ordenação temporal e atenção auditiva em escolares com ... · maiores que os meus, pois ele vai...

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ELISÂNGELA BARROS SOARES MENDONÇA Concentrações de hemoglobina em adolescentes e sua associação com as habilidades de ordenação temporal e atenção auditiva RECIFE 2013

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ELISNGELA BARROS SOARES MENDONA

Concentraes de hemoglobina em adolescentes e sua associao

com as habilidades de ordenao temporal e ateno auditiva

RECIFE

2013

ELISNGELA BARROS SOARES MENDONA

Concentraes de hemoglobina em adolescentes e sua associao

com as habilidades de ordenao temporal e ateno auditiva

Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em

Sade da Criana e do Adolescente do Centro de

Cincias da Sade da Universidade Federal de

Pernambuco, para obteno do Ttulo de Doutor em

Sade da Criana e do Adolescente.

Orientador: Prof Dr. Alcides da Silva Diniz

Co-orientadora: Prof Dra. Lilian Ferreira Muniz.

RECIFE

2013

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

REITOR

Prof. Dr. Ansio Brasileiro de Freitas Dourado

VICE-REITOR

Prof. Dr. Silvio Romero Barros Marques

PR-REITOR DA PS GRADUAO

Prof. Dr. Francisco de Souza Ramos

DIRETOR CENTRO DE CINCIAS DA SADE

Prof. Dr. Nicodemos Teles de Pontes Filho

VICE-DIRETORA

Profa. Dra. Vnia Pinheiro Ramos

COORDENADORA DA COMISSO DE PS GRADUAO DO CCS

Prof Dra. Jurema Freire Lisboa de Castro

PROGRAMA DE PS GRADUAO EM SADE DA CRIANA E DO ADOLESCENTE

COLEGIADO

Profa. Dra. Marlia de Carvalho Lima (Coordenadora)

Profa. Dra. Maria Eugnia Farias Almeida Motta (Vice-Coordenadora)

Prof. Dr. Alcides da Silva Diniz

Profa. Dra. Ana Bernarda Ludermir

Profa. Dra. Andra Lemos Bezerra de Oliveira

Profa. Dra. Claudia Marina Tavares de Arruda

Prof. Dr. Dcio Medeiros Peixoto

Prof. Dr. Emanuel Savio Cavalcanti Sarinho

Profa. Dra. Estela Maria Leite Meirelles Monteiro

Profa. Dra. Gislia Alves Pontes da Silva

Profa. Dra. Luciane Soares de Lima

Profa Dra. Maria Gorete Lucena de Vasconcelos

Prof. Dr. Paulo Svio Angeiras de Ges

Prof. Dr. Pedro Israel Cabral de Lira

Profa. Rosemary de Jesus Machado Amorim

Profa. Dra. Slvia Regina Jamelli

Profa. Dra. Slvia Wanick Sarinho

Profa. Dra. Sophie Helena Eickmann

Leila Maria lvares Barbosa (Representante discente - Doutorado)

Catarine Santos da Silva (Representante discente -Mestrado)

CORPO DOCENTE COLABORADOR Profa. Dra. Ana Cludia Vasconcelos Martins de Souza Lima

Profa. Dra. Bianca Arruda Manchester de Queiroga

Profa. Dra. Cleide Maria Pontes

Profa. Dra. Daniela Tavares Gontijo

Profa. Dra. Margarida Maria de Castro Antunes

Profa. Dra. Rosalie Barreto Belian

Profa. Dra. Snia Bechara Coutinho

SECRETARIA

Paulo Srgio Oliveira do Nascimento

Juliene Gomes Brasileiro

Janana Lima da Paz

Dedico este trabalho a DEUS, que por seu intermdio,

consegui realizar mais esta etapa de minha vida. Dedico aos

meus pais, que me ensinaram que o saber o meu maior

legado e ao meu esposo, Gleydson, que esteve comigo nesse

longo caminho.

AGRADECIMENTOS

A Deus, que est no controle de tudo e que sempre esteve comigo, protegendo-me,

orientando- me e amando-me.

Aos meus pais, Edvaldo e Elenilda, pelo amor e compreenso nos diversos momentos

que passei, pela escuta, pelo apoio e incentivo que fez com que chegasse at aqui.

Ao meu amado esposo Gleydson pelo seu amor, compreenso e apoio em todas as

etapas do Doutorado, por escutar-me, e nos diversos momentos de preocupao e desnimo,

trazer palavras de conforto e carinho.

Aos meus irmos, Eduardo e Elivnia, pela compreenso e colaborao nessa

caminhada.

Aos meus sogros Isaias e Luzemar, meus cunhados Isaias e Clayton, pela compreenso

ao longo dessa jornada.

Ao meu orientador, Profo Alcides da Silva Diniz, por ter acreditado em mim e ter estado

comigo nos desafios que apareceram.

A minha co-orientadora e amiga, Prof Lilian Ferreira Muniz, que por sua generosidade,

carinho, ateno, conhecimento, confiana e disponibilidade, foi muito importante na

realizao do Doutorado. Obrigada por ter acreditado em mim.

Ao Corpo Docente da Ps Graduao em Sade da Criana e do Adolescente, obrigada

pela oportunidade em crescer e amadurecer com profissionais to compromissados com a

nossa Formao.

Aos Secretrios Paulo, Juliene e Janana, pelo auxlio e ateno dispensados durante

esse perodo.

Aos companheiros e amigos do Doutorado: Adolfo, Ana Catarina, rika, Gabriela,

Maria Ceclia, Maria Cristina, Miriam, Wanderleya e Paulo, pela amizade e cooperao

mtua ao longo de nossa convivncia.

Ao Corpo Docente e Discente do setor de Audiologia do Departamento de

Fonoaudiologia da UFPE, pelo espao que me foi dado para realizao dessa pesquisa.

Ao setor de Fonoaudiologia do Real Hospital Portugus que me recebeu com carinho e

ateno para realizao dos exames.

As minhas amigas fonoaudilogas que me honram com suas amizades desde a

graduao: Maria da Soledade Rolim e Thalita Karina.

A minha amiga Everlane Alcntara por me ouvir e estar comigo durante o doutorado.

Foi muito bom ter sua companhia durante essa etapa da minha vida.

s profissionais do Ncleo de Ateno ao Servidor (NAS), em Nazar da Mata-PE:

Joanhyze Brito, Gilda Souza, Elaine Morais e a ex- componente Lucielle Farias, pela ateno,

generosidade e compreenso, pois foi fundamental nesse processo. Agradeo pelos momentos

de escuta e de companheirismo.

Professora Ilma Kruze e as nutricionistas: Patricia Brazil, Mellina Albuquerque,

Maria Lucia Diniz e Patricia Calado, que elaboraram a coleta e me receberam no projeto de

pesquisa com tanto carinho.

A Rosete Melo e sua equipe, que me deram tanta ateno, alm de terem sido

fundamentais na coleta de dados.

Aos voluntrios que participaram direta ou indiretamente desta pesquisa,

especialmente os escolares, que se dispuseram a fazer os exames auditivos, meu muito

OBRIGADA!

"Em me vindo o temor, hei de confiar em Deus

(Salmos 56.3). Tudo posso em Deus que me

fortalece (Filipenses 4.13). Os sonhos de Deus so

maiores que os meus, pois Ele vai fazer o melhor por

mim (Nani Azevedo).

RESUMO

A anemia um problema de sade pblica nos pases em desenvolvimento e pode provocar

repercusses no desenvolvimento neuropsicomotor, cognitivo, comprometendo a linguagem e

a aprendizagem. As habilidades de ordenao temporal (OT) e ateno auditiva (AA) so

importantes no desenvolvimento da linguagem e da aprendizagem. Avaliaes

eletrofisiolgicas tm mostrado maior lentido na conduo do estmulo auditivo ao sistema

nervoso central nos indivduos anmicos. Essa lentido pode afetar as habilidades auditivas,

prejudicando o aprendizado dos escolares. No h relatos na literatura de estudos desenhados

para investigar a associao entre as habilidades auditivas, mediante o uso do teste padro de

frequncia (TPF) e do teste eletrofisiolgico P300, com a anemia em adolescentes. Estimar a

prevalncia da anemia e fatores de risco associados em adolescentes da rede pblica de ensino

de RecifePE, bem como avaliar a associao das habilidades auditivas de OT e AA segundo

as concentraes de hemoglobina (Hb) em adolescentes. O delineamento metodolgico

consistiu de um corte transversal, com amostra aleatria de 256 adolescentes, de 13 a 18 anos,

de ambos os sexos, e de uma srie de 17 casos de adolescentes com concentraes

inadequadas de Hb, acoplado a um grupo controle com 17 adolescentes com teores de Hb

adequados. Os adolescentes foram avaliados segundo as habilidades auditivas de OT e AA, as

concentraes de Hb, estado nutricional e caractersticas socioeconmico-demogrficas. A

prevalncia de concentraes inadequadas de Hb foi de 10,2% [IC95% 6,7 - 14,5], situando-se

em patamares que configuram a anemia do tipo leve (9 g/dL 0,05), bem como com as caractersticas socioeconmico

demogrficas (p> 0,05). As habilidades de OT e AA no mostraram associao (p> 0,05) com

as concentraes de Hb, quando ajustadas para o estado nutricional e caractersticas

socioeconmico-demogrficas (p> 0,05). A mdia de latncia do componente P3 nos

adolescentes com concentraes de Hb inadequadas foi menor naqueles com maior idade (p=

0,02), melhor escolaridade (p= 0,02), melhor nvel scioeconmico (p= 0,04) e com registro

de repetncia (p= 0,04). Embora a prevalncia de anemia tenha sido discreta e classificada em

grau leve, importante a adoo de medidas preventivas de educao nutricional com a

difuso da alimentao saudvel nas escolas e o incentivo ao consumo de alimentos fontes de

ferro. Mesmo no havendo associao entre as habilidades auditivas e as concentraes de

Hb, recomendam-se investigaes com maior nmero de casos e maior diversidade nas

concentraes inadequadas de Hb, incluindo nveis moderado e grave (Hb< 9g/dL) para testar

essa associao.

Palavras-chaves: Processamento de informao humano. Habilidade. Audio. Anemia.

Adolescente.

ABSTRACT

Anemia is a public health problem in developing countries and may cause effects on neuro

and, cognitive development, affecting language and learning. Temporal ordering (TO) and

auditory attention (AA) skills are important in language and learning development.

