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9 Belo Horizonte, v. 9, n. 3, p. 9-34, jul. / set. 2008 INTERNACIONALIZAÇÃO DAS EMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA EM BELO HORIZONTE – MG, BRASIL THE INTERNATIONALIZATION OF THE BIOTECHNOLOGY CLUSTER OF THE METROPOLITAN REGION OF BELO HORIZONTE – MG, BRAZIL Resumo OTAVIO REZENDE CRISTIANE AMARAL SERPA A internacionalização das empresas integrantes do Arranjo Produtivo Local de Biotecnologia da Região Metropolitana de Belo Horizonte (APL Biotec) é avaliada a partir de um diagnóstico realizado no ano de 2007. A pesquisa propõe identificar estágios de internacionalização e delinear ações de capacitação e promoção comercial externa. A metodologia utilizada foi a realização de entrevistas para levantamento de dados situacionais, com aplicação de questionário semi-estruturado aos proprietários e gerentes de 16 empresas entre as 21 integrantes do APL Biotec. Ressalta-se como resultado da pesquisa a capacidade das empresas de ser uma born global pela posse de certificações e registros internacionais e a participação constante em eventos internacionais como forma de promoção comercial. São apontadas ações alternativas para maximizar a competitividade do setor, buscando a melhoria da sua posição no mercado internacional e promovendo sinergia para que as empresas enfrentem os desafios do mercado global. PALAVRAS-CHAVE Internacionalização de empresas. Competitividade internacional. Inovação tecnológica. Estratégia internacional e Biotecnologia.

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9 Belo Horizonte, v. 9, n. 3, p. 9-34, jul. / set. 2008

Otavio Rezende, Cristiane Amaral Serpa

INTERNACIONALIZAÇÃO DASEMPRESAS DE BIOTECNOLOGIA EM

BELO HORIZONTE – MG, BRASIL

THE INTERNATIONALIZATION OF THE BIOTECHNOLOGYCLUSTER OF THE METROPOLITAN REGION OF BELO

HORIZONTE – MG, BRAZIL

Resumo

O T A V I O R E Z E N D ECRISTIANE AMARAL SERPA

A internacionalização das empresas integrantes do ArranjoProdutivo Local de Biotecnologia da Região Metropolitana de BeloHorizonte (APL Biotec) é avaliada a partir de um diagnóstico realizadono ano de 2007. A pesquisa propõe identificar estágios deinternacionalização e delinear ações de capacitação e promoçãocomercial externa. A metodologia utilizada foi a realização deentrevistas para levantamento de dados situacionais, com aplicaçãode questionário semi-estruturado aos proprietários e gerentes de 16empresas entre as 21 integrantes do APL Biotec. Ressalta-se comoresultado da pesquisa a capacidade das empresas de ser uma bornglobal pela posse de certificações e registros internacionais e aparticipação constante em eventos internacionais como forma depromoção comercial. São apontadas ações alternativas para maximizara competitividade do setor, buscando a melhoria da sua posição nomercado internacional e promovendo sinergia para que as empresasenfrentem os desafios do mercado global.

PALAVRAS-CHAVEInternacionalização de empresas. Competitividade internacional.Inovação tecnológica. Estratégia internacional e Biotecnologia.

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Abstract

The internationalization of the Biotechnology Cluster of theMetropolitan Region of Belo Horizonte (APL Biotec) is evaluated froma diagnosis carried through in the year of 2007. The research seeks toidentify stages of internationalization and to delineate actions ofqualification and external commercial promotion. The methodologyused was the accomplishment of interviews for situational data-collecting, with application of half-structuralized questionnaires toowners and managers of 16 amongst the 21 companies of the APLBiotec. The result outstand the companies’ capacity of being “bornglobal” due to certifications and international registers acquired andthe constant participation in international events as a form ofcommercial promotion. Alternative actions are pointed to maximizethe competitiveness of the sector, searching improvement of its positionin the international market and promoting the synergy betweencompanies to face the challenges of the global market.

KEYWORDSInternationalization of companies. International competitiveness.Technological innovation. International strategy and Biotechnology.

Introdução

Estudos sobre interna-cionalização de empresascostumam concentrar discussõesem dois tipos distintos de análise:no processo gradual de atividadesempresariais internacionais, ondeocorre um crescente compro-metimento da empresa com omercado externo, ou nos estágiosde internacionalização comoinovação da firma, seja em

melhorias e métodos seja em pro-cessos empresariais (ANDERSEN,1993).

Esses modelos podem serconsiderados muito lentos parasetores intensivos emconhecimento, como o deBiotecnologia, onde é grande apossibilidade de uma empresa serum born global1 devido a fatorescomo mudanças tecnológicas,conhecimento técnico de seufundador, a seus produtosestarem direcionados a nichos

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específicos de mercado ondeexiste forte demanda e ao fatode ver o mundo como um únicomercado (RASMUSSEN;MADSEN, 2002, p. 6).

Um diagnóstico daindústria de Biotecnologia emMinas Gerais, realizado no ano de2004, identificou mudançassignificativas no comportamentodas empresas do setor em relaçãoàs exportações. À época, ficounotório um distanciamento dapostura convencional de foco,predominante no mercadointerno. O crescimento daparticipação das empresas dosetor nas exportações nacionaisteria, como principal mercado-alvo, os países da América Latina(JUDICE, 2005). Porém, parapoder participar como agenteativo do comércio internacional,é necessário ter competitividadee auto-conhecimento (CORTI-ÑAS; MANOEL; GAMA, 2002).

