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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE – UNI-BH Olga Durães A evolução da mídia e o contraste com as novas mídias sociais nas eleições do Irã Belo Horizonte 2010

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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE – UNI-BH

Olga Durães

A evolução da mídia e o contraste com as novas mídias sociais nas

eleições do Irã

Belo Horizonte 2010

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Olga Durães

A evolução da mídia e o contraste com as novas mídias sociais nas

eleições do Irã

Monografia apresentada ao Centro Universitário de Belo Horizonte como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Relações

Internacionais. Orientador: Túlio Sérgio Henriques Ferreira

Belo Horizonte 2010

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A evolução da mídia e o contraste com as novas mídias sociais nas

eleições do Irã

Olga Durães 1

Túlio Sérgio Henriques Ferreira 2

Resumo:

Baseado na evolução da mídia, o artigo propõe analisar ferramentas como a TV Al

Jazera, o microblogging twitter, e imagens de celular são utilizados para reportar

conflitos. O Twitter surge dentro de uma revolução informacional em que uso de

tecnologias de informação e comunicação tem por base e a troca de informação,

links e notícias restritas a 140 caracteres. Dessa forma, entende-se que o Twitter

potencializa os fluxos de notícias e quebra o paradigma dos monopólios da

informação. O artigo também observa a situação pós-eleições do Irã em junho de

2009, quando parte dos cidadãos consideraram fraudulento o processo eleitoral que

reelegeu Mahmoud Ahmadinejad e mobilizam-se em prol da democracia e liberdade

de expressão.

Abstract:

Based on the evolution of the media article aims at analyzing tools such as TV Al

Jahzerah, the microblogging twitter, and images of cell are used for reporting

conflicts. Twitter appears with an information revolution where the use of information

technologies and communication is based and the exchange of information, links and

news limited to 140 characters. Thus, it is understood that Twitter enhances the flow

of news and break the paradigm of the monopolies of information. The article also

notes the post-election situation in Iran in June 2009 when the citizens saw the

fraudulent electoral process that re-elected Mahmoud Ahmadinejad and are

mobilizing to democracy and freedom of expression.

1 Graduanda em Relações Internacionais do Centro Universitário UNI-BH 2 Professor orientador do Curso de Relações Internacionais do UNI-BH

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Introdução

O presente trabalho propõe acompanhar a evolução da mídia internacional e

analisar os impactos causados pela comunicação via internet aliada ás mobilizações

mundiais pela democracia e pela liberdade de expressão.

O artigo é dividido em três partes. Na primeira parte é descrito o surgimento das

agências internacionais e a maneira acirrada em que os estúdios cinematográficos,

redes de televisão, canais a cabo, revistas e jornais eletrônicos agem na divulgação

de notícias e atendem aos desmandos do capitalismo. Grande parte das empresas

da mídia faz parte do mercado e da mesma forma que outras empresas, elas sofrem

fortes pressões dos acionistas, diretores e banqueiros.

Posteriormente, o “efeito CNN” é abordado durante a guerra do golfo. Neste período

as notícias sofriam fortes censuras por parte do governo estadunidense e por falta

do que noticiar os jornalistas enfatizavam a aparência dos soldados, seus uniformes

para proteção contra armas químicas, equipamentos do exército e cantis. O

telespectador assistia às imagens como se estivesse participando de um vídeo-

game.

Na última seção é contrastado o “efeito CNN” com o atual “efeito Al Jazeera” e

“efeito Nokia”. As novas tecnologias possibilitam que outros pontos de vistas sejam

mostrados, assim como a visão do Oriente Médio.

As novas ferramentas de mídias sociais desempenham um papel importante nas

coberturas jornalísticas importantes e as eleições no Irã são um marco nestas

possibilidades.

EVOLUÇÃO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E A CONCENTRAÇÃO DA MÍDIA

EM UM NÚMERO MENOR DE CONGLOMERADOS

As agências internacionais de notícias apareceram durante o século XIX e isto

estava diretamente aliado ao crescimento das potências européias da França,

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Alemanha e Reino Unido. Uma característica desta época que contribuía para a

difusão da informação era o sistema de acordas entre agência que visava distribuir o

mundo em zonas de influência. MATTA (1980)

No começo os acordos eram exclusivamente europeus e aconteciam entre as

agências de Havas, Reuter e Wolf. Mas, em 1975, o acordo já incluía a Associate

Press (AP) dos EUA, a qual já requeria a necessidade de instaurar o principio de

fluxo livre da informação3. MATTA (1980)

Havas e Reuter, que são reconhecidos como os fundadores das agências

internacionais de notícias que disputavam entre si o domínio pelo mercado de

informação internacional apoiado nas vinculações financeiras que tinham dado

origem a suas agências e no apoio político que obtinham dos Estados que estavam

ligados. Para tal, eles decidiram dividir o mundo em três partes, em que Reuter ficou

com as informações do Império Britânico, Estados Unidos, países do mediterrâneo,

o Canal de Suez e grande parte da Ásia; Havas ganhou o Império Francês, Europa

Ocidental do Sul e partes da África e Wolf ficou com o resto da Europa, incluindo

Áustria-Hungria, a Escandinávia e os Estados Eslavos. MATTA (1980)

Isto não difere da atual situação da mídia, ela está centralizada em um número cada

vez menor de empresas, desde 1990 estão concentradas principalmente em nove

conglomerados transnacionais: Disney, AOL-Time Warner, Viacom (proprietária da

CBS), News Corporation, Bertelsmann, general Eletric (proprietária da NBC), Sony,

AT&T-Liberty Media e Vivendi Universal. Estes grupos são donos de todos os

grandes estúdios cinematográficos, redes de televisão e empresas fonográficas do

mundo, assim como boa parte dos grandes canais e sistemas a cabo, revistas,

estações de televisão de grande mercados e editoras de livros. HERMAN;

CHOMSKY (2003)

A mídia tem como uma de suas principais funções propagar informações em nome

de poderosos interesses sociais que a controlam e financiam. Isto só é possível com

3 O principio de flux livre significa que na prática, as agências determinam o que deve ser considerado como notícia. Ou seja, elas possuem o direito de selecionar dentre os mais variados acontecimentos domésticos e internacionais o que deve ser noticiado em todo o mundo. MATTA, Fernando Reyes. A informação da nova ordem internacional. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.p.62

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a colaboração dos representantes desses interesses que estão bem posicionados

para elaborar e também selecionar as políticas de mídia. Há um aumento dos

conglomerados que controlam muitos tipos de mídia como estúdios

cinematográficos, redes de televisão, canais a cabo, revistas e jornais eletrônicos e

isto acontece principalmente em função da globalização. HERMAN; CHOMSKY

(2003)

O rápido crescimento da propaganda global e a melhora na tecnologia são

motivados pela globalização dos negócios de modo geral e também tem sido

auxiliados por políticas governamentais e pela consolidação da ideologia neoliberal.

