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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

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A SEGURANÇA E SOBERANIA NA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR

Teonildo Cirino Rodrigues¹

Sidnei Pressinatte Junior²

RESUMO: A segurança e soberania alimentar é um tema pouco comum nos dias de hoje. Tal

assunto requer muita atenção dos grupos sociais organizados, agricultores, consumidores e dos

bancos escolares. É importante que os alimentos ofereçam uma confiabilidade e que os

consumidores, principalmente estudantes conheçam sua origem. Na merenda escolar, a legislação

assegura que pelo menos 30% seja de origem da agricultura familiar, através de compra direta. Desta

forma a legislação requer que os alimentos possuam uma qualidade que os torne mais saudáveis e

que tenham uma origem orgânica e agroecológica. As praticas convencionais da agricultura não

garantem este quadro de segurança e diversidade pois pelas normas do agronegócio se pratica a

monocultura. A soberania alimentar estimula aos agricultores o controle e o domínio de suas

sementes, que é a garantia sustentável para cada povo e o próprio sistema biológico. Então, cabe à

escola fazer o debate de que forma são produzidos os alimentos, quais grupos garantem a

alimentação da sociedade e como este assunto se correlaciona com os demais conteúdos escolares

de uma forma contextualizada. O desenvolvimento do trabalho teve dificuldades pois estudantes e

comunidade escolar muitas vezes se abstém de tal debate uma vez que tais assuntos tendem a ser

suprimidos do dia a dia escolar que é voltado unicamente para os conhecimentos convencionalmente

programados. Os resultados obtidos refletem as afirmações feitas anteriormente. De certa forma os

resultados das discussões da sala de aula venham a aparecer quando adultos, com filhos, adotando

regras alimentares. O grande embate proporcionado foi com o fazer mudanças de hábitos

alimentares, que mecanismos sociais, políticos, precisam ser adotados para direcionar modificações

na sociedade. De tantas questões, o esperado aconteceu porque mesmo que não demonstrem, mas

na hora de adquirir um alimento surgirão varias perguntas como: é bom? É bem produzido? Quem

produziu? De onde vem?

Palavras-chave: Fome. Agricultura familiar. Garantia necessária.

_________________

¹ Professor Estatutário da Rede Pública Estadual do Paraná, lotado no Colégio Estadual Ludovica

Safraider. Graduado pela Faculdade Fundação Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Jandaia

do Sul, Curso de Ciências, Licenciatura Plena com habilitação em Biologia.

² Professor orientador da Universidade Estadual do Centro Oeste, graduado em Ciências Biológicas,

Mestre em Ciências Ambientais

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1. INTRODUÇÃO

“A alimentação básica é um direito de todos, homens, mulheres e crianças,

independentemente das condições de cada um. As práticas alimentares devem ser

promotoras de saúde, com respeito a diversidade cultural e ambiental”. CONSEA,

2004.

GIRAMUNDO, 2009, afirma que:

“A deficiência de certos elementos, constituidores, bem como a escassez na

quantidade nas refeições diárias, gera uma elevação dos índices de

mortalidade infantil, retardo no crescimento físico decorrente de doenças

derivadas da desnutrição. São comuns também os casos de excessos de

alimentos repetidos com poucos nutrientes, muito açúcar e gordura, que

causam patologias como obesidade, diabetes e outros”.

Os estudantes necessitam estar cientes que a alimentação dita “normal” é

deficiente em nutrientes. Também que a constituição federal em seu artigo 208,

prevê que a alimentação segura contribui na aprendizagem no período escolar. Além

disso, a Lei Federal 11.947/2009 em seu artigo 14º assegura que a merenda escolar

seja oriunda pelo menos de 30% da agricultura familiar. Este artifício legal possibilita

que municípios estimulem associações, cooperativas de produção local, de

pequenos agricultores e agricultoras, forneçam seus produtos à merenda escolar. O

artigo 20º da mesma lei discorre que além de serem oriundos da agricultura familiar,

que sejam preferencialmente, sempre que possível alimento orgânico ou

agroecológico. Uma questão é que os alimentos convencionais obedecem à lógica

do mercado, de modo que cada vez mais os alimentos são nada mais nada menos,

que uma oportunidade de negócios, de geração de lucro e acumulação de riquezas.