É sob essa perspectiva queeste estudo tem o propósito dedimensionar o estágio de estrutu-ração para exportação dasempresas integrantes do ArranjoProdutivo Local de Biotecnologiada Região Metropolitana de BeloHorizonte (APL Biotec). Para tanto,subdividimos o trabalho em cinco

seções. Após a introdução, asegunda parte apresenta defi-nições de competitividadeinternacional, inovação tecno-lógica e internacionalização;temas relativos às análisesefetuadas nas seções posteriores.A terceira parte apresenta ametodologia utilizada. A quarta,os resultados da pesquisa,apresentando dados de importa-ção e exportação relativos aosprodutos comercializados pelasempresas do grupo, no mundo; eno Brasil, identificandoprincipais mercados consu-midores, mercados emergentes eaqueles que vêm perdendocompetitividade nos últimosanos. A última seção apresenta asíntese dos resultados dapesquisa, algumas recomenda-ções de ações e as consideraçõesfinais.

Os temas mais importan-tes da pesquisa relacionam-se àcapacidade do setor em atender asexigências internacionais depráticas de produção, aquisição deexperiência na importação dematéria-prima e pessoal com altonível de formação técnica eacadêmica. Os principais entravespara a internacionalização estãovinculados à gestão comercial dasoperações internacionais.

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CompetitividadeInternacional

Diversos são os motivosque levam as empresas a atuaremno mercado internacional. Adecisão de se tornar um playerno mercado mundial exige acompreensão das mudançastecnológicas e do mercadoglobalizado e competitivo,necessidades reais para ocrescimento empresarial.

Na medida em que umaempresa se internacionaliza, elaevolui e conquista melhorias parasi e para seu país. Ampliação demercado, ganhos de conhe-cimento, tecnologia e novosprocessos são algumas dasvantagens que contribuem paraum melhor posicionamentoestratégico e demandam melho-rias de seus fornecedores – comexigências de padrão global. Porconsequência, tudo isso étransferido também para omercado local (NETO, 2007, p.139).

A competição interna-cional projeta globalmente amarca da empresa e os seusprodutos, gerando, dessa forma,o ajuste automático dos preços àrealidade de um mercadoextremamente competitivo. Aadequação de métodos produ-

tivos a diferentes exigências dequalidade e às novas tecnologiasé outro fator que sofre forteinfluência da competiçãointernacional. Contudo, paraconquistar esses benefícios, aempresa deve estar apta acompetir com os demais atoresinternacionais, possuindo algunsdos fatores que aperfeiçoam suacompetitividade. Dentre esses,destacam-se qualidade, design,embalagem, preço, e serviço pós-venda (CORTIÑAS; MANOEL;GAMA, 2002).

Competitividade deve serentendida como a capacidade daempresa de criar estratégiasconcorrenciais que lhe permitamconservar, de forma duradoura,uma posição sustentável nomercado. O sucesso dependerá dacriação e da renovação devantagens competitivas com quecada empresa se esforça paraobter peculiaridades que adiferenciem favoravelmente dasdemais, como custo e/ou preçomais baixo, melhor qualidade,menor lead-time, melhor serviçoao cliente, entre outros(COUTINHO; FERRAZ, 1995, p.18).

Com o fenômeno daglobalização, tornar-se competi-tivo deixou de ser uma necessidadeexclusiva dos interessados emexportar, tendo em vista que a

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concorrência internacionalencontra-se também no mercadodoméstico. Portanto, adquirircaracterísticas necessárias àcompetitividade internacionalpassou a ser uma necessidade paraa sobrevivência da empresa,independente do segmento oumercado em que ela atua.

Inovação Tecnológica

A competitividade de umpaís depende da capacidade deinovar da sua indústria. Suavantagem competitiva é gerada esustentada por meio de umprocesso altamente localizado.Para explicar porque deter-minado país proporciona umabase doméstica favorável, para asempresas, na competiçãointernacional, é necessárioconsiderar fatores de compe-titividade que extrapolam asvantagens comparativas e incluirmercados segmentados, produtosdiferenciados, diversidadetecnológica e economias deescala. É no mercado domésticoque se criam e se sustentam asvantagens competitivas essen-ciais da empresa. É nele que seestabelece uma estratégia, quesão geradas e mantidas astecnologias essenciais dosprodutos e dos processos e que se

localizam os empregos maisprodutivos e as habilidades maisavançadas. As empresas atingema vantagem competitiva cominiciativas de inovação, e assustentam por meio de melhoriascontínuas (PORTER, 1999, p. 211).

Inovação tecnológica, porsua vez, será toda novidadeintroduzida em determinadaempresa ou mercado, de forma aincrementar um produto oumesmo um processo produtivo.Essa novidade pode ser obtida pelaaquisição de processos inovativosdesenvolvidos externamente àempresa, através do licen-ciamento, do uso de tecnologia deterceiros ou mesmo por meio dodesenvolvimento na própriaempresa – na medida em que essapossua um departamento dePesquisa e Desenvolvimento – P&D(ARRUDA; VERMULM; HOLLAN-DA, 2006).

As inovações tecnológicasimpulsionam as empresas aexpandir suas atividades para omercado externo, visando aganhos de competitividade emcurto prazo. Contudo, ao verificara gama de vantagens inerentes aesse processo, a empresa poderáoptar pela continuidade daatuação no mercado inter-nacional, seguindo uma se-quência de estágios de

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internacionalização que serãoapresentados a seguir.

