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International Political Science Association – IPSA Political Science World Congress 2009 Obstáculos à consolidação democrática: a baixíssima representação política feminina no Brasil Danusa Marques – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Brasil i Carlos Augusto Mello Machado – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Brasil ii Filipe Recch – Fundação João Pinheiro – FJP – Brasil iii Santiago, Chile, 2009

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International Political Science Association – IPSA

Political Science World Congress 2009

Obstáculos à consolidação democrática: a baixíssima representação política feminina no Brasil

Danusa Marques – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Brasili

Carlos Augusto Mello Machado – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Brasilii Filipe Recch – Fundação João Pinheiro – FJP – Brasiliii

Santiago, Chile, 2009

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Para se compreender a inserção da mulher na vida política brasileira é crucial ter

em mente o cenário no qual se desenvolveu o sistema político no Brasil, com enfoque

especial nas relações entre o sistema partidário – o ambiente onde se relacionam

candidatos e se definem candidaturas – e o formato do mandonismo local,

considerando-se as estruturas sob as quais este se alicerça.

No contexto do exercício da dominação tradicional deve-se atentar para o

controle que grupos predominantes em determinados cenários políticos possuem sobre a

dinâmica de seus redutos, através do controle das opções políticas ou exercendo

influência sobre o eleitorado. Desta forma, é possível considerar que os grupos

tradicionais tenderão a monopolizar os postos de poder local dentro de suas áreas de

influência. Para manter este quadro, esses grupos buscam impedir a viabilização política

de grupos rivais ou mesmo o surgimento de novos atores políticos dentro da competição

local.

Sob a influência da teoria da modernização, diversos autores (Lipset e Rokkan,

1967; LaPalombara e Weiner, 1966) utilizaram o conceito de “desenvolvimento

político” para compreender o arranjo das novas formas de relação de poder existentes

nas emergentes sociedades pós-industriais. De forma geral, a dominação tradicional está

presente em um cenário no qual a maior parcela da população apresenta-se em uma

situação de dependência com relação a determinados mandatários. Recorrentemente esta

divisão se observa pelo controle de terras em um sistema de produção baseado na

agricultura. Quanto maior a concentração de poder econômico e de prestígio, é maior a

influência dos donos de terra sobre os trabalhadores rurais, tornando mais importantes

os benefícios de adesão a estas lideranças tradicionais (Lipset e Rokkan, 1967: 44-5).

Com o processo de modernização, o cenário se torna mais complexo. Surgem

novas clivagens sociais, que se distanciam da idéia de um clã unido sob a dominação

tradicional de um “mandão local” 1. A modernização garantiria o acesso de um maior

número de clivagens sociais – sejam elas trabalhadores ou capitalistas – à esfera do

exercício do poder (LaPalombara e Weiner, 1966: 20), que podem ser contrárias ao

modelo anteriormente estabelecido, constituindo um novo sistema político (Lipset e

Rokkan, 1967: 23).

1 Conceito apresentado por Queiroz, 1976.

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Os países com estruturas sociais modernizadas e economias industriais

desenvolvidas tendem a apresentar “altos níveis de participação política, maior

estabilidade e efetividade de seus governos, e menos violência política do que países

com estruturas sociais mais tradicionais e economias pré-industriais” (Powell Jr., 1982:

34). Desta afirmação segue-se o raciocínio de que a modernização é um condicionante

da mobilização política e que o sistema político estará mais aberto à participação de

novos grupos, que anteriormente eram excluídos (como, por exemplo, as mulheres).

Esta linha de argumentação afirma que em sociedades com alto desenvolvimento

econômico existe uma tendência à proliferação de um maior número de trabalhadores

especializados (Powell Jr., 1982; Queiroz, 1976), o que pode produzir uma maior

diversidade e autonomia da população frente às lideranças tradicionais. Isso possibilita o

desenvolvimento de novas formas de organização e associação, baseadas não somente

em relações de interesse, mas também em relações de solidariedade.

Este raciocínio aponta no Estado tradicional determinadas características, como

o patrimonialismo, o clientelismo, o patriarcalismo, o personalismo e a adesão ao chefe

local. A modernização traria um modelo diferente de Estado, que não seria baseado

nestes valores, mas os ultrapassaria.

No entanto, a teoria feminista endereça várias críticas a essa concepção linear e

progressista da superação da dominação tradicional (e do patriarcado) através do

processo modernizador. Aguiar (1997) afirma que as relações patriarcais (portanto, de

dominação de gênero) se sustentam, seja em governos autoritários – caracterizados pela

apropriação do espaço público pelo privado, impedindo a universalização das regras de

relacionamento entre sociedade e poder público – ou em governos liberais – que apesar

dos pactos sociais que garantem liberdades individuais, deixam intocadas as relações de

dominação na esfera doméstica.

O patriarcalismo se caracteriza (em sua expressão máxima, na obra de Weber,

1914), na tradição liberal, como um estágio tradicional, anterior ao desenvolvimento do

capitalismo. A autoridade do chefe de família é baseada na tradição e se caracteriza sob

a forma de propriedade. Integram a propriedade do chefe de família os servos, escravos,

filhos e esposa, além dos seus bens, o que caracteriza uma distância social entre o

patriarca e os demais membros do grupo doméstico. Na visão de Weber, o

patriarcalismo e a dominação tradicional seriam superados através do processo de

racionalização das sociedades ocidentais, com o carisma e a tradição sendo substituídos

pela dominação racional-legal.

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O feminismo vem discutindo essa “previsão” weberiana2 da superação da

dominação tradicional e do patriarcalismo, que estariam fadados ao desaparecimento,

argumentando que o patriarcado se apresenta como um sistema de opressão que se

mantém mesmo com o avanço do capitalismo e da democracia liberal. O processo de

racionalização, neste contexto, aprofunda ainda mais a desigualdade entre homens e

mulheres, por manter a estrutura de subordinação feminina, através de seu

mascaramento e utilização em um novo arranjo.

Apesar da discussão sobre patriarcado ocorrer majoritariamente através da

discussão sobre a divisão público/privado, Walby (1990) afirma que o patriarcado é um

modelo que sofre adaptações, se apresenta em vários graus e é um sistema sujeito à

mudança histórica. Além de apresentar seis formas de patriarcado3, a autora apresenta

os conceitos de patriarcado público e privado. No patriarcado privado o homem – pai ou

marido – está na posição de opressor e beneficiário da subordinação feminina, cujo

mecanismo central é a exclusão das mulheres da vida pública. No patriarcado público as

mulheres têm acesso à esfera pública – ao contrário do que ocorre no patriarcado

privado, onde este acesso é interditado –, mas sofrem uma subordinação coletiva,

realizada no público e manifestada por diferentes formas institucionais.

A passagem do patriarcalismo privado para o público ocorreu devido às

manifestações feministas pela garantia dos direitos civis para as mulheres e também ao

desenvolvimento do capitalismo, que necessitava de mais oferta de mão-de-obra – fruto,

assim, de um processo de modernização da sociedade. O modelo público de

patriarcalismo se divide no acesso ao mercado de trabalho (com a inclusão de mulheres

como mão-de-obra remunerada) e ao Estado (garantindo direitos formais de

cidadania). Passa-se ao patriarcalismo público, no qual o acesso à esfera pública às

mulheres é permitido, mantendo, entretanto, as condições de desigualdade entre homens

e mulheres.