Esta ideologia tem cedido o raciocínio intelectual para políticas que concederam a

propriedade de estações de radiodifusão e de sistemas a cabo e via satélite a

investidores transnacionais privados. HERMAN; CHOMSKY (2003)

Existe uma busca crescente da Internet pelos principais jornais e conglomerados da

mídia. Novas tecnologias são introduzidas para atender as necessidades

corporativas e as tecnologias dos anos recentes têm permitido que empresas de

mídia reduzam seus quadros de pessoal administrativo ao mesmo tempo em que

atingem maior produção, além de possibilitar a criação de um sistema de distribuição

global que diminui o número de entidades da mídia.

A mídia está centralizada e os recursos destinados ao jornalismo foram reduzidos.

Isso tem feito a mídia cada vez mais independente dos definidores primários que

concomitantemente fazem notícia e subsidiam a mídia, oferecendo matérias

acessíveis e baratas. Pesquisas mostram que grande parte das noticias surgem de

release de relações públicas. Hoje, existem de acordo com uma contagem, mais de

20mil agentes de relações públicas trabalhando para distorcer as notícias que os

jornalistas escrevem. HERMAN; CHOMSKY (2003)

Com a valorização do capitalismo e o aumento do poder daqueles que são a favor

da privatização, os mercados são cada vez mais democráticos.

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A mídia principal segue uma agenda governamental na cobertura de países-clientes

e países não-favorecidos. Eleições organizadas e vencidas por governos apoiados

pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, não houve destaque da ameaça

de fraude, não consideraram a convocação de uma mídia independente Para a

mídia principal quando há uma fraude nas eleições é melhor do que não existir

nenhuma eleição.

O aperfeiçoamento das tecnologias agregado ao interesse dos proprietários de

jornais em alcançar públicos maiores aumentou a escala de produção de jornais. E o

amadurecimento da TV a cabo, resultou em uma fragmentação da audiência e uma

lenta erosão da participação das redes no mercado e do poder.

Grande parte das empresas da mídia faz parte do mercado e da mesma forma que

outras empresas, elas sofrem fortes pressões dos acionistas, diretores e banqueiros.

Isto ganha força nos últimos anos à medida que as ações das empresas de mídia

tornam-se favoritas do mercado, contando com a capitalização de maiores

audiências e grandes fortunas aplicadas a franquias de propaganda. HERMAN;

CHOMSKY (2003)

Ao mesmo tempo, as restrições aos comerciais de televisão - que já eram fracas –

estão desaparecendo e a lucratividade da mídia aumenta em um ambiente mais livre

das regras.

Os grupos que controlam a mídia também estão envolvidos em relacionamentos

estreitos com o principal segmento da comunidade empresarial através de

conselhos de administração e de relacionamentos sociais.

COBERTURA JORNALISTICA DA CNN NA GUERRA DO GOLFO

Durante a primeira Guerra do Golfo, foi identificado o "efeito CNN". Pela primeira

vez, havia uma rede de notícias provendo, praticamente em tempo real, informações

sobre o campo de batalha. Este efeito marcou a chegada da cobertura ao vivo de

qualquer lugar, em tempo real dos acontecimentos.

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O controle do governo sobre os jornalistas foi muito intenso. Foram nomeadas

sessenta e cinco pessoas na Grã Bretanha para coordenar a imprensa e o

Pentágono estabeleceu que apenas dois grupos de dezoito repórteres fariam a

cobertura. Logo depois, com a pressão exercida por parte da mídia, o governo

cedeu e acrescentou onze grupos de sete jornalistas para acompanhar o

acontecimento. FONTENELLI (2004)

Este controle só foi possível porque a maioria das ofensivas acontecia diretamente

pelos aviões, o que torna o acompanhamento dos fatos mais complicado para a

imprensa. Somente quando as batalhas atingem os campos que os jornalistas

passam a possuir maior capacidade para cobrir o que ocorre, entretanto, os

combates no solo duraram apenas uma semana. Pela falta do que noticiar, os

jornalistas enfatizavam a aparência dos soldados, como uniforme para proteção

contra armas químicas, equipamentos do exército e cantis. MATTOS (2002).

A mídia, de maneira geral, aliada ao governo estadunidense, tentava minimizar as

iniciativas de coberturas independentes e a partir disso favorecer a manipulação dos

fatos. Isto tornou evidente quando Richard Cheney, o Secretário de Defesa de

George H. Bush afirmou: “eu achava que era importante tentar administrar esses

relacionamentos para evitar que a imprensa nos ferrasse, se é que posso usar esse

termo”. FONTENELLI (2004).

Durante a guerra, nenhum jornalista tinha permissão de se movimentar no campo de

batalha desacompanhado de algum membro do governo, sendo assim, geralmente

os oficiais se direcionavam para registrar apenas o que era interessante divulgar do

ponto de vista dos aliados. Além disso, a cobertura era feita em rodízio, o que

significa que havia um número reduzido de repórteres para testemunhar os esforços

da guerra. Suas reportagens eram remetidas a outros veículos de comunicação,

portanto, o parecer do que era vivenciado nos campos de batalha era bastante

restrito. FONTENELLI (2004)

Todas as matérias eram revisadas pelos militares, um processo que às vezes levava

horas ou até mesmo dias quando estas não iam ao encontro das expectativas dos

aliados. Eles não chegavam a censurar o material, mas a revisão que era feita

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atrasava o envio das reportagens às redações, o que fazia com que algumas delas e

tornassem desatualizadas. Em um total de mil trezentos e cinqüenta das

reportagens que eram produzidas, apenas cinco chegavam ao Pentágono para

revisão. Toda informação repassada aos jornalistas era cedida pelos militares, ou

seja, grande parte das reportagens favorecia os aliados. ROBINSON (2005)

O cuidado dos norte-americanos era justificado, já que não havia no Congresso

consenso em relação à guerra, a opinião pública estava dividida e também, devido

aos avanços tecnológicos, o número de telespectadores acompanhando o conflito

era elevado: no dia 16 de janeiro de 1991 um total de cento e vinte milhões de

pessoas foram capazes de assistir, pela maior audiência da história, o anúncio da

guerra.

Contudo, ocorreram três fatos que fugiram do controle dos aliados: o bombardeio de

uma fábrica de leite infantil, a destruição de uma casamata em Bagdá, causando a

morte de civis e a destruição de mil veículos do exército iraquiano. Na Inglaterra,

pesquisas de opinião demonstraram que 80% do público eram a favor das restrições

impostas à mídia.

Grande parte das entrevistas elaboradas pela CNN é preparada por uma pequena

equipe que ensaia as perguntas e respostas anteriormente e o apresentador

transforma-se apenas no leitor deste script. Não existe um diálogo com vontade de

compreender o que acontece. Existe uma preocupação em dividir as pessoas entre

amigos e inimigos. LIVINGSTONE (2001)

É especulado que as mesmas pessoas que são responsáveis pela equipe editorial

também participam junto a outros líderes da imprensa dos EUA de uma reunião

semanal no Metropolitan Club em Washington para discutir "ética" com os

responsáveis pela comunicação da Casa Branca.

