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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Artigos Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE I

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OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Artigos

Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3Cadernos PDE

I

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CONSUMISMO, ALIENAÇÃO E PUBLICIDADE: A INFLUÊNCIA DA

MÍDIA NO COMPORTAMENTO DOS EDUCANDOS

Ivone Lindolfo da Silva Vidal Jeani Delgado Paschoal Moura

RESUMO Este artigo, na área de Geografia, resulta das atividades desenvolvidas no Colégio Estadual Bento Mossurunga Ensino Fundamental e Médio, no município e Núcleo de Ivaiporã/PR, junto aos educandos do 3º ano do ensino médio, como parte do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), constituído por estudantes, advindo em sua maioria, de bairros menos favorecidos, um grupo muito vulnerável e influenciado pelas mensagens midiáticas. O presente trabalho valoriza a análise crítica sobre as propagandas midiáticas como meio de alienação nessa sociedade “moderna”. O marketing, aliado ao capitalismo, é atualmente uma das grandes armadilhas das crianças, adolescentes e jovens induzindo-os ao consumismo. Como resultados da intervenção pedagógica, abriu-se um espaço de reflexão potencializando ações mais conscientes, na comunidade local, diante dos apelos propagandistas. Palavras-chave: Consumismo. Propagandas Midiáticas. Alienação. Educação. 1. INTRODUÇÃO

É de suma importância a discussão sobre esse tema, pois vivemos numa

sociedade capitalista e de consumo. Torna-se necessário à formação de cidadãos

conscientes para que possa, com responsabilidade, filtrar o que realmente precisa

consumir, daquilo é supérfluo. O ensino não pode ser alienado e superficial. É

necessária, uma inovação na maneira de ensinar, para que o conhecimento seja

transformador, desmistificando e minimizando esse valor tão forte que são dadas às

“coisas” e cada vez menos às pessoas.

Nessa perspectiva, este artigo visa apresentar o esforço em sensibilizar os

educandos sobre o consumismo exacerbado incentivado pela mídia, para que possam

ter uma mudança de comportamento em relação ao mesmo, agindo, de forma

consciente diante dos apelos propagandistas e, assim, formar cidadãos plenos e

conscientes de seu papel para atuar e transformar o meio em que vive, promovendo

a cidadania. O consumismo é criado ideologicamente, como recurso do capitalismo

para dominação do ser humano.

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Diante dessa situação cumpre-se desenvolver uma ação pedagógica inclusiva,

comprometida com um ensino humanizado para que possa contemplar quem mais

precisa, ou seja, quem só pode contar com a escola para vencer os obstáculos da

vida. Em geral, as pessoas conseguem dinheiro vendendo o seu trabalho e dele

recebem um salário que nem sempre é suficiente para atender as suas necessidades.

Há muitas pessoas que trabalham demasiadamente, mesmo assim, não conseguem

receber o suficiente para suprir as suas necessidades básicas, como alimentação,

moradia, saúde, educação e lazer. Outras sequer conseguem trabalhar; são os

desempregados, os que têm maiores dificuldades para sobreviver, já que tudo é

trocado por dinheiro.

O indivíduo tem que estar com esta ou aquela marca para se sentir aceito e

quando isto não é possível, o mesmo fica com a autoestima baixa. O consumismo

aliado ao capitalismo induz as pessoas, adolescentes e jovens a se endividarem e até

a exercerem práticas ilícitas como a prostituição, a venda de drogas e a criminalidade

em geral. Essas pessoas movidas por uma espécie de compulsão, não fazem uma

reflexão crítica, desprezam seus valores, ignoram a sua situação financeira, destroem

relações e passam a viver manipulados por esse processo, buscando nos novos

objetos algo para suprir o vazio que nelas existem.

