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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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SECRETARIADE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

DEPARTAMENTO DE POLÍTICAS E PROGRAMAS EDUCACIONAIS

COORDENAÇÃO ESTADUAL DO PARANÁ

LUIZ CARLOS DA SILVA CAMERAN

AS VILAS RURAIS EM TOLEDO E O PROBLEMA DA TERRA NO BRASIL

TOLEDO – 2014

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LUIZ CARLOS DA SILVA CAMERAN

AS VILAS RURAIS EM TOLEDO E O PROBLEMA DA TERRA NO BRASIL

Artigo apresentado ao Programa de Desen-volvimento Educacional – PDE como requisi-to para a conclusão do programa. Orienta-dora: Prof.ª Drª Apª Darc Souza.

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AS VILAS RURAIS EM TOLEDO E O PROBLEMA DA TERRA NO BRASIL

Autor: Ms. Luiz Carlos da Silva Cameran1

Orientadora: Drª. Aparecida Darc de Souza2

Resumo. A concentração fundiária e a má distribuição de terras constituem-se em

dramas históricos da sociedade brasileira. Esta é a questão que busquei discutir

com os alunos e colegas durante a aplicação do Projeto de Intervenção Pedagógica

elaborado durante minha participação no PDE. Sendo assim, neste artigo busco tra-

zer algumas reflexões sobre o processo histórico que engendrou esta problemática e

contextualizou a formação de diversas estratégias de luta pela terra.

Palavras chaves: Terra; Vila Rural; Questão Agrária; Latifúndio

1. Formado em Licenciatura Plena em Filosofia, História e Psicologia (1992). Especialista em: História (1997), e Educação (2003), pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste. Mestrado em História (2000), pela Universidade Estadual do Cento Oeste – Unicentro Campus Guarapuava. Atual-mente é professor QPM lotado na SEED/PR.2. Formada em Licenciatura Plena em História pela pela Universidade Federal de Uberlândia (1994), mestrado em História Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998) e doutorado em História Econômica pela Universidade de São Paulo (2009). Trabalhou na Educação Básica como professora de História até o ano de 2002. Atualmente é professora-adjunta no curso de História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná Campus de Marechal Cândido Rondon das disciplinas de Prática de Ensino de História e Metodologia do Ensino em História.

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1. Introdução

Este Artigo é resultado das atividades acadêmicas realizadas durante o perío-

do de inserção no PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional), tendo por ob-

jetivo discorrer sobre uma proposta de ensino que problematiza as disputas pela

posse da terra no Brasil a partir do estudo das Vilas Rurais implantada no Estado do

Paraná. Este projeto foi implementado no 2º Ano do Ensino Médio do C. E. Ayrton

Senna da Silva, no primeiro semestre de 2014 e contou com uma carga horária de

32 horas para sua realização. Para possibilitar a concretização do projeto de inter-

venção Pedagógica e viabilizar a interdisciplinaridade, foi utilizado como metodologia

o estudo do meio e, em especial, da Vila Rural Félix Lerner, constituída no Bairro

São Francisco, no Município de Toledo Pr.

O que nos motivou a escolha da temática e da metodologia de ensino foi a re-

alidade dos alunos da turma escolhida para a aplicação do projeto de Intervenção

Pedagógica. Alguns alunos residem na Vila rural e os demais nas proximidades.

Portanto, parte da comunidade escolar é oriunda deste espaço social, razão pela

qual optamos pelo estudo da história local.

A Vila Rural é um espaço de produção agrícola, vivências, trabalho e, por

consequência, constituição de memórias. Assim, para o desenvolvimento desta pro-

posta utilizamos a metodologia do estudo do meio. Está é uma prática pedagógica

interessante que possibilitou uma aprendizagem significativa e mais dinâmica dos

acontecimentos e experiências vividos pelos assentados da vila rural, seus avanços

e limites desse modelo de assentamento rural a partir de um olhar crítico e investiga-

tivo do cotidiano dos assentados.

O Estudo do Meio pode ser compreendido como um método de ensino inter-

disciplinar que visa proporcionar aos alunos e professores o contato direto com de-

terminada realidade, um meio qualquer, rural ou urbano, que se decida estudar. De

acordo com Circe Bitencourt (2008, p. 280), o estudo do meio é um método de in -

vestigação que integra três etapas: a problematização da realidade, coleta e análise

dos dados e intervenção no contexto estudado. Além disso, o estudo do meio,

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trata-se de uma oportunidade especial de construção de relações diferencia-das entre todos os participantes desse trabalho. A saída de alunos do ambi-ente escolar, ao quebrar a rotina, exige o estabelecimento de novas regras e normas entre os participantes. (Bittencourt, 2008, p. 276).