Estágios deInternacionalização

A internacionalização deuma empresa é um processocontínuo que exige compro-metimento e dedicação por partede todos aqueles que nelatrabalham. Geralmente osresultados são obtidos a médio elongo prazo e, muitas vezes,somente após a realização de altosinvestimentos. Determinarquando iniciar o processo deinternacionalização é uma decisãointrínseca da administração daempresa. Deve-se, contudo,ponderar sobre o custo-benefício,porque ele afetará todas as áreasda empresa, exigindo melhorqualificação de fornecedores ecolaboradores, maiores níveis deinvestimentos e uma série demedidas que constantementeatualizem a posição da empresa nocenário internacional.

Ainda que haja necessi-dade de investimento e compro-metimento com o processo, umaempresa possui inúmeras razõespara se internacionalizar. Deacordo com Minervini (2001),algumas dessas razões podem sera possibilidade de ganhosprodutivos de escala, a fuga de

eventuais crises internas, melhoraproveitamento dos movimentossazonais, possibilidade de preçosmais rentáveis, prolongamentodo ciclo de vida de um produto,diversificação de riscos,possibilidade de melhoria daimagem com seus parceiros oubusca de equilíbrio mediante aentrada de competidores nomercado nacional.

Ao se lançar no mercadointernacional, a empresa iráexpandir seus mercadosconsumidores, permitindo eestimulando o amadurecimentodas estratégias mercadológicas ede planos de marketing maissofisticados. As exigências domercado internacional tambémpodem levar a empresa adesenvolver produtos comdiferenciais que possibilitemganhos exponenciais decompetitividade, tanto nomercado interno quanto nointernacional. Com a expansão doseu mercado consumidor, aempresa passa a utilizar de formaotimizada sua capacidadeinstalada, maximizando osganhos de escala, reduzindo oscustos produtivos e produzindocada vez mais produtos, que, porsua vez, serão mais competitivos.

Por fim, ao obter maiorlucratividade com a conquista denovos mercados, novos inves-

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timentos tornam-se possíveis,abrindo infinitas possibilidadespara as empresas. Dentre essaspossibilidades, há a incorporaçãode novas tecnologias produtivas,desenvolvimento de inovaçõestecnológicas e aumento da linha deprodutos disponíveis. Em outrasocasiões, a internacionalizaçãopode não se apresentar como umaopção, mas como uma necessi-dade. Em determinados setores,onde há homogeneização datecnologia produtiva e os produtospodem ser tratados comocommodities, os ganhos de escalapodem ser decisivos para o futuroda empresa. É o caso de empresasque precisam atingir altos níveisde escala para viabilizar suaprodução – como as montadoras de

veículos automotores, setor queexige altos níveis de investimentoe escala de produção para atingiro ponto de equilíbrio. Nesse caso,a decisão pela não interna-cionalização pode fadar a empresaao insucesso (KOTLER, 2000).

Para não negligenciar oseventuais riscos do processo deinternacionalização, devem-seconhecer detalhadamente suasetapas, de forma a escolher qualé a que melhor representa os seusobjetivos estratégicos. Essasetapas podem ser identificadasem um continuum, onde ocorreum gradativo aumento no nívelde comprometimento, risco,controle e lucro com as atividadesinternacionais, conforme apre-sentado na Figura 1, a seguir:

FIGURA 1 - Cinco maneiras de ingressar no mercado internacionalFonte: KOTLER, 2000, p. 396.

As exportações indiretasse configuram como a primeiraetapa no processo de interna-

cionalização. Nesse caso, opta-sepor autorizar intermediáriosindependentes a realizar

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exportações de seus produtos.Assim, não há dispêndio algumpor parte da empresa produtora.

Ao adquirir experiênciainternacional e buscar maiorcomprometimento com omercado externo, as empresaspodem vir a realizar exportaçõesdiretas. Trata-se da venda diretade um produtor para umcomprador, localizado em outropaís, ainda que a negociaçãotenha sido total ou parcialmenteconduzida por agentes externosà empresa.

Paralelamente às suasexportações, uma empresa podeoptar por realizar o licencia-mento de sua produção emdeterminados mercados alvo. Olicenciamento permite aexpansão da marca sem anecessidade de arcar com grandescustos financeiros, ao mesmotempo em que expõe agressi-vamente marca e produto, pormeio de uma empresa parceira.

Exigindo maior nível decomprometimento e impondomaiores riscos às empresas, têm-se as joint-ventures. Nesseestágio de internacionalização aempresa produtora junta forçascom um parceiro no exterior queofereça algum valor agregado aoproduto final.

O mais alto nível decomprometimento de umaempresa com o mercado externoocorre com a realização deinvestimentos diretos. Ao fazê-lo,a empresa assume que, a médioe longo prazo, os investimentoscompensarão os recursos despen-didos.

Antes de iniciar o pro-cesso de internacionalização, asempresas concentram-se naexpansão e consolidação nomercado interno. Alcançado esseestágio, ela pode então buscar omercado externo para obter asvantagens mencionadas ante-riormente, ou mesmo paradiversificar a carteira de clientes,evitando a excessiva dependênciade determinados clientesnacionais e as eventuais crisesinternas.

Em setores que aassimilação de insumos impor-tados gera ganhos de com-petitividade, pode haver acúmulode experiência em negociações deimportação direta. Essa familia-ridade com trâmites interna-cionais pode ser consideradacomo um estágio pré-internacionalização. Porém, aaquisição de produtos impor-tados de distribuidores locais não

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é considerada, nesse modelo,como geradora de conhecimentoacerca do processo de interna-cionalização.

Estratégia ComercialInternacional

A participação de umaempresa no mercado interna-cional poderá acontecer tanto deforma ativa e permanente,quanto de maneira eventual,variando conforme seu estágio deinternacionalização e objetivos.Geralmente, o êxito e o bomdesempenho na atividadeexportadora são obtidos porempresas que escolheram omercado externo como resultadode um planejamento estratégico,direcionado a mercados escolhi-dos a partir de uma análiseprofunda das características eexigências da demanda, comadequação de produtos e ajusteda estrutura empresarial.