Sem a preocupação do ser, o homem se torna ‘vazio’ por dentro. Perde sua

consciência crítica, sua capacidade de reflexão e se torna uma presa fácil no tripé

formado pelo consumo, publicidade e televisão (NOVAES, 1983, p.175). Diante dessa

situação problema, pergunta-se: Como sobreviver no mundo atualmente, em meio ao

‘’capitalismo selvagem’’, que nos massacra e escraviza, onde as pessoas deixaram

de serem cidadãos e seres humanos e passaram a serem clientes (bancos, lojas,

supermercados, empresas etc.)? Por que os jovens e adolescentes têm que consumir

para serem felizes? Existe relação entre consumismo e a mídia? Qual a influência da

mídia e da publicidade no comportamento dos educando? Qual o potencial da

Geografia para trabalhar nesse contexto? O que a escola pode fazer para minimizar

ou orientar os educandos nesse aspecto?

Sendo assim diante da problemática em relação ao consumismo e a influência

da mídia no comportamento dos educandos, muito presente entre os jovens fez se

necessário uma releitura na maneira de ensinar, cujo objetivo foi sensibilizar os

educandos sobre o consumismo exacerbado incentivado pela mídia na sociedade

capitalista, para que possam ter uma mudança de comportamento em relação ao

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mesmo, agindo, de forma consciente diante dos apelos propagandistas e, assim,

formar cidadãos plenos e conscientes de seu papel para atuar e transformar o meio

em que vive, promovendo a cidadania.

2. CONSUMO, CONSUMISMO E EDUCAÇÃO

Para o ensino da Geografia, principalmente nos dias atuais, faz se necessário

uma espécie de educação para o consumo, pois vivemos numa sociedade capitalista,

onde o consumismo é algo preocupante, pois tudo é trocado por dinheiro pelo qual se

obtém o lucro. Uma sociedade de consumo se faz pelo capitalismo no seu esplendor,

luxo e beleza. O elemento fundamental do modo de produção capitalista é a

mercadoria. O capitalismo só se realiza na produção e venda de mercadorias. O

capitalismo transforma tudo em mercadoria; conseguiu transformar até o trabalhador

(NOVAES, 1983, p.172).

A cultura é pautada pela oferta, vive-se de sedução, da criação de novas

necessidades, desejos e não de responsabilidades (NOVAES, 1983, p. 173). A

sociedade de consumo é, portanto, o capitalismo elevado a sua enésima potência.

Vista por outro ângulo, a sociedade de consumo pode ser chamada de sociedade de

venda. Para alguém consumir alguém tem que vender. Como Ciência Social a

Geografia tem como objeto de estudo também a sociedade que, no entanto, analisa o

comportamento do ser humano. Nem todos têm acesso a tudo o que é produzido.

Somos diariamente incentivados a consumir. Não necessariamente o que precisamos,

mas aquilo que aparece como desejável e essencial para a vida em sociedade. Assim

as pessoas se sentem objetos, peças de uma engrenagem da qual fazem parte, mas

dela não se beneficiam.

A propaganda e o marketing ditam regra na vida dos indivíduos, os quais só se

sentem valorizados quando estão usando uma marca. Afinal, essa é a ideologia

capitalista. Conforme Santos (1987, p.28) ’’o consumo de massa esboçado [...] vale

se da mídia, em crescimento, vertical para impor gostos e preços’’. A mídia exerce

uma espécie de fascínio sobre as pessoas. Além disso, por outro viés, o capitalismo

individualiza as pessoas, torna as mesmas mais competitivas e menos humanizadas.

‘’A sociedade de consumo sacramentou definitivamente a ideia de que Ter é mais

importante do que Ser’’ (NOVAES,1983, p.174).

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O Capitalismo joga forte, empenha se a fundo nesse processo de individualizar soluções, de isolar pessoas . O sistema vira um salve se quem puder .As pessoas se voltam cada vez mais para si ,para seu mundo pessoal.Perde se assim ,o espírito de coletividade, o sentido de solidariedade, de humanidade, a noção de comunidade , de conjunto , de tribo, valores que acompanham o Homem desde os albores da Civilização.(NOVAES,1983, p.193)

O sistema capitalista faz com que as pessoas pensem que são todas iguais,

todas são consumidores e aptas a consumirem.

