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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE I

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE

I

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AS LETRAS DE RAP COMO RECURSO METODOLÓGICO NO ENSINO DE GEOGRAFIA E NA PERCEPÇÃO DO ESPAÇO VIVIDO

Ademir José da Silva1

Mateus Marchesan Pires2

RESUMO: A música é um importante instrumento didático que pode ter seu uso bastante difundido no ensino da Geografia. As letras de algumas músicas carregam significados que, dependendo do conteúdo ministrado, servem como alternativa didática. Deste modo, o presente artigo é fruto do estudo sobre o uso do rap como metodologia de ensino da Geografia. A pesquisa foi realizada com alunos do ensino fundamental fase II, do CEEBJA Joaquina de Mattos Branco, em Cascavel, Paraná. Utilizando letras de músicas do gênero musical rap. Foram realizadas diferentes atividades como debates, trabalhos manuais de desenho e colagens e de reflexões sobre as letras das músicas, buscando articular a realidade vivida pelos alunos ao conhecimento geográfico. Assim, os alunos foram construindo o raciocínio geográfico para compreender a sua realidade. Como resultado, concluímos que a música é um recurso de apoio didático pedagógico muito enriquecedor, pois ela contribuir na construção do saber de forma lúdica, as letras promovem a discussão de diferentes conceitos geográficos como a paisagem e seus contrastes e os alunos entendem o conteúdo de maneira mais fácil e construtiva.

Palavras-chave: Paisagem. Música. Rap.

INTRODUÇÃO

O presente artigo busca discorrer sobre a compreensão de como a música, pode

ser uma das linguagens, da qual o professor de Geografia tem a possibilidade de utilizar

em suas aulas aproximando os estudantes com os conteúdos da disciplina, e com a vida

cotidiana desses jovens. Nesse sentido, o recurso musical ao ser utilizado durante as

aulas de Geografia, pode aproximar os estudantes da disciplina e das suas discussões,

pois a música também é uma forma de representação do mundo, e através de suas letras

compreender o espaço e meio no qual estamos inseridos.

Deste modo, apresentamos as atividades desenvolvidas em sala de aula, no

Ensino Fundamental, as quais buscaram relacionar com o cotidiano vivenciado por esses

alunos. Partimos da necessidade de conhecermos qual estilo musical os alunos se

1 Professor de Geografia pela SEED, especialista em Educação Jovens e Adultos e Geografia. Integrante do PDE 2014/2015. E-mail:[email protected].

2 Professor do Colegiado do curso de Geografia da UNIOESTE, Campus de Marechal Cândido Rondon. Mestre em Geografia - Produção do Espaço e Meio Ambiente. E-mail: [email protected].

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identificam, para assim nos aproximarmos dos mesmos, entendendo a realidade cultural

na qual estão inseridos, assim, chegou-se ao RAP.

Segundo Correia (2009), a música é uma forma pedagógica de enriquecer e

elaborar os conhecimentos. Desta maneira o educador deve buscar meios em sua

disciplina para inserir a música, tendo em vista, que é um elemento metodológico criativo

e atrativo. Portanto se torna um recurso que facilita o ensino e a aprendizagem dos

educandos “[...] funcionaria como uma chave para abrir as diversas possibilidades que o

aluno traz dentro de si, e que pode compartilhar com seu próximo.” (CORREIA, 2009,

p.65).

Muitos educandos se identificam com o rap, e essas letras trazem uma reflexão

sobre a situação da sociedade e do meio em que esses sujeitos se encontram, sendo

possível desenvolver e aprofundar os conteúdos da disciplina de Geografia, estimulando-

os a refletir e a debater a sua própria realidade.

Partindo do pressuposto de que a Geografia é a ciência que também resulta das

relações sociais entre os sujeitos, compreende-se a importância de inserir no seu ensino

metodologias que tenham a capacidade de atrair a atenção dos estudantes a partir do seu

espaço de vivência.

A música é muito mais que um simples conjunto de sons que se unem em uma melodia. Ela penetra nossa pele, provoca arrepios de prazer ou nos faz mergulhar em doces lembranças. Algumas melodias não nos tocam, enquanto outras nos atingem diretamente – e podem até mesmo transmitir significados concretos. O cérebro de todo ser humano se interessa muito por informações musicais e é extremamente habilidoso em compreender seu significado [...] (SCHALLER apud CORREIA, 2009, p.59).