Lançar-se no mercadointernacional, sem uma análisede competitividade de produto econhecimento de hábitos deconsumo do mercado-alvo, podegerar ações frustradas. Umestudo realizado pela FUNCEX(MARKWALD; PUGA, 2002),sobre a atuação de pequenas

empresas no mercado interna-cional, identificou que, a cadaano, 3.400 novas empresas sãoregistradas como expor-tadoras.Dessas, 2.600 desistem no anoseguinte. Uma das razõesapresentadas para esse baixograu de continuidade foi a faltade informação de mercado.Portanto, o mais importante ésaber como se pretende alcançaro mercado externo.

De acordo com Kotler(2000, p. 387), algumas decisõesimportantes devem ser tomadaspara o ingresso no mercadointernacional: decidir se deveingressar no mercado interna-cional, decidir em quaismercados entrar, decidir sobre amaneira de ingressar no mercado,decidir o programa de marketinge decidir a organização demarketing.

A avaliação dessasquestões deve considerar oambiente interno e externo dasempresas. Essa análise serádiferenciada do planejamentoestratégico usual devido aodiferencial do marketinginternacional para o marketingdoméstico. O primeiro envolve orelacionamento com outrospaíses. Nesse caso, tanto asvariáveis não-controláveis do

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mercado interno (forças político-legais, econômicas, sócio-culturais e tecnológicas), quantoas forcas não-controláveis doambiente externo (acrescenta-senível de tecnologia, geografia,infra-estrutura e, estrutura dedistribuição), influenciarãodiretamente no planejamento demarketing internacional(CATEORA; GRAHAM, 2001, p. 5).Feita a análise da demandaexterna (oportunidades eameaças), confrontada com ascaracterísticas estruturais (forçase fraquezas da empresa), coloca-se a seguinte questão: qual seráa estrutura comercial maisadequada à realidade do meunegócio no contexto inter-nacional? A resposta estádiretamente relacionada aoestágio de internacionalização eà preparação para enfrentar osdesafios do mercado.

A estrutura comercial paraatender o mercado externo devecontemplar ações envolvendo omarketing mix (produto, preço,promoção e canal de distribuição– “4Ps”). Consideradas variáveiscontroláveis, porque são decisõesestratégicas de abordagem demercado definidas pela empresa,todas as ações envolvendo esses“4 Ps” serão determinantes paradizer “como” se pretendeexportar. Essas decisões serão

importantes, inclusive, paraencontrar o comprador adequadopara o seu produto, de acordocom a estratégia e políticacomercial escolhida como a maisadequada para os seus objetivos.O processo de construção dos 4Psdefine ações do tipo: avaliação decompetitividade de produto,preparação de lista de preços,preparação de catálogos,definição do perfil do comprador(se haverá busca derepresentantes, distribuidores,lojistas no mercado externo ou seum simples contato com agentese trading companies, no mercadointerno, será suficiente). Assim,uma estratégia comercialcoerente com os objetivosidealizados pela empresa, bemcomo a preparação de umesquema de ação gradual econdizente com as condiçõeshumanas e financeiras, é defundamental importância paradelinear que tipo derelacionamento de mercado aempresa pretende obter.

Metodologia

O material utilizado nopresente estudo refere-se àsinformações obtidas com aaplicação de 16 questionáriossemi-estruturados junto adiretores-sócios, executivos e

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gerentes de empresas debiotecnologia, entre 21 identi-ficadas como integrantes do APL2

Biotec da região metropolitana deBelo Horizonte, em 2007; o querepresenta 75% da população. Asentrevistas foram realizadas nosmeses de outubro, novembro edezembro de 2006 e o tempomédio de duração das entrevistasfoi de 35 minutos.

Realizou-se a pesquisaempírica com objetivo deidentificar a competitividadepara atendimento ao mercadoexterno. Para os propósitos desteartigo, as variáveis centraisinvestigadas foram: 1)caracterização do grupo e o 2)estágio de internacionalizaçãodas empresas.

Transcreveram-se as respostas aoquestionário relativas àsvariáveis selecionadas para esteestudo em seus aspectosqualitativos. A apresentação e adiscussão dos resultados, napróxima seção, realiza-se a partirda análise dos resultadosencontrados no referido estudo.

Caracterizaçãodo Grupo

As empresas integrantesdo APL Biotec concentram-se na

região metropolitana de BeloHorizonte, Varginha e Itabira, esão importantes geradoras deemprego e renda. Contratam 847funcionários, com uma média de53 por empresa. Em 2005, ofaturamento conjunto dasempresas foi de aproxima-damente R$92.3 milhões. Esseresultado apresenta-se subesti-mado para caracterizar a realidadedo APL, pois não caracteriza ofaturamento integral do grupo.

No que se refere ao portedas empresas,3 existe umaconcentração nas faixas de microe pequena empresa (80% do grupoentrevistado). Essa concentraçãopode caracterizar um potencialpara utilização de apoio e subsídiosgovernamentais, que possibilitema participação em programas deincentivo à inovação, à promoçãode exportações e ao desenvolvi-mento do arranjo produtivo.

A capacidade produtiva ébastante diversificada, principal-mente pela variedade de produtosfabricados. Tendo em vista umafutura implantação de umprograma de exportação,identificou-se a disponibilidadede produção diante de umpossível aumento nas vendas.Dentre os respondentes (6),encontram-se quantidades quevariam de 10 a 30.000 unidades/

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mês. Essa variação é conse-quência dos diferentes segmentosde mercado atendidos pelo grupo.No entanto, os dados levantadosapontam para uma capacidadeociosa capaz de absorver grandedemanda de mercado externo.

