os direitos humanos no contexto da globalizacao

Upload: assessoria

Post on 07-Jul-2018

239 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    1/17

    38 II I VIDA NO E CONTRA O TRABALHO

    SARGENT, L. (ed.) Women and Revolution: A Discussion ofthe Unhappy

    Marriage

    of Marxism and Feminism, Boston: South End Press, 1981.

    YOUNG, B. 'Global izat ion and Gender: A European Perspective'. In: R.M. Kelly,

    J H,

    Bayes, M.W. Hawkesworth and B. Young (eds.) Gendet; Globalization, and De-

    mocratization. Lanharn, MD: Rowman

    &

    Littlefield, p. 27-47, 2001.

    YOUNG,1. 'Beyond the Unhappy Marriage: A Critique ofDual Systems Theory'. In:

    L. Sargent (ed.) Women and Revolution. Boston: South End Press, p. 43-69. Falling

    Wall Press, 1981.

    •......... 'Katbi Weeks graduou-se em teoría política e

    é

    atualmente professora associada no

    departamento de Women's Studies na Duke University. Autora de Constituing Feminist Sub-

    jects (Cornell University Press, 1998), seu tema detrabalho atual

    é

    políticaeaét ica dotrabalho.

    E-mail: [email protected]

     

    LUGAR COMUM N 25-26,

    pp.

    39-71

    Os direitos humanos no contexto da

    globalizay8o: tres precis5es conceltuals=

    : _ Joaquín Herrera Flores

    o

    ser humano só   alguém  ou se expressa como

    alguém) como condensacáo de tramas de relaciies.

    Hello Gallardo, Política

    y

    transformación social.

    Discusión sobre Derechos Humanos

    1. As tres

    precísñes

    1 .a A p re cisá ofiloso fica

    Na tradicáo de direitos humanos que se veio impondo durante a época

    da Guerra Fria, a fundamentacáo filosófica daqueles d ire itos plasmou-se em duas

    tendencias: a universalidade dos direitos e sua pertinencia inata

     

    pessoa humana.

    Nada nem ninguém pode i r con tra di ta  esséncia't.já que ao fazé-Io pareceria que

    atentamos contra as própria s características da  natureza  e da dignidade humana

    universal.

    Os desmandos e atrocidades que se cometeram durante o século XX e a

    memória do horror que ternos acerca da escravidáo ou dos genocídios irnperia-

    listas, dentre outros

    fen ómenos,

    ou, para citar exemplo mais próximo, a irracio-

    nalidade, o terror e a indiferenca em relacáo a qualquer normativa internacional

    que deriva do campo de concentracáo de Guantánamo, induz-nos a pensar que

    tal fundamentacño é a adequada, que há

    esséncias

    humanas abstratas que nao

    podem ser contrariadas sequer pelos próprios seres humanos, que há , enfim, urna

    espécie de reserva espir itual intocável que nos preserva do mal desdobrado na

    história. Apresentando-se como  humanistas , as fundamentacñes abstratas dos

    direitos humanos defendern, na real idade, um anti-hurnanismo que postula que os

    16 Este trabalho

     

    parte de umtexto mais amplo, realizado por Joaquín Herrera Flores e Ale-

    jandro M. Médici, intitulado

    Derechos Humanos y Orden Global: tres desafios teórico-políti-

    cos,

    a ser publicado em Desclée de Brouwer. Traduzido do espanhol pelo Coletivo de t raducáo

    attraverso (Désirée Tibola, LeonardoRetamoso Palma, Lúcia Copetti Dalmaso ePaulo Fernan-

    dodos Santos Machado).

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    2/17

    I   r

     

    1  

    40 I I OS DIREITOS HUMANOS NOCONTEXTO DAGLOBALlZAQAO

    , direitos humanos sáo entidades que estáo - ou devem estar -

     

    margem de nossas

    acóes,   margem do humano e devem ser entendidos como se dependessem de

    urna entidade transcendente a nossas debilidades humanas que nos protegerá, em

    última instancia, dohorror e das violacóes. Os direitos suporiam, pois, urna esfera

     objetiva  de limites

    ¡ ¡

    própria acáo do homem, sobretudo quando esse ostenta o

    poder sobre a vida e a morte de seus congéneres.

    Ainda que os beneficios imediatos dessa fundamentacáo filosófica se-

    jam importantes para mobilizar as consciéncias e denunciar o horror da tortura,

    da discriminacño, da indiferenca frente ao homem ou ante a destruicáo do meio

    ambiente, sob um olhar mais atento, vemos que os problemas que acarretam sáo

    maiores que os beneficios que trazem.

    Pretender colocar osdireitos em um mais

    além,

    liberado de qualquer tipo

    de impureza contextual, pode nos servir, como dissemos, para conscientizar de

    modo ingenuo e imediato os que tenham, como única bagagem, a esperanca de

    um mundo melhor e sem injust icas: daí a forte legitimacáo que conseguiram as

    propostas da teologia da liber tacáo no campo dos direi tos humanos. Contudo,

    bastaria inflar a esperanca, para solucionar os problemas concretos e reais?

    É

    suficiente confiarmos em urna instancia transcendente e benevolente, para funda-

    mentar práticas sociais que articulem movimentos de luta pelos direitos? E mais:

    por que lutar pelos direitos, se já os temos garantidos metafísica, ideal ou reli-

    giosamente? De que nos vale a esséncia metafisica que dizem nos pertencer pelo

    mero fato de sermos seres humanos, ante as práticas depredadoras das grandes

    corporacóes transnacionais? O que se conseguiu nos mais de cinquenta anos da

    assinatura da Declaracáo Universal, que contribua, hoje, para resolver os pro-

    blemas de condicóes de vida de mais de oitenta por cento da humanidade? Nao

    estaremos universalizando urn só ponto de vista: o judaico-cristáo-ocidental, e

    apresentando-o como a

    ess éncia

    imutável de algo que tem necessariamente de

    contar com outras formas de conceber e resolver os problemas que subjazem aos

    particulares conceitos de dignidade? Como garantir o acesso   justica

    áque las

    e

    áqueles

    que defendem e praticam um conceito diferente dedignidade humana, ou

    que hierarquizam de modo diferente os valores?

    Nietzsche ensina que, quando falamos de conhecimento ou derealidade,

    é preciso negar a existencia em si (separada de suas condicóes de existencia) e

    negar termos tais como espirito, razáo, consciencia, alma ou pensamentos verda-

    deiros , O conceito de verdade é urn contra-senso ... todo o reino do verdadeiro

    e do falso refere-se tao somente

    a relacñes entre seres,

    nao ao em si... Nao há

    nenhum ser em si, como tampouco

    dá-se

    ou pode dar-se algum conhecimento

    r

    Joaquín Herrera Flores

    41

    em si  (Nietzsche, 1998, p. 14-122); ambos, conhecimento e ser, constituem-se

    no conjunto de relacóes em que se integram. Nesse sentido, qualquer produto

    cultural- como os direitos humanos - tem de ser integrado no que denominamos

    o circuito cultural:

    Com nós mesmos

    Produtos

    culturais Realidade: Trama de Relacáes: Com os outros

    Com a natureza

    Todo produto cultural surge em urna determinada realidade, num marco

    específico e histórico de relacóes sociais, morais e naturais. Nao

    h á

    produtos cul-

    turais a margem do sistema de relacóes que constitui suas condicóes de existencia.

    Nao há produtos culturais em si mesmos. Todos os produtos culturais surgem

    como respostas simbólicas a determinados contextos de relacóes. Ainda mais, os

    produtos culturais nao só estáo determinados por esses contextos, mas, por sua

    vez, eles condicionam a realidade na qual se inserem. A isso se chama o circuito

    cultural . Nada há, pois, que possa ser considerado em si mesmo,   margem do

    contexto específico em que surge e sobre o qual atua.

    O exemplo filosófico por excelencia

    é

    Platáo. Haveria

    A República

    se

    Platito nao tivesse sido impulsionado a escrever contra a democracia de seu tem-

    po? Acaso Platáo nao influiu nos desenvolvimentos reacionários posteriores? Fa-

    lamos, entáo, de umprodutor deprodutos culturais que reagiu frente a' um deter-

    minado complexo derelacñes humanas e que colocou como objetivo de todo seu

    pensamento afastar ao máximo os seres humanos concretos do conhecirnento e da

    política verdadeiros , Com argumentos denominados dialéticos , pela tradicáo,

    mas que nao eram mais que reducóes ao absurdo, Platáo vai depreciando tudo o

    que soe a pacto entre seres humanos e tudo o que se baseie no fluir continuo dos

    acontecimentos. As coisas nao

    té m

    relacáo nem dependencia conosco - afirma

    Platáo -, sáo em si por sua própria natureza ; e, al ém disso, nao podem mudar,

    sáo estáticas, alheias aos fluxos naturais e históricos . Nao fosse ass im, o co-

    nhecimento seria impossível (o conhecimento puro, o conhecirnento de esséncias

    imutáveis, o conhecimento nao humano, haveria que acrescentar.

    Nada, nem a jus tica, nem a dignidade e muito menos os direi tos huma-

    nos procedem de esséncias imutáveis ou metafísicas que se situem além da acáo

    17 Platáo, Crátilo, 386 e.

    18 Platáo,

    Crátilo

    411 e, 437c, 439 d. Como ampli ac áo do que tr at amos, ver Rodolf o Mondo l-

    fo,

    La Comprension del Sujeto en la Cultura Antigua,

    Buenos Aires, 1968.

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    3/17

    FI 1

     

    42 I I OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DA GLOBALlZACÁO

    humana para cons trui r espacos onde desenvolver as lutas pela dign idade humana.