Rezende (2007) afirma que os estudos sobre a formação do Estado brasileiro

ressaltam o caráter rural como o elemento central da organização social brasileira,

baseada na dominação tradicional. O patriarca tinha uma autoridade incontestável sobre

o seu grupo familiar, que também se estendia para a vida pública (fragmentada, 2 A argumentação weberiana influenciou diretamente a abordagem da teoria da modernização, apresentada no início deste artigo. Deste modo, é importante ressaltar que as críticas feministas à abordagem de Weber também se direcionam ao pensamento desenvolvimentista-modernizador. 3 O modo de produção patriarcal; as relações patriarcais do trabalho remunerado; as relações patriarcais do Estado; a violência masculina; as relações patriarcais da sexualidade; e as relações patriarcais na cultura.

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descentralizada e dominada por facções e grupos familiares). Sobre este cenário autores

clássicos do pensamento político brasileiro4 afirmam a necessidade de se desenvolver

uma centralização capaz de promover a integração nacional e a transformação dos

indivíduos em cidadãos, baseando-se na divisão entre os domínios privados e públicos.

Aguiar (1997) aponta a insuficiência da questão da divisão entre as esferas

pública e privada se considerada a questão da subordinação das mulheres, porque o

patriarcalismo não somente é caracterizado pela apropriação privada dos mecanismos

do governo, mas também por uma situação de desequilíbrio de poder na esfera privada.

Rezende (2007) ressalta que o programa de centralização e modernização

brasileiro da era Vargas – que instituiu o sufrágio feminino no país – não era neutro

quanto à relação entre homens e mulheres, porque considerava a família o elemento

central da sociedade, assim atuando para manter as hierarquias entre os sexos e

fundamentando a estrutura social. Após a primeira onda de feminismo, que conseguiu

alcançar algumas conquistas, como o acesso ao mercado de trabalho e o sufrágio

feminino, reforçou-se a opressão das mulheres. A família patriarcal não deixou de

existir, mas ocorreu uma transição do modelo privado para o modelo público de

patriarcalismo5, assimilando novos papéis femininos nas relações patriarcais e

perpetuando a dominação masculina.

No que tange à participação política no Brasil, o enfrentamento à ausência das

mulheres na esfera política começou a ser mais sistemático a partir da década de 1970,

durante a ditadura militar, com a estruturação dos movimentos de mulheres e feministas

e uma onda de debates mundial, em especial com a Década da Mulher das Nações

Unidas (1975-1985). Ainda que não tivessem sido necessariamente feministas, estes

movimentos foram muito importantes para a inserção e participação de mulheres no

mundo da política, ainda que maneira pouco eficaz nos espaços formais (Matos, 2007).

Durante a década de 1980, estes movimentos se consolidaram sob as lutas pela

democratização do país.

Mesmo com o retorno do poder aos civis, em 1985, a representação de mulheres

em todos os cargos eletivos segue muito baixa, inclusive até a atualidade. Com a

percepção do cenário de desigualdade entre homens e mulheres nas esferas legislativas e

algumas iniciativas advindas do cenário internacional para o incremento da participação

4 Como Oliveira Vianna, em Populações Meridionais do Brasil (1920) e Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil (1936). 5 Segundo concepção de Walby (1990).

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feminina, em 1993 foi apresentado, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei para a

implementação de cotas para mulheres na política, de autoria do deputado Marco

Penaforte (PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira), que foi rejeitado. Em

1991, o PT (Partido dos Trabalhadores) havia incorporado cotas para mulheres para os

seus órgãos de direção, seguido pela CUT (Central Única dos Trabalhadores), em 1993,

que também as implementou para as instâncias de direção (regional, estadual e

nacional), definindo o preenchimento mínimo de 30% dos cargos de direção por

qualquer sexo (Miguel, 2000).

As discussões decorrentes da Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres

das Nações Unidas, ocorrida em Beijing, em 1995, foram decisivas na apresentação de

um novo projeto de lei de cotas no Parlamento. Em 1995, também refletindo as

experiências das cotas internas do PT, a deputada Marta Suplicy (PT) apresentou um

projeto de lei estabelecendo 20% das vagas de candidatura reservadas a mulheres para

as eleições municipais de 1996. A lei foi aprovada (Lei n° 9100/1995) e as cotas foram

instituídas nas eleições municipais de 1996. Em 1997, a lei eleitoral que regulamentaria

as eleições de 1998 ampliou o percentual para 25% (Lei n° 9504/1997). Para as eleições

de 2000, foi estabelecido que as listas de candidaturas deveriam ser constituídas com,

no mínimo, 30% de candidatos de um sexo e, no máximo, 70% de candidatos do outro

sexo (Miguel, 2000).

No entanto, o efeito da lei de cotas para a eleição de mulheres para cargos

proporcionais segue muito aquém do esperado. Apesar do pequeno avanço observado

quanto ao número de representantes eleitas, não se verificou um incremento satisfatório

no número de cadeiras ocupadas por mulheres.

A seguir estão as porcentagens de mulheres candidatas e eleitas para cargos

proporcionais, desde 2000, por estado6:

6 Não havendo eleições municipais no Distrito Federal, optou-se por retirar esta unidade da federação do presente estudo, a fim de facilitar a comparação dos dados entre os estados analisados.

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Candidatas Eleitas Candidatas Eleitas Candidatas Eleitas Candidatas Eleitas Candidatas Eleitas Candidatas EleitasAC 22,0 14,7 21,1 13,4 13,9 8,3 16,9 20,8 16,0 0,0 14,0 12,5AL 19,3 13,1 21,0 15,5 11,7 7,4 12,7 11,1 7,2 12,5 12,2 0,0AM 19,5 12,9 20,4 12,7 20,5 4,2 15,4 12,5 14,5 12,5 12,8 25,0AP 21,2 19,2 24,1 15,5 13,0 16,7 17,0 12,5 3,0 5,1 14,3 50,0PA 20,6 13,5 23,3 15,2 13,3 19,5 14,0 17,1 13,8 5,9 13,9 11,8RO 18,4 10,0 22,4 12,9 13,5 4,2 14,2 4,2 13,5 12,5 15,7 12,5RR 20,3 10,9 22,7 12,5 21,8 12,5 14,3 12,5 15,5 25,0 16,0 25,0BA 17,4 12,1 21,0 13,2 11,0 9,5 12,2 12,7 12,3 0,0 6,5 10,3CE 17,9 12,7 22,6 16,2 13,4 17,4 15,3 4,3 9,5 12,5 8,3 4,5MA 21,1 14,4 24,0 16,3 13,9 19,0 16,4 16,7 11,3 11,1 11,8 5,6PB 18,3 14,0 22,0 16,6 14,1 16,7 8,6 11,1 8,0 8,3 6,9 0,0PE 18,0 10,0 20,9 10,3 15,5 16,3 12,2 12,2 7,5 0,0 12,1 4,0PI 17,3 12,8 19,6 13,2 8,7 6,7 12,3 10,0 11,3 10,0 4,8 0,0RN 19,4 15,3 21,6 17,4 12,2 16,7 9,7 16,7 16,2 25,0 11,8 25,0SE 20,0 16,7 24,3 16,5 15,5 25,0 15,7 25,0 15,3 0,0 25,0 0,0GO 18,9 12,3 22,0 13,2 10,4 19,5 8,7 17,1 13,2 11,8 7,3 11,8MS 21,8 12,8 24,3 14,2 13,3 8,3 14,5 4,2 21,8 0,0 22,9 0,0MT 19,6 14,4 21,6 12,6 11,3 4,2 7,6 4,2 19,0 25,0 18,5 12,5TO 22,6 15,6 22,5 16,7 19,3 8,3 18,3 12,5 18,3 12,5 21,4 12,5PR 17,9 10,2 21,0 10,8 12,9 7,4 12,5 7,4 7,2 3,3 10,1 0,0RS 18,7 10,5 21,8 11,9 9,8 3,6 13,2 9,1 10,7 12,9 11,8 9,7SC 18,3 9,7 20,4 11,3 13,3 5,0 13,0 7,5 10,0 6,3 10,7 6,3ES 18,2 7,6 21,0 7,8 12,3 16,7 12,4 10,0 13,1 20,0 20,5 40,0MG 18,3 10,6 20,9 10,9 11,9 13,0 11,7 9,1 9,9 1,9 10,2 5,7RJ 21,8 7,2 24,9 9,0 18,2 20,0 17,4 15,7 13,6 13,0 13,4 13,0SP 20,0 10,3 24,1 10,9 15,2 10,6 14,8 11,7 9,8 8,6 14,4 4,3