(CAPORAL, 2011, p. 106).

Diante das discussões que podem ser levantadas pela deficiência dos

alimentos pela incipiência da Legislação ou pelo não cumprimento da lei, em muitos

casos, o debate está dado. Todas as questões a partir dos artigos citados, a

disciplina de Biologia, contribui nas discussões através do conteúdo Teoria Celular e

os Mecanismos Bioquímicos, práticas alimentares, formas de produção, políticas

sociais, meio ambiente, trabalhando-os de forma contextualizada.

O debate consciente proporciona reivindicações desse direito em querer e

exigir alimentação de qualidade, proporcionando qualidade de vida, bem como

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melhor desempenho escolar. Portanto é necessário estimular a capacidade de

observação e uma vigilância constante de uma dieta saudável e equilibrada.

2. A FOME

A problemática da falta de comida se arrasta por todos os cantos do planeta.

Estudos mais antigos relatam diversas situações de penúria e miséria assoladas

pela seca no sertão nordestino no século XIX (VASCONCELOS, 2005, p. 440).

Com relação à fome existiu uma tímida intervenção por parte do estado

brasileiro no período de Vargas com programas de política de alimentação e

nutrição. O estado brasileiro proporcionou ações voltadas à produção e consumos a

determinados segmentos sociais. Certamente o favorecimento ao acúmulo de capital

e serviços, de jogos de interesse voltados a camadas sociais bem distintas.

Pesquisas realizadas na década de trinta, sobre a condição da classe

trabalhadora relacionadas a capacidade nutricional correspondia a 71,6% do seu

total. Neste período o consumo diário girava em torno de 1645 calorias, porém,

pobre em vitaminas e sais minerais, que causava mortalidade e baixa expectativa de

vida. (VASCONCELOS, 2005, p. 441)

A fome e a desnutrição em nosso país desbancam muitos discursos políticos

e demagógicos. Com a criação do salário mínimo em 1940, pelo decreto 2.162 seria

de garantir o sustento do trabalhador e de sua família (citação). No entanto, sabe-se

que os que ganham salário mensal, dificilmente vivem no campo e do trabalho no

campo, em se tratando daquela época (citação).

A produção de alimentos vinculada a interesses de grupos especiais e

distintos, bem como mercado e ao comércio especulador, tornou a alimentação

básica com índices energéticos. No sistema econômico vigente, os alimentos da

agricultura são mercadorias.

Com a revolução verde a biodiversidade está dando lugar aos monocultivos e

a produção de commodities, em detrimento da diversificação e modificação de

hábitos e dietas de distintas populações. (CAPORAL, 2011, p. 126)

O primeiro destino de todo o veneno agrícola, é para melhorar a produção e

qualidade, dar segurança do plantio e colheita. Na primeira década do séc. XXI no

Brasil se gastou aproximadamente quatro toneladas de veneno por habitante.

Deveras a segurança na alimentação está comprometida. Segundo Caporal (2011),

planilhas sobre agricultura familiar, no Rio grande do Sul, na produção de soja,

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milho, feijão foram financiadas em torno de 19% dos valores com herbicidas e

outros.

