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OS ANIMAIS EM NOSSA VIDA: Família, comunidade e ambientes terapêuticos

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OS ANIMAIS EM NOSSA VIDA:Família, comunidade e ambientes terapêuticos

P A P I R U S E D I T O R A

OS ANIMAIS EM NOSSA VIDA:Família, comunidade e ambientes terapêuticos

PEGGY McCARDLE, SANDRA McCUNE, JAMES A. GRIFFIN, LAYLA ESPOSITO

E LISA S. FREUND (ORGS.)

Tradução

Mônica Saddy Martins

© 2011, Paul H. Brookes Publishing Co., Inc.Título da edição original: Animals in our lives: Human-animal

interaction in family, community, and therapeutic settingsPublicado por Paul H. Brookes Publishing Co., Inc.

Tradução: Mônica Saddy MartinsCapa: Fernando CornacchiaFoto de capa: Rennato Testa

Coordenação: Beatriz MarchesiniDiagramação: DPG Editora

Copidesque: Julio Cesar Camillo Dias FilhoRevisão: Ademar Lopes Jr., Ana Carolina Freitas, Bruna Fernanda Abreu e Isabel Petronilha Costa

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Os animais em nossa vida: Família, comunidade e ambientes terapêuticos/(orgs.) Peggy McCardle... [et al.]; tradução Mônica Saddy Martins. – Campinas, SP: Papirus, 2013. – (Série Educação Especial)

Título original: Animals in our lives: Human-animal interaction in family, community, and therapeutic settings.Vários autores.Outros organizadores: Sandra McCune, James A. Griffin, Layla Esposito e Lisa S. Freund.Bibliografia.ISBN 978-85-308-1045-0

1. Animais – Uso terapêutico 2. Humanos e animais – Relacionamento 3. Interação ser humano-animal I. McCardle, Peggy. II. McCune, Sandra. III Griffin, James A. IV Esposito, Layla. V. Freund, Lisa S. VI. Série.

13-06303 CDD-615.8515

Índice para catálogo sistemático:

1. Animais: Uso terapêutico 615.8515

Exceto no caso de citações, a grafia deste livro está atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa adotado no Brasil a partir de 2009.

DIREITOS RESERVADOS PARA A LÍNGUA PORTUGUESA: © M.R. Cornacchia Livraria e Editora Ltda. – Papirus Editora R. Dr. Gabriel Penteado, 253 – CEP 13041-305 – Vila João Jorge Fone/fax: (19) 3272-4500 – Campinas – São Paulo – Brasil E-mail: [email protected] – www.papirus.com.br

Proibida a reprodução total ou parcial da obra de acordo com a lei 9.610/98. Editora afiliada à Associação Brasileira dos Direitos Reprográficos (ABDR).

Este livro é dedicado a Laraine Freund (27 de julho de 1990-1o de janeiro de 2010)

Dedicamos este livro a Laraine Freund. Essa moça de 19 anos, ativa, que gostava de se divertir e de trabalhar, voluntariou-se no Departamento de Desenvolvimento e Comportamento Infantil do Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development durante o verão de 2009, quando o departamento estava particularmente assoberbado de trabalho, mas, em virtude de contenções financeiras, não podia contratar estagiários. Laraine chegou e pôs a mão na massa; todos no departamento não só valorizavam muito o seu trabalho árduo e sua dedicação, como também se afeiçoaram muito a ela. Laraine sabia que a equipe estava trabalhando em livros sobre a ciência da interação ser humano-animal (IHA) e até chegou a fazer a revisão de algumas referências bibliográficas dos capítulos. A mãe dela é funcionária do departamento, e acabamos sabendo que mãe e filha adoravam cavalos e haviam construído uma relação especial com eles e entre si ao compartilhar essa atividade. Queríamos ter feito uma festa de despedida para Laraine quando ela terminou o trabalho conosco, mas não tivemos essa chance. Laraine, que havia passado por um transplante de coração quando era muito pequena, começou a ter problemas de saúde. Foi hospitalizada e sofreu de uma enfermidade longa, durante a qual mostrou força e bom humor incríveis. A mãe dela criou um site para que o pessoal do departamento, os parceiros da Mars e outras pessoas pudessem acompanhar a recuperação. Depois de uma batalha corajosa, Laraine faleceu, no dia de ano-novo, em 2010. Os cavalos e os animais de estimação da família foram parte importante da vida de Laraine, e achamos que ela deveria ser homenageada com a dedicatória deste livro, que procura compreender cientificamente o papel benéfico que os animais podem ter em nossa vida.