A música auxilia no ensino e aprendizagem, podendo ser um meio facilitador para a

compreensão dos conteúdos pelos estudantes. Após levantamento, constatou-se que

outros trabalhos já foram desenvolvidos no Programa de Desenvolvimento Educacional,

utilizando a música como recurso metodológico, sendo um excelente instrumento para o

ensino e aprendizagem, pois possibilita ao aluno a fazer análise, da realidade inserida.

No contexto educacional atual, a aprendizagem precisa tornar-se mais atrativa

diante das dificuldades em sala de aula, sendo necessários novos instrumentos para

propiciar as aulas mais atraentes e dinâmicas.

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A música possibilita uma análise das transformações culturais, econômicas,

politicas e sociais. Assim, tanto a unidade didática como a implementação didática,

constitui-se como elemento importante para refletir e buscar uma prática docente que

esteja embasada na significação dos conteúdos trabalhados, instigando os estudantes a

serem sujeitos participantes na sociedade. Com as atividades foram promovidos debates,

reflexões coletivas e individuais, elaboração de trabalhos em sala de aula, mostras de

trabalhos e apresentações que conduziram os alunos na reflexão esperada.

1. A MÚSICA COMO INSTRUMENTO DE ENSINO

A música é um instrumento que tem a possibilidade de representar o mundo, acaba

se transformando numa forma de se compreender o mesmo, ou seja, o espaço e o meio

em que vivemos. Segundo Oliveira, Bernardes e Rodrigues (1998), antes mesmo de

desenvolver a fala, a criança desenvolve-se a partir de movimentos, sons e ritmos. É

através da convivência com ruídos e sons, que ocorre grandes descobertas e a

exploração do novo.

Por ser de natureza criativa, o ser humano rompe com o óbvio buscando novos

caminhos, o primeiro contato com sons e ritmos ocorre com o corpo e do ambiente ao

redor, “É importante que nós, educadores, valorizemos o ato de criação da criança, para

que ele seja significativo no seu contexto de desenvolvimento” (OLIVEIRA,

BERNARDES e RODRIGUEZ, 1998, p. 104) (grifo nosso).

Para Berchem apud Campos, Fullgraf e Wiggers (2010), a música é uma

linguagem que vem a ser traduzida em forma sonora, fazendo com que haja expressões e

comunicações de sensações, sentimentos e pensamentos. Reforçando essa ideia através

de Rosa (1990), que identifica a música enquanto uma linguagem expressiva, sendo que

as canções têm ligação direta com as emoções e sentimentos.

A música no processo de ensino e aprendizagem, força o individuo a refletir sobre

a linguagem musical, e dialogar com ele mesmo. Além de explorar, diversos estilos,

fazendo com que haja uma aproximação e compreensão de diferenciadas culturas,

grupos sociais e a sociedade em geral.

De acordo com Jeandot (1993), não é só o professor que deve pesquisar, mas os

alunos devem ser estimulados para isso. Ao utilizar a música enquanto instrumento

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metodológico, tanto o educador quanto o aluno, enriquecem seu repertório musical,

ampliando e facilitando o ensino dos conhecimentos a serem construídos.

Nesse sentido, o professor deve ser criativo, motivando os estudantes,

desbravando novos caminhos para o ensino, e facilitando a apreensão das atividades

quando solicitadas em sala de aula. Apreender com a música significa interagir com

novas experiências e vivências, desenvolvendo uma reflexão e análise critica do mundo.

Ferreira (2012) afirma que a principal vantagem de utilizar a música no ensino é a

abertura, de um segundo caminho de comunicação, logo a música é uma forma de

expressão humana rica e universal, “[...] valerá muito ao professor utilizar a música em

suas aulas, mas é preciso dedicar-se ao seu estudo, procurando compreendê-lo com a

amplitude” (FERREIRA, 2012, p.13).