Ainda segundo a autora, “o método é um ponto de partida, não um fim em si

mesmo”. Além disso, “[…] sua aplicação resulta sempre de um projeto de estudo que

integra o plano curricular da escola e pode ser parcial ou integral”. (Bittencourt,

2008, p. 280).

A partir desta reflexão propusemos trabalhar o Projeto de Intervenção Peda-

gógica de forma integral, uma vez que envolvemos o estudo da história local, ou

seja, partimos do estudo de uma área delimitada, no caso, a Vila Rural Félix Lerner,

mas, também, propusemos a estudar a questão da terra no Brasil em várias tempo-

ralidades e espaços, e os seus respectivos problemas oriundos da disputa pela sua

posse, por meio de vários textos bibliográficos, imagens, entre outras linguagens.

O conjunto desta proposta baseou-se num diálogo com uma bibliografia críti-

ca sobre a evolução histórica da questão agrária no Brasil. A seguir apresentamos a

referência teórica que orientou as discussões em sala de aula e também na elabora-

ção do material didático utilizado para discutir o significado das vilas rurais no con-

texto de luta pela terra no Brasil.

2. Fundamentação teórica

Estudar história é compreender a vida das pessoas nos mais diferentes tem-

pos, temporalidades e diversidade cultural buscando analisar as suas formas de or-

ganização social e interpretar as suas relações sociais, políticas, econômicas, cultu-

rais e religiosas. O passado pode ser relido e reinterpretado permanentemente como

instrumento de compreensão, a luz do momento presente.

Segundo Marx e Engels, em A Ideologia Alemã, as pessoas para fazerem his-

tória precisam, antes, satisfazer um conjunto de necessidades básicas, dentre elas

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comer, beber, morar, vestir entre outros itens da condição humana. Assim,

O primeiro ato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam a satisfação destas necessidades, a produção da própria vida material, e de fato este é um ato histórico, uma condição fundamental de toda a história, que ainda hoje, como há milhares de anos, deve ser cumprido todos os dias e todas as horas, simplesmente para manter os homens vivos. (MARX e ENGELS, 1993, p.30).

Os homens ao satisfazerem as suas necessidades vitais, criam outras neces-

sidades no processo de constituição da própria vida. Com isso é possível compreen-

der que a história é feita na luta pela sobrevivência por meio do trabalho, cotidiana-

mente, por todos e todas. Para trabalhar são necessários ferramentas, instrumentos

de trabalho e meios de produção.

A terra é um meio de produzir os alimentos para alimentar todos os seres vi-

vos, especialmente homens e mulheres. No entanto, ela, enquanto meio de produ-

ção tem sido negada a uma parcela significativa de brasileiros, desde os seus pri-

mórdios.

Nos dias atuais o requisito básico para um programa de reforma agrária seria

a garantia da subsistência da família beneficiária e, consequentemente, sua autono-

mia econômica e política.

2.1 A Luta pela Terra no Brasil

De início o território brasileiro tinha como legítimos proprietários os nativos.

Até a chegada dos europeus, em 1500, este território era habitado por apro-ximadamente 5 milhões de pessoas, aglutinadas em mais de 200 povos in-dígenas, com território, culturas, hábitos diferenciados; a propriedade do solo não era privada. Era apenas um bem da natureza utilizado coletivamente por todos os membros dos diferentes povos. Assim, os brasileiros que aqui vivi-am tratavam a terra como um bem comum, em que todos tinham o direito de explorá-la para sobreviver. (STÉDILE 2000, p.01).

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Com a colonização, o território brasileiro foi dividido em várias capitanias he-

reditárias, porém algumas prosperaram e outras não. Ressalte-se que essas capita-

nias foram subdivididas em propriedades denominadas sesmarias3 e estas grandes

extensões de terras foram doadas aos amigos do então Rei de Portugal, que fazen-

do uso do poder temporal e militar impôs aos gentis a sua lógica dominadora.

A chegada do europeu colonizador significou uma ruptura nesse sistema, já que um dos objetivos da colonização era se apoderar dos bens existentes, especialmente a terra e os recursos naturais, de minérios e florestas. Esse conflito, que se estabeleceu à força da pólvora e do controle ideológico da religião, impôs uma derrota aos povos que aqui viviam. Vencedor, Portugal passou então a gerir os bens da natureza de acordo com suas leis. (STÉDILE, 2000, p.01).

A concentração da propriedade da terra no Brasil ocorreu após os europeus

imporem o seu modelo colonizador e dominador. O Brasil é o resultado de uma

construção histórica de acúmulos, avanços e recuos daqueles que foram excluídos

da terra. A lógica dominadora europeia nem sempre foi aceita passivamente por

seus legítimos proprietários: Os indígenas. Também todos aqueles que a terra abre-

viaria a pobreza em que se encontram, como no caso dos camponeses sem-terra,

quilombolas e indígenas que ainda ousam lutar por um pedaço de terra.

