar. Em face desse destino, a mulher se vê levada a uma invenção singular, uma bricolagem com os elementos que ela, uma mulher, pode colher em seus encontros, em seus achados na existência, e no que busca no homem. Tomando de empréstimo termos caros ao existencialismo, e colocando entre parênteses o contexto de sua filiação filosófica, ousamos uma aproximação: Eis a mulher condenada a ser relativo; a gratuidade, a opacidade do objeto.

Para a psicanálise não mais se trata de se tornar mulher, mas do que cada uma inventa para se tornar uma mulher singular, posto que do lado radicalmente feminino não encontra fórmula, resposta universal: a mulher não existe, segundo Lacan. Isso é correlato da inexistência da relação sexual (outro slogan lacaniano), o que significa que não há uma relação complementar, como Freud já assinalava ao demonstrar a assimetria dos édipos feminino e masculino. O que não impede que existam mulheres, uma a uma, e que com sua fe-minilidade façam história. E também não impede que existam relações sexuais. Nem que os homens sejam femininos. Mas eles chegam às mulheres pela função fálica. As mulheres experimentam um Outro gozo, um gozo do Outro que as habita, do qual “nada sabem, a não ser que o experimentam”.2 As mulheres têm mais aptidão para o feminino. E a verdadeira mulher não é a mãe, mas aquela que nela se furta a essa função, Medeia que sacrifica seus filhos em vingança ao homem que a abandona.

2 Lacan, J. O seminário, livro 20: mais, ainda. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985.

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Mas isso é uma outra história. Por isso, também, as mulheres inventam histórias, falam demais, se com-prazem disso, se perdem nos desfiladeiros de sua memória, “adoram falar de si”, de sua infância, de seus amores realizados ou contrariados. Fazem série, os homens são sérios. Os homens se fazem âncora da ne-cessária errância feminina, ao tomarem-na como objeto e, com sorte, amarem-na, fazendo suplência à assi-metria fundamental que lhes causa o desejo.

LACAN FEMINISTA OU O FEMININO EM LACANOndina Maria Rodrigues Machado (AMP/EBP)

Marie-Hélène Brousse vem se dedicando a pensar o feminino sob o ponto de vista da clínica psicanalítica assim como seus efeitos na cultura. O verbete publicado em Scilicet dos No-mes do Pai é mais um desses momentos de reflexão e interesse pelo tema. Nesse texto, a autora cria um diálogo entre a psicanálise e o movimento fe-minista, mostrando como a teoria psicanalítica sobre o feminino de alguma maneira respondeu às reivindicações feministas e, por outro lado, como as primeiras feministas entenderam a teoria. Nascidos em um mesmo momen-to histórico, psicanálise e feminismo parecem ter surgido juntos, não por aca-so. Ambos se completam de tal forma que resta a interessante conclusão de que as reivindicações feministas e as reivindicações histéricas foram feitas da mesma matéria prima, ou seja, que a psicanálise começou pela histeria porque este era o sintoma social da época, da mesma forma como hoje o são os distúrbios alimentares e as drogadições.

Brousse percorre os diferentes momentos da teoria psicanalítica sobre o feminino e vai delineando as consequências dessa teoria na cultura. A autora aborda de frente a incidência do saber psicanalítico no movimento feminista e nos oferece sua análise, tanto dos efeitos esperados quanto dos efeitos colaterais desse discurso.

Dois importantes momentos são apontados no desenvolvimento da teoria psicanalítica do feminino: seu início com a neurose histérica e a coincidência entre falo e pênis; depois a investida de Lacan, nos primeiros anos de seu ensino, quando destaca o falo do pênis, situando-o como significante ao qual ambos os sexos estão referidos. Essa passagem do pênis ao falo é crucial para tirar a mãe do lugar central e quase exclusivo no desenvolvimento emocional da criança e, mais tarde, possibilitar que se repense o feminino como um modo de inscrição subjetiva, distinto daquele regido pelo falo. Pensar o feminino como um modo de gozo é ampliar a ideia do feminino, retirando-o do gueto das minorias e, assim, demonstrar sua prevalência na cultura pós-moderna.