BRASIL 19,1 11,6 22,1 12,6 14,3 12,5 14,0 11,7 11,4 8,2 12,6 8,8

2004 2006

Fonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br)

Tabela 1: Porcentagem de candidatas e de eleitas para vereador, deputado(a) estadual e federal em 2000, 2002, 2004 e 2006, por estado (%).

2002 2006Federal

UFVereador

2000Estadual

2002

Existe pouca variação entre os anos das eleições, sendo possível falar de

algumas tendências para cada nível de disputa. De forma geral, o nível municipal

apresenta maior permeabilidade às candidaturas femininas do que os níveis estadual e

federal. Entretanto, a diferença entre a porcentagem de candidatas e de eleitas é maior

nas eleições locais. A maior apresentação de candidaturas femininas para o cargo de

vereadora não se traduz em cadeiras na mesma proporção que ocorre nos demais níveis.

Rio de Janeiro e Espírito Santo são os estados com as piores condições no âmbito

municipal; contudo, o mesmo não se repete para a disputa aos cargos de deputada

estadual e federal.

Nos pleitos estaduais os piores casos são Rondônia e Mato Grosso, para as duas

eleições analisadas. Existe grande variação quanto ao número de candidatas à deputada

estadual, sendo que em 2000 houve variação desde 8,7% no Piauí até 20,5% do

Amazonas, e em 2004 houve variação desde 8,6% na Paraíba até 17,4% no Rio de

Janeiro. Os estados da região Sudeste apresentam, ao lado dos estados da Região Norte,

os melhores indicadores referentes ao número de candidatas e eleitas para as

Assembléias Legislativas.

No que se refere às eleitas ao cargo de deputada estadual, o caso de Sergipe se

destaca, visto que apresenta a melhor elegibilidade para as mulheres: ali as deputadas

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ocupam 25% do total de cadeiras da Assembléia Legislativa. Analisando mais

detalhadamente o caso de Sergipe, observa-se um alto grau de reeleição7, acima de 60%.

Entre as mulheres, este índice alcança a totalidade dos casos, o que explica a

estabilidade da composição feminina da Casa. Essa estabilidade na ocupação de

cadeiras por mulheres pode ser interpretada como um fator satisfatório, mas ao mesmo

tempo pode apresentar muitas questões: aliada a um alto índice de reeleição (tanto geral

quanto somente entre as deputadas), isso pode significar uma grande dificuldade de

inserção de novos atores no jogo político, em especial, mulheres. Se existe esta barreira

à inserção de novos atores, principalmente para mulheres, o aumento do número de

deputadas estaduais em Sergipe se mostraria prejudicado.

Nas eleições federais, vários estados de todas as regiões, exceto da região

Sudeste, não elegeram nenhuma deputada para a Câmara dos Deputados. Espírito Santo,

Rio Grande do Norte, Amazonas, Amapá e Roraima apresentam um alto número de

mulheres eleitas no nível federal, todos acima de 20% das cadeiras8.

A escolha dos representantes não é determinada somente pela quantidade de

votos que cada candidatura recebe. O sistema eleitoral e suas regras são determinantes

na definição de quem será eleita(o), seja por princípios do sistema eleitoral – que pode

ser proporcional ou majoritário – ou devido a diferentes fórmulas de distribuição de

cadeiras – que podem apresentar resultados mais ou menos proporcionais. Tendo isso

em consideração, não se busca neste estudo analisar a elegibilidade dos candidatos, pois

o número de eleitas não evidencia o apoio eleitoral que as candidaturas de mulheres

efetivamente recebem.

Deste modo, pretende-se compreender como a população distribui os votos em

candidatos e candidatas e se existem diferenças nos padrões de votação em diferentes

localidades. Seria possível afirmar que contextos menos tradicionalizados são mais

permeáveis a candidaturas de mulheres? Para constatar se existe uma reação

diferenciada da população a candidaturas de mulheres e homens, a votação dada a

candidatos de ambos os sexos foi comparada em cada distrito da disputa eleitoral nas

eleições analisadas.

Na tabela 2 apresentam-se os dados referentes ao número de municípios onde a

média de votos dados a mulheres é considerada igual ou superior à média dos homens: 7 Segundo os dados sobre deputadas(os) estaduais disponibilizados na página de internet da Assembléia Legislativa de Sergipe. 8 É importante ressaltar que todos estes estados possuem distritos de baixa magnitude, entre oito e dez cadeiras na Câmara dos Deputados.

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Os estados onde se verifica um pequeno número de municípios que o eleitorado

dá maior apoio a homens concentram-se nas regiões Norte e Sudeste. É possível

constatar a retração na quantidade de municípios com melhores condições quanto ao

apoio a mulheres. Em ambas as eleições, Rio de Janeiro e Espírito Santo apresentam os

piores cenários na disputa municipal, enquanto Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba e

Ceará apresentam grande proporção de municípios com maior apoio eleitoral para as

candidatas.

Em 2002, era possível constatar nas eleições para as Assembléias Legislativas

várias situações onde a votação das mulheres era pareada à dos homens. Ao verificar a

variação temporal, nota-se a piora deste quadro, ilustrado pelo caso do Ceará, onde a

tendência à igualdade em 2002 transformou-se em clara vantagem para os homens em

2006. As piores situações, em ambas as eleições, ocorrem em Amazonas, Mato Grosso,

Paraná e Santa Catarina.

Estado 2000 2004AC 25,0 20,0AM 33,3 20,0AP 33,3 13,3PA 22,8 19,0RO 15,9 13,6RR 14,3 28,6AL 34,0 27,0BA 33,7 25,0CE 42,1 30,9MA 29,6 26,8PB 37,3 37,2PE 32,2 19,4PI 36,7 37,6RN 46,2 43,9SE 40,3 27,8GO 32,6 21,1MS 25,7 18,9MT 32,8 24,8TO 33,8 25,8PR 23,3 20,2RS 31,1 30,0SC 28,0 29,2ES 6,7 9,3MG 24,0 21,5RJ 6,8 3,4SP 17,4 12,2

BRASIL 28,4 23,3Fonte: os autores, a partir dos bancos de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizados pelo TSE (www.tse.gov.br)

Tabela 2: Porcentagem de municípios com condição de igualdade ou vantagem média para as mulheres em 2000 e

2004 para o cargo de vereador, por estado (%).