Desde o período colonial até os dias de hoje, várias Leis foram aprovadas

para legalizar e normatizar a propriedade da terra. A que mais provocou impacto so-

cial foi a Lei de nº 601 de 18 de setembro, a chamada Lei de terras de 1850. A posse

da terra no Brasil sempre representou status e símbolo de distinção social.

Ocorre que com o avanço da economia capitalista a terra passou a ter um va-

lor mercantil e o seu uso como valor de troca4 e o seu potencial agrícola foi explora-

3. Sesmaria – Terreno sem culturas ou abandonado, que a antiga legislação portuguesa, com base em práticas medievais, determinava que fosse entregue a quem se comprometesse a cultivá-lo. Quem a recebia pagava uma pensão ao estado, em geral constituída pela sexta parte do rendimento através dele obtido. Quando o Brasil foi descoberto, para cá transplantou-se o regime jurídico das sesmarias. O rei, ou os primeiros donatários de capitanias, faziam doações de terras a particulares, que se comprometiam a cultivá-las e povoá-las. Só em 1812 as sesmarias foram oficialmente extin -tas. Disponível em: http://www.dicio.com.br/sesmaria/ acesso: 08/11/2014.4. Marx, em O capital, conceitua valor de uso de acordo com sua utilidade: "É a utilidade de uma coisa que lhe dá um valor de uso, mas essa não surge no ar. É determinada pelas qualidades físicas da mercadoria e não existe sem isso". Diferentemente do valor de troca, pode-se dizer que o valor de uso tem uma relação qualitativa, enquanto o valor de troca tem relação quantitativa. MARX, Karl. O Capital. (Livro I, vol. 2, 10ª edição). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1985, p.42-43.

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do ao máximo. A Lei de terras foi mais um instrumento da elite agrária brasileira para

restringir o acesso à terra aos negros libertos pela Lei nº 3353, conhecida como Lei

áurea, em 13 de maio de 1888.

No passado a formação dos grandes latifúndios tinha suas origens nos pri-

mórdios da colonização. Conforme nos indica Stédile em seu artigo sobre as origens

do latifúndio no Brasil.

A primeira forma de distribuição de terra foram as Capitanias Hereditárias, concessão de uso em que a Coroa destinava grandes extensões do territó-rio a donatários, amigos e prestadores de serviço à Coroa. Os donatários e concessionários tinham o direito de repartir e distribuir parcelas desses terri-tórios a outros que lhes interessasse ou para viabilizar o aumento da explo-ração. (STÉDILE, 2003, p.1).

A metrópole portuguesa ofertava terras em abundância aos amigos do Rei e

aos fidalgos, porém apenas duas capitanias prosperaram: A de Pernambuco e a de

São Vicente, em que seus donatários iniciaram o cultivo da cana-de-açúcar com ca-

pital próprio ou com empréstimos estrangeiros, notadamente capital holandês, as

demais capitanias fracassaram. A época das Capitanias Hereditárias a produção

açucareira vicentina tornou-se secundária ainda no século XVI, devido ao sucesso

da empresa açucareira nordestina, especialmente nas capitanias de Pernambuco e

Bahia.

No período colonial apesar do declínio da produção do açúcar, São Vicente

tornou-se, com o tempo, polo irradiador da caça e escravização do índio e ponto de

penetração para o interior, em busca de pedras e metais preciosos. A causa do fra-

casso do sistema de Capitanias Hereditárias são vários: Os constantes ataques dos

índios, a grande quantidade de terras inférteis em algumas capitanias, o desinteres-

se de alguns donatários que não chegaram sequer a vir ao Brasil e, fundamental-

mente, a falta de capital.

Contrastando com a história do passado, quando havia a necessidade de

muito de dinheiro para desbravar, ocupar e defender a terra, comprar escravos, ins-

talar engenhos cujos equipamentos eram importados da Europa, tornava incompatí-

vel o desenvolvimento da colonização com capital particular. No processo de coloni-

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zação brasileira competia às pessoas com recursos próprios, organizar os empreen-

dimentos agrícolas. Há que se considerar, também, a incompatibilidade do sistema,

excessivamente descentralizado, com o poder rigidamente centralizado do Estado

metropolitano, interessado no absoluto controle da exploração mercantil colonial.