Logo, a música pode ser utilizada em diversos momentos no processo de ensino e

aprendizagem, “[...] sendo um instrumento imprescindível na busca do conhecimento,

sendo organizado sempre de maneira lúdica, criativa, emotiva e cognitiva.” (CORREIA,

2010, s/p). Ainda segundo o autor, os currículos de ensino devem incentivar a

interdisciplinaridade, levando em consideração todas as suas possibilidades, tendo em

vista que a música pode ser utilizada em todas as etapas da aprendizagem.

Segundo as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (DCE), a utilização de

recursos audiovisuais deve fazer com que o aluno análise as verdades socialmente

impostas, trazendo novas fontes de pesquisa e investigação das raízes socioespaciais,

com uma análise crítica.

Nesse sentido, a música “[...] como recurso didático, pode auxiliar o trabalho com a

formação de conceitos geográficos, diferenciando paisagem de espaço e, dependendo da

abordagem dada ao conteúdo, desenvolver os conceitos de região [...]” (PARANÁ, 2009,

p.82).

Portanto, é necessário que os conteúdos não se transformem em emaranhados de

informações, é a partir da busca de novas metodologias de ensino, que podemos

aprimorar os conhecimentos socializados em sala de aula. Correia (2010), afirma que é

necessário repensar a educação e superar a transmissão tendenciosa de conteúdos.

Logo, a utilização da linguagem musical no ensino, traz à tona a interdisciplinaridade

possibilitando uma maior dinamicidade no processo de ensino e aprendizagem.

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A música é uma linguagem, que por meio de suas letras, isto é, as canções, é

capaz de apresentar diversas realidades, assim acaba transformando-se numa forma de

se compreender o espaço o meio em que vivemos. Segundo Oliveira (2006) como

instrumento didático no ensino de Geografia, traz, além de uma abordagem teórico-

conceitual, uma vivência experimental em sala de aula abordando temas relacionados a

partir da realidade do aluno, a utilização da música é uma ferramenta importante, pois

esse recurso contribui para que o professor, possa dinamizar o seu trabalho, fazendo das

aulas um momento prazeroso para ele e seus educandos. Assim podemos trabalhar letras

de música que abordam várias questões do cotidiano.

A música no processo de ensino e aprendizagem de geografia, possibilita aos

educandos assimilar com maior clareza os conteúdos abordados em sala de aula, e

promove uma maior interação entre os alunos e o conhecimento, despertando um maior

interesse pelas aulas.

De acordo com as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (2008) da disciplina

de geografia, a sociedade apresenta-se com estruturas políticas, econômicas, culturais,

sociais permanentes. Para essas concepções, a contextualização tem como finalidade

explicar o comportamento social dos indivíduos ou dos grupos conforme a normatização

de uma estrutura pré-existente, cabendo à educação adaptar os indivíduos a essas

estruturas.

Conforme Ongaro (2006, p. 01), “[...] a música com maior ou menor intensidade

está na vida do ser humano, ela desperta emoções e sentimentos de acordo com a

capacidade de percepção que ele possui para assimilar a mesma.”

2. A MÚSICA NA ESCOLA, ALGUNS RESULTADOS.

Ao pensarmos na possibilidade de utilização da música nas aulas de Geografia,

com base em nossa prática cotidiana, estabeleceu-se o interesse de transformar o uso

dessa linguagem em objetivo de pesquisa. Assim, a pesquisa com o Rap como recurso

para as aulas de Geografia, foi desenvolvida no Colégio Estadual Joaquina Mattos Branco

(CEEBEJA), no município de Cascavel – Paraná. As atividades foram elaboradas com

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uma média de vinte alunos, com a faixa etária de 18 a 50 anos, do Ensino Fundamental

de Jovens e Adultos3.

A utilização do recurso musical nas aulas contribuiu para a reflexão sobre os

problemas vivenciados por esses estudantes, e que fazem parte do seu cotidiano. A partir

dos seus relatos durante a pesquisa, podemos observar que questões sociais como:

violência, transporte público, saúde, educação, segurança, drogadição, vulnerabilidade e

desigualdade social, foram temas constantemente abordados, colocando-os em contato

direto ou indireto com a sua própria realidade, e levando em consideração o contexto da

sociedade na qual estão inseridos.