O homem deixa de ser sujeito e passa a ser objeto. Tem suas decisões e sua própria vida comandada pelas necessidades e pelos interesses do mercado [...]. A ideologia dominante passa, então a ideia de igualdade, de união, para preencher tudo aquilo que o homem vai perdendo na individualização estimulada pelo sistema. Mas a ideia de igualdade passa pela massificação, pelo consumo, pela informação horizontal (televisão). (NOVAES, 1983, p.175-194).

Nesse processo os meios de comunicação, a propaganda e a mídia são

fundamentais para fazer o elo e concluir a teia final de alienação e sedução do

consumidor. Por não levar as pessoas à reflexão, os meios de comunicação, e

consumismo se fundem. Sendo assim a mídia está sempre ao lado do capital. No

mesmo teor ela aliena, seduz e controla o cidadão. Novaes (1983) afirma ainda que a

ideologia é um estabilizador social, pois faz com que o trabalhador, que produziu

quase tudo o que é anunciado na televisão, não possa consumir o que produziu e o

mais agravante é que se conforme com isso. A mídia pensa pelas pessoas, se

deixarmos veremos o mundo pelos olhos da mídia. Segundo Novaes (1983, p.181)

A ideologia é um dos meios usados pelas classes dominantes para exercer sua dominação sem que os dominados percebam que são realmente dominados. Esse é o papel da ideologia dominante (burguesa) fazer com que as pessoas não se apercebam de que estão divididas em classes (tornando muito mais fácil a dominação).

Não percebendo que estão divididas em classe, as pessoas também não se

identificam como classe trabalhadora, assalariada, ou ainda pior às vezes

desempregados, portanto, não tendo poder de compra, de consumir aquilo que é

mostrado nos meios de comunicação, nas novelas, filmes programas e nas

propagandas. No entanto, a ideologia trabalha com tamanha voracidade no sentido

de “[...] homogeneizar a sociedade. A todo momento, procura demonstrar que só

existe um homem brasileiro (o homem cordial), que só existe uma família brasileira.

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Mas mande uma família da Vieira Souto perguntar a uma família do sertão nordestino

se ela sabe o que é um cheque ouro ou um cartão de crédito’’ (NOVAES, 1983, p.182).

Para justificar as diferenças, a ideologia burguesa tem também as suas estratégias:

“Eis algumas usadas com frequência: questões de talento individual, questões de

natureza, ambição etc” (NOVAES, 1983, p.182). Mas, as oportunidades, a formação

de cada cidadão e o salário, entre outros são iguais? Segundo Novaes: ‘’Um dos

chavões preferidos da ideologia dominante, que gosta de anunciá-lo com toda a

pompa, orgulho e circunstância, é que “as oportunidades são iguais para todos”

(NOVAES, 1983, p.183).

Contudo, feito esse trabalho de massificação, é necessário criar mecanismos

para a prática concreta do consumo em massa. Mas, como consumir se o dinheiro

não está disponível, ou se não sobrou do salário do mês, ou pior se ainda nem

ganhou? Segundo Bauman (2010, p.12) a introdução dos cartões de crédito foi um

sinal do que viria a seguir. Foram lançados “no mercado” cerca de 30 anos atrás, com

o slogan exaustivo e extremamente sedutor de “Não adie a realização do seu desejo”.

Você deseja alguma coisa, mas não ganha o suficiente para adquiri-la?

Nos velhos tempos, felizmente passados e esquecidos, era preciso adiar a

satisfação. Esse adiamento, segundo um dos pais da sociologia moderna, Max Weber

(BAUMAN, 2010) foi o princípio que tornou possível o advento do capitalismo

moderno. Organizar o salário, guardar dinheiro para possuir algo desejado é coisa

passada. A sociedade moderna, com o uso do cartão de crédito mudou isso, é

possível ter tudo agora e pagar depois. Contudo quando pagar, e se pagar, terão

contraído novas dívidas por conta da empresa de desejos, tornando assim cada vez

mais difícil pagar os empréstimos feitos para satisfazer os novos anseios.