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As eleições federais apresentam maior variedade entre os estados, desde

situações como o Amazonas – onde as mulheres receberam uma votação média três

vezes maior que a votação média dos candidatos homens, em 2002 – até o quadro de

São Paulo – no qual de uma situação desvantajosa para as mulheres em 2002 (0,37)

passou-se para um cenário lamentável de ampla desigualdade no apoio eleitoral

recebido entre mulheres e homens candidatos (0,05) em 2006, valor próximo ao

observado em Paraná e Pernambuco neste mesmo ano.

Algumas observações gerais podem ser feitas ao se comparar os três níveis

eleitorais, as quais instigam futuros estudos mais detalhados sobre os cenários de cada

ambiente político. Pode-se levantar a hipótese de que o estado de Amazonas está

passando por um momento de transição de suas lideranças políticas femininas, pois

apesar de valores expressivos nos pólos da carreira legislativa de cargos proporcionais

(níveis municipal e federal), nas eleições estaduais há uma grande diferença entre a

expressividade eleitoral de candidatas e candidatos.

O cenário de São Paulo para as eleições de deputadas(os) federais é intrigante,

pois apesar da alta magnitude do distrito, que tenderia a privilegiar o aumento da

2002 2006 2002 2006AC 0.82 0.85 1.26 1.49AM 0.31 0.44 3.02 1.13AP 1.09 0.64 1.38 3.28PA 1.09 1.09 0.93 0.65RO 0.69 0.66 1.47 1.13RR 0.62 0.97 1.08 1.56AL 1.04 0.80 0.27 0.42BA 0.95 1.00 1.12 1.44CE 1.16 0.45 0.15 0.27MA 1.21 0.99 1.08 2.29PB 1.11 1.17 0.51 0.99PE 0.84 1.04 0.79 0.05PI 0.85 0.89 0.22 0.40RN 1.05 1.62 1.19 0.73SE 1.50 1.35 0.70 0.69GO 1.52 1.55 0.78 1.11MS 0.74 0.41 0.45 0.45MT 0.57 0.60 0.37 0.22TO 0.40 0.76 0.76 0.38PR 0.45 0.65 1.48 0.08RS 0.75 0.79 1.29 0.72SC 0.50 0.57 1.25 1.11ES 0.94 0.70 0.97 0.33MG 0.85 0.75 0.82 0.62RJ 0.69 0.67 0.45 0.31SP 1.03 0.79 0.37 0.05

Tabela 3: Razao entre percentual médio de votos de candidatas e candidatos em 2002 e 2006 para

deputado federal e estadual, por estado

Fonte: os autores, a partir dos bancos de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizados pelo TSE (www.tse.gov.br)

FederalEstadualUF

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11

proporcionalidade da representação política e poderia viabilizar candidaturas menos

ortodoxas, a desigualdade da votação entre homens e mulheres é massacrante.

É oportuno ressaltar que em vários estados não se percebe um cenário constante

quanto à razão da votação entre mulheres e homens, em todos os níveis. Em alguns

momentos, é possível tecer hipóteses de que as mulheres ainda não conseguiram romper

barreiras de acesso a níveis mais elevados da carreira política, como nos casos de

Alagoas, Ceará, Pernambuco, Piauí, Sergipe e São Paulo. Em uma nova pesquisa, seria

interessante verificar a hipótese de que as mulheres têm acesso até o nível estadual,

devido ao apoio de possíveis padrinhos políticos – quer eles sejam familiares, ou não9 –

que ocupam cadeiras no nível federal.

Sendo possível conceber diferenças razoáveis dentro da análise territorial, cabe

indagar de que forma os partidos políticos favorecem ou prejudicam a captação de votos

por candidaturas de mulheres. Visto que o desenvolvimento político está diretamente

relacionado ao surgimento das instâncias partidárias e que estas mobilizam diferentes

clivagens sociais e as organizam eleitoralmente, é interessante observar se no sistema

partidário brasileiro há alguma agremiação política capaz de agregar maior votação para

mulheres, em comparação às candidaturas masculinas.

Entre os maiores partidos10, existe pouca variação no efeito do sexo entre as

candidaturas de um mesmo partido que disputam em um mesmo distrito.

Partido 2000 2004PMDB 26.2 24.6PSDB 24.6 22.7PFL 25.3 23.3PL 21.7 18.4PP 23.8 22.9PTB 22.7 20.7PC do B 18.9 19.5PDT 20.1 19.2PPS 22.5 19.4PSB 21.1 19.6PT 25.4 25.2PV 20.4 20.3

Tabela 4: Porcentagem sobre o total de municípios em que cada partidos pariticipou, que apresentam igualdade ou vantagem média para as mulheres em 2000 e 2004, por

partido (%).

Fonte: os autores, a partir dos bancos de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizados pelo TSE (www.tse.gov.br)

9 De acordo com Queiroz (1976), o grupo político da parentela não se restringe apenas a relações familiares, mas busca diferentes apoios, de acordo com as suas necessidades. 10 Nas tabelas, a fim de facilitar sua interpretação, optou-se por trabalhar apenas com os dados dos maiores partidos, além de PC do B e PSOL, que não são partidos grandes mas apresentam um interessante e destoante efeito favorável às mulheres candidatas.

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12

Percebem-se condições favoráveis às mulheres apenas em cerca de 22%11 dos

municípios onde cada partido concorre às eleições ao cargo de vereador(a). Em geral, os

partidos de esquerda apresentam piores indicadores do que os partidos de centro ou de

direita, exceto em 2004, quando o PL, partido de direita, apresenta situações de

igualdade ou vantagem para as mulheres em apenas 18% dos municípios onde concorre

a eleições de vereador(a).

Já nos níveis estadual e federal (tabela 5), é possível notar pouca constância e

alguns paradoxos. Em geral, o eleitorado dos partidos de direita tende a beneficiar a

votação das candidaturas masculinas, em ambos os níveis, à exceção de PFL em 2002 e

PPB em 2006, no nível federal, e PRB, estadualmente, em 2006. Entre os partidos de

esquerda é notável a queda do índice entre o PPS e a melhoria do PSB, estadualmente.

O partido que apresentou o cenário mais favorável à captação de votos por candidatas

nas eleições federais, em 2006, foi o PSOL.

2002 2006 2002 2006PMDB 0.99 0.76 0.85 1.01PSDB 0.86 0.83 0.89 0.48PFL 0.66 0.64 0.97 0.49PL 0.61 0.89 0.06 0.18PPB 0.64 0.75 0.63 0.96PRB * 1.07 * 0.03PTB 0.67 0.70 0.39 0.17PC do B 1.44 1.26 3.35 2.29PDT 0.90 0.83 0.73 1.22PPS 1.32 0.54 0.37 1.03PSB 0.69 1.19 1.53 1.52PSOL * 1.12 * 4.20PT 1.20 1.15 1.48 0.87PV 0.37 0.90 0.34 0.23

* PSOL e PRB foram criados posteriormente às eleições de 2002

Tabela 5: Razão entre percentual médio de votos de candidatas e candidatos em 2002 e 2006 para deputado

federal e estadual, por partido

Fonte: os autores, a partir dos bancos de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizados pelo TSE (www.tse.gov.br)

FederalEstadualPartido

Até o presente momento observaram-se neste artigo as condições que se

apresentam mais favoráveis à captação de votos por candidaturas femininas, em relação

a partidos e estados. Entretanto, cabe ressaltar que para compreender de forma mais

aprofundada quais efeitos contribuem para o cenário de maior ou menor apoio eleitoral

para mulheres deve ser realizada uma análise que considere as especificidades dos

ambientes políticos em que se dão as diversas eleições. 11 Entre os doze partidos analisados.