Como fruto das práticas adotadas pela revolução verde, os consumidores que

não observam a origem do alimento e muito menos as quantidades de agrotóxicos

usados nas lavouras são totalmente influenciados, dessa forma, a tecnologia foi

utilizada como um trampolim para o desenvolvimento, gerando vícios insustentáveis

na produção. A ciência também é influenciada pela revolução verde, pois trabalha

afirmando que é possível uma quantidade aceitável de veneno nos produtos

agrícolas. Entretanto, a todo o momento se houve na escola que se deve respeitar

um período de carência dos medicamentos, e em todos os lugares estão

informativos da ANVISA alertando para o uso dos venenos. Contudo, ainda não são

comuns as doenças até mesmo as perdas devidas pelo uso demasiado dos

venenos.

Nos anos 80, especialmente na nova república, aparecem vários programas

governamentais que tentam reforçar a ideia de melhorias na condição alimentar

brasileira.

No início dos anos 90, quando um governo de caráter neoliberal, Collor de

Melo, ao assumir o poder proporciona uma redução nos programas de alimentação

e nutrição, (Vasconcelos, 2005). Mas, com impeachment de Collor e o aparecimento

de movimentos por Ética, cidadania, combate a fome, liderada por Betinho, a nação

se mobiliza por mudanças fundamentais e sensibilizam a sociedade a combater a

fome e a miséria. (VASCONCELOS, 2005, p. 447).

Como afirma VASCONCELOS (2005), muitos programas governamentais, por

sugestão de partidos e movimentos sociais, como bolsa alimentação, fome zero e

tantos outros apareceram como forma paliativa, para suprir as necessidades

básicas, porém nunca se teve a intenção de mudar as estruturas do país. Vale

lembrar que 52% das mercadorias de consumo humano são manipulados por quatro

maiores empresas do mundo e 90% dos ingredientes ativos, usados na alimentação

e produção são manipulados por 10 empresas (CAPORAL, 2011, p. 450).

Na atualidade, os sistemas alimentares passam por crises e deixam milhões

de pessoas sem acesso aos alimentos, Altieri (2008), afirma que 1,5 bilhões de

hectares produzem alimentos, mas não excluem os 800 milhões de pessoas

famintas do planeta. Um agravante é que muitos alimentos suprem a corrida da

produção de biocombustíveis. Outro fator importante é que a agricultura, produtora

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de alimentos depende de muitos fatores ecológicos, como agentes polinizadores,

ciclo da água entre outros. Vale lembrar que o sistema econômico vigente não

proporciona condições a esses fatores ecológicos.

Na corrida de produção agrícola, a cada ano aumentam as áreas devastadas

por monoculturas, com a destruição de ambientes naturais, que causam

desequilíbrio nos sistemas. “Todo processo na agricultura capitalista, é um

progresso da arte de roubar não só do trabalhador, mas do solo”. (MARX, 1867).

A falta de investimento faz com que não haja agricultura ecológica,

sustentável e que não seja agressiva. Uma condição impar que propõem a produção

de alimentos com erradicação da fome, é o movimento social da Via Campesina, em

que debate a soberania alimentar como direito dos povos. Segundo Altieri (2008), a

soberania alimentar concentra-se em circuitos, locais fechados de produção e

consumo. Desta forma constroem-se controles de todos os métodos de produtos,

consumos, troca de sementes e receitas. (VIA CAMPESINA, 2003). Nesta

perspectiva, cada sociedade, cada camponês é agente de sua própria

sobrevivência, ou seja, cada povo possui suas sementes, mecanismos de controle,

conservação de toda sua produção. Altieri (2008), afirma que as pequenas

propriedades diversificadas produzem de duas a dez vezes mais que as grandes

fazendas corporativas. Cabe uma reflexão sobre as condições da pequena

propriedade, como distância dos centros formadores e acadêmicos, conhecimentos

das linhas de credito, condição de escoamento e armazenagem e outros,

impossibilitam a viabilidade de muitas pequenas propriedades.

O direito humano a alimentação é uma discussão estendida por toda a

sociedade. O acesso à alimentação não se restringe somente aos meios para sua

aquisição, mas condiciona a um “pacote” mínimo de calorias, proteínas e outros

nutrientes específicos, como diversidade adequação nutricional e cultural e que o

alimento não possua substâncias nocivas. (VALENTE, 2003, p. 54).