Segundo os chefes de Estado, esta política adotada por eles não pode ser

considerada uma pressão, apenas um acordo de cavalheiros relacionado ao senso

de responsabilidade nacional. Em função disto, o grupo CNN aprendeu a jogar com

rapidez, e diminuir o poder de memória dos telespectadores.

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Segundo Thiery Meyssan (2005) o general Colin Powell desenvolveu dois princípios

de comunicação:

1) O custo de sangue deve ser o mais baixo possível para a população dos EUA.

Isto significa que o que realmente importa durante a transmissão da CNN, é que não

se deve nunca derramar lágrimas e sangue. Assim, quando aconteceu a primeira

Guerra do Golfo e o general Powell estava na CNN, as imagens transmitidas foram

do embarque, aeronaves, bombardeamentos. O telespectador participa da operação

como se fosse um jogo de vídeo. Ele nunca vê o drama humano que se realiza na

terra. Na segunda Guerra do Golfo, apesar dos jornalistas embarcarem junto com as

unidades de combate, eles foram obrigados a assinar um contrato de onde se

comprometiam não dizer respeito sobretudo dos horrores da guerra. CNN poderia

então divulgar imagens da vida quotidiana dos soldados. Os telespectadores podem

participar no seu épico, mas ignoram todos os efetivos do combate.

A guerra tornou-se um grande espetáculo. Para manter sua posição como a rede de

referência global, a CNN foi conduzida a transmitir imagens para os telespectadores

estrangeiros e censura para o público americano.

2) Para se livrar das atrocidades da guerra, deve-se contar com aliados em

operações militares. Daí o desejo de construir coalizões mais ou menos fictícias, e

contar com a reforma da OTAN.

Uma conseqüência não intencional do colapso do império soviético foi o

desenvolvimento descontrolado de uma propaganda pró-EUA. Uma das maneiras

encontradas para difundir este novo instrumento foi a própria CNN. Sua força reside

no conceito de transformar as informações em um espetáculo para evitar qualquer

forma de análise mais específica. Além disto, há uma maior proliferação de notícias

em canais nacionais, que transmitem imagens ao vivo da CNN, desta forma a CNN

tem minimizado o impacto e as vulnerabilidades dos telespectadores. THIERY

MEYSSAN (2005)

A informação tornou-se uma forma de condicionar a opinião pública e sem reclamar

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da liberdade de expressão é preciso mostrar que estamos conscientes. Não são

todas as pessoas que acreditam na veracidade e imparcialidade da CNN, mas

quase o mundo todo pode acompanhá-la, diretamente ou de forma indireta, através

de outros canais radiodifusão.

MÍDIAS SOCIAIS E OS CONFLITOS PÓS-ELEIÇÕES

A partir dos anos 90 foram verificados avanços tecnológicos na área da

comunicação que possibilitaram maior interação entre as pessoas de todo o mundo.

Novos meios de comunicação como a Internet, aparelhos celulares, câmeras

digitais, transmissores de rádio, máquinas de impressão, copiadores de CDs, entre

outros entre outros inventos, tornaram a comunicação social mais flexível, dinâmica

e, principalmente, acessível. Isso refletiu diretamente nas relações com o mundo.

No início do século XXI, a supremacia das grandes corporações midiáticas que

durante o século passado dominaram o cenário mundial com a massificação da

cultura foi colocada em cheque. Em 19 de setembro de 2004 na Folha de S. Paulo, a

coordenadora adjunta da Escola de Comunicação e Artes da UFRJ, Ivana Bentes,

publicou um artigo onde afirma que a cultura digital pós-industrial em todo o planeta

vem transformando a "identidade nacional", em uma ‘diversidade’ cultural bem mais

complexa. Ela destaca que redes de cooperativas, coletivos de toda espécie,

produtores independentes "têm a real oportunidade de participar na produção da

comunicação em nível local, regional e global".

A possibilidade de propagar e produzir cultura, arte e tecnologia no âmbito global

surge como ponto crucial no rompimento da hegemonia corporativista, que está

ligada quase sempre aos ideais de uma minoria com maior poder aquisitivo.

DOWING (2002) relaciona o estudo da mídia alternativa ao uso em movimentos de

transgressão a modelos políticos, econômicos e culturais hegemônicos ou

dominantes. Ele não considera apenas a mídia alternativa como modelo de oposição

a esses sistemas. São descritas experiências de mídia alternativa das mais diversas

e em vários momentos da história.

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DOWING (2002) considera para seu estudo não apenas os tradicionais meios de

comunicação como a televisão, o rádio, ou o jornal impresso, mas também outros

mecanismos criados para servirem como forma de resistência e luta e de

demonstração de descontentamento ou abuso. O teatro, o grafite, os folhetins, a

panfletagem, o vídeo, o vestuário, a fotografia, as intervenções de rua,

manifestações públicas, greves, entre outros, são alguns deles. Também não deixa

de considerar a importância da Internet para o cenário político, cultural e econômico

da atualidade, lembrando o poder que esta tem como veículo de transformações

sociais e como mídia alternativa.

Através da Internet foi aberta a possibilidade de espaço inédito de intercâmbio da

informação, fora dos circuitos dos conglomerados, contribuindo para uma dimensão

real ao movimento social mundial da sociedade civil em temas globais.

Acontecimentos nos quais a livre circulação de informação na Internet foi relevante

na Rebelião Zapatista, em 1995 em Chiapas; a criação em rede do movimento

francês ATTAC, no final de 1998; o desenvolvimento na Internet de freenets, dos

Centros de meios independentes como Indymedia que mostraram sua eficácia para

a cúpula da OMC, em 1999, em Seattle.

O desenvolvimento de novas tecnologias, somados ao uso de Internet, favoreceu a

criação de novos meios de comunicação e novas experiências de jornalismo-

cidadão com grande sucesso não só nos Estados Unidos e em países

desenvolvidos, mas também na luta pela liberdade de expressão nos países.

Com a excessiva circulação de informações na Internet, os meios alternativos com

as novas tecnologias têm enfrentado enormes desafios. Alguns estudos indicam

que, se antes havia apenas alguns meios em cada localidade, agora existem

milhões de sítios acessíveis e 50% do tráfego na rede visita 0.5% dos sítios. Deste

modo, a riqueza da informação traduz-se em diminuição da atenção e a questão da

credibilidade da informação transforma-se em questão fundamental.

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Em função das novas tecnologias, foi possível ter uma perspectiva que não era

estritamente a dos EUA. O chamado "efeito CNN" está sendo substituído pelo

"efeito Al-Jazeera”4 ou mesmo pelo efeito Nokia 5.

A história da emissora Al Jazeera começou na Arábia Saudita, em 1994, com um

acordo entre a rede inglesa BBC e a emissora saudita Orbit Communications. A

intenção era criar uma versão árabe da BBC, que até o momento era transmitida em

inglês para o Oriente Médio. Porém a maneira britânica de editar suas reportagens

desagradou os sauditas e eles preferiram desfazer o acordo a ter de assistir a

entrevistas dos opositores de seu regime na nova emissora. MILES; PRESS (2006).