    Por mais que se fale de direitos que as pessoas té m por ser em seres humanos,

    quer dizer , por mais que se fale de esséncias anter iores ou previas as práticas

    socia is de const rucáo de relacñes socia is, políticas ou jurídicas, inevitavelmente

    teremos de

    decifrar o contexto de relacáes -

    a trama densa de

    relacñes

    que de -

    f inem o sujeito - que lhe dáo origem e sentido, sobretudo se queremos fugir da

    ten tacáo de  imputar a toda a humanidade o que nao é senáo produto de urna

    forma cultural de ver e e star no mundo.

    1.b A precisiio teórico-política: os quatro

    planos

    da luto pelos direitos

    humanos e os quatro

    mal-estares

    culturais

    o homem

      11m

    animal

    suspenso

    em

    r ed es que e/e m e S1 11 0

    teceu

    C. Geertz, La interpretación de las culturas

    Desde 1948 até a atualidade, fomo-nos acostumando a denominar direi-

    tos humanos os diferentes processos sociais, polít icos e culturais que tenderam

    a positivar institucionalmente tanto as exigencias de protecáo cidadá contra a he-

    gemonia do Estado sobre nossas vidas cotidianas, como as demandas políticas

    de intervencáo do próprio Es tado, com o objetivo de impedir o desdobramento

    i rre strito do mercado nas rela cñes socia is e suas consequéncia s buscadas inten-

    cionalmente ou nao.

    Essa dupla atitude frente ao Estado conduz ao que se pode denominar o

    mal-estar da dualidade. Essa tendencia supñe, por um lado, um forte componente

    de ambiguidade, dado que nos coloca ante a reivindicacáo de urna esfera autóno-

    ma livre de interferéncias e, ao mesmo tempo, ante a exigenc ia de interferir para

    impedi r o desdobramento sern res tricóes das

    consequéncias

    perversas do mercado

    capitalista: destruicáo do meio ambiente, desemprego, privatizacáo do património

    h istór ico art ís tico, despro tecáo con tr a enfennidades . .. Por outro l ado, essa ten-

    dencia coloca-nos ante a ri queza do conceit o que, ao longo da segunda me tade do

    século XX, foi sendo convencionalmente chamado de

    direitos humanos.

    Quando ut il izamos o termo da convencáo tenn inológ ica (portanto,

    ideológica) e fa lamos de direitos humanos , nao nos referimos a processos uni-

    later ai s ou abs tra tos nos quais só se ve urna parte do probl ema: as ingerencia s do

    Estado na autonomia individual , dos quais se exige , ao mesmo tempo, adaptacáo

    aos níve ís de complexidade de uma reali dade humana submetida a proce sso eco-

    nómicos , socia is e cul tur ais em que predominam as d is tribu icóes injus tas de bens,

    r

    Joaquín Herrera Flores

    43

    e nos qua is os objet ivos políticos sáo reduz idos as necessidades de garant ir pro-

    tecáo jurídica

     

    esfera económica. Por convencáo terminológica, denominamos

    dire itos humanos os processos que asseguram nossa esfera de atuacáo autónoma;

    mas, também, os processos que a fron tam as consequéncias perversas dessa auto-

    nomia, sobretudo quando a autonomia

    é

    entendida como a possibi lidade de atuar

    i rrest ri ta e corporativamente com o objet ivo de aprofundar os d iferentes modos de

    acumulacáo e apropriacáo do cap ital.

    Esse mal-estar da dualidade pode ser enfocado a part ir de out ra per s-

    pectiva. Como defende Jurgen Haberrnas , se falamos de direitos

    humanos

    remete-

    mo-nos a meras ins tancias ideais e morais dejust if ícacáo e leg it imacáo das acóes

    individua is e da s polít icas públicas, o que o filósofo de Frankfurt rechaca abso-

    lutamente. Mas se falamos direitos humanos - opcáo admitida por Habermas -,

    referimo-nos ao conjunto de normas constitucionais, válidas positivamente, que

    cont ro lam os h ipotét icos desvios despóticos do poder, ao mesmo tempo em que

    asseguram urna obediencia baseada na le í, e nao em meras instancias morais ou

    metaf isicas. Deixando de lado o fundamento f ilosóf ico dessa distincáo terminoló-

    gica - nao pode haver consenso racional d iscurs ivo baseado em ques tóes morais

    ou de bem comum, mas unicamente em direitos formais - a causa eficiente da

    distincáo reside no repúdio que a teoria juridica libera l manteve cont ra a est re ita

    re lacáo que existe ent re di re itos e deveres. Para Habermas , os direitos humanos

    nao obrigam a nada, mas nos oferecem um marco de autonomia para nossa acáo

    pública : por isso podem ser justificados apenas por serem positivados. Mas os

    direitos humanos, ao se basearem em questóes morais, estabelecem urna s ime-

    tria absoluta entre dire itos e devere s, a qual excede a positivacáo e nos conduz a

    perguntar se os ato res púb licos e privados atenderam ou nao as r esponsabi lidades

    que lhes competem, como critério de jus ti ficacáo de suas acóes. Como afirma o

    próprio Habermas (1999, p. 204), tratar urn problema social a partir de urn ponto

    de vistajurídico requer, dentre outras condicóes, reconhecer que o direito

    é

    formal

    (o que nao está pro ib ido, está permit ido), individualista (nao existem direitos co-

    let ivos , dado que o sujei to jurídico é o ind ivíduo, nunca as comunidades) e jus ti fi -

    cável exclus ivamente por cri térios r acionais de proced imento discur sivo (nao por

    responsabilidades e deveres). Qual esfe ra dos direit os Haberrnas defende? A de

    interferencia social, económica e cultural que controle as consequéncias perversas

    do mercado, ou a puramente individual abstrata que exige a nao intervencáo e a

    nao responsab il izacáo dos ámbitos públicos e institucionais nas vidas cotidianas

    dos seres humanos? Se o direito tem como única funcáo estabelecer e garantir

    marcos de acáo sem referencia a devere s e responsabilidades, como obrigar a s

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    4/17

    44 II I OS DIREITOS HUMANOS NOCONTEXTO DAGLOBALlZAC;:Ao

    Joaquín Herrera Flores II I45

    ins ti tuicñes a intervi r cont ra os horrores produzidos pelo processo de acumula-

    9ao, hoje global, do capital? Como exigir da s grandes corporacóes privadas que

    renunciem a depredar o conheci rnen to t radicional das comunidades populares?

    Como garantir a reproducáo do ecos sistema e a diversidade sociobiológi ca da

    humanidade? .

    O problema é que, ao rechacar os fundamentos morais dos direitos e só

    aceitar os direitos constitucionalmente positivados, Haberrnas - como Bobbio,

    para quem nao importaria a jus ti ficacáo dos d ire itos , s ó a aplicacáo deles - está

    aceitando impl ic itamente urna fundamentacáo moral que ele nao t raz ao debate ;

    e que, aceita como natural e nao modificável, torna-se invisível. Essa fundamen-

    tacáo moral é a do l ibera li smo, ideo logia duali sta que separa os d ir ei tos humanos

    em duas esferas i rr econci liáveis e defende a impossibi lidade de garant ir jurídica e

    institucionalmente os direitos sociais, económicos e culturais.

    Se estamos d iante de d ire itos un icamente forrnais, que permitem o que

    nao proíbam expressamente, como re sist ir ante inovacóes t écnicas muito ma is

    rápidas que as reformas jurídicas, e que, se nao encontram proibicóes expressas,

    tém campo livre para provocar consequéncias que podem ser gravosas para a

    humanidade? Como controlar as

    astúcias

    das grandes corporacñes , sempre muito

    hábeis para escapa r as poucas regulacóes jurídicas que a nava ordem global dei-

    xou i lesas? Dados esses fa tos , nao seria melhor mudar o adágio jurídico e ins ti tu -

    c ional izar que será pro ibido o que nao esteja expressamente permi tido?

    Reside aí a verdadeira razáo do mal-estar da dualidade. Nao fa lemos de

    direitos humanos, nem de dir ei tos humanos, mas de direitos humanos.  Direitos

    humanos sáo mais do que as normas que os reconhecem nacional ou internacio-

    nalmente, e sáo menos que as proposta s idea listas que repe tem que haveria urna

    esf er a moral externa aos seres humanos . Contudo, e a par te outras consideracóes

    que exporemos adiante, falar de direitos humanos implica afrontar diretamente

    esse duali smo cas trante que d ivide ideolog icamente o que a própria r ealidade nao

    pode distinguir.

    De nosso ponto de vista, o problema tem outros tres planos de aná lise: o

    jurídico-cul tu ra l, o socia l e o po lí tico . Os quat ro p lanos estáo est re itamente imbri -

    cados num ent re lacamento de tal complex idade que deixar decons iderar um deles

    implica tergiversar , fugir ao debate ,

    No plano jurídico-cultural, fa larnos das tensas re lacñes ent re as catego-

    r ias de identidade e diferenca. Já desde os debates da Assembléia revo lucionária

    na Franca pós-1789 fa la-se da necessidade de um mínimo de homogeneidade ci -

    dada como base para a construcáo de um Estado democrático. Os cidadáos de-

    vem compar ti lhar urna série de t raeos comuns que lhes permitam auto-en tender-

    se como partícipes da vontade geral. Esses traeos comuns t omam possível fala r

    da igualdade frente   lei e apresentá-Ia como se se tratasse de um fato : somos

    todos iguais perante a lei . Portanto, qualquer d iferenca real ent re as pessoas ou

    grupos somente entra no deba te jurídico sempre e quando nao provoque algum

    tipo de discr iminacáo perante a lei. Tomar par tido unicamente por esse aspecto

    jur ídico-cultural, que superpóe a identidade

     

    diferenca, conduziu a preponderan-

    cia das teoria s formais ou procedimentais da just ica. Teorías segundo as quais as

    diferencas - sejam as representadas pelas reivindicacóes igualitárias de Babeuf,

    se jam as propos tas f eministas de Ol impe de Gouges - eram, e seguem sendo, con-

    sideradas obstáculos , d is tor cñes ou, meras propos icóes de dever ser - anuláveis

    do d iscurso, f rente ao r isco de cai r na humeana f alácia natural is ta . As di feren-

    cas parecem interferir em dito processo de construcáo jurídica e política , o qual

    reque r a homogeneidade como base imprescindíve l (Birulés, op, cit., p. 19-29 e

    Honig, 1993, p . 76-125) . Grande parte do debate teórico de classe (Marx), de etn ia

    (Fanon) ou de genero (Livra ria da s Mulheres de Miláo), centrou-se na denúncia

    do que podemos chamar  o mal-estar da emancipacáo  : a conquista da igualdade

    de direitos nao parece ter se apoiado, nem parece te r impul sionado o reconhec i-

    mento das, e o respei to pelas , d iferencas. O ata homogeneizador prevaleceu sobre

    o da pluralidade e diversidade.