Vamos acompanhar esse diálogo entre a psicanálise e o feminismo demarcando seus momentos cruciais com frases que não só representam estes momentos, como são verdadeiros achados frasísticos.

“O feminismo contribuiu para politizar o corpo” – expressa o primeiro resultado do movimento feminista e também o momento inaugural da psicanálise. Sob o ponto de vista do feminismo, o corpo da mulher não era da mulher, era um corpo falado, usado e controlado pelo poder masculino. Sob o ponto de vista da psi-canálise dá-se o mesmo, não exatamente da mesma maneira. O que eram as conversões histéricas, senão a expressão dessa denúncia? O que eram as conversões senão a manifestação de um poder sobre o seu próprio corpo que denunciava um ponto de impotência no discurso masculino? Talvez, justamente por essa aproximação, é que comumente se identifique a primeira hora do movimento feminista como histérica. Sem fazer psicologismo, mas fazendo, podemos perceber que até as saídas propostas pelo feminismo têm um quê de resposta ao mestre.

A busca de saber sobre o feminino assim como a identificação viril da histeria freudiana funcionaram como resposta à desfalicização promovida pelo entendimento da feminilidade no âmbito do não-ter; foi uma resposta que partiu do penisneid. O problema é que o corpo politizado é o corpo das exigências, das reivindi-cações, razão pela qual os sintomas conversivos se mostraram adequados para expressar o desejo recalcado, seu envelope formal da hora.

Brousse reconhece que a psicanálise que corresponde ao primeiro momento do movimento feminista é conservadora e foi facilmente tomada por machista. Podemos mesmo dizer que esse conservadorismo não

Feminism in surrealism by Musta Satumaa

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estava distante do conservadorismo de Freud, evidenciado, por exemplo, no Caso Dora. Porém a questão é que, para além do homem, está a teoria. Isso cai como uma luva para Freud, pois se sob o ponto de vista pessoal identificamos nele uma dificuldade para lidar com o feminino, por estar impregnado de lógica fálica, por outro lado precisamos reconhecer a influência da teoria freudiana na liberação dos costumes.

“Certas mulheres são homens” – é a frase que sintetiza o segundo momento do feminismo e, de certa forma, caracteriza uma preocupação de Lacan na primeira fase do seu ensino. A autora situa esse momento do feminismo como sendo de recuo frente à constatação da não consistência do conjunto das mulheres. Seu efeito foi a inclusão do feminismo num movimento mais geral de luta das minorias e, nesse contexto, passou a um ensimesmamento quase religioso. Da reivindicação por igualdade passa à assunção de uma diferença tão radical que acaba por isolar a mulher, impondo-lhe uma solidão, que pode ser verificada a partir do final dos anos 1960, com o boom dos divórcios e a intolerância na convivência entre homens e mulheres.

“Lacan feminista” – é uma frase que soa irônica. Era Lacan um feminista? Estranho pensar isso. Apesar de nutrir profundo respeito pelos movimentos sociais, jamais poderemos pensar em Lacan levantando a ban-deira desses movimentos. Lacan não era ingênuo quanto ao ser humano. Se por um lado ele se interessava pelos movimentos das minorias, por outro estes não o comoviam suficientemente para deles fazer parte. Mas, nos parece que a autora quer mostrar com essa frase que, se Lacan não levantou bandeiras, acabou por promover uma via de entendimento do feminino que questiona o falo como o único referente. Tanto é assim que no Seminário, livro 10: a angústia3, ele diz que nada falta à mulher, concepção contrária a dos pós--freudianos que militavam a favor de um complexo de castração atávico à mulher.

3 LACAN, J. (1962-1963) O seminário, livro 10: a angústia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005, p. 209.