Somente duas empresasentrevistadas utilizam aterceirização como recurso deprodução. Uma delas contrata100% da produção com terceiros(mas o conhecimento sobre oproduto é exclusivo e patenteado)e a outra terceiriza somente 25%da fabricação mecânica das peçascom as quais trabalha. O baixograu de terceirização da produçãono segmento de Biotecnologia podeestar vinculado ao controle doconhecimento e desenvolvimentode produtos, além de ter umaindústria instalada que atenda asnecessidades de mercado.

A obtenção de certi-ficados internacionais comodiferencial de posicionamento demercado é bastante variada.Metade do grupo possuicertificação em Boas Práticas deFabricação (BPF) que, em outrasduas empresas, encontra-se emprocesso de implantação; 25%possuem certificação ISO 9000 eoutras duas estão em processo decertificação; duas empresaspossuem a marcação CE e três

outras empresas pretendem obtê-la em médio e longo prazo. Ocorreintensa busca de certificação,trazendo, como consequência,melhorias na estruturação dasorganizações por meio detreinamentos, absorção detecnologias de informação,inovação em marketing ecomercialização.

Como forma de inserçãointernacional, o alto grau deexigência do segmento porcertificações internacionaistraduz um modelo diferenciadode preparação das empresas paraa internacionalização. Portrabalharem com produtos deconceito global, a adequação dasempresas, da produção e dosprodutos deve atender às normasinternacionais. Portanto, oprocesso de internacionalizaçãodo setor exige capacitação dasempresas para o relacionamentocom o mercado externo.

A faixa etária dos funcio-nários varia entre 19 e 50 anos,explicada pelo grau deconhecimento técnico-científicoexigido pelo segmento. Essacaracterística pode serfacilitadora na absorção de umacultura exportadora. O nível deescolaridade dos funcionários edirigentes das empresasdistribui-se de forma equilibrada

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entre o médio completo esuperior completo. A altaexigência tecnológica dosprocessos e produtos faz com queas empresas de biotecnologiacontratem funcionários commaiores níveis de escolaridade,permitindo e facilitando otreinamento e a execução deprocedimentos.

É baixa a contribuiçãopara a geração de novosempregos decorrentes deexportações. Somente cinconovos postos de trabalho foramcriados no ano. Esse baixonúmero deve-se ao fato de aprodução estar mais vinculada àconcentração de tecnologia do queà necessidade de mão-de-obra.

Apenas três empresasrealizam treinamentos voltados àcompreensão das necessidades domercado internacional. Além doscursos oferecidos na áreaespecífica de comércio exterior,muitos estão atrelados aosprocessos de certificação (como

ISO 9000) ou capacitação emgestão empresarial. Nota-se queas empresas que realizamtreinamentos são aquelas que jáexportam. Assim, o investimentoem treinamento para o mercadoexterno está vinculado ànecessidade de atender a umademanda do exterior. Oinvestimento ativo é baixo.

O mix de produtoscomercializados é bastantediversificado. O grupo fabricadesde kits diagnósticos parasaúde humana até extratosfitofármacos, como tambémpresta serviços de identificaçãomolecular ao tratamento deinfer tilidade. Entretanto,metade da produção conjuntado APL Biotec concentra-se emSaúde Humana e a produção dediagnósticos para essesegmento significa quase 25%da produção total das empresas.O Quadro 1, a seguir, apresentaos diferentes ser viços eprodutos distribuídos porsegmento e subárea:

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QUADRO 1Produtos por segmento de mercado

Fonte: Dados da pesquisa

Existe baixa sazonalidadena venda de produtos e, quandoocorre, relaciona-se mais aquestões de mercado que afatores naturais, como, porexemplo, concorrência pública.

No que se refere à embalagem,cinco empresas se consideramperfeitamente adequadas paraatender o mercado externo, dezacreditam que necessitammelhorias e uma não respondeu

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porque trabalha com serviços.Entretanto, a necessidade deadequação da embalagem deve seranalisada a partir da exigênciaespecífica de cada mercado.

O modelo de segmentaçãode mercado utilizado nestetrabalho foi apresentado noDiagnóstico da Indústria deBiotecnologia em Minas Gerais(Diagnóstico BIOTECNOLOGIA,2004, p.19), onde foi reelaborada aconceituação de Biotecnologia,buscando uma classificação quepermitisse comparabilidadeinternacional.

É grande a diversificaçãodas áreas de atuação das empresasdo APL Biotec. Destacam-se asáreas de Saúde Humana (48%),Saúde Animal (17%) e BiologiaMolecular (9%). Existe umaparticipação mais tímida emAgronegócios (4%) e MeioAmbiente (4%); áreas menosrepresentativas concentram-se emOutros (17%). Este último, écomposto equitativamente portratamentos de infertilidade,monitoramento e controle depragas, por meio da Tecnologia daInformação (TI) e equipamentos.

Estágio deInternacionalização

A Gestão Comercial domercado externo é feita por

funcionários das empresas,ocorrendo terceirização somenteem atividades como despachoaduaneiro4 e logística. Somente ascinco empresas exportadoraspossuem um funcionário ou umaequipe, dentro da empresa, paraatendimento exclusivo a expor-tação.

Embora o domínio delíngua estrangeira para efetuarum atendimento comercial como exterior seja suficiente, poistreze empresas estão habilitadasa fazer atendimentos em inglês,sete em espanhol, duas emitaliano e uma em francês, poucasempresas possuem materialpromocional disponível paraatender clientes internacionais.