AGRADECIMENTOS ................................................................... 11

PRÓLOGO ............................................................................. 13

INTRODUÇÃO......................................................................... 17 Layla Esposito, Peggy McCardle, Valerie Maholmes,

Sandra McCune e James A. Griffin

PARTE I – OS ANIMAIS EM NOSSA VIDA ............................................ 23

Buddy: O melhor amigo de uma menina ................................... 25

1. AS PERSPECTIVAS HISTÓRICAS E CULTURAIS DAS INTERAÇÕES DOS SERES HUMANOS COM ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO ....................... 27

James A. Serpell

2. OS BENEFÍCIOS DAS INTERAÇÕES DOS SERES HUMANOS COM OS ANIMAIS PARA A COMUNIDADE: EFEITO DOMINÓ .................. 41

Lisa Jane Wood

3. A SAÚDE E O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA E OS ANIMAIS ............. 65 Alan M. Beck

Samantha e o casal feliz ...................................................... 77

4. AS IMPLICAÇÕES DOS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO NA SAÚDE PÚBLICA: NOSSOS ANIMAIS E OS ANIMAIS DOS OUTROS ................... 79

Lynne Haverkos, Karyl J. Hurley, Sandra McCune e Peggy McCardle

D Sumário

5. PAIS ETOLOGISTAS AMADORES: REDUÇÃO DE RISCO NAS INTERAÇÕES DAS CRIANÇAS COM OS CÃES ........................... 109

Patricia B. McConnell

PARTE II – OS ANIMAIS E A INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA ...................... 133

Sal, o cão terapeuta ..........................................................136

6. SER HUMANO E ANIMAL EM INTERAÇÃO TERAPÊUTICA: VISÃO GERAL ................................................................... 137

Peggy McCardle, Sandra McCune, F. Ellen Netting, Ann Berger e Valerie Maholmes

7. OS ANIMAIS EM SALA DE AULA ................................................ 149 Nancy R. Gee

8. INTERVENÇÕES ASSISTIDAS POR ANIMAIS NA PSIQUIATRIA INFANTIL ......................................................... 179

Anke Prothmann e Aubrey H. Fine

São Tonto ....................................................................... 202

9. EQUOTERAPIA ASSISTIDA E ATIVIDADES EQUESTRES PARA INDIVÍDUOS COM DEFICIÊNCIAS FÍSICAS E DO DESENVOLVIMENTO: VISÃO GERAL DE RESULTADOS CIENTÍFICOS E TIPOS DE PESQUISA EM CURSO ............................. 205

Lisa S. Freund, Octavia J. Brown e Preston R. Buff

10. AS FUNÇÕES POSSÍVEIS DOS ANIMAIS NO AUXÍLIO A INDIVÍDUOS COM AUTISMO ................................................. 225

Temple Grandin

PARTE III – PESQUISA FUTURA ..................................................... 241

O pós-doutorado de Leon na área de interação de seres humanos com animais ............................................. 243

11. A PESQUISA ENCONTRA A PRÁTICA: QUESTÕES PARA O TREINAMENTO DE BASE CIENTÍFICA NO CAMPO DA INTERAÇÃO DOS SERES HUMANOS COM OS ANIMAIS ...................... 245

Kate Trujillo, Philip Tedeschi e James Herbert Williams

12. OS DESAFIOS NA PESQUISA SOBRE A INTERAÇÃO SER HUMANO-ANIMAL: QUESTÕES METODOLÓGICAS E OBSTÁCULOS À SUSTENTABILIDADE ....................................... 265

Roland J. Thorpe Jr., James A. Serpell e Stephen J. Suomi

13. A PESQUISA CIENTÍFICA SOBRE A INTERAÇÃO SER HUMANO-ANIMAL: QUADRO DE REFERÊNCIA PARA ESTUDOS FUTUROS ............................................................ 275

