o sindicalismo revolucionário como estratégia dos congressos operários (1906, 1913, 1920)

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    O SINDICALISMO REVOLUCIONRIO COMO ESTRATGIA DOS CONGRESSOS OPERRIOS

    (1906,1913,1920)

    Joo Gabriel da Fonseca Mateus*

    O objetivo deste texto identificar e caracterizar a perspectiva deorganizao proletria assumida nos Congressos Operrios de 1906, 1913 e 1920 na

    cidade do Rio de Janeiro. Objetiva-se ainda explicitar as mudanas entre as concepes

    assumidas nesses trs congressos (o primeiro realizado de 15 a 22 de abril de 1906; o

    segundo de 8 a 13 de setembro de 1913 e o terceiro congresso de 23 a 30 de abril de

    1920), mostrando as similitudes e diferenas assumidas ao longo dessas duas dcadas

    que separam esses congressos.

    Tem-se como elemento norteador desse texto a estratgia utilizada pela

    classe trabalhadora que tem representado um acmulo de experincias para ostericos, compondo uma forma de autogesto social. A derrocada do sindicalismo

    revolucionrio mostrou mais uma vez a fora voraz do Estado de cooptar, reprimir e

    por fim luta dos trabalhadores, sendo um inimigo da autoemancipao dos

    trabalhadores.

    Este texto ter como fontes primrias as Resolues dos dois primeiros

    Congressos Operrios reunidas na obra Classe Operria no Brasil (1889 1930).

    Documentos Vol 1. O Movimento Operrio de Paulo Srgio Pinheiro e Michael Hall11,

    alm do Boletim da Comisso Executiva do 3 Congresso Operrio de agosto de 1920

    disponveis no Arquivo Edgard Leuenroth da UNICAMP e alguns nmeros do Jornal A

    Voz do Trabalhador, rgo da Confederao Operria Brasileira, tambm disponvel ao

    pblico nesse centro de documentao.

    O Primeiro Congresso Operrio, realizado entre os dias 15 e 22 de abril de

    1906 deu um passo significativo para a organizao do sindicalismo revolucionrio no

    Brasil fruto do ascenso do movimento oper|rio revolucion|rio (SAMIS, 2004, p. 135).

    *Graduando em Licenciatura em Histria pelo Instituto Federal de Educao, Cincia e Tecnologia deGois. Autor do livro Educao e Anarquismo: uma perspectiva libertria (Rio de Janeiro, Rizoma Editorial,2012). Membro do corpo editorial da Revista Espao Livre e bolsista do PIBID/Capes.

    11 PINHEIRO, P. S.; HALL, M. A Classe Operria no Brasil (1889 1930) - Documentos Vol 1. O MovimentoOperrio. So Paulo: Alfa-Omega, 1979.

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    Porm, essa no foi a primeira organizao de trabalhadores no Rio de Janeiro e no

    Brasil. Conforme Oscar Farinha Neto aponta, aps as greves de 1903 na capital federal

    surge uma necessidade de cria~o de um rg~o que coordenasse o movimento das

    diversas classes trabalhadoras (NETO, 2007, p. 21). E dessa necessidade ir| surgir,

    neste mesmo ano, a Federao das Associaes de Classe, cujo modelo de organizao

    era inspirado no sindicalismo na verso de mile Pouget, ento secretrio-geral da

    CGT12 francesa.

    Essa nascente federao j contava com as bases pilares do que ser a COB

    posteriormente: o internacionalismo. Com as influncias da FORA (Federao Operria

    Regional Argentina) de bases anarco-sindicalistas a federao passa-se a chamar

    Federao Operria Regional Brasileira, com forte influncia anarquista e que ter a

    possibilidade de uma reunio geral (Congresso) no ano de 1906.