Electrophysiological assessments have shown slowing of the conduction of the auditory

stimulus to the central nervous system in anemic patients. This slowness can affect auditory

skills, harming the learning of the students. There are no reports in the literature of studies

involving auditory skills through the use of test pattern frequency (TPF) and

electrophysiological test, P300 among anemic adolescents. To estimate the prevalence of

anemia and its associated risk factors in adolescents attending public schools in Recife - PE,

as well as to evaluate the association of auditory skills of TO and AA according to

hemoglobin (Hb) levels in adolescents. The methodological approach consisted of a cross-

sectional study involving a random sample of 256 adolescents, 13-18 years old, of both sexes,

and a series of 17 cases of adolescents with inadequate Hb concentrations matched to a

control group with 17 adolescents with adequated Hb . The adolescents were evaluated by

hearing abilities of TO and AA, Hb concentrations, nutritional status and socioeconomic and

demographic characteristics. The prevalence of inadequate Hb concentrations was 10.2 % [CI

95% 6.7 - 14.5], reaching levels considered as mild anemia (9 g/dL < Hb < 12 g/dL). Female

adolescents showed greater vulnerability to inadequate Hb concentrations in all age groups (p

< 0.001). Any association was observed between Hb concentrations nutritional status (p>

0.05), and socio-economic and demographic characteristics (p> 0.05). OT and AA skills did

not correlated (p > 0.05) to Hb concentrations, when adjusted for nutritional status and

socioeconomic and demographic characteristics (p> 0,05). The average latency of the P3

component in adolescents with inadequate Hb concentrations was lower in those with higher

age (p = 0,02), higher educational level (p = 0,02), higher socioeconomic status (p= 0,04) and

registration of repetition (p = 0,04). Although the prevalence of anemia was mild and

classified as low levels, it is important to adopt preventive nutrition education with the spread

of healthy eating habits in schools and encouraging the consumption of iron-rich foods.

Regarding to auditory skills vs Hb concentrations it is recommended further investigations

with larger sample and greater diversity of inadequate concentrations of Hb, including

moderate and/or severe levels (Hb < 9g/dL ) to test this association .

KEYWORDS: Mental processes. Aptitude. Hearingn. Anemia. Adolescent

LISTA DE FIGURAS, QUADROS e TABELAS

Figura 1: Traado do PEALL em um adulto jovem saudvel, contendo os traados raro

frequente dos componentes exgenos (N1, P2, N2) e endgeno (P3). ................................................ 39

Artigo de reviso:

Figura 1: Diagrama explicativo sobre o processo de seleo de artigos ........................................ 44

Quadro 1: Aplicabilidade do teste padro de frequncia na avaliao da ordenao

temporal:2006 2011 ......................................................................................................................... 45

Quadro 2: Aplicabilidade do P300 na avaliao da ateno auditiva: 2006 2011 ...................... 47

Artigo original 1:

Tabela 1: Caracterizao da amostra quanto s caractersticas socioeconmicasdemogrficas e

o estado nutricional em adolescentes de 13 a 18 anos de Recife, PE. 2011- 2012 .......................... 73

Tabela 2: Concentraes de hemoglobina segundo as variveis scioeconmicas demogrficas e

o estado nutricional em adolescentes de 13 a 18 anos de idade, matriculados na rede pblica de

ensino do Recife, PE. 2011-2012. ........................................................................................................ 74

Tabela 3: Concentraes de hemoglobina em adolescentes anmicos de 13 a 18 anos de idade, de

ambos os sexos, matriculados na rede pblica de ensino do Recife, PE. 2011- 2012..................... 75

Artigo Original 2:

Tabela 01 Habilidade de ordenao temporal (TPF) e ateno auditiva (N2 e P3) do segundo as

concentraes de hemoglobina em adolescentes de 13 a 18 anos de idade da rede pblica de

ensino do Recife, PE. 2011 - 2012.. ..................................................................................................... 94

Tabela 02 Ordenao temporal segundo as concentraes de hemoglobina ajustadas para o

estado nutricional e as caractersticas scioeconmico demogrficos em adolescentes de 13 a 18

anos de idade da rede pblica de ensino do Recife, PE. 2011 e 2012. ............................................ 96

Tabela 03 Ateno auditiva (N2 ) segundo as concentraes de hemoglobina ajustadas para o

estado nutricional e as caracteristicas scioeconmico - demogrficas em adolescentes de 13 a 18

anos de idade da rede pblica de ensino do Recife, PE. 2011 2012 ............................................. 98

Tabela 04 Ateno auditiva (P3) segundo as concentraes de hemoglobina ajustadas para

o estado nutricional e as caractersticas scioeconmico - demogrficas em adolescentes de 13

a 18 anos de idade da rede pblica de ensino do Recife, PE. 2011

2012......................................................................................................................................................99

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AIDS - Sindrome da Imunodeficincia Adquirida

ABEP - Associao Brasileira de Antropologia e Associao Brasileira de Empresas de

Pesquisa

ASHA - American Speech and Language Association

CNPq - Conselho Nacional de Pesquisa

dBNA - Decibis em nvel auditivo

dB NS - Decibel nvel de sensao

DeCS - Descritores em Cincias da Sade

DP - Desvio padro

DPA Distrbio do Processamento Auditivo

EF - Estmulo frequente

ER - Estmulo raro

ETDA - cido etileno diamino tetractico

Gb - Gigabytes

g/dL - Gramas por decilitro

GIN - Gap in noise

Hb - Hemoglobina

Hz - Hertz

IC - Intervalo de confiana

I.H.S - Smart Ep Intelligent Hearing Systems

IMC - ndice de Massa Corprea

IMIP - Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira

LILACS - Literatura Latino-americana em Cincias da Sade

LRF - Limiar de recepo da fala

MEDLINE - Literatura Internacional em Cincias da Sade

ms - Milisegundos

N2 - Onda com pico negativo, componente do potencial auditivo de longa latencia (P300)

OD - Orelha direita

OE - Orelha esquerda

OMS - Organizao Mundial de Sade

PA - Processamento Auditivo

PAELM - Potencial auditivo evocado de mdia latncia

PAETC - Potencial auditivo evocado do tronco cerebral

PE - Pernambuco

PEA - Potencial evocado auditivo

PEALL - Potencial Evocado Auditivo de Longa Latncia

P/E - Indicador antropomtrico peso por estatura /idade

P/I - Indicador antropometrico peso por idade

PSI - Pediatric Speech Inteligibility

P3 - Onda com pico positivo, componente do potencial auditivo de longa latncia (P300)

RGTD - Random Gap Detection Test

RP - Razo de prevalncia

RMR - Regio Metropolitana de Recife

SAOS - Sndrome da Apneia Obstrutiva do Sono

SCIELO - Scientific eletronic Library

SD - Sndrome de Duchenne (SD)

SNA - Sistema Nervoso Auditivo

SNC - Sistema Nervoso Central

SPSS - Statistical Package for the Social Sciences

SSI - Synthetic Sentence Identification

SSW - Staggered Spondaic Words

/s - Segundos

TA - Treinamento auditivo

TCLE - Termo de consentimento livre e esclarecido

TDAH - Transtorno de Dficit de Ateno e Hiperatividade

TDCV - Teste dictico consoante-vogal

TDNV - Teste dictico com sons verbais competitivos

TPF - Teste Padro de Frequncia

TPD - Teste Padro de durao

UFPE - Universidade Federal de Pernambuco

UNICEF - Fundo das Naes Unidas para a Infncia

vs versus

v - Microvolts

WHO - World Health Organization

% - Percentual

SUMRIO

1. Apresentao ............................................................................................................ 15

2. Captulo de Reviso ................................................................................................. 18

2.1. Anemia ............................................................................................................... 18

2.2. Processamento Auditivo (PA) ........................................................................ 24

2.3. Potencial evocado auditivo de longa latncia (PEALL) P300 .................... 33

3. Artigo de Reviso Integrativa .................................................................................. 42

4.Mtodos ...................................................................................................................... 52

4.1. Desenho de estudo e casustica ......................................................................... 52

4.1.1 Amostragem ............................................................................................. 52

4.2. Mtodos e Tcnicas de Avaliao .................................................................... 53

4.2.1. Audiometria, Limiar de Recepo de fala e Imitanciometria ............ 53

4.2.2. Habilidades auditivas (ordenao temporal e ateno auditiva) ....... 54

4.2.3. Concentraes de hemoglobina: ............................................................ 56

4.2.4. Antropometria ......................................................................................... 57

4.2.5. Caractersticas scioeconmico-demogrficas ..................................... 58

4.3. Anlise de dados ................................................................................................ 58

4.4. Aspectos ticos ................................................................................................... 59

5. Resultados: ................................................................................................................ 60

5.1. Artigo Original 1: Concentraes de hemoglobina e fatores associados em

adolescentes de Recife, PE. ................................................................................... 60

Resumo ................................................................................................................. 61

Abstract ................................................................................................................ 62

Introduo ............................................................................................................ 63

Mtodos ................................................................................................................ 65

Resultados ............................................................................................................ 68

Discusso .............................................................................................................. 69

Concluso ............................................................................................................. 72

Agradecimentos ................................................................................................... 72

Referncias ........................................................................................................... 76

5.2 Artigo Original 2: Concentraes de hemoglobina em adolescentes e sua

associao com as habilidades auditivas de Ordenao Temporal e Ateno . 80

Resumo ................................................................................................................. 81

Abstract ................................................................................................................ 82

Introduo ............................................................................................................ 83

Mtodos ................................................................................................................ 86

Resultados ............................................................................................................ 93

Discusso ............................................................................................................ 100

Concluses .......................................................................................................... 104

Referncias ......................................................................................................... 105

6. Consideraes finais ............................................................................................... 112

Referncias .................................................................................................................. 114

Apndices ..................................................................................................................... 134

Apndice A - Questionrio .............................................................................. 135

Apndice B - Termo de Consentimento livre e esclarecido ........................... 137

Anexos ........................................................................................................................ 139

Anexo A - Normas de Revista de Nutrio .................................................... 140

Anexo B- Normas de publicao da Revista Brasileira de

Otorrinolaringologia ...................................................................... 150

Anexo C - Protocolo de avaliao audilogica ............................................... 168

Anexo D - Teste de padro de freqncia ....................................................... 169

Anexo E Carta de aprovao do Comit de tica ...................................... 170

15

1. Apresentao

A anemia um problema de sade pblica no Brasil, que pode provocar repercusses

no desenvolvimento cognitivo e psicomotor das crianas, influenciando a aquisio da

linguagem e a aprendizagem (SHIRMER; FONTOURA; NUNES, 2004, BELLIS; FERRE,

1999, ALGARN et al., 2003). Esses processos so bastante complexos e envolvem redes

neuronais distribudas em diferentes regies cerebrais que se relacionam com a percepo da

fala.

Esta percepo dependente da integridade auditiva perifrica e central. Para a

aquisio do conhecimento, via audio, necessrio que as habilidades auditivas estejam

adequadas para a compreenso das situaes cotidianas.