    A prob lemática funda suas ra ízes na f igura clássica do cont ra to como

    fundamento da relacáo socia l. Paradoxalmente, a idéia de contrato, que pa rece

    ter uma clara raiz económica ou mercantil (e, de fa to, é t razida a f ilosof ia pol ít ica

    a part ir da economia ), situa -se na sepa racáo, fundament al pa ra o liberalismo po-

    lítico, entre política e economia, Como afirmam Rosanvallon e Fitoussi (1997),

    apesar dessa proclamacáo ideológ ica de esf eras separadas,

    é

    o mercado que im-

    pñe as linha s de transformacáo socia l que a política tem que acatar. Qual melhor

    representacáo da ordem pol ít ica que a proporcionada por urn modelo exp licativo

    que ao mesmo tempo que se articula sobre a organizacáo capitalista das rela-

    cóes sociais, esquiva toda referencia a economía 'i? . Por consegu in te , e apesar de

    suas conotacóes conc reta s, a figura do contra to ba seia-se num conjunto de abs-

    19 Cf. o texto de Fraisse (1995)  Entre égalité et liberté .

    20 La expuls ión de l as re laciones soc ia le s. l a excl usi ón de las dete rminaci ones e fect ivas de

    los sujetos reales, posibil ita una representación del orden pol ít ico como un asunto de raciona-

    lidad, consenso, legaJidad. . . /a escisión entre economía y polí tica convie rte a l os teór icos del

    contrato en liberales ilustrados, seguramente bien intencionados y progresis tas, pero cada vez

    más impotentes para art icular la teoría a los procesos efect ivos . cada vez más impotentes para

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    5/17

    i

    46 ~ OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DA GLOBAlIZACÁO

    tracóes que, ao separar-se ideológica e ficticiamente dos contextos onde ocorrem

    as situacóes concretas entre os individuos e os grupos , normalizam, legitimam

    e legalizam posicñes prévias de desigualdade, com o objetivo de reproduzir-se

    infinitamente. Nesse processo, vai-se instaurando urna segunda separacáo muito

    importante para nosso tema: aparece urnespaco ideal/universal- o espaco públi-

    co - onde se moveriam idealmente sujeitos idealizados e idénticos que gozam da

    igualdade formal perante a lei.Nos termos de Sheila Benhabib, instaura-se a idéia

    de um sujeito generalizado , táo distante dos contextos nos quais vive ,que as si-

    tuacóes conflitivas desaparecem frente ao consenso que supñea igualdade formal,

    e as situacóes de desigualdade se esfumacam ante a aparencia de justica em que

    consistem os procedimentos. Enquanto quejunto a esse espaco público ideal sur-

    ge a consciencia de um espaco material/particular - o espaco do privado - onde

    se fazem presentes nao só os interesses económicos dos sujeitos concretos , suas

    insercóes nos ámbitos produtivos e reprodutivos, mas também os nós de relacóes

    que os ligam a outros sujeitos no espaco doméstico, as crencas particulares e as

    identidades sexuais e raciais+.

    O contratualismo supóe, entáo, a construcáo de urna percepcáo social

    baseada na identidade que se d á no espaco público garantido pelo direito e na

    expulsáo das diferencas ao ámbito desestruturado (einvisivel para o institucional)

    do privado. Daí as dificuldades que a teoria política liberal encontra na hora de

    reconhecer institucionalmente a proliferacáo de reivindicacóes de genero, raciais

    ou étnicas. Para o liberalismo político, há que entender a diferenca como di -

    versidade , como mera dessernelhanca que, no melhor dos casos,

    h á

    que tolerar,

    estabelecendo medidas que permitam aproximar o diferente ao padráo universal

    que nos faz idént icos a todos , e nao como urnrecurso público a ser fomentado

    det ener l aavanzada de la nueva derecha, ese enemigo que no ha dejado de vencer

    (Alejandra

    Ciriza, 1999, p. 237).

    21  El capitali smo alcanza

    S1

    mayor ía de edad cuando automatiza lo que en el periodo de

    la acumulación ori gi nari a e ra s imple expropiación arbitraria. desposesion salvaje ... La nor-

    malidad sucede a la anomalí a. la l eg it imi dad a la ley de l a jungla, la plusvalia al robo. Todo

    es conforme a l a ley. con forme al valor;

    y

    el c ic lo de la reproduccion se basta por sí solo, con

    muda constricción, para garanti zar su continuidad ampliada (Antonio Negri, 1989. p. 21).

    22 Lo privado incluye 110 sólo los intereses económicos de los sujetos, su forma de inserción

    en el proceso deproducc ión y reproducc ion de l a v ida mi sma , s ino además el conj un to de re-

    laciones que los l igan a otros sujetos en el espacio doméstico, las creenc ias particulares, las

    prácticas e identidades sexuales

    y

    raciales  (Alejandra Ciriza, op. cit. p. 239).

    23 Desde urna perspectiva liberal, a toleráncia com os diferentes sereduz

     

    mera contemplacáo

    da diversidade. Nesse sentido  la diversidad esdébilmente democrática: reconoce la mera de-

    r

    Joaquín Herrera Flores I I 47

    e garantido. O argumento ideológico que se usa, urna e outra vez, é que nao se

    deve contaminar o debate filosófico jurídico com questóes como as sexuais ,

    étnicas ou raciais. Todas as questñes estáo embebidas no principio universal de

    igualdade formal que constitui o sujeito generalizado . Qualquer argumentacáo

    que parta das características concretas e das insercóes contextuais especificas dos

    sujeitos concretos é rapidamente apelidada de comunitarismo, evitando a co-

    nexño que tal categoria ou esquema tem com a realidade norte-americana para a

    qual foi criada . A questáo nao consiste em introduzir o sexo, a raca ou a etnia no

    jurídico e no político, diluindo o debate com perguntas tais como: as normas térn

    sexo? Precisamente, areclusáo das diferencas em umámbito separado dopúblico,

    faz com que a raca, o sexo e a etnia adquiram importancia para o direito e para

    a política. Senum Parlamento a

    ratio

    homem-mulher é de 80 para 20%, nessa

    instituicáo o sexo tem muita importancia: é um critério configurador do pertenci-

    mento   instituicáo. Se em um código civi l ou em urna teoria dajustica segue-se

    utilizando o termo pai de familia , o sexo daquele que firma os cont ra tos ou

    daquele que pode se dizer urna pessoa representativa, tem muita importancia: é

    urn critério discriminatório em beneficio de uma das partes. Agora, numa confi-

    guracáo institucional onde a diferenca, nesse caso sexual, reconhece-se como um

    recurso público a garantir e onde a percentagem se aproxima a 50%, a caracterís-

    tica sexual deixa deser algo relevante ao ter todas as partes sua cota de participa-

    ¡;:iioe visibilidade: estamos frente

    a

    encarnacáo real, nao somente formal/ideal do

    principio de nao discriminacáo, Reconhecer pública e juridicamente as diferencas

    tem o objetivo deerradicar o sexual, o étnico ou o racial do debate político,já que

    todos teriam a possibilidade de apresentar suas expectativas e interesses sem ter

    em conta, agora sim, suas diferencas, Nao estariamos diante de urna polí tica de

    discrirninacáo inversa, com toda a conotacáo adversa que tem a palavra discri-

    rninacáo; mas diante de políticas de

    inversáo da discriminacáo

    e dos privilégios

    semejanza. Se podrí a decir que supadrino intelectual es J ohn Locke en Sil Let ter on Tolera/ion.

    Enfrentado a la d ive rs idad de vis iones de los grupos religiosos adoptó una táctica que reducía

    elpoder a religión organizada ... la religión era ante IIlIacuest ión de creencias individuales

    y

    no de representaciones colectivas (Sheldon Wolin, 1996 , p . 154).

    24 Quando os conee ito s ap li cáve is a um contexto que goza de hegemonía, sem maior ref le-

    xáo , exportarn-se para out ros contextos hegemonizados, chega -se á conclu sáo de que d it os

    conceitos nao sáo par ticulares, mas de aplicacáo universal. Ve r Bourdi eu e Wacquan t 2000, p .

    110 e 113. Sobre o contexto da polémica liberais-comunitaristas, ver  Universalism  xComu-

    nitarianism: Contemporary Debates in Ethics , em Philosophy   Soc ia l Criticism, n°. 3-4, V.

    14, 1998.

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    6/17

    48 I I OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZAQAO

    tradicionalmente ostentados pelos grupos que dominaram a construcáo social da

    realidade que vivemos.