Antes mesmo de existir um pacto entre as duas emissoras já existia um projeto de

montar uma rede de TV independente e livre. Em 1995, Hamad bin Khalifa Al Thani,

emir do Catar através de um golpe, tirou seu pai do trono e tornou-se rei. No poder,

ele concedeu direito de voto às mulheres e aboliu a figura do ministro da Informação,

que censura toda notícia que circula dentro dos países árabes e com um

investimento inicial do governo de US$ 150 milhões que, em 1º de novembro de

1996, a Al Jazeera transmitiu seu primeiro telejornal. MILES; PRESS (2006)

A popularidade da emissora entre os árabes foi imediata. Pela primeira vez foram

vistas reportagens sobre os próprios assuntos com tanto conteúdo. Com a eclosão

da 2ª Intifada, na Palestina, a emissora fez sua primeira cobertura de guerra. Os

outros canais árabes inspirados na emissora passaram a utilizar o mesmo formato.

Porém a principal diferença entre a Al Jazeera e as demais emissoras é que a Al

Jazeera fazia entrevistas com israelenses. MELLOR (2005)

Durante a guerra no Afeganistão a emissora tornou-se conhecida no resto do

mundo, e, em fevereiro de 2000, o regime Talibã convidou a rede árabe e a CNN

para abrirem escritórios no país. Ao contrário da emissora americana, a Al Jazeera

aceitou a proposta e passou a estabelecer contatos e a manter fontes com o regime

4 Al Jazira ou Al Jazeera é a maior emissora de televisão jornalística do Catar. Transmite em língua árabe. Criada em 1996 por Hamad bin Khalifa Al Thani, emir do Catar, no intuito de transformar seu pequeno país em centro cultural da região, Al Jazira iniciou suas transmissões em 1º de novembro daquele ano e logo se destacou por alcançar um nível de liberdade de expressão e de oposição raramente visto no mundo árabe, acostumado a uma mídia controlada e dócil, mera porta-voz de comunicados oficiais. DERIAN (2006) 5 O efeito Nokia possibilita o envio de imagens instantâneas, do celular para os grandes jornais. DERIAN (2006)

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vigente e com civis afegãos. Todos estes fatores contribuíram no sucesso da

cobertura em 2001, quando o Talibã proibiu a entrada de novos repórteres no

Afeganistão. MILES; PRESS (2006)

Logo após o início dos bombardeios da guerra do Afeganistão, o repórter Taysir

Alluni recebeu em Cabul um vídeo da rede Al Qaeda. O vídeo mostrava um discurso

de Osama bin Laden falando sobre os ataques do 11 de Setembro e conclamando

os muçulmanos à guerra contra os EUA e Israel . A partir deste vídeo a Al Jazeera

recebeu mais destaque pelos governos britânico e americano e passou a ser motivo

de preocupação no Ocidente. MILES; PRESS (2006).

As grandes redes mundiais de TV, por não terem acesso ao local da guerra exibiam

cenas captadas pela nova mídia árabe. Neste mesmo período em que a TV era

conhecida mundialmente, foi associada ao “eixo do mal” por George W. Bush assim

como Iraque, Irã, Coréia do Norte representando o apoio ao terrorismo. Os EUA

ainda estavam traumatizados pelo terrorismo, e o fato da TV Al Jazeera abrir espaço

para Osama bin Laden, homens-bomba palestinos e outros suicidas do islã era um

fato impossível de admitir. Enquanto isso a TV tentava se explicar defendendo que

esses homens tinham dado a vida por uma causa. MELLOR (2005)

Outro fator que despertou a curiosidade dos telespectadores foi exibir a situação

deplorável dos alvos civis muçulmanos – algo que não era visto nos canais

americanos e europeus. A produtora americana May Ying Maya Welsh que esteve

no Iraque trabalhando para a Al Jazeera e acompanhou a rotina do conflito afirmou

que existe uma grande diferença entre reportar para uma emissora americana e

para a Al Jazeera. “Havia pouca coisa em Bagdá que não sabíamos. Já na CNN,

embora lidássemos com pessoas locais nos campos de guerra, éramos estranhos

tentando dizer ao mundo o que acontecia em um lugar sobre o qual não sabíamos

nada”, conta Welsh. MELLOR (2005)

No período de invasão americana, a Al Jazeera foi atacada por duas bombas

jogadas sobre o escritório da emissora em Cabul. O prédio que estava vazio foi

derrubado e no dia 8 de abril de 2003, durante a guerra no Iraque, um avião

americano lançou dois mísseis sobre as instalações do canal em Bagdá, matando o

correspondente e produtor Tareq Ayyoub. MILES; PRESS (2006)

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Uma das maiores polêmicas da emissora são os programas de auditório. Estes

programas são transmitidos todos os domingos às 21h05, horário de Meca, trazem

em toda edição o xeque6 Yusuf al-Qaradawi, um dos mais respeitados religiosos do

Oriente Médio e têm a participação intensa dos telespectadores. No programa o

xeque apoia a democracia e o uso da tecnologia. Critica a falta de habilidade política

dos governantes árabes e imposição do casamento contra a vontade da mulher.

Embora tenha condenado os atentados de 11 de setembro de 2001, o xeque Yusuf

perdeu a o visto de entrada nos EUA após um pronunciamento apaixonado a favor

dos suicidas da causa palestina. MELLOR (2005)

Todas as quintas-feiras é exibido o programa Al-Ittijah al-Muakis inspirado em

Crossfire (“Fogo Cruzado”), da CNN, e reúne dois convidados com posições

conflitantes. Durante a sua existência já foi debatido se o islã é obstáculo para o

desenvolvimento de nações muçulmanas, se a família real saudita é corrupta, se o

Kuwait é ainda uma parte do Iraque ou se os países árabes deveriam permitir a

entrada de tropas americanas em seu território.

O programa é interativo e a plateia participa e debate com o apresentador e com os

convidados. Alguns gritam e abandonam o estúdio ao longo do programa e isso faz

da sua exibição um grande sucesso das telas árabes. Até hoje, muitos governantes,

intelectuais ou líderes políticos têm receio de aparecer no show. Um deles já usou

um bigode falso para não ser reconhecido. Durante a entrevista o disfarce caiu e o

apresentador Faisal al-Qasim teve um acesso de riso e para disfarçar a situação

constrangedora chamou os comerciais. MELLOR (2005).

Mais uma novidade da TV a Al Jazeera foi a exibição de uma programa direcionado

exclusivamente ao público feminino. Foi tirado do ar após 4 anos, porque segundo o

editor Ayman Gaballah, o formato estava se tornando repetitivo e segundo ele

mulheres não precisam de um programa só para elas. MELLOR (2005).

A Al Jazeera revolucionou o padrão das mídias do Oriente Médio porém a

liberalidade no tratamento dos assuntos globais não é o mesmo para a cobertura

6 Chefe muçulmano em território de extensão variada (país, cidade, bairro ou tribo); xeique, muçulmano respeitado pela idade.

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das questões internas do país sede da emissora, o Catar. Menos de 1% da

programação contempla o noticiário local.

O editor Ayman Gaballah explica que o Catar é pequeno e não produz muitos fatos

que gerem matérias, e que não há qualquer tipo de influência do Estado na escolha

da pauta. Ele diz que a rede veicula notícias do país, porém apenas quando são de

extrema importância. Quando questionado se o canal já entrevistou algum membro

da oposição catariana, o editor assume que nunca.

A emissora pode ser apenas uma parte da ambiciosa política externa do xeque

Hamad, já que o emirado tem boas relações com os vizinhos e pretende assumir

posição neutra nos conflitos da região. Também tem criado laços com Israel e com

os EUA, que mantêm no país a maior base militar de todo o Golfo Pérsico.

MELLOR (2005) acredita ser óbvia a intenção do emir de colocar dinheiro na rede

para atrair atenção para seu país, pois a Al Jazeera se tornou uma forte marca do

Catar. É importante lembrar que o país tem nota baixa no Índice de Liberdade de

Imprensa 7. Enquanto os demais jornais catarianos podem sofrer censura e seus

jornalistas ser perseguidos, a Al Jazeera noticia com mais liberdade.

Quem trabalha na TV afirma que notícias do Catar também são transmitidas e tem

como exemplo um episódio de Al-Ittijah al-Muakis que discutia se era correto o país

manter a base aérea americana de Al-Udeid em seu território. Durante o 7º

aniversário da emissora, foi feito um programa comemorativo dedicado a criticar a Al

Jazeera. Em 1996, após a deposição do antigo emir, aliados opostos ao golpe

tentaram tomar o poder do xeque Hamad. Os conspiradores foram presos e

julgados. A emissora mostrou o julgamento ao vivo – a primeira transmissão do tipo

no Oriente Médio, o que seria uma amostra da transparência do canal. MILES;

PRESS (2006).

Outra crítica feita ao canal está na cobertura ser pró-árabe e ter um caráter político.

O editor Gaballah explica que são essas características que distiguem a emissora

das demais. Hugh Miles observa que a emissora é similar à BBC em termos de

liberdade de imprensa e é menos influenciada que os demais. 7 Índice divulgado anualmente pela ong Repórteres Sem Fronteiras www.en.rsf.org acessado dia 16 de abril ás 19h13

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A possibilidade da criação de um canal independente no Oriente Médio foi a

principal questão que a criação da Al Jazeera. Para Noha Mellor, o que acontece

hoje é um acúmulo de poder na imagem dos jornalistas, que acabam agindo mais

como políticos do que como repórteres.

A história da Al Jazeera mostra que Estado, religião e mídia sempre estiveram

estritamente ligados no mundo árabe. Cabe à Al Jazeera ter uma visão crítica dos

fatos à sua volta.

A disseminação de tecnologias, como internet e celulares com câmeras permite a

proliferação de pontos de vistas e também a visão do Oriente Médio. Como foi

amplamente noticiado, os ataques mortais 7 de julho em Londres8 no sistema de

transporte de massa marcou a estréia do videofone celular como uma fonte de

depoimentos e provas em potencial. Foi possível enviar quase que

instantaneamente imagens para emissoras e em poucos minutos imagens e vídeos

do atentado estavam espalhados pelos jornais eletrônicos de todo o mundo.

O jornal britânico The Guardian identificou o nascimento de um novo tipo de

jornalismo, aliado ao papel desempenhado pelos blogs da Internet na comunicação

instantânea do evento.

Através do efeito Al Jazeera, baseado em 24-horas do canal de notícias em árabe, é

possível perceber o impacto das notícias provenientes de fontes ocidentais: ela é

responsável por trazer uma maior variedade de pontos de vista, complexidade e

controvérsia sobre a cobertura do guerra no Iraque e a guerra contra o terrorismo.

O primeiro obstáculo é a questão da qualidade e isto impede que o fenômeno seja

completo. Também é necessário um meio de julgar a autenticidade, de saber se é

uma fonte genuína ou não. O segundo provável obstáculo é o fato de não haver

editores. São apenas um grande número de imagens sem qualquer tipo de

filtro.Quando um vídeo da Al-Qaeda é divulgado num site, a mídia geralmente não

identifica a fonte da informação. Para que a informação seja perfeita é necessário o

8 Conhecido também como Atentado ao metrô de Londres, ocorreu na manhã de quinta-feira, no dia 7 de julho de 2005. Neste dia memorável, a cidade de Londres (Inglaterra) foi vítima de uma série de explosões de quatro bombas que atingiram o sistema de transporte público da cidade durante a hora do rush. DERIAN (2006)

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uso de uma fonte, ou um autor, porque desta forma cria-se o que é conhecido como

responsabilidade. DERIAN (2006).

Existe uma grande guerra na internet para fechar alguns sites de extremistas (o que

não é fiel aos princípios democráticos). E extremistas no Iraque costumam usar sites

americanos de compartilhamento de arquivos para divulgar vídeos e áudios. O

governo Bush criou um grande grupo dedicado à inspecionar estes sites, que são ao

mesmo tempo um meio de divulgar a palavra Jihad e do seu oponente e entender

suas fraquezas. DERIAN (2006)

Muitos destes vídeos não têm como alvo o público americano, mas o do Oriente

Médio. Os telespectadores americanos podem julgar os protagonistas destes vídeos

como loucos e se perguntarem o motivo da decapitação de reféns. Por outro lado, a

própria Al-Qaeda lançou um comunicado pedindo que parassem com as

decapitações, porque era um tipo de publicidade negativa para o grupo.

Apesar da grande diversidade existente nos Estados Unidos, às informações ainda

não alcançam à todos e o que acontece no mundo e no Oriente Médio (apesar da

mídia ser tão poderosa no país) não é visto por todos. Isto pode acontecer por uma

questão cultural ou por conseqüência do excesso de informação. Porém é

importante reconhecer que fronteiras não barram ameaças, por isso é necessário

que as pessoas estejam cada vez mais informadas.

Com o restante do mundo também houve isolamento em relação às informações

referentes ao Oriente Médio, e isso tem mudado de várias maneiras. Seja pelas

imigrações e pela economia global. Com estas forças interdependentes e

transnacionais, as pessoas estão buscando mais informações sobre o mundo.

Em outras guerras, os Estados Unidos usaram com eficiência a propaganda contra

seus inimigos. Agora, apesar do combate ao terrorismo, mais e mais pessoas

escolhem o martírio e não a liberdade. Há uma tendência das burocracias - e o

Departamento de Defesa que é uma enorme burocracia - de reagir com lentidão.

DERIAN (2006).

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Além disso, há evidências de que antes do ataque de 11 de setembro de 2006 9

havia um site da Al-Qaeda. Agora, são centenas. Então, pode-se dizer que, neste

ponto, a guerra tem sido boa para a Al-Qaeda. É possível reconhecer que eles são

mais fortes em relações às redes de comunicações, que muitas vezes favorecem o

caráter descentralizado, flexível e não-hierárquico das células terroristas. Eles têm

esta vantagem. De qualquer maneira, o Estado tem mais recursos, em termos de

informática, capacidade de vigilância, entre outros.

As eleições presidenciais no Irã são um marco histórico nas possibilidades das

mídias sociais10 em coberturas jornalísticas importantes. As mídias sociais permitem

que qualquer indivíduo publique vídeos (em sites como Youtube11 e Vimeo12), fotos

(Flickr13), textos (em blogs e ferramentas de microblogging como o Twitter14),

músicas (Last.fm15) e estabeleça contato com outras pessoas (em redes sociais

como Facebook16,MySpace17, Orkut18). A lógica de livre publicação nas mídias

sociais estabelece uma mudança em relação aos padrões de difusão da mídia

tradicional, em que um centro distribui conteúdo para todos. Nas mídias sociais,

todos têm a chance de produzir e divulgar conteúdo para todos. LÉVY (1999)

As eleições foram responsáveis por unir à esquerda e a direita no ocidente e mídias

sociais reuniram-se para acompanhar os fatos no momento em que acontecem,

colocando-se ao lado da oposição iraniana, o que é não é muito comum no

ciberespaço. O twitter é o local mais notável de publicações sobre o tema. Essa

ferramenta possibilita a publicação periódica de textos curtos com até 140

caracteres.

9 Os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, foram uma série de ataques suicidas contra alvos civis nos Estados Unidos, perpetrados em 11 de Setembro de 2001 e atribuídos à organização fundamentalista islâmica Al-Qaeda. 10 As mídias sociais são ferramentas online de interação social. E estão baseadas principalmente na criação coletiva e no compartilhamento de conteúdo entre usuários da Internet. Elas abrangem diversas atividades que integram tecnologia, interação social e a construção de palavras, fotos, vídeos e áudios. Esta interação e a maneira na qual a informação é apresentada dependem nas várias perspectivas da pessoa que compartilhou o conteúdo, visto que este é parte de sua história e entendimento de mundo. (LEVY, 2009) 11 www.youtube.com 12 www.vimeo.com 13 www.flickr.com 14 www.twitter.com 15 www.lastfm.com 16 www.facebook.com 17 www.myspace.com 18 www.orkut.com

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Os usuários podem “seguir” e serem “seguidos” por outros inscritos, num sistema de

assinatura que facilita a recepção das atualizações de quem se deseja ler. A frase

de apresentação, “What are you doing?” (em português, “o que você está

fazendo?”), convida os usuários a divulgarem suas ações na rede e a flexibilidade da

ferramenta possibilita sua utilização para mobilizar ativistas dispersos – função que

se observa no caso iraniano. A facilidade de publicação de conteúdo nas mídias

sociais permite seu emprego em situações em que a imprensa não consegue cobrir

adequadamente os acontecimentos – principalmente por repressão de autoridades

(caso das atuais eleições do Irã)

As mídias interativas e as comunidades virtuais desterritorializadas abrem uma nova esfera pública em que floresce a liberdade de expressão. A Internet propõe um espaço de comunicação inclusivo, transparente e universal, que dá margem à renovação profunda das condições da vida pública no sentido de uma liberdade e de uma responsabilidade maior dos cidadãos” (LÉVY, 2003, p. 367)

Não existem provas sólidas de uma fraude em grande escala, que pudesse

comprovar uma fraude eleitoral em uma eleição que contou com onze milhões de

votos para um candidato. Desde que o presidente Mahmoud Ahmadinejad e seu

principal opositor, o ex-primeiro ministro Hossein Mousavi, anunciaram suas

candidaturas, no começo de março de 2009, várias pesquisas eleitorais foram

realizadas no Irã.

O resultado dessas pesquisas variava, entre os dois concorrentes, mas a maioria

convergia para o resultado que Ahmadinejad continuaria cargo de presidente.

Porém, algumas das organizações que financiavam essas pesquisas, como a

Iraniana Labour News Agency e a Tabnak admitem abertamente terem sido aliadas

à Mousavi, que fazia parte da oposição conhecido como movimento reformista. Seus

números foram claramente inclinados em favor de Mousavi, da oposição e lhe deram

uma vantagem de 30% em algumas pesquisas. ESAM AL-AMIM19 (2009)

19 Esam Al-Amin escreve para www.observatoriodaimprensa.com.br acessado dia 17 de novembro de 2009 ás 18h44

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Apenas uma das pesquisas foi feita por uma agência de imprensa ocidental. Esta

agência foi comissionada conjuntamente pela BBC e pela ABC News, e realizada

por uma entidade independente chamada Centro para a Opinião Pública (CPO, em

sua sigla em inglês) da New America Foundation. A CPO pode ser considerada uma

entidade que tem como característica marcante fazer pesquisas de opinião

rigorosas, não apenas no Irã, mas em todo o mundo muçulmano, desde 2005. Esta

entidade, realizou uma pesquisa, poucas semanas antes das eleições, que contava

com uma participação de 89%, mostrando que Ahmadinejad tinha uma vantagem

nacional numa razão de dois para um, sobre Mousavi. ESAM AL-AMIM (2009)

Os resultados oficiais mostraram que houve aproximadamente quarenta e sete

milhões de votantes registrados no Irã. Esta participação foi intensa, como o CPO já

previa. Quase quarenta milhões de iranianos participaram do pleito, com um total de

participação de 85%, dos quais aproximadamente vinte e cinco milhões de votos

foram para Ahmadinejad, contra quase quatorze milhões dados a Mousavi, ou

62,6% contra 33,8% do total de votos, respectivamente. O resultado foi bem

parecido com o resultado das eleições de 2005, quando Ahmadinejad recebeu o

total de 61,7% dos votos e o presidente Hashemi Rafsanjani, 35,9%, naquelas

eleições. O restante dos votos foi destinado para outras candidaturas minoritárias,

como as de Mehdi Karroubi e Mohsen Rezaee. ESAM AL-AMIM (2009)

O que ocorreu pós-eleições no Irã foi uma crise causada pelo descontentamento de

parte dos eleitores com a reeleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad. O

resultado oficial mostrou a vitória de Ahmadinejad com uma diferença de 63% –

quase o dobro de Mir Houssein Mousavi, o segundo colocado. Este resultado foi

recebido com uma onda de protestos, principalmente na capital do país, Teerã. Os

manifestantes acusam que houve fraude na apuração dos votos. Para reprimir

protestos contra o presidente reeleito, o governo iraniano – que já tem um histórico

de condutas arbitrárias – colocou tropas nas ruas, censurou serviços de informação

(telefonia e Internet) e proibiu correspondentes internacionais de fazerem a

cobertura dos atos de descontentação. Alguns jornalistas, inclusive, foram obrigados

a se retirar do país. ESAM AL-AMIM (2009).

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Mousavi e outros candidatos derrotados, um dia após as eleições, apresentaram

aproximadamente setecentas queixas ao Conselho de Guardiães, a entidade

encarregada de supervisionar a integridade das eleições. O Conselho comprometeu-

se a fazer uma investigação aguçada de todas as queixas. Estas acusações

baseavam-se principalmente em quatro pontos:

O primeiro ponto diz respeito sobre o prazo de duração da votação. Foi alegado que

os resultados apareceram muito rápido para terem sido obtidos logo após o

encerramento da votação, quando existiam aproximadamente 39 milhões de papéis

para serem contados.

Em segundo lugar, os observadores atuaram partidariamente, e em alguns casos, a

oposição não contou com seus próprios observadores presentes durante a

recontagem.

Em terceiro lugar, Mousavi, que descende da região do Azerbaijão, no noroeste do

Irã, foi derrotado em sua própria cidade natal.

Quarto motivo, alguns colégios eleitorais encerraram a votação antes do tempo e as

pessoas tiveram de voltar as suas casas sem terem exercido seu direito ao voto.

Um dia, depois que aconteceram as eleições, uma cópia de uma carta de um

funcionário do ministério do interior enviada ao Guia Supremo Ali Khamenei

começou a circular por todo o mundo (os políticos ocidentais e os meios de

comunicação gostam de chamar Khamenei de “Líder Supremo”). Esta carta afirmava

que Mousavi havia vencido o pleito e que Ahmadinejad ocupava o terceiro lugar nas

eleições. Também assegurava que as eleições tinham sido arranjadas em favor de

Ahmadinejad por ordens de Khamenei. ESAM AL-AMIM (2009).

Neste período, o twitter teve a função de combinar protestos, promover o principal

candidato da oposição, Mir Houssein Mousavi, denunciar abusos e violência das

autoridades repressoras, enviar informações gerais do conflito para o restante do

mundo e criar campanhas de mobilização internacional em torno da causa iraniana

nos conflitos decorrentes do resultado das eleições de 12 de junho de 2009.

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Outras mídias sociais também são utilizadas para os protestos (por exemplo, o

Facebook, tem uma comunidade que possui quase 62 mil membros com título “Iran -

Take back your vote!”), mas o twitter é um dos veículos mais utilizados. A facilidade

de distribuição de informações para um número significante de pessoas, de poder

publicar e concomitantemente responder o que outras pessoas escrevem, de

acompanhar a publicação de informações, o seu poder de mobilidade (pode ser

usado em computadores ou celulares com conexão à Internet, o que permite a

publicação de mensagens direto do local dos fatos) e a facilidade para reunir

conteúdo divulgado em outras mídias (pode atuar como um espaço de reunião de

conteúdo através da postagem de links para vídeos no Youtube e fotos no Flickr, por

exemplo) fazem com que o twitter seja a ferramenta preferida.

É importante destacar que o sucesso da Internet na mobilização no Irã é um

fenômeno possível pela intimidade anterior da população com a rede – mais de 20

milhões de iranianos possuem conexão de Internet. Com uma população

predominantemente jovem, o Irã sempre se destacou em número de usuários em

redes sociais como Facebook e Orkut e tem, de longa data, uma comunidade forte

de blogueiros.

A ajuda internacional contribuiu significativamente para a continuidade do

movimento no Irã. Para driblar o rastreamento – e consequente punição – de

manifestantes contrários ao governo, usuários de outras nacionalidades têm

oferecido proxies20 para que iranianos se conectem à Internet como se estivessem

em outro país. Há campanhas no Twitter para que se troque o horário para o de

Teerã, capital do Irã, e se utilize uma imagem colorida de verde ou um avatar21 com

mensagens de apoio aos manifestantes. Manuais de como localizar as informações

dispersas na rede sobre o conflito iraniano foram criados por blogueiros e por

veículos de diversos países, a fim de facilitar a busca de tweets, vídeos, fotos, blogs,

etc. Uma manutenção no sistema do Twitter programada para o dia 16 de junho de

20 Em ciência da computação, proxy é um servidor que atende a requisições repassando os dados do cliente a frente. 21 Em informática, avatar é a representação gráfica de um utilizador em realidade virtual. De acordo com a tecnologia, pode variar desde um sofisticado modelo 3D até uma simples imagem. São normalmente pequenos, de tamanhos variados mas deixando espaço livre para a função principal do site, programa ou jogo que se está a usar.

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2009 foi adiada como forma de não interromper esse canal de comunicação dos

oposicionistas iranianos. O pedido de adiamento partiu do Departamento de Estado

dos Estados Unidos. BRUNS (2005).

Manifestações de colaboração internacional como as acima expostas (independente

de estratégias políticas, como se pode atribuir ao caso de apoio dos EUA)

demonstram que a causa iraniana ganhou força através de sua visibilidade na web e

conseguiu mobilizar uma parcela considerável de pessoas em todo o mundo.

[...] países com contextos muito diferentes, com identidades culturais e religiosas de todo tipo, desenvolvem movimentos cidadãos em rede, que convertem objetivamente a cidadania em fiscalizadora dos processos democráticos, denunciando fraudes eleitorais, corrupções e excessos autoritários dos governantes. (UGARTE, 2008, p. 51)

Assim, a utilização do Twitter nos conflitos pós-eleições iranianas constitui um

fenômeno de inteligência coletiva, em que predomina a manifestação política em

defesa da democracia e da liberdade de expressão. LÉVY (2000)

A definição de ciberativismo dada por Ugarte pode ser aplicada à classificação do

uso do Twitter no caso dos protestos pós-eleições no Irã:

Estratégia que persegue a mudança da agenda pública, a inclusão de um novo tema na ordem do dia da grande discussão social, mediante a difusão de uma determinada mensagem e sua propagação através do ‘boca a boca’ multiplicado pelos meios de comunicação e publicação eletrônica pessoal. (UGARTE, 2008, p.77)

No movimento iraniano, a capacidade de o ciberativismo incluir assuntos na agenda

pública é bem representado pelo uso da tag22 #cnnfail24 (em português, CNN

fracassa) para questionar, via Twitter, a pouca cobertura que a rede americana de

televisão vinha dando ao conflito. Após o grande emprego da hashtag o termo ficou

visível entre os trending topics do Twitter. Não se pode afirmar com certeza essa

relação, mas é possível que a CNN tenha intensificado a cobertura sobre o Irã em

virtude do movimento iniciado no Twitter. 22 A aplicação de palavras-chave que facilitem sua posterior busca no sistema. As hashtags, em especial, são uma convenção entre os usuários do Twitter. Trata-se da inclusão de um símbolo de sustenido (“#”, o popular jogo-da-velha) diante das palavras que se deseja estabelecer como tags. No caso das eleições iranianas, a tag mais popular é #IranElection. Outra marcação bastante adotada é #gr88 (hashtag em apoio a Mir Houssein Mousavi, em referência ao seu lema deGreen Revolution e ao ano atual, 1388, no calendário persa).

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O Irã sofreu uma guerra brutal de oito anos com o Iraque, um embargo e um

bloqueio punitivos além de assassinatos que incluem juízes, um presidente eleito e

um primeiro ministro. O grupo responsabilizado pelas tragédias foi o Mujahideen

Khlaq Organization. MKO é uma organização nacional violenta, com sede na

França, que tem como principal objetivo derrotar o governo pela força.

Apesar de todos os desafios, a República Islãmica do Irã persistiu em uma consulta

eleitoral em três décadas. Realizou mais de trinta eleições nacionais. E, estabeleceu

uma tradição eleitoral ordenada, muito similar às circunscrições eleitorais nos EUA

(election precincts) ou no Reino Unido (borough). Não existe uma tradição de fraude

eleitoral no Irã. O antigo presidente Mohammad Khatami, considerado um dos

principais reformistas no Irã, foi eleito presidente pelo povo quando o Ministério do

Interior era dirigido por ultraconservadores. Venceu as eleições com mais de 70%

dos votos não apenas uma vez, mas duas. ESAM AL-AMIM (2009).

Pode-se considerar que a questão principal nas eleições do Irã não é a fraude, mas

o acesso dos candidatos aos votos que é um problema que não só exclusivo do

país, os EUA também têm o mesmo problema.

Ahmadinejad pertence a um partido político ativo que venceu várias eleições desde

2003, Mousavi é um candidato que apareceu na cena política apenas há três meses,

depois de um intervalo de 20 anos. Durante a campanha Ahmadinejad fez mais de

sessenta viagens por todo o Irã em menos de doze semanas, enquanto seu

oponente só fez campanha nas cidades maiores, e carecia de um aparato eleitoral

sofisticado.

Apesar de Mousavi ter ascendência azeri, a pesquisa do CPO mencionada

anteriormente e publicada antes das eleições observa que “seus resultados indicam

que só 16% dos iranianos de etnia azeri votarão em Mousavi. Em troca, 31% dos

azeris afirmaram que votariam por Ahmadinejad”. Segundo os resultados oficiais, a

eleição naquela região foi muito mais concorrida do que no cômputo nacional e

Mousavi ganhou por uma estreita margem na província ocidental azerbaidjana, mas

perdeu a região para Ahmadinejad por uma diferença de uns 45 a 52% (ou de 1,5 a

1,8 milhões de votos). ESAM AL-AMIM (2009).

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Alguns observadores perceberam que ao serem divulgados os resultados oficiais, a

margem de votos entre os candidatos se mantinha durante a recontagem. Os

especialistas assinalam que, geralmente, quando 3 ou 5% dos votos de uma dada

região foram contados há 95% de segurança de que esse resultado será definitivo.

Em relação ao fechamento dos colégios eleitorais e das pessoas tendo que voltar ás

suas casas é importante mencionar que o tempo de votação foi estendido quatro

vezes para permitir que mais pessoas votassem. Se todas essas pessoas que

voltaram pra casa tivessem votado em Mousavi, isso significaria aproximadamente

6,93 milhões de votos adicionais e manteria o resultado final das eleições, já que a

diferença entre os dois principais candidatos era de 11 milhões de votos. ESAM AL-

AMIM (2009)

É um enorme erro interpretar esse desacordo nacional como um “levante” contra a

República Islãmica, ou um toque de atenção para que a política externa se acomode

ao ocidente às expensas do programa nuclear iraniano, ou de seus interesses vitais.

ESAM AL-AMIM (2009)

Os Estados Unidos têm uma longa história de interferências nos assuntos internos

do Irã, especialmente quando derrubaram o governo democraticamente eleito do

primeiro ministro Mohammad Mossadegh em 1953. Esse ato, que muitos

estadunidenses desconhecem, está muito presente na consciência dos iranianos,

desde a sua infância. É a principal causa de boa parte de sua constante

animosidade com os EUA. Foi preciso que se passassem 56 anos para que um

presidente estadunidense reconhecesse esse ato ilegal: foi quando Obama o fez no

começo do mês, no Cairo.

O presidente Obama deixa que os iranianos resolvam por si mesmos essa questão.

Ater-se aos interesses políticos dos republicanos ou dos democratas pró-Israel seria

extremamente perigoso e traria graves repercussões.

As declarações do presidente Obama no Cairo estão sendo acertadamente

lembradas. A esse respeito disse ao Irã: “Reconheço que será difícil superar

décadas de desconfiança mútua, mas procederemos com coragem, retidão e

determinação. Há muitas questões a debater entre nossos dois países, e desejamos

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dar um passo à frente, sem condições pré-estabelecidas, com base no respeito

mútuo”. ESAM AL-AMIM (2009)

Considerações Finais

A comunicação em massa teve início no século XIX e só a partir do século XX em

função do crescimento da produção e difusão do rádio, televisão, filmes e revistas o

seu crescimento se solidificou. Essas mídias tiveram grande impacto na formação da

estrutura social, bem como passaram a direcionar o comportamento dos indivíduos.

A mídia pode confirmar ou questionar posições oficiais, revelar discordâncias e

corrigir erros e omissões. Recentes avanços no campo da tecnologia da informação

capacitaram a mídia a ter um impacto muito grande sobre a opinião pública.

Por estarem centralizadas em um número cada vez menor de empresas, desde

1990 estão concentradas principalmente em nove conglomerados transnacionais: as

notícias passaram a sofrer influências dos interesses políticos e econômicos em

nome dos poderosos interesses sociais que a controlam e financiam. O aumento dos

conglomerados que controlam muitos tipos de mídia como estúdios

cinematográficos, redes de televisão, canais a cabo, revistas e jornais eletrônicos

acontece principalmente em função da globalização.

Por outro lado, o aparecimento das novas mídias sociais, permitiu que as

ferramentas online de interação social, baseadas na criação coletiva e no

compartilhamento de conteúdo entre usuários da internet fosse utilizada via internet

para mobilizar pessoas de várias partes do mundo em prol da democracia e da

liberdade de expressão.

O twitter tornou-se um veículo de comunicação em tempo real. As informações são

divulgadas em poucos caracteres antes mesmo que seja publicado em jornais e

portais eletrônicos. Ele também permite que haja interação entre os usuários o que

contribui ainda mais para a troca de informação.

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Apesar destas novas ferramentas da mídia não estarem acessíveis à todas as

camadas da sociedade, as eleições do Irã provaram o sucesso da Internet na

mobilização de mais de 20 milhões de iranianos que possuem conexão de Internet.

O Irã possui uma população predominantemente jovem, e sempre se destacou em

número de usuários em redes sociais como Facebook e Orkut e tem uma

comunidade forte de blogueiros.

A contribuição internacional ajudou de maneira significativa que o movimento no Irã

continuasse. Manifestações de colaboração internacional demonstram que a causa

iraniana ganhou força através de sua visibilidade na internet e conseguiu mobilizar

uma parcela considerável de pessoas em todo o mundo

As eleições que aconteceram no Irã e todo um conflito envolvido permitem concluir

que a internet não pode ser facilmente controlada pelo Estado, mesmo com o

estabelecimento de censura. Os protestos que acontecem através da internet são

capazes de mobilizar pessoas do mundo todo, inclusive aquelas pessoas que não

estão diretamente relacionadas à causa.

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