Para impedir que o efeito dos cartões de crédito e do crédito fácil se reduza a um lucro que o emprestador só realiza uma vez com cada cliente, a dívida contraída tinha de ser [...] transformada numa fonte permanente de lucro. (BAUMAN, 2010, p.13)

Contudo, além de pagar caro pelo adiamento da satisfação do desejo, a conta

chegará mais cedo do que se espera e com juros literalmente, e ainda o ideal é que

não consiga efetuá-la, pagando somente uma parte, senão o mínimo, transformando

a dívida contraída numa fonte permanente de lucro, como afirma Bauma (2010).

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O consumismo de hoje não consiste em acumular objetos, mas em seu gozo descartável. Sendo assim, por que o “pacote de conhecimento” adquiridos na universidade deveria escapar dessa regra universal? No turbilhão de mudanças, é muito mais atraente o conhecimento criado para usar e jogar fora, o conhecimento pronto para utilização e eliminação instantâneas, o tipo de conhecimento prometido pelos programas de computador que entram e saem das prateleiras das lojas num ritmo cada vez mais acelerado. (BAUMAN, 2010, p.42).

Atualmente vive-se para o prazer imediato. E, assustadoramente, creem, ou

seja, têm fé que adquirindo objeto preencherão o vazio que os aterrorizam. E o que

não oferece isso de imediato é friamente descartado. Até o conhecimento, não escapa

desse modelo (BAUMAN, 2010). Os jovens estão treinados para serem felizes, para

fazer coisas que dão prazer. E a busca pelo estudo, demanda esforço. Daí um

conhecimento superficial é o ideal nesse processo. O prazer também no mesmo teor

está no ato de descartar, e isso vale também para afetividade, relacionamentos,

trabalhos, enfim, todos estão treinados para o prazer e a felicidade imediatos e

momentâneos, e tudo o que demanda esforço investimento é logo abandonado.

Quanto a essa problemática Zuben (2010, p.96), destaca:

Diante da situação educacional em nosso contexto, dois motivos são preocupantes e merece constante análise e observação, sendo eles relacionados às finalidades da educação e á capacidade docente. O primeiro é a continuidade e os interesses em reduzir educação simplesmente à informação ou a instrução material. O segundo encontra se no fato da possível desatualização do conteúdo e da perspectiva educativa em meio às profundas transformações que estão correndo no presente, as quais abalam as bases de nossa civilização e colocam em risco a continuidade da vida humana no planeta terra. Nesse sentido, a educação deve ser constantemente atualizada em seu conteúdo crítico e não pode se encontrar distante dos problemas reais e concretos da vida, do país e do mundo.

Conforme Zubem a finalidade da educação é a emancipação e a transformação

humana. Sinalizando uma educação para além do capital. Nesse contexto a escola

não deve reproduzir conhecimentos que reforcem esses estímulos. Conforme

Bauman

Num mundo como este, o conhecimento é destinado a perseguir eternamente objetos sempre fugidos que, como se não bastasse, começam a se dissolver no momento em que são apreendidos.Então a paranóia é tamanha que o ato de descartar, se livrar do produto é maior do que o de obtê-los. E como os prêmios para quem faz a coisa certa tendem a se colocado cada dia num lugar diferente, os estímulos de reforço podem ser tão enganosos quanto

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tranquilizadores: transformam-se em armadilhas e serem evitados, pois podem instilar hábitos ou impulsos que, um segundo depois, se revelarão inúteis ou até daninhos. (BAUMAN, 2010, p. 45)

O comportamento de quem paga em dia é uma ameaça para esse modelo

consumista. Na atual configuração da política dos cartões de crédito, os bancos

credores não querem que os seus devedores paguem as dívidas, ao contrário,

oferecem mais cartões e empréstimos para saudarem os débitos antigos tornando-os

eternos devedores. E são justamente os juros cobrados mensalmente, que essas

instituições, conseguem transformar na principal fonte de lucros constantes. O cliente

que paga prontamente o dinheiro que tomou emprestado, a pessoa que recusa gastar

um dinheiro que ainda não ganhou, levado pela prudência ou pela honra hoje fora de

moda para pagar seus débitos no prazo estabelecido, é o pesadelo dos credores. Para

Bauman (2010, p.15-16) “[...] o devedor ideal é aquele que jamais paga integralmente

suas dívidas. Tais credores se recusam a fornecer cartões, sem incorrer em

pagamentos de encargos financeiros a quem quitam inteiramente suas dívidas”.

