o professor e a tecnologia educacional

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O PROFESSOR E A TECNOLOGIA EDUCACIONAL O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem precisamente definido com antecedência. Lévy, 1999 Uma das expressões mais interessantes para descrever o professor da era da cibercultura é “animador da inteligência coletiva”[1] (Lévy, 1999). Mas o que isso significa? Por que será que o professor, que não questiona o nome da sua profissão há milênios, de repente recebe um nome novo, que aponta para tantas funções diferentes? Ocorre que, com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC), que dão acesso muito fácil a informações das mais variadas, a função do professor se multiplica. Nesse novo contexto, a transmissão do conhecimento, que sempre foi um dos principais papéis do professor (e dos livros, evidentemente), passa a ser realizada muito rapidamente pela tecnologia, com cores, animações, material atualizado e outros recursos motivadores. Com isso, o professor passa a ter mais tempo para se dedicar ao papel de orientar e avaliar seus alunos [2]. Vamos, então, ao laboratório de informática para observar o que o professor tem a fazer com os estudantes ali, na condição de animador da inteligência coletiva: O animador da inteligência coletiva não está no centro das atenções da turma. Provavelmente, a sensação mais estranha que um professor acostumado com aulas expositivas tem nas primeiras vezes em que vai ao laboratório de informática com seus alunos é a de não estar mais no centro das atenções da turma. Dependendo da configuração do laboratório, nem há um lugar específico para ele. Além disso, quando este existe, não é necessariamente o local para onde convergem todos os olhares do grupo. Os estudantes olham para telas de computadores ligados, que lhes dão acesso a mundos interessantíssimos, e é muito difícil fazer com que olhem para o professor e o ouçam nesse momento. Essa sensação estranha de “estar sobrando” ou “não estar conseguindo atrair a atenção dos alunos” ou mesmo de “estar sendo desrespeitado” é plenamente justificada. Afinal, todos nós fomos educados em escolas que colocam o professor no centro das atenções da sala, e deve ser muito estranho de repente ter de agir de maneira diferente. No entanto, se o professor incorporar o papel de animador da inteligência coletiva, ele perceberá que não é nem deve ser o centro das atenções naquele momento. Para ele, o que importa é criar uma proposta de trabalho interessante o suficiente para que os estudantes trabalhem ou até incentivá- los a elaborar essa proposta. Ela pode ter sido discutida fora do laboratório ou ser passada em uma folha de papel ou na própria tela de computador para os

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O PROFESSOR E A TECNOLOGIA EDUCACIONAL O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem precisamente definido com antecedência. Lévy, 1999 Uma das expressões mais interessantes para descrever o professor da era da cibercultura é “animador da inteligência coletiva”[1] (Lévy, 1999). Mas o que isso significa? Por que será que o professor, que não questiona o nome da sua profissão há milênios, de repente recebe um nome novo, que aponta para tantas funções diferentes? Ocorre que, com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC), que dão acesso muito fácil a informações das mais variadas, a função do professor se multiplica. GOSTOU? DEIXE SEU COMENTÁRIO OU SUGESTÃO!!!

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Page 1: O Professor e a Tecnologia Educacional

O PROFESSOR E A TECNOLOGIA EDUCACIONAL

O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem precisamente definido com antecedência. Lévy, 1999

Uma das expressões mais interessantes para descrever o professor da era da cibercultura é “animador da inteligência coletiva”[1] (Lévy, 1999). Mas o que isso significa? Por que será que o professor, que não questiona o nome da sua profissão há milênios, de repente recebe um nome novo, que aponta para tantas funções diferentes? Ocorre que, com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC), que dão acesso muito fácil a informações das mais variadas, a função do professor se multiplica.

Nesse novo contexto, a transmissão do conhecimento, que sempre foi um dos principais papéis do professor (e dos livros, evidentemente), passa a ser realizada muito rapidamente pela tecnologia, com cores, animações, material atualizado e outros recursos motivadores. Com isso, o professor passa a ter mais tempo para se dedicar ao papel de orientar e avaliar seus alunos [2].

Vamos, então, ao laboratório de informática para observar o que o professor tem a fazer com os estudantes ali, na condição de animador da inteligência coletiva:

O animador da inteligência coletiva não está no centro das atenções da turma.