Sob esse prisma, podemos fazer uma relação da prática em sala de aula com as

DCEs do Estado do Paraná (1992), em que a música no contexto escolar não está

dissociada do lugar onde ela é composta e interpretada, nem se desvincula de nenhum

determinado grupo social.

A compreensão e reflexão dos alunos deram-se através de músicas de Rap que

abordavam temas socialmente relevantes bem como o conceito geográfico de paisagem.

Existem diversas vertentes musicais, entre elas o rap. O rap, que segundo Campos

(2008) significa “rhythm and poetry” (ritmo e poesia), que provavelmente surgiu na

Jamaica na década de 1960 – na década seguinte, muitos jamaicanos migraram para os

EUA – é um estilo que se caracteriza por ser uma espécie de fala ritmada, com uma

melodia singular, sendo a letra mais significativa que o som, que a batida (CAMPOS,

MARQUES, 2008, p.237), no rap o que importa são as falas, o que se diz, a ideologia que

essa música transmite aos ouvintes.

É importante destacar, que para além da música, segundo Zeni (2004), o rap está

inserido no movimento hip hop, apesar de ser pouco estudada essa manifestação cultural,

é constituída por quatro elementos: o break que é a dança, o grafite que é uma pintura

feita com spray, que caracteriza muito o espaço da cidade, o DJ e o rapper, que são os

MCs (cantores) que cantam e declamam as letras.

Segundo Zeni (2004), no Brasil, a construção do movimento se deu a partir dos

anos de 1970, com os chamados bailes blacks, que eram animados por músicas soul e

3 Inicialmente as atividades não haviam sido planejadas para essa faixa etária. A implementação aconteceria no

CENSE, contudo, por questões burocráticas da unidade sócio educativa, não foi possível serem desenvolvidas as

atividades. Sendo realizadas no CEEBJA, tendo uma boa aceitação dos educandos, onde os mesmos expressaram

interesses pelas atividades, aproximando os da realidade vivenciada.

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funk. O hip hop surge em São Paulo, em meados de 1980, pois ainda de acordo com Zeni

(2004), o rap surgiu como improviso para acompanhar as manobras de break, os rappers

cantavam na rua e “improvisando ao som de latas, palmas e beat box (imitação das

batidas eletrônicas feitas com a boca). No começo, por ser um canto falado, feito de

improviso nas rodas de break, o rap era chamado no Brasil de "tagarela" (ZENI, 2004,

s/p.).

Zeni (2004) afirma que, o rap veio a ganhar o caráter contestador com a dupla

Thaíde e DJ Hum, tendo em vista, que no seu começo tinha um jeito mais extrovertido e

brincalhão.

A atual situação da periferia brasileira, e dos jovens de quem dela são originários,

acirra a desigualdade social. Para Zeni (2004), a intensa presença de detentos com a pele

negra no sistema penitenciário do Brasil, é um dos indícios de que a desigualdade de

classe continua a ser sentida de maneira mais grave entre os negros.

Campos e Marques (2008), falam das semelhanças do break com a capoeira, ou

seja, a percepção de que ambos se relacionam com a cultura negra, isso fez com que a

auto-estima de jovens negros da periferia, aumentasse afastando-os da criminalidade.

Partindo do pressuposto de que o rap se torna uma forma de expressão em relação

as desigualdades e opressões que ocorrem na periferia, suas letras geralmente abordam

o cotidiano desses lugares, nesse sentido de acordo com Gomes (2009), os raps passam

a ser entendidos por uma grande parcela da sociedade, como letras que fazem apologia

ao crime, a violência e ao tráfico de drogas, por isso é importante que haja a

desmistificação desse assunto, e compreender que se trata de uma realidade social.

É nesse momento que o ensino da geografia se insere, pois de acordo com Correia

(2009), a ciência geográfica provoca a sensibilização e a percepção, fazendo com que o

educando desenvolva ações intuitivas e artísticas. Durante esse processo, é possível

fazer com que o aluno, deixe de se alienar em relação a sua realidade social, e passe a

ter uma perspectiva crítica.