Ao longo do período colonial e até o final do século XIX prevaleceu esse sis-tema em que a terra era um bem da Coroa portuguesa, com concessão de uso para aqueles que se dispusessem a explorá-la, que tivessem condições para isso (recursos para compra de escravos, por exemplo) e que tivessem serviços prestados à Coroa. Em meados do século XIX, o Brasil passou por grandes transformações sociais. Crescia a luta dos negros escravos, multi-plicavam-se os quilombos. Intensificavam-se as pressões externas e inter-nas contra o tráfico de negros oriundos da África. Na sociedade brasileira, setores liberais, de classe média, com vocação republicana, também se opu-nham e lutavam contra a escravidão. (STÉDILE, 2003, p.01).

A tentativa de centralizar o poder e a administração pública no Brasil se insere

nos quadros do fracasso do sistema de capitanias, da vulnerabilidade do Brasil às

investidas estrangeiras e da inviabilidade de se promover a colonização com recur-

sos particulares. Se nos primórdios da colonização os espanhóis descobriram (1545)

as ricas minas de prata na região do Potosi (na atual Bolívia). Por outro lado, a auto-

ridade do poder monárquico português se chocava com o excesso de autonomia e

soberania assumido pelos donatários em suas capitanias.

Preocupada com essa pressão e percebendo a inevitabilidade da libertação dos escravos, a Coroa tratou de legislar sobre a aquisição da terra no Brasil, de forma a garantir que a posse e a propriedade da terra mantivessem o ca-ráter mais restrito possível, ou seja, acessíveis apenas para uma minoria das elites da nobreza. E, sobretudo, para garantir que os escravos libertos não ti-vessem o direito de acesso à terra, tão abundante, e se mantivessem na condição de trabalhadores assalariados nas fazendas. Aceitavam terminar com a senzala, mas queriam manter a mão de obra cativa nas grandes fa-zendas de cana e café. (STÉDILE, 2000, p.01).

Em 1548, o governo português elaborou um instrumento jurídico, denomina-

do de Regimento de 1548, pelo qual instalava e regulamentava o novo sistema po-

lítico: O Governo Geral. Conforme esse regimento, competia ao governador – geral:

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Fundar vilas e povoações, conceder sesmarias para a instalação de engenhos de

açúcar ou qualquer outra atividade econômica; explorar e descobrir terras no sertão;

promover a criação de feiras nas vilas e povoações; exterminar os corsários5 e des-

truir seus estabelecimentos nas costas do Brasil; edificar fortes e construir navios

para a defesa da terra; garantir o monopólio real sobre a exploração do pau-brasil;

fazer alianças com as tribos amigas e promover sua catequese; etc.

No século XIX, observamos que os instrumentos jurídicos são outros mais

sofisticados, porém o modelo de exclusão social ficou o mesmo, sofrendo pouca al-

teração. Com a promulgação da Lei de Terras de 1850, os objetivos eram muito cla-

ros: Impedir o acesso à terra dos negros e índios, que historicamente sempre foram

excluídos dela. Com relação ao uso da terra, essas transformações incidiram direta-

mente nas tradições que antes vinculavam a posse de terras enquanto símbolo de

distinção social. A rigor “a prática de criminalizar os movimentos sociais dos traba-

lhadores não é efêmera, fortuita e eventual”.(Moreira p.4, 2010).

A luta pela terra é antiga e as formas de dominação por parte do poder coerci-

tivo do estado que aliado aos interesses do latifúndio tem se perpetuado ao longo do

processo histórico brasileiro. No Estado do Paraná segundo Silva, “verifica-se que

na década de 1960, o grande movimento de expansão da fronteira agrícola se deu

no extremo Oeste e Sudoeste do estado, tendo à frente o pequeno ocupante”. O mo-

delo de colonização e as sucessivas crises em que o país viveu fez surgir um novo

modelo concentrador de terras que, aliados à mecanização agrícola forjou a expul-

são de muitas pessoas do campo. Ainda, conforme pontua Silva, “já na metade da

década de 1970 os resultados mostram o aparecimento de grandes proprietários

nessas regiões acompanhado de uma forte redução do número de pequenos esta-

belecimentos” (Silva, 1982, p.103).

O avanço da economia capitalista tinha um caráter cada vez mais mercantil,

onde a terra deveria ter um uso integrado à economia, tendo seu potencial produtivo

explorado ao máximo. Em consequência dessa nova prática econômica, percebe-

mos que diversas nações discutiram juridicamente as funções e os direitos sobre

5. Embarcação armada de propriedade privada, que podia perseguir ou apresar navios de comércio de outros países. Antes do desenvolvimento dos navios de guerra, muitas nações recorriam a esse tipo de navios para auxiliá-las em casos de necessidade. Empregados pela primeira vez no séc. XV, os navios recebiam carta de corso e tanto eles como suas tripulações eram conhecidos como corsá-rios. Tinham autorização para atacar, roubar ou afundar os navios mercantes dos países; inimigos.