    O

    plano social

    da problemática nos faz dar um passo adiante. Já nao se

    trata de analisar as tendencias homogenizadoras, que pretendem aparentemente

    evitar as discriminacóes, com o efeito perverso de reduzir a cinzas as diferencas

    e impor urna só visáo de mundo como universal. Trata-se agora de contrapor os

    conceitos de igualdade e desigualdade. Nesse nível abandonamos o terreno do

     sameness ,

    do esforco tendente a potencializar a igual identidade detodos peran-

    teo direito, para entrarmos na problemática da igualdade. a qual conceitualmente

    nao seopóe a diferenca , mas

     

    desiguaJdade. Nessa sedejá nao faJamos de nao-

    discriminacáo das cidadás e dos cidadáos perante a leí, mas das diferentes condi-

    cóes sociais, económicas e culturais que fazem uns terem menos capacidades para

    atuar do que outros: seja por

    razóes

    de etnia (Amílcar Cabral); de genero (Simone

    de Beauvoir); de c\asse (Mariátegui); de poder cultural (Gramsci); de situacáo

    geográfica (Samir Amin); ou, para colocar um ponto final. de   m á sorte (Ronald

    Dworkin). Nesse nível contata-se o que podemos denominar

     o mal-estar dode-

    senvolvimento :

    o progresso nas técnicas e na abundancia para uns, nao sornente

    nao redundou em beneficio das imensas maiorias populares que povoam nosso

    mundo, mas, precisamente, parecem alimentar-se da exploracáo e ernpobrecimen-

    to de 80% da hurnanidade.

    Danilo Zolo (1997) tentou sair desse mal-estar afirmando que, enquanto

    a cidadania provocava desigualdades e, ao mesmo tempo, liberdade, o mercado

    provocando desigualdades, também criava riqueza (p. 111)25 . O problema dessa

    equacáo reside em analisar que tipos de condicóes possibili tam a riqueza e a li-

    berdade, sem provocar o aumento das desigualdades existentes. Ficando, por en-

    quanto, no aspecto jurídico do problema, poderíamos afirmar que se dá urna pro-

    porcáo inversa entre a quantidade de recursos que seuse e a relacáo que se tenha

    com os direitos (nesse caso, sociais, económicos e culturais): maior quantidade

    derecursos disponíveis, menor referencia a esses direitos. e menor quantidade de

    recursos, maior referencia aosmesmos. Mas, pelo contrário, dá-se urna proporcáo

    25 De acordo com A. Ciriza (op. cit., p. 245).

     La aceptación plena de las

    premisas

    liberales

    e individualistas en relación a la ciudadanía conducen, mal que lepese a Zolo a predicar;

    sinsaberloy probablemente sin desearlo, un retama a la barbarie.Efectivamente, una de las

    tensionesde la ciudadanía esprecisamente la de requerir de un mínimo de insercióncon vista

    al goce de los derechos. De ahí la importancia de tener encuenta la tensión, y no la mutua

    exclusión, entre economía

    y

    política. La consideración puramente política de los derechos

    derivaen su configuración comoprivilegios (o grifo

    é

    do autor do artigo).

     

    Joaquin Herrera Flores I I 49

    direta entre a quantidade de recursos a que tenhamos acesso e a relacáo que se

    tenha com os direitos (individuais: civis e políticos); maior quantidade disponível

    de recursos, maior importancia concedida a esses direitos, e menor quantidade

    de recursos, maior indiferenca e desdém para com os mesmos (entendendo por

    recursos nao somente os económicos, mas também os sociais e culturais com os

    quais enfrentaremos o que mais adiante chamaremos as diferentes caras da opres-

    sáo). Está claro que o denominador comum que distingue as diferentes posicóes

    perante osdireitos é o acesso aos recursos. O que nos leva a urnareflexáo sobre a

    igualdade e a necessidade de abstracáo que toda tarefa jurídica requer. O direito

    nao reconhece necessidades, mas formas de satisfacáo dessas necessidades em

    funcáo do conjunto devalores que predominam nas sociedades deque se trata. Ao

    nao formalizar necessidades, mas formas de satisfacáo das necessidades, o direito

    ostenta um forte caráter de abstracáo. O problema nao reside nisso: formalizar

    implica necessariamente abstrair. O problema é o que se abstrai para poder levar

    adiante a tarefa de formalízacáo sem aprofundar, ou criar novas, desigualdades.

    Se abstrairmos as normas das diferentes

    situacóes

    no momento de ter acesso aos

    recursos disponíveis, os direitos, sobretudo os individuais, seráo vistos como pri-

    vilégios dos cidadáos que tém acesso as condícñes materiais que permitem gozar

    dos mesmos, e a um consequente desprezo pelos direitos sociais,

    económicos

    e

    culturais como meros indicadores de tendencia. Nesse sentido, o direito privile-

    giaria osmembros de urna classe, de um sexo, de urna raca ou de urna etnia em

    prejuízo dos que nao pertencem aoviés privilegiado, mantendo ou aprofundando

    a distancia entre a proclamacáo formal da igualdade e as condicñes.que permitem

    seu gozo.

    É

    esse o objetivo da democracia e do Estado de direito? Agora, se ao

    formalizar urna forma de satisfazer alguma necessidade, nao abstrairrnos as dife-

    rentes posicóes sociais, na hora de ter acesso aos recursos que permitam

    pó r

    em

    prática os direitos, estaremos, primeiro, denunciando os privilégios gozados pelos

    poucos; segundo, estabelecendo vias para ir fechando o abismo entre o formal e

    o material; e, terceiro, colocando em funcionamento o principio de nao discrimi-

    nacáo por razñes económicas, sexuais, raciais ou étnicas, já que o importante para

    o direito será essa funcáo ou tendencia deigualacáo no acesso aos recursos e nao

    defender e garantir os privilégios dos membros de urna classe, sexo, raca ou etnia.

    Nesse sentido, tanto urna política de redistribuicáo das possibilidades no acesso

    aos recursos, como urna política dereconhecimento da diferenca enquanto recur-

    so público a garantir, conduziriam a urna revitalizacáo e a urna democratizacáo

    dojurídico, sempre e quando ficar superada a tradicional cisáo entre as esferas da

    economia e da política e, a partir daí, teremos o marco adequado, nao para seguir

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    7/17

    r

    50 OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZA

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    8/17

    52 II I OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZAyAO

    ras do

    poder ,

    depois da grande vitória frente ao nacionalismo e, indiretamente,

    f rente ao comunismo soviético e a subs ti tu icáo do imperial ismo europeu pelo de

    matriz estadunidense, a ideologia l iber al - com seus componentes individual is -

    tas , abs tra tos e formal is tas - se conso lida como a visáo natura l e universal

    que se expressa nitida e com matize s universa lista s na s normas e textos que

    váo surgindo da ordem instituciona l global das Nacóes Unidas. Essa ordem, que

    se mantém intacta até a crise do keynesianismo a princípios dos setenta e que

    se desmorona a finais dos oitenta com o t riunfo do capitalismo anglo-saxáo e

    suas just ificacóes englobadas sob o rótulo do fi rn da h is tór ia e do Consenso de

    Washington , está sendo substituida por outro conjunto de processos que estáo

    ampliando a idéia liberal de direitos humanos a outras esferas antigamente con-

    sideradas malditas , por pertencerern aos pressupostos básicos do marxismo

    e do socia lismo real (Negri e Hardt, 2002) . O que nos inter essa , no momento, é

    ressal tar a v isáo l iber al ind ividual is ta dos di re itos humanos que, a par ti r desse ara

    universalizador e garantista da ideología.l ibera l, p revaleceu no período da Guerra

    fria e que ainda segue funcionando como pressuposto ideológico no campo da

    producáo jurídica. Por urn lado, o termo humanos serviu para a ímposicáo de

    urna concepcáo, como dissemos , l ibera l- ind iv idual is ta da idéia de humanidade

    que sobrevoaria por cima da d iv isáo do mundo nos dois b locos antagón icos , e que

    func iona como se expressa sse a esséncia abstra ta da pessoa. Por outro lado, o

    termo direito serviu para apresentar os direitos humanos como se pudessem

    ser garant idos por s i mesmos, sem a necess idade de out ras instancias.

    Isto

    levou

    a po lémicas fa laciosas e desfocadas que discut iam se era melhor fa lar de d ire itos

    fundamentais ou de direitos humanos (ou como no caso de Habermas, de di-

    reitos formais

    versus

    direitos humanos ). O fato da existencia de um

    direito

    nacional dos direitos humanos (os direitos fundamentais) e um direito internacio-

    nal dos direiios humanos clari fica o que v iemos defendendo: quando falamos de

    direitos humanos,

    o fazemos a part ir de urna convencáo, de um acordo ideológ ico,

    que aponta a a lgo que tem mais conteúdo que o puramente formal e que, também,

    nos afasta da s visóes essencialistas da Decla racáo de 1948. E, contudo, como vi-

    mos com Habermas - visáo rati ficada pelo cet ic ismo que professa a teor ia jurídica

    em relacáo ao conceito de d ire itos humanos - predomina a concepcáo formal is ta

    dos mesmos.

    26 Ver as obras de Richard TUCK.

    Natural Rights Theories,

    Cambridge University Press,

    1981; Philosophy and government: 1572-1651,

    Cambridge University

    Press, 1993;

    e, sobretu-

    do, The rightsof warandpeace:political thoughtand the internoüonalorderfrom Grotiusto

    Kant,

    Oxford University Press,

    1999.

    r

    Joaquín Herrera Flores

    53

    Esse entendimento, além de manter urna concepcáo restrit a de cultura

    jur ídica como algo separado do conjun to de relacóes socia is, pol ít icas, jurídicas

    e

    económicas,

    parte também de urna visáo mui to est re ita das prát icas jur ídicas. O

    direito nao

    é

    unicamente um refíexo das r elacóes sociai s e cul tu ra is dominantes;

    tambérn

    pode atuar, ou melhor, pode ser usado, e a ssim foi historicamente tanto

    por tendencias conservadoras como revolucionárias, para transformar tradicóes,

    cos tumes e inércias axiológ icas . Nao que estejamos ante urna ferramenta neut ra :

    em primeiro lugar , o direito

    é

    urna técnica de domínio socia l par ticular (Capella,

    op. cit., p. 150) que aborda os conflitos neutralizando-os desde a perspectiva da

    ordem dominante. E. em segundo lugar.