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13

A questão territorial se apresenta como sendo de extrema importância para a

explicação de cenários eleitorais diferenciados, seja do ponto de vista do

desenvolvimento político (Powell Jr., 1982) ou, especificamente, entre os estudos sobre

o sucesso eleitoral de mulheres (Alves, 2004 e 2007; Miguel e Queiroz, 2006; Marques,

Machado e Recch, 2008a, 2008b).

As diferenças nos ambientes políticos geram condições que podem beneficiar ou

prejudicar determinados tipos de candidaturas. Isso decorre de diferentes padrões de

comportamento do eleitorado, que podem surgir tanto a partir de efeitos da estrutura

social, psico-sociológicos ou estratégicos (Castro, 1994).

Quaisquer sejam os tipos de efeito, individual, sujeição do indivíduo ao meio ou

limitação das ações estratégicas dos indivíduos, ainda assim o ambiente político limita o

comportamento eleitoral. Deste modo, será utilizado um modelo de regressão

hierárquica em dois níveis, sendo o primeiro o nível dos candidatos e o segundo, o nível

dos distritos eleitorais em que estes concorrem. Esta ferramenta é mais adequada ao

estudo por ter em suas premissas a consideração de que os candidatos estão

subordinados a determinadas estruturas, neste caso as condições de seus distritos

eleitorais. Espera-se que ambientes onde exista um acúmulo de condições tomadas

como propícias a ambientes políticos tradicionais ocorra um efeito negativo mais forte

para as candidaturas de mulheres. Evidentemente, outras características das candidatas

podem negar ou mesmo ultrapassar o possível “preconceito” do eleitorado.

Escolheu-se a porcentagem de votação nos municípios como indicador do apoio

eleitoral que cada candidatura recebeu em seu distrito. Entretanto, como esta variável

não possui relação linear com os demais indicadores do modelo final, foi utilizado o

logaritmo da porcentagem da votação. Esta transformação faz com que os coeficientes

do modelo de regressão signifiquem a variação em proporção da média da variável

dependente com a mudança de uma unidade da variável independente.

Neste sentido cabe questionar se o sexo possui efeito sobre a votação e também

se este difere ao mudar de distrito, acirrando ou minorando as diferenças entre

candidatas e candidatos. Para avaliar o impacto do sexo da(o) candidata(o) foi utilizada

uma variável binária, onde o valor 1 condiz com o sexo feminino.

O modelo é expresso pela seguinte fórmula:

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14

ijijjiij

jj

joj

ijjojij

rsexouusexoY

u

u

rsexoY

++++=

+=

+=

++=

)()(

)(

101000

1101

000

1

γγ

γβ

γβ

ββ

Nesta fórmula, a votação de um candidato, expressa em porcentagem do total de

votos válidos no distrito, é dada pela média geral da votação ( 00γ ) mais um efeito

específico do sexo ( 10γ ), além das variações da média por distrito ( ju0 ) e do efeito do

sexo entre os distritos ( ju0 ) e do resíduo do modelo.

A tabela 6 apresenta a saída dos efeitos fixos do modelo. Observa-se em todos os

cenários considerados o efeito negativo do sexo feminino. Através do teste t é possível

considerar o impacto da variável dentro do modelo. De acordo com o valor t, nota-se

que o efeito negativo do sexo feminino é mais relevante, além de crescente, nas eleições

municipais. Contudo, nas eleições analisadas de todos os níveis, a característica sexo

feminino influi com o decréscimo de 42% a 59% da média geral de votação nos

modelos.

Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa tIntercepto 0.220 20.3 0.276 27.4 -2.791 -24.5 -2.826 -21.9 -1.913 -12.4 -1.946 -10.9feminino -0.425 -65.3 -0.521 -77.9 -0.442 -5.8 -0.432 -4.6 -0.497 -5.1 -0.589 -4.5

2004 2002

Tabela 6: Modelo 1 para as eleições de 2000, 2002, 2004 e 2006 para os cargos de vereador(a), deputada(o) estadual e federal

Fonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br).Variável dependente: logaritmo da porcentagem de votos no distrito

Parâmetros 20022006 2006Estadual FederalVereador(a)

2000

Na tabela 7, assumindo-se que a hipótese nula sobre a variância do efeito do

sexo feminino é “não há mais variação relevante a ser explicada”, verifica-se que no

nível municipal ainda é possível especificar melhor o modelo, a fim de realizar uma

explicação mais detalhada sobre o efeito desta variável. Apesar deste fato, a variação do

efeito do sexo feminino para o cargo de vereador(a) é muito pequena (3,1% e 4,3%,

para 2000 e 2004, respectivamente), quando considerada a variância total do modelo.

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15

Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig.Resíduo 1.31 0.000 1.27 0.000 3.50 0.000 3.40 0.000 3.96 0.000 3.60 0.000Intercepto 0.59 0.000 0.51 0.000 0.32 0.001 0.42 0.001 0.60 0.001 0.82 0.001Feminino 0.06 0.000 0.08 0.000 0.07 0.098 0.14 0.037 0.00 . 0.20 0.211

2006 2002Variância 2006

Tabela 7: Variância do modelo 1 para as eleições de 2000, 2002, 2004 e 2006 para os cargos de vereador(a), deputada(o) estadual e federal

Variável dependente: logaritmo da porcentagem de votos no distritoFonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br).

Vereador(a) Estadual Federal2000 2004 2002

De acordo com os modelos, existe variação entre os municípios nas eleições para

o cargo de vereador(a). Contudo, nas eleições dos demais níveis, não se observa

variação relevante entre os estados, no que se refere ao efeito do sexo feminino. Apesar

desta certamente se manifestar entre os municípios, não foi possível verificá-la, devido à

organização dos dados disponíveis12.

Constatado o efeito do sexo feminino, cabe controlar o efeito desta variável

tendo em vista outras características individuais das(os) candidatas(os). O controle de

outras variáveis individuais permite avaliar se o impacto do sexo feminino se mantém

relevante. Deste modo, o modelo a seguir inclui, além de “sexo feminino”, as variáveis

“escolaridade”, “pertencimento a ocupação tradicional” e “ideologia do partido da(o)

candidata(o)”:

ijijijijij

ijijijjiji

iiiiiij

jj

jj

jj

jj

jj

jj

jj

joj

ijijij

ijijijijijojij

rdireitaucentrouOTuescolu

escoluescolusexouudireitacentro

OTescolescolescolsexoY

u

u

uu

u

u

u

u

rdireitacentro

OTescolescolescolsexoY

++++

++++++

++++++=

+=

+=

+=

+=

+=

+=

+=

+=

++

++++++=

)()()()3_(

)2_()1_()()()(

)()3_()2_()1_()(

)()(

)()3_()2_()1_()(

7654

321077060

504030201000

7707

6606

5505

4404

3303

2202

1101

000

76

54321

βγγ

γγγγγγ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

ββ

ββββββ

12 O modelo hierárquico sofre grande influência do número de casos em seu segundo nível (os distritos eleitorais, nesta análise). Deste modo, os modelos para as eleições municipais estão mais adequados à análise, por apresentar uma variação maior do que 5000 casos. No entanto, como os dados eleitorais para as eleições estaduais e federais não se apresentam de forma adequada para o tratamento segundo essas necessidades, optou-se por trabalhar com a votação recebida dentro dos distritos (que, neste caso, para as eleições para o cargo de vereador(a), são os municípios, e nas eleições para deputado(a) estadual e federal, são os estados).