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esse bem.

Na Lei de terras de 1850 ficou estabelecido a venda das propriedades rurais,

antes doadas; e pela Constituição Federal Brasileira de 1988, ficaram definidos os

seguintes critérios para o acesso à terra. Segundo a CF em seu Artigo 184, que ver-

sa sobre a questão da política agrícola e fundiária, afirma-se:

Compete à União desapropriar por interesse social, para fins da reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante previa e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de pre-servação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. (BRA-SIL, 1988, p.125).

Reinterpretado o processo de formação histórica do nosso país, voltamos a

problematizar o nosso objeto de estudo. É importante compreender a história da

questão agrária, em especial a paranaense, para entender o surgimento das vilas ru-

rais e os seus respectivos problemas. As vilas rurais foram criadas com o intuito de

dar respostas as demandas por reforma agrária. Dentro do modelo de dominação

capitalista, as vilas rurais constituíam uma medida paliativa do estado para contornar

o problema da ausência de uma reforma agrária profunda, que abrangesse todas as

pessoas que tem origem na terra e necessita dela para a sua sobrevivência.

2.2 As Vilas Rurais no Paraná

O Projeto das Vilas Rurais foi uma das políticas compensatórias de alívio a

pobreza do governo Jaime Lerner (1996 – 2002). Era parte do Programa Paraná 12

meses, iniciado em 1995, financiado pelo Banco Mundial e pelo Governo do Estado,

sendo que a compra do terreno era feita pelas prefeituras municipais, por meio da

Secretaria Municipal de Agricultura – SMA, com participação da EMATER e COHA-

PAR.

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Desde o primeiro governo Lerner, as Vilas Rurais foram anunciadas como o maior programa de assentamento de trabalhadores rurais em andamento no país, tendo as-sentado cerca de 16 mil famílias em 403 vilas rurais, em 279 municípios paranaenses atingindo 94% dos municípios do Estado. (OLIVEIRA, 2004, p.01).

No discurso governamental paranaense, o programa das Vilas Rurais foi de-

senvolvido com um objetivo bem claro: integrar o trabalhador volante (o boia-fria) à

sociedade. Dando-lhes, um sentido de vida com maior dignidade. Esse era na época

o discurso governamental, porém com o passar do tempo as intenções iniciais não

se comprovaram totalmente.

O processo de implantação de uma vila rural começava com a identificação

da demanda de moradia no município, passava pelo cadastro e chegava se à sele-

ção das famílias. Os candidatos precisavam ter vínculo com a terra e morar há pelo

menos, cinco anos no município aonde pleiteava a Vila Rural.

O espaço da Vila Rural previa um lote de cerca de 5 mil m² para cada família

(meio hectare), uma casa de 44,52 m² e insumos para o plantio. Ocorre que o tama-

nho dessa área de terra disponível para a prática da agricultura era insuficiente para

garantir a subsistência de uma família, o que estimulava a desistência de muitos dos

chamados vileiros. Segundo Andrade (2005, p.80) as Vilas Rurais foram criadas

“para evitar novos integrantes às organizações dos trabalhadores sem-terra, sem

teto, e, acima de tudo, atenuar o movimento migratório campo/cidade, dos trabalha-

dores rurais (boias-frias)”.

No presente notamos que apenas algumas vilas rurais estão progredindo e

outras se encontram com vários tipos de problemas. O que se produz nas vilas ru-

rais são produtos voltados única e exclusivamente à subsistência dos vileiros.

Segundo (Oliveira, 2002, p.2) “Muitos trabalhadores que estão vivendo nas vi-

las rurais reclamam da localização da área, na maioria dos casos distantes do muni-

cípio e desprovido de atendimento de transporte” entre outros problemas que afetam

diretamente a vida dessas pessoas envolvidas nesse projeto. Ademais, as vilas ru-

rais estão envoltas a outros tipos de problemas estruturais, conforme aponta Andra-

de (2005 p.81): “falta de uma infraestrutura já alocada ao plano diretor, uma vez que

as condições (alegadas pelo governo) são ínfimas para atender as demandas”. Além

dos problemas de infraestrutura básica, atenderiam as necessidades de alguns seto-

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res agroindustrial, conforme nos indica Andrade,

O governo estava preocupado ao mesmo tempo com o patronato rural, uma das justificativas do programa estava centrada na falta de mão de obra no campo para atender alguns produtos da agricultura paranaense. (ANDRA-DE, 2005 p.81).

Na perspectiva dos vileiros, o projeto Vilas Rurais tem fracassado por falta de

investimentos públicos. Mas, por outro lado, ele pode ser considerado um sucesso

na visão do governo, pois o projeto das vilas rurais contribuiu para a diminuição do

fluxo de trabalhadores para as periferias das grandes cidades. No entanto, na pers-

pectiva do trabalho, o problema continua e precisa ser investigado.