    é

    uma técnica especial izada que deter-

    mina a priori quem está legitimado para produzi-la e quais sáo os parámetros

    desde onde julgá -Ia . Da í a imensa forca de quem controla - em outras palavras,

    de quem está dotado de autoridade para a tar efa de dizer o d ire ito no momento

    de adequar ati tudes e regular re lacóes socia is nurn sen tido ideológica e pol it ica-

    mente determinado , que na atual idade segue sendo for temente sex is ta . Portanto,

    nem desprezo da luta jurídica, nem conñanca, em que somente a través de la se vá

    chegar a urn tipo de soc iedade justa, em que ca ibam todas a s expectativas, nao

    somente as hegemónicas,

    Toda leitura da realidade se faz desde duas posicóes, Em primeiro lugar ,

     lemos o mundo desde as chaves que o presente nos oferece, que r dizer, de sde

    os parámerros dominantes que conformam a hegemonia num espaco e num tempo

    determinados: estamos frente a posicáo ideológica. Enquanto que, em segundo

    lugar . lemos o mundo desde a situacáo que ocupamos no inte ríor dos conflitos

    socia is ou , o que é o mesmo, desde as chaves que a acáo social, opositora ou le-

    gitimadora frente ao status qua, nos oferece: posicáo política. Pois bem, a cul tur a

    jurídica - entendida como o conjun to de pressupostos teór icos, concei tuais e s im-

    bó licos atr avés dos quais se intervém, se exp licam e, em seu caso, interp re tam-se

    as re lacñes socia is desde o d ire ito - desdobra , para d izé-lo em termos Juan Ramón

    Capella, um conjun to de sele to res doxológ icos (Capel la , op . c it., p. 138) que

    induzem a um determinado tipo de Ieitura do fenómeno jur ídico.

    Em pr imeiro lugar, há urna lei tu ra nao ideológica , que possu i u rna ver-

    sñ o for te , aquel a que nega a influencia das ideolog ias na producáo, interp re tacáo

    e aplicacáo do direito e urna versao débil, que afirma que o direito é suscetível de

    ser usado por qualquer ideologia: mesmo reconhecendo que as normas jurídicas

    sáo produtos de urna leitura determinada das relacóes sociais, ao darem início  

    fo rmacáo do ordenamento jur ídico posi tivo , adqui rem o caráter de universalida-

    de e generalidade. E, em segundo lugar, urna le itura nao política , euja versáo

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    9/17

    54 ~ OSDIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZAQÁO

    forte se afirma nos dogmas de auto-suficiencia (validade formal) e completude

    (mecanismo de ajustes puramente internos) e sua versáo débil , a que, ainda re-

    conhecendo o apego do direito aos conñitos, prirneiro, esquece qual de ditos

    conflitos esteve na origem das normas e, na sequéncia, supñe que delas se pode

    resolver tecnicamenú~ qualquer outro conflito que se apresente, de urnamaneira

    neutra e ascética.

    Tanto em sua versáo forte quanto em sua versáo débil, essa leitura do di-

    reito  seleciona , hierarquiza e separa os diferentes componentes que constituem

    o fenómeno jurídico em sua globalidade e complexidade, invisibilizando ou esfu-

    mando, como veremos, as posicñes ideológicas e políticas do mesmo, sustentadas

    na visáo patriarcal, vale dizer, sexista, da realidade social.

    A costarriquenha Alda Facio (1999) defende quepara chegar a um direito

    e a urna análise jurídica apropriados para entender a categoria de direitos humanos

    de todas e de todos,

    é

    preciso adotar, em primeiro lugar, um conceito amplo de

    direito que contemple tanto o componente formal/normativo, como o institucio-

    nal/estrutural e o político/cultural. Conceito que conduza a conseguinte ampliacáo

    dos conceitos de validade formal, aplicacáo e interpretacáo e eficácia das normas;

    do que se deduz , em segundo lugar, a exigencia de urna visáo relacional, nao

    fragmentária ou idealizada de ditos componentes, dado quenao se falade tres es-

    feras ou perspectivas, mas de tres componentes de urna mesma realidade, somente

    separável em termos pedagógicos.

    Falar de componente

    formal-normativo

    é

    fazé-Io nao somente

    da perspec-

    tiva do conjunto de normas positivas que configuram o que se denomina orde-

    namento jurídico , mesmo que esse seja seu conteúdo fundamental; mastambém,

    da perspectiva do conjunto de regras que institucionalizam determinados compor-

    tamentos, relegando outros ao perseguido ou perseguível pelas instituicñes dota-

    das de autoridade. Essas regras nao esgotam sua funcionalidade em si mesmas,

    mas váo marcando o ritmo da atividade interpretativa, criando, ao mesmo tempo,

    formas de pensar que estabelecem o que em um determinado momento espaco-

    temporal denomina-se sentido comurn. Estamos, pois ante a ordenacáo e regu-

    lacáo de quem ostenta poder, de quem interpreta as decisóes desse poder, confor-

    mando, paralela e simultaneamente, as consciéncias dos submetidos a autoridade.

    Pelo que, os componentes estrutural/institucional e o político/cultural influem e

    sáo influenciados, pelo componente formal. Além disso, falar do componente es-

    trutural/institucional nao consiste unicamente em descrever as instituicóes que

    criam asnormas, aplicam-nas e as tutelam. Também há que sefalar do conteúdo

    que ditas instituicóes dáo as normas formalmente promulgadas ao combiná-las,

    r

    Joaquín Herrera Flo res ~ 55

    selecioná-Ias, aplicá-las e interpretá-las, criando, como afirma Facio, outras leis

    nao escritas - como a que impóe a tendencia a conceder as máes a guarda dos

    filhos nos processos de separacáo e divórcio - mas tao ou mais importantes para

    entender o fenómeno jurídico em sua globalidade. Dessa perspectiva, nao sepode

    entender a interpretacáo e aplicacáo do direito (seja por parte da administracáo

    pública ou dajustir,:a)unicamente desde a atividade do órgáo dotado de jurisdicáo

    (ou seja, desde as operacñes intelectuais realizadas pelas entidades jurisdicionais

    nahora de interpretar e aplicar a norma), mas também, desde os resultados aos

    quais conduzem ditas atividades, ou o que

    é

    o mesmo, desde a atribuicáo de sig-

    nificados aos fatos e as normas em funcao da cultura jurídica que predomina e

    os objetivos e valores dominantes. A interpretacáo e aplicacáo que de urna lei

    se realiza de forma reiterativa, ou a ausencia de ambas - por exemplo, por sua

    distancia da realidade social ou por urna impossibilidade material de aplicacáo -

    vai dotando de significados a dita lei e outorgando urna determinada vigencia ou

    falta de efetividade   margem da pura atividade formal. O hermeneuta, tal como

    o concebe Juan Ramón Capella, está ligado a dois tipos de exigencias: urnas, in-

    ternas a atividade de decidir; outras, ligadas a estrutura institucional na que está

    inserido. Razáo pela qual ojuiz ou o administrador nao só estáo sujeitos a normas

    preexistentes e a regras institucionais, mas também a valores, ideais, represen-

    tacóes intelectuais, paixñes, interesses concretos e condicóes de factibilidade de

    suaatuacáo jurisdicional, que nao ternos outro remédio a nao ser considerar como

    parte do conteúdo da lei . Se é que nao queremos, como veremos mais adiante,

    cair em urna metafísica jurídica de claros tons conservadores. De igual modo, o

    componente

    politico/cultural

    nao se reduz aomero conhecimento que a cidadania

    tenha das leis. Está claro que se nao conhecemos nossos direitos, essesnáo seráo

    exigidos. Mas nessa tarefa cidadá de exigencia e reconhecimento de direitos,

    esses se preencheráo de um conteúdo ausente dapura redacáo formal. Como afir-

    maAlda Facio, doconteúdo que cada comunidade der aos princípios e valores tais

    como liberdade, igualdade, solidariedade, honestidade... dependerá muito do que

    se entenda por igualdade de salário , igualdade conjuga ,  igual qualificacáo

    ou liberdade de trabalho , todos eles conceitos relevantes de diferentes campos

    jurídicos concretos. Urna lei ou urnanorma por mais válida que possa ser,no sen-

    tido formal do termo, nao poderá ser interpretada ou aplicada pelas autoridades

    jurisdicionais se nao for auspiciada, impulsionada ou exigida pela cidadania. Des-

    semodo, urnanorma será ou nao considerada conforme a constituícáo, nao por si

    mesma, mas até que urn Tribunal assim o decida, seja- em nosso ordenamento

    constitucional - por duvida razoável, seja pelo recurso apresentado pelos setores

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    10/17

    56 I I

    OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZA

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    11/17

    I  {   :' .

    58 I I

    OS DlREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DA GLOBALlZAc;:AO

    direito e as convencñes da ordem social sáo, sem dúvida , importantes para esse

    mundo (normativo) e, no entanto, somente sáo urna pequena parte do universo

    normativo que deveria chamar nossa atencáo (p. 16). Ficarmos no aspecto pura-

    mente formal nos faz esquecer, ou oculta ideologicamente, que atuamos nomarco

    de um conjunto de narracñes que situam as normas e lhes outorgam significado

    cultural. Toda constituicáo - afirma Cover - tem urna épica, como todo decálogo

    tem urna Escritura. Quando se o entende no contexto das narracoes que [he dáo

    sentido, o direito deixa de.ser ummero sistema deregras a serem observadas e se

    transforma em ummundo no qual vívernos .

    Os direitos humanos funcionam como esse contexto de narracóes ao

    estabelecer processualmente as relacóes entre o mundo normativo e o mundo

    material, entre os limites e obstáculos da realidade e as demandas ético-culturais

    da comunidade. Que esse contexto de narracñes nos conduza a um paradigma de

    passividade e de resignacáo ou a outro de contradicáo e resistencia dependerá de

    nossos comprornissos interpretativos na relacáo com o dominante estado de

    coisas. Reduzem-se os direitos a sua componente jurídico-formal, perderemos

    isso que George Steiner denomina a  altemidade do nomos , ou seja, a faculda-

    de de construir o distinto ao que

    é ,

    ouseja, ... as proposicñes, imagens, formas

    do desejo e da evasáo contrafática com as quais alimentamos nossa vida mental

    e através das quais construimos o meio mutável e em grande medida fictício de

    nossa existencia somática e social .