Um estudo de Geografia deve ter como base a realidade. A pergunta, a dúvida e a problematização são fundamentais. Buscar exemplos vividos é uma atitude importante. Dada as características do rap, ele é um possibilitador de exemplos em aulas de Geografia [...]. (CAMPOS, MARQUES, 2008, p.245).

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Outro fator importante nesse momento é o de desmistificar o rap, ensinando para

esses educandos, que não se trata da apologia ao crime mais sim, da realidade a periferia

do Brasil, “[...] é despertar o senso crítico, explicar posteriormente o significado das

palavras e os diferentes sentidos que pode ter dependendo do contexto em que está

inserida” (NEVES apud CAMPOS, MARQUES, 2008, p.246).

Uma das músicas escolhidas, para o desenvolvimento do trabalho em sala, foi “Um

bom lugar” do cantor de rap Sabotage, que aborda a questão da luta de classes, a

violência e o descaso do Estado com as classes dominadas, saneamento básico e

estruturas básicas para sobrevivência.

E a partir dessa música, os alunos foram motivados a realizaram seus relatos da

realidade, fazendo também com que os mesmos desenvolvessem a escrita analítica,

interpretação, manifestação de sentimentos, experiências, ideias, opiniões e realidades.

Nas atividades a seguir podemos ver a reflexão que a música proporcionou para muitos

alunos:

Imagem 1 – Atividade com Rap durante as aulas

Fonte: SILVA, A.J. 2015.

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Como podemos observar a letra escrita por esse aluno revela os problemas do seu

bairro, principalmente o vandalismo com orelhões quebrados e ônibus incendiados.

Chamando também atenção para observação da paisagem da cidade. Demais reflexões

surgiram como podemos visualizar na letra a seguir:

Imagem 2 – Atividade com Rap durante as aulas

Fonte: SILVA, A.J. 2015.

Percebe-se que a letra desenvolvida pelo educando, não possui necessariamente o

ritmo o qual o rap exige, porém, verifica-se que com ela o aluno traz questões do seu

cotidiano, invisibilidade do sujeito através do título (Rejeitado da sociedade), bem como

questões relacionadas ao ato de fumar, além de destacar que a cor da pele estabelece a

diferença entre os cidadãos (“polícia passar aí e ver catar esse neguinho de meia hora e

bater”).

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Imagem 3 – Atividade com Rap durante as aulas

Fonte: SILVA, A.J. 2015.

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Através dessa letra desenvolvida pelo aluno, inúmeras questões podem ser

contextualizadas. A primeira dela diz respeito de como o aluno aponta em seu texto, as

questões raciais, quando relata que “eu sou julgado pela minha cor e meu cabelo

crespo...”. De forma crítica, o aluno questiona as paisagens, as dos cartões postais e as

das periferias “A maioria vende imagens, paisagens de cartão postal mais se esquece das

periferias e seus impactos sociais”. Relata também a diferença de classe entre ricos e

pobres, e cita o nordeste como região pobre, por fim, a esperança que possui de

mudanças.

Assim verifica-se que o RAP trata das experiências cotidianas como afirma

Schroeder:

O Rap constitui-se em uma expressão artística através do qual relatam poeticamente a condição social, suas experiências cotidianas. Nesse sentido escrevem sobre, temas como, politica, violência, crimes, drogas, pobreza, discriminação falam de falta de perspectiva e da relação que tem com a policia. Mostra a realidade de uma classe social excluída. (SCHROEDER, 2009, s/p).

O tema da implementação, buscou discutir o conceito de paisagem, e as mudanças

nesta paisagem, sobretudo abordando a paisagem urbana, isto é a cidade. Como afirma

Cavalcanti (2012) é através das nossas atividades diárias, que tanto alunos e professores

constroem a geografia, ao circularem, brincarem, trabalharem pela cidade e pelos seus

bairros, constroem lugares, produzem espaços, delimitam seus territórios e vão formando

espacialidades cotidianas em seu mundo vivido, contribuindo para a produção de espaços

geográficos mais amplos.