Comissão financeiraComunicamos novos valores de inscrições para o XIX Encontro Brasileiro do Campo Freudiano, a partir de

01 de novembro de 2012.

VALORES DE INSCRIÇÕES R$ 290,00 para profissionais da rede pública, estudantes de graduação e pós-graduação (até 26 anos) e

alunos dos Institutos do Campo Freudiano, e R$ 400,00 para Membros e Aderentes da EBP, participantes e profissionais.

Informamos-lhes passo a passo, como você pode participar:1. DEPÓSITO EM CONTA CORRENTE

Banco – 237, Bradesco | Agência – 3072 |Conta corrente – 79.541-0CNPJ 01.033.326/0001-88.Após efetuar o depósito, enviar o comprovante com o nome completo do inscrito, telefone, e-mail e cópia

do documento que justifique o desconto.Opções de envio: Fax: 71 3235-9020 e 713235-0080e-mails: [email protected]@terra.com.br

2. INSCRIÇÕES NAS SEÇÕES E DELEGAÇÕESDirija-se à secretaria e efetue sua inscrição até Terça-feira 20 de Novembro.

3. INSCRIÇÕES PARA OS QUE ESTÃO NO EXTERIOREnviar e-mail para Pablo.Pablo Sauce ([email protected])

4. PAGSEGURO- Entrar no site - http://www.mulheresdehoje.com.br, e ver as opções para pagamentos.

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EVENTOS PARALELOSLOCAL: HOTEL PESTANAINSCRIÇÕES: EBP. BAHIASandra ou Cláudia Bandeira, tel. (71) 3235-9020.Depósito em conta corrente: Banco Bradesco, 237 | Agência: 3072-4 | Conta corrente: 75.599-0IPB – Instituto de Psicanálise da Bahia CNPJ: 01.425.789- 0001/95Favor enviar e-mail do depósito para [email protected] ou fax (71) 3235-9020, contendo no corpo,

o telefone, e-mail do participante, para que possamos confirmar a inscrições.CEREDA: 3º ENCONTRO DOS NÚCLEOS DA NOVA REDE CEREDA

TEMA: ANGÚSTIA E SEUS EFEITOS NA CRIANÇAData: 22 de novembro de 2012Horário: 8: 30h às 15:00hValor: R$ 30,00Conferencista: Cristina Drummond (Diretora da EBP)Depoimento de Passe: Ana Lydia Santiago (AE da Escola Uma)Informações: Cristina Vidigal - [email protected]átima Sarmento - [email protected]

CIEN: III MANHÃ DE TRABALHO DO CIEN NO BRASILTEMA: FURANDO ETIQUETASData: 25 de novembro de 2012Horário: 8: 00h às 12: 00hValor: R$ 30,00Participação especial – Ana Lydia SantiagoConvidado internacional: Éric LaurentOs inscritos no CEREDA e CIEN podem participar da Conversação sobre Autismo, gratuitamente; porém

precisam se escrever nesta conversação. Vagas limitadas.CONVERSAÇÃO SOBRE AUTISMO

TEMA: O AUTISMO HOJE E SEUS MAL-ENTENDIDOSData: 25 de novembro de 2012Horário: 12:00h às14:30hValor: R$20,00Coordenadora da Comissão: Paula Borsoi ([email protected])Conferencista: Éric LaurentParticipação especial: Ana Lydia Santiago (AE)

PARTICIPE TAMBÉM DA FESTA DE ENCERRAMENTO:Local: Cabana da Barra (em frente ao Farol da Barra)Data: 24/11/2012Atrações: Pirigulino Babilake e DJ Lôla BêValor do Convite: R$ 150,00Convite inclui: Rosca, cerveja, refrigerante, petisco e jantar.Para adquirir seu convite, basta efetuar depósito no Banco Bradesco Ag. 3072 Conta 79.541-0. CNPJ

01.033.326/0001-88 e enviar o comprovante via e-mail, para [email protected], ou fax para o tel. (71) 3235-9020