O tema Vilas Rurais, que a princípio era entendido como um novo agente da organização do espaço regional, conclui-se que trata apenas de uma políti-ca de intervenção do governo paranaense, criada notadamente para con-templar trabalhadores temporários que moram nas periferias das cidades, visando amenizar a mobilidade espacial campo-cidade e minimizar os pro-blemas urbanos. As Vilas Rurais se enquadram dentro de uma nova modali-dade nos programas de ‘assentamentos’ e merecem um estudo mais pro-fundo do ponto de vista de sua organização sócio-espacial. (ANDRADE, 2005, p.19).

O projeto Vilas Rurais não pode impedir aos pobres o direito a cidadania ne-

gando-lhes ou dificultando-lhes o acesso aos serviços públicos obrigatórios. São 16

mil famílias que foram retiradas da cidade para viver à margem da cidadania, pri -

vando-as do direito aos serviços públicos assistenciais.

A realidade atual, com muitas pessoas sem-terra e a densidade demográfica

em alta nos grandes centros urbanos, o aumento contínuo do latifúndio, o espaço

denominado vila rural com um diminuto pedaço de terra não tem sido suficiente para

garantir a subsistência das famílias envolvidas nesse programa. Mas a situação se

agrava em muitas vilas rurais onde a terra, além de pouca, é ruim e imprópria para a

prática da agricultura.

O que é constatado atualmente é que devido à insuficiência do espaço desti-

nado ao trabalho, os vileiros precisam complementar sua renda, fazendo pequenos

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bicos quando encontram. E devido à falta de incentivos, os moradores passaram a

frequentar as filas das secretarias municipais de Assistência Social quando ocorre

distribuição de cestas básicas.

Segundo Fabris, (2006, p.57) “O modelo econômico implantado pelos neolibe-

rais na América Latina, trouxe à superfície uma infinidade de problemas de ordem

social”. A experiência tem mostrado que ele falhou no seu objetivo propagado, pois

“houve uma queda visível dos salários, redução do poder aquisitivo, aumento do de-

semprego e do subemprego”. Fabris, (2006, p.57).

Na América Latina, vê se a centralização dos gastos sociais em programas seletivos dirigidos aos pobres, isto ao comando dos organismos financeiros internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), que trabalham em prol da capitalização do setor privado, instituindo uma política de remer-cantilização dos benefícios sociais, e deteriorização das instituições públi-cas, levando a implantação de programas estatais voltados a aliviar a po-breza.(FABRIS, 2006 p.42).

A questão agrária paranaense esta diretamente ligada à questão da política

fundiária brasileira, não há como pensar e problematizar a questão da terra no esta-

do do Paraná, sem antes compreender as origens da formação dos grandes latifún-

dios, que desde o início da colonização do Brasil, se faz presente em nosso país.

3. Experiências Didáticas: A questão das Vilas Rurais

A Vila Rural é um espaço de produção agrícola, vivências, trabalho e, por

consequência, constituição de memórias. Para Lefebvre,(1973, p.115) “é através do

espaço produzido que a sociedade se reproduz em sintonia com uma determinada

ordem forjada pelas relações capitalistas de produção”. O homem atua na natureza

de modo a propiciar condições para sua reprodução; e ao lutar para buscar as suas

condições de existência material, produz vivências, constitui relações interpessoais,

o que favorece a produção de memórias coletivas e individuais.

Para a concretização do trabalho de campo, selecionamos cuidadosamente

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um rol de conteúdos escritos e audiovisuais que possibilitou a sensibilização dos alu-

nos e o aprofundamento teórico sobre o tema proposto. Num segundo momento,

após as leituras, debates e ter assistido audiovisuais, fizemos uma visita técnica a

Vila Rural para fazer um levantamento das fontes da área delimitada para o nosso

estudo, como depoimentos dos assentados e registro de fotografias.

Os conteúdos e as fontes estudadas nos possibilitou um trabalho interdiscipli-

nar que visou à integração com as disciplinas de sociologia para estudar as relações

de trabalho, com a disciplina de geografia com o estudo da paisagem, entre outros

aspectos geográficos e a produção e correção textual, com a disciplina de portu-

guês.

Para fixação e compreensão dos textos, foram elaborados além de exercícios

que possibilitaram a formação de novos conceitos que os levou a uma visão mais

crítica sobre reforma agrária.

Parte importante das atividades desenvolvidas com os alunos para que eles

compreendessem a dinâmica da vida no campo foi baseada no trabalho de campo

que os ajudou na reconstrução da trajetória de vida por meio do relato de memórias

das pessoas que residem na vila rural.