    Esse Congresso, chamado primeiramente de Congresso Operrio RegionalBrasileiro13, contou com a participao de 43 delegados de vrios estados do Brasil

    representando as 28 associaes de trabalhadores. Em deliberao, aprovou-se a

    filiao (muito mais uma continuao) das teses do congresso ao modelo do

    sindicalismo revolucionrio francs14.

    Do Congresso que surgir a COB (oficialmente em 1908) est prximo aos

    moldes do sindicalismo revolucionrio da CGT (Confdracion Gneral du Travail)

    francesa e do anarco-sindicalismo europeu. Nesse congresso foi deliberado que no

    ocorreria nenhuma vinculao a partidos (ou a um modelo ou diretriz proletria),

    sendo que o congresso via como nica base slida de acordo e de a~o os interesses

    econmicos comuns a toda classe oper|ria (DULLES, 1977, p. 27). compreendendo a

    realidade operria como uma interpretao do passado que a COB reafirmaria suas

    bases sem uma doutrina poltica nica a ser seguida. Porm, h de ressaltar que existia

    uma maioria de militantes anarquistas em sua composio, fato que no nos autoriza a

    12 Confederao Geral do Trabalho.

    13

    De acordo com Samis (2004, p. 135), foi a comisso de redao das deliberaes finais do congressoque deu o nome do encontro de Primeiro Congresso Operrio Brasileiro, j que se tratava de umCongresso nacional e no regional.

    14 De acordo com Pinheiro e Hall (1979, p. 41): o Congresso de 1906 mostra a clara influncia dosindicalismo revolucion|rio: h| mesmo uma men~o ao operariado francs como o modelo de atividadee iniciativa ao trabalhador brasileiro.

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    dizer que o Primeiro Congresso Operrio defendeu o anarco-sindicalismo ou o

    anarquismo. O Primeiro Congresso, como veremos adiante, assumir o sindicalismo

    revolucionrio e no, o anarco-sindicalismo.

    Nos liames da compreens~o do mtodo federativo como o nico mtodo

    de organiza~o compatvel com o irreprimvel sentimento de liberdade, o tema 3 dasbases do Congresso, que tocava no assunto da organizao, definia a federao como:

    (...) a mais larga autonomia do indivduo no sindicato, do sindicato na

    federao e da federao na confederao e como unicamente admissveis

    simples delegaes de funo sem autoridade, e delibera, outrossim, fazer as

    necessrias prticas para a sua fundao (...). Delibera tambm que a

    Confederao s admita sindicatos cuja base essencial seja a resistncia sobre

    o terreno econmico (PINHEIRO e HALL, 1979, p. 49).

    No tocante Ao Operria, o Congresso aprovaria uma das bases pilares dosindicalismo revolucionrio: a ao direta. A ao direta era composta por diversas

    aes, destacando-se a greve geral ou parcial, o boicote, a sabotagem, etc.

    Sobre ao operria

    Tema 1

    (...) o Congresso aconselha como meios de a~o das sociedades de

    resistncia ou sindicatos todos aqueles que dependem do exerccio direto e

    imediato de sua atividade, tais como a greve geral ou parcial, a boicotagem, a

    sabotagem, o label, as manifestaes pblicas, etc., variveis segundo ascircunstncias de lugar e de momento (idem, 1979, p. 51).

    Ainda de acordo com as Bases do Acordo da Confederao Operria Brasileira,

    aprovadas pelo Congresso, dever-se-ia constituir um jornal que levasse a cabo as lutas

    dos trabalhadores. Nesse sentido, o objetivo de criar o jornal A Voz do Trabalhador

    (nome j| definido no Primeiro Congresso), seria o de estudar e propagar os meios de

    emancipao do proletariado e defender em pblico as reivindicaes econmicas dos

    trabalhadores (...) (idem, p. 42).