Contamos com a presença de todos em Salvador, e desejamos-lhes um excelente encontro.Atenciosamente,

Pablo SauceTesoureiro XIX-EBCF

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Comissão de Acolhimento

Bradesco 237; Ag. 3072-4; C/C 79.541-0: Escola Brasileira de Psicanálise – Seção Bahia

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ATENÇÃO A III MANHÃ CIEN BRASIL INI-CIARÁ AS SUAS ATIVIDADES ÀS 8HS

III MANHÃ DE TRABALHOS DO CIEN BRASILFURANDO ETIQUETAS - O TRA-ÇO DA POLÍTICA DO CIENCONFERÊNCIA DE ÉRIC LAURENT - A CRISE DO CONTROLE DA IN-FÂNCIA

A III Manhã de trabalhos do CIEN Brasil, em Salvador, ocorrerá no dia 25/11 das 8h às 12hs no Hotel Pes-tana, em Salvador. Além da grande conversação, animada por Éric Lau-rent, sobre os trabalhos enviados, teremos a satisfação de contar com a conferência de Éric Laurent sobre “A crise do controle da infância” e com o testemunho de Ana Lydia Santiago, AE, sobre “O CIEN no pas-se de cada um”.

A grande Conversação do Cien sobre o tema “furando etiquetas - o traço da política do cien” dar-se--á através do relatório de leitura de alguns colegas sobre 16 vinhetas práticas, selecionadas para esta manhã, cujas experiências interdis-ciplinares trazem a urgência instala-da e, muitas vezes, silenciada, naqueles que trabalham com crianças e adolescentes, no campo da assistên-cia, educação, saúde e justiça no Brasil.

Com simplicidade, tais vinhetas esclarecem os S1s no comando de instituições e práticas submetidas à lógica da pregação de etiquetas e à obediência cega aos protocolos, segundo exigência das normas para o controle da infância. Por essas vinhetas, nossos colegas também testemunham como foi possível, no campo inter-disciplinar de sua experiência, abrir espaço e fazer falar o Outro de nossos dias, demonstrando o que pode a oferta do CIEN frente a desordem e os impasses abertos por essa ordem de ferro.

Esclarecida quanto ao momento atual e a responsabilidade política da psicanálise para com seu tempo, a Comissão de Coordenação e Orientação do CIEN Brasil convidou psicanalistas da EBP/AMP e profissionais de outras práticas e áreas do saber para fazer a leitura dessas vinhetas, dando início a conversa com seus autores que será animada por Éric Laurent.

Você também é nosso convidado a tomar a palavra nessa conversa, fazer falar e dividir o Outro dos dias que correm, espalhando o poder das lacunas por todos os lados, para que o saber da criança possa advir.

Restam apenas mais 50 vagas. Faça a sua inscrição, o quanto antes.

Inscrições através de depósito bancárioBradesco - Ag: 3072-4, conta: 75599-0Enviar comprovante depósito ao email: [email protected] evento: HOTEL PESTANA - SALVADOR

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Uma contribuição para a Conversação clínica sobre o Autismo em Salvador

Nos dias 06 e 07 de outubro de 2012 aconteceu a 42ª Jornada da Escola da Causa Freudiana de Paris, cujo tema central foi: Autismo e Psi-canálise; Política da Psicanálise.

Durante dois dias de intenso tra-balho psicanalistas franceses e de ou-tras partes do mundo, ligados a AMP, trouxeram suas contribuições ao de-bate em torno da clínica e da política que a psicanálise de orientação laca-niana dedica à prática com sujeitos autistas. Como salientou Jean-Pierre Deffieux, em nota sobre o tema das Jornadas publicado no Le Point Du Jour n. 64, este tema é amplo e visa tanto responder aos ataques sofridos pelos psicanalistas que tratam sujei-tos autistas como discutir a lógica es-trutural do autismo generalizado.