Os alunos construíram em sala de aula um questionário que os orientou nas

entrevistas. Esse trabalho, assim como a sistematização das entrevistas, a análise

das fontes, como fotografias e os relatos orais que foram colhidos, os alunos fizeram

com o auxílio do professor.

A implementação da Unidade Didática Pedagógica em sala de aula teve o se-

guinte Cronograma das atividades:

1. Apresentação da Unidade Didática a comunidade escolar, professores e funcioná-

rios do C.E. Ayrton Senna da Silva, no início do ano letivo de 2014 durante a Sema-

na Pedagógica.

2. Apresentação aos alunos 2º série do Ensino Médio do C. E. Ayrton Senna da Sil-

va, explicitando o tema, os conteúdos a serem trabalhados, a metodologia que foi

utilizada e a formas de avaliação no decorrer do semestre.

3. Atividades de implementação.

Foi necessária a conscientização e a sensibilização dos alunos para que eles

se envolvessem no projeto e a sua execução fosse possível, com objetivo da produ-

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ção do conhecimento por meio da possibilidade do uso de diversas evidências (fon-

tes históricas) e a problematização desses materiais históricos.

Iniciando a aplicação do projeto em sala de aula, com alunos do 2ª ano do en-

sino médio, realizou-se uma discussão por meio da charge6 “A culpa é do latifúndio”

e da “Lei de Terras de 1850”, o trecho que compreende as regras de acesso à terra,

questionando-os com perguntas para conhecer a opinião deles em relação à ques-

tão fundiária e o uso da terra como bem social e fonte de renda ao trabalhador ou

como bem especulativo e também dando oportunidade para que eles expressassem

suas ideias prévias, em relação a temática a ser estudada. Reforma agrária, latifún-

dio e Vila Rural Félix Lerner.

Ao iniciar os trabalhos da temática da Unidade Didática Pedagógica juntos

aos alunos com as atividades propostas, as quais foram elaboradas ao longo do ter-

ceiro período do PDE, apresentamos aos estudantes um roteiro de entrevista oral,

além de assistir ao filme Narradores de Javé, para que pudéssemos tornar mais cla-

ro as atividades a serem desenvolvidas através da história oral.

O documentário foi utilizado em sala de aula, servindo como subsídio audiovi-

sual ao estudo, análise e reflexão dos movimentos sociais de lutas pela posse da

terra, considerando o estudo do meio e o espaço delimitado para a realização da

pesquisa de campo.

Outra etapa importante do trabalho do PDE que aconteceu paralelamente a

implementação da Unidade Didática Pedagógica foi a realização do Grupo de Traba-

lho em Rede o GTR7 o qual apresento os seus resultados e os debates realizados no

decorrer do período compreendido entre 18/03/2014 a 06/05/2014.

Eram objetivos do GTR:

1. Possibilitar novas alternativas de formação continuada para os professores

da Rede Pública Estadual;

2. Viabilizar mais um espaço de estudo e discussão sobre as especificidades

da realidade escolar;

6. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/tvmultimidia/imagens/4socio-logia5mst1913_05.jpg acessado em 09/11.

7. Os Grupos de Trabalho em Rede – GTR constituem uma atividade do Programa de Desenvolvi-mento Educacional – PDE, que se caracteriza pela interação virtual entre os Professores PDE e os demais professores da Rede Pública Estadual. Fonte: ttp://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/mo-dules/conteúdo/ conteudo.php?conteúdo=503. Acesso em 20/09/2014.

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3. Incentivar o aprofundamento teórico-metodológico nas áreas de conheci-

mento, através da troca de ideias e experiências sobre as áreas curriculares;

4. Socializar o Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola elaborado pelo

Professor PDE com os demais professores da Rede;

Vale destacar que o GTR também promove a inclusão digital dos Professores

como forma democratizar o acesso da Educação Básica aos conhecimentos teórico-

práticos específicos das áreas/disciplinas trabalhados no Programa PDE. Importante

destacar que o domínio das ferramentas tecnológicas dos professores que tiveram a

oportunidade de interagir conosco possuem um certo desnível de conhecimento e

pude constatar alguns problemas em relação ao tempo para efetuar as atividades

propostas, alguns precisaram de um tempo maior e outros não conseguiram realizar

as atividades propostas na sua totalidade, além da compreensão e domínio das ati-

vidades sugeridas no GTR.

Eis alguns resultados constatados a partir de minhas leituras, análises e refle-

xões e contribuições dos demais professores da rede. Lembrando que o GTR estava

organizado da seguinte maneira: Fóruns e produções de diários acerca da temática

dos conteúdos estudados. A primeira atividade do GTR era um fórum de ambienta-

ção, apresentações e discussão do Projeto de Intervenção Pedagógica.