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16

A escolaridade foi classificada em quatro classes. Dentro de escolaridade 1

foram agrupados os candidatos que informaram “ler e escrever” ou possuir

“fundamental incompleto”, na escolaridade 2 uniu-se “fundamental completo” com

“médio incompleto”, na escolaridade 3 agrupou-se “médio completo” e “superior

incompleto”, ficando por fim apenas aqueles que indicaram possuir “superior completo”

em escolaridade 4. Foi utilizada a variável escolaridade 1 como grupo de comparação

dentro do modelo.

Para compreender o efeito da ocupação profissional sobre a votação dos

candidatos foi utilizado o conceito de ocupação tradicional, já utilizado em outros

estudos (Marques, Machado e Recch, 2008a, 2008b), o qual se baseia nas percepções de

Hagopian (1986) e nas constatações dos recentes estudos sobre perfil político no Brasil

(Rodrigues, 2002). Hagopian afirma existir uma tendência a haver um maior

entrosamento entre indivíduos que exerciam profissões liberais e os chefes do poder

local desde o período colonial até o regime de exceção de 64. Dentre estas profissões

encontravam-se advogados, médicos, engenheiros. Nos estudos recentes sobre carreira

política é perceptível a existência de diferentes perfis partidários, havendo

“composições sociais predominantes” (Rodrigues, 2002) que os distinguem além das

divisões ideológicas. Isso poderia indicar a existência de diversas formas de entrada na

vida política, algo constatado por Santos (1997) ao perceber o aparecimento de novos

perfis sócio-econômicos existentes dentro da Câmara dos Deputados. Entretanto,

nesses estudos existe um elemento implícito que seria da existência de um perfil mais

recorrente entre os políticos, percebido por Rodrigues (2002), enquanto empresários ou

profissionais liberais. Como o objetivo do trabalho é observar efeitos da possível

persistência de padrões de dominação tradicional, a variável ocupação tradicional

pretende medir – de forma pouco precisa – a tendência de haver um contato mais

próximo entre os candidatos e o acesso à estrutura de poder do país. Neste sentido

foram agrupados advogados, médicos, engenheiros, empresários, produtores agrícolas,

deputados, vereadores, senadores, prefeitos, governadores e/ou presidentes dentro de

uma variável dicotômica, onde o valor 1 indica pertencimento à profissão classificada

como tradicional e 0 o não-pertencimento à mesma.

Para mensurar o efeito dos partidos nos diferentes pleitos foi considerada a sua

classificação ideológica. Neste sentido, foram classificados como partidos de esquerda

PT, PDT, PPS, PSB, PC do B, PSOL, PV, PMN, PHS, PSTU, PCO e PCB. Classificou-

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17

se como centro PMDB e PSDB. Como direita, foram agrupados PFL, PP (PPB), PTB,

PL, PRB, PSC, PRONA e todos os demais partidos de pequeno porte. Foram criadas

variáveis dicotômicas para cada um destes grupos e a categoria esquerda foi utilizada

como grupo de referência para a análise.

Dentro do modelo proposto anteriormente, o efeito do sexo se apresenta como

aquele que possui maior impacto entre as variáveis consideradas para as eleições

municipais, enquanto nos demais níveis seu efeito é menor do que ocupação dos

candidatos ou escolaridade. Nas eleições para vereador(a), além do sexo dos candidatos,

a escolaridade é um outro importante fator na composição da votação das(os)

candidatas(os).

Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa tIntercept -0.211 -17.7 -0.108 -9.9 -3.779 -28.1 -3.858 -27.6 -3.057 -16.4 -3.085 -14.4feminino -0.483 -75.7 -0.594 -92.0 -0.408 -5.1 -0.395 -5.8 -0.366 -3.5 -0.482 -5.6escol_1 0.137 24.6 0.120 20.7 0.248 3.3 0.121 1.4 1.095 12.1 -0.077 -0.5escol_2 0.344 61.4 0.314 58.8 0.587 9.2 0.408 5.5 -0.066 -0.4 0.286 2.2escol_3 0.542 67.8 0.597 76.2 1.233 16.0 1.057 11.6 0.392 3.0 0.904 6.4ocup_trad 0.458 48.0 0.065 20.2 1.076 18.0 1.364 22.7 1.034 7.7 1.336 15.3centro 0.366 49.1 0.382 51.6 0.625 5.3 0.538 4.5 0.853 5.2 0.887 7.1direita 0.267 37.2 0.246 37.3 -0.300 -4.6 -0.240 -4.1 -0.061 -0.5 -0.144 -1.8

Fonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br).

ParâmetrosVereador Estadual Federal

2000 2004 2002 2006 20062002

Tabela 8: Modelo 2 para as eleições de 2000, 2002, 2004 e 2006 para os cargos de vereador(a), deputada(o) estadual e federal

Variável dependente: logaritmo da porcentagem de votos no distrito

Admitindo-se que o cargo de vereador(a) é uma das portas de entrada na carreira

política13, é relevante notar que o sexo possui um efeito mais forte sobre a votação

recebida por candidatas e candidatos do que a escolaridade ou a ocupação dos mesmos.

Nas eleições municipais verifica-se que persiste no modelo variação significativa a se

explicar entre os distritos de todas as variáveis consideradas.

13 Como observou Miguel (2003), existem outras formas de inserção no campo político; entretanto, ainda persiste a importância das Câmaras Municipais como parte do ambiente de formação política de grande parcela dos atuais ocupantes de cargos eletivos no Brasil.

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18

Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig. Estimativa Sig.Resíduo 1.18 0.000 1.16 0.000 2.70 0.000 2.56 0.000 3.04 0.000 2.71 0.000Intercepto 0.59 0.000 0.51 0.000 0.36 0.001 0.37 0.001 0.48 0.001 0.78 0.001Feminino 0.05 0.000 0.07 0.000 0.08 0.083 0.06 0.112 0.04 0.663 0.03 0.787Fundamental completo 0.01 0.001 0.01 0.000 0.01 0.554 0.02 0.346 0.01 0.889 0.00 .Médio completo 0.01 0.000 0.01 0.000 0.00 . 0.00 . 0.00 . 0.00 .Superior completo 0.02 0.000 0.04 0.000 0.04 0.118 0.07 0.020 0.02 0.413 0.06 0.064Ocupação Tradicional 0.04 0.000 0.01 0.000 0.04 0.045 0.05 0.024 0.07 0.217 0.10 0.058Partido de centro 0.08 0.000 0.10 0.000 0.25 0.013 0.29 0.006 0.45 0.043 0.22 0.062Partido de direita 0.10 0.000 0.09 0.000 0.06 0.020 0.05 0.025 0.24 0.020 0.07 0.137

2006

Variável dependente: logaritmo da porcentagem de votos no distritoFonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br).

Tabela 9: Variância do Modelo 2 para as eleições de 2000, 2002, 2004 e 2006 para os cargos de vereador(a), deputada(o) estadual e federal

VariânciaVereador(a) Estadual Federal

2000 2004 2002 2006 2002

A hipótese central dos modelos propostos por este trabalho é a e que, seguindo a

corrente do desenvolvimento político, em ambientes mais complexos sócio-

economicamente, haverá uma retração das condições que alimentam sistemas de

dominação com bases tradicionais, permitindo o acesso de atores políticos alijados do

espaço público (no caso deste estudo, as mulheres).

Para observar o efeito de variáveis do contexto sócio-econômico e político dos

distritos sobre o efeito do sexo dos candidatos, desenvolveu-se um modelo final que

inclui variáveis deste tipo, controladas pelas variáveis individuais consideradas no

modelo anterior, mantendo estas últimas sem variação entre os distritos.