Cabe salientar que esses ataques já atingiram psicanalistas que clini-cam no Brasil, visto que recentemen-te surgiu em São Paulo um Edital de Convocação para credenciamento de Instituições especializadas em aten-dimento a pacientes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), diagnos-ticados por laudo médico dado por psiquiatras ou neurologistas, e que se submeterão a diversas terapêuticas, dentre elas as praticadas por Psicólo-gos especializados em Terapias Cog-nitivos Comportamentais, tais como: PECS, ABA e TEACHH.

No sábado, dia 06/10, a partir de frases extraídas das produções de Jacques Lacan, Jacques-Alain Miller e Éric Laurent expuseram aos colegas seus pontos de vista sobre: a natureza do Outro no Autismo, o estatuto do Um que é interrogado pelo autista por ser sem o Outro, mas dali advir; as relações da psicanálise com a ciência; a noção de borda e objeto autístico, entre outros.

No sábado à tarde, contamos com o depoimento de Laurence Vollin, mãe de uma criança autista que, ao destacar a marca real que não se estava esperando na relação mãe x filho quando se tem um filho autista, salientou a importância do encontro com um analista para ela e sua filha, sobretudo no campo da separação. Uma relação fusional ali se desfez após este encontro com o analista.

No domingo, dia 07/10, a partir da política de transmissão dos analistas da Escola Una, Éric Laurent, na coordenação dos trabalhos, salientou, dentre outros pontos, que o único programa pensável para o falasser é seu programa de gozo. Ele acentuou sobretudo que a psicanálise não recusa a ciência, mas sim a sua degra-dação feita pelo cientificismo cognitivo-comportamental que visa programar o humano, desconsiderando ali a existência de um sujeito e o que ele tem de mais singular.

Deste debate extraí algumas notas que enumero abaixo, com a expectativa de contribuir para o aprofun-

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damento desses pontos em nossa Conversação. Destaco, entretanto, que estaremos abertos às contingên-cias, uma vez que novos questionamentos podem surgir no decorrer das discussões em Salvador a partir das particularidades brasileiras.

Notas:O que torna a psicanálise um autismo a dois é o fato de só haver solilóquio o que aponta a função da lin-

guagem muito mais ligada ao gozo do que à comunicação? O “dizer” faria obstáculo ao autismo a dois?Deste modo seria a situação analítica o encontro de dois inconscientes opacos?A direção do tratamento no autismo é uma psicanálise às avessas, visto que encontramos ali um S1 isola-

do do S2, objetivo que se tem na interpretação com sujeitos neuróticos e que, numa análise levada a termo, reforça este “falar sozinho”, do tipo “autístico”, no sentido de que o sujeito se encontra sozinho confrontado ao seu sintoma?

A causalidade na psicanálise de orientação lacaniana inclui o furo, o que nos leva a concluir que se há uma base biológica no autismo que ela seja vista como única, decorrendo daí que não se exclua a noção de sujeito.

Qual a natureza da borda no autismo? É sintoma? O que quer dizer não recorrer ao significante para cons-truir a borda, mas ao signo?

Como identificar clinicamente as bordas salientadas por Maleval em sua fala, a saber: objeto autístico, duplo e ilhas de competência?

O autista escolhe um objeto fora do corpo para concentrar seu gozo, esta é a via da invenção no encontro com o analista?

Bom, espero ter contribuído com pontos que, a meu ver, são instigantes para a Conversação Clínica sobre Autismo que ocorrerá dia 25/11/2012 das 12h às 14h30 h em Salvador, no Hotel Pestana, com a participação de Éric Laurent, para a qual todos estão convidados.

Até lá!Tânia Abreu (EBP/AMP)

Linhas de Investigação Bibliografia Filmografia

ExpedienteTânia Abreu (Editora) Email: [email protected] Bruno Senna (Layout e editoração)

Elisa Monteiro (revisora) Editora Comissão Científica Ajusta Foco e ResenhasMarcela Antelo

Salvador, 14 de novembro de 2012