    O Jornal

    O rgo da Confederao ser redigido por uma comisso escolhida entre os

    seus membros e pela Comisso Confederal e publicar, segundo esta ordem,

    de preferncia:

    1.) Informaes sobre o movimento operrio e associativo;

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    a) Resumo das resolues das sociedades aderentes;

    b) Convocao e avisos das sociedades aderentes;

    c) Artigos que a redao considerar contidos nos limites marcados pelas

    presentes bases de acordo, assim como redigidos de modo compreensvel, e

    isentos de questes pessoais.

    11 O Congresso dir, cada ano, se a redao do jornal correspondeu

    confiana nela depositada (idem, p. 43).

    Ainda sobre as questes do papel da imprensa operria e a emancipao,

    Edgar Rodrigues ressalta que o jornalA Terra Livre no nmero de 13 de agosto de 1906,

    discutiu o papel do Primeiro Congresso Operrio para a imprensa burguesa.

    Relacionando a imprensa e o modo organizativo do Congresso - o sindicalismorevolucionrio - Rodrigues ressalta no jornal:

    A Internacional, desfeita por causa das lutas de partido no seu seio, deve ser

    memorvel lio para todos. Se o Congresso tivesse tomado um carter

    libertrio, teria feito obra de partido, no de classe. (...) Mas se o Congresso

    se no foi, a vitria do anarquismo, foi, porm, indiretamente til difuso

    das nossas ideias (A TERRA LIVRE apud RODRIGUES, 1969, p. 131).

    Dessa forma, o Congresso no se definiu como anarquista, mas assumiu um

    carter revolucionrio de bases sindicalistas. A outra grande preocupao do PrimeiroCongresso Oper|rio Brasileiro foi a transformao de todas as entidades operrias em

    sindicatos de ofcio, cujos objetivos seriam a defesa dos interesses econmicos e a

    resistncia (SEGATTO, 1987, p. 38).

    importante ressaltar que durante toda a Primeira Repblica do Brasil, a

    imprensa operria foi um importante rgo da propaganda libertria. Nesse mago, o

    peridico A Voz do Trabalhadorcirculou de 1908 at 1915 e era a publicao oficial da

    Confederao Operria Brasileira, (SILVA, s/d, p. 13) sob a direo do operrio grfico

    espanhol Manuel Moscoso.

    Entendemos ento que foi com o Primeiro Congresso Operrio Brasileiro,

    que iria constituir a COB (Confederao Operria Brasileira) se instituiu um modelo

    organizativo revolucionrio que naquele perodo foi de suma importncia ao

    movimento operrio revolucionrio: o sindicalismo revolucionrio. Todas as teses

    bsicas do sindicalismo revolucionrio neutralidade sindical, federalismo,

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    descentralizao, antimilitarismo, ao direta, greve geral, antinacionalismo, violncia

    revolucionria, etc. esto contidas nas declaraes dos congressistas (NETO, 2007,

    p.26). Dessa forma, de acordo com Edgar Rodrigues, quando vem tona esse novo tipo

    de sindicalismo ocorre uma substituio do sindicalismo de carter reformista.

    O sindicalismo reformista e possibilista dava lugar a um novo movimentooperrio de cariz revolucionrio que, sem desprezar as reivindicaes

    econmicas imediatas, introduziu novos objetivos como a instruo e a

    capacitao profissional, a cultura de seus associados atravs do esperanto,

    do conhecimento da histria social e da filosofia. (...) O jornalismo, o teatro

    amador de contestao e a poesia, eram alguns dos meios usados pelo

    movimento operrio para construir a sua prpria cultura, tendo por meta o

    ideal social de autogesto. Seu objetivo era provocar a derrocada do Estado,

    acabar com o regime de pobres e ricos, de exploradores e explorados, para

    reconstruir em cima das runas do velho sistema burgus uma Sociedade

    Nova, autogerida, onde todos tivessem direitos e deveres iguais. Estes temas

    comearam a ser frequentemente tratados na imprensa operria e social,

    tornando-se uma verdadeira escola para os trabalhadores ligados a este

    sindicalismo autnomo (RODRIGUES, 1997, s/p).