No perodo da adolescncia, h poucos dados disponveis sobre a prevalncia de

anemia por deficincia de ferro (GARANITO; PITTA; CARNEIRO, 2010). Contudo, apesar

da ausncia de um levantamento multicntrico e nacional no Brasil, existe um consenso na

comunidade cientfica de que a anemia ferropriva tem alta prevalncia em todo o territrio

brasileiro, atingindo todas as classes sociais. Em reviso de estudos localizados (regionais),

estima-se uma taxa de 20% de anemia entre os adolescentes. (NUNES et al., 2004).

Algarn et al. (2003) mostraram que a anemia ferropriva causa lentificao na

transmisso do som pela via auditiva do tronco cerebral. possvel que essa lentificao

tambm se estenda ao sistema nervoso auditivo (SNA) e por isso importante avaliar o

processamento auditivo (PA) nos escolares anmicos. O PA pode ser realizado com uso de

testes comportamentais, que sofrem interferncia de variveis internas ao indivduo (efeito do

cansao, falta de motivao, etc.) e por teste eletrofisiolgico (P300), que um mtodo

objetivo, no dependente inteiramente do sujeito, possuindo menos variveis ligadas a ele. O

P300 um dos exames classificados como potencial evocado auditivo de longa latncia

(PEALL), cujo pr-requisito para sua realizao ter a maturao cognitiva, que percebida a

partir dos 12 anos.

Sabe-se que as habilidades auditivas de ordenao temporal para sons verbais e no

verbais e a localizao sonora mostraram-se inadequadas em grande parte dos pr-escolares

anmicos (SANTOS et al., 2008), mas no h indicativos na literatura consultada quanto

avaliao das habilidades de ordenao temporal, com uso de teste padro de frequncia (teste

16

comportamental) e da ateno auditiva, com uso de teste eletrofisiolgico P300, em escolares

anmicos.

O estudo do P300 tem sido utilizado em muitas patologias, como a epilepsia, o distrbio

da aprendizagem (MELO; ROTTA, 2000), a Doena de Parkinson (PINEROLI et al., 2002),

a esquizofrenia (MARQUES-TEIXEIRA, BARBOSA, 2006), a Sndrome da Apnia do Sono

(MARTINS et al., 2011), entre outras. A vantagem de seu uso diminuir variveis

dependentes do sujeito que possam interferir nos resultados obtidos.

Com o P300 possvel avaliar a vias nervosas auditivas centrais, assim como a ateno

auditiva (FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002;

SCHOCHAT, 2003).

Foi considerando os aspectos acima mencionados que surgiu o interesse de estimar a

prevalncia de anemia em escolares de 13 a 18 anos e verificar a associao das habilidades

auditivas de ordenao temporal e ateno auditiva em adolescentes com as concentraes de

hemoglobina (Hb).

Definiu-se como objeto de estudo dessa tese a avaliao da anemia pelas

concentraes inadequadas de Hb em adolescentes e seus fatores associados, assim como

verificar como se apresentam as habilidades auditivas de ordenao temporal e ateno

auditiva diante dessa deficincia nutricional.

As perguntas condutoras que fundamentaram o estudo foram: Qual a prevalncia de

anemia em adolescentes e seus fatores associados? e Existe alterao nas habilidades

auditivas de ordenao temporal e ateno auditiva em adolescentes com concentraes

inadequadas de Hb?.

A resposta a esses questionamentos se daro a partir da estimativa a prevalncia de

adolescentes anmicos e da comparao do desempenho das habilidades auditivas de

ordenao temporal, com uso do Teste Padro de Frequncia (TPF), e da ateno auditiva,

com uso de teste objetivo (P300), segundo as concentraes de Hb ajustado para variveis

scioeconmico-demogrficas e o estado nutricional. Presume-se que o menor aporte de

oxignio carreado pela Hb, pode provocar a fadiga, reduo da capacidade cognitiva e falta de

ateno, podendo comprometer as habilidades em questo.

17

Essa tese se insere na linha de pesquisa Epidemiologia dos distrbios da nutrio

materna, da criana e do adolescente do Programa de Ps Graduao em Sade da Criana e

do Adolescente da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). A tese encontra-se

estruturada em sete captulos; o primeiro trata-se de uma apresentao de como a tese foi

conduzida, o segundo captulo apresenta a reviso da literatura, abordando o processamento

auditivo (PA), as habilidades auditivas existentes e a avaliao do PA, salientando os testes

comportamentais e o teste eletrofisiolgico P300, finalizando com a anemia, causas,

consequncias e prevalncia na adolescncia.

O terceiro captulo corresponde a uma reviso integrativa da literatura, composta por

estudos empricos que utilizaram o Teste padro de frequncia (TPF) e o P300 em sua

metodologia. Foram consultados artigos indexados nas bases de dados Literatura Latino-

americana em Cincias da Sade (LILACS), Literatura Internacional em Cincias da Sade

(MEDLINE) e Bireme, utilizando os descritores: ateno auditiva, potencial evocado P300,

eletrofisiologia e P300, ordenao temporal, processamento e TPF. Este artigo intitulado

Applicability of pitch pattern sequence and P300 for the processing of hearing evaluation

foi publicado no Brazilian Journal of Otorhinolaryngology. 79(4):512-21, 2013.

O quarto captulo apresenta o percurso metodolgico para a execuo do estudo e a

construo dos dois artigos originais.

O quinto captulo trata-se de dois artigos originais. O primeiro tem o objetivo de

estimar a prevalncia da anemia e identificar os fatores associados a essa deficincia

nutricional nos escolares residentes no municpio de Recife - Pernambuco. Esse artigo se

intitula Concentraes de Hemoglobina e fatores associados em adolescentes do Recife, PE

e ser submetido Revista Nutrio (Normas no Anexo A). O segundo artigo original tem o

objetivo de comparar o desempenho das habilidades auditivas de ordenao temporal e

ateno auditiva segundo as concentraes de Hb em adolescentes. Este artigo se intitula

Concentraes de hemoglobina em adolescentes e sua associao com as habilidades

auditivas de Ordenao Temporal e Ateno (Anexo B).

O sexto e ltimo captulo tece as consideraes finais, pontuando os resultados e as

concluses mais importantes da tese.

18

2. Captulo de Reviso

Este captulo consta de uma reviso bibliogrfica acerca do tema abordado nesse

trabalho e est dividida em sub-captulos.

2.1. Anemia

As anemias nutricionais constituem um grave problema de sade pblica em todo o

mundo e esto associadas ao retardo no desenvolvimento neuropsicomotor, ao

comprometimento de imunidade celular e diminuio da capacidade intelectual

(UCHIMURA et al., 2003; MS, 2007). Os termos anemia ferropriva, anemia por

deficincia de ferro ou, simplesmente, anemia tm sido utilizados como sinnimos, e a

designao anemia tem sido mais frequentemente usada (WHO, 2008).

Embora os termos citados estejam sendo utilizados de maneira intercambivel,

existem estgios da deficincia de ferro que antecedem o aparecimento da anemia, exercendo

impacto no funcionamento do organismo. Tais estgios so consecutivos e aumentam

gradativamente com o balano corporal negativo de ferro (ANDERSON, 2005), a saber:

- Estgio 1 - Depleo das reservas de ferro. Diante da situao de balano negativo de

ferro, o organismo utiliza as reservas corporais para produzir hemoglobina. A taxa de

Hb se situa dentro da normalidade, mas ocorre diminuio da ferritina srica.

- Estgio 2 - Eritropoiese limitada pela falta de ferro ou deficincia de transporte. A

progressiva utilizao das reservas de ferro leva reduo da saturao da transferrina

e dos nveis de ferro srico. A taxa de Hb ainda se mantem normal.

- Estgio 3 - Anemia ferropriva. Estgio final da deficincia de ferro, estando presentes

todas as anormalidades descritas.

Segundo a OMS (2001) e o Consenso do United Nations Administrative Committee

on Coordination (atual United Nations System Chief Executives Board for Coordination) e

Sub-Committee on Nutrition (atual Standing Committee on Nutrition), anemia nutricional a

condio na qual o contedo de Hb do sangue est abaixo dos valores considerados normais,

em conseqncia da carncia de um ou mais nutrientes essenciais, necessrios formao da

Hb, dentre as quais a deficincia de ferro a mais comum (UNICEF/UNU/WHO/ MI, 1999,

OMS, 2001), sendo responsvel por 90% das anemias nutricionais (OMS, 2001), afetando

19

mais de 3,5 bilhes de indivduos no mundo em desenvolvimento (UNICEF/UNU/WHO/ MI,

1999).

A anemia ferropriva um distrbio nutricional de alta prevalncia no mundo,

atingindo indiscriminadamente tanto o sexo masculino quanto o feminino, em pases

desenvolvidos ou em desenvolvimento (OLIVEIRA; FIGUEIREDO, 1998). Estima-se que a

anemia afete metade dos escolares e adolescentes nos pases em desenvolvimento e que suas

principais causas sejam as infestaes parasitrias e a deficincia de ferro, alm de outros

fatores tais como: perda de sangue no perodo menstrual das mulheres, ingesto deficiente em

ferro, sobrepeso, obesidade, desnutrio e excesso de atividade fisica (TSUYOKA et al.,

1999, WHO, 2008, GREEN,1994), doenas crnicas, como malria, cncer, tuberculose e

infeco pelo HIV; e hemonoglobinopatias, menos comuns na populao em estudo

(TSUYOKA et al., 1999, WHO, 2008).

Os sinais e sintomas so diversos de acordo com a velocidade de instalao da anemia:

palidez cutneo-mucosa, fraqueza muscular, perverso alimentar conhecida como "pica",

claudicao intermitente, tonturas, zumbido, retardo no crescimento, anorexia, sinais de

insuficincia cardaca, alteraes do humor e da funo cognitiva, comprometendo a

aprendizagem e o desenvolvimento escolar, maior susceptibilidade as infeces e diminuio

do desempenho fsico (AKRAMIPOUR, REZAEI , RAHIMI , 2008).

No Brasil, apesar da escassez de dados de base populacional, em reviso de estudos

localizados, estima-se uma taxa de 20% de anemia entre adolescentes (Nunes et al, 2008).

Publicao da OMS sobre prevalncia mundial de anemia entre 1993 e 2005 aponta que a

prevalncia no Brasil seria de 54,6%. Essa prevalncia baseia-se em apenas trs estudos, dois

realizados em Recife e um na cidade de So Paulo, com resultados estimados por frmula

especfica (BENOIST et al., 2008). H poucos dados disponveis sobre a prevalncia de

anemia por deficincia de ferro na adolescncia (GARANITO; PITTA; CARNEIRO, 2010).

Deve-se considerar que, as mudanas da adolescncia, como o estiro de crescimento fsico e

o desenvolvimento sexual e sseo, promovem o aumento das necessidades de ferro neste

estgio de vida (EISENSTEIN et al., 2000).