James A. Griffin, Sandra McCune, Valerie Maholmes e Karyl J. Hurley

ÍNDICE................................................................................ 287

SOBRE OS ORGANIZADORES ....................................................... 297

SOBRE OS COLABORADORES ...................................................... 299

Os animais em nossa vida 11

Grande parte deste livro está embasada em duas oficinas fundamentais. A primeira, “Indicações para a pesquisa em intervenção ser humano-animal: Intervenções no desenvolvimento infantil, na saúde e na terapia”, foi realizada em Rockville, Maryland, no período de 30 de setembro a 2 de outubro de 2008. A segunda, “Indicações para a pesquisa em intervenção ser humano-animal II: O papel dos animais de estimação no desenvolvimento socioemocional e comportamental das crianças”, foi realizada de 3 a 5 de agosto de 2009, em Waltham-on-the-Wolds, no Reino Unido. Ambas foram patrocinadas pela parceria público-privada entre o Waltham Centre for Pet Nutrition, uma divisão da Mars, Inc., e o Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development (NICHD), formada para promover e financiar pesquisas sobre a interação ser humano-animal (IHA). Os organizadores agradecem aos dois parceiros pelo apoio às oficinas e por tornar possível a publicação deste livro.

O Waltham Centre for Pet Nutrition no Reino Unido é o núcleo da Mars, Inc. para as atividades mundiais de pesquisa sobre nutrição e saúde animal que fundamentam a produção de várias marcas de alimentos para animais e também contribuem para a ciência de um modo mais geral. Os cientistas do centro foram pioneiros em avanços importantes na nutrição animal e compartilharam seus conhecimentos em mais de 1.500 publicações de pesquisa. As instalações do centro no Reino Unido integram, de modo singular, espaço administrativo e de pesquisa para animais e pessoas. Afiliada ao centro, existe a Waltham Foundation, criada em 2001, que se dedica à pesquisa científica sobre nutrição e longevidade saudável de animais de companhia. Essa fundação tem patrocinado pesquisas em mais de 20 países, oferecendo financiamento para pesquisas que melhorem a saúde e o bem-estar dos animais de companhia. O Waltham-Mars vem financiando várias conferências e encontros, assim como estudos que investigam vários aspectos da IHA. Em 2008, a organização iniciou a atual parceria com o NICHD.

D Agradecimentos

12 Papirus Editora

O NICHD foi criado para investigar os aspectos amplos do desenvolvimento humano como meio de compreender as deficiências de desenvolvimento, incluindo a deficiência intelectual, e os problemas de desenvolvimento que ocorrem durante a gestação. Hoje, o NICHD realiza e patrocina pesquisas em todos os estágios do desenvolvimento humano, da concepção à idade adulta, a fim de compreender melhor a saúde de crianças, adultos, famílias e comunidades. A missão do NICHD é assegurar que toda pessoa nasça saudável e desejada; que as mulheres não sofram efeitos prejudiciais nos processos reprodutivos; que todas as crianças tenham a oportunidade de desenvolver todo o seu potencial para uma vida saudável e produtiva, livre de doenças ou deficiências; e que todas as pessoas alcancem saúde, produtividade, independência e bem-estar por meio de uma reabilitação ideal.

Também agradecemos às várias pessoas que contribuíram com esforço considerável para tornar este livro uma realidade. Primeiro, pelo empenho em formar a parceria e sugerir as oficinas nas quais este livro está parcialmente baseado, agradecemos a John Lunde e Megan Sibole da Mars, Inc. Por fazer com que as oficinas acontecessem da forma eficaz como aconteceram, agradecemos a Tiffany Ray, Wanda Hawkes e Fuambai Ahmadu do NICHD e a Sarah Wright do Waltham Centre. Por fim, por nos auxiliar pacientemente na finalização do prospecto do livro e por nos orientar durante o processo de produção, um agradecimento especial a Sarah Shepke, nossa editora de aquisições, cujo entusiasmo pelo tema da obra foi crucial para esta publicação.

Os animais em nossa vida 13

Este livro nasceu das atividades de uma parceria público-privada, iniciada pela Mars, Inc., com o Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development (NICHD). Essa parceria entre o NICHD e o Waltham Centre for Pet Nutrition, divisão da Mars, Inc., fundamenta-se no valor que esses dois organismos atribuem à saúde, ao desenvolvimento e ao bem-estar de crianças e animais e em sua preocupação com esses temas. Essa parceria tem grande interesse na ciência que possa influenciar o modo como as interações entre pessoas (principalmente crianças e jovens) e animais afetam a saúde e o desenvolvimento dos seres humanos. Tanto o Waltham Centre quanto o NICHD têm grande interesse nessa área, em geral chamada de interação ser humano-animal (IHA).