    Muitos autores ao longo de suas produes confundiam ou colocavam o

    anarco-sindicalismo como sinnimo de sindicalismo revolucionrio. Felipe Corra e

    Alexandre Samis fazem uma anlise mais detida e que aprofunda essa discusso, no

    desvinculando um ou outro ao anarquismo, mas as analisando enquanto estratgias do

    anarquismo. Para o autor o sindicalismo revolucion|rio nunca se colocou, explcita e

    conscientemente, em vnculo com o anarquismo (CORRA, 2011, p. 83). Porm, isso

    no deixa de vincular o anarquismo ao sindicalismo revolucionrio.

    o sindicalismo revolucionrio uma estratgia do anarquismo um vetor

    social -, que foi impulsionada determinantemente pelos anarquistas, ainda

    que tenha tomado corpo em todo um contingente popular amplo de

    anarquistas e no-anarquistas, corpo esse que constituiu sua verdadeira base,

    e faz com que no seja possvel atribuir completamente o fenmeno do

    sindicalismo revolucionrio aos anarquistas (idem, p. 83).

    O autor ainda continua:

    O que diferencia esse sindicalismo revolucion|rio do anarco-sindicalismo

    que o primeiro nunca se vinculou explicitamente e conscientemente ao

    anarquismo, diferentemente do segundo (idem, p. 83).

    Assim, entende-se que uma organizao anarco-sindicalista tem em suas

    bases, os princpios anarquistas; e uma organizao sindicalista revolucionria, no caso o

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    sindicato, no tinha nas suas bases apenas aos princpios anarquistas. Esta ltima

    deveria ter o acmulo de foras para ser uma associa~o da classe trabalhadora,

    abarcando dentro de si quaisquer trabalhadores que, na condio de assalariados, e

    tendo em comum as necessidades econmicas, poderiam utilizar a ao direta como

    meio de luta (idem, p. 135). Porm, interessante dizer que os sindicatos foram um

    importante espao de militncia para os anarquistas nos anos 20 no Brasil e no o

    nico. Afirmar isso seria negar toda a construo histrica de estratgias de luta que o

    anarquismo construiu ao longo de suas lutas e seria, no mnimo, um reducionismo com

    grandes consequncias.

    Ao analisar o Primeiro Congresso, o portugus e anarquista Neno Vasco,

    afirmara que o Congresso n~o foi, de certo, uma vitria do anarquismo. No o devia

    ser. (...) Se o Congresso tivesse tomado carter libertrio [querendo dizer,

    anarquista],teria feito obra de partido, n~o de classe (VASCO apud SAMIS, 2002, p.

    196) [observao e grifo nosso].

    No ano de 1912, aps a organizao do chamado Congresso Pelego feito por

    Mrio da Fonseca, filho do presidente da Repblica Hermes da Fonseca, a Federao

    Operria do Rio de Janeiro nomeou a Comisso Reorganizadora da COB com o intuito de

    rearticular a formao do Segundo Congresso Operrio que aconteceria em setembro

    do prximo ano. De acordo com o historiador Alexandre Samis, deste Congresso que

    contou com a participao de duas federaes estaduais, cinco federaes locais e

    mais de cinquenta sindicatos, quatro jornais (A Voz do Trabalhador, do Rio de Janeiro;A

    Lanterna, de So Paulo; Germinal, de So Paulo e O Trabalho de Bag, Rio de Janeiro),ligas e associaes do pas, a representatividade havia crescido e, na sua grande

    maioria, as propostas do Primeiro Congresso foram corroboradas pelas plenrias de

    1913 (SAMIS, 2004, p. 137). No entanto, o cerne das discusses deste Congresso girava

    em torno das questes de cooperativismo, carga horria diria de trabalho, salrio

    mnimo, bolsas de trabalho e principalmente, do modelo organizativo, afirmando mais

    uma vez o sindicalismo revolucionrio.