Adolescncia o perodo do desenvolvimento humano, entre 10 e 19 anos,

caracterizado pelo processo de transio entre a infncia e a vida adulta, com mudanas

somticas, psicolgicas e sociais. Compreende a puberdade, em que se observa crescimento

20

somtico acelerado, com a ocorrncia do pico de crescimento estatural (estiro) e de

maturao biolgica (ssea e sexual) (WHO, 1995).

Essa fase considerada, pela Organizao Panamericana de Sade, como um perodo

sujeito a agravos (LOPEZ et al., 1992). Embora o adolescente adoea pouco, a ingesto

inadequada de alimentos, seja pela falta ou pelo excesso, bastante comum, predispondo-o a

alteraes nutricionais (TOJO; LEIS, 1992). Observa-se preferncia pelo consumo de lanches

e produtos ricos em acares e gorduras, em detrimento de alimentos ricos em vitaminas e

minerais (GAMBARDELLA; FRUTUOSO; FRANCHI, 1999). O principal agravo

nutricional na adolescncia a deficincia de micronutrientes, particularmente a de ferro,

decorrente, principalmente, da ingesto inadequada, seja por modismos alimentares e/ou

fatores scioeconmicos, em uma fase de grande necessidade de ferro para o crescimento,

causada pelo aumento de incorporao de massa muscular, mais evidente nos rapazes, e por

perdas menstruais irregulares, nas meninas (SLAP et al., 1994; GAMBARDELLA;

FRUTUOSO; FRANCHI, 1999).

Na adolescncia, a deficincia de ferro uma condio complexa, na medida em que

vrios fatores podem estar envolvidos, uma vez que essa etapa da vida marcada por intensas

mudanas fisiolgicas (perda sangunea menstrual nas meninas e ao aumento da massa

muscular decorrentes do estiro pubertrio) e psicolgicas, interferncias socioculturais

(imagem corporal, influncia de pares e da mdia), possibilidade de condies econmicas

desfavorveis (GARANITO; PITTA; CARNEIRO, 2010). Desta forma, deve-se estar atento,

principalmente, aos eventos pubertrios e aos hbitos alimentares e possibilidade de ocorrer

deficincia de ferro nesta faixa etria, antes mesmo do aparecimento dos sinais e sintomas

clnicos de anemia (GARANITO; PITTA; CARNEIRO, 2010).

A menor prevalncia de anemia ferropriva em adolescentes do sexo masculino, em

relao aos do sexo feminino, pode ser explicada pelo aumento fisiolgico dos nveis de Hb

causada pela maturao sexual, muito embora se saiba que a prevalncia de ferropenia esteja

aumentada nessa faixa etria devido expanso volmica e ao aumento da massa muscular. J

nas meninas, qualquer aumento que seria esperado nos nveis de Hb acaba sendo superado

pela perda sangunea na menarca (SOEKARJO et al., 2001).

Na literatura, existem evidncias de que a anemia est associada a muitos fatores

socioeconmicos (GRANTHAM-MCGREGOR; ANI, 2001), sendo a baixa escolaridade

21

materna considerada um fator de risco para anemia (PALTI; MEIJER; ADLER, 1985;

ASSUNO et al., 2007; OLIVEIRA; OSRIO; RAPOSO, 2007)

interessante destacar que existem fatores de confuso, que devem ser considerados

ao avaliar a anemia e a cognio como: scioeconmico; falta de estmulo em casa (educao

materna pobre e menor vnculo materno); quociente de inteligncia; depresso materna; pais

ausentes; baixo peso ao nascer e desmame precoce; infeco parasitria e desnutrio

(MCGREGOR; ANI, 2003)

A anemia est associada ao dficit no desenvolvimento neuropsicomotor, cujas

repercusses podem ser percebidas mesmo aps uma dcada do tratamento adequado desta

carncia. Por sua vez, esse distrbio nutricional compromete a imunidade celular e diminui a

capacidade intelectual. Quando existe carncia de ferro, mesmo moderada, o anmico tem seu

desempenho comportamental alterado, diminuindo a capacidade de aprendizagem e causando

alteraes no crescimento (OMS, 1975; WALTER, 2003; LOZOFF; JIMENEZ; SMITH,

2006). Estudos encontraram piores escores nos testes de desenvolvimento cognitivo e

neuropsicomotor em anmicos (DOMMERGUES et al., 1989; WALTER et al, 1989;

LOZOFF; WOLF; JIMENEZ,. 1996; LOZOFF; JIMENEZ; SMITH, 2006). Estudo sugere

efeitos de longo prazo no desempenho cognitivo, mesmo que a deficincia de ferro seja

revertida (GIUGLIANI; VICTORA, 1997).

Em crianas e adolescentes tem sido identificado efeito negativo da anemia sobre o

crescimento pondero-estatural (CHWANG; SOEMANTRI; POLLITT, 1988), o

desenvolvimento psicomotor e a aprendizagem (POLLITT, 1999; LOZOFF et al., 2003).

Essas conseqncias variam de acordo com a gravidade e durao da anemia e podem

persistir mesmo aps a correo da deficincia (LOZOFF et al., 2000).

A maioria dos estudos epidemiolgicos sobre anemia no Brasil refere-se

exclusivamente a crianas menores de 6 anos (SIGULEM et al., 1978; LIRA et al., 1985) e a

gestantes (SZARFARC, 1974; SALZANO et al., 1980; SZARFARC, 1985a), considerados os

grupos de maior vulnerabilidade, ou a usurios de servios de sade (SALZANO et al., 1985;

SZARFARC, 1985b; MONTEIRO; SZARFARC, 1987). Com relao aos adolescentes, h

poucos estudos sobre anemia. Os escassos dados, contudo, sugerem elevada prevalncia de

anemia ferropriva, especialmente entre adolescentes do sexo feminino (SILVA et al., 2007).

22

Na pesquisa de Nunes et al, (2008), foi constatada a presena de anemia em 23,2% dos

adolescentes atletas na faixa etria de 10-13 anos e de 18,5% na faixa etria de 14-18 anos,

no apresentando diferenas significativas entre ambos os grupos etrios. Verificou-se no

estudo que a prevalncia de anemia foi elevada e que o estado nutricional da maioria dos

adolescentes era eutrfico.

Na pesquisa de Borges et al. (2009), com 1013 sujeitos na faixa etria de 7 a 14 anos

em escolas estaduais e municipais, verificou-se uma prevalncia de anemia de 24,5% e esta

esteve associada com a renda familiar mensal menor que um salrio mnimo. Observa-se que

taxas de prevalncias maiores do que a observada no estudo em pauta foram registradas por

Brito et al. (2003), em Jequi, municpio do Estado da Bahia (32,2%), por Uchimura et al.

(2002) em Maring, Estado do Paran (31,7%), por Ferreira (1998), em So Loureno da

Mata, Estado de Pernambuco (43,1%), por Miglioranza et al. (2002), em Londrina no Estado

do Paran (41,3%), por Mariath et al. (2006) em Cambori, Santa Catarina (31,2%), Matos et

al. (2003) em Balnerio Cambori-SC (33%), Iuliano, Frutuoso, Gambardella (2004), no

Municpio de So Paulo (11%), com baixa prevalncia, mas acima da esperada por serem

pberes de escola particular, Santos, Amancio, Oliva (2007), em duas favelas da cidade de

So Paulo (24,4%), entre outros.

Embora no tenham sido encontrados estudos especficos de processamento da

informao auditiva utilizando testes comportamentais em escolares anmicos, pesquisas com

avaliao eletrofisiolgica mostram maior lentido na conduo do estmulo auditivo ao

sistema nervoso central nos lactentes indivduos ferro-deficientes (RONCAGLIOLO et al.,

1997; ALGARIN et al., 2003).

O ferro tem uma funo importante na maturao neuronal, na mielinizao e na

constituio de algumas enzimas envolvidas na sntese, na funo e na degradao de

neurotransmissores cerebrais, interferindo em funes relacionadas diretamente com o

desenvolvimento cognitivo (PEDRAZA; QUEIROZ, 2011). Acredita-se que diminuio desse

micronutriente possa provocar alteraes na conduo de fibras corticais, prejudicando a

neurotransmisso e o desenvolvimento de oligodendrcitos, provocando ainda uma

hipomielinizao, podendo acarretar lentido no processamento da informao (TODORICH

et al., 2009).

Sendo assim, o uso dos potenciais evocados auditivos (PEA), medida eletrofisiolgica

no invasiva, tem sido usada para avaliar o efeito da anemia, controlando o fator de confuso

23

das condies scioeconmicas (MCCANN; AMES, 2007). A tcnica comumente usada

para observar o grau de hipomielinizao associada a varias doenas (STOCKARD; POPE-

STOCKARD; SHARBROUGH, 1993). Na pesquisa de Algarin et al. (2003) foi demonstrado

que o desempenho auditivo est associado deficincia de ferro atribuda hipomielinizao.

No estudo de Santos et al. (2008) pde-se observar que pr-escolares anmicos

mostraram maior vulnerabilidade s alteraes do componente perifrico do sistema auditivo,

s alteraes do reflexo acstico e s alteraes nas habilidades auditivas. Estes fatores so

considerados de risco para alteraes do PA (ASSUNO et al., 2007).

A literatura expe uma estreita associao entre PA e desenvolvimento de linguagem

(MOORE, 2007), j que a comunicao um processo central complexo no ser humano e

envolve, alm dos processos auditivos, processos multimodais, cognitivos e sociais

(WERNER, 2007). Pode-se supor ento, que as crianas anmicas sejam mais vulnerveis a

alteraes do PA (MAGALHES; OLIVEIRA; ASSENCIO-FERREIRA, 2001).

A audio envolve a participao de redes neurais complexas e diferentes habilidades

auditivas capacitam o sistema nervoso a processar a informao sonora. Tais processos como

as de ateno e memria so bases para qualquer aprendizado (MOORE, 2007).

Deste modo, no h como negligenciar a avaliao da audio e seu processamento

nos anmicos, que apresentam maior vulnerabilidade a atrasos no desenvolvimento

(WALTER, 2003; ALGARIN et al., 2003; LOZOFF; JIMENEZ; SMITH, 2006).

Segundo Fernandes (2005), muitos estudos mostraram que a anemia ferropnica est

associada a piores desempenhos cognitivos, do desenvolvimento psicomotor, da percepo

visuoespacial e da realizao escolar (leitura, escrita e matemtica) aos 4, aos 14 e aos 18

anos de idade, alm de apresentarem mais perturbaes comportamentais e emocionais

(irritabilidade, desateno, ansiedade, depresso, problemas sociais).

interessante observar que pesquisas buscam verificar a associao da anemia com

o estado nutricional, como por exemplo, no estudo de Cesar (1990), Sigulem Devincenzi e

Lessa (1978), embora os autores no tenham encontrado associao da anemia com a

desnutrio. J em outras pesquisas, as duas patologias estavam associadas (TORRES;

SATO; QUEIROZ, 1994; NEUMAN et al., 2000).