A política comercial parao mercado externo, adotada porquatro empresas, é de identi-ficação de distribuidores eagentes no exterior e definição decotas de vendas, com exclusi-vidade temporária. Esse é ummodelo comum a diferentessegmentos e atende empresas eminício de atividades interna-cionais. Envolve baixo risco ecomprometimento da empresaexportadora porque se vincula aopagamento de comissão a agentesno exterior. Porém, as outrasempresas entrevistadas (12)declararam não ter nenhuma

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política comercial definida. Essefato demonstra a falta deconhecimento e direcionamento deações voltadas para o mercadoexterno, e requer preparação paraa compreensão das possibilidadesde estruturação das empresas paravivenciar um processo deinternacionalização.

De forma geral, as vendasexternas são feitas pordistribuidores no exterior. Comonão existe uma política comercialclara, os negócios realizados sãorespostas a demandas recebidasespontaneamente. Algumas açõesde estruturação comercial sãorecomendáveis para esclare-cimento e definição de qual tipode política comercial será maisadequada àquelas empresas embusca de mercado externo. Sãonecessidades das empresasentrevistadas: conhecer os canaisde distribuição para os diferentesprodutos dentro de cada segmento;saber como alimentar esses canaisoferecendo preço compatível parasustentação do produto nomercado externo; elaborarcontratos para atender políticascomerciais efetivas.

O diferencial competitivopara o mercado externo apontadiferentes resultados porsubsegmento de Biotecnologia: i)Diagnósticos: preço e qualidade

associados; ii) Tratamento deInfertilidade: qualidade doserviço e atendimento; iii)Veterinária - AssistênciaReprodutiva: utiliza tecnologiamuito nova e restrita, altoinvestimento em aparelhagensespeciais, gastos com amontagem do laboratório e anecessidade imperativa dedomínio do conhecimentotecnológico (com relação aocomércio exterior, a comer-cialização de embriões ainda nãose encontra amplamenteautorizada pelos órgãosresponsáveis e, também, há acarência de tecnologia dearmazenamento e transporte quepermitam o fluxo transfronteiriçode tais produtos); iv) IdentificaçãoGenética: importação de insumosbásicos que possibilitem amontagem de kits, os quais terãopor sua vez preços maiscompetitivos; v) Biorremediação:preço mais baixo (insumos maisacessíveis + utilização bactériasendêmicas / bactérias locais quenão afetam a fauna e a flora); vi)Suplementos Alimentares ouNovos alimentos: preço e o nívelmédio de tecnologia é quediferenciam o produto no mercado(o mesmo por menos).

Não há problemas comqualidade de produto pelo fato deo segmento exigir certificações e

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registros nacionais, creditandocapacidade às empresas paraatuar no mercado. Por sua vez,não há, também, ação ativa parabusca de clientes, ao mesmotempo em que existe facilidade dedemanda. O cliente procurafornecedores internacionalmentereconhecidos por meio decertificados e a concorrência porpreços surge como a questãoprincipal.

A compreensão dasnecessidades dos clientes vincula-se ao entendimento do conceito demarketing integrado nasempresas. Esse conceito entendeque todas as áreas da empresadevem estar direcionadas para asnecessidades dos clientes,desenvolvendo ações a partir dasinformações coletadas no mercado(KOTLER, 2000, p. 44). A maioriadas empresas afirma entender asnecessidades dos clientes semqualquer problema. Sendoindústria de base tecnológica, osproblemas encontrados pelosclientes estão mais voltados paraprocessos de logística, prazo deprodução e entrega de mercadoriado que especificação de produtos.

Apenas três empresasconsideram a entrega da merca-doria, no prazo combinado, umproblema fraco e médio. Esseproblema ocorre devido a atrasos

dos fornecedores na entrega deinsumos ou por questões ligadasà programação da produção eterceirização do transporte. Apouca preocupação com o temademonstra um desconhecimentode questões de imagemvinculadas à empresa e aoproduto, resultantes de gestão decompras, processo produtivo eatendimento ao cliente. Esse éum tema importante norelacionamento de mercado,considerando a perda decredibilidade com compradoresexternos.

A forte concorrência éoutro fator de destaque. Por serum segmento que demandaconhecimento tecnológico, ainovação constante, capaz degerar competitividade, é umanecessidade para a participaçãono mercado internacional. A faltade conhecimento sobrediferencial competitivo capaz depermitir posicionamento surgecomo fator estruturante para adefinição de estratégicas deabordagem de mercado.

O desenvolvimento deações de promoção dos produtosé outra questão a ser trabalhadapelas empresas. As açõesrealizadas acontecem, principal-mente, em exposições técnico-científicas e em congressos

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internacionais. Percebe-se anecessidade real de nivelamentoe aprofundamento de conceitos ede ações de marketing direciona-das para o segmento deBiotecnologia.

A comunicação com omercado apresentou distribuiçãohomogênea de esforços entrepromoção de vendas, parti-cipação em feiras como visitanteou expositor e divulgaçãoconvencional de mídia impressae eletrônica. A internet é usadade forma institucional. Outrosmeios como rádio, folder, maladireta e exposições são utilizadospara desenvolver trabalhos empequenas regiões.

Além disso, ocorre altoíndice de visitação a feirasinternacionais, tendo comodestino os mais variadosmercados, ao passo que ocorrebaixa participação em feiras,como expositores, devido ao alto

valor do investimento de cadauma das atividades.

No que se refere ao setorde Biotecnologia, as vantagenscomparativas do Brasil diante daconcorrência internacional estãorelacionadas à disponibilidade defatores naturais e humanos dopaís. Por outro lado, as vantagenscompetitivas estão vinculadas aopotencial tecnológico do Estadode Minas Gerais e às parceriascom boas Universidades.