Diversos indicadores foram utilizados para tratar da questão das diferenças de

ambientes que propiciariam distintos graus de desenvolvimento político de cada distrito

eleitoral – municípios ou estados. Do ponto de vista do desenvolvimento sócio-

econômico foram selecionados os índices de desenvolvimento humano (IDH) e de Gini.

O IDH corresponde às condições educacionais e econômicas de cada distrito eleitoral. O

índice de Gini propicia mensurar se há uma maior concentração de renda no local, o que

poderia indicar maior propensão à existência de grupos dominantes na política local.

Territorialmente é possível considerar que o aumento populacional e a

transferência da população rural para a vida urbana seriam empecilhos para a formação

de condições mais propícias ao desenvolvimento de líderes de tipo tradicional. O

adensamento populacional diminuiria os laços internos dos diferentes grupos políticos,

chegando até mesmo ao alheamento de pessoas leais à parentela, devido à posição

periférica que nela ocupariam (Queiroz, 1976). A transferência do campo para a cidade

se refere ao processo de industrialização, do qual decorre a diversificação de atividades

profissionais, dificultando a manutenção de laços de lealdade entre chefe local e a

população, pois haveria uma diversificação de interesses.

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19

Para medir a estas variáveis, de cunho territorial, foram considerados o tamanho

da população e a proporção da população rural. Nos dois casos as informações foram

coletadas a partir do Atlas do Desenvolvimento Humano, disponibilizado pelo PNUD

Brasil, que se baseia no censo brasileiro de 2001 conduzido pelo IBGE.

Para lidar com fatores políticos que afetam as condições das eleições nos estados

e municípios, para este estudo é razoável considerar a interação de fatores políticos com

a condição específica do mandonismo. Dado que um dos atributos mais importantes dos

grupos tradicionais é o controle sobre as opções políticas disponíveis para as eleições,

consideram-se fatores que estejam relacionados diretamente com as condições de oferta

do sistema político. Um baixo número de candidaturas pode sinalizar tanto o controle

deste poder de escolha ou uma percepção, por parte de outros possíveis candidatos, da

impossibilidade de concorrer com reais chances de vitória frente aos candidatos

“oficiais”. Ao mesmo tempo é necessário compreender que tipos de candidaturas são

apresentadas, visto que o surgimento de um perfil diferenciado de candidatas (os) pode

indicar a abertura do sistema político a novos atores, seja pela quebra do monopólio

eleitoral dos líderes tradicionais ou pelo apelo a um eleitorado fora dos padrões de

votação tradicionais. Para mensurar a quantidade de candidaturas foi selecionado um

dos possíveis indicadores de competitividade eleitoral: o número de candidaturas

dividido pelo número de cadeiras, dado que os distritos possuem diferentes tamanhos

quanto ao número de vagas disponíveis. A variação da composição das candidaturas

será tratada por meio da proporção do número de candidatas em cada distrito.

No intuito de facilitar a compreensão dos resultados dos modelos, IDH e Gini,

por possuírem uma variação entre 0 e 1, foram transformados numa escala de 10 pontos,

de forma que nos modelos a variação de uma unidade em qualquer desses índices

implicará na mudança de 0,1 do valor original. O mesmo foi realizado com todas as

variáveis que utilizam a proporção de algum valor – neste caso, as proporções de

população rural e de candidatas. Ainda com a intenção de facilitar a compreensão das

saídas, todas as variáveis referentes às condições dos distritos eleitorais foram

centralizadas na média das mesmas, para evitar que o modelo se adequasse a situações

inexistentes (e.g. população com valor zero).

Para simplificar o modelo, apenas os efeitos da variável sexo feminino e do

intercepto foram considerados como possuindo variação entre os municípios. Ao

mesmo tempo, somente a variável sexo feminino foi especificada quanto aos efeitos do

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segundo nível que compõem o seu impacto sobre a votação recebida pelas candidaturas.

Estas considerações podem ser observadas através do modelo apresentado a seguir:

ijijjij

ijijijij

ijjj

jjjjii

iiiiiij

j

j

j

j

j

j

j

j

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rsexouusexoinasfeascandidatursexoidadecompetitivsexoruralpopulaçãosexopopulaçãosexoGini

sexoIDHinasfeascandidaturidadecompetitiv

ruralpopulaçãopopulaçãoGiniIDHdireitacentroOTescolescolescolsexoY

uinasfeascandidaturidadecompetitivruralpopulaçãopopulaçãoGiniIDH

u

rinasfeascandidaturidadecompetitiv

ruralpopulaçãopopulaçãoGiniIDHdireitacentroOTescolescolescolsexoY

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15141312

11130120

11010090807060

504030201000

13013

12012

11011

10010

909

808

707

606

505

404

303

202

116

1514131211101

000

1312

11109876

54321

γ

γγγγ

γγγ

γγγγγγ

γγγγγγ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γβ

γ

γγγγγγβ

γβ

ββ

ββββββ

ββββββ

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Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa t Estimativa tIntercept -0.779 -106.6 -0.613 -103.0 -4.013 -41.9 -4.176 -37.9 -3.467 -22.6 -3.832 -23.4Feminino -0.502 -78.3 -0.633 -99.6 -0.443 -8.7 -0.410 -5.6 -0.425 -3.4 -0.464 -2.7Ens. Fundamental 0.130 24.0 0.113 20.2 0.247 3.4 0.170 2.0 -0.067 -0.4 -0.074 -0.5Ens. Médio 0.333 63.0 0.303 59.2 0.591 9.2 0.466 5.8 0.403 3.0 0.311 2.2Ens. Superior 0.562 78.7 0.640 95.3 1.219 18.8 1.105 13.8 1.042 8.0 0.992 6.9Ocupação Tradiional 0.479 58.4 0.012 8.9 1.050 26.7 1.348 36.0 1.114 17.1 1.298 22.3Partido de Centro 0.324 57.4 0.358 64.8 0.550 9.8 0.581 11.1 0.754 8.3 0.827 10.3Partido de Direita 0.169 35.0 0.170 38.1 -0.380 -10.1 -0.291 -8.1 -0.332 -5.2 -0.163 -2.8IDH 0.030 4.1 0.055 9.7 -0.105 -0.3 -0.227 -0.6 -0.215 -0.6 -0.607 -1.8Gini -0.126 -14.5 -0.074 -10.9 -0.615 -1.4 -0.635 -1.5 -0.695 -1.6 -0.693 -1.8População 0.000 -10.4 0.000 -16.2 0.000 -7.9 0.000 -8.2 0.000 -6.4 0.000 -9.0População Rural 0.063 24.0 0.034 16.0 0.023 0.2 -0.081 -0.6 0.153 1.0 -0.085 -0.6Competitividade -0.189 -112.4 -0.156 -137.3 0.013 0.5 0.001 0.3 0.010 0.3 -0.001 -0.3Candidatas 0.072 8.7 0.042 6.5 -0.045 -0.1 0.215 0.9 0.434 2.1 0.673 4.4Feminino * IDH -0.047 -4.7 -0.042 -4.4 -1.109 -3.2 -0.361 -0.8 -0.636 -1.0 0.053 0.1Feminino * Gini 0.011 1.0 -0.019 -1.7 -0.755 -2.0 -0.458 -1.0 -1.105 -1.4 -0.428 -0.5Feminino * População 0.000 -0.5 0.000 4.2 0.000 1.4 0.000 1.4 0.000 -1.3 0.000 -1.0Feminino * População Rural -0.007 -1.8 0.001 0.2 -0.145 -1.2 0.087 0.6 -0.106 -0.4 -0.027 -0.1Feminino * Competitividade -0.020 -10.7 -0.025 -14.9 0.005 0.2 0.006 1.9 0.012 0.2 0.004 0.6Feminino * Candidatas -0.039 -3.3 -0.024 -2.1 -0.599 -2.1 -0.420 -1.5 -0.392 -1.0 -0.478 -1.5

2006

Tabela 10: Modelo 3 para as eleições de 2000, 2002, 2004 e 2006 para os cargos de vereador(a), deputada(o) estadual e federal

Variável dependente: logaritmo da porcentagem de votos no distrito

Fonte: os autores a partir das bases de dados nominais e de resultados eleitorais disponibilizadas pelo TSE (www.tse.gov.br) e do Atlas do Desenvolvimento Humano disponibilizado pelo PNUD (www.pnu.org.br).