24

Deve-se ainda considerar a m alimentao do adolescente, predisposto a se

alimentar de fast food, as freqentes dietas para controle de peso to em evidncia pelo culto

ao corpo, alm da presena de substncias que interferem na absoro do ferro, como, por

exemplo, o consumo de refrigerantes durante as refeies. Atualmente devemos levar em

considerao o aumento do nmero de adolescentes grvidas, o que favorece a prevalncia de

anemia nas adolescentes, conforme relatos na literatura (PAPA et al., 2003).

Assim, o mdico que atende adolescentes deve estar atento ocorrncia de anemia

por deficincia de ferro, que pode influenciar de modo negativo o desenvolvimento biolgico,

social e at mesmo escolar e cognitivo dos adolescentes e que tem uma prevalncia

aumentada nessa faixa etria. Deve-se considerar tambm as variaes regionais, os fatores

que dificultam a absoro do ferro e as diferenas sociais e culturais, com o objetivo de

reduzir seu impacto nessa fase do desenvolvimento e promover uma melhor orientao

preventiva dessa doena carencial, podendo realizar o tratamento com sulfato ferroso na dose

de 180 a 240 mg de ferro elementar ao dia durante trs meses. (SILVA, 2007).

2.2. Processamento Auditivo (PA)

O Sistema Nervoso Auditivo (SNA) um sistema altamente complexo e redundante,

constitudo por mltiplos componentes e nveis de organizao interativa, seqencial e

paralela. Tem papel relevante e essencial para o correto reconhecimento e discriminao de

eventos auditivos, desde os eventos mais simples, como um estmulo no verbal, at

mensagens complexas, como o caso da fala e da linguagem (FONTAN-VENTURA,

2005).

O crebro responsvel pelo PA da fala, que tem incio na cclea, onde a atividade

mecnica transformada em impulsos nervosos. Ouvir, no sentido fisiolgico, integra trs

fatores: atividade perifrica, atividade auditiva central e os processos do Sistema Nervoso

Central (SNC). Quando h uma ruptura em qualquer um desses fatores, ocorre um dficit na

habilidade de reconhecimento da fala (SENS, ALMEIDA, 2007).

Processamento auditivo compreende uma srie de processos que se sucedem no

tempo, envolvendo o sistema auditivo perifrico (orelha externa, orelha mdia, orelha interna,

VIII par craniano) e o sistema auditivo central (tronco cerebral, vias subcorticais; crtex

auditivo/lobo temporal, corpo caloso), podendo envolver tambm reas no auditivas centrais

25

(lobo frontal, conexo temporal-parietal-occipital), permitindo que o indivduo realize

anlises acsticas e metacognitivas dos sons (MUSIEK; BARAN; PINHEIRO, 1994;

AZEVEDO et al., 1995; KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL, 1995; PEREIRA; NAVAS;

SANTOS; 2004). O PA refere-se ento a aquilo que fazemos com o que ouvimos, ou seja, a

construo que se faz acerca do sinal auditivo para tornar a informao funcionalmente til

(RAMOS, PEREIRA, 2005). Constitui-se numa srie de operaes mentais que o indivduo

realiza ao lidar com informaes recebidas, via sentido da audio, e que dependem de uma

capacidade biolgica inata, do processo de maturao e das experincias e estmulos no meio

acstico (IZQUIERDO, OLIVER, MALMIERCA, 2009).

O PA envolve a deteco de eventos acsticos; capacidade de discrimin-los quanto ao

local, espectro, amplitude, tempo; habilidade para agrupar componentes do sinal acstico em

figura-fundo, como por exemplo, separar o violino de um piano em uma msica ou uma voz

de outra voz; habilidade para identific-los, isto , denomin-los em termos verbais e ter

acesso sua associao semntica (significado) (PHILIPS, 1995).

O PA se refere aos mecanismos e processos do sistema auditivo responsveis pelos

seguintes fenmenos comportamentais: localizao e lateralizao sonora, discriminao

auditiva, reconhecimento de padres auditivos, aspectos temporais da audio (resoluo

temporal, mascaramento temporal, integrao temporal e ordenao temporal), desempenho

auditivo na presena de sinais acsticos competitivos e desempenho auditivo para sinais

acsticos degradados (American Speech and Language Association-ASHA, 1996).

Habilidade auditiva um comportamento manifesto de uma pessoa ao processar as

informaes recebidas por meio da modalidade auditiva (PEREIRA; CAVADAS, 1998).

Pfeiffer (2007), baseada na literatura, descreve e explica as habilidades auditivas,

sendo elas:

- Deteco do som habilidade de identificar a presena do som.

- Localizao sonora habilidade do indivduo em identificar o local de origem do som.

- Ordenao temporal habilidade de ordenar em seqncia o estmulo auditivo

recebido. Que pode ser dividido em: simples: identificar sons no verbais no silncio e

complexa: identificar sons verbais competitivos, mantendo uma ordem apresentada.

- Ateno auditiva habilidade de manter a ateno a um estmulo auditivo.

26

- Figura fundo auditivo pode ser tanto verbal quanto no verbal. a habilidade em

focar um determinado estmulo sonoro em meio a outros sons competitivos auditivos.

- Sntese ou integrao binaural habilidade do indivduo em identificar sons de fala

distorcidos, porm complementar (entram nas duas vias auditivas ao mesmo tempo).

- Separao binaural habilidade do indivduo em separar os estmulos auditivos que

entram nas vias auditivas das duas orelhas ao mesmo tempo.

- Fechamento auditivo habilidade do indivduo em compreender sons de fala, mesmo

que incompletos.

- Associao auditiva a habilidade de associar o estmulo auditivo com os outros

tipos de informaes, como por exemplo, os visuais.

- Memria auditiva a habilidade de armazenar, arquivar informaes acsticas para

poder recuper-las depois quando houver necessidade.

- Reconhecimento a habilidade de identificar corretamente um evento sonoro

previamente aprendido. um processo totalmente aprendido. Para que ocorra o

reconhecimento, necessrio, alm da informao auditiva, o conhecimento do

contexto situacional temporal.

- Discriminao a habilidade de detectar diferenas entre os padres de estmulos

sonoros como freqncia, intensidade e durao dos sons da fala.

- Resoluo temporal a habilidade de identificar quantos sons esto ocorrendo

sucessivamente, considerando o intervalo entre eles.

Na avaliao do PA, recomenda-se a utilizao de estmulos verbais e no verbais,

com uso de testes especficos para analisar as habilidades, mas essa avaliao deve ser

precedida da avaliao audiolgica bsica, pois quando o sistema auditivo perifrico

encontra-se dentro da faixa da normalidade, no se encontram dificuldades com a aplicao

dos testes especiais. No entanto, se o sistema auditivo perifrico encontrar-se com perdas

auditivas neurossensoriais ou condutivas h que se levar em conta o grau dessa perda para a

realizao da avaliao do PA (PEREIRA, 1997).

O distrbio do processamento auditivo (DPA) caracterizado por uma dificuldade

com prejuzo das habilidades auditivas, mas, tambm pode estar associada dficits de

linguagem, memria e ateno, entre outros (ZEIGELBOIM et al., 2011, RAMOS,

PEREIRA, 2005) e deve ser considerado como um distrbio de audio, no qual h um

27

impedimento da habilidade de analisar e/ou interpretar padres sonoros, provocando a

dificuldade no aprendizado da linguagem (PEREIRA, 1997, RAMOS, PEREIRA, 2005).

O diagnstico para uma DPA possibilita mudanas no processo de reabilitao

fonoaudiolgica por meio do treinamento auditivo (TA) que visa minimizar as habilidades

auditivas alteradas (SCHOCHAT, CARVALHO, MEGALE, 2002; ZALCMAN,

SCHOCHAT, 2007, PEREIRA, SCHOCHAT, 2011). O TA um conjunto de estratgias

utilizadas para desenvolver ou reabilitar as habilidades auditivas, as quais so necessrias para

a compreenso da fala, amplamente utilizada na interveno em indivduos com distrbio do

PA, no sentido de melhorar a funo do sistema auditivo na resoluo de sinais acsticos

baseado na plasticidade neural (SCHOCHAT, CARVALHO, MEGALE, 2002; ZALCMAN,

SCHOCHAT, 2007, PEREIRA, SCHOCHAT, 2011)

A avaliao do PA tem como objetivo determinar a presena ou no de distrbio,

descrever os parmetros de extenso, detectar e identificar o local da disfuno auditiva

central (MCPHERSON, 1996). um procedimento til para diagnosticar o uso funcional

correto e eficiente da audio, possibilitando a deteco do DPA e adequada interveno, para

que no ocorra um bloqueio srio na comunicao, aprendizagem e comunicao social

(ZEIGELBOIM et al., 2011; CORREA et al., 2011).

O PA pode ser avaliado por meio de testes eletrofisiolgicos e comportamentais, que

avaliam as habilidades auditivas (McPHERSON, 1996), porm, os testes comportamentais

trazem maior riqueza de informaes acerca da natureza da ao das respostas do indivduo

(SCHOCHAT, CARVALHO, MEGALE, 2002).

A avaliao do PA deve incluir uma cuidadosa histria do paciente, com aspectos pr

e perinatais, estado de sade geral, desenvolvimento da fala e linguagem, histria familiar,

fatores psicolgicos, desenvolvimento educacional, social, ambiente cultural e lingstico.

Essa avaliao ainda pressupe uma observao sistemtica e no padronizada do

comportamento auditivo. Recomenda-se uma avaliao do sistema auditivo perifrico,

constituda da audiometria tonal e vocal, da imitanciometria e das emisses otoacsticas, a

avaliao do sistema auditivo central (comportamental e/ou fisiolgica) e a avaliao da

linguagem (ASHA, 1995; MOMENSHON-SANTOS; BRANCO-BARREIRO, 2004).

28

Os testes comportamentais a serem usados na avaliao especfica do PA devem ser

selecionados obedecendo a critrios como: considerar a queixa principal, medir diferentes

habilidades centrais, incluir estmulos verbais e no verbais e considerar a idade (PEREIRA,

1997; MOMENSHON-SANTOS; BRANCO-BARREIRO, 2004).

Existe uma forte relao entre as habilidades perceptuais e a idade, sendo que o

desempenho das crianas de 8 e 10 anos semelhante ao desempenho dos adultos. Os fatores

tais como: compreenso das instrues, motivao, ateno tarefa, capacidade de

aprendizado, maturao do sistema nervoso auditivo e memria auditiva podem justificar o

fato de que existe uma relao entre as habilidades perceptuais e a idade dos indivduos

(ELFENBEIN; SMALL; DAVIS, 1993).

Esses testes podem ser agrupados segundo a forma de apresentao do estmulo.

Existem testes monticos, testes dicticos e testes diticos, para avaliao do processamento

auditivo, porm os testes diticos no avaliam as orelhas separadamente; os estmulos

utilizados podem ser a prpria voz do avaliador ou objetos sonoros e so apresentados

simultaneamente para ambas as orelhas (apresentao binaural dos estmulos sonoros)

(TONIOLO, et al.,1994; ZANCHETTA, BORGES, PEREIRA, 1994; CRUZ, PEREIRA,

1996; PEREIRA, 1997).

Entre os testes monticos, pode-se citar: teste de escuta montica com sentenas

(Pediatric Speech Inteligibility - PSI), teste de fala com rudo branco com figuras e com

palavras (PSI com palavras), teste de identificaes de sentenas com mensagem competitiva

(Synthetic Sentence Identification - SSI), teste de fala filtrada Teste de fala com rudo branco

(PEREIRA; CAVADAS, 1998, PEREIRA, SCHOCHAT, 2011). Alguns testes dicticos so:

teste dictico consoante-vogal (TDCV), teste dictico com sons verbais competitivos

(TDNV), teste de palavras e de frases com mensagem competitiva contralateral (PSI) e teste

de frases com mensagem competitiva contralateral (SSI), teste de fuso binaural, teste

dictico de disslabos alternados (Staggered Spondaic Words - Teste SSW ) e teste Random

Gap Detection Test (RGTD) (PEREIRA; CAVADAS, 1998, PEREIRA, SCHOCHAT,

2011). Entre os testes diticos pode-se citar: teste de localizao sonora em cinco direes,

teste de memria para sons verbais em sequncia, e teste de memria no verbal em

seqncia, teste de padro de durao (TPD), teste de padro de freqncia (TPF), gap in

noise (GIN) e o Random Gap detection test (RGDT). Cabe salientar que o teste de padro de

durao e o teste de padro de frequncia podem ser aplicados de maneira montica.

29

O TPF tem o objetivo de fazer com que o ouvinte reconhea contornos acsticos.

Diversos processos acsticos contribuem para essa habilidade, incluindo a discriminao de

diferentes estmulos auditivos; seqencializao dos elementos lingsticos; ou ordenao

temporal de sons; reconhecimento do todo; transferncia inter hemisfrica e memria quanto

ao nmero de itens utilizados na srie (FROTA; PEREIRA, 2004). Esse teste de fcil

realizao, alm de poder ser utilizado por indivduos com dificuldades de fala e por crianas.

A percepo adequada da durao, enquanto seqncia de eventos, imprescindvel para o

processamento das pistas acsticas da fala, devendo, portanto ser analisada durante o processo

diagnstico (MUSIEK; BARAN; PINHEIRO, 1994).

O TPF consiste na apresentao de sessenta padres de freqncias, trinta em cada

orelha, cada uma deles formados por trs tipos de tons, sendo dois em uma mesma freqncia

(PTACEK; PINHEIRO, 1971). O paciente orientado a nomear os padres ouvidos,

utilizando fino para o tom agudo e grosso para o grave. Se no consegue ou tem um

desempenho rebaixado, instrudo a imitar (utilizando o termo pi para o tom agudo e p,

para tom grave) ou a murmurar o padro, ou ainda apontar blocos finos ou grossos,

correspondentes aos tons ouvidos. As seqncias so apresentadas em ordem aleatria:

agudo/agudo/grave, grave/agudo/agudo, grave/grave/agudo e grave/agudo/agudo, a 50 dBNS

(MOMENSOHN-SANTOS; BRANCO-BARREIRO, 2004). A sensibilidade do TPF de

83% e especificidade de 80% (MUSIEK; BARAN; PINHEIRO, 1990; BARAN; MUSIEK,

2001).

Segundo Taborga (1999), a habilidade de ordenao temporal de freqncia e de

durao utilizada para analisar aspectos da prosdia da fala como ritmo, acentuao e

entoao.

A discriminao do padro de durao e de freqncia sonora e a percepo dos

aspectos temporais do som como de consenso na literatura especializada exercem um papel

fundamental na percepo da fala, na habilidade de segmentar os sons da fala, no aprendizado

e na compreenso da linguagem e, conseqentemente, pr-requisito na aquisio da leitura e

da escrita (PTACEK; PINHEIRO, 1971; TALLAL, 1980; BRADY; SHANKWEILER;

MANN, 1983; WATSON; MILLER, 1993; MERZENICK et al., 1996; BELLIS, 2003).

30

De acordo com Balen (2001), os testes de Padro de Freqncia e de durao podem

ser os mtodos mais efetivos para avaliar a habilidade de reconhecimento de padres

auditivos temporais.

Existem variveis que podem interferir nos resultados dos testes comportamentais,

como por exemplo: calibrao do equipamento, experincia prtica do audiologista, uso de

poucos itens, idade do paciente (mais jovem e idosos tm maior variabilidade de respostas),

grau da perda auditiva (contra-indicado para limiares superiores a 40 dB NA), assimetria

entre as orelhas (perdas auditivas com diferena a partir de 15 dB NA), estabilidade da perda

auditiva perifrica, sade, ateno, habilidades lingsticas, inteligncia, presena de outros

distrbio adicionais ou relacionados que possam interferir nos resultados dos testes. Existe

ainda a contra-indicao para a realizao desses em portugus para pessoas que no tenham

o portugus como primeira lngua (PEREIRA, 1997; MOMENSHON-SANTOS; BRANCO-

BARREIRO, 2004).

Muito embora existam testes que no dependem da colaborao da pessoa a ser

avaliada (testes eletrofisiolgicos), um diagnstico de DPA no pode ser feito sem a incluso

de testes especfico para a funo auditiva (BELLIS, 2003)

O uso dos testes comportamentais est fundamentado nas seguintes premissas

(MOMENSHON-SANTOS; BRANCO-BARREIRO, 2004):

- -Existe relao entre as habilidades auditivas, a linguagem, o aprendizado e o

comportamento;

- -reas especficas do sistema nervoso auditivo central tm funes especficas;

- -Procedimentos especficos podem ser usados para avaliar essas funes auditivas;

- -Os resultados desses testes podem prover informaes com relao integridade

do sistema auditivo e sobre as competncias funcionais especficas de uma criana,

to bem como a performance educacional geral, sobre seu sucesso nas habilidades

de comunicao e sobre seu bem-estar psicossocial.

As alteraes da percepo auditiva podem ser classificadas quanto ao grau e quanto

ao tipo. Quanto ao grau estas podem ser classificadas em normal, leve, moderada ou severa.

Quanto ao tipo podem ser classificadas como: problema de decodificao, codificao e

organizao, sendo que um mesmo indivduo pode ser classificado em mais de uma das

categorias de alteraes (PEREIRA, 1996).

31

Outra proposta de descrio do problema baseada nas habilidades auditivas

alteradas, pois nem sempre as alteraes se restringem a uma nica categoria, o que dificulta o

uso de classificaes.

Bellis (2003) apresenta um modelo de categorizao dos transtornos do

processamento auditivo caracterizados por trs subperfis primrios e dois subperfis

secundrios. Os subperfis primrios so:

- Decodificao auditiva: disfuno localizada no crtex auditivo primrio do

hemisfrio dominante para a linguagem, mais evidentes em tarefas com

redundncia extrnseca reduzida, tem como habilidades auditivas alteradas o

fechamento, a discriminao, o processamento temporal, a separao e a integrao

binaural. Traz como achados na avaliao comportamental: dficit bilateral ou na

orelha direita em testes de escuta dictica, baixo desempenho em testes monoaurais

de baixa redundncia e limiares elevados de deteco de intervalos de silncio.

- Prosdia: localizada no hemisfrio direito, essa alterao frequentemente apenas

na parte auditiva de uma disfuno maior neste mesmo lado. Caracterizada nos

testes de PA por dficit na nomeao, na imitao de padres temporais e

desempenho rebaixado na orelha esquerda em testes dicticos com estmulo verbal.

- Integrao: caracterizada pela dificuldade em tarefas que exigem transferncia

inter-hemisfrica e podem estar localizadas no corpo caloso. Os achados

caractersticos so: dficit na nomeao de padres temporais, melhor performance

em respostas do tipo imitao e baixo desempenho em testes dicticos com

estmulos verbais na orelha esquerda, principalmente com maior complexidade

lingstica.

- Subperfis secundrios:

- Associao: caracterizado pela inabilidade em aplicar regras da lngua e tem como

achados tpico desempenho alterado, nas duas orelhas, com estmulos dicticos

verbais, apresentando na orelha direita o pior resultado.

- Organizao de resposta: caracterizada pela inabilidade em sequencializar, planejar

e organizar respostas a uma instruo auditiva. Tem como local provvel da

disfuno a transferncia entre o lobo temporal e o frontal e/ou o sistema eferente.

Os achados tpicos so: baixo desempenho no teste de fala com rudo, no teste

32

dictico de disslabos alternados, no dictico de dgitos e nos testes de padres de

durao e freqncia. E comum no apresentar reflexo acstico.

Katz (1992) descreve crianas com alterao do PA, citando os problemas de

ateno, concentrao, linguagem pobre, memria, dificuldades escolares, entre outros.

Pereira; Cavadas (1998) descrevem manifestaes comportamentais e clnicas

observadas em indivduos com DPA como: ateno ao som prejudicada, dificuldade de

escutar em ambiente ruidoso, problemas de produo de fala envolvendo os fonemas /r/ e /l/

principalmente, problemas de linguagem expressiva envolvendo as regras da lngua (estrutura

gramatical), dificuldade de compreender em ambiente ruidoso, dificuldades de compreender

palavras de duplo sentido, problemas de escrita quanto a inverses de letras, orientao

direita/esquerda, disgrafias, dificuldade de compreender o que l, distrao, agitao,

hiperatividade, quietude, tendncia ao isolamento, desempenho escolar inferior em leitura

gramtica, ortografia e matemtica.

Entre as manifestaes comportamentais indicativas da presena de um distrbio do

processamento auditivo podem-se citar os distrbios articulatrios, vocabulrio inespecfico e

ambguo, sintaxe simplificada, erros e concordncia, dificuldade na aprendizagem da leitura e

escrita, distrbios na aquisio de linguagem, dificuldade em manter a ateno a estmulos

puramente auditivos, pedindo constantes repeties, tempo de latncia aumentado para

emisso de respostas e/ou emisso de respostas inconsistentes aos estmulos auditivos

recebidos, dificuldade em compreender conceitos verbais e relacion-los a conceitos visuais

e/ou idias abstratas, discriminao dos sons de fala prejudicada na presena ou no de

estmulos simultneos ou competitivos, falha na memorizao das mensagens ouvidas,

dificuldades na organizao e sequencializao de estmulos verbais e no-verbais,

aprendizagem insuficiente quando restrita ao canal auditivo, comportamento agitado ou quieto

demais e possveis desajustes sociais (ALVAREZ et al., 2000; PEREIRA; NAVAS;

SANTOS, 2004).

Ramos, Pereira (2005) estudaram 32 escolares da quarta srie submetidos avaliao

simplificada do processamento auditivo e obtiveram 9,4% indivduos com DPA.

O uso de testes eletrofisiolgicos, como os Potenciais Evocados Auditivos de longa

latncia (PEALLs) tambm tm se mostrado um mtodo efetivo na investigao do SNA e do

33

PA, isso porque a captao desses potenciais reflete a atividade cortical envolvida em

habilidades de discriminao, integrao e ateno do crebro e memria (KRAUS; MCGEE,

1994).

2.3. Potencial evocado auditivo de longa latncia (PEALL) P300

As primeiras observaes sobre a atrao de corpos eletrizados remontam Grcia

antiga com o filsofo Tales de Mileto (MELO, ROTTA, 2000). A partir do sculo XVIII

foram estudados os fenmenos eltricos vinculados ao SNC, inicialmente atravs dos efeitos

da aplicao da eletricidade ao corpo e, aps, atravs do prprio corpo como fonte de

eletricidade (BRAZIER, 1992; HALLIDAY; RESNICK; MERRIL, 1994).

Com o advento da computao, em 1951, Dawson pde introduzir as bases para a

obteno dos potenciais evocados sensoriais (PES) que, na dcada de 70, foram reconhecidos

como de utilidade clnica, aps o desenvolvimento de amplificadores fisiolgicos para os

sinais eltricos captados (CHIAPPA, 1997). A expresso potencial evocado usada

especificamente para designar as respostas do SNC ao estmulo sensorial ou eltrico (MELO;

ROTTA, 2000).

Dentre os fenmenos eltricos cerebrais, existem aqueles que so espontneos,

medidos por meio de eletroencefalografia, e os provocados por estmulos, que so chamados

de potenciais evocados. Esses potenciais se classificam de acordo com o tipo (Potenciais

evocados visuais, Potenciais evocados auditivos e Potenciais auditivos somatossensoriais),

tempo (curto, mdio e longo) e local onde so gerados (rgo sensorial, subcrtex e crtex)

(DUARTE; ALVARENGA; COSTA, 2004).

O P300 um potencial evocado auditivo de longa latncia (PEALL), tambm

chamado de potencial cognitivo, j que envolve reas relacionadas ateno e memria

recente (MEADOR; LORING, 1989; SCHOCHAT, 2003), assim como da rea lmbica

(HALGREN et al., 1980).

Considera-se que o P300 tem correlao com o hipocampo, tlamo, lobo frontal (giro

orbital), corpo geniculado medial e temporal posterior (CARVALHO, 2003).

O P300 deve ser obtido quando o paciente est acordado, alerta e distingue um

estmulo combinado entre um grupo de estmulos, representando o perodo de resposta do

34

crtex de associao ao estmulo do crtex primrio e ocorre 300 ms aps a apresentao do

estimulo (PFEFFERBAUM; FORD; KRAEMER, 1990; GOODIN, 1992; SCHOCHAT,

2003). Sua origem no exclusivamente cortical, sendo tambm subcortical (MELO;

ROTTA, 2000).

A pesquisa do potencial evocado auditivo (PEA) um dos mtodos objetivos

atualmente utilizados e reflete as mudanas neuroeltricas que ocorrem ao longo da via

auditiva, desde a cclea e nervo auditivo at o crtex cerebral, em resposta a um estmulo ou

evento acstico. Ele um potencial positivo, distribudo amplamente, com mxima amplitude

observada na linha mdia sobre a rea centro-parietal (JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002;

SCHOCHAT, 2003).

Alm de permitir a investigao da audio perifrica do indivduo, avalia a

integridade das vias auditivas centrais, sua maturao durante o processo de desenvolvimento

e disfunes causadas por diversas doenas. Esta metodologia permite seguir o curso da

atividade cerebral no tempo com a preciso de milissegundos e, portanto, obter conhecimento

no somente do produto final do processamento, tambm da seqncia, tempo e estgios de

processos especficos (LEPPNEN; LYYTINEN, 1997).

Segundo Mcpherson (1996), as mudanas do desenvolvimento observadas nos PEAs

esto relacionadas no apenas aos elementos anatmicos e funcionais, mas tambm aos

padres organizacionais que ocorrem com o comportamento e a aprendizagem. Assim,

destaca-se a contribuio dos PEALLs na investigao de algumas habilidades cognitivas

envolvidas no processamento da informao (ateno, discriminao e memria recente).

(FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002;

SCHOCHAT, 2003).

O P300 pode ser alterado por algumas caractersticas do sujeito entre as quais se

incluem o nvel de ateno, a dificuldade da tarefa proposta e a idade (COURCHESNE, 1978;

BAUMANN et al., 1987; PFEFFERBAUM; FORD; KRAEMER, 1990; NAGANUMA et al.,

1993, OKEN, 1997).

A idade tem efeito significativo em relao memria e ao P300 (MEADOR;

LORING, 1989). Durante a infncia, a latncia do P300 decresce progressivamente no decorrer

dos anos (COURCHESNE, 1978). Esse decrscimo equipara-se durao do

35

desenvolvimento da memria, podendo estar relacionado com o fenmeno maturativo do

processo cognitivo (GOODIN, 1992, NAGANUMA et al., 1993).

So poucos os trabalhos em que crianas na mesma faixa etria, em nmero

expressivo, foram avaliadas com o P300, o que contribui para aumentar as dvidas e

controvrsias, at mesmo no que se refere a padres de normalidade (MELO; ROTTA, 2000),

mas sabe-se que a sensibilidade desse instrumento de 80% e a especificidade de 70%

(MUSIEK; BARAN; PINHEIRO, 1990; MCPHERSON, 1996).

Os fatores scio-culturais podem influenciar nos distrbios cognitivos e do

aprendizado (SEIDENBERG; BECK; GEISSER, 1986). Os fatores scioeconmicos so os

maiores preditores nos resultados dos testes de inteligncia (ELLENBERG; HIRTZ;

NELSON, 1986). A escolaridade dos pais est associada ao desempenho da criana na

alfabetizao. Pais com maior escolaridade oferecem maior proteo para a criana por um

conhecimento mais estruturado e, teoricamente, por uma renda maior. Pais mais instrudos

apresentam maior capacidade para oferecer a seus filhos melhores condies de vida

(GUARDIOLA, 1995). Os resultados desse estudo mostraram que o grau de escolaridade

materna est associado significativamente com o desempenho escolar da criana. Mau

rendimento escolar foi mais frequentemente encontrado em filhos de mes com baixo nvel de

instruo escolar. Ficou, ainda, evidenciado, que a motivao ou o estmulo familiar

interferem no desempenho escolar, reforando ainda mais a importncia dos fatores scio-

econmicos no aprendizado. A renda per capita familiar tambm mostrou associao quanto

ao desempenho escolar da criana (MELO; ROTTA, 2000).

Baumann et al. (1987) encontraram associao da latncia do P300 com a condio

scio-econmica, provavelmente por estar ligado a maior risco de desnutrio. Na pesquisa de

Melo, Rotta (2000), o P300 com crianas epilpticas no sofreu modificaes ligadas aos

fatores escolaridade dos pais ou renda per capita. Tal aspecto pode estar relacionado ao fato

de que as crianas avaliadas no apresentavam histria de desnutrio nos primeiros anos de

vida.

O P300 eliciado de forma consciente, numa tarefa de discriminao entre estmulos

acsticos por meio de fones, pode ser mono ou binaural, tonal ou vocal. Os sons apresentados

devem ser diferentes entre si e so chamados de estmulos freqentes (EF), ocorrem num

intervalo de tempo constante e de estmulos raros (ER), introduzidos de modo aleatrio entre

36

os primeiros. Essa forma de apresentao denominada paradigma oddball ou paradigma do

alvo (FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002). O

ER ocorre em 15 e 20 % das vezes e o sujeito deve identific-lo (SCHOCHAT, 2003).

Podem ser usados tons puros diferenciados pela freqncia (EF 1000 Hz e ER

2000 Hz) ou ainda estmulos de fala diferenciados pelo trao de sonoridade (EF /pa/ e ER

/ba/) como estmulos acsticos eliciadores (JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

Segundo Karl (2003), os estmulos geralmente consistem de rajadas de tons de 250-

2000 Hz. Para evitar uma resposta ao inicio da rajada de sons, faz uma rajada com uma

elevao gradual de 25-50 ms e um plateau de 30-50 ms. Os estmulos so geralmente

repetidos regularmente a 0,5-2 /s, apesar das respostas maiores poderem ser obtidas com

menores freqncias com a estimulao irregular. A estimulao com freqncias maiores de

2/s podem alterar a forma e a latncia da onda.

Os estmulos raros podem variar em freqncia, intensidade, clicks entre sons de

fala, rudos bursts entre clicks e omisso de uma srie de estmulos (RITTER; SIMSON;

VAUGHAN, 1972; FORD et al., 1973; PICTON; HILLYARD, 1974).

Para a realizao do procedimento o individuo deve estar acordado e relaxado

durante o registro. O Sono, a privao de sono e as alteraes da ateno alteram ao P300

(KARL, 2003). Os infantes e crianas devem ser sedadas, porque geralmente no podem ser

examinadas quando acordadas. O relaxamento dos msculos do pescoo e do couro cabeludo

no to crtico porque os componentes miognicos no so causas provveis de

obscurecimento dos PEALL (KARL, 2003).

O indivduo orientado a manter-se atento e contar mentalmente ou com o auxlio

dos dedos, ou at mesmo com o levantar da mo, o nmero de ER que conseguir reconhecer e

discriminar (POLICH, 1986; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

A cada varredura, so gravadas duas ondas, uma para o estmulo freqente e outra

para o raro (CARVALHO, 2003). Em conseqncia desse processo atencivo, observa-se uma

onda positiva, que ocorre em aproximadamente 300 ms (ps-estmulo), com amplitude

variando entre 10 e 20 microvolts. (POLICH, 1986; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002;

SCHOCHAT, 2003).

37

O sistema auditivo habitua-se a ouvir o estimulo freqente e, portanto, menos

neurnios respondem a esse estmulo. J o estimulo raro, que ouvido poucas vezes, faz com

que o sistema responda com mais neurnios; e ento a curva gerada por este neurnio maior

(em amplitude) do que a gerada pelo estmulo freqente. Subtraindo-se o estimulo raro do

freqente, obtm-se o P300. (SCHOCHAT, 2003).

A amplitude do P300 tambm relacionada ao aparecimento do estmulo raro, no

sentido de que quanto mais ele aparece, menor o P300. (SCHOCHAT, 2003).

Os registros so, geralmente, feitos em um nico canal, entre o vrtex e o ouvido ou

mastide. O deslocamento do eletrodo do vrtex em cerca de seis cm no altera a resposta. A

amplificao no to alta quanto para o Potencial evocado auditivo do tronco cerebral

(PEATC) ou para o Potencial evocado auditivo de mdia latncia (PEALM), porque a

amplitude do PEALL maior, variando entre 1 a 10 v. Os ajustes dos filtros, que incluem

uma largura de banda de 0,2-100 Hz, so amplos; ajustes mais estreitos, de apenas 2-25 Hz

podem ser usados. O comprimento da varredura usualmente de cerca de 500 ms. Para um

PEALL necessrio medir cerca de 30-100 respostas (KARL, 2003).

Para Carvalho (2003), o filtro a ser utilizado para a gravao desse potencial deve

ficar entre 1 a 30 Hz. A janela a ser utilizada deve ser de 750 ms, com uma velocidade de 1,1

estmulo por segundo.

Os trabalhos encontrados na literatura usam metodologias diferentes tanto para

identificar o P300, considerando a morfologia (POLICH; HOWARD; STARR, 1985; POLICH,

1986; LADISH; POLICH, 1989; POLICH; LADISH; BURNS, 1990; POLICH, 1991; JIRSA,

1992; OTSUKA et al., 1993; DINIZ, 1996; HIRAYASU et al., 2000), a reprodutibilidade da

onda (HOWARD; POLICH, 1985; GARCIA-LARREA; LUKASZEWICZ; MAUGUIRE,

1992; CSAR; MUNHOZ, 1999) e intervalo de latncia (BARAJAS, 1990; LIN, POLICH,

1999; COLAFMINA et al., 2000), como para marcar suas medidas de latncia e amplitude

esperadas para faixa etria avaliada (considerando o ponto de mxima amplitude da onda

(HOWARD; POLICH, 1985; POLICH; HOWARD STARR, 1985; POLICH, 1991; JIRSA,

1992; LIN; POLICH, 1999) mdia entre duas replicaes (GOODIN et al., 1978; BROWN;

MARSH; LARUE, 1983; JIRSA, 1992), ponto mais prximo a 300 ms (COLAFMINA et

al., 2000), ponto da onda mais replicvel (CSAR; MUNHOZ, 1999).

38

Alguns termos utilizados como o pico mais alto, a maior onda, o primeiro

pico, a onda mais proeminente ou mais bem formada, podem levar a interpretaes

diferentes entre diversos examinadores, gerando resultados diferentes entre os trabalhos

(JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

A forma mais simples, segundo Schochat (2003), a utilizao de diferena de tons;

o estmulo freqente sendo, por exemplo, 1000 Hz e o raro 2000 Hz ou 1500 Hz,

normalmente apresentados a 60 a 70 DbNA. Uma srie de 300 promediaes so feitas

normalmente a cada varredura. Isso resulta em uma srie de 45 - 60 estmulos raros e 255 a

240 estmulos freqentes (dependendo se for utilizado 15 ou 20 % de estmulos raros).

As medidas de latncia do P300, encontradas na literatura, para a faixa etria de 5 a 18

anos, atingem valores de 240 a 700 ms para uma populao normal, ou seja, sem alteraes

auditivas, neurolgicas, cognitivas e psicolgicas. Mesmo considerando a influncia

maturacional, a subjetividade na determinao da onda pelo examinador, pela falta de um

critrio de anlise mais uniforme entre os trabalhos, pode estar contribuindo para o aumento

da variabilidade da medida observada nos mesmos (JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

Os principais potenciais (ondas) descritos so: N1, P2, N2 e P3 ou N1 (P100), P2 (P200),

N2 (N200), P3 (P300) (FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001; JUNQUEIRA;

COLAFMINA, 2002). (Ver figura 1)

39

Figura 1: Traado do PEALL em um adulto jovem saudvel, contendo os traados raro

frequente dos componentes exgenos (N1, P2, N2) e endgeno (P3)

(FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001).

O P3 ou P300 a onda mais tardia que aparece aps o complexo N1-P2-N2 como uma

resposta objetiva relacionada a aspectos fundamentais da funo mental: percepo e

cognio (MCPHERSON, 1996).

Esses estmulos subdividem-se em potenciais exgenos (N1, P2, N2), fortemente

influenciados pelas caractersticas fsicas do estmulo (intensidade e freqncia, entre

outros) e potenciais endgenos (P300), influenciados predominantemente por eventos

internos relacionados s habilidades cognitivas, ou seja, o uso funcional do estmulo pelo

sujeito, sem dependncia direta das caractersticas fsicas deste estmulo (FRIZZO;

ALVES; COLAFMINA, 2001; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

A intensidade do estmulo utilizado na captao dos PEALLs tambm produzir

variaes nas respostas obtidas. Um aumento na intensidade do estmulo promover um

aumento na amplitude e uma diminuio na latncia dos componentes N1, P2, N2 e P3 (mais

levemente). Isso sugere que o fator intensidade interfere diretamente nas medidas de

amplitude e latncia das ondas (COVINGTON; POLICH, 1996).

40

Atualmente, sabe-se da possibilidade de existncia de um pico duplo, ou seja, a

resposta do P300 sendo composta de dois componentes: P3a e P3b (FRIZZO; ALVES;

COLAFMINA, 2001). De acordo com os estudos de Squires, Squires e Hillyard (1975),

esses dois componentes resultariam de tarefas distintas, de ateno ativa e passiva, que

produzem valores de latncia e amplitude diferentes. O pico P3a corresponderia aos

processos de ateno passiva, e o P3b estaria relacionado aos processos de ateno ativa

(FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001).

Embora seja considerado um mtodo objetivo de avaliao, o P300 pode sofrer

interferncia de alguns fatores que contribuem para a variabilidade de suas medidas

(latncia e amplitude da onda) (JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

Podemos citar as variveis relacionadas ao teste: os parmetros (intensidade,

freqncia e tipo de estmulo acstico eliciador, filtro, tipo de tarefa, intervalo

interestmulo, as condies de registro (hora do dia) e ao sujeito (idade/maturao, sexo,

habilidade cognitiva, temperatura do corpo), personalidade, tipo de tarefa, estao do ano e

ingesto de alimentos anterior ao exame podem contribuir para a variabilidade de latncia

e amplitude do P300 (POLICH, 1991; CZAR; MUNHOZ, 1999; COLAFMINA et al.,

2000; JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

Alm das variveis j conhecidas e, portanto, controladas pelos examinadores,

chama-se a ateno a subjetividade envolvida na identificao e marcao da onda P300.

Isto ocorre pela falta de um ou mais critrios de anlise bem definidos e padronizados

(JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

Sabe-se que movimentos oculares interferem na captao da atividade eltrica

craniana; porm, pesquisas tm mostrado que orientar o sujeito avaliado para reprimir

"piscadas" de olhos no representa uma boa soluo para a reduo desses movimentos.

Tem sido mostrado que tal instruo produz uma diminuio de amplitude e aumento do

pico de latncia do P300, quando comparado ao resultante da no instruo (OCHOA;

POLICH, 2000).

Variaes nos valores do P300, como aumento da latncia (POLICH, 1991;

GOODIN, 1992) e diminuio da amplitude (VERLEGER et al., 1991), com o avano da

idade, tm sido freqentemente demonstradas. Hirayasu et al. (2000) estudaram o efeito do

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sexo na mudana do P300 com o aumento da idade, observaram maiores mudanas na

latncia do P300 (exceto em amplitude) em adultos do sexo masculino acima de 30 anos,

quando em comparao com o ocorrido em relao a adultos do sexo feminino de mesma

idade.

De acordo com os estudos de Barajas (1990), observa-se que at a faixa etria dos

18 anos, ocorre diminuio da latncia com a idade de 19 (ms/ano), sendo que na faixa de

6 a 14 anos essa correlao negativa de 2,4 ms. Esse decrscimo da latncia relacionado

idade rpido, e atinge seu plateau aos 20 anos. Na faixa de idade entre 18 e 78 anos,

ocorre um aumento da latncia, numa relao positiva de 1,25 ms/ano.

O estudo dos distrbios cognitivos e neurolgicos da demncia, depresso,

esquizofrenia e Mal de Alzheimer tem sido beneficiado pela pesquisa do P300

(PFEFFERBAUM et al., 1984; PATTERSON; MICHALEWSKI; STARR, 1988).

Polich, Ladish, Burns (1990) demonstram que o P300 influenciado pela idade e,

principalmente, pelo desenvolvimento cognitivo.

As aplicaes dos PEALLs abrangem o estudo dos distrbios de linguagem, de

aprendizagem e perceptuais, tidos atualmente como distrbios do processamento auditivo

(FRIZZO; ALVES; COLAFMINA, 2001).

Segundo Frizzo, Alves, Colafmina (2001), todas essas variveis devem ser

consideradas na pesquisa e interpretao dos potenciais em populaes clnicas, a fim de se

evitar equvocos durante as avaliaes.

O uso do P300 na prtica clnica ainda discreto. Porm, a possibilidade de

correlacionar aspectos do comportamento auditivo a fenmenos fisiolgicos observveis

promete despertar o interesse dos profissionais envolvidos com o estudo e avaliao das

habilidades auditivas (JUNQUEIRA; COLAFMINA, 2002).

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3. Artigo de Reviso Integrativa

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4.Mtodos

4.1. Desenho de estudo e casustica

Foram desenvolvidos dois delineamentos metodolgicos: um estudo de corte

transversal e um estudo do tipo srie de casos, com um grupo controle acoplado. Os dois

estudos derivaram de uma coorte Dislipidemias e sua associao com excesso de peso,

sedentarismo e estresse oxidativo: uma coorte de escolares de Recife-PE, iniciada em 2007.

Foram avaliados 256 adolescentes de 13 a 18 anos de idade de ambos os sexos,

matriculados em escolas pblicas estaduais e municipais do Recife-PE, no perodo de junho

de 2011 a dezembro de 2012. No entanto, os adolescentes da coorte que no foram

encontrados nas unidades escolares rastreadas no ano de 2010 pelo estudo, mas que tinham

registros de endereos fornecidos pela escola, foram contactados e avaliados em seus

domiclios.

Foram analisadas as habilidades auditivas (ordenao temporal e ateno auditiva), as

concentraes da Hb, o estado nutricional, a escolaridade dos pais e do escolar, o sexo, a

idade, o nvel scioeconmico e a repetncia escolar.

Os critrios de excluso adotados para o primeiro estudo foram: apresentar alguma

manifestao de doena aguda no momento da coleta do material biolgico para o exame

laborato