Com relação ao conceito de paisagem um dos alunos indica na sua produção

textual que:

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Imagem 4 – Paisagem na visão do aluno

Fonte: SILVA, A.J. 2015. O educando faz uma ligação de várias paisagens, diferenciadas em todo o mundo,

e estabelece uma relação de paisagem com algo belo, pois relata “porque ao vez de

reclamar na hora eu não levanto e dou uma olhada no nascer do dia... e a coisa mais

linda”. Com relação ao conceito de paisagem, Santos (1988) diz que:

Tudo aquilo que nós vemos, o que nossa visão alcança, é a paisagem. Esta pode ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é formada apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons etc. (SANTOS, 1988, p.21)

Percebe-se assim, que muitos alunos compreenderam o conceito de paisagem, ao

refletirem e escreverem em seus textos. Com relação aos aspectos visíveis da paisagem,

os alunos também realizaram uma atividade através da técnica de estêncil em papel Kraft,

onde um professor de artes convidado, explicou a técnica e o desenvolvimento da

mesma, os educandos escolheram uma paisagem urbana, logo em seguida com a

utilização de estilete, foram criando o molde vazado, finalizando a atividade com a

aplicação da tinta spray, como pode-se verificar o resultado abaixo:

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Imagem 5 - Trabalhos desenvolvidos com a técnica do estêncil em papel Kraft

Fonte: SILVA, A.J. 2015.

Com esta atividade os alunos buscaram representar a paisagem urbana, percebe-

se que alguns alunos trouxeram outros elementos para seus desenhos, como coqueiros e

possivelmente representaram uma praia, mas a maioria colocou em evidência os prédios,

como elemento da paisagem urbana.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Várias maneiras diferentes podem ser pensadas para utilizar a música no ensino

de Geografia, o importante é que os educadores que ministram essa disciplina fiquem

atentos a este instrumento, a música, e o insiram adequadamente no cotidiano escolar.

Podendo inclusive construir, relações entre as disciplinas, como por exemplo, Geografia e

História, Geografia e Língua Portuguesa, ou várias outras. Um grande desafio das

escolas, dos professores e das áreas disciplinares é manter esta relação entre as

disciplinas, e a música, serviria então como uma facilitadora no diálogo entre estas.

A música nos serve como um “espelho” da sociedade e das relações dos seus

autores com o meio. Com suas letras, suas construções sonoras, seus instrumentos, a

música nos fala, muito além da simples distração e diversão, ela pode ensinar, apresentar

aos alunos e professores uma Geografia diferente, que produz uma educação para

cidadania.

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É preciso, como afirma Cavalcanti (2012) levar em consideração a prática cotidiana

dos alunos, pois ela é plena de espacialidade e de conhecimentos dessa espacialidade, e

formar o cidadão é um projeto que tem como centro a participação politica e coletiva das

pessoas, pensando o destino da sociedade e da cidade, e essa participação esta ligada a

uma democracia participativa, ao pertencimento à sociedade.

Por isso, acredita-se ser fundamental, utilizar a música para refletir sobre as

mazelas da sociedade coletivamente com os alunos. Instigando os mesmo a produzirem

suas letras, e sentirem-se pertencentes a essa sociedade, na qual podem atuar.

As atividades desenvolvidas se mostraram eficazes, os resultados apontaram a

compreensão dos conteúdos pelos alunos que puderam estimular a criatividade, e

também evidenciaram aspectos do seu espaço vivido. Callai (2005) destaca que para

realizar a leitura de mundo, é fundamental partir do próprio lugar, isso é, considerar a

realidade concreta do espaço vivido dos educandos, uma vez que é no cotidiano da

própria vivência que as coisas vão acontecendo e, assim, configurando o espaço. Deste

modo, é importante partir da vivência concreta, ampliando a leitura do espaço e,

desenvolvendo a capacidade de “aprender a pensar o espaço”, fomentando o raciocínio

geográfico.

Essas práticas com a música contribuíram para que os alunos percebessem que o

conhecimento escolar não serve apenas “para fazer a avaliação” e, depois pode ser

esquecido, mais ele proporciona uma leitura e interpretação do mundo. Portanto, pode-se

afirmar que a inserção de práticas pedagógicas e metodológicas usando a música, como

instrumento, especialmente as letras de rap, possibilitam ao aluno uma visão crítica e

aguçada da sua existência e do espaço geográfico.

REFERÊNCIAS

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