    Os Temas

    Tema 1

    (...) O Segundo Congresso Operrio Brasileiro, mesmo tendo em conta a

    devida liberdade de preferncias e de ao poltica dada aos sindicatos fora

    do sindicato, convida a classe trabalhadora do Brasil a, repelindo a influncia

    dissolvente da poltica, dedicar-se obra da organizao operria sindicalista,

    que, considerada dentro da ao operria, o meio mais eficaz e mais

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    poderoso para a conquista de melhoras imediatas de que necessita para o

    fortalecimento da luta para a sua completa emancipao (PINHEIRO e HALL,

    1979, p. 188).

    No limiar das discusses sobre o papel do Congresso, o que e como os

    trabalhadores devero se organizar, surge a questo das bolsas de trabalho. Estasbolsas estavam em discusso pelo carter quase integral que alguns militantes tinham

    na COB. Assim, definiu, por negar o funcionalismo burocrtico. Assim,

    o Segundo Congresso Operrio Brasileiro entende que a obra essencial e

    primria da organizao a resistncia e a propaganda e que, por isso, a

    instalao de bolsas de trabalho no deve nunca embaraar a ao de

    resistncia, devendo o servio de colocao ser feito pelas prprias comisses

    administrativas dos sindicatos, para se evitar o funcionalismo burocrtico

    (idem, p. 194).

    As bases definidas no Segundo Congresso so mais eficazes e mais claras noque diz respeito propaganda e educao para os trabalhadores. Alm da questo

    das bolsas de trabalho, instituiu-se a retomada de A Voz do Trabalhador, j que a

    imprensa oper|ria o meio mais eficaz para orientar as massas populares (idem, p.

    196). nesse contexto de apoio imprensa operria que o trabalho de Maria Nazarteh

    Ferreira (1988) tem destaque ao apontar que existiam cerca de 343 ttulos de jornais

    operrio no territrio brasileiro. O reaparecimento do jornal oficial da COB foi um fator

    de ascenso desta organiza~o, j| que o prprio jornal era entendido como reflexo de

    todo o movimento oper|rio do Brasil (idem, p. 210).

    Retomando as decises do Segundo Congresso, ficou-se aprovado ainda na

    seo Moes de Solidariedade, o carter internacionalista da luta pela emancipao

    humana. Moes de apoio foram mandadas a trabalhadores do Mxico, CGT da Frana,

    trabalhadores de Portugal e da Espanha, para reafirmar o esprito de solidariedade

    que deve estar de perfeito estado para todos os trabalhadores do globo (idem, p.

    202). Esta rede de solidariedade internacional daria cabo criao no de 1915 do

    Congresso Internacional da Paz e ao Congresso Anarquista Sul-Americano, sendo que este

    ltimo tinha o papel de clivar diferenas sensveis entre o sindicalismo e o

    anarquismo (SAMIS, 2004, p. 138).

    Continuando ainda os apoios, na Terceira Parte do Relatrio da

    Confederao Operria Brasileira, veicula-se uma homenagem para Francisco Ferrer y

    Guardia, anarquista espanhol que foi fuzilado em 13 de outubro de 1909 pelo governo

    espanhol. Ferrer, o criador das Escolas Modernas foi caracterizado como um homem

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    que soube num decnio de penoso estudo constituir um exrcito de homens educados

    nos mais elevados sentimentos de solidariedade e assim, grande foi o abalo sentido

    pelo operariado consciente do Brasil (idem, p. 210). Ainda destaca-se a deciso de

    recusar frmulas burocrticas nos estatutos sindicais, alm de reafirmar a propaganda

    anti-militarista e do internacionalismo.