Os principais concor-rentes encontram-se na China,Inglaterra, Índia, França, EstadosUnidos, Brasil, Alemanha,Canadá, Austrália e algumasempresas de natureza multi-nacional. Foram citadas, por noveempresas, vinte nacionalidadesde produtos que competem comos do APL Biotec. O Quadro 2apresenta as principais marcasconcorrentes mencionadas pelosentrevistados:

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QUADRO 2Principais marcas concorrentes

Fonte: Dados da pesquisa

Existem cinco empresascom operações de exportaçãodireta,5 mas somente trêspossuem fluxo constante devendas ao mercado externo. Aárea com maior concentração deatividade exportadora é a deSaúde Humana, com quatroempresas. A quinta empresaencontra-se no subsetor demonitoramento e controle depragas.

Ainda que essas empresaspossuam experiência expor-tadora, nem todos os serviçosrelacionados ao comérciointernacional são realizados porfuncionários internos. Por maisque elas tenham pessoal

especializado para atender ocliente externo, determinadosprocedimentos que requeremconhecimento mais técnico sãoterceirizados, tais como serviçosde prospecção de clientes,documentação, despacho adua-neiro e operações de logística.

O atendimento ao clienteexterno é feito por represen-tantes comerciais e/ou contatodireto com distribuidores noexterior. Esse modelo é bastanteusual no início da atividadeexportadora, no qual o agente noexterior atua comissionado e apoiao produtor em ações de mercado.Dessa forma, as empresasexportadoras do APL Biotec

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encontram-se na primeira etapa doprocesso de interna-cionalização.

Duas empresas encon-tram-se num estágio maisadiantado de internaciona-lização, assumindo maiorcomprometimento e risco com omercado externo, por teremcontratos de joint-venture comempresas alemãs. Em um doscasos, a distribuição da sociedadeé de 80% de capital estrangeiro e20% de capital nacional.

Percebe-se grande des-conhecimento sobre atuação nomercado internacional. Somentequatro das empresas expor-tadoras utilizam algum processoou fórmula para a formação dopreço de exportação, gerandopreços flexíveis que consideramvolume, preços praticados nomercado, tipo de cliente, entreoutros. Operações financeiras,como adiantamento de contratode câmbio (ACC),6 são utilizadassomente por uma das empresasexportadoras, embora quatrotenham conhecimento de comofazê-lo. O mesmo ocorre comoperações comerciais e denegociação, logísticas e opera-cionais, burocráticas. Somenteuma das empresas terceirizaesses serviços, inclusive aprospecção de clientes.

Com baixo conhecimentodas necessidades dos clientes noexterior, os exportadoresdependem da manifestação dosclientes estrangeiros. Um dosentrevistados justificou existirum apelo forte pelo produtobrasileiro e de fonte natural. Porsua vez, poucas empresaspossuem registro de marcas epatentes no exterior. Dentreaquelas que possuem registro demarcas no exterior (apenas duas),os registros concentram-se nospaíses da América Latina e foramfeitos com o auxílio deconsultorias especializadas.

Os principais mercadosde atuação estão na AméricaLatina. Entretanto, a escolha nãose deu pela realização de umestudo prévio de mercado erealização de um planejamentoestratégico. A busca de mercadoacontece de forma passiva e ademanda externa chega àempresa através da solicitaçãoamostras.

Algumas empresas comexperiência exportadora expe-rimentaram problemas de atrasona entrega da mercadoria e coma embalagem. Atrasos incidemem quebra de confiança e perdade imagem junto ao cliente. Paraque isso não ocorra, é necessáriodomínio das operações delogística, desde a produção até a

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entrega. Quanto à embalagem,recomenda-se investigar progra-mas de apoio governamentaldisponíveis no mercado paratrabalhar a adequação deprodutos para exportação.

As principais dificuldadesapontadas pelas empresas comrelação à capacidade paracompetir no mercado interna-cional foram: falta de conhe-cimento, legislação, questãotributária, medo e incredi-bilidade de parceiros, vigilânciasanitária, logística, dificuldadede competir com marcasinternacionais, desconhecimentodos problemas, registro demarcas, burocracia e falta deconhecimento gene-ralizada.

Todos esses fatoresdemonstram que, apesar dealgumas empresas possuíremexperiência exportadora, oconhecimento geral sobre osprocessos relativos ao mercadointernacional é bastanteincipiente, explicitando anecessidade de se realizar açõesvoltadas para treinamento,capacitação, adequação deprodutos e produção de materialpromocional.

O uso de matérias-primase insumos produtivos impor-tados, adquiridos de forma

indireta por meio deimportadores e distribuidoresbrasileiros, é uma prática comumna indústria de Biotecnologia. Afalta de matéria-prima no país foia principal justificativa para aimportação desses insumos,seguida da busca por melhoria daqualidade e de inovações. Osprodutos importados são meiosde cultura, pipetas, placas decultivo, tubos de ensaio,reagentes, TAQ polimerase, tubospara micro- centrífuga, microplacas de PCR, oligosnu-cleotideos, tampão, enzimas,armadilhas MQT, atraentes,cartões adesivos, botões deacrílico, sais, motores,componentes do sistemahidráulico; ou seja, matérias-primas, produtos acabados,máquinas e equipamentos. Ospaíses fornecedores dessesinsumos são: Suécia, Dinamarca,Estados Unidos, Alemanha,Japão, Índia, China, França,Bélgica, Espanha e Argentina.Devido ao grande volume dematéria-prima importada,poderia haver um estágio de “pré-internacionalização” no grupodiante da experiência naaquisição de produtos se acompra é não fosse feita por meiode distribuidores no Brasil.Diante da forte demanda por

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insumos e da possibilidade deredução de custos na aquisiçãoconjunta dessa matéria-prima,recomenda-se avaliar a criaçãode uma central de negócios para,em um primeiro momento, iniciarcompras conjuntas no mercadointerno, obter ganhos de escala e,futuramente, realizar importaçõesdiretas. Esse segundo estágio trará

conhecimento e experiência nomercado internacional.