A Mars, Inc. é uma empresa privada que há muito tempo tem em sua cultura corporativa um respeito profundo pela pesquisa básica avaliada por cientistas da mesma área. Esse grande respeito pelo valor da ciência possibilitou à empresa

* A edição original desta obra, em inglês, pode ser reproduzida no todo ou em parte para uso oficial do governo dos Estados Unidos ou por qualquer agência autorizada dele. O material enumerado a seguir foi escrito por servidores do governo norte-americano, dentro do escopo de suas funções oficiais e, como tal, deve permanecer em domínio público: Prólogo, Introdução, Capítulo 1, Capítulo 4, Capítulo 6, Capítulo 9 e Capítulo 13.

As opiniões expressas neste livro são as dos autores e não necessariamente representam as do National Institutes of Health, do Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development, do Department of Health and Human Services dos Estados Unidos ou da Mars, Inc.

As pessoas descritas neste livro são compósitos ou pessoas reais cuja situação foi mascarada e baseada nas experiências dos autores. Em todos os casos, nomes e detalhes de identificação foram alterados para proteger a privacidade ou usados com permissão.

D Prólogo*

14 Papirus Editora

patrocinar pacientemente a pesquisa de longo prazo em temas relacionados à sua atividade principal e aos ingredientes fundamentais de sua produção. Como maior empresa do mundo no cuidado de animais de estimação, a Mars procurou desenvolver o conhecimento sobre esses animais e sua guarda, em todos os aspectos, no centro de pesquisa e treinamento do Reino Unido, o Waltham Centre for Pet Nutrition. Desde a década de 1980, por meio de financiamentos e estudos conjuntos, o Waltham tem sido pioneiro no estudo do fenômeno da IHA. Com o avanço deste e de outros trabalhos, os profissionais da área começaram a demandar mais pesquisas, estudos mais aprofundados e mais rigor metodológico. Nesse ponto, a equipe do Waltham procurou um parceiro cujo “negócio” fosse o financiamento de pesquisas e que estivesse interessado na saúde e no bem-estar infantil: o NICHD.

O NICHD, criado pelo Congresso americano em 1962, é um dos 27 institutos e centros que compõem os National Institutes of Health, a maior agência financiadora de pesquisa biomédica e comportamental do mundo. O NICHD realiza e apoia pesquisas sobre temas relacionados à saúde e ao bem-estar de crianças, adultos, famílias e populações. Alguns desses temas são: redução da mortalidade infantil; melhoria da saúde de crianças, pais e famílias; aprendizado sobre crescimento e desenvolvimento; exame, prevenção e tratamento de problemas como deficiências intelectuais, de aprendizado e de desenvolvimento; compreensão do desenvolvimento típico e promoção do desenvolvimento saudável; e melhoria do bem-estar das pessoas durante toda a vida por meio da melhor pesquisa em reabilitação.

A convite do pessoal da Mars, uma equipe de investigação conjunta foi formada no início de 2008. De comum acordo, decidiu-se que era essencial um primeiro exercício para “avaliar a situação” da pesquisa atual sobre a IHA. Foi formada uma parceria público-privada entre o Waltham Centre e o NICHD, baseada no compromisso com essa atividade. Depois de um levantamento bibliográfico preliminar no campo da IHA e de um reexame do relatório de consenso da conferência de 1987 dos National Institutes of Health, sobre os benefícios dos animais de estimação para a saúde, o grupo propôs uma oficina para elaborar a pauta para a pesquisa em IHA. Essa oficina, realizada em Rockville, Maryland, em outubro de 2008, reuniu pesquisadores que já estavam trabalhando na área e muitos que não estavam, vindos de diversas disciplinas, incluindo medicina veterinária, pediatria, enfermagem, gerontologia, comportamento animal, psicologia do desenvolvimento e outras. Uma segunda oficina foi realizada em agosto de 2009 no Waltham Centre em Waltham-on-the-Wolds, no Reino Unido. Essas duas oficinas resultaram não só numa pauta de pesquisa rigorosa e ambiciosa,

Os animais em nossa vida 15

como também num forte desejo de informar as pessoas sobre o potencial desse campo de pesquisa. Um resultado importante das oficinas é este livro, que os colaboradores esperam que ajude a informar todos os que não conhecem a IHA e a fomentar um movimento no sentido de reunir comprovação científica que possa inspirar o uso terapêutico dos animais e que tenha potencial para constituir uma base de conhecimento para essa área do tratamento clínico. Por fim, claro, os colaboradores deste livro esperam que ele, de alguma forma, melhore a vida de crianças, jovens, famílias e animais de estimação ou de terapia, enquanto os seres humanos e os animais continuarem a interagir.