Entre os professores participantes do GTR foi consenso de que a verdadeira

reforma agrária que o país tanto precisa e necessita ainda não aconteceu. O que

houve até hoje foram iniciativas isoladas de vários governos de Getúlio Vargas a Dil-

ma Roussef, com poucas famílias sendo beneficiadas pelo programa nacional de re-

forma agrária. Enquanto isso os problemas sociais no campo brasileiro se arrasta a

séculos com todo o tipo de conflitos. Em todos os governos desse período foram to-

madas medidas muito temidas em relação a reforma agrária, todas elas mediadas

pelo sistema capitalista de produção.

No caso específico das vilas rurais o projeto inicial era bem claro, eram medi-

das que visavam sobretudo o alívio e a contenção da pobreza.

A vila rural, objeto de estudo desse trabalho de pesquisa foi na época uma po-

litica de intervenção do estado do Paraná no sentido de minorar os problemas agrá-

rios, oferecendo ao homem do campo previamente selecionado pelas prefeituras

municipais um lote de terras com cerca de 5 mil m² para cada família (meio hectare),

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uma casa de 44,52 m² e insumos para o plantio.

Após ler e analisar vários documentos, livros, artigos e teses e debater com

os demais professores participantes do GTR sobre o assunto, temos a clareza de

que esse modelo de assentamento rural não surtiu os resultados esperados, por vá-

rios motivos e problemas que ocorreram na execução do projeto e também pela au-

sência de políticas públicas que viessem de encontro as necessidades dos vileiros.

Com a frase do grande pensador de todos os tempos. Encerramos essa breve

reflexão.

“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência”.

Karl Marx.

4. Considerações finais

Mediante problematização de conteúdos do movimento histórico de luta pela

terra, tendo como objeto de estudo a Vila Rural Félix Lerner, a partir do uso dos ma-

teriais históricos (fontes, documentos, evidências) em sala de aula, com suas impli-

cações teóricas, metodológicas e práticas, e na medida em que compreendemos es-

tes materiais como signos, na busca da construção e produção do conhecimento, é

possível conhecer o processo histórico do movimento social.

Aliar a pesquisa a uma nova proposta de estudo em sala de aula, com proce-

dimentos que articulam os conteúdos com a prática social que atendem no sentido

de superar as dificuldades dos alunos em compreender conceitos e linguagens bási-

cos da disciplina, está diretamente aliado a um pressuposto de múltipla necessidade

da escola.

A partir da análise da experiência de sala de aula, compreende-se que ensi-

nar História para os alunos do Ensino Médio significa apresentar possibilidades de

pesquisa histórica escolar e bibliografias que os situem dentro de uma visão mais

crítica sobre o contemporâneo, possibilitando a construção do conhecimento.

O presente artigo pretendeu, numa perspectiva interdisciplinar, estabelecer a

compreensão do processo histórico da luta pela posse da terra. Um dos pontos evi-

denciados é a memória dos trabalhadores em luta. Ressaltando a política agrária do

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Brasil, que, no entrar do século XXI, ainda não solucionou um direito legítimo do ser

humano: O direito do acesso à terra. Levando-se em conta a pouca quantidade de

famílias de trabalhadores rurais beneficiados pelo programa nacional de reforma

agrária nos governos Lula e Dilma, pretendeu-se contemplar pesquisas que tives-

sem como temática principal o movimento e a prática da pesquisa em sala de aula.

Procurou-se perceber as mudanças teórico-metodológicas que os estudos

apresentaram ao longo do trabalho aplicado com os alunos, as fontes de pesquisa,

bem como o foco principal de análise, suas contribuições e limites.

O trabalho de implementação da Unidade Didática Pedagógica foi uma expe-

riência de vida única, pois nos possibilitou uma visão mais aprofundada e rica da te-

mática abordada. Quando iniciamos a construção desse objeto de estudo tínhamos

uma visão sobre essa temática e, após ter passado por várias etapas e leituras che-

gamos a conclusão de que o projeto das Vilas Rurais cumpriu sim com os seus obje-

tivos para os quais foram criados, embora com o rol de problemas explicitados.

Espera-se que tal proposta seja útil para, pelo menos, provocar um debate

necessário, cujos maiores beneficiados serão, com certeza, os alunos, que têm direi-

to de aliar o estudo a uma visão de conhecimento construído a partir de suas expe-

riências.

Por fim, este artigo é resultado de uma pesquisa historiográfica e empírica, re-

latando a experiência na sala de aula com a implementação pedagógica, mas que

teve também a intenção de contribuir para o debate e o levantamento de fontes so-

bre a “Vila Rural” ora pesquisada.

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