O cidadão que tem essa clareza política e desenvolve tais competências para

indignar e investigar a história e a raiz autoritária desse processo tem um

comportamento de enfrentamento, e não de passividade diante dessas provocações.

As quais não o afetam diretamente, ou de maneira tão danosa. Porém, entre os

jovens, isso parece hegemônico e merece atenção relevante. Conforme Bauman

(2010, p.18) “[...] fala se em 25 mil jovens em dificuldades financeiras todo ano, e só

estamos vendo a ponta do iceberg”. Portanto, essa sociedade de consumo, baseia se

na falência do ser humano e na projeção do capital.

Portanto, a eterna renegociação do crédito para saldar empréstimos antigos é

algo pensado. E nisso consiste o real sucesso dos credores, e o tormento dos

consumidores, que perdem a liberdade e vivem eternamente sob o jugo pesado de

uma sociedade que está culturalmente fadada a uma autoperpetuação de endividados

da qual os jovens são discípulos vorazes.

O que ficou alegremente e loucamente esquecido nessa ocasião é que a natureza do sofrimento humano é determinada pelo modo de vida dos homens. As raízes da dor da qual nos lamentamos hoje, assim como as raízes de todos os males sociais estão profundamente entranhados no modo como nos ensinam a viver: em nosso hábito, cultivado com cuidado e agora já bastante arraigado, de correr para os empréstimos cada vez que temo um problema a resolver ou uma dificuldade a superar. Como poucas drogas, viver a crédito cria dependência. (BAUMAN, 2010, p.24)

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A dependência de créditos e a insatisfação pessoal é o combustível do

processo consumista, alimentado pela mídia, subsidiado pelo capital e assimilado pela

massa. “Numa sociedade capitalista, o Estado tem, portanto, duas coisas a fazer:

subsidiar o capital, caso não tenha o dinheiro, e garantir a força produtiva do trabalho”

(BAUMAN, 2010, p.28). Vivemos numa sociedade pensada por alguém, que não leva

em consideração os interesses, valores e o trabalho de cada um, e sim os próprios

interesses. Então como esses bancos não quebram?

Se os devedores não tiveram condições pessoais de pagar os juros sobre a orgia consumista inspirada e amplificada pelos bancos talvez possam ser induzidos/obrigados fazê-lo por meio dos impostos que pagam ao Estado. (BAUMAN, 2010, p.26)

.

Portanto, não se preocupem, todos pagarão a conta aos credores, o Estado

garante isso, afinal o mesmo é o maior aliado do capital. Nesse contexto, a Educação

tem uma responsabilidade social relevante, a função de elencar a problemática e levar

no âmbito da discussão.

Uma educação que possibilitasse ao homem a discussão corajosa de sua problemática. De sua inserção nesta problemática. Que o advertisse dos perigos de seu tempo, para que consciente deles, ganhasse a força e a coragem de lutar, ao invés de ser levado e arrastado à perdição de seu próprio‘’eu’’, submetido as prescrições alheias. (FREIRE,1975, p.89-90)

A grande preocupação de Freire (1975) é alavancar uma educação para a

decisão, para a responsabilidade social. Para Freire (1975, p.89)

[...] uma educação para o desenvolvimento e para a democracia, entre nós haveria de ser a que oferecesse ao educando instrumentos com que resistisse aos poderes desenraisamento de que a civilização industrial a que nos filiamos está amplamente armada.

Cumpre assimilar que a finalidade da educação é a transformação do sujeito.

É a emancipação humana para exercitar uma vivência que contemple a plenitude do

ser, vivendo de forma autônoma, menos engessada, rompendo com a visão

padronizada enxergando e respeitando a si mesmo e comprometido com seu próprio

eu.

Porque a insatisfação constante é a chave desse processo consumista. Na sociedade atual, vive-se uma desconstrução do cidadão para surgir o consumidor. A glorificação do consumo se acompanha da diminuição [...] de outras sensibilidades e no

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aniquilamento da personalidade. A individualidade, algo inerente do cidadão, é substituída pelo individualismo, que segrega. (SANTOS,1987, p.35).