Os animais em nossa vida 17

Para muitas pessoas, as lembranças mais vívidas da infância estão relacionadas a um animal de estimação da família, incluindo a chegada de um novo cachorrinho ou gatinho, às aventuras (e desventuras) compartilhadas com ele, à troca de carinho e, frequentemente, à primeira experiência de perda e luto. Os animais de estimação fazem parte da cultura humana há milênios (Knight e Herzog 2009; Serpell 2008), e muitos donos de animais costumam atribuir muitos de seus pensamentos e de suas emoções humanas aos animais domésticos e silvestres, à medida que interagem com eles e observam seu comportamento. Em muitas comunidades, os animais de estimação se mudaram do quintal para a família, e a guarda desses animais só faz crescer (American Pet Products Association 2009).

A American Pet Products Association relatou, no levantamento nacional sobre donos de animais de estimação realizado em 2009-2010, que, dos 72 milhões de famílias que incluíam animais de estimação, 64% tinham cachorros, 53,5% tinham gatos e 5,5% tinham cavalos. Várias outras espécies também são criadas normalmente como animais de estimação, como peixes, répteis e roedores. As estatísticas atuais sugerem que talvez existam mais bichos de estimação do que crianças nos Estados Unidos e que é mais provável que uma criança cresça numa família com animal de estimação do que numa com pai (Melson 2004; ver também os Capítulos 4 e 11).

Os animais não só são frequentemente considerados parte da família nos lares em que residem como também continuam a prestar serviços às pessoas em papéis tradicionais (por exemplo, os cães-guias) e em situações mais inusitadas (por exemplo, os cães-vigias que conseguem perceber quando uma criança diabética adormecida está em risco de desequilíbrio químico e, assim, podem despertar a criança e/ou os pais). Os animais são encontrados nas escolas e nos ambientes terapêuticos. Com frequência, os professores incluem os animais nas lições e nas

D Introdução

Layla Esposito Peggy McCardle

Valerie Maholmes Sandra McCune

James A. Griffin

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atividades de sala de aula, e os psicoterapeutas fazem uso dos animais para facilitar a interação e a conversação com os pacientes.

Dados esses vários modos de incluir animais no cotidiano de crianças e famílias, é imperativo que o campo da interação ser humano-animal (IHA) seja bem estudado e que o envolvimento dos animais nas terapias seja cientificamente fundamentado. Embora o interesse pela IHA exista há décadas, não há uma quantidade proporcional de pesquisa sistemática. Histórias e estudos limitados indicam que a IHA tem potencial para proporcionar benefícios à saúde e ao desenvolvimento humanos; no entanto, são necessários mais estudos para comprovar esses benefícios.

Em 1987, o National Institutes of Health (NIH) realizou uma conferência de consenso para examinar a pesquisa existente sobre os benefícios dos animais de estimação na saúde. Especialistas de várias disciplinas revisaram a pesquisa em cinco áreas temáticas, a fim de identificar os conceitos que necessitavam de base científica mais sólida. As áreas eram: o papel dos animais de estimação no desenvolvimento infantil, o papel dos animais de estimação na saúde cardiovascular, a correlação da saúde dos idosos com a guarda de animais de estimação, o papel dos animais de estimação nas situações sociais e terapêuticas e a segurança e os riscos das relações entre pessoas e animais de estimação.

Os especialistas concordaram que conclusões definitivas sobre os possíveis benefícios dos animais de companhia exigiriam amostras muito maiores e projetos experimentais mais rigorosos do que os existentes nos estudos realizados até então. Os estudos revisados pela equipe de especialistas sugeriam que algumas crianças poderiam se beneficiar dos animais de estimação, que facilitariam relações estáveis das crianças com seus pares e com os adultos, todavia, esses estudos eram limitados por amostras pequenas e por amostras desproporcionais nas classes média e alta. A equipe recomendou que fossem realizados estudos longitudinais prospectivos que atravessassem limites raciais e socioeconômicos, com o objetivo de determinar as consequências duradouras da guarda de um animal de estimação e identificar populações específicas de crianças, com ou sem animais de estimação, em situação de risco para problemas no desenvolvimento social, emocional e cognitivo, além de reconhecer condições e experiências que pudessem levar as crianças a esse risco.