    Se analisarrnos as normas (ou, o que é muito importante, as

    consequén-

    cias de sua aplicacáo a coletivos tradicionalmente marginalizados das vantagens

    que supñe a adocáo daquela ficcáo e desse nomos ) e as teorias ou reflexñes

    sobre as mesmas, percebemos as dificuldades existentes a nível juridico e insti-

    tucional para incluir as expectativas e os valores de grandes camadas da popula-

    cáo: o patriarcalismo, o individualismo possessivo e o formalismo estáo na base

    de dita norma fundamental, de dita hipótese, ficcáo ou, melhor ainda, de dita

    cultura jurídica dominante. Agora, aotoparmos com universos discursivos e nao

    28 Ve r t ambém Cove r, op ci t. , p. 23:  El alcance del s igni ficado que sepuede asi gnar a toda

    norma  la interpretabil idad de la norma- se def ine. entonces. tanto por un texto legal , que ob-

    jetiva la exigencia. como por una mul tipl ic idad de compromisos implíci tos y explíci tos que lo

    acompañan. Algunas interpretaciones están escritas con sangre, y permi ten apelar a lasangre

    como par te de su fuerza de legitimación. Otras imerpretaciones suponen límites más conven-

    cionales acerca de cuánto debe arriesgarse en su defensa. Las narrac iones que cada grupo

    particular asocia con laley revelan el alcance delos compromisos del grupo. Esas narraciones

    también ofrecen recursos dejusti fi cación. condena y debate a los actores del grupo que deben

    luchar para vivir su ley .

    r

    Joaquín Herrera Flores I I59

    com

    esséncias

    absolutas ou metafísicas, poderemos defender que, se a burguesía

    teve éxito ao construir um procedimento que lhe permitiu elevar seus valores e

    expectativas   categoria de Grundnorm , hoje em dia deve-se generalizar di ta

    possibilidade e possibilitando urna transformacáo do procedimento jurídico para

    queoutros coletivos possam constituir - parafraseando a Ignacio Ellacuría - outra

     Grundnorm , ou seja, outro conjunto de ficcóes e pressupostos, favoráveis agora,

    nao somente a urna cIasse social, a que triunfa com as revolucóes burguesas, mas

    aos coletivos tradicionalmente marginalizados da ñccáo hegemónica: indígenas,

    irnigrantes, mulheres ...

    Por mais importante que seja defender o princípio de seguranca jurídica

    que certifica a validade interna das normas e outorga certeza na aplicacáo do di-

    reito,e por mais relevante que seja identificar as normas que promovam desigual-

    dadeou discriminacóes - tanto em sua redacáo formal como nos resultados que

    produzam - quando falamos desde a convencáo dos direitos humanos, é muito

    maisnecessário desvelar e julgar criticamente os traeos patriarcais da cultura ju-

    rídica: os pressupostos, hipóteses e fíccóes que irnpñem um único ponto de vista,

    urnaleitura particular e parcial da realidade como se fosse a única e universal.

    Para isto, necessita-se de urna concepcáo do direito que inter-relacione suas tres

    componentes.

    2. O conceito de

    direitos humanos:

    os direitos humanos como

    processos

    ..... a liberdade

    é

    o mais apreci ado e o mai s doce . .. e ssa li be rdade

    nao somente se pode conceder sem prejuizo para a paz piedade e

    para a paz do Es tado , mas, a lém disso, somen te pode-s e supr im i- la ,

    suprimindo com e/a a propria paz do Estado e ap iedade

    Spinosa,

    Tratado teológico político

    A capacidade de

    desfrutar é

    condicdo para

    desfrutar;

    e  

    portanto. seu

    primeiro

    i nst rumento ; e ssa capac idade equ ival e ao

    desenvol viment o de um talent o indi vi dual da forca produtiva

    A. Negri,

    Mane olt re Mane

    Os direitos humanos. em sua integralidade e desde o universo normativo

    de resistencia que defendemos nessas páginas, constituem algo mais que o con-

    junto denormas formais que os reconhecem e os garantem em um nível nacional

    ou internacional. Eles fazem parte da ancestral tendencia humana de construir e

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    12/17

    60 I I

    OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZA

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    13/17

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    14/17

    64 I I OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZACAO

    universa l - como produto do desdobramento de uma natureza humana essencia l

    e abstrata. Se nós falamos de direitos humanos como processos de luta - o

    co

    natus como fundamento imanente dos direitos humanos -, devemos negar essa s

    fundamentacñes ideal istas e ver os d ire itos humanos em seus con textos e em suas

    relacóes de adaptacáo 'ou crí tica f rente   est ru tur a imanente do mundo socia l que

    impóe o capitalismo.

    Assirn, como vimos, com o primeiro conjunto de textos (século XVIII)

    nos encontramos com a formulacáo dos direitos do cidadáo, sob os quais se pre-

    tendeu assegurar o ámbito autónomo - individual e e ssencialista - de libe rdade

    necessária para a acáo r acional do individuo no novo marco de relacóes socia is

    capitalistas que se estava desenhando: Declaracáo do Bom Pavo da Virgínia e

    Declaracáo do Homem e do Cidadáo , tex tos per fe itamente funcionais, p rimeiro,

    para enfr entar as est ru tu ras do

    Ancien Regime

    e, segundo, para a extensáo colonial

    e imperialista das potencias ocidentais. No entanto, após as duas grandes guer-

    ras que a ssolaram o continente europeu durante o século XX e que envolveram,

    pela prime i ra vez, a potencia norte americana como sócia na rapina colon ia l e

    neo colonial que se aproximava

    a

    segunda metade do século,

    surge o conceito de

    direitos humanos:

    um conceito que pretendía estender-se a toda a humanidade

    ao nao circunscrever-se unicamente aos direitos do homem burgués, branco e

    capitalista, e que parecía gozar da garantia jur ídica oferecida pelo substantivo

     direitos (Cortes regionais e intemacionais de justica).

    No entanto, devemos levar em conta t res ques tóes: 1 ) a insercáo de di to

    conceito (Declaracáo Universal de Dire itos Humanos) no marco

    sócio-político

    da

    Guerra Fria ent re os paises cap ital is tas e os comunistas - o qual reduziu novamen-

    te o conceito   de fesa e   garantia dos direítos individuais do sujeito capitalista

      frente dos direitos socia is económicos e culturais dos coletivos de ideologia

    socialista; 2

    a

    ) o reconhecimento positivo dos direitos deu-se no marco geoestraté-

    g ico da descolonízacáo  controlada  da s antigas colonias - o que reduziu o papel

    l iberador dos chamados di re itos de autodeter rn inacáo - e supós a consol idacáo de

    um sistema jurídico e político internacional baseado na supremac ia da vontade

    dos Estados; 3

    a

    )

    a continuidade da definicáo humanista , isto é, essencialista e

    33 No entanto, nao devemos ter urna visáo uni linear da his tória; ao lado dessas declaracñes 

    liberais, foram surgindo alternativas que tentavam superá- las a par ti r de diferentes ámbitos :

    a i nco rporacao da mulher (O. de Gouges), o s d ir eit os da s mass as popul are s ( ja cobinos ), o s

    anseios de l iberdade e jus tica dos escravos (Hait í). Alternativas que forarn irnediatarnente des-

    man te lada s por um poder bur gués que fo i as sumindo a hegemoní a e que nao ace itava ir ma is

    al ém do que seus ideólogos ilustrados tinham concebido.

    r

    Joaquin Her re ra Flores

    65

    abstrata dos direitos, que pretendia ve -los como a modelacáo histórica do des-

    dobramento de urna natureza humana a-histórica, produto de alguma instancia

    transcendental alheia aos processos de lutas sociai s e separada da extensáo do

    capitalismo como base ideológica. económica e política da reconstrucáo mundial

    após a segunda grande guerra. Esse s tre s elementos implica ram urna reducáo do

    conceito a seus limites individualistas, etnocént ricos, estatal is tas e fo rmal is tas,

    perfe itamente funcionais diante da nova fase de acumulacáo do capi ta l que ocor -

    reu na segunda metade do século XX e suas correspondes formas de poder social,

    econ6mico e cultural.

    Na atual idade, tal como vimos amplamente no desafio con textual , esta-

    mos ass is tindo a urna nova fase histórica que está exigindo urna nova per spectiva

    teórica e po lí tica no que concerne aos d ire itos humanos. Desde o final dos anos

    oi tenta e princípios dos noventa do século passado, e em consequéncia de fenó-

    menos como a queda estrondosa do socialismo real e a consequente expansáo

    g lobal do modo de producáo e de relacñes socia is capi ta li stas, iniciaram-se navas

    processos que estáo colocando em ques táo a natureza individual is ta , essencial is -

    ta , estata lista e formalista dos direitos que prevaleceram desde 1948 até quase a

    última década do século

    Xx.

    A nova fase da globaliz acáo, a denominada neoliberal , pode caracte-

    r izar- se , em termos gerais, sob quat ro caracterí st icas art iculadas: a) a prol ifera-

    yao de cen tros de poder (o poder pol ít ico nacional ve-se obrigado a compart ilhar

     soberanía com corporacñes privadas e organismos globais multilate rais); b) a

    inextricável rede de interconexóes financeiras (que faz as políticas públicas e a

     constituicáo económica nacional dependerem de flutuacóes económicas impre-

    visíveis pa ra o tempo com o qual joga a práxis democ rática nos Estados-Na-

    cáo); e) a dependencia de urna informacáo que circula em tempo real e é captura-

    dapelas grandes corporacoes privadas com maior faci lidade que pelas est ru tur as

    institucionais dos Estados de Di reito; d) o ataque frontal aos dire itos socia is e

    traba lhistas (que faz com que a pobreza e a tirania convertam-se em vant agens

    comparativas para atrair investimentos e capitais) (José Eduardo Faria, 2002).