Diante das questões de nutrição, ela pode produzir segurança caso se saiba a

sua origem ou insegurança por esconder informações de produção. A segurança

está garantida pela diversidade, se produzida com respeito ao sistema ecológico. A

insegurança está no desrespeito aos sistemas na forma de produção, obedecendo

ao mercado como afirma o Instituto Giramundo, (2010).

Ainda, segundo o Instituto Giramundo (2009), “a segurança alimentar não

está apenas na forma bem apresentada, bem acabada da embalagem, mas na

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composição intrínseca de cada alimento, na ausência de riscos físicos, químicos e

biológicos”. É importante cuidar da quantidade adequada para cada ser consumidor.

A segurança alimentar é a realização do direito de todos ao acesso regular e

permanente, a qualidade e na quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a

outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras

de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam, sociais, econômicas e

ambientalmente sustentáveis (CONSEA, 2004).

No ano 2006, foi criado a Lei 11.346 que originou o sistema nacional de

segurança alimentar e nutricional (SISAN). Esta lei estabelece critérios direcionando

a varias fontes como condição de acesso, conservação da Biodiversidade com

práticas sustentáveis dos recursos, garantia da diversidade biológica, produção de

conhecimento e implementação de políticas publicas sustentáveis, respeitando as

múltiplas características do país.

Em se tratando de lei, existem muitos critérios, mecanismos de garantia e

acesso ao alimento de qualidade a todos. Aparentemente, a garantia está dada. O

desafio da sociedade é o acompanhamento dessas medidas governamentais. A falta

de cumprimento dessas determinações exige uma demanda de medidas

emergenciais para atender as necessidades de grupos em condições adversas.

A segurança alimentar em nossa sociedade esta submetida à condição social

e econômica que os diversos grupos estão inseridos. Outra questão é que a

agricultura familiar esta condicionada aos moldes de produção convencional ou do

agronegócio. Para tal pratica importa produzir para o mercado e quanto à forma e

garantia de qualidade natural e ecológica é quase inexistente

Cabe aqui uma reflexão do sistema econômico vigente. Na produção

mercantil, confrontam-se compradores e vendedores entre si. Suas relações

recíprocas cessam no mesmo dia em que acaba o contrato que fizeram. (MARX,

1989, p.682). No sistema econômico, além dos alimentos serem mercadoria até o

trabalho afunda ao nível de serem mercadoria e uma das mercadorias mais

deploráveis, em que a miséria do trabalhador aumenta com o poder e o volume de

sua produção. (MARX, 1844).

Mesmo assim, a agricultura familiar com todas as dificuldades no processo de

produção, armazenagem, escoamento e outros problemas produzem em torno de

70% de alimentação no Brasil, espalhada em todo o território nacional, apresenta-se

vantajosa na produção de alimentos no país.

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A lei 11.316/2006 em sua diretriz defende a ampliação e a diversificação de

produção. Neste item a segurança remete a discussão que os produtos podem ser

garantidos pelos grupos de agricultores, incluindo as suas sementes e os insumos

próprios. O agronegócio, o mercado detém os insumos, sementes, tecnologia,

eximindo da agricultura familiar conhecimentos tradicionais e populares. Pode-se ver

também que as universidades da área de produção, com raras exceções dedicam

estudos e pesquisas voltadas para a necessidade da agricultura familiar e sistemas

ecológicos. Dentro da questão, mesmo se referindo à lei é que agricultores e

agricultoras estão sendo desaculturados de suas praticas e tradições. O sistema

mercantil atropela dinamismos naturais impondo atitudes imediatistas de mercado.

Além disso, os hábitos alimentares são modificados pela insistência do mercado e

da propaganda de consumo.