A moda uniformiza, inclui todos num mesmo grupo, criando a falsa ideia de

igualdade, característica da massificação. “Um segundo caráter da moda é sua

uniformidade: cada qual deve tornar se semelhante aos outros”. É preciso fazer como

todo mundo; não devemos nos fazer notar. “[...] Fazer se notar, não fazer como todo

mundo, é excluir do meio social ao qual se pertence. Ser um ‘’original” é ser uma

pessoa isolada’’ (SANTOS,1987, p.36).

Para tanto interessa-nos uma educação transformadora, que rompe de algum

modo com a visão padronizada, que nivela, massifica e aliena. Que aniquila o cidadão

e transforma a mero consumidor. Uma educação, que passe as novas gerações, os

conhecimentos das gerações passadas, costumes tradições, valores culturais,

fundamentais para entender a sociedade que estão inseridos. Que leve os educandos

à reflexão, a romper com essa cegueira generalizada, que se instaurou

propositadamente sobre todos. Um conhecimento capaz de fortalecer e minimizar

esse valor exagerado atribuído as coisas e cada vez menos às pessoas.

3. A IMPLEMENTAÇÃO DO PROJETO NA ESCOLA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

O projeto de intervenção pedagógica foi apresentado no primeiro momento na

Semana Pedagógica aos professores e equipe pedagógica, do Colégio Estadual

Bento Mossurunga, em que houve um acolhimento em relação ao projeto, e todos se

comprometeram a colaborar para o desenvolvimento do mesmo.

A implementação do projeto teve início com a apresentação do tema aos

alunos: Consumismo, publicidade e alienação: a influência da mídia no

comportamento dos educandos, aplicado aos alunos do 3º ano do Ensino Médio. No

primeiro contato com os alunos, o tema foi apresentado de forma descontraída e até

um pouco lúdica, e foram instigados através de uma roda de conversa de forma franca

e informal, para que se sentissem envolvidos no processo. Foi aplicado um

questionamento escrito, com o intuito de levantar dados referentes ao acesso e

utilização dos meios midiáticos pelos estudantes bem como os conhecimentos que

possuem sobre o tema ‘’Consumismo, alienação e publicidade: a influência da mídia

no comportamento dos educandos’’.

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Houve boa receptividade por parte dos mesmos. O assunto em questão dialoga

com os pressupostos da Geografia, contemplando os conteúdos: capitalismo,

globalização, meio ambiente, consumismo, sendo assim culminou, em um prazeroso

e proveitoso trabalho. Em um dos encontros foram dispostos vários trechos pequenos

que envolveram o projeto para que os alunos aos poucos fossem se familiarizando

com o tema. Com objetivo de interpretar e desenvolver a criticidade que o tema na

sua complexidade exige. A utilização do livro didático o conteúdo Globalização,

Consumo e felicidade, Esgotamento de recursos naturais foi útil na execução do tema.

Foram criados pequenos textos por parte dos alunos e apresentados em forma de

debate socializando com o grupo.

A fase inicial do projeto foi fundamental para elencar a problemática que o tema

envolve. Com metodologias que proporcionaram a oportunidade de questionamento

e reflexão aos educandos. Nessa fase do projeto, as discussões, leituras e a

interpretação foram de extrema valia na apropriação da temática e no despertar do

interesse pelo tema. Foram fundamentais as diversas metodologias aplicadas para

contemplar as diferentes habilidades de cada educando na apropriação dos

conteúdos.

A observação e o uso de imagens, um dos pontos altos da implementação,

também cabem destacar. Foram analisadas as imagens e propagandas, a evolução

no decorrer do tempo, e a criatividade no poder de sedução, interpretando o apelo

implícito nas mesmas ao consumo. Formaram-se dois grupos para análise de duas

imagens. Um grupo analisou as imagens e as simbologias das propagandas e

publicidade instigados a pesquisarem novas fontes para ter diversos parâmetros,

sobre o assunto. Outro grupo levantou questionamentos e apresentou os males desse

modelo de publicidade exacerbado que aliena e condiciona os jovens. O resultado das

atividades foi em forma de textos.