O Quadro 3, a seguir,apresenta de forma resumidaalgumas características deinternacionalização das empresasdo APL Biotec e classifica asempresas de acordo com seu graude internacionalização:

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QUADRO 3Estágio de internacionalização das empresas do APL Biotec

Fonte: Dados da pesquisa

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do dinamismo dosegmento de Biotecnologia e

comparando o desempenho dogrupo analisado, destacam-sealgumas necessidades dasempresas interessadas em

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atender o mercado externo, comoa estruturação de processos degestão comercial, de desenvolvi-mento de estratégias demarketing, de conscientização daadequação de embalagem etreinamentos específicos ematividades de comércio exterior,tais como operações de logísticaou financeira, e a importância dacooperação para o trabalho emgrupo.

Sugere-se o desenvolvi-mento de ações integradas decomunicação e marketingvoltadas para o relacionamentocom o mercado externo, deacordo com a capacidade deprodução e atendimento dasempresas. Uma pesquisa demercado poderá dar subsídio aum planejamento estratégico quepermita desenvolver umposicionamento de mercadoadequado às necessidades deatuação das empresas.

Por concentrar alto nívelde conhecimento tecnológico,contratar pessoal capacitadopara atender as exigênciasinternacionais e se caracterizarpela intensa busca de cer-tificação, o setor obtém compe-

titividade por meio detreinamentos, absorção detecnologias de informação,inovação em marketing ecomercialização. Todos essesfatores, junto com a aceitabili-dade do produto certificado,permitem avanços rápidos noprocesso de internacionalizaçãovivido pelas empresas, seja comresultados em exportação ou pelolicenciamento de processostecnológicos.

Embora a necessidade deintervenção seja pequena no quese refere à competitividade, deve-se ressaltar o interesse dosempresários na realização e nasvantagens do trabalho em grupo.Ainda que a contribuição e odesempenho de cada uma dasempresas tenham sido funda-mentais para realizar umlevantamento de dados adequadoà importância e à qualidadeesperada deste trabalho, reco-menda-se a realização depesquisas futuras voltadas para acooperação em rede de empresas,buscando destacar vantagensdecorrentes do trabalho de formaassociada e a conquista benefícioscomuns na busca pela interna-cionalização do setor.

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4 O Despacho Aduaneiro é oprocessamento da desnacionalização damercadoria para ser exportada, que secaracteriza pelo fornecimento dasinformações relativas à exportação erecolhimento de impostos e taxas incidentessobre a operação (KEEDI, 2004, p. 72).

2 Arranjos produtivos locais sãoaglomerações territoriais de agenteseconômicos, políticos e sociais, com foco emum conjunto específico de atividadeseconômicas, que apresentam vínculos, mesmoque incipientes, e envolvem a participação deempresas, instituições públicas e privadas(CASSIOLATO; LASTRES, 2003).

3 A classificação do BNDES é aplicável àindústria, comércio e serviços, conforme aCarta Circular nº. 64/02, de 14 de outubro de2002 – Micro-empresas: receita operacionalbruta anual ou anualizada até um milhão eduzentos mil reais; Pequenas Empresas:receita operacional bruta anual ou anualizadasuperior a um milhão e duzentos mil reais einferior ou igual a dez milhões e quinhentosmil reais; Médias Empresas: receitaoperacional bruta anual ou anualizadasuperior a dez milhões e quinhentos mil reaise inferior ou igual a R$ 60 milhões; e GrandesEmpresas: receita operacional bruta anual ouanualizada superior a R$ 60 milhões (BNDES,2007).

1 Termo cunhado por um estudo realizadopelo The Australian Manufacturing Councilpara designar pequenas empresas que nascemglobais e não precisam passar pelos estágiosusuais de internacionalização – tradução livre.

Notas

6 Antecipação parcial ou total de recursosfinanceiros, em moeda nacional, pelo valorequivalente em moeda estrangeira, por contade uma exportação a ser realizada em datafutura (FARO, 2007, p. 156).

5 A exportação direta implica na operaçãorealizada pelo próprio fabricante do produto,o que quer dizer que ele não utiliza qualquerintermediário na operação, saindo esta com seunome, incluindo toda a documentação decomércio exterior em que aparece comoexportador (KEEDI, 2004, p. 20).

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Otavio ROtavio ROtavio ROtavio ROtavio RezendeezendeezendeezendeezendeCentro Universitário UNA

Mestre em Administração pela Faculdade deCiências Humanas de Pedro Leopoldo/MG.

Endereço profissionalCentro Universitário UNA, Faculdade de Ciências

Sociais Aplicadas.Rua Aimorés, 1.451 - Lourdes

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Cristiane Amaral SerpaCristiane Amaral SerpaCristiane Amaral SerpaCristiane Amaral SerpaCristiane Amaral SerpaCentro Universitário UNA

Mestrado em Política Econômica Internacional pelaUniversidade de Tsukuba - Japão, validado comomestrado em Ciência Política pela Universidade

Federal de Minas Gerais (2003).Gestora do Núcleo de Assuntos Internacionais do

Centro Universitário UNAEndereço profissional

Centro Universitário UNA, Faculdade de CiênciasSociais Aplicadas.

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