    Afirma Pinheiro e Hall (1979, p. 172),

    O Congresso Operrio de 1913 continuava a linha adotada pelo Congresso de

    1906 (...). A linguagem algumas vezes mais militante do que a do congresso

    anterior, e h alguns toques bastante eclticos (como no tema 10), mas o teor

    geral continua a ser sindicalista-revolucionrio, como em 1906. O folheto do

    congresso, que vai reproduzido abaixo, juntamente com as resolues,

    tambm inclui informao sobre a preparao do congresso, e um pequeno

    histrico da Confederao Operria Brasileira (COB), que permitem

    compreender melhor o significado do congresso.

    Cerca de um ano ps o Segundo Congresso Operrio, no nmero 63 datado

    de 1 de outubro de 1914, o jornal A Voz do Trabalhador publicava um apelo aos

    trabalhadores para se manifestarem novamente contra a Guerra Mundial. Neste

    nmero, o texto A Internacional Operria Contra a Guerra reafirmava o carter

    internacionalista dos pressupostos defendidos pelo jornal e reafirmados no Segundo

    Congresso.

    Diversas organizaes operarias, atendendo ao apelo da Confederao

    Operaria Brazileira, realizaram em suas sdes, no dia 13 de setembro findo,comcios e sesses de protesto contra a atual conflagrao europeia de

    solidariedade para com o operariado de todos os paizes em luta! Em diversas

    cidades, como no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, So Paulo, Santos, etc., a

    policia, zelosa no apoio aos opressores das classes trabalhadoras, no

    permitiu a efetuao das manifestaes operarias nem mesmo na sde de

    suas associaes! Abaixo a tirania burgueza! Abaixo a guerra! Viva a

    solidariedade universal! (A VOZ DO TRABALHADOR, n 63, 1 de outubro de

    1914, p. 1).

    Outro elemento recorrente na imprensa da COB era os apelos pela paz

    mundial. A Primeira Guerra Mundial que assolava a Europa tinha ecos no Brasil e aqui, ojornalA Voz do Trabalhador fazia apelos contra o militarismo. No nmero de 7 de abril

    de 1915, vem em destaque no artigo Pela Paz O grande comcio de hoje que esse

    movimento de carater essencialmente internacional, a ajitao de hoje constituir a

    primeira grande manifestao publica a favor da paz, contra a guerra. E ainda,

    insistimos vivamente para que nenhum dos nossos amigos deixe de, com sua

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    prezena, contribuir para a impotencia a significa~o da manifesta~o (A VOZ DO

    TRABALHADOR, n 69, p. 2).

    Na Europa o bolchevismo tornava-se vitorioso, colocando abaixo, via

    represso, os conselhos operrios. Tais acontecimentos tiveram ressonncias em todo

    o mundo, causando o processo de criao de Partidos Comunistas, como por exemplo,o PCB. No caso especfico do Brasil, vrios militantes anarquistas iro arregimentar a

    justificativa do bolchevismo no Brasil15, concordando com as teses da Terceira

    Internacional. Isso sem dvida foi um elemento estruturante que contribuiu para a

    derrocada do sindicalismo revolucionrio, se no, do anarquismo no Brasil.

    No ano de 1920 organizar-se- o Terceiro Congresso Operrio Brasileiro que

    tem algumas particularidades que remetem a prpria dinmica que o pas estava

    passando: a transformao do quadro industrial no Ps-Primeira Guerra Mundial.

    Conforme Neto (2007) aponta, a I Guerra Mundial criou condies favor|veis aor|pido crescimento da indstria brasileira (idem, p. 14). Alm disso, v|rios

    acontecimentos, como por exemplo, as greves de 1917, sobretudo a Greve Geral de

    julho16 na cidade de So Paulo e suas ressonncias, foram elementares para a nova

    dinmica da COB.

    De acordo com o Boletim da Comisso Executiva do 3 Congresso Operrio,

    as questes do contexto so passveis e necessrias de serem analisadas. Vejamos:

    O 3 C.O.B., tendo em vista as condies particulares aos meios operarios do

    Brazil, reaffirma em suas linhas geraes as declaraes feitas nos Congressosde 1906 e 1913; por outro lado, porm, examinando e ponderando a situao

    historica de facto em que se encontra o proletariado mundial neste

    momento, julga necessrio estabelecer, em termos precisos, um criterio

    fundamental, positivo e realista, pelo qual devero orientar-se todas as

    organizaes, todas as lutas, todos os esforos dos trabalhadores do Brazil

    (Boletim da Comisso Executiva do 3 Congresso Operrio, Ano I, n I, agosto

    de 1920).