A partir de uma propaganda de jornal impresso foi solicitado aos estudantes

que, em grupos, discutissem e retirassem todas as informações possíveis em relação

à leitura do texto e, principalmente, das imagens, discutindo sobre as mensagens

ocultas que a publicidade utiliza para incentivar o consumo. Um educando de cada

grupo expôs o que foi solicitado e foi feita as intervenções e observações necessárias.

Após as discussões, cada grupo redigiu um texto expondo todos os pontos

observados e relevantes da discussão.

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O documentário, ”A história das coisas”: analisando como se dá a sociedade

de consumo; estratégias de mercado (marketing); consumo e a relação com a

felicidade, foi também relevante na ilustração das discussões. A História das Coisas

(The Story of Stuff), é um Documentário de 20 minutos que mostra como colaboramos

diariamente para a degradação do meio ambiente. Mostra passo a passo desde a

compra de um produto, da manipulação da propaganda até o consumo final. É um

alerta para a construção urgente de uma sociedade baseada num consumo

sustentável. Após o documentário, foi discutido com os estudantes os temas abaixo

e, em grupos, foi solicitado aos educandos que elaborassem um texto propondo

alternativas para o consumo desenfreado e consequente esgotamento dos recursos

naturais. Os temas abordados foram: -Sociedade de consumo; -Estratégias de

mercado (marketing); -Consumo e felicidade; -Esgotamento dos recursos naturais.

As metodologias adotadas e criadas especificamente para esse trabalho

favoreceram nesta etapa do projeto, maior aprofundamento e compreensão do

mesmo. Foi possível observar o quanto é relevante trazer essa problemática para o

âmbito escolar. Os meios midiáticos trabalham para que a sua produção de imagens

chegue ao indivíduo de maneira que legitime e afirme não só o consumo, mas também

os modos de sociabilidade, uma espécie de orientação sobre como viver e se

relacionar em sociedade. Para isso, a mídia ensina o que, onde, quando e como

consumir. Ensina também como devemos ser. Por meio de suas representações, o

indivíduo pode se reconhecer como protagonista das imagens, espelhando-se nos

modelos apresentados, fazendo da imagem midiática algo a ser copiado. Ficou

explícito que, se essa problemática não for debatida no âmbito escolar, os alunos

perderão a oportunidade talvez a única de suas vidas, de fazer essa análise, pois a

sociedade não fará.

Segundo Nunes (2007) os meios de comunicação ocupam grande parte do

tempo físico e mental dos jovens, disputando lugares na socialização. Pelo trabalho

de campo realizado em um meio de comunicação local, jornal de grande circulação

no meio, inclusive online, foi possível entender o processo de produção, circulação e

influência local desse meio de comunicação. Na visita, os estudantes foram

incentivados a observar a produção de notícias, das propagandas, as tecnologias

utilizadas nessa produção, os diversos ambientes, os profissionais. Posteriormente foi

discutido com os educandos suas impressões, curiosidades. Nas estratégias, que

envolveram o trabalho de campo foi possível perceber o quanto é importante a

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fundamentação teórica, e o aprofundamento em sala de aula. A aula de campo é um

seguimento amplo do conhecimento. Porém as dificuldades são sempre iguais; para

tanto houve a necessidade de preparação pedagógica e prática para que o objetivo

pudesse ser alcançado.

As metodologias de cunho prático, tiveram papel de conectar os conteúdos

teóricos à realidade vivida. Como foi o caso da visitação ao supermercado,

observando a disposição dos produtos pela loja. O supermercado visitado é de grande

expressão comercial, e favoreceu o objetivo de analisar como é feito a disposição dos

produtos no interior da loja para atrair a atenção dos clientes, para determinados

produtos. Foram analisadas as embalagens e as estratégias de marketing, a origem

das empresas fornecedoras dos produtos e, obviamente, o preço final dos produtos.