O conjunto de pesquisas sobre a IHA amadureceu desde o início dos anos 1970, passando de estudos de observação e histórias individuais para a produção científica avaliada por outros cientistas. Embora muitos estudos usem o método

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científico, ainda é difícil tirar deles conclusões definitivas. Como resultado do fato de esses trabalhos frequentemente usarem amostras pequenas, não terem força estatística nem controle adequado, o potencial benéfico da IHA na saúde ainda precisa ser conhecido em sua totalidade. Esse campo de estudos é muito promissor e importante na vida das pessoas, e o foco na qualidade é vital para assegurar que o trabalho teórico possa ser aplicado com o melhor resultado.

Em 2008, o National Institute of Child Health and Human Development (NICHD) e o Waltham Centre for Pet Nutrition, divisão da Mars, Inc., copatrocinaram uma série de encontros que reuniram os pesquisadores e os profissionais clínicos que trabalhavam com comportamento animal ou saúde e desenvolvimento infantil com aqueles que estavam estudando ou aplicando clinicamente os princípios da IHA. Resultado desses encontros, este livro descreve os lados humano e animal da IHA, apresenta a ciência já produzida e trata da necessidade de uma prática embasada em pesquisa científica num campo que cresce rapidamente.

Neste livro, a IHA se refere às relações mútuas e dinâmicas entre pessoas e animais e às maneiras como essas interações podem afetar a saúde física e psicológica e o bem-estar. O conceito também é chamado de vínculo ser humano-animal ou vínculo ser humano-animal de companhia. No campo da IHA, diversos grupos e subcampos usam diferentes terminologias.

A terapia assistida por animais (TAA) descreve a inclusão intencional de um animal num plano de tratamento para facilitar a cura e a recuperação de pacientes com doenças agudas ou crônicas. A TAA é voltada para objetivos, baseada no plano de tratamento personalizado do indivíduo, e deve ser conduzida por um profissional treinado e avaliada periodicamente para que o progresso seja monitorado. A TAA é usada, com frequência, para enfatizar uma diversidade de outros tipos de tratamento, mais convencionais, como terapia ocupacional, fonoaudiologia, reabilitação física e até psicoterapia. Os resultados esperados da TAA podem incluir melhorias na cognição, na regulação de emoção ou afeto, na competência social ou nas habilidades físicas. Já as atividades assistidas por animais (AAA) envolvem animais em situação recreativa ou educativa, não têm objetivos específicos de tratamento e podem ser realizadas sem a condução de um profissional. Essas atividades são menos formais e estruturadas do que a TAA e, caracteristicamente, não têm coleta de dados sobre o impacto da interação (Delta Society 2009). Juntas, TAA e AAA compõem a intervenção assistida por animais (IAA). A IAA pode ser muito importante na orientação e na intervenção na vida de crianças e jovens, mas muitas pessoas não a conhecem e mesmo quem a conhece talvez não veja a necessidade de pesquisa ou

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de uma base de comprovação científica para essas práticas. Este livro procura tratar dessas lacunas no conhecimento.

Aqui adotamos uma perspectiva multidisciplinar e formamos um grupo internacional de autores, com psicólogos, psiquiatras, enfermeiros e educadores que estudam e/ou trabalham com desenvolvimento infantil e/ou IAA; psicólogos, etologistas e veterinários que estudam o comportamento animal; e cientistas sociais e pesquisadores de saúde pública que estudam os impactos populacionais dos animais na saúde e no comportamento humanos. Nós, como pesquisadores, esperamos que a apresentação do material num único volume de dados coletados em múltiplas disciplinas, com diferentes metodologias de pesquisa (por exemplo, levantamentos, estudos experimentais) e provenientes de vários países alcance dois objetivos: 1) fornecer informações para clínicos, professores e público sobre a ciência por trás da IHA e o valor que ela pode ter para as crianças quando adequadamente compreendida e orientada; e 2) fornecer uma base para aspectos que os pesquisadores queiram incluir em seus estudos. Por exemplo, eles poderiam incluir questões sobre a guarda de animais de estimação e observações sobre a interação de crianças com animais ou exclusivamente de seres humanos com seres humanos. Poderiam também enfocar metodologias experimentais para avaliar a IAA que já se mostrou benéfica para crianças com deficiências, doenças agudas ou crônicas ou dificuldades sociais ou emocionais.

