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Organização e Gestão de Cooperativas ESAPL / IPVC

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Organização e Gestão de Cooperativas

ESAPL / IPVC

O Código CooperativoLei n.º 51/96 de 7 de Setembro

Algumas notas sobre o Capítulo I

Disposições Gerais

Artigo 2º

Noção

1. As cooperativas são pessoas colectivas autónomas, de livre constituição, de capital e composição variáveis, que, através da cooperação e entreajuda dos seus membros, com obediência aos princípios cooperativos, visam, sem fins lucrativos, a satisfação das necessidades e aspirações económicas, sociais ou culturais daqueles.

2. As cooperativas, na prossecução dos seus objectivos, podem realizar operações com terceiros, sem prejuízo de eventuais limites fixados pelas leis próprias de cada ramo.

A Declaração da Aliança Cooperativa Internacional sobre Identidade Cooperativa, aprovada no Congresso de Manchester de 1995, inicia-se com a seguinte definição

de Cooperativa:

“Uma cooperativa é uma associação autónoma de pessoas, que se unem, voluntariamente, para satisfazer necessidades e aspirações económicas, sociais e culturais comuns, através de uma empresa de propriedade conjunta e democraticamente controlada.”

1ª Grande Questão:

Será que uma Cooperativa é, de facto, uma Empresa ?

• Sem dúvida !

• Apenas no aspecto funcional é que as cooperativas são distintas das outras empresas.

• A cooperativa é uma empresa, mas uma empresa diferente, porque a actividade exercida em ordem à produção ou troca de bens ou serviços não tem como destinatários terceiros, mas sim os próprios membros da cooperativa. São estes os destinatários das operações sociais, da actividade empresarial, e esta faceta confere uma contextura diferente à empresa.

• A actividade empresarial destina-se a satisfazer directamente certas necessidades dos membros da cooperativa, isto é, dos empresários, e não, como na empresa capitalista, a atribuir a estes ganhos com os quais procurarão depois os bens ou serviços de que necessitam.

2ª Grande Questão:

Então e a questão do Lucro ?

• O Código Cooperativo refere, como se viu, que as cooperativas são organizações “sem fins lucrativos”.

• Mas esta afirmação não permite afirmar, como por vezes e de forma errada se pretende, que as cooperativas sejam sociedades sem fins lucrativos stricto sensu. Da forma como a Lei se encontra redigida, o que de facto se diz é que as cooperativas são sociedades de fins não lucrativos.

• Significa isto que o que a cooperativa visa é satisfazer necessidades, de diferentes tipos, dos seus associados; e o que ela não visa é o lucro pelo lucro. O que não impede, porém, que o tenha, como é normal numa economia de mercado e, eventualmente, que ele seja desejável, na medida em que tal lucro possa ser um instrumento útil à melhor satisfação do objecto da cooperativa.

3ª Grande Questão:

Se são pessoas colectivas, são Sociedades ?

• As Sociedades têm figura jurídica independente das cooperativas na legislação portuguesa.

• Um contrato de sociedade é aquele pelo qual duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens e serviços para o exercício em comum de uma actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartir os lucros resultantes dessa actividade.

• Então só um elemento levanta dúvidas: o da repartição dos lucros.

• Mas sobre isso já se falou. Se considerarmos em vez do conceito de lucro, outro mais alargado de “proveito económico”, já a dúvida deixa de ter razão de ser.

• A cooperativa deve ser gerida de modo a que as receitas equilibrem as despesas e, se um excedente de exercício for apurado, ele representa uma quantia que pode ser devolvida aos cooperadores a título de retorno, em função das operações económicas realizadas pelos membros com a cooperativa ou do trabalho e serviços por estes prestado.

4ª Grande Questão:

Se são Empresas, idênticas a Sociedades, e atése pode falar de Lucro, que tipo de empresas são e quem é o empresário ?

• O suporte da “empresa cooperativa” é sempre uma “associação de pessoas”.

• Está assim decomposta a instituição cooperativa nos seus dois elementos essenciais: a associação e a empresa.

• O primeiro elemento (associação) é o sujeito activo que gere a empresa e, simultaneamente, é o seu destinatário (princípio da dupla qualidade)

• O segundo elemento (empresa) é o meio instrumental usado pelo primeiro para o desenvolvimento das finalidades da instituição cooperativa.

• Sendo o suporte da empresa cooperativa uma múltipla associação de pessoas, temos de concluir que o “ente cooperativo” é uma forma de organização colectiva de produção, sendo a “empresa” cooperativa e a própria “cooperativa”uma “empresa colectiva”.

5ª Grande Questão:

Se o Empresário é a Sociedade, qual a verdadeira especificidade da cooperativa, relativamente à empresa capitalista, no que toca ao Empresário ?

• A empresa cooperativa reúne na mesma pessoa qualidades antagónicas que a empresa capitalista separa.

• A cooperativa permite a quem quer que se torne seu membro investir-se de uma qualidade que antes estava em conflito com aquela que o identificava como um determinado sujeito económico, colocado face a certas necessidades numa posição tal que o obrigava, para as satisfazer, a depender estreitamente de outrem.

RESUMINDO:

As cooperativas devem ser consideradas como Sociedades de Pessoas, em contraposição às Sociedades de Capitais.

• Nas sociedades cooperativas, a pessoa do sócio e os vínculos pessoais do sócio face à empresa cooperativa ocupam o primeiro plano. A participação financeira do sócio, se bem que importante, é relegada para um plano secundário face à sua intervenção pessoal (participação activa do sócio na vida da sociedade cooperativa, utilização das respectivas instalações e serviços).

• A actual noção de cooperativa assenta em quatro características distintivas das dos demais tipos de pessoas colectivas:

• duas de características formais:• a variabilidade do capital social;• a variabilidade da composição societária

• duas de natureza substantiva:• o objecto da cooperativa;• o modo de realizar esse objecto, ou seja, o modo de gestão da empresa cooperativa.

Ainda Outra Questão:

Que se entende por essas características de variabilidade do capital social e de composição ?

Significa simplesmente que:

• a admissão de membros;

• a demissão de membros;

• o aumento do capital social, e

• a redução do capital social,

Não exigem uma alteração do pacto social nem as inerentes obrigações de registo e publicações.

Uma Última Questão:

Qual o significado da referência a “Operações com Terceiros” ?

• Note-se que as cooperativas visam a satisfação de necessidades dos seus membros, e não de outros.

• Na legislação anterior à actual, as Operações com Terceiros eram apenas admitidas se se revestissem de natureza Complementar, ou seja, residual, acessória.

• A legislação actual aceita-as sem reservas, não só porque no actual mercado aberto e cada vez menos receptivo a medidas proteccionistas, impedir as cooperativas de nele concorrer sem restrições significaria, desde logo, diminuir a sua capacidade concorrencial, mas também porque a situação anterior era absolutamente inexequível.

• Note-se ainda, e apesar de tudo, que se admite que as Operações com Terceiros venham a ser objecto de limitações na legislação sectorial dos diferentes ramos do sector cooperativo.

Artigo 3ºPrincípios Cooperativos

As cooperativas, na sua constituição e funcionamento, obedecem aos seguintes princípios cooperativos, que integram a declaração sobre a identidade cooperativa adoptada pela Aliança Cooperativa Internacional:

1º Princípio - Adesão voluntária e livre (...)2º Princípio - Gestão democrática pelos membros (...)3º Princípio - Participação económica dos membros (...)4º Princípio - Autonomia e independência (...)5º Princípio - Educação, formação e informação (...)6º Princípio - Intercooperação (...)7º Princípio - Interesse pela comunidade (...)

Afinal, o que são os Princípios Cooperativos ?

• São, no seu conjunto, o “sangue” do movimento cooperativo.

• Derivam dos valores que inspiraram o movimento desde os primórdios, moldam as estruturas e determinam as atitudes que levam às perspectivas distintas do movimento.

• São linhas de orientação pelas quais os cooperadores lutam para desenvolver as suas organizações cooperativas.

• São, na essência, princípios práticos, moldados por gerações de experiência, bem como por pensamento filosófico. São por isso elásticos, aplicáveis em vários graus nos diferentes tipos de cooperativas e nas diferentes situações.

• Requerem que os cooperadores tomem decisões, no que há natureza democrática das suas organizações diz respeito, nos papéis dos diversos detentores de partes sociais, e na distribuição dos excedentes gerados.

• Os princípios cooperativos só adquirem força jurídica própria, quando são incorporados, directa ou indirectamente, na ordem jurídica através de um preceito legal que lhes homologue o sentido.

• Deve contudo salientar-se que eles não são pura matéria extrajurídica que apenas ascende ao direito por força de um acto formal legislativo.

• Eles são regras que decidem da possibilidade de uma estrutura organizativa pertencer à ACI (Aliança Cooperativa Internacional), tendo validade potencialmente universal, em paralelo com o âmbito da Aliança, e nessa medida exercem uma macro-influência junto dos legisladores e dos poderes do Estado.

• São regras que vão dando forma e perfil à vida das organizações cooperativas, exercendo um elevado número de pequenas influências que condicionam a actividade legislativa, pois ao tornarem-se parte da identidade cooperativa constituem-se na realidade que o legislador tem de reconhecer como facto, ao legislar sobre ela.

Qual a importância dos Princípios Cooperativos no processo legislativo ?

Qual a relevância dos Princípios Cooperativos na legislação Portuguesa ?

• Resulta directamente do disposto no n.º 2 do artigo 61º da Constituição da República Portuguesa:

““A todos A todos éé reconhecido o direito reconhecido o direito àà livre constituilivre constituiçção de ão de cooperativas, desde que observados os princcooperativas, desde que observados os princíípios pios

cooperativoscooperativos””

Mas a que princípios cooperativos se refere a Constituição da República Portuguesa ?

• De facto a formulação que lhes foi dada pela ACI está longe de ser a única possível.

• Mas tem sido largamente dominante o ponto de vista que sustenta a identidade plena entre os princípios adoptados pela ACI e os que são consagrados na CRP. Daí que eles tenham acabado por ser integralmente integrados na Lei (Código Cooperativo).

Artigo 4°Ramos do sector cooperativo

1. Sem prejuízo de outros que venham a ser legalmente consagrados, o sector cooperativo compreende os seguintes ramos:

a) Consumo;b) Comercialização;

c) Agrícola;d) Crédito;

e) Habitação e construção;f) Produção operária;

g) Artesanato;h) Pescas;i) Cultura;

j) Serviços;l) Ensino;

m) Solidariedade social.2. É admitida a constituição de cooperativas multissectoriais, que se caracterizam por poderem desenvolver actividades próprias de diversos ramos do sector cooperativo, tendo cada uma delas de indicar no acto de constituição por qual dos ramos opta como elemento de referência, com vista à sua integração em cooperativas de grau superior.

Principais aspectos relativos ao Art. 4º

• O critério adoptado para a divisão por ramos carece de qualquer fundamento doutrinário ou pragmático.

• A principal relevância desta classificação traduz-se na aplicação de um vasto leque de diplomas legais complementares, que constituem osdiferentes regimes jurídicos de cada ramo cooperativo.

• O Ramo Solidariedade Social constitui neste diploma um ramo novo. Anteriormente, cabia ao ramo das Cooperativas de Prestação de Serviços “desenvolver actividades” na área da solidariedade social.

• O actual Código Cooperativo uniformiza os conceitos de “multisectorialidade” e de “polivalência” inscritos no diploma anterior, aproximando-o do primeiro e retirando a natureza “subsidiária” às actividades desenvolvidas para além do objecto principal.

• A existência de cooperativas multisectoriais, prevista no n.º 2, obriga esse tipo de cooperativas à escolha de um ramo “como elemento de referência, com vista à sua integração em cooperativas de grau superior”. Ficam assim salvaguardadas questões de representatividade das federações e confederações de cooperativas.

Artigo 5ºEspécies de cooperativas

1. As cooperativas podem ser do primeiro grau ou de grau superior.

2. São cooperativas do primeiro grau aquelas cujos membros sejam pessoas singulares ou colectivas.

3. São cooperativas de grau superior as uniões, federações e confederações de cooperativas.

Principais aspectos relativos ao Art. 5º

Uma vez que a Lei admite a constituição de uma cooperativa de primeiro grau tendo exclusivamente como membros pessoas colectivas (cooperativas ou outras), a distinção entre cooperativas de primeiro grau e de grau superior é feita em função, não dos membros, mas do seu objecto social (ou “finalidades”, como usa o presente Código Cooperativo para as cooperativas de grau superior – artigos 82º e 85º)

Art. 2º - Noção de Cooperativa – (...) visam , sem fins lucrativos, a satisfação das necessidades e aspirações económicas, sociais ou culturais daqueles.

Art. 82º - Uniões de Cooperativas – (...) 3. As uniões têm finalidades de natureza económica, social, cultural e de assistência técnica.

Art. 85º - Federações de Cooperativas – (...) 6. As federações têm finalidades de representação, de coordenação e de prestação de serviços, podendo exercer qualquer actividade permitida por lei e consentânea com os princípios cooperativos.

Artigo 6ºRégies cooperativas

1. É permitida a constituição, nos termos da respectiva legislação especial, de régies cooperativas, ou cooperativas de interesse público, caracterizadas pela participação do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, bem como, conjunta ou separadamente, de cooperativas e de utentes dos bens e serviços produzidos.

2. O presente Código aplica-se às régiescooperativas em tudo o que não contrarie a respectiva legislação especial. (*)

(*) - Decreto-Lei n.º 31/84, de 21 de Janeiro

Artigo 7.ºIniciativa cooperativa

1. Desde que respeitem a lei e os princípios cooperativos, as cooperativas podem exercer livremente qualquer actividade económica.

2. Não pode, assim, ser vedado, restringido ou condicionado, às cooperativas o acesso e o exercício de actividades que possam ser desenvolvidas por empresas privadas ou por outras entidades da mesma natureza, bem como por quaisquer outras pessoas colectivas de direito privado sem fins lucrativos.

3. São aplicáveis às cooperativas, com as adaptações inerentes às especificidades resultantes do disposto neste Código e legislação complementar, as normas que regulam e garantem o exercício de quaisquer actividades desenvolvidas por empresas privadas ou poroutras entidades da mesma natureza, bem como por quaisquer outras pessoas colectivas de direito privado sem fins lucrativos.

4. Os actos administrativos contrários ao disposto nos números anteriores ou aos princípios neles consignados estão feridos de ineficácia.

Principais aspectos relativos ao Art. 7º

• O Código Cooperativo toma posição clara sobre a liberdade de actuação das cooperativas.

• Este artigo, na mesma linha de fidelidade à disposição constitucional que reconhece a todos o direito à livre constituição de cooperativas, afirma o que nem sempre é respeitado em processos administrativos – o direito das cooperativas exercerem livremente qualquer actividade económica.

• A única limitação estabelecida pelo Código a esta iniciativa cooperativa é “a lei e os princípios cooperativos”.

• É particularmente importante o disposto no n.º 4, particularmente quando tão frequentemente se encontram forças que procuram impedir a livre constituição e funcionamento das cooperativas, alegando possuírem estas hipotéticas inadequações ao exercício de determinadas actividades ou uma incapacidade para responderem a determinadas exigências económicas.

Artigo 8ºAssociação das cooperativas com outras pessoas

colectivas

1. É permitido às cooperativas associarem-se com outras pessoas colectivas de natureza cooperativa ou não cooperativa, desde que daí não resulte perda da sua autonomia.

2. Nas cooperativas que resultem exclusivamente da associação entre cooperativas, ou entre estas e pessoas colectivas de direito público, o regime de voto poderá ser o adoptado pelas cooperativas de grau superior.

3. Não podem adoptar a forma cooperativa as pessoas colectivas resultantes da associação de cooperativas com pessoas colectivas de fins lucrativos.

Principais aspectos relativos ao Art. 8º

• O conceito de “associação” consignado neste artigo, nada tem a ver com as figuras de cooperativas de segundo grau – uniões, federações e confederações de cooperativas – reguladas por outros artigos deste Código.

• Permite-se então a associação de cooperativas com:

• outras cooperativas

• pessoas colectivas doutra natureza – associações, sociedades comerciais, sociedades civis

• A forma jurídica dessa associação pode ser:

• cooperativa – associação de cooperativas entre si ou de cooperativas com pessoas colectivas de fins não lucrativos

• outra – obrigatória para a associação de cooperativas com pessoas colectivas de fins lucrativos.

• O n.º 2 consagra a única forma de existência de voto plural numa cooperativa de primeiro grau.

Artigo 9°Direito subsidiário

Para colmatar as lacunas do presente Código, que não o possam ser pelo recurso àlegislação complementar aplicável aos diversos ramos do sector cooperativo, pode recorrer-se, na medida em que se não desrespeitem os princípios cooperativos, ao Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente aos preceitos aplicáveis às sociedades anónimas.