Dentro do contexto de possuir uma garantia alimentar, exige-se que a

população não se submeta a imposições externas. O domínio de qualquer

civilização sobre outra, implica em uma serie de coisas como neste caso, a perda

das sementes, de hábitos e modelos. Perder as sementes é ficar dependendo da

alimentação própria. Esse descuido é a perda da segurança e muito mais da

soberania alimentar. (GRAIN, 2006, p. 40)

Para a Accion Ecológica (1999), “a globalização com sua força da

organização mundial do comercio (OMC), segue uma linha equivocadas”. Nesta a

observação é que o mercado internacional, globalizado põe a produção de alimentos

na mão dos importadores, deixando o estoque e a população dependente do

comércio externo, deste modo há perdas e fuga de divisas, limitado pelas exigências

do mercado exportador.

A perda da soberania dos países se deu com a revolução verde, em que

exigia uma alta demanda de insumos externo e solúveis. Desse modo é muito

conhecida a fórmula do NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio) na adubação

convencional da atualidade. A política de agricultura de mercado desbanca a

utilização de sementes crioulas (sementes produzidas pelas comunidades) bem

como os adubos naturais. Neste contexto as sementes e adubos químicos dominam

o mercado. No caso dos adubos se desconhece o uso de farinha de rocha. Se

perguntar a um agricultor ou a um geógrafo onde estão as rochas, com certeza

sobrarão endereços rochosos. “Todos os elementos químicos estão incrustados nas

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rochas, os minerais foram criados aproximadamente há 15 bilhões de anos”.

(HENSEL, 1889, p. 10).

Diante da exigência de mercado, a semente crioula é menos produtiva. Aí

está a questão de uma ciência ser voltada a pesquisa de técnicas sem agressões

dos fertilizantes químicos, dos interesses mercantis consumistas.

O mercado globalizante interessa qualquer tipo de ação comercial e as

transações econômicas, importa o lucro. Para Martins, 2004, “o mundo se nega a

tratar a fome em termos globais. Pelo que se veem estes assuntos são tratados

como meros fenômenos econômicos e não há interesse da coletividade”. O

problema da fome está na distribuição e não é um problema técnico, mas sim

político. Por isso, a soberania dos povos não se restringe só aos alimentos, mas a

saúde pública, saneamento, educação e outros.

O conceito soberania, segundo a Via Campesina, (2003) é decorrente a um

debate feito na Cumbre Mundial da Alimentación em 1996. Segundo o debate a

dependência das nações mais empobrecidas pelo desenvolvimento neoliberal se

preocupa com o comercio internacional. O empenho do mercantilismo possibilita

milhões de camponeses a saírem do campo, promovendo êxodo, congestionamento

urbano e constantes migrações. A reflexão em torno da soberania dos povos requer

um preço justo no comércio entre as nações tanto nas importações quanto

exportações.

Na Carta da Organização dos Estados da América, 1948, menciona a

importação da autoridade e direitos humanos, forma de resguardar a dignidade,

normas de conduta dos estados e suas relações recíprocas. Contudo a soberania

alimentar requer que cada civilização dirija seus rumos da existência, que se

alicerçam na pratica do comer bem e viver bem.

Portanto a segurança, bem como a soberania alimentar, passa pelas

civilizações conscientizadas dos seus direitos de autonomia. A formação da

civilização passa pelas entidades responsáveis, que vão desde as organizações das

categorias, até os bancos escolares. A alimentação sempre foi e será elemento de

preocupação e ação dos povos. A primitividade no seu percurso histórico disputou

espaços, técnicas, conhecimentos para possuí-las como troféu de domínio. O

desafio da atualidade é deixar a disputa para obtê-lo e perseguir incansavelmente a

solidariedade. Tanto no mundo primitivo como no moderno o conhecimento

necessita da convivência diária e da contextualização dos saberes de forma ampla e

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diversa. Nas DCE´s (Diretrizes Curriculares da Educação Básica, 2008), a

biodiversidade é um conteúdo estruturante que possibilita o debate da segurança

alimentar. Segundo a mesma diretriz a sala de aula orienta a compreensão dos

sistemas orgânicos dos seres vivos e a relação com o não vivo.

Dentro de uma visão ecológica parece meio estranho considerar seres não

vivos, mas estes são elementos constituídores dos seres vivos. A compreensão

desta intima relação faz do conhecimento biológico um defensor da relação até dos

ecossistemas. Uns dependem dos outros. Pois, de acordo com as Diretrizes

Curriculares da Educação Básica de Biologia (Paraná, 2008), a disciplina tem um

papel importante na formação dos alunos, pois afirma:

Entende-se, então, que o trabalho pedagógico neste conteúdo

estruturante, deve abordar a biodiversidade como um sistema

complexo de conhecimentos biológicos, interagindo num processo

integrado e dinâmico e que envolve a variabilidade genética, a

diversidade de seres vivos, as relações ecológicas estabelecidas

entre eles e com a natureza, além dos processos evolutivos pelos

quais os seres vivos têm sofrido transformações. (2008, p. 59).

Como afirma a diretriz que é importante compreender a complexidade, as

relações ecológicas e consequentemente o respeito ao tempo de cada espécie para

o crescimento, maturação, colheita. Este trabalho sugere que a segurança e a

soberania alimentar está em respeitar cada ciclo, cada meio, cada grupo social,

etnia com suas culturas, costumes, suas sementes de produção alimentar.

3. METODOLOGIA

A proposta pedagógica é tentar interferir nos conteúdos de Biologia da escola.

Através das discussões objetivou-se a mudança de hábitos alimentares, práticas

constantes de cuidados a saúde, a vida e ao meio ambiente. A tal proposta remete

estudantes, comunidade escolar ao centro do debate referente à biodiversidade, a

contextualização sócio – econômica política e histórica de seu tempo.

A aplicação das atividades ocorreu na 1ª série do ensino médio do Colégio

Estadual Ludovica Safraider no município de Rio Bonito do Iguaçu. As ações foram:

Verificar quais alimentos fazem parte da merenda escolar oriundo da

agricultura familiar;

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Através da pesquisa, certificar a origem da produção e os mecanismos

usados, como adubação e manejo de conservação;

Debater em sala textos que estimulem a compreensão das práticas do

agronegócio, capitalismo e ecologia;

Pesquisar o uso de técnicas no uso da agroecologia e de produtos

convencionais;

Promover palestra com representantes da Via Campesina para

compreender o sentido dos alimentos, com relação a segurança e

soberania alimentar da sociedade;

Visitar grupos de agricultores (as) familiares agroecológicos para observar

como os alimentos oferecem segurança, bem como são estimulados a

autonomia;

Desenvolver atividades que avaliem a apropriação dos conceitos

biológicos e sua contextualização, desenvolvidos durante o processo do

projeto.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

O primeiro ponto de debate foi a questão da escolha da cesta básica, que

critérios são considerados para a aquisição dos produtos? Um segundo ponto dentro

da escolha apareceu a diferença básica de alimentos produzidos de forma

convencional, orgânica e ecologicamente. Cada forma de produção causou nos

estudantes surpresas porque se entendia que alimentação é tudo igual e se está na

mesa é boa. A diferenciação de produção de cada sistema possibilitou a cada

participante da comunidade escolar aquela pergunta básica de consumidor em

querer saber quem produziu e da onde veio. Dentro das atividades, as surpresas em

descobrir diversos sistemas de produção e mesmo assim alguns estudantes

demonstraram pouco envolvimento. Os motivos deste envolvimento são pessoais ou

de livre escolha pois cada pessoa precisa trilhar seus próprios caminhos e gozar de

suas escolhas.

Outra atividade foi a análise e comparação dos alimentos da merenda escolar

e se eles garantem uma segurança e soberania alimentar. Primeiramente a

segurança requer uma qualidade amparada por uma quantidade suficiente. A

quantidade é a aquisição suficiente de cada nutriente. Portanto, consumir um

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alimento saudável em quantidade insuficiente também é um problema. O

desconhecimento da função de muitos componentes químicos e orgânicos nos

alimentos faz dos consumidores meros consumistas. Dentro dessa condição a

juventude é mais atingida. Os sistemas comerciais estão interessados no lucro. Para

conseguir maior desempenho o mercado se utiliza de embalagens sofisticadas,

aditivos de sabor como atrativos.

Segundo relatório da ONU, 2009, um sexto da população mundial sofre com a

desnutrição. Uma coisa interessante é que a cada ano que passa a produção de

grãos é cada vez maior, no entanto, não a quantidade existente dos alimentos, mas

sim a disponibilidade, as condições econômicas ou ainda o acesso à terra para

produção dos mesmos (ARL, V. R.; DAMBROS, O).

Diante de tanta produção muitos alunos chegaram a perguntar se seria

possível produzir tanto alimento se mudar o sistema convencional utilizado. Esta

questão não está clara, mesmo a academia em sua maioria aposta na forma

convencional. Outra questão debatida se a agroecologia teria condição de garantir

alimentos, tese também levantada por Valdemar R. Arl.

As condições climáticas, as condições dos solos e o próprio efeito estufa são

contribuintes para a diminuição dos alimentos. Estes temas nos bancos escolares

são bastante comuns. No entanto durante momento de reflexão parecem pouco

atraentes. Aparentemente, tais problemas deixam de existir, pois são abordadas

medidas paliativas ao invés de se tratar a causa do problema, por exemplo: Em

alguns casos a temperatura elevada é solucionada com água fria, ventilador ligado

em sala de aula. Quando se refere aos solos, o senso comum, o agrônomo, a

cooperativa e o comercio tem a solução. Assim a escola formal tenta remar contra a

maré ou como acontece na maioria das vezes segue a corrente colocando um

ventilador a mais, outro bebedor com água gelada e tudo se resolve.

Durante a aplicação da proposta e com a leitura, o debate de textos sobre a

soberania alimentar alguns alunos se mostraram inquietos, outros indiferentes e

ainda houve aqueles que se mostraram bastante satisfeitos. A imponência da

produção do agronegócio obscurece alternativas importantes.

A soberania alimentar dos povos defendidos por movimentos sociais,

pequenos agricultores aparece como uma pequena luz no final do túnel. Segundo

ALTIERI (2008), “a soberania alimentar concentra-se de locais fechados em que

agricultores em suas ações comunitárias facilitam o acesso a terra, a água, a agro-

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biodiversidade”. Para diversos estudantes a soberania alimentar desencadeou uma

espécie de esperança, de vida melhor. Esta perspectiva de bem estar no campo,

com autonomia também é um desafio para a escola, pois os sistemas educacionais

se caracterizam com aspectos urbanos. Os alimentos nos grandes centros é suprido

por grandes redes de supermercados condicionados ao sistema mercadológico.

Além da questão alimentar a soberania pode estar incluída na educação sem copiar

modelos, nas questões políticas onde cada povo construa sua historia.

Uma comunidade ou até mesmo uma sociedade com soberania alimentar

proporcionará uma segurança alimentar. Esta segurança implica em fatores

importantes onde os alimentos garantam a produção de vida por sua constituição

original, o outro fator é que essa segurança esteja garantida nas quantidades

suficientes de cada nutriente. Portanto não basta o alimento ser bom, mas ele

precisa estar na medida certa, sem falta. Vale lembrar que o excesso também

provoca distúrbios na saúde de qualquer ser vivo.