    15 DULLES (1977), diz que Otvio Brando entrou em conflito com suas teses (at ento anarquistas) e acrescente bolchevique no pas, sendo que, Astrojildo Pereira, militante que deixou as correntesanarquistas para defender o bolchevismo, lhe forneceu livros que justificasse que o bolchevismo no erareformista. Para maior aprofundamento ver Dulles (1977, p. 148 151).

    16 Para este intento, cf. LOPREATO, C. R. O Esprito da Revolta: a greve geral anarquista de 1917. So Paulo:Annablume/FAPESP, 2000.

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    Assim, de acordo com Samis (2004, p. 139), o Terceiro Congresso realizado

    em 1920, defendeu a prioridade da sindicaliza~o por indstrias, em detrimento da

    organiza~o por ofcios, sendo que as decises dos congressos anteriores so

    reafirmadas com certas questes particulares do prprio contexto. Essa resoluo que

    aprovara a preferncias pelos sindicatos de indstria em detrimento dos de comrcio

    bastante clara. Essa substituio reflete as alteraes tecnolgicas em curso, pois

    preconizava a organiza~o de sindicatos de indstria, em lugar dos sindicatos de

    ofcio (NETO, 2007, p. 14).

    Outro elemento especfico de declnio do sindicalismo cobista vem na

    dcada de 1920. O brasilianista Jhon W. Foster Dulles afirma que a Liga Operria da

    Construo Civil de So Paulo props ao Terceiro Congresso que se filiasse a Terceira

    Internacional, caso que no ocorreu por posies de Astrojildo Pereira (este se

    vincular ao bolchevismo posteriormente) e Edgard Leuenroth17. Porm, a deciso do

    Congresso foi o de transmitir seus votos de felicidade ao importante acontecimentode Moscou, cujos princpios ferais verdadeiramente correspondem s aspiraes de

    liberdade e igualdade dos trabalhadores de todo o mundo (DULLES, 1977, p. 113). No

    entanto, a criao do PCB em 1922 e as disputas entre anarquistas e bolchevistas sob o

    controle dos sindicatos de resistncia, que resultaram no conflito entre diversas

    federaes, foi fator crucial de derrota do sindicalismo revolucionrio.

    Concomitantemente, a constante represso do Estado favoreceu para esta derrocada.

    Por fim, compreende-se que os Congressos Operrios foram

    assumidamente sindicalistas revolucionrios, compostos por princpios que no soexclusivamente anarquistas. O sindicato que representava um espao de luta do

    proletariado se tornou um empecilho e um amortecedor do conflito capital/trabalho.

    Assim, a fora do burocratismo estatal dos sindicatos e, sobretudo, com a ascenso do

    Partido Comunista do Brasil na dcada de 20 e das medidas do governo getulista

    marcaram o caminhar a passos largos para o enfraquecimento, seno, para o fim do

    sindicalismo de bases revolucionrias para se tornar um local a ser combatido.

    Combater os sindicatos se torna um passo importante para o fim da sociedade de

    classes.

    17 Em O Operariado do Brasil e a situao internacional proletria, v-se: I Declarar a sua espectativasympathica em face da 3 Internacional de Moscou, cujos principios geraes correspondemverdadeiramente as aspiraes de liberdade e igualdade dos trabalhadores de todo no mundo (Boletimda Comisso Executiva do 3 Congresso Operrio, Ano I, n I, agosto de 1920, p. 15).

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    Enfrentamento. Goinia: ano 7, n 12, ago./dez. 2012 75

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