Os colaboradores deste livro apresentam resultados de pesquisa que podem conformar a base de comprovação científica para a prática da inclusão de animais em terapias, com o objetivo de melhorar a saúde e o desenvolvimento infantil. Também fornecem indicações para as pesquisas futuras, necessárias para continuar a construir essa base de comprovação, incluindo o trabalho fundamental de conduzir esse campo a uma compreensão mais profunda sobre a natureza da IHA e a experimentos clínicos sobre o uso da IHA em crianças. A Parte 1 define o contexto do livro, tratando do papel que os animais desempenham na vida dos seres humanos e no desenvolvimento infantil. A Parte 2 trata da inclusão de animais em terapias humanas. Os terapeutas observaram que os animais parecem exercer funções facilitadoras e, como mencionamos, já são incluídos, com frequência, em vários ambientes terapêuticos. Os capítulos da Parte 2 examinam algumas dessas situações e interações e a pesquisa que tem sido feita para investigá-las. A terceira e última parte do livro discute por que é importante para a pesquisa em IHA desenvolver uma base de comprovação científica que demonstre sua efetividade tanto nas práticas clínicas quanto no aconselhamento de pais e professores a respeito da promoção de interações saudáveis de crianças com

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animais. Os capítulos apresentam abordagens, ilustradas com dados, do modo como programas existentes podem e devem ser avaliados e como podem servir de fonte para pesquisadores e de informação para profissionais clínicos.

De modo geral, esperamos que este livro estimule o interesse pelo campo da IHA e resulte num número maior de estudos de alta qualidade, que examinem a essência das interações dos animais com as crianças e os jovens. Se forem realizados corretamente, é de se esperar que demonstrem a capacidade da IHA de melhorar a saúde humana e de sustentar e promover o desenvolvimento saudável. Esses estudos fornecerão a base científica para a inclusão terapêutica dos animais no tratamento e na reabilitação de seres humanos.

Referências bibliográficas

AMERICAN PET PRODUCTS ASSOCIATION (2009). 2009-2010 National Pet Owners Survey. Greenwich: APPA.

DELTA SOCIETY (2009). Animal assisted activities and animal assisted therapy. [Disponível na internet: http://www.deltasociety.org/Page.aspx?pid=317, acesso em 3/11/2009.]

KNIGHT, S. e HERZOG, H. (2009). “All creatures great and small: New perspectives on psychology and human-animal interaction”. Journal of Social Issues, v. 65, n. 3, pp. 451-461.

KNIGHT, S. e HERZOG, H. (orgs.) (2009). “New perspectives on human-animal interactions: Theory, policy, and research”. Journal of Social Issues, v. 65, n. 3, pp. 451-633.

MELSON, G. (2004). Why the wild things are: Animals in the lives of children. Cambridge: Harvard University Press.

NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH (1987). The health benefits of pets. [Disponível na internet: http://consensus.nih.gov/1987/1987HealthBenefitsPetsta003html.htm, acesso em 7/12/2009.]

SERPELL, J. (2008). In the company of animals: A study of human-animal relationships. Cambridge: Cambridge University Press.

Os animais em nossa vida 23

D Os animais em nossa vida

A fotografia de uma criança brincando derrete o coração da maioria das pessoas. Filhotes de cães e gatos provocam reações emocionais semelhantes, como demonstra a propaganda moderna. Os seres humanos atribuem muitas emoções aos animais, chegando mesmo a considerá-los membros da família. O dinheiro gasto com cuidados veterinários, comida especial e brinquedos denotam o carinho que sentem por seus animais de estimação. Como começou esse caso de amor? Seria essa relação mutuamente benéfica?

Os capítulos desta parte do livro tratam desses temas. No Capítulo 1, James A. Serpell, etologista de uma faculdade de medicina veterinária, analisa a história da guarda de animais de estimação na cultura ocidental, desde os gregos e romanos antigos até os tempos modernos e em vários níveis socioeconômicos. O autor explica como os animais de estimação podem servir de fonte de apoio social, descreve o valor desse apoio social na saúde em geral e examina como os animais de estimação, nesse papel de apoio, podem melhorar a saúde de seus donos, citando a comprovação científica disponível.