    Essas ca racte rísticas própria s da nova fase de apropriacáo do capita l e s-

    tño provocando urna mudanca impor tante na cons ideracáo dos di re itos humanos:

    p rimeiro , a n ível jur ídico, esses fa to s induzi ram, em pr imeiro lugar ,

     

    cri se do

    d ire ito nacional dos di re itos humanos, já que as const ituicóes - sobretudo as que

    surgiram na América La tina e na Europa Latina após as ditaduras do último terco

    do século XX, nas quais verteu a última esperanca do Estado democrático de

    d ire ito - estáo perdendo seu caráter normat ivo e estáo aproximando- se perigosa-

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    15/17

    1r  1

    66 OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZAt;:AO

    mente ao que Loewestein denominava const ituicñes nominais e semánticas; e , em

    segundo lugar , estáo supondo a reconf iguracáo do dir ei to internacional de matriz

     particularista e soberanista que predorninou após a proclamacáo da DecIara-

    cáo Universal. A pau la tina ins tauracáo de urna ordem global. desigual e injusta

    que está minando as propost as de just ica socia l, e stá levando a teoria jurídic a

    internacionalista mais progressista a urna releitura constituinte que baseia o di-

    re ito internacional , mais que no ind iv idual ismo e no etnocent ri smo, na p lanetari -

    zacáo das necessidades e exigencia s de individuos e grupos, na busca mat eria l de

    jus tica e de sol idar iedade e na ins tauracáo de urna relacáo circular ent re o Es tado

    e a comunidade internacional ( Juan Car il lo Salcedo, 2002, p . 20).

    E, em outro nível, a consciencia das injusticas e os desequilíbrios aos

    quais conduz a g lobalizacáo estáo provocando , em primeiro lugar, o surg imento

    de processos de reacáo social multitudinários de recusa (movimentos antiglobali-

    zacáo) que levam anos colocando em cheque as até entáo t ranqui las e leg it imadas

    reunióes dos poderosos do p laneta ; em segundo lugar, o início de buscas de novas

    art iculacñes de redes socia is amplas (os t res fóruns socia is mundiais celebrados

    em Por to Alegre) , que estáo formando urn movimento de movimentos a n ível pla-

    netár io que nao se conforma com as t radicionais formas de part ic ipacáo e art icula-

    cáo social , mas estáo criando urna nova visáo do que s igni fica democracia; e , a n í-

    vel internacional, estáo dando or igem a todo um amálgama de tex tos, declaracóes

    e propostas que supe ram com vantagem o ca rát er individualista e e ssencial ista

    da Declaracáo Universal>. Épossível negar que estamos ante um novo processo,

    34 Consu lt e-s e a r nudanca de t om e de f undo que sur ge , den tr e out ro s t ex to s, na Convencáo

    mar co sob re mudanca c limá ti ca (R io de J anei ro , 1992) , a Convencáo da UNESCO sobre a

    protecáo do pat rimonio mundial cul tura l e natural (de 1972) ; A Ear th Charter Ini riat ive na

    qua l o s d ir ei to s humanos condic ionam- se a u rna v is áo concre ta da d ignidade humana (Pa rt e

    1), á protecáo ambiental - com especia l a tencáo as relacóes socia is de producáo, dis tr ibuicño e

    consumo - (Parte I l) , á just ica socia l e económica (Parte 111)e á construcáo de relacóes políticas

    democ rá ti ca s e náo v io lent as , como precond icóe s par a a constr ucáo de um Espaco Púb li co

    Compar til hado (Par te IV) ; o Mani fe st o 2000 par a u rna cul tu ra de paz e nao v io lenc ia , no

    qual a s ituacáo violenta ve-se como consequéncia dafalta de apl icacáo dos direi tos socia is , eco-

    nómicos e cu lt ura is ; a Decl ara cáo do Mil én io , que comeca com o obj et ivo de e lim inacao da

    pobreza e a promocáo de desenvolvimento; a impor tante Declaracáo de Responsabil idades e

    Deveres Humanos adotada pela UNESCO e organizada por ADC Mil lénaire e a Fundacáo Va-

    lencia Terceiro Milénio, na qual desde o princípio aposta-se na imputacáo de responsabil idade

    tanto aos organismos públicos como aos organismos privados peLasconsequéncias que provoca

    a o rdem pol ít ic a, soci al e cul tu ra l que sur ge da ampli ac áo da g loba liz acáo : veja -s e o cap ít ul o

    3 sobre seguridade humana e ordem internacional equitat iva (art igos 10-15) e o capítulo 10

    sob re Trabal ho , qua lidade de v ida e nível de vida (sobretudo o art igo 36, em cujo parágrafo

     

    Joaquín Herrera Flores I I67

    ante urna nova d inámica h is tó rica que enf renta as novas cir cuns tancias pelas quais

    a trave ssa o mundo no início do novo milénio? Os direitos humanos sáo algo dado

    e cons truído de urna só vez ou sáo processos em permanente const rucáo e recons-

    trucáo? Nao estaremos assistindo   ins tauracáo de um novo processo de di re itos

    humanos que afronta diretamente a globalizacáo neo liberal?

    Conclusñes

    o ato de vontade que dá origem ao mundo  

    utn ato de nossa propria vontade

     chopenh uer

    Seguindo a revo lucáo ó tica de Huygens, segundo a qual era o o lho huma-

    no que iluminava os objetos e nao esses que enviavam sua luz ao olho, Spinoza

    p6de conceber a natureza imanente do fundamento do humano no

    conatus,

    ou

    seja, na potencia humana de autopreservacáo na existencia. Esse dinamismo do

    humano , opos to a qualquer ten ta tiva t ranscenden te de passividade e submissáo a

     necess idades externas, implico u reconceber a l iberdade, nao como a l iv re de-

    cisáo de urna vontade autónoma, mas s im como a expressáo de urna necess idade

    interna de exist ir e de atuar. Recusando o individual ismo do con tra to socia l hob-

    besiano -:-a partir do qual os seres humanos renunciavam

     

    sua potencia em favor

    do Estado - Spinoza reivind icou o conatus como fundamento do cont ra to po-

    lítico - cujo pressuposto

    é

    a igualdade de condicóes entre as partes - o qual nao

    abriga a renuncia r a nada, mas sim t ende a empode rar os sujeitos que partici pam

    nele. Para Spinoza, só haverá l iberdade quando se fortalecer o conatus colet ivo ,

    isto é, a trama de relacóes de empoderamento no qual deve consistir a política

    democrática , e o sujei to humano nao ficar deb il itado por rnedo, supers ticáo ou por

    promessas de recompensas que se apresentam nas d if erentes fo rmas e manifesta-

    cóes teológ icas da v ida celes tial. Sem essa precondicáo, a acáo políti ca e soc ial

    nao será mais que a manif es tacáo de um simulacro : v ive- se em urn t ipo de reg ime,

    1I consolida-se o direito á segur idade socia l e as medidas de promocáo dos direi tos humanos).

    Este mesmo tom e estas mesmas questóes de fundo indicadoras , como dissemos, do surgimento

    deum novo processo de direi tos humanos , encontram-se nas declaracóes de direi tos indígenas

    r ed ig idas na década dos noven ta do s écul o XX: a Decl ara cáo de Ka ri-Oca e Cart a da Terr a

    dos Povos Indígenas . Conferencia Mundial dos Pavos Indígenas sobre Terri tório, Ambiente e

    Desenvolvimento (1992); a Declaracáo de Mataatua dos Direitos Intelectuais e Culturais dos

    Povos Indígenas (1993); a Deciaracáo dos Povos Indígenas do hemisfério ocidental em rela-

    cáo ao Projeto de Diversidade do Genoma Humano (1995).

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    16/17

    68 I I OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DA GLOBALlZA9AO

    mas se atua como se  se es tivesse em outro . A través do  conatus , a acáo política

    e social tenderá a construcáo de urna cul tur a de poder na qual se manif es tem clara

    e con tundenremente as d iferencas, a pluralidade e a potenc ialidade humana de

    transformacáo social.

    A ingenuidade  em política é, nas palavras de Slavoj Zizek, a pressupo-

    s icáo de que a realidade

    é

    algo dado de urna vez por todas, algo ontologicamente

    auto-suficiente, sendo nossa liberdade o espaco de autonomia que nos permite a

    existencia no marco do que se cons idera ob je tivamente puro e alheio as impurezas

    da subjetividade. A maturidade  em política, entáo, supóe afirmar a incompletu-

    de ontológica da  própria realidade: há realidade só na medida em que houver

    um hiato ontológico, u rna fenda, em seu próprio cen tro , sendo a l iberdade entáo,

    a assuncáo de nossa capacidade e nossa potencia lidade para aprovei tar as brechas

    e os inter st ic ios do que se cons idera objet ivo e criar novas formas de organizacáo

    e de luta. Ant ígona nao somente nega a lei públic a, senáo que, como manifesta-

    cáo de sua potencia como se r humano, a transcende e luta por transformá-la em

    outra.

    A nova fase do processo de construcáo social, política, económica e cul -

    tural de urna nova forma de estar no mundo a partir da categoria convencional e

    imanente dos d ir ei tos humanos, implic a nece ssariamente em lancar luz sobre o

    conjunto de relacóes que o neolibera lismo globali zado vem nos impondo como se

    se t ra tasse de urna realidade t ranscenden ta l e intocável. Mas essa necess idade de

    contexto nao fica por

    aí,

    Reconhecer a dependencia das categorias socia is como,

    por exemplo , os d ire itos humanos , de suas condicóes sociai s de existencia, nao é o

    único aspecto que nos interessa. Há que se da r um passo amais e afirmar a presen-

    ea da sub je tividade revolucionária e antagonista como

    motor móvel

    do processo

    de luta pela d ignidade humana. As fases histór icas nao estáo determinadas  obje-

    ti vament e , tal qual o atual determini smo do mercado, ou o vel ho determinismo

    comunis ta , queriam fazer-nos pensar. A passagem de urna época a out ra é produ to

    de sub je tividades que configuram o processo de t rans icáo e estabelecem as bases

    da nova configuracáo socia l. Nao é a transicáo objetiva a que se materializa nas

    lutas; mas sáo as lutas que se mate rial izam sob a forma da transic áo, da mudanca,

    da transformacáo, desde o desdobramento do conatus coletivo spinozano.

    Poi s bem, o que constitui o ponto de vista decisivo em todo esse pro-

    ce sso, nao sáo mais as de terminacóes objetivas do mesmo, mas a criacáo de sub-

    jet iv idade antagon is ta capaz de apresen tar a lternativas

    a

    ordem dominante: em

    nossos termos, os d ire itos humanos como processo de luta. Cont ra a passividade

    dos humanismos que de fendem o desdobramento natural e orgánico da natureza

    r:

    Joaquín Herrera Flores I I 69

    humana abst raída de seus contextos, dev emos re ivindicar o dinamismo das fun-

    damenta¡; :oes imanentes e material is tas que, como defende Negri, nao tendem a

    novos determinismos, mas sim a constituicáo mater ial da subjetividade revolucio-

    nária e antagonista.

    O ato ético e pol ítico por excelencia , defendem Jacques Ranciére, Ala in

    Badiou e Slavoj Zizek, nao é o que vai mais além do princípio de realidade. O

    próprio F reud o diz ia em

    O futuro de uma ilusüo:

    a i lusáo tem futuro nao porque

    a dura realidade nunca possa se r aceita e sejam necessários falsos sonhos, mas

    porque as  ilusóes , interpreta Zizek, estáo sustentadas pela insistencia incondi-

    c iona l de urna pulsáo que é mais real que a rea lidade rne sma . O ato ético e polí-

    tico por excelencia é aque l e que empode ra os sujeitos para que possam mudar a s

    próprias coordenadas do que se percebe como poss ível. Nilo supoe situar-se mais

    além do bem e do mal , mas t raduzindo l iter almente a famosa obra de Nietzsche,

    implica nos posicionar mais além do bem e do mal , quer dizer, mais além dos

    duali smos que nos impedem de const rui r out ras cons ideracóes do bem e ou tr as

    formas disti nta s, nao só de opor-nos ao mal, mas inclusive de defini-lo.

    Pa ra nós, o mal está regrado no que denominamos a nova constituicáo

    jurídica da globalizacáo , a qual se material iza nos d iferentes acordes  que sur-

    gem da Organizacáo Mundial do Comércio e cujas consequéncias Susan George

    definiu com toda cl areza: debilitar ou destruir os servicos públi cos; a rrui na r os

    pequenos agricultores;

    pó r

    em dúvida a s conquistas sociais; burla r o direito in-

    ternacional mais consolidado; prejudicar ainda mais os países já desfavorecidos;

    homogeneizar a cultura; devas tar o meio ambiente; cor tar os salár ios r eais e as lei s

    trabalhistas; reduz ir drastic amente a capacidade dos governos de pro teger seus

    c idadáos e a capac idade dos c idadáos para exigir ga rantia s de seus govemos. A

    cul tura - afi rma George -, a saúde e os servicos soc iais, a educacáo , os servicos

    púb licos, a propriedade intelectual , a seguranca alimentar: tudo isto se encon tra

    ameacado, entre tantas outras coisas. Para essa C constituir;:ao jur ídica do neolibe-

    ralismo globalizado ), o mundo

    é,

    efetivamente, uma mercadoria .

    Os di re itos humanos devem ser entend idos como processos socia is, eco-

    nómicos , po lí ticos e cul tur ais que, por um lado , configuram mater ia lmente - a tra-

    vés de processos de reconheci rnento e de mediacáo jurí dic a - esse ato ético e

    político maduro e radical de criacáo de urna nova ordem; e, por outro, a matriz

    para a cons ti tuicáo de novas práticas socia is, de novas subjetividades antagonis-

    ta s, revolucioná ria s e subve rsivas dessa ordem global absolutamente oposta ao

    con junto imanente de valores - l iberdade, igualdade, solidariedade - que tantas

    lutas e sacri ficios exigi ram para que se generalizassem. Por essa razáo, o último

  • 8/19/2019 Os Direitos Humanos No Contexto Da Globalizacao

    17/17

    F

    I 70 I I

    OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DAGLOBALlZA¡;:Ao

    e grande desafio que citamos nessas páginas e que deverá constituir o foco que

    ilumine

    n o ss a s p r á ti ca s,

    é afi rmar que o que convencionalmente denominamos

    direitos

    humanos nao

    sá o

    meramente normas jur íd icas nacionais ou intemacio-

    nais, nem meras declaracóes idealist as ou abstra tas, mas processos de luta que se

    diri jam abertamente cont ra a ordem genocida e ant idemocrática do neo libera li s-

    mo globalizado.

    O

    sujei to antagon is ta cons ti tui -se nesse processo e reproduz-se

    na riqueza de sua s prátic as sucessivas. Nao há nada de mais objeti vo que a  forca

    da multidáo que - como defend ia Deleuze - converte em comum a luta e dota de

    realidade a utopia .

    Referencias

    BIRULÉS, F.  E l sueño de l a absoluta autonomia: Ref lexiones en tomo a la igualdad

    y la d iferencia In : Gómez Rodríguez, A.; Tally, 1. La construcción cultural de lo

    feminino,

    BOURDIEU, Pierre.

      od er

    Derecho y Clases Sociales,

    Bilbao : Desclée de Brouwer,

    2

     

    edicáo, 2001,

    BOURDIEU, P.:WACQUANT,

     

    Los artificios de la razón imperialista In:

    Voces

    y

    Culturas, Revista de comunicación, n.

    15,2000.

    CAPELLA, Juan Rarnon.

    Elementos de analisis jurídico,

    Madri: Editorial Trotta,

    2006,

    CHAUÍ, Marilena.

    A nervura do real. Imanéncia e Liberdade em Espinosa,

    Vol.

    Imanéncia Companhia das Letras, 1999

    ___ ' Espinosa, umafilosofia da liberdade 

    Editora Moderna, Sáo Pau lo , 1995.

    CIRIZA, Alejandra. Democracia

    y

    ciudadanía de mujeres: encrucijadas teóricas y

    políticas In: Atilio

    Borón

    (comp.)

    Teoría y Filosofía Política. La tradición clásicay

    las nuevasfronteras,

    Buenos Aires: CLACSO- Eudeba, 1999.

    COVER, Robert.

    Derecho, narración

    y

    violencia, Poder constructivo J poder des-

    tructivo en la interpretacián judicial

    (Ch. Courtis ed.) , Barcelona: Gedisa, 2002.

    FACIO, A.

    Cuando elgénero suena cambios trae,

    San José de Costa Rica: ILANUD,

    1999.

    FACIO, A.; Fries, L

    Género

    y

    Derecho,

    LOM EdicioneslLa Morada, 1999.

    FARIA, José Eduardo.  E l derecho en una democracia cosmopol ita ,

    Anales de la

    Cátedra Francisco Suárez , n .

    36 ,

    2002.

    FARIÑAS, Dulce M,J. La 'ficción' en la teoría jurídica de Kelsen In:

    Crítica Jurídi-

    ca. Revista Latinoamericana de Politica, Filosofía y Derecho,

    n. 18,2001.

    r

    Joaquín Herrera Flores 71

    FITOUSSI, J.P .; ROSANVALLON, P.

    La nueva era de las desigualdades,

    Buenos

    Aires: Manantial,

    19 97.

    FLORES, Joaquín Herre ra (ed.).

    El Vuelo de Anteo. Derechos Humanos y Crítica de

    laRazón L iberal,

    Bilbao: Desclée de Brower, 200 l.

    FRAlSSE, G.  Entre égalité et liberté , In:

    La Place des Femmes,

    La Decouverte,

    1995 .

    GRUPO DIOTIMA,

    Oltre

    I

    'ugluaglianze. Le radici

    femminili

    del  'autoritá,

    Miláo:

    Liguori Editore , 1995.

    HABERMAS,

    Jürgen, La inclusión del otro. Estudios sobre Teoría Política,

    Barcelo-

    na: Paidós, 1999.

    HINKELAMMERT, El

    Crítica de la razón utópica

    (lA. Senent de Frutos ed.),Des-

    clée deBrouwer, 2002.

    HONIG, B.

    Political Theory and the Displacement ofPolitics,

    Nova York: Comell

    University Press, 1993.

    MONDOLFO, Rodolfo.

    La Comprensíon del Sujeto en la Cultura Antigua,

    Buenos

    Aires, 1968.

    NEGR , A.; Hardt,

    M.Imperio,

    Barcelona:

    Paidós,

    2002.

    NEGR ' Antonio.

    Fin de Siglo,

    Barcelona: Paidos,

    1989.

    NIETZSCHE, F.

    Nihilismo. Escritos póstumos,

    Barcelona: Península, 1998.

    SALCEDO, Juan A. Carrillo. Prólogo  a J.M. Pureza,

    El Patrimonio Común de la

    Humanidad. Hacia un derecho internacional de solidariedad?

    Madrid: Trot ta , 2002.

    SEN,A.

    Desarrollo y Libertad,

    Barcelona: Planeta, 2000.

    TABUCCHI, A.

    La cabeza perdida de Damasceno Monteiro,

    Barcelona: Anagrama,

    1997.

    WOLIN, Sheldon.  Democracia, diferencia y reconocimiento In:

    La Política,

    n. 1 ,

    1996.

    ZOLO, D. La ciudadanía en una era post-comunista In:

    Agora,

    n. 7, 1997.

    • Joaquín Herrera Flores

    é professor de direito da Universidad Pablo O lav ide - UPO

    de Sevilha, Espanha. Publicou vár io s Ii vr os sob re a problemática da t eo ri a c ri ti ca dos direitos

    humanos.