A segurança e a soberania alimentar proporciona às comunidades uma íntima

ligação com os ecossistemas. A garantia da qualidade alimentar passa pelo respeito

em cada ser vivo, animal ou planta, necessitada em desenvolver-se.

A escola como formadora de conhecimento, de cultura, carrega um grande

desafio se quiser contribuir com mudanças culturais e estruturais. Uma modificação

nas programações curriculares ou atitudes transformadoras é ir até a origem dos

problemas, no caso deste artigo, é ver como são produzidos uma alimentação

segura e soberana. No dia-a-dia da escola aparece problemas ligados a má

alimentação, aos exageros de uma alimentação consumista.

A composição nutricional de qualquer ser vivo assegura sua adaptação,

resistência e equilíbrio nos sistemas. Outra preocupação se deu pela proposta em

que os alimentos mais saudáveis seriam os de origem agroecológicos. Esta situação

não foi aceita por todos os alunos, pois até mesmo filhos de pequenos agricultores,

um grupo deles, desconhecem ou resistem a praticas desta natureza. Dentro deste

contexto as praticas pedagógicas são desafios. Quando a prática escolar se detiver

ao complexo do sistema convencional, ela está endossando o modelo tradicional

resistente a mudanças.

Sem atropelos e tampouco ousadia a questão da segurança e da soberania

quanto de alimentos ou de outra dimensão da historia e outros conceitos

socioeconômicos parecem entrar em sintonia com o texto de Leonardo Boff (2013)

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(Contradição capitalismo/Ecologia). Na visão do autor capitalismo e ecologia não se

combinam. Para diversos alunos resultou uma questão. Que modelo seria possível?

Para Boff, o debate teve corpo participativo, pois ecologia tem dificuldades de se

manter por que o sistema explora os recursos naturais até a exaustão.

Portanto a agroecologia é um tema que percorre todos os aspectos dos

sistemas biológicos. A segurança e soberania alimentar deverá ser tantos quantos

forem os diferentes ecossistemas e sistemas culturais que os praticam (CAPORAL,

2009. pag. 84).

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após as primeiras ações é possível perceber a importância da aplicação das

atividades em um período especial. Certos projetos para serem implementados

necessitam de um envolvimento maior da instituição escolar, não podendo ser um

projeto individual do professor.

As atividades com os estudantes foram semelhante aquelas que acontecem

no dia-a-dia. Os conceitos propostos para a reflexão de como escolhemos os

alimentos, qual sua origem, de modo geral, são ignorados. Mesmo assim, quando

colocados frente a frente com os alimentos naturais e os artificializados os

educandos mostram-se impressionados pois desconheciam a diferença entre um e

outro alimento. Neste momento se instala o desafio da escola, das pessoas que

estão participando com algumas questões que não foram respondidas: como tenho

certeza da segurança? Hoje é possível ter alimentos saudáveis, a formação

acadêmica caminha para uma transformação, se continuar assim ate quando esse

sistema aguenta? Outras tantas indagações que acontecem o tempo todo.

As visitas, palestras e atividades diferentes da sala de aula são motivantes e

impressionantes, mas a escola deve ser fomentadora de reflexão, de estudo e de

pesquisa. Aulas de auditório só nos programas midiáticos.

A segurança e soberania alimentar de uma sociedade na sua origem

conceitual requer mudanças de atitude, discernimento de políticas publicas, defesa

de práticas culturais e respeito aos ecossistemas, o esquecimento destas questões

e de outras põe em risco a vida no planeta. Contudo existem muitas iniciativas que

mostram esperanças, como diz um dito popular, esperança que tem atitude,

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discernimento, determinação. Esta esperança que conduz a uma sociedade segura

e soberana.

Sobre o programa PDE, é ressaltada sua importância, pois permitiu a

formação de forma presencial, continuada e tutorada por universidades públicas.

Contudo o tempo de dedicação do PDE não pode ser uma formação aligeirada, pois

a formação ou a criação de cultura necessita de tempo.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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