No Capítulo 2, a socióloga australiana Lisa Jane Wood investiga o impacto dos animais de estimação nas comunidades. Discute a própria pesquisa sobre o papel dos animais de estimação na construção do capital social (um conceito das ciências sociais que se refere a conexões no interior das redes sociais e entre elas, como, por exemplo, entre os moradores de um bairro) e do espírito de comunidade.

No Capítulo 3, Alan M. Beck, professor de ecologia animal, oferece uma visão geral de como os animais podem afetar a saúde das crianças. Trata das interações intencionais de crianças com animais de estimação, das atitudes humanas em relação aos animais em geral, da inclusão dos animais em ambientes terapêuticos e das questões biomédicas éticas relacionadas ao uso dos animais de terapia na pesquisa de saúde pública.

PARTE I

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O Capítulo 4 é mais específico sobre as questões de saúde pública referentes aos animais no caso das relações com crianças. As autoras são Lynne Haverkos, formada em pediatria e saúde pública e atualmente administradora de pesquisa em promoção da saúde e prevenção de risco; Karyl J. Hurley, formada em medicina veterinária; Sandra McCune, formada em comportamento animal; e Peggy McCardle, formada em saúde pública. Elas delineiam os potenciais impactos positivos e negativos dos animais na saúde infantil, apresentam estatísticas de saúde sobre ferimentos causados por animais (por exemplo, a incidência de mordidas de cachorro, que são mais frequentes entre crianças pré-escolares) e discutem as zoonoses, infecções que podem ser transmitidas entre animais e seres humanos. As zoonoses são uma fonte de receio que pode afetar a maneira como os seres humanos e os animais interagem; donos de animais de estimação e pais em geral (na verdade, todas as pessoas) devem saber o que são elas, como geralmente são transmitidas e o que pode ser feito para reduzir a possibilidade de transmissão. O capítulo também traz conselhos sobre a escolha de um animal de estimação e informações sobre medidas de segurança e questões de saúde para orientar os pais, os profissionais que orientam os pais e os terapeutas que usam animais em sua clínica.

No Capítulo 5, Patricia B. McConnell, etologista e especialista certificada em comportamento animal aplicado, discute a relação entre seres humanos e cães e dá boas ideias sobre o comportamento animal, incluindo como “ler” o humor e o temperamento dos cães, como saber quando eles estão se sentindo ameaçados e como orientar interações saudáveis entre crianças e cães.

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BUDDY: O MELHOR AMIGO DE UMA MENINA

Keisha, de 12 anos, era muito tímida. Tinha dificuldade para fazer amigos na sala de aula e geralmente comia sozinha no refeitório da escola. Seu desempenho acadêmico era bom, assim como o relacionamento com os professores e os outros adultos da escola, o problema eram as situações sociais com outras crianças.

Quando a família de Keisha mudou de cidade, porque o pai foi transferido no trabalho, os pais da menina ficaram preocupados que ela pudesse ter mais dificuldade ainda para fazer amigos na nova escola. Para ajudá-la a se ajustar, decidiram comprar um cachorrinho, que Keisha chamou de Buddy.* Ela andava pelo novo bairro com Buddy, para explorar a vizinhança e aprender a andar por ali. Encontrou um playground e viu grupos de crianças jogando basquete e outras crianças apenas passando o tempo juntas. Keisha jogou um frisbee e Buddy correu para pegá-lo e trazê-lo de volta para sua dona. Ela tornou a jogar o frisbee. Algumas crianças notaram Keisha e Buddy e vieram falar com ela. De repente, Keisha ouviu uma enxurrada de perguntas: “Qual é o nome dele?”, “Ele é tão fofinho, quantos anos ele tem?”, “Ele sabe outras brincadeiras?”, “Posso jogar o frisbee e ver se ele traz de volta para mim?”.

O dia seguinte foi o primeiro de Keisha na nova escola. Ela entrou na sala de aula e viu duas das crianças que conhecera no playground. Quando elas a cumprimentaram, do outro lado da sala, Keisha acenou timidamente. Depois da aula, as crianças se aproximaram de Keisha para perguntar sobre Buddy, e a menina e seus novos amigos caminharam juntos para a atividade seguinte.

* Buddy, em inglês, significa companheiro, camarada. (N.T.)