Parâmetros 2002Vereador(a) Estadual Federal

2000 2004 2002 2006

Abaixo estão detalhadas as interpretações dos efeitos das variáveis e sua

interação com a variável sexo feminino:

Índice de Desenvolvimento Humano – IDH

Nos três níveis, houve um efeito inesperado em relação às hipóteses da teoria do

desenvolvimento político, que apontariam para um incremento da votação de mulheres

em ambientes mais desenvolvidos. O aumento do IDH não implicou em um aumento da

votação de mulheres. Ao contrário, nos três níveis, implicou em uma diminuição da

votação média de mulheres.

Concentração de renda (Índice de Gini)

Nos níveis estadual e federal, os efeitos da concentração de renda foram os esperados,

de acordo com a teoria do desenvolvimento político: o aumento da concentração de

renda afetou negativamente a votação média de mulheres. No entanto, no nível

municipal, em 2000, o aumento da concentração de renda afetou positivamente a

votação média de mulheres.

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22

População total

Para os níveis municipal e estadual, os efeitos foram os esperados, de acordo com a

teoria do desenvolvimento político: o aumento da população favoreceu a votação de

mulheres. No nível federal, entretanto, observou-se o oposto.

Proporção de população rural

O efeito esperado foi alcançado em todos os níveis. O aumento da proporção de

população rural implicou em uma diminuição da votação média de mulheres.

Competitividade eleitoral

No nível federal, os efeitos da competitividade eleitoral foram irrelevantes, assim como

no nível estadual em 2006. Neste nível, em 2002, a competitividade favoreceu a votação

de mulheres, o que corrobora a hipótese de que ambientes mais abertos a um maior

número de candidaturas seriam mais favoráveis a candidaturas femininas. No entanto,

no nível municipal, em ambos os anos a competitividade eleitoral afetou negativamente

a votação média de mulheres. Queiroz e Miguel (2006) já apontam que a maior

competitividade pode ser a causa de uma menor votação de mulheres na região Sudeste,

embora não apresentem uma explicação mais detalhada sobre a causa deste efeito.

Proporção de candidatas

Apesar de Alves (2007) afirmar que possivelmente a principal ação a ser implementada

para atingir um maior número de eleitas nos pleitos legislativos brasileiros seja o

incremento no número de candidaturas femininas (cumprindo, de fato, as cotas para

mulheres na política), observa-se que em todas as eleições analisadas o aumento da

proporção de candidatas diminuiu a votação média recebida por estas. Sendo o sistema

eleitoral baseado na concentração de votos e o acréscimo de candidaturas femininas

tendo aumentado a dispersão de votos entre as mulheres, a ação de aumentar o número

de candidatas, isoladamente, não deve favorecer o incremento do número de mulheres

eleitas.

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23

CONCLUSÃO

Segundo as explicações da teoria feminista, o patriarcado é um modelo que se

adapta às transformações históricas. Assim, a liberalização e o desenvolvimento político

e econômico não seriam suficientes para abrir o espaço público às mulheres, que

passariam de uma condição de interdição de acesso à esfera pública a uma situação de

acesso meramente formal garantido.

Embora exista um maior número de candidatas nas eleições proporcionais

municipais, comparando-se aos pleitos estaduais e federais, é neste nível que as

mulheres têm maior dificuldade em captar e votos e se eleger. O efeito do sexo na

votação média, verificado no modelo 1, é mais forte nas eleições municipais do que nos

demais níveis.

Analisando os dados apresentados neste trabalho, observa-se que o nível

municipal é o que mais apresenta “surpresas” em relação ao que a teoria do

desenvolvimento político. Nas eleições municipais, o aumento do índice de

desenvolvimento humano, a diminuição da concentração de renda e o aumento da

competitividade eleitoral e da proporção de candidatas afetaram negativamente a

votação média de mulheres, contrariando as hipóteses de que o maior desenvolvimento

político traria uma melhor situação para as mulheres na política, fruto da diminuição da

força da dominação tradicional. Os resultados deste estudo apontam que situações mais

“liberalizadas” não favorecem a votação de mulheres, nos níveis municipais; ao

contrário, neste caso, a hipótese da adaptação das práticas patriarcais a cenários mais

“desenvolvidos”, já apontada pela teoria feminista, se apresenta de maneira robusta. O

mesmo não ocorre nos níveis estadual e federal; no entanto, tendo as portas de entrada

na política – ou seja, o nível municipal – já controladas pelas práticas patriarcais, é

possível imaginar que os demais níveis não precisem ser controlados – o que fortalece a

idéia de livre acesso à esfera pública para as mulheres, que, na verdade, têm uma

dificuldade altíssima em ultrapassar uma das barreiras iniciais para ingresso na carreira

política.

As situações com indicadores mais tradicionalizados apresentam melhores

resultados para a votação de mulheres, comparados a situações mais “desenvolvidas”.

Indicadores mais tradicionalizados se relacionam a situações com relações de clientela

mais fortes, inclusive mais patriarcais. Em ambientes com relações clientelistas, é

possível imaginar que o chefe do clã pode apoiar mulheres de sua clientela para a

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disputa a cargos políticos, transferindo seu próprio capital político às candidatas. O

acesso à esfera pública por parte das mulheres seria, deste modo, tutelado pelos chefes

dos clãs/patriarcas. Esta hipótese não é testada neste estudo, mas é um amplo campo de

pesquisa a ser realizado.

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ANEXO

Descrição das variáveis utilizadas:

Feminino: variável dicotômica onde o valor 1 indica candidatas e o valor 0 candidatos

Escol_0: não sabe ler/escrever e ensino fundamental incompleto

Escol_1: ensino fundamental completo

Escol_2: ensino médio completo

Escol_3: ensino superior completo

Ocup_trad: pertencimento a ocupação profissional classificada como tradicional

Esquerda: pertencimento a partido de esquerda

Centro: pertencimento a partido de centro

Direita: pertencimento a partido de direita

Idh_10_c: IDH do distrito eleitoral em escala de 10 pontos e centralizado na média

Gini_ 10_c: índice de Gini do município

Pop_tot_c: tamanho total da população do distrito eleitoral centralizado na média

Prop_rur_10_c: proporção da população rural no distrito eleitoral centralizada na média

Competitividade_c: número de candidatos no distrito eleitoral centralizado na média

Prop_cand_fem_10_c: proporção de candidatas no distrito eleitoral em escala de 10

pontos centralizada na média

i Bolsista da CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ii Bolsista da FAPEMIG - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais iii Bolsista do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico