opinião - agencia.ecclesia.pt · 10.º aniversário da beatificação de alexandrina maria da...

37

Upload: trandiep

Post on 15-Dec-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

AGÊNCIA ECCLESIA Diretor: Paulo Rocha | Chefe de Redação: Octávio CarmoRedação: Henrique Matos, José Carlos Patrício, Lígia Silveira,Luís Filipe Santos, Margarida Duarte, Sónia NevesGrafismo: Manuel Costa | Secretariado: Ana GomesPropriedade: Secretariado Nacional das Comunicações Sociais Diretor: Cónego João Aguiar CamposPessoa Coletiva nº 500966575, NIB: 0018 0000 10124457001 82.Redação e Administração: Quinta do Cabeço, Porta D1885-076 MOSCAVIDE.Tel.: 218855472; Fax: [email protected]; www.agencia.ecclesia.pt;

04 - Editorial: Tolentino Mendonça06 - Foto da semana07 - Citações08 - Nacional14- Opinião.. D. Manuel Linda16 - A semana de... José Carlos Patrício18 - Entrevista D. José Saraiva Martins28- Dossier São João XXII e São João Paulo II

52 - Internacional58 - Cinema60 - Estante62 - Vaticano II64- Agenda66 - Por estes dias68 - Programação Religiosa69 - Minuto YouCat70 - Liturgia

Foto da capa: D.R.Foto da contracapa: Agência Ecclesia

2

Opinião

Franciscocanoniza JoãoXXIII e JoãoPaulo II[ver+]

D. José SaraivaMartins recordaPapas santos[ver+]

Papa defendetrabalhadoresitalianos[ver+] Tolentino Mendonça | D. ManuelLinda

3

O Espírito da Democracia

José Tolentino Mendonça

Ao fazer quarenta anos, o 25 de Abril quiscelebrar com grande festa. Tem havido um semnúmero de iniciativas: publicaram-se volumes dehistória contemporânea com enorme interesse; amúsica de intervenção voltou a ser escutada nasrádios; organizaram-se colóquios; rebuscou-seimagens e protagonistas no fundo silencioso dosarquivos. A par disso, desencadearam-sepolémicas, algumas que parecem aindainevitáveis, outras talvez nem por isso. Mas tudocabe numa festa.O 25 de abril de 74 constitui efetivamente ummarco. Trouxe-nos o regime democrático e o queele representa em termos de cidadania e decultura; operou a descolonização, conseguindouma saída pacífica e digna para conflitos quepareciam insolúveis; recolocou Portugal nodesígnio europeu, ajudando a vencer umpersistente isolacionismo. O 25 de abril qualifica-nos assim com uma herança imensa. E, semdúvida que, como sociedade e nação,precisamos de reencontrar-nos com essamemória, envolvendo nela as novas gerações.Mas o que o 25 de Abril nos legou não épropriamente uma obra acabada, que nos cabeapenas conservar. Pensemos na democracia.Claro que a instauração do regime representaum extraordinário momento histórico. Mas ademocracia não está feita. É em cada dia, emcada ciclo que ela se constrói e reinventa parapoder

4

cumprir-se. A democracia temmuitas ameaças, que mesmo nãosendo ameaças ao sistema, sãoofensas ao espírito da democracia:e elas provêm sobretudo dapobreza, do desemprego, daexclusão e da injustiça. Cabe-nos atodos, mas de forma particular aosque democraticamente nosrepresentam, zelar pela saúde dademocracia. Quarenta anos

depois da revolução de abril, o piorque nos podia acontecer eracontentarmo-nos por vivermosformalmente num estadodemocrático e abandonarmos asinquietações do espírito dademocracia, que nos obriga a fazerfesta, é verdade, mas também aarregaçar as mangas. Como diziaSophia de Mello Breyner Andresen,o 25 de Abril é o “dia inicial”.

5

Comemorações do 33.º título de campeão português do Benfica Lisboa, 20.04.2014 © Slbenfica.pt “A Universidade do Minholamenta profundamente osucedido, apresenta às famíliasdos estudantes falecidos assuas mais sentidas condolênciase exprime a sua solidariedadepara com todos aqueles queforam afetados por esta tragédia”Comunicado da instituição deensino superior u após o acidenteque provocou a morte de trêsestudantes, Braga, 23.04.2014

“O grande desafio que hoje secoloca à sociedade portuguesa égarantir que a disciplinafinanceira e orçamental sejarespeitada”, mas também que “ajustiça distributiva e o Estadosocial sejam preservados egarantidos, em nome dadignidade de todos”Guilherme d’Oliveira Martins,presidente do Tribunal de Contas,em declarações à Lusa,23.03.2014

6

"Não é restituir às pessoas ossalários que elas tinham, não éisso que eu estou a dizer. Temosde remover estes entorses queesta forte progressividade criou,e fazer a função pública respirar,desbloquear as progressões,desbloquear os prémios demérito"Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro, durante conferênciasobre o "pós-'troika'" promovidapelo Diário Económico, Lisboa,23.03.2014 “Está a constatar-se que é umamoda deste Governo encerrarserviços públicos que vãocontribuindo para adesertificação do interior dopaís”Raul Castro, presidente daComunidade Intermunicipal daRegião de Leiria, 23.03.2014 “Em Portugal, os projetosextremistas não vingam, aocontrário de outros paíseseuropeus, e essa é uma virtudeda nossa jovem democracia”Rui Ramos, historiador, ementrevista ao programa ‘Terça àNoite”, da Renascença, 22.03.2014

7

Misericórdias criam fundopara ajudar instituiçõesA União das MisericórdiasPortuguesas (UMP) e a Santa Casada Misericórdia de Lisboa (SCML)assinaram esta quarta-feira noBarreiro um protocolo decooperação para ajudar asmisericórdias endividadas por causado desenvolvimento de novasrespostas sociais. O fundo ‘RainhaD. Leonor’ tem uma atençãoparticular à área dos cuidadoscontinuados e segundo o presidenteda UMP Manuel de Lemos,representa um momento “inédito ehistórico”.“Este acordo é inédito e histórico,porque significa um reencontro coma história, já que a Santa Casa daMisericórdia de Lisboa foi a primeiraa nascer, mas as outras que secriaram em todo o país cresceramtendo em conta o seu exemplo”,disse à Agência ECCLESIA.O fundo pretende “apoiarfinanceiramente as MisericórdiasPortuguesas na finalização daconstrução e/ou adaptação deunidades de cuidados continuadose outros equipamentos sociais

comprovadamente necessários paraa cobertura da resposta aoscidadãos de todo o país”, refere oprotocolo.Manuel de Lemos considera queeste acordo é “um exemplo demodernidade, de solidariedade e decoesão” dado que se trata de umasolução “em que todos ganham”, ousejam “ganham as instituições,porque o fundo Rainha D. Leonorlhes vai permitir melhorar a suasituação financeira, e a Santa Casada Misericórdia de Lisboa e aspessoas de Lisboa ganham também,porque a partir de agora as pessoaspodem ser colocadas noutros locaisao longo do país”.O provedor da SCML, PedroSantana Lopes referiu à AgênciaECCLESIA que a aproximação entreinstituições que “têm muito emcomum” é “muito importante” e que“não faz sentido nenhum no tempode crise que se vive atualmente queduas entidades ‘irmãs’ nãotrabalharem em conjunto”.“Com este acordo vamos por emconjunto os nossos esforços

8

e tentar encontrar os reforçosfinanceiros para conseguir colocarnas unidades paradas,equipamentos e cuidados paramuitas pessoas que precisam deapoio e ajuda”, acrescenta.Presente na assinatura desteprotocolo esteve o ministro daSolidariedade, Emprego eSegurança Social, Pedro MotaSoares, que disse considerar esteacordo “importante”, dado quesegue “um caminho de

contratualização da resposta social”.“Muitas vezes que o Estado tentafazer por si faz pior, com menosqualidade e mais caro e por isso éimportante que o Estado consigacontratualizar essa resposta socialcom instituições sociais, ajudando àsustentação financeira dessasinstituições”, disse o governante aosjornalistas.

9

Alexandrina de Balasar:10.º aniversário da beatificaçãoO Santuário Alexandrina de Balasar,na Arquidiocese de Braga,comemora entre hoje e amanhã o10.º aniversário da beatificação deAlexandrina Maria da Costa. “Estabeata tem uma mensagem muitoforte, de alguém que se ofereceu aDeus pela humanidade, consagrou-se pelos pecadores e pelas almas eao mesmo tempo passa umamensagem sobre a importância daEucaristia porque ela viveu pelaEucaristia e da Eucaristia eofereceu todo o seu sofrimento peloamor a Deus, pela remissão esalvação das almas”, disse hoje àAgência ECCLESIA o padre ManuelNeiva, pároco de Balasar.O sacerdote acredita que nostempos conturbados de crise quePortugal vive, “o exemplo destajovem, da sua fé total em JesusCristo, é fundamental”. “Éimpressionante verificar que otúmulo da beata Alexandrina deBalasar é continuamente visitadopor peregrinos todos os dias, sendoque no domingo chegam a passarcerca de 2500 pessoas

pelo santuário”, conta o padreManuel Neiva.Alexandrina de Balasar foibeatificada a 25 de abril de 2004pelo Papa João Paulo II, a quem sereferiu como “esposa de sangue”,porque ao longo da sua vida reviveu“misticamente a paixão de Cristo eoferece-se como vítima pelospecadores, recebendo a força daeucaristia que se toma o únicoalimento dos seus últimos treze anosde vida”.O Papa João Paulo II lembrou entãoque “pela esteira da BeataAlexandrina, expressa na trilogia‘sofrer, amar, reparar', os cristãospodem encontrar estímulo emotivação para nobilitar tudo o quea vida tenha de doloroso e tristecom a prova maior de amor:sacrificar a vida por quem se ama”.Uma mensagem que segundo opadre Manuel Neiva, pároco deBalasar e presidente da FundaçãoAlexandrina de Balasar, “é muitoatual”.

10

Fátima lembra João XXIII e JoãoPaulo IIO Santuário de Fátima vai associar-se este domingo às cerimónias decanonização de João XXIII e JoãoPaulo II com uma Eucaristia às11h00. Em comunicado enviado àAgência ECCLESIA, osresponsáveis do santuário marianoreferem que a instituição “exulta dealegria e dá graças a Deus” pelosdois futuros santos, recordando-oscomo “exemplos e testemunhos” doque significa “ser-se cristão”.Durante a Missa no Santuário deFátima, que será presidida pelovice-reitor do recinto, padreEmanuel Matos Silva, “será feita aevocação das três peregrinações deJoão Paulo II a Fátima, em

1982, 1991 e no ano 2000”.Os participantes vão ser convidadosa rezarem uma breve oração,pronunciada em Fátima por JoãoPaulo II”, realça a mesma nota.A Missa de canonização dos doisPapas, no Vaticano, contará com apresença do bispo de Leiria-Fátima,D. António Marto, do bispo eméritoda diocese, D. Serafim FerreiraSilva, e do reitor do Santuário,padre Carlos Cabecinhas.(Fotografias: D. Angelo RoncalliI naperegrinação de 13 de maio de1956; João Paulo II naquela que foia sua última peregrinação aoSantuário de Fátima, a 13 de maiode 2000)

11

A Agência ECCLESIA escolhe sete acontecimentos que marcaram aatualidade eclesial portuguesa nos últimos dias, sempre atualizadosem www.agencia.ecclesia.pt

12

Patriarca latino de Jerusalém vai presidir à peregrinação do 13 de maio emFátima

Cónego António Janela evoca João XXIII, que marcou a sua formaçãosacerdotal

13

A Europa e o regresso do iluminismo

D. Manuel Linda Bispo das ForçasArmadas e de Segurança

Vamos ter eleições para o Parlamento Europeu.Se é verdade que os grandes agentes demudança quase sempre se situam fora do poderlegislativo, nem por isso se pode desvalorizar aimportância deste sector. Particularmente nestaépoca em que a Europa parece desencontradaconsigo mesma e a navegar à sirga, apenasarrastada pela idolatria de um capitalismofinancista, mesmo que nele não creia. Destemodo, os cristãos, quer os eleitores, quer os quese propõem ser eleitos, são chamados a intentaruma séria reflexão ética, já que estão em jogovalores que constituem o homem e a sociedadeenquanto tal ou os negam radicalmente.Sabemos que, quanto aos conteúdos, não háuma política cristã, como não há uma químicacristã ou um futebol cristão. Não obstante, existeuma singular sensibilidade, um específicoconjunto de referências que têm de estarpresentes e balizar a actuação legislativa eexecutiva. A Sagrada Escritura parece apontarpara as seguintes, definidas de forma sintética eclara: respeito pelos pobres, defesa dos débeis,protecção dos estrangeiros, desconfiança dagrande riqueza, condenação do domínio exercidopelo dinheiro, destruição dos poderes totalitáriose defesa acérrima da dignidade de toda a vidahumana.Se assim é e na medida em que o é, então umamente cristã não pode ausentar-se

14

desta envolvência. E mesmo os nãocristãos poderão reconhecer nestenúcleo valores humanos básicos:pelo menos na sua faceta imediata,eles situam-se mais a nível daantropologia que da teologia. Comotal, para todos, deveriam constituirfronteiras inultrapassáveis.Curiosamente, por acção ouomissão dos dirigentes, nos últimostempos, a Europa comunitáriaparece ter trocado estas referênciaspela política imposta por novosgurus sociais que quase sempre sesituam num campo novo: oresultante da fusão da economiacom o regresso da cultura doIluminismo. Efeito: uma absoluta esoberana insensibilidade àspessoas concretas, traduzida namais «normal» aceitação dapobreza, mormente entre os idosose os estrangeiros. A forma como aEuropa se comportou em relaçãoaos três Estados intervencionados(Irlanda, Portugal e Grécia) é dissoexemplo acabado.E porque falamos em Iluminismo?Como sabemos, em termos muitosimples, este movimento culturalconsistiu numa espécie de fé nacapacidade da razão

para resolver todos os problemashumanos. Só que, aplicado à economia, geroua mais completa desregulamentaçãoliberal-capitalista, porque osadministradores e gestores, queraramente são os donos dasempresas que dirigem, se atribuemestatutos de excepção e se pagam asi mesmos em função da suaesperteza ou capacidade deaplicarem uma relação de mercadoinsensivelmente cega, apenasavaliada em função do que,quantitativamente, conseguemsugar.Como responder a esta esclerosadae anti-humana cultura iluminista?Com uma outra cultura alternativaque valorize o justo lucro, massempre balizada pelos critériosacima referidos: a “economia derosto humano” só pode ser fruto deuma «cultura de rosto humano».Os nossos dirigentes europeuspossuirão a força anímica para asintentar? A ver vamos. Mas eu,pessoalmente, tenho medo que umaparte significativa não aceite estedesafio histórico e se enlameie naobsessão dos temas típicos daideologia do género.

15

O que resta da revolução de abril

José Carlos PatrícioAgência ECCLESIA

Numa semana marcada pela comemoração dos40 anos da revolução de Abril, importa reter osresultados do inquérito realizado esta semanapela Universidade Católica Portuguesa a 1117portugueses, de norte a sul do país.De acordo com o estudo, 83 por cento dosinquiridos estavam insatisfeitos com ofuncionamento da democracia e 62 por centoapontava para o facto de Portugal ter-setornado, desde 1974, num paísprogressivamente mais pobre.Perante estes dados, que colocam em causa nãoo regime democrático em si mas o seufuncionamento - e aqui o exemplo mais recente éa forma como o poder político tem vindo a lidarcom a crise económica – o 40.º aniversário do 25de abril deveria ser uma oportunidade para umareflexão geral acerca do tipo de rumo que o paíspretende para o futuro.Um dos “capitães de abril”, Vítor Crespo,salientava esta semana que nunca haveria umademocracia completa enquanto subsistisse porexemplo o fosso atual entre ricos e pobres, ealertava para o perigo do regime resvalar para oautoritarismo.De facto, os últimos anos e as últimas decisõespolíticas fizeram com que a generalidade dosportugueses sentisse que não eram tida nemachada em diversas matérias, essenciais para asua vida

16

quotidiana e em muitos casosmesmo à própria sobrevivência.Onde tem estado, no meio dasmedidas de austeridade, ademocracia enquanto forma deorganização em que a tomada dedecisões corresponde à vontadegeral?A democracia tem de ser mais doque o simples poder de escolha deum Governo, de uma cor partidáriaem vez de outra, de um conjunto depromessas em vez de outras, quemuitas vezes acabam por serabandonadas porque “a situaçãoera pior do que parecia” ou “aconjuntura mudou”.Se assim não for, qual é a validadede uma eleição, se

os pressupostos que estavam emcima da mesa são completamentealterados?Recordar a “revolução dos cravos”,mais do que uma disputa dediscursos ou um esgrimir deargumentos, deve ser encaradocomo uma oportunidade essencialpara educar as novas geraçõespara a importância de respeitarem edefenderem os valores daverdadeira democracia.Só assim teremos tambémprogressivamente elites políticasmais empenhadas e comprometidascom o povo e não com outras“conquistas”, que não têm nada aver com o bem-comum.

17

Cardeal português evoca dois PapassantosD. José Saraiva Martinsconviveu com João XXIII e foicolaborador de João Paulo II,tendo estado ligado ao processode canonização dos dois, aoserviço da Cúria Romana Agência Ecclesia (AE) – Comoacompanhou o processo decanonização do Papa João XXIII edo Papa João Paulo II?D. José Saraiva Martins (JSM) –Conheci muito bem os dois Papas,tanto João XXIII como João Paulo II.Tive relações profundas com osdois, em especial com João Paulo II,durante os meus anos na CúriaRomana, como secretário daCongregação para a EducaçãoCatólica e depois como prefeito daCongregação para as Causas dosSantos. Foram dois papas queconheci bem, não só do ponto devista pastoral, mas como pessoas.São duas personalidadesextraordinárias. AE – Como acompanhou opontificado de João XXIII, na alturacomo professor e reitor nasuniversidades romanas?JSM - Eu era professor naPontifícia Universidade Gregoriana(PUG). Uma vez

encontrei-me com João XXIIIdemoradamente e ele perguntou-meo que eu fazia em Roma... Eu disse-lhe que era professor naUniversidade ao que ele respondeucom espanto: “Já? Tão jovem e já éprofessor?”Ficou admirado com a minhajuventude! Era uma pessoa muitosimpática, com uma linguagem muitopopular. Era o Papa bom, muitosensível e próximo do povo. A genteamava-o profundamente, era comoum pai, um pai bom.Tenho uma ideia muito agradável,muito profunda da personalidadehumana, não só pontifícia, mashumana de João XXIII. AE – Recorda a eleição de JoãoXXIII e o início do seu pontificado?JSM – Recordo-me bem! Sucedeuao Papa Pio XII, de quem erabastante diferente do ponto de vistahumano e no modo de agir, massem se contradizerem.Os papas são todos diferentes unsdos outros, consoante a suapersonalidade. Completam-semutuamente. João XXIII completou opontificado de Pio XII, o PapaPancelli, para mim um dos grandesPapas, senão o maior da épocacontemporânea!

18

19

AE – O pontificado de João XXIIIficou incontornavelmente marcadopela convocação do ConcílioVaticano II…JSM – João XXIII ficou marcadocomo sendo o autor do ConcílioVaticano II, que foi um verdadeiroPentecostes para a Igreja, oprincípio de uma renovaçãoprofunda da comunidade eclesial.No entanto, a ideia do Concilio nãoé propriamente de João XXIII. A ideiado Concílio é do papa Pio XII. Elepensou convocar um ConcílioEcuménico para rever váriosproblemas da Igreja, naquele tempo.Pensou fazer um Concílio e nomeouuma comissão teológica paraestudar o problema. Simplesmentetinha já a sua idade e faleceu. VeioJoão XXIII e retomou a ideia doConcilio e naturalmente convocou-o. AE – Isso tira algum mérito a JoãoXXIII e ao seu pontificado?JSM – Não tira mérito, antes pelocontrário. Foi um sinal decontinuidade do pontificado do PapaPio XII num campo tão importantecomo a pastoral da Igreja.

AE – Que relevo têm as encíclicassociais de João XXIII, a promoçãoda paz ao longo do seu pontificado?JSM – Encontramos parte do seupensamento nos documentos doConcílio Vaticano II, sobre arenovação litúrgica (a SacrosantumConcilium), sobre a Igreja e asrelações entre Igreja e o mundo, naConstituição Gaudium et Spes, queé um documento muito importante eque exprime o pensamento de JoãoXXIII. AE – A realização do Concílio e oestilo do Papa gerou algumaviragem no diálogo da Igreja com asociedade?JSM – Certamente. Era um Papamuito próximo das pessoas. Não seconsiderava uma pessoa superiorou longe da sociedade. Era ummembro da sociedade, via muitobem quais os problemas queexistiam entre a Igreja e o Estado, omundo político e procurouaprofundar vários problemas,inclusivamente os que implicavam aação pastoral da Igreja. Deixou-nosdocumentos importantíssimos.

20

AE – O que é que na sua opiniãofaz de João XXIII um Papa santo?JSM – Observei sempre em JoãoXXIII a simplicidade evangélica. Erarealmente como Cristo. Estavasempre connosco. Para mim erauma interpretação autêntica doEvangelho e renovou a imagem deCristo, no seu tempo e no seupontificado. AE – De João Paulo II, terámemórias mais próximas, maispessoais?JSM – Eu mantive relações muitopróximas com João Paulo II. Foi eleque me pediu para ficar em Roma.Depois de uns anos como professorna Universidade PontifíciaUrbaniana (UPU), tinham-me pedidopara

ir para Lisboa para a UniversidadeCatólica Portuguesa, para aFaculdade de Teologia. O patriarcade então, o Cardeal Cerejeira,andava à procura de professores deTeologia e soube que em Romahavia um professor português naUPU e escreveu várias cartas apedir que fosse para a faculdade emLisboa.João Paulo II nomeou-me para aCongregação para a EducaçãoCatólica, que é o ministério daeducação da Igreja, e depois paraprefeito da congregação para asCausas dos Santos que, segundoele, era o dicastério mais importanteda Igreja, uma vez que trata dasantidade, da santidade dosmembros da Igreja.

21

AE – A sua permanência em Romaestá então muito ligada a JoãoPaulo II?JSM – Devo-a a ele, assim comodevo a João Paulo II o meu serviçona Santa Sé.Tive com o Papa um relacionamentomuito próximo, com quem estivemuitas vezes em almoços detrabalho. Ele também era de umasimplicidade extraordinária e falavaconnosco como falamos com umamigo.

Sempre admirei nele a suahumanidade. João Paulo II foi umPapa profundamente humano.A sua vida consistiu em defender epromover a pessoa humana, a suadignidade, e defender com coragem,muita coragem, por vezes heroica,os direitos fundamentais e naturaisdo homem. Direitos inalienáveis quetêm de ser respeitados epromovidos até ao fim.Hoje fala-se muito também

22

do problema da igualdade entrehomem e mulher. E estaproblemática foi enfrentada porJoão Paulo II, com espírito de umacompreensão extraordinária. Era umPapa moderno, humano,profundamente humano. Aexplicação para mim é simples: eraum santo. Tinha uma fé profunda,concreta, não abstrata. Era umsanto enamorado de Cristo.Como santo era também humanoporque, ao contrário do que sepensa, são todos humanos. Asantidade e a humanidade não sãoduas realidades contrapostas, masintimamente unidas, inseparáveis. Asantidade para mim não é senão aplenitude da humanidade e ossantos são os que viveram emprofundidade à luz do Evangelho aprópria humanidade. Foi também oque fez João Paulo II: Um santomuito humano, que o exprimiu detantas maneiras. AE – Quais as essenciais, ao longodo seu pontificado?JSM - Foi um Papa missionário,apostólico, evangelizador. Para mimfoi o São Paulo dos temposmodernos. Foi ele que começou asviagens apostólicas por todo

o mundo e, à semelhança de SãoPaulo, evangelizou os gentios dehoje.As suas viagens por todos oscontinentes não eram viagensturísticas, mas apostólicas,missionárias e evangelizadoras.Sempre tive uma grande admiraçãopor João Paulo II. AE – Recorda-se algum momentode encontro com João Paulo II queo tivesse marcado particularmente?JSM – Lembro-me de um factoimportante do ponto de vistahumano. Depois de ter sido eleitoPapa convocou todos os reitoresdas Pontifícias UniversidadesRomanas, entre as quais a UPU. Euera o chefe dos reitores das váriasUniversidades e discutimosprofundamente os vários problemasdas universidades de Roma. Depoisde uma hora, de discussões, eletomou a palavra e disse: “Agoravamos começar a segunda parte donosso encontro, que é ainda maisimportante do que a primeira. Asegunda parte é a ceia todos nós”.Um gesto extraordinário, de umagrande simplicidade!Tenho outras lembranças com ele esempre que falávamos era comoentre amigos!

23

AE – O que dizia João Paulo IIsobre Portugal. Que imagem tinhaele do nosso país?JSM – Muito boa. Para ele foisempre uma nação fiel à Santa Sé eao Papa e exprimia-o de muitasmaneiras. E quando se fala dePortugal, fala-se naturalmente deFátima. Ele foi um homemenamorado de Fátima. Foi váriasvezes a Fátima e atribuiu sempre aNossa Senhora de Fátima aproteção e o facto de não termorrido no dia do atentado (13 demaio de 1981, ndr). Ele dizia quetinha sido Nossa Senhora a desviara bala para que ele não morresse.Trouxe uma imagem de NossaSenhora e colocou-a no palácioapostólico de Castel Gandolfo.Depois beatificou os doispastorinhos, Jacinta e Francisco,processo que eu acompanhei.João Paulo II estimava muitoPortugal, como país e naçãocatólica. AE – Por ocasião do atentado,esteve com ele nos dias imediatos?JSM – Não. Ele foi para o hospital etinha de descansar. Ainda ficou nohospital bastante tempo. Na altura,o que podíamos fazer, e fazíamos,era rezar por ele.

AE – Os anos subsequentes dopontificado, depois do atentado,foram de alguma expectativa sobre apossibilidade de João Paulo IIcontinuar ou não? Asconsequências que aquele atentadopoderia ter na sua saúde?JSM – Não há dúvida de que oatentado teve as suasconsequências. Ele suportousempre aquela situação como umverdadeiro crente. Como umaespécie de associação oureprodução da Paixão de Cristo. AE – também nos últimos anos depontificado?JSM – Também e mais ainda porquehavia outros aspetos da sua saúdenada boas. Todos se lembram dodia em que ele foi à janela do seuapartamento, quis falar à multidãopresente na Praça de São Pedromas não saiu uma palavra. Foi ummomento, do ponto de vistahumano, trágico. Só quem viveuesses momentos com ele se dáconta do significado profundo para oPapa. AE – E foi a melhor decisão doPapa João Paulo II levar o seupontificado até à sua morte, talcomo aconteceu?JSM – Sim. É preciso ter em contaum facto importante: num certo

24

momento ele pensou demitir-se.Pediu conselhos aos colaboradoresmas disseram-lhe que seria melhornão se demitir. AE – Falou consigo sobre isso?JSM – Não. Diretamente não. Eledeu-se conta da sua situação.Também já Paulo VI tinha pensadodemitir-se e nomeou uma comissãopara estudar o problema, que odesaconselhou. A demissão de umPapa não é uma novidade absoluta.Bento XVI seguindo a mesma linha,para bem da Igreja, e achou melhordemitir-se. É o código de direitocanónico, o cânone 83 que dizexpressamente que o papa tem odireito de se demitir se achar que éconveniente para o bem da Igreja eninguém o pode impedir.

AE – Num pontificado tão longocomo o de João Paulo II, algumacoisa ficou por fazer?JSM – Alguma coisa fica sempre porfazer. A Igreja tem de darimportância à pastoral no momentopresente. Há sempre problemas, talcomo há sempre problemas nasociedade. A Igreja tem de viver notempo presente, por isso, tem defalar ao homem de hoje, com alinguagem de hoje. A de ontem jánão existe.Naturalmente isso pede umaadaptação e levanta problemas. Agrande preocupação da Igreja éajudar a resolver os problemas doponto de vista pastoral e eclesial. OPapa tinha essa ideia muito clara.

25

AE – João Paulo II terá enfrentadoda melhor forma o problema dapedofilia na Igreja? Ter-se-iaapercebido dos problemas eproposto uma resolução?JSM – Este Papa tão próximo daspessoas, deu-se conta do problemae procurou resolvê-lo. Mas nemtudo o que de bom faz um Papa éreproduzido na imprensa. Eleinterveio várias vezes por meio daCongregação para a Doutrina daFé. A Igreja preocupou-se sempreporque este é um problema real.A Igreja é geralmente acusada pornão ter denunciado os sacerdotespedófilos, mas isso não é verdade.Ela procurou com muito cuidadointervir. E interveio, mais do queuma vez em vários casos, nãopublicamente, tendo sido sábia aoseguir um caminho discreto. AE – O que faz deste Papa, àsemelhança de João XXIII, um Papasanto?JSM – João Paulo II foi santo porqueseguiu o Evangelho. Procurar asantidade consiste em seguir oEvangelho, pôr em prática o que dizCristo. Cumprir a Palavra de Deus.A santidade não é

uma coisa extraordinária. É muitosimples. Consiste em viver oEvangelho de Cristo, seguir a Suavoz, aplica-la no seu dia-a-dia. Asantidade consiste nisso. E JoãoPaulo II viveu em profundidade oEvangelho, em todos os sentidos ecircunstâncias da sua vida. AE – O Papa Francisco dispensou aexistência de um milagre atribuído aJoão XXIII para concluir o processode canonização. É a opção maisacertada na sua opinião?JSM – Certamente. O Papa podefazer uma exceção se achar maisimportante para a Igreja nestemomento.Segundo os estatutos em vigor,requer-se um milagre para abeatificação e outro para acanonização feito depois dabeatificação. É uma norma, não é dedireito divino, mas eclesiástico. OPapa pode, se quiser e acharconveniente em qualquer momentoda história, dispensar o milagre. Sónão pode dispensar a heroicidadedas virtudes.Beatificar ou canonizar não é senãoproclamar a santidade daquelapessoa, do candidato

26

aos altares. Um milagre não estáunido á beatificação oucanonização. É uma espécie deconfirmação por parte de Deus deque aquela pessoa praticou asvirtudes em grau heroico.A Igreja achou, e muito bem, que seexija ordinariamente um milagrepara a beatificação e canonização.As virtudes heroicas têm de existirsempre. O milagre não é necessáriopara a canonização. E o PapaFrancisco dispensou o milagre paraJoão XXIII. AE – No caso de João Paulo II oprocesso conclui-se com um milagre…JSM – A cura de uma pessoa comum aneurisma cerebral da CostaRica é atribuído à intercessão

de João Paulo II.Para que uma cura sejaconsiderada milagrosa é precisoque seja completa, instantânea eduradoura à luz da ciência médicaatual. Tem de aparecer claramenteque aquela cura foi feita porintercessão de alguém. AE – A comunidade dos crentes queenriquecimento tem com acanonização de dois Papas?JSM – São dois Papas com umpapel importante na aplicação doConcílio: O que inaugurou e um dosque mais contribuíram para aaplicação na vida da Igreja doConcilio. Este aspeto conciliar queune os dois Papas Santos.

27

A personalidade mais relevantedo século XXO Papa João Paulo II é apersonalidade mais relevante doséculo XX. Levou a palavra deDeus, palavra de fraternidade,palavras de amor, de tranquilidade,de serenidade, de bem-estar atodos os continentes. Empreendeudesde o início do seu pontificadouma ação vigorosa na Igreja etambém no mundo político ediplomático. As suas 104 viagensem todo o mundo contaram com aparticipação de enormes multidões,bem como as Jornadas Mundiais daJuventude, uma criação que aindahoje tem um grande sucesso.Tive a alegria de o receber na suaprimeira viagem ao México (janeirode 1979). Não foi fácil a preparaçãodesta primeira visita, porque aSanta Sé não tinha relaçõesdiplomáticas com o México, ospadres não podiam usar o hábitosacerdotal, era um delito celebrar aSanta Missa fora dos templos eainda mais estrita era a situaçãopara o clero estrangeiro.Por outro lado, João Paulo II,

eleito a 16 de outubro de 1978,começava o seu ministério pontifícioe os bispos da América Latinatinham a reunião do CELAM, emPuebla de los Angeles (IIIConferência Geral do EpiscopadoLatino-Americano).O presidente da reunião, osprelados da Cúria Romana e odelegado apostólico da Santa Sé noMéxico foram recebidos pelo Papa,para decidir o quê fazer. Osprimeiros não estavam a favor; odelegado apostólico disse ao SantoPadre que era realmente difícil, masque a sua visita seria um sucesso.Então João Paulo II decidiuparticipar na reunião, enviou umacarta ao presidente da República,José Lopez Portillo, que lhe foientregue em mão pelo delegadoapostólico, comunicando-lhe a suaintenção de participar no referidoencontro como Sumo Pontífice daIgreja Universal.A semana passada no México foi umgrande sucesso para todos –bispos, sacerdotes, religiosos,religiosas, membros do corpodiplomático e também

28

para membros do Governo. Defacto, o ministro dos NegóciosEstrangeiros, apesar de se teroposto à visita do Papa até aoúltimo momento, abordou adelegação apostólica para pedir queo Santo Padre prolongasse a suaviagem, visitando Monterrey, porqueera uma das mais importantescidades do México e ele nãoconseguia responder negativamentea tantos pedidos.A visita do Santo Padre foi umgrande êxito. El SalvadorA 6 de março de 1983, João Paulocelebrou a Missa em San Salvador ena sua homilia convidou todos ecada um dos salvadorenhos aserem “artesãos da paz e dareconciliação”. O país encontrava-se numa horrível guerra fratricida. OPapa chamou os cidadãos aconstruir um futuro de esperança,com a “sabedoria da paz”. Recordouas ideologias radicais, que nãorespeitam a pessoa humana – naqual se encontra escrita a mão docriador – e proclamou: “Nunca maisa guerra”.Na segunda visita, em fevereiro

de 1996, o Santo Padre convidou ossalvadorenhos a construir juntosuma era de paz, uma sociedadenova e a renunciar ao ódio, àviolência; a começar um novocaminho de fraternidade e deprogresso social procurando o bemsocial de todos.As orações e as palavras de SãoJoão Paulo II foram bem acolhidas.As mensagens dadas ao povo e aosjovens ficaram no coração de muitose começou-se a procurar o modo dechegar à paz e lá se chegou, mesmocom dificuldade. Cardeal Manuel Monteiro de Castro

29

João XXIII, «humildade»e capacidade de diálogoO Papa João XXIII, Angelo GiuseppeRoncalli, futuro santo, deixou umlegado de “humildade” e “diálogo”,segundo o cardeal português D.Manuel Monteiro de Castro.“Angelo Roncalli, sacerdote,diplomata, bispo, Papa, evidencia-se pela humildade, amor ao diálogo,amor a Cristo, à Igreja e àhumanidade inteira”, refere àAgência ECCLESIA o penitenciário-mor emérito da Santa Sé, que talcomo João XXIII passou váriasdécadas ao serviço diplomático doVaticano.O Papa italiano, beatificado porJoão Paulo II em setembro de 2000,nasceu em 1881 na localidade deSotto il Monte, Bérgamo, onde foipároco, professor no Seminário,secretário do bispo e capelão doexército durante a I Guerra Mundial.João XXIII iniciou a sua carreiradiplomática como visitadorapostólico na Bulgária, de 1925 a1935; foi depois delegado

apostólico na Grécia e Turquia, de1935 a 1944, e Núncio Apostólico naFrança, de 1944 a 1953.“Sobressaiu pela sua capacidadeconciliadora, pelo seu interesseecuménico, sinceridade e coragem,manifestada em salvar a vida ajudeus durante a II Guerra Mundial”,lembra o cardeal Monteiro deCastro.Em 1953, Angelo Roncalli foinomeado patriarca de Veneza e nodia 28 de outubro de 1958 foi eleitoPapa, sucedendo a Pio XII.“A vida diplomática, em diversospaíses, enriqueceu naturalmente osdotes de Angelo Roncalli e o seumodo de atuar”, destaca o cardealportuguês a respeito de João XXIII,que “convocou o Concilio Vaticano IIpara explicar a doutrina da Igreja aomundo atual e publicou oitoencíclicas, de grande valor como a‘Mater et Magistra’ e a ‘Pacem inTerris’”.O homem que alimentava “apossibilidade da paz universal, dafraternidade entre os homens”defendia “uma atuação não

30

para fazer-se ver, mas para levar atodos a paz própria dos filhos deDeus”, acrescenta D. ManuelMonteiro de Castro.O penitenciário-mor emérito daSanta Sé esteve na Arquidiocese deBérgamo a 24 de junho de 2012para presidir à festa patronal daparóquia de São João Batista, nodia seguinte, visitar a casa dos paisdo Papa João XXIII.

“Notei uma fotografia junto a umacarta escrita à mão. Aproximei-me eli: ‘Queridos pais, celebrei 50 anosde sacerdote e não vos escreviporque o tempo não me permitiu,mas quero dizer-vos que li muitoslivros mas o melhor da minha vidafoi o vosso, foi o que aprendiconvosco em casa. A família é amelhor escola’”, relata.

31

É impossível esquecer o olhar doPapa João Paulo II, o Peregrino deFátimaForam momentos inesquecíveis.João Paulo II esteve no nosso paísem três ocasiões (e numa breveescala técnica no aeroporto deLisboa) e cruzou-se com largascentenas de pessoas. Quem teve oprivilégio de falar com ele, de oescutar, nunca mais se esqueceudesses momentos. Mesmo quetenham sido apenas brevessegundos. O Papa que veio doLeste não deixou nunca ninguémindiferente. Quase todos os querecordaram os momentos em queestiveram com Karol Wojtyla foramunânimes em lembrar um olharúnico, penetrante, que chegava àalma, que transmitia uma forçaenorme e uma serenidade invulgar.Foram três as visitas ao nosso país.Em 1982, 1991 e no ano 2000. Foisempre em maio e apesar detambém ter estado em Braga,Coimbra, Lisboa, Porto, Vila Viçosa,Açores e Madeira, podemos dizerque, de certa forma, João Paulo IInunca saiu do Santuário de Fátima,esteve sempre com ajoelhado naCapelinha das Aparições junto

da imagem de Nossa Senhora deFátima. A ela agradeceu a vida, oter sobrevivido ao atentado de 13de maio de 1981, facto que iriarevelar-se marcante para o resto doseu pontificado e, de certa forma,iria moldar até a própria história dahumanidade.O olhar. Em 2008 quando comecei aescrever o livro “João Paulo II, oPeregrino de Fátima”, procurandorecolher, histórias e testemunhosque nos permitissem ficar aconhecer os bastidores das viagensdo Santo Padre a Portugal,entrevistei dezenas de pessoas.Desde motoristas que o conduziram,a hospedeiras que o acompanharama bordo dos aviões da TAP, agovernantes, polícias, jornalistas,crianças, padres, religiosas… Empraticamente todos essesdepoimentos, em todas essasmemórias desses encontrosinolvidáveis, estava a recordação doolhar de João Paulo II, o tal olharque descia até ao fundo da alma.Oiçamos Aura Miguel, hoje jornalistada Rádio Renascença, entãoestudante de Direito

32

na Universidade Católica: “Estavana Católica. Fazia parte do coro.Quando ele chegou, vinha deautocarro, olhei para o Papa e eleolhou para mim. Olhou para mim,tenho a certeza absoluta disso.”Outro testemunho, agora doprofessor Narana Coissoró, que seencontrou com João Paulo II, naNunciatura, em representação dacomunidade hindu: “O Papa tinhauma personalidade magnética. Umapessoa olhava para ele e quaseficava conquistada. Era o olhar.Criava logo um sentimento dereverência…” Carlos Carneiro, hojesacerdote jesuíta, foi

escolhido para entregar uma prendasimbólica ao Papa em nome dajuventude portuguesa. Foi uminstante que mudou a sua vida.“Quando me devia levantar e retirarpara dar lugar às outras pessoasque vinham na procissão doofertório não me consegui levantar,o meu corpo não me obedecia econtinuei de joelhos (…). Foi nesseinstante que olhei para o SantoPadre e disse-lhe: ‘Quero serjesuíta’. Ainda hoje não sei o que sepassou comigo, senti-me levado afalar, era a voz da minha alma, dosmeus desejos mais límpidos, libertadas minhas

33

ansiedades e medos, que severbalizava… era, não sei. Sei queo Papa olhou-me, agarrou-me orosto e deu-me um beijo. Vi no seuolhar e no seu gesto um sinal deDeus a todas as minhasinquietações, dúvidas epossibilidades. Fiquei louco.”Maria Teresa Monteiro, hospedeirada TAP, na viagem de 1982, lembra-se de tudo o que aconteceu nosmomentos em que esteve com JoãoPaulo II a bordo do avião. Até doque ele comeu

e bebeu. Vinho branco,presunto como entrada, rolo delinguado e queijo da serra comosobremesa, acompanhado por umVinho do Porto velho. Mas o queguarda mesmo na memória é olharde Karol Wojtyla. “Fiqueiimpressionada com o Papa. O seuolhar era penetrante, parece quechegava à nossa alma, que chegavacá dentro. Ele era muito alto e osolhos eram muito azuis.”O Padre António Teixeira também sedeixou seduzir pelo Papa.

34

Aliás, foi pela televisão, ao ver asmultidões que o aclamavam emPortugal, em 1982, que seinterrogou quem seria aquelehomem vestido de branco quefascinava tanto as pessoas e queele desconhecia por completo. E asua vida mudou. Entrou para oSeminário e, em 1991, já diácono,foi escolhido para acompanhar oPapa na celebração eucarística noRestelo. Tinha apenas 24 anos.“Ficou cá tudo gravado. Ainda hojemexe comigo e me arrepia. O Papaexercia em mim um fascínio total eestar ali, tocar-lhe, beijar-lhe asmãos, celebrar ao lado dele, Dar-lheo abraço da paz naquela eucaristia,são momentos que

nunca vou esquecer. Foi o culminarde um projeto de vida”.Nessa viagem a Portugal, o SantoPadre também foi aos Açores.Durante essa estadia esteve sempreacompanhado por Mário Pinto,então Ministro da República para osAçores. Em São Miguel celebrou-semissa. “Fiquei mesmo em frente aJoão Paulo II. Então, tive umasensação impressionante, porqueele parecia que estava sempre aolhar para mim. Mas depois, outraspessoas disseram-me o mesmo.Cada um, ali, sentia que o Papaestava a olhar para ele e o Papanão podia estar a olhar para todosao mesmo tempo.

35

O olhar dele era muitoimpressionante, intenso, havia aliuma luz que parecia que estavasempre a ser-nos dirigida. Era umolhar luminoso, muito belo”.Depois dos Açores e da Madeira, oregresso a Portugal Continental,rumo à pista de Monte Real, daForça Aérea. Por pedido expressode João Paulo II, o avião sobrevoou,em círculos, o Santuário de Fátima,já então apinhado de gente. MariaHelena, hospedeira da TAP, viucomo ele se comoveu nesseinstante, “e os seus olhos ficaramcheios de lágrimas”. Ela acrescenta:“O Papa falava com o olhar. Eu nãodigo que ele incomodava, mas, àsvezes, desviava-me, pois era

muito intenso. Era um olhar azul. Elenão precisava de falar compalavras. Bastava-lhe olhar”. António Marujo, então jornalista do“Público”, também viajou com oPapa a bordo do mesmo avião.Também ele recorda a enormeatração que o Papa polaco exerciasobre as pessoas. “O olhar dele erabrutal. Eu senti isso uma vez. Foi emRoma. Assisti à missa na capelaprivada e ele vinha semprecumprimentar as pessoas. O olharera fulminante, intensíssimo. Haviamagnetismo”.Anos mais tarde, Aura Miguelhaveria de voltar a estar de pertovárias vezes com Wojtyla, já nãocomo estudante na Universidade

36

Católica, mas sim como jornalistada “Rádio Renascença”. Foi aconfirmação do poder magnético doolhar de João Paulo II quepressentiu na primeira viagem aPortugal para agradecer aintercessão da Virgem de Fátima nasua história pessoal e na história detodos nós. “O Papa olhava-nos naalma. Só havia duas hipóteses deencarar o seu olhar, porque ele nosdeixava completamente expostos.Era encará-lo ou fugir. Houve casosde colegas meus que não foramcapazes de enfrentar o olhar doPapa e isso impressionou-meimenso. Não aguentaram edesviaram o olhar…”

Paulo Aido, [email protected]

37

O amor de João Paulo II pelosportugueses27 de Abril de 2014.A data coincide com o segundoDomingo do tempo pascal, da DivinaMisericórdia. Celebração instituídapor João Paulo II e na véspera daqual o Papa polaco faleceu, em 2 deAbril de 2005.Nesta data assinala-se umacontecimento religioso que merecea nossa maior atenção: a soleneCanonização de João Paulo II(1978-2005), pelo actual SumoPontífice: Francisco I. É aconfirmação daquilo que já há muitotempo se comentava, se desejava ese atribuía como certo.Com o anunciar oficial destadecisão no dia 30 de Setembro de2013, e depois da emoção com quea recebemos, sentimos o dever decontribuir, ainda que modestamente,para assinalar esta memorável data.Contributo que damos atravésdestas palavras aqui escritas e daobra que lançamos recentemente:«João Paulo II e Portugal». Umálbum a cores, com dezenas defotografias (muitas delas inéditas),em que nos é revelada a memóriailustrada dos dias inesquecíveis emque João Paulo II visitou

o nosso País e que fazem parteintegrante da nossa História decrentes e de portugueses.A nossa ideia, confessamos, eraescrever uma obra de duração, quesubsistisse e encontrasse leitoresquando as pessoas e ascircunstâncias tiverem passado.Este livro (ou uma parte dele)esteve para ser publicado em 2011,na altura da solene Beatificação deJoão Paulo II, mas uma série devicissitudes acabou por nos levar aprolongar a sua escrita durante maisalgum tempo.Várias vezes, ao longo destes anos,deixamos esta obra parada.Sentíamos que, apesar do nossodesejo de escrever um retratototalmente vivo sobre oprotagonista, era humanamenteimpossível escrever a palavra final.Porém, chegamos à conclusão deque quando se tem a oportunidadede prolongar a escrita e a saída dolivro, oferece-se-nos uma provaexplícita de afecto e amor para como tema. Quase poderíamos dizerque ao longo destes muitos anos emque nos dedicamos a ler centenasde livros sobre e de João Paulo II,

38

fomos ficando íntimos destapersonalidade e vida fantásticas.Nesta obra, e enquanto a fomosescrevendo, ficamos a conhecer ossegredos das visitas do PapaWojtyla ao nosso País. Asmensagens que nos deixou. Asconversões operadas em muitosdaqueles que contactaram comJoão Paulo II. A relação de amor deSua Santidade pela Virgem

de Fátima. O Amor do Pontíficepelos Portugueses. Mas tambémalgumas histórias menosconhecidas.Histórias que, nesta época tãoespecial, desejamos que todospossam recordar e conhecer.Obrigado, João Paulo II!

José Carvalho,Professor e Investigador de História

39

João XXIII, um testemunhoJoão XXIII marca profundamente aminha vida sacerdotal, a partir doConcílio Vaticano II: como pessoa ecomo orientação pastoral que eleimprimiu à Igreja com o Concílio.Li e meditei vários livros sobre ele.Inclusivamente fui visitar, comalguns amigos, a sua terra natal(21.09.1982), Sotto il Monte deBérgamo, no norte da Itália. Vimosas suas raízes rurais e o espólio doseu ministério e falámos com o seusecretário, o Bispo D. LorisCapovilla, a quem pedimos umarelíquia que guardamos na CapelaJoão XXIII, na Casa do Oeste.Cativou-me a sua maneira de serafável, alegre, intrépido e corajoso,simples e enérgico. É exemplo nasobras de misericórdia, visitandoprisioneiros e doentes, pobres eexcluídos, pessoas de todas asnações e credos, mostrando-separa todos um “pai” cheio deternura. Cativaram-me as suasvirtudes de Fé, de simplicidade e dehumildade, o seu otimismo e o seuzelo pastoral e a sua paternalcaridade. Respirava Fé a plenospulmões. Não se envergonhava deconfessar o Evangelho. O seu

olhar, os seus gestos e as suaspalavras respiravam bondade ealegria. Especialmente nos diversospaíses onde exerceu o seuministério, com o seu humor eotimismo ele quebrava o gelo,derrubava barreiras e construíapontes restabelecendo a paz entrepessoas e instituições. Por isso ocognominavam de “Anjo da Paz” eficou conhecido pelo “Bom PapaJoão”. A sua simplicidade e aberturacativou-me tanto que, quando fuinomeado pároco, acampando no meio do povo, decidi deixar de usarcolarinho eclesiástico e, nos diasque podia, ia para o campo ajudaros agricultores modestos, nos seustrabalhos da pulveriza e da apanhada azeitona.É que nos últimos anos da minhaformação no Seminário dos Olivais,anos do Concílio (1962-65), marcou-me a novaeclesiologia da comunhão e daparticipação responsável, inseri-me no Escutismo e constitui comoutros uma Equipa deEspiritualidade que me levou àsEquipas Sacerdotais e pastoraiscom quem trabalhei durante 40anos. Disto dei testemunho, em1996,

40

em Fátima no Simpósio “O estilo davida do padre: problemas eapelos” (p.245-248): “O mundoquer encontrar no padre um homemque possua espiritualidade fundadasobre a comunhão, para quetranspareça do rosto do padre aalegria e a beleza de seguir Cristo,juntamente com os irmãos nosacerdócio e com todo o povo deDeus”Também a minha nomeaçãode Assistente Eclesiástico dos

movimentos rurais da AçãoCatólica (ACR, JARC e ACN)que perdura até agora me deu aoportunidade de cultivar e expandiro espírito conciliar com as maisdiversas atividades: nos programasdos Grupos dos Movimentos e nasvárias paróquias, em colóquios esemanas de estudos, campos deformação e férias, conferências,divulgação de documentos

41

do magistério (encíclicas, cartaspastorais, exortaçõesapostólicas…). Exemplifica istoAntónio Batalha noseu livro Caminhar na Existência,quando afirma: “A Ação CatólicaRural, por influência do ConcílioVaticano II, começou a desenvolverum tipo de reflexão muito real eprofundo: os acontecimentos nasfábricas, as realidades da área ruraldo Oeste e de todo o país, asrealidades e acontecimentosmundiais a nível da Igreja e a outrosníveis passaram a estar presentesnos momentos de reflexão, naspublicações, nas conversas deamigos, etc… mas sempre emconfronto a Fé e a Vida. A EquipaDiocesana empenhou-se emprocurar pessoas de valor paraajudar neste tipo de reflexão. ABíblia, as Encíclicas, os documentosdo Concílio e outros documentos daIgreja constituíram a linhaorientadora…” (p.99). Foi com este espírito que nasceu aCasa do Oeste e a instituímosem Fundação João XXIII/Casa doOeste em Ribamar da Lourinhã quedesde 1973 com os Movimentosrurais da Ação Católica tem sidouma grande “Escola deevangelização” da Região doOeste (entre outros Movimentos).Entre outras

iniciativas destaco o “Congresso deCristãos do Oeste” em 1996/97,onde o Cardeal Ribeiro, na homiliade encerramento disse: “OCongresso veio na hora certa, nestefinal do século e do milénio, para astarefas da nova evangelização, quecertamente todos consideramosnecessária e urgente…Necessitamos de um novo ardorapostólico, uma renovada paixãopor Jesus Cristo e pela Igreja quenos inflame o coração e faça de nósverdadeiras testemunhas e arautosdestemidos da açãoevangelizadora”. Por isso, nasequência do Congresso se gerou oNúcleo de Diálogo Social que jáproduziu o livro “Ação Social daParóquia”, porque o serviço daCaridade é indispensável aoanúncio da Palavra e à celebraçãodos Sacramentos (CE 25a).O Concílio despertou a Igreja para amissão que é promover a dignidadee levar à salvação todos os homens,partilhando alegrias e esperanças,tristezas e angústias das suas vidase por isso levou a Fundação àsolidariedade com a Guiné/Bissau,onde criámos o Centro João XXIII,em Ondame/Biombo. Aí apoiamos,há 23 anos, projetos dedesenvolvimento nas áreas

42

do ensino, da saúde, da agricultura,da educação e das comunicações(Vide livro “Solidariedade com aGuiné – duas décadas”. Na Casa do Oeste a presença deJoão XXIII é bem assinalada comvários registos: a dedicação daCapela, a sua relíquia quetrouxemos da Itália, painel deazulejo com ele no campo que tantoamava, uma pintura no

auditório e um monumento na viapública com a sua imagem. Promovemos a celebração doCentenário do seu Nascimento, emnovembro de 1981, no Oeste(Óbidos) com uma encenação dasua vida “O novo Pentecostes” euma Eucaristia presidida pelo Bispo-auxiliar, D. António Rodrigues.Promovemos o estudo e divulgaçãodo Concílio, abrindo caminhos derenovação

43

da Igreja com rosto novo,caracterizando-a “Igreja-Povo deDeus; Igreja-Mistério deComunhão e Igreja-Serviçodo Evangelho ao mundo”.Promovemos a celebração dos 25anos do Concílio, com 40 GruposBíblicos no Altoconcelho deAlenquer, com estudo dosdocumentos encerrando com umaFesta do Concílio.Promovemos a celebração doCinquentenário do Concílio: nasduas Paróquias de Ribamar e SantaBárbara (Vigararia de Lourinhã Mãedo Salvador), durante cerca de trêsmeses realizámos a “Visitação doConcílio” com Grupos de estudo dosdocumentos principais do Concílio eProcissões do Concílio com o SSmoSacramento, tendo culminado na“Festa do Concílio” das duasComunidades Paroquiais; e tambémmobilizámos os Grupos da AçãoCatólica com Guiões de estudo doConcílio que encenaram noutra“Festa do Concílio” a níveldiocesano, na Casa do Oeste.Juntamente com o Concílio outrosdois grandes acontecimentosmarcaram o Pontificado de JoãoXXIII: - a encíclica,

Mater et Magistra (1961) sobrenumerosos problemas sociaistratando pela 1º vez e com realce osproblemas agrícolo-rurais (MM.120-154).. Sem dúvida que isso se deveà sua origem camponesa e ao seucarinho

44

pela gente humilde que trabalha aterra. Outro, foi a encíclica Pacem inTerris (1963), a grande carta sobreos Direitos Humanos –proclamação revolucionária dosdireitos da Vida que despertou ecosprofundos.Estes dois grandes documentoscom a Populorum Progressio econstituição conciliar Gaudium etSpes (e outros posteriores) têm sidoa cartilha da educação/formaçãodos leigos ligados à Ação CatólicaRural do Patriarcado.Ele levou-nos a beber desta fonteda doutrina social da Igreja.Percorremos tantos caminhospromovendo encontros deformação humana e cristã, deformação agrícola: SeminárioAgrícola “Jovens na agricultura- quefuturo?”; Encontros de agricultoressobre a entrada na CEE; o Encontrocom João Paulo II em Vila Viçosa;Jornadas Rurais “Mundo rural – quedesenvolvimento?”. Tivemos oestímulo do Cardeal Ribeiro,Patriarca de Lisboa que no dia daBênção da Casa do Oeste, em03.06.1979, aniversário de JoãoXXIII, nos incitou: “Tornai o Espíritode Deus presente na vida doshomens. Formai Grupos de AçãoCatólica.

Organizai-vos! Atuai!... Formaigrupos vigorosos, firmes, deadolescentes, jovens e de adultos –grupos organizados – que tenhampresente a promoção do mundorural e ao mesmo tempo a dimensãodo Evangelho, do apostolado cristão”. Porque o Espírito manifestado noBom Papa João, fecundou de novoa Igreja, velha Sara, como fecundoua jovem, Maria de Nazaré.Nas Paróquias da Lourinhã, foi como espírito conciliar que restaurámoso Convento de Santo António,implantando a estátua do Bom PapaJoão e tornando-o um CentroPastoral da Igreja do Concílio –sobre a qual disse o PatriarcaRibeiro: “Diante do Conventorestaurado erguestes a estátua doPapa João XXIII. Esta estátua aliposta é também ela um desafio paraque continuemos a obra destegrande Papa”.Como não me é permitidodesenvolver mais este testemunho,resumo à maneira de conclusão os4 polos principais do meu ministériopastoral influenciado pelo Bom PapaJoão:· Os Movimentos rurais da AçãoCatólica, com a sua sede

45

dinamizadora que é a Casa doOeste, inspirada e abençoada pelaproteção do Bom Papa João XXIII.Daqui expandimos o seu espírito e oensinamento conciliar, promovendoo seu conhecimento e propondo asua vivência testemunhal, segundoa pedagogia do Ver-Julgar-Agir(MM, n. 236).· O Centro Pastoral da Merceana(de 1975 a 1989): aqui em EquipaSacerdotal inspirada pelo Concíliodeu à Bíblia toda a importância queela merece ter no coração e na vidado Povo de Deus. Entãopromovemos Cursos Bíblicos,Festas da Palavra de Deus; GruposBíblicos (chegámos a ter 40 GruposBíblicos) com Encontros semanaisapoiados com o caderninho “Palavrana vida”. Fizemos 10 catecismosBíblicos para a Catequese daInfância e Adolescência.· O Centro Pastoral da Lourinhã(1989 a 2005): a dinâmica dasEquipas Sacerdotais e cooperaçãode Leigos teve diversos dinamismospara a Evangelização: Escola deLeigos, Semanas Bíblicas, Jornadasda Pastoral da Fé, Jornadas sobre oDomingo,

Conferências e Encontros diversos;Peregrinações ao Santuário JubilarAno 2000, Visita Pastoral doPatriarca, Visitação da ImagemPeregrina de Fátima, Visita Pastoralàs Famílias; Congressos: um sobreo Domingo, outro Congresso deCristãos do Oeste; e CongressoEucarístico Interparoquial.· Nos 8 anos mais recentes, nasParóquias de Ribamar e SantaBárbara tentei imitar o Bom PapaJoão a trabalhar pela unidade e pelapaz das duas paróquias comVisitação da Imagem Peregrina deFátima; a implantação da estátua àSenhora da Paz e respetivasPeregrinações anuais, a EscolaParoquial, as Jornadas do AnoPaulino e a implantação da estátuade S. Paulo a porta da Igreja; aVisitação da Palavra Peregrina; aVisitação do Concílio e o Catecismodo Ano da Fé O Bom Papa João me proteja.Louvor e glória ao Senhor!

Padre Joaquim Luís Batalha

46

47

João Paulo II: O peregrino de FátimaO futuro santo João Paulo II éparticularmente recordado emPortugal pela sua ligação a Fátima,reforçada pela intercessão a NossaSenhora na recuperação doatentado de 1981 e pelabeatificação dos pastorinhosFrancisco e Jacinta, em 2000.A Nota Pastoral da ConferênciaEpiscopal Portuguesa (CEP)divulgada em 2011, aquando dabeatificação do Papa polaco, KarolWojtyla (1920-2005), sublinhavaessa ligação. “É considerado oPapa de Fátima, que um ano depoisdo atentado na Praça de SãoPedro, em Roma, a 13 de maio de1981, veio à Cova da Iria agradecerà Rainha da Paz o terprovidencialmente sobrevivido”,assinalavam os bispos, a respeitode Wojtyla, eleito Papa em outubrode 1978.João Paulo II esteve no Santuário deFátima em 1982, 1991 e, pela últimavez, em 2000, altura em quebeatificou os videntes Francisco eJacinta Marto. Nessas três visitas,sempre no mês de maio, passouainda por Braga, Coimbra, Lisboa,Porto, Vila Viçosa, Açores eMadeira, somando-se uma

escala técnica no aeroporto deLisboa (2 de março de 1983), acaminho da América Central.A ida a Roma, em outubro 2000, daimagem original de Nossa Senhorade Fátima da Capelinha dasAparições, no Jubileu dos Bispos,consagrando-lhe o terceiro milénio,confirma a particular ligação doPapa polaco com o santuário daCova da Iria.Simbolicamente, a bala que lheatravessou o abdómen num dia 13de maio repousa hoje na mesmaimagem da Virgem. João Paulo IIsempre se mostrou seguro de que“uma mão maternal” guiou atrajetória da bala naquela tarde de1981, no Vaticano.Um ano depois, Karol Wojtylachegava a Fátima para “agradecer àDivina Providência neste lugar que amãe de Deus parece ter escolhidode modo tão particular”Em 2005, passados apenas 42 diassobre a sua morte, o 13 de maio foia data escolhida para que Bento XVIanunciasse o início imediato doprocesso de beatificação –dispensando o período de esperade cinco anos.A CEP elencou “grandes traços dapersonalidade e da missão

48

do Papa João Paulo II”,apresentado como um “homem deintensa vida interior” com uma“invulgar capacidade decomunicação pessoal, tanto diantedas multidões, como em particular,atraindo magneticamente tantosjovens, entre os quais muitos que seafirmavam estar distantes da Igreja”.

A este respeito, cita-se um episódioacontecido a 15 de maio de 1982,em Coimbra, quando o Papa Wojtyla“não hesitou em pôr aos ombros acapa preta que um estudante lheofereceu e, no pátio daUniversidade, gritou à multidão:«Olá, malta! O Papa contaconvosco! Melhor, Cristo contaconvosco!»”.

49

João XXIII: O Papa da paz e dabondadeAngelo Giuseppe Roncalli nasceuem 1881 na localidade de Sotto ilMonte, Bérgamo, onde foi pároco,professor no Seminário, secretáriodo bispo e capelão do exércitodurante a I Guerra Mundial.João XXIII iniciou a sua carreiradiplomática como visitadorapostólico na Bulgária, de 1925 a1935; foi depois delegadoapostólico na Grécia e Turquia, de1935 a 1944, e Núncio Apostólico naFrança, de 1944 a 1953.Em 1953, Angelo Roncalli foinomeado patriarca de Veneza e nodia 28 de outubro de 1958 foi eleitoPapa, sucedendo a Pio XII.“Manso e atento, empreendedor ecorajoso, simples e cordial, praticoucristãmente as obras demisericórdia corporais e espirituais,visitando os encarcerados e osdoentes, recebendo homens detodas as nações e crenças ecultivando um extraordináriosentimento de paternidade paracom todos. O seu magistério foimuito apreciado, sobretudo com asEncíclicas ‘Pacem in terris’ e ‘Materet magistra’", recorda a biografiaoficial do Vaticano.

O Centro Televisivo do Vaticano(CTV) evocou o futuro Santo JoãoXXIII como o “Papa do amor, daunidade e da paz”. “O Papa Roncaliipermanece no coração de muitoscomo um pontífice capaz de dirigir-se a todos com simplicidade,respeito, espontaneidade, osucessor de Pedro que deu início àrevolução conciliar”, refere o CTV,num trabalho a respeito dacanonização do próximo domingo.João XXIII convocou o Sínodoromano, instituiu uma comissão paraa revisão do Código de DireitoCanónico e convocou o ConcílioVaticano II (1962-1965).O Papa italiano faleceu na tarde dodia 3 de junho de 1963 e foibeatificado por João Paulo II emsetembro de 2000, com que serácanonizado este domingo, peloPapa Francisco, após este terdecidido dispensar um segundomilagre atribuído à intercessão deJoão XXIII.O padre Ezio Bolis, diretor daFundação João XXIII, diz ao CTV queo futuro santo tinha “umaespiritualidade ferial, corrente,familiar”, que nasceu da sua“experiência rural, de uma

50

família muito unida”. “Podemos dizerque o êxito do Papa João duranteos anos do pontificado se deveuprecisamente a esta capacidade derelacionar-se com as pessoas,mesmo as mais simples, de se fazerouvir de forma imediata, sem imporsujeições”, explica.O cardeal Loris FrancescoCapovilla, que foi secretárioparticular de João XXIII, recorda porsua vez o momento da morte doPapa italiano, quando se

juntavam várias pessoas paraacompanhar os seusúltimos momentos. “Um dia disse-lhe: Santo Padre, aqui à volta dasua cama estamos três, quatro,cinco, seis pessoas, mas se visse aPraça [de São Pedro]… Eu pensavaque ele não iria ligar, dado que nãoestava habituado a estar na ribalta,mas nessa ocasião olhou para mime disse-me: ‘Bem, é natural que sejaassim, é o Papa que morre. Eu amo-os, eles amam-me’”, relata.

51

Papa solidário com trabalhadoresitalianos O Papa mostrou-se“verdadeiramente comovido” e“triste” com uma videomensagemque lhe foi enviada pelostrabalhadores da empresasiderúrgica Lucchini Piombino, naItália, que lutam pelos seusempregos. “Caros trabalhadores,caros irmãos, nos vossos rostos eravisível uma profunda tristeza epreocupação de pais de família quepedem apenas o seu direito atrabalhar e viver dignamente, parapoder guardar, alimentar e educaros seus filhos. Ficai certos da minhaproximidade e da minha oração”,declarou esta quarta-feira, noVaticano.Francisco explicou às dezenas demilhares de pessoas reunidas naPraça de São Pedro para aaudiência pública semanal que amensagem chegou antes doencerramento do forno dainstalação siderúrgica, situada emLivorno, cerca de 250 quilómetros anorte de Roma. “Não percais aesperança, o Papa está convosco,reza por vós, para que, quando seperdem as esperanças humanas,fique sempre acesa a esperançadivina, que nunca desilude. Abraço-vos

fraternalmente”, afirmou.Francisco dirigiu-se depois a “todosos responsáveis”, pedindo esforçosde “generosidade e criatividade”para voltar a “acender a esperançanos corações” destas pessoas e de“todas as pessoas desempregadaspor causa do desperdício e da criseeconómica”. “Por favor, abri os olhose não fiqueis de braços cruzados”,apelou.A intervenção aconteceu após acatequese, na qual o Papa disseque só a fé na ressurreição deJesus oferece a alegria“verdadeira”. A alegria pascal é“uma alegria verdadeira, profunda,baseada na certeza de que Cristoressuscitado já não morre, mas estávivo e atua na Igreja e no mundo”,declarou.Os peregrinos de várias línguassaudaram Jorge Mario Bergoglio nodia da festa litúrgica do seuonomástico, São Jorge. Antes dechegar à Praça de São Pedro, poronde passou em carro coberto, porcausa da ameaça de chuva, o Papacumprimentou um grupo de pessoascom deficiência, na sala Paulo VI.

52

Francisco convidou os presentes naPraça de São Pedro a repetir, comele, uma frase do Evangelho de SãoLucas, dita aos discípulos após amorte e ressurreição de Jesus:‘Porque procurais entre os mortosaquele que está vivo?’. “Estaspalavras são como uma pedramilenar na história mas também umapedra de tropeço,

se não nos abrimos à Boa Nova, sepensamos que é menos incómodoum Jesus morto do que um Jesusvivo”, assinalou.Segundo o Papa, é preciso repetirno “caminho diário” a pergunta doanjo aos discípulos, ‘Porqueprocurais entre os mortos aqueleque está vivo?’.

53

Mensagem pascal lembrou vítimasda guerra e da fomeO Papa Francisco deixou um apeloà paz, aludindo aos focos deconflitos que atingem ahumanidade, à fome e ao tráfico deseres humanos, na sua mensagemde Páscoa.“Pedimo-vos, Jesus glorioso, quefaçais cessar toda a guerra, toda ahostilidade grande ou pequena,antiga ou recente”, pediu, antes dabênção ‘urbi et orbi’ [à cidade (deRoma) e ao mundo], desde avaranda central da Basílica de SãoPedro.Neste contexto, o Papa recordou asituação na Síria, rezando para que“quantos sofrem as consequênciasdo conflito possam receber a ajudahumanitária necessária” e as partesem conflito deixem de “usar a forçapara semear morte, sobretudocontra a população indefesa, mastenham a audácia de negociar apaz”. Num ano em que cristãos doOcidente e do Oriente celebram aPáscoa no mesmo dia, Franciscoapelou à pacificação na Ucrânia.“Que todas as partes interessadas,apoiadas

pela Comunidade internacional,possam empreender todos osesforços para impedir a violência econstruir, num espírito de unidade ediálogo, o futuro do país”, declarou.O Papa pediu “a reconciliação e aconcórdia fraterna” na Venezuela,saudou o reinício das negociaçõesentre israelitas e palestinos e rezoupelas “vítimas da violência fratricidano Iraque”.A intervenção destacou ainda váriosconflitos em curso no continenteafricano e as populações atingidaspela epidemia de ébola na GuinéConacri, Serra Leoa e Libéria, bemcomo os que são afetados por“tantas outras doenças, que sedifundem também pela negligência ea pobreza extrema”.O Papa rezou ainda pelo fim da“chaga da fome, agravada pelosconflitos e por um desperdícioimenso” de que muitos são“cúmplices”.

54

Alegria deve marcar vivência daPáscoaO Papa Francisco destacou aimportância de viver o tempo daPáscoa com “alegria”, de formagenuína, transmitindo-a aos outros,como aconteceu nas primeirascomunidades cristãs. “Deixemos queesta experiência, impressa noEvangelho, se imprima também nosnossos corações e transpareça nanossa vida. Deixemos que oespanto alegre do Domingo dePáscoa irradie nos pensamentos,nos olhares, nas atitudes, nosgestos e nas palavras”, declarou,perante milhares de pessoasreunidas na Praça de São Pedropara a recitação do ‘Regina Caeli’,na ‘segunda-feira do Anjo’.Segundo o Papa, esta alegria “nãoé uma maquilhagem”, mas vem dedentro, “de um coração mergulhadona fonte”, como o de MariaMadalena, testemunha daressurreição.Por isso, cada cristão deve sercapaz de levar um “raio” da luz deJesus ressuscitado “às diversassituações humanas: às felizes,tornando-as mais belas epreservando-as do egoísmo; àsdolorosas, levando serenidade eesperança”.

Francisco renovou os votos de “boaPáscoa” e pediu que todoscontinuem a trocar os “votospascais” durante esta semana“como se fosse um único dia”.“O sentimento dominante quetransparece dos relatos evangélicosda Ressurreição é a alegria plenade espanto e na liturgia revivemos oestado de espírito dos discípulospor causa da notícia que asmulheres trouxeram: Jesusressuscitou”, precisou.O Papa convidou os católicos a releros capítulos dos Evangelhos quefalam da ressurreição de Jesus e apensar na “alegria de Maria, Mãe deJesus”, durante esses momentos.

55

A Agência ECCLESIA escolhe sete acontecimentos que marcaram aatualidade eclesial portuguesa nos últimos dias, sempre atualizadosem www.agencia.ecclesia.pt

56

Via Sacra no Coliseu de Roma

Papa condena assassinato de jesuíta holandês na Síria

57

O acto de matarO projeto nascera com o objetivo deregistar o testemunho das vítimas,seus familiares, e sobreviventes detrês décadas de regime repressivona Indonésia, sob a presidência deHadji Mohamed Suharto. Com cercade um milhão e meio de mortos edesaparecidos estimados nessenegro período da história indonésia,resultado da tenebrosa ação dosesquadrões da morte criados paraexterminar qualquer assumidodefensor ou simpatizante deesquerda, a importância de umdocumento cinematográfico seriafulcral e meritória, registando para omundo e a posteridade o valor dosque, de fragilizados pelo abuso depoder, se fizeram fortes no seucombate.No entanto, perante as dificuldadesem estabelecer livre contacto comesses testemunhos, não obstanteas diversas tentativas e meios parao conseguir, a equipa liderada pelosrealizadores Joshua Oppenheimer e Christine Cynn encontrou-se nainsólita situação de ter, ao seudispor e despudoradamente, um

outro calibre de testemunha:membros dos esquadrões da morte,orgulhosos dos seus atos e hojecelebrados como heróis nacionais.O inesperado desafio é aceite e eisque surge ‘O Acto de Matar’, umdocumento impressionante e dedificílima digestão que nos obriga apensar, da mais séria e dura forma,sobre os limites da(des)humanidade e,inevitavelmente, sem vislumbre dearrependimento, sobre apossibilidade de perdão.Com a participação de WernerHerzog (A Gruta dos SonhosPerdidos) na produção, ‘O Acto deMatar’ é um documento quase tãobrutal como as mortes perpetradasàs mãos dos seus protagonistas,que as relatam e recriam com adespudorada liberdade permitidapelos realizadores. Uma opçãodiscutível que, se por um lado visaevidenciar a fidelidade do retratodos homicidas, por outro resultanuma perversa espetacularizaçãodo desumano, do horror, o quedeslocaria partes do filme do génerodocumental para o de terror e oinsólito se fosse

58

de ficção e não de realidade o quese trata. Assim, o filme interessasobretudo pelos dois tipos dereflexão que oferece: uma,certamente a mais óbvia e maisterrível, sobre o conteúdo; e outra,menos evidente mas igualmenteimportante, sobre a sua forma. Noque respeita a esta última, vale apena ter em atenção que, nocinema, um realizador atua sempre.Mesmo por omissão. Pois a formacomo câmara e sujeito seencontram é sempre sua opção. E,sabe, desde logo, que um encontroentre duas pessoas não é o mesmoque um encontro entre alguém euma câmara. É nesse sentido que aliberdade conferida aostestemunhos que aqui seapresentam, com a particularidadede cada um representar a suamemória e a relação deconsentimento com os seustenebrosos atos de forma própria,pode (e deveria) ser,

mais que estética, eticamentediscutida. Combinados com imagensde arquivo e da atualidade social epolítica que provam que a negranuvem que pairou sobre a Indonésianão foi ainda dissipada por nenhumvento de mudança suficientementeforte, os testemunhos não deixamde constituir uma portentosadenúncia sobre o estado dedesrespeito pelos mais elementaresdireitos humanos de um país que,desde que perdeu Timor, não terávoltado a despertar o interesse epreocupação merecidos entremuitos de nós, portugueses. No finaldo filme, atendendo sobretudo àmotivação que lhe deu origem, éainda mais profunda e quasemesmo insuportável a ausênciasentida dos que morreram lutandocontra o regime, e é principalmentepor isso que a obra resulta.

Margarida Ataíde

59

Uma revolução para lá da«cosmética»A jornalista argentina ElisabettaPiqué, autora do livro ‘Francisco -Vida e Revolução’, considera que asmudanças levadas a cabo peloprimeiro Papa sul-americano noprimeiro ano de pontificado sãomais do que uma operação de“cosmética”. “Ele está a desmantelarum Vaticano que era uma espéciede corte imperial, fechado em sipróprio, eurocêntrico. É um Papaque fala ao mundo”, disse à AgênciaECCLESIA.A jornalista e correspondente noVaticano, que conhece Jorge MarioBergolgio há mais de uma década,recolheu testemunhos edocumentação inédita numa obraem que procura projetar asmudanças que o Papa argentino irápromover. “É o primeiro Papa quese atreve, que tem a coragem dechamar-se Francisco, como o santode Assis, filho de um mercador ricoque se despoja de tudo” e simboliza“uma Igreja que tem de estar aolado dos excluídos”, refere a autora.Para Elisabetta Piqué, apopularidade explica-se pela sua“autenticidade” e a “coerênciaabsoluta” entre o que faz agora

e toda a sua vida, com um perfil“muito discreto”. “É a voz dosexcluídos”, sustenta.A jornalista recorda que o aindapadre Jorge promoviaacampamentos para os alunos doColégio de que era reitor e para ascrianças dos bairros em volta,relatando que foi assim que viu omar pela primeira vez. “Claro queele não tirava férias nem participavanesses acampamentos que tinhaajudado a organizar”, sublinha.Para a especialista, as “surpresas”do atual pontificado ainda nãoacabaram, admitindo que algumaspessoas se possam sentir“deslocadas” face às reformas queestão a ser levadas a cabo.“Francisco chama a uma novaatitude, a uma vida simples,

60

austera, mas é possível que algunsnão o entendam”, afirma.O contraste entre o atual Papa e aimagem generalizada de umVaticano como um “ninho devíboras” levou o “imagináriocoletivo” a projetar ameaças àprópria vida de Francisco, que ajornalista desvaloriza. “Desde oprimeiro dia que a minha padeira, asenhora dos jornais dizem-se: ‘Ah,vão matá-lo’. É verdade que, para ládeste imaginário coletivo, ele temum discurso que incomoda, falacontra as máfias, contra o tráfico depessoas”, observa Elisabetta Piqué,para quem o Papa vai “continuar aexpor-se”, porque acredita que éessa a sua maneira de viver a suamissão.Francisco telefonou-lhe menos de24 horas após a eleição pontifícia, a13 de março de 2013, um exemplodo que a autora apresenta como o“escândalo da normalidade” de umhomem de Igreja que privilegia ocontacto direto. “Muitos perguntam-me qual é a estratégia mediática doPapa, mas não há nenhuma, é elepróprio. Consegue comunicar,mesmo com as crianças, porque falade forma simples”, conclui.

61

II Concílio do Vaticano: Abolição dosíndices dos livros proibidos (1)

Embora o II Concílio do Vaticano tenha encerrado nomês de dezembro de 1965, só no ano seguinte (14de junho), se abria para muitos católicos uma novaépoca com a abolição do índice dos livros proibidos.Com esta medida, o Vaticano cumpria as palavrasproféticas de João XXIII proferidas na abertura desteacontecimento magno da Igreja Católica. Para oPapa que o convocou, a Igreja devia ir ao encontrodas necessidades dos tempos actuais, propondo-seantes de mais demonstrar a validade da sua doutrinae não enveredando pelo caminho das condenações.Num artigo publicado no jornal «Correio de Coimbra»(22-08-96), Manuel Augusto Rodrigues realça que,actualmente, “já pouco se fala dos índices de livrosproibidos, tema que durante quatro séculos tantoagitou a Igreja e o mundo culto em geral”. Para trásda referida decisão de 1966 ficava uma “longahistória de censuras e proibições” da leitura de livrosde autores célebres, como a «Madame Bovary» e«Salammbô» (escritos por Gustave Flaubert).«Les Misérables» de Victor Hugo (novelista, poeta,dramaturgo, ensaísta e ativista pelos direitoshumanos francês do século XIX) e Emanuel Kant(filósofo alemão do século XVIII) com a sua «Criticada Razão Pura» também tinha o seu nome na listados livros censurados. Estes não foram os únicospensadores/filósofos que sofreram com a redeapertada, antes do II

62

Concílio do Vaticano, que incluíatambém Pascal, Descartes, DavidHume, Espinoza e Voltaire. Filósofosmarcantes da cultura europeia que“viram os seus nomes registados norol dos livros defesos” (In: Jornal«Correio de Coimbra» [22-08-96]).A censura eclesiástica tambémactuou em relação aos teólogos e,neste caso, são de recordar os“livros dos reformadores” e de“grande número de católicos” quedurante o pontificado de Pio X se“tornaram suspeitos demodernismo”, entre os quais secontam Alfred Loisy (teólogo efilósofo francês nascido em 1857 efalecido em 1940 e grandeconhecedor das SagradasEscrituras, que ensinou no InstitutCatholique de Paris) e HermannSchell (teólogo e filósofo alemãonascido em 1850 e falecido em1906).Aconteceu também ser incluída norol de livros proibidos a obracompleta de determinado autor, oque tinha como consequência serproibida a leitura de toda e qualquerparte da mesma, “embora setratasse de assuntos que nadatinham a ver com a fé e oscostumes. Incluem-se nestes

casos Balzac, Giordano Bruno (Nafoto), Alexandre Dumas (pai e filho),André Gide, Anatole France, GeorgeSand, Jean Paul-Sartre e Emile Zola.Depois do II Concílio do Vaticanoestes autores ganharam nova vidaliterária…

63

AbrilDia 25* Aveiro - Salão da junta defreguesia de Santa Joana - DiaDiocesano do Catequista.* Açores - Ponta Delgada (salãoparoquial de S. José) - OSecretariado Bíblico de São Miguelpromove a iniciativa «Um dia com aBíblia» com o tema "O Evangelho deMateus". * Braga - Auditório Vita - Musicalsobre o Papa João Paulo IIpreparado pelo padre Albano deSousa Nogueira.* Fátima - Peregrinação nacional dafamília agostiniana.* Santarém - Início do curso geral decatequistas.* Lisboa - Mafra (Real ConventoFranciscano de Mafra) - Actividade«Capítulo das Esteiras» promovidopela Família FranciscanaPortuguesa. * Vila Real - Ribeira de Pena - DiaDiocesano da Juventude. * Algarve - Jornada diocesana dosreligiosos e consagrados promovidapelo Secretariado Regional daConferência dos InstitutosReligiosos de Portugal (CIRP).* Fátima - Peregrinação nacional dafamília andaluz.

* Algarve - Portimão (Ferragudo) - Actividade «Mariápolis Regional noAlgarve» promovido pelo Movimentodos Focolares. (27 a 27)* Braga - Barcelos - Festa dasCruzes. (25 a 04 de maio)Dia 26* Vaticano - O Papa Franciscorecebe o primeiro-ministro daUcrânia, Arseniy Yatsenyuk.* Itália - Roma (Igrejas do Centro deRoma) - Noite Branca de oraçãointegrada nas canonizações de JoãoPaulo II e João XXIII.* Itália - Alba - Beatificação do padreGiuseppe Girotti (1905-1945) mortono campo de concentração nazi deDachau, Alemanha, durante a IIGuerra Mundial.* Porto - Marco de Canaveses(Avessadas - Santuário de MeninoJesus) - Encerramento (início a 22de abril) do XII Capítulo Provincial daProvíncia Portuguesa da Ordem dosCarmelitas Descalços.* Porto - Pavilhão Rosa Mota - DiaDiocesano da Juventude.* Porto - Sé (21h30m) - Concerto dePáscoa.

64

* Setúbal - Barreiro (Igreja de SantaMaria) (21h00m) - Concerto dePáscoa «Cânticos da tarde e daManhã». * Braga - Casa dos Crivos - Encerramento (início a 4 de abril)da exposição «A Senhora do MantoGrande» e integrada na SemanaSanta de Braga.* Leiria - Biblioteca Municipal AfonsoLopes Vieira - Apresentação do livro«O hipopótamo de Deus e outrosTextos» de Tolentino Mendonça porManuel Villas Boas e Cristina Nobre.* Portalegre - Alcains - DiaDiocesano do Catequista.* Itália - Roma (Igrejas do centro dacapital) - Vigília geral de oraçãopelas canonizações de João Paulo IIe João XXIII.* Beja - Santiago do Cacém (IgrejaMatriz de Santiago Maior) - Concerto «Vozes que brotam docéu: Entre o romântico e omaneirismo» integrado no Festival«Terras Sem Sombra». * Fátima - Encontro nacional dasReparadoras Missionárias da SantaFace. (26 e 27)

* Setúbal - Almada (Seminário deSão Paulo) - Retiro para casaispromovido pela Pastoral Familiar doPatriarcado de Lisboa e orientadopelo padre Nuno Amador. (26 e 27) Dia 27* Vaticano - Canonização de JoãoPaulo II e de João XXIII. * Fátima (11h00m) - O Santuário deFátima vai associar-se àscerimónias de canonização de JoãoXXIII e João Paulo II.* Aveiro - Sé - Ordenaçãopresbiteral de Helder Ruivopresidida por D. António FranciscoSantos.* Açores - Ilha Terceira (Angra doHeroísmo) - Benção da capela daPraça de Toiros por ocasião dacanonização do Beato João Paulo II,passando a ter como orago o santopolaco.* Braga - Esposende (Belinho) -Procissão do Senhor aos enfermos.* Viseu - Satão (CineTeatromunicipal) (17h00m) - Exibição dofilme «Papa João Paulo II» paracelebrar a sua canonização.

65

No Barreiro este sábado, dia 26 de abril, a cantora

Teresa Salgueiro vai estar na Igreja de Santa Mariapara um concerto de Páscoa intitulado ‘Cânticos daTarde e da Manhã’. No domingo, dia 27 de abril, às 10h00 (menosuma em Lisboa), o Papa Francisco vai presidir àMissa de canonização dos Beatos João XXIII eJoão Paulo II. Também no Vaticano inicia-se na segunda-feira, dia 28de abril uma reunião do Papa com o Conselho deCardeais. Nesta reunião de dois dias Francisco vaireunir pela quarta vez com os oito cardeais dos cincocontinentes que nomeou em abril de 2013 para oaconselharem, abrindo caminho à redação de umanova constituição para o Vaticano. Os bispos portugueses vão estar reunidos emFátima, a partir de terça-feira, dia 29 de abril, emAssembleia Plenária da Conferência EpiscopalPortuguesa. A agenda do encontro, que vaidecorrer até dia 1 de maio, prevê publicações detrês notas pastorais e eleições para o triénio2014-2017. No dia 30 de abril, quarta-feira, o Instituto UniversitárioJustiça e Paz de Coimbra promove uma descidanoturna no rio Mondego intitulada ‘Recebe a luz eorienta-te’.

66

67

Programação religiosa nos media

Antena 1, 8h00RTP1, 10h00Transmissão damissa dominical

11h00 -Transmissão missa 12h15 - Oitavo Dia

Domingo: 10h00 - ODia do Senhor; 11h00- Eucaristia; 23h30 -Ventos e Marés;segunda a sexta-feira:6h57 - Sementes dereflexão; 7h55 -Oração daManhã; 12h00 -Angelus; 18h30 -Terço; 23h57-Meditando; sábado:23h30 - TerraPrometida.

RTP2, 11h22Domingo, dia 27 - Dois PapasSantos: João XXIII e JoãoPaulo II. RTP2, 15h30Segunda-feira, dia 28 -Entrevista a Aura Miguel eOctávio Carmo sobre JoãoXXIII e João Paulo II;Terça-feira, dia 29 -Informação e entrevista aopadre João Gonçalves sobreo 1º Congresso Ibérico daPastoral Penitenciária;Quarta-feira, dia 30 - Informação e entrevista ao padreJoaquim Carreira das Neves sobre o livro "Lutero -Palavra e Fé";Quinta-feira, dia 01 - Informação e entrevista a JoséPaixão, sobre o Dia do Trabalhador;Sexta-feira, dia 02 - Análise das leituras bíblicas dedomingo pelo padre Armindo Vaz e frei José Nunes. Antena 1Domingo, dia 27 de abril, 06h00 - Conversa com ocardeal José Saraiva Martins sobre canonização deJoão XXIII e João Paulo II. Comentário à atualidadecom José Luís Borga. Segunda a sexta-feira, 22h45 - 28 - HistoriadorAntónio Matos Ferreira e os Papas João XXIII e JoãoPaulo II; 29 - Monsenhor Luciano Guerra e João PauloII; 30 - Enciclicas sociais de João XXIII e João Paulo IIcom Alfredo Bruto da Costa; 1 - António Pinto Leite eo Dia do Trabalhador; 2 - Padre Eduardo Novo e oFátima Jovem.

68

Existem provas da ressurreição deJesus?

69

Ano A - 2º Domingo da Páscoa Comunidadescom coraçãomisericordioso

Se tivesses aqui a fotografia da comunidade cristã datua paróquia, que imagens, que traços apareciam? Ese fosse em vídeo, que caminhos, que passospercorridos?Repara na fotografia da comunidade cristã deJerusalém: uma comunidade de irmãos, que vive emcomunhão fraterna; uma comunidade assídua aoensino dos apóstolos; uma comunidade que celebraliturgicamente a sua fé; uma comunidade que partilhaos bens; uma comunidade que dá testemunho.Trata-se de uma descrição da comunidade ideal, quepretende servir de modelo à Igreja universal e àsigrejas locais. Pensa na tua comunidade cristã eprocura ver se é uma comunidade à maneira dacomunidade de Jerusalém, nestes cinco elementos.A tua comunidade cristã é uma comunidade de irmãosque vivem no amor, ou é um grupo de pessoasisoladas, em que cada um procura defender os seusinteresses, mesmo que para isso tenha de magoar osoutros?Como comunidade assídua ao ensino dos apóstolos, atua comunidade cristã é uma comunidade que seconstrói à volta da Palavra de Deus, que escuta e quepartilha essa Palavra?A tua comunidade cristã é uma comunidade quecelebra liturgicamente a sua fé? A celebraçãoeucarística é um rito aborrecido, a que se assiste porobrigação, ou é uma verdadeira experiência deencontro com o Jesus do amor e do dom da vida, umaexperiência de amor partilhado com os irmãos de fé?

70

A tua comunidade cristã é umacomunidade de partilha do amor, doserviço, do dom da vida, umacomunidade que dá testemunho?Deixa-te também iluminar peloEvangelho de hoje, pelo Cristo vivoque ressuscita em ti, pelas atitudesde Tomé tantas vezes semelhantesàs tuas, e retoma o caminho semprenovo da fé e da vida nova.Hoje é também o Domingo daMisericórdia de Deus. Como nos dizo Papa Francisco, «a Igreja deveser o lugar da misericórdia gratuita,onde todos possam sentir-seacolhidos, amados, perdoados eanimados a viverem segundo oEvangelho».Os nossos contemporâneos sofremao verem imagens de

violência, ao verem atitudes de ódioe vingança. Têm necessidade depalavras e gestos de conciliação ereconciliação, de ternura e perdão,de fidelidade e confiança, de amor emisericórdia. Não nos podemoscontentar em rezar ao nosso Deus“misericordioso, lento na cólera,cheio de fidelidade e lealdade”.Procuremos perdoar, ter um olhar euma escuta de bondade sobre osoutros, refrear os nossos impulsosde cólera, ser fiéis aos nossoscompromissos e leais nas nossaspalavras e nos nossos atos, enfim,ser pessoas com coraçãomisericordioso.

Manuel Barbosa, scjwww.dehonianos.org

71

A vocação do cristão é a santidade, em todo momento davida.

Na primavera da juventude, na plenitude do verão da idademadura, e depois também no outono e no inverno da velhice,

e por último, na hora da morte.(João Paulo II)

72