Comparando, preço dos produtos de época, com outros produtos, entendendo essa

dinâmica de diferenças no valor final. Identificando em produtos de expressiva

aceitação e consumo, as empresas que fabricam e comercializam tais produtos, se é

nacional, ou transnacional. Assim, foi possível entender na prática como o capitalismo

precisa da publicidade para promover o consumismo. Para tanto quanto mais

fundamentado, aprofundado e trabalhado for o tema em sala, melhor será o

entendimento e o resultado por parte dos educandos.

No Mercado da cidadania, uma estratégia para entender a circulação, de

mercadoria no sistema capitalista, foi criado um produto fictício com materiais

recicláveis e criado uma propaganda para apresentá-lo ao professor que assumiu a

posição de consumidor. Foram utilizadas as mais variadas formas de marketing

empregadas pela mídia para conquistar o consumidor, tentando convencê-lo a

consumir. Como recurso foram usados cartazes, vídeos e slides.

Na finalização do projeto, foi usado como encaminhamento metodológico, o

seminário com apresentação e socialização do conhecimento por parte dos

educandos à escola. Tal tema não se encerra em um determinado período, é amplo

e deve ser problematizada como instrumento pedagógico.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS: FORMANDO CIDADÃOS CONSCIENTES

A frase ‘’tempo é dinheiro’’, dá uma ideia da importância que o dinheiro assume

em nossa sociedade: com ele podemos comprar alimentos, roupas, pagar taxas de

água, luz, impostos e outros serviços que necessitamos. Em nossa sociedade, tudo é

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vendido, até os serviços públicos que aparecem como gratuitos, são pagos em forma

de impostos. Dessa maneira, tudo tem que ser comprado, portanto, precisamos de

dinheiro. Na sociedade em que vivemos, valorizam-se as pessoas pelo que podem

comprar, pelos objetos que possuem e não, necessariamente, pelo que fazem, pelo

seu trabalho e pelo que são. Isso faz com que haja uma formação de indivíduos

consumidores; consumir significa demonstrar certo poder.

Dessa forma, as pessoas passam a ser consumidoras e quando não têm o

dinheiro, se endividam porque o importante é consumir e demonstrar para outros o

poder do consumo. A cultura, nos dias de hoje, é pautada de oferta, vive-se de

sedução, da criação de novas necessidades, desejos e não de responsabilidades. O

marketing induz fortemente ao consumismo que atinge a parte frágil das pessoas,

assim, esse trabalho se justifica por valorizar a análise crítica sobre as propagandas

midiáticas como meio de alienação nessa sociedade “moderna”. O marketing,

alienado ao capitalismo, é atualmente uma das grandes armadilhas das crianças,

adolescentes e jovens induzindo-os ao consumismo.

O ensino não pode ser alienado e superficial. Dessa forma, a escola cumpre

um importante papel de inovação na maneira de ensinar, para que o conhecimento

seja transformador, desmistificando e minimizando esse valor tão forte que são dadas

às “coisas” e cada vez menos às pessoas. A nossa contribuição é no sentido de abrir

o debate sobre a importância dessa temática, pois é preciso refletir sobre o modo de

vida nessa sociedade capitalista e de consumo. Assim, com o término da pesquisa,

concluímos que a formação de cidadãos conscientes, com responsabilidade, passa

pelo crivo da educação que ensine a filtrar o que realmente precisa consumir, daquilo

é supérfluo. Foi o que buscamos desenvolver de forma contínua, permanente,

formativa e participativa, em que os educandos foram valorizados em sua

individualidade, capacidade e potencialidades.

REFERÊNCIAS

NOVAES, Carlos Eduardo. Capitalismo para principiantes. 2 ed. São Paulo: Ática,1983. ZUBEN, Reginaldo Von. Educação e ética planetária no contexto da globalização. Dissertação (Mestrado em Educação). Londrina: UEL, 2010. BAUMAN, Z Capitalismo parasitário: e outros temas contemporâneos. Trad.Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 5.ed.Rio de Janeiro: Paz e Terra,1975.

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PIETROCOLLA, Luci Gati. O que todo cidadão precisa saber sobre sociedade de consumo. 2. ed. São Paulo: Global, 1989. SANTOS, Milton. Do cidadão imperfeito ao consumidor mais-que-perfeito. In: ______. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987. p. 33-80. (Coleção Espaços)