Provavelmente, a sensação mais estranha que um professor acostumado com aulas expositivas tem nas primeiras vezes em que vai ao laboratório de informática com seus alunos é a de não estar mais no centro das atenções da turma. Dependendo da configuração do laboratório, nem há um lugar específico para ele. Além disso, quando este existe, não é necessariamente o local para onde convergem todos os olhares do grupo. Os estudantes olham para telas de computadores ligados, que lhes dão acesso a mundos interessantíssimos, e é muito difícil fazer com que olhem para o professor e o ouçam nesse momento.

Essa sensação estranha de “estar sobrando” ou “não estar conseguindo atrair a atenção dos alunos” ou mesmo de “estar sendo desrespeitado” é plenamente justificada. Afinal, todos nós fomos educados em escolas que colocam o professor no centro das atenções da sala, e deve ser muito estranho de repente ter de agir de maneira diferente.

No entanto, se o professor incorporar o papel de animador da inteligência coletiva, ele perceberá que não é nem deve ser o centro das atenções naquele momento. Para ele, o que importa é criar uma proposta de trabalho interessante o suficiente para que os estudantes trabalhem — ou até incentivá-los a elaborar essa proposta. Ela pode ter sido discutida fora do laboratório ou ser passada em uma folha de papel ou na própria tela de computador para os

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alunos, e ele nem percebe que “não está sendo ouvido”. Afinal, o animador da inteligência coletiva não precisa ser ouvido ali. Tendo alunos engajados e animados à sua frente, ele está praticamente satisfeito. Quem está no centro, exercitando sua inteligência agora são os estudantes. E o melhor lugar para o animador da inteligência coletiva ficar, inicialmente, é em algum ponto da sala a partir do qual consiga ver todas as telas dos computadores.

O animador da inteligência coletiva tem tempo para observar o trabalho dos seus alunos.

Bem, tendo feito uma proposta motivadora, com os estudantes trabalhando à sua frente, o animador da inteligência coletiva tem tempo para observar o que estes estão fazendo e esclarecer suas dúvidas. Mas o que observar? São inúmeros os comportamentos que merecem destaque. É possível perceber se o aluno está realizando a atividade que foi proposta de maneira concentrada ou se está navegando rapidamente a esmo; se está acessando um material completamente diferente do sugerido pelo professor; se está vendo o que os colegas estão fazendo; e assim por diante.

A partir dessas constatações, o animador da inteligência coletiva consegue dar um atendimento mais individualizado aos estudantes. Aqueles que estão trabalhando de maneira concentrada, estudando, indo e voltando às mesmas páginas, repetindo as propostas interativas, não precisam de sua atenção específica. Estão trabalhando bem e, em algum momento, o animador da inteligência coletiva lhes oferece esse reconhecimento. Caso um aluno esteja parado em um ponto do material acessado, possivelmente está tendo alguma dúvida, e o animador da inteligência coletiva vai até ele e lhe pergunta se precisa de ajuda.

Se um estudante está navegando sem atenção ou consultando um material completamente diferente do que ele havia sugerido, também vai até esse aluno e pergunta por que ele está fazendo isso. Pode ser que ele esteja buscando algo em outro lugar para realizar a proposta original, e isso é louvável. Por outro lado, pode estar desmotivado e, então, vale a pena tentar compreender o motivo disso. O animador da inteligência coletiva incentiva o estudante a voltar à proposta, reformula-a para que fique mais interessante ou simplesmente registra que o aluno não a realizou. O que ele não faz é gastar muita energia com essa aparente rebeldia e deixar de ajudar os que precisam.

Por fim, se um estudante se levanta para ver o que outro está fazendo, ele não classifica esse aluno como “indisciplinado”, mas como alguém que pode estar tentando aprender algo com o colega. Nesse caso, o animador da inteligência coletiva vai ver o que há de tão interessante que fez outro estudante se levantar e até incentiva mais alunos a partilhar a experiência do colega. A aula de laboratório não necessita do silêncio de uma aula expositiva, pois estudantes e professores não precisam se ouvir todos ao mesmo tempo.

Animadores da inteligência coletiva mais organizados levam uma lista dos alunos com espaço para observações para a aula de laboratório e, nela, fazem registros que podem ser muito úteis para a avaliação.

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O novo professor da cibercultura

Como acabamos de observar, o animador da inteligência coletiva tem muito a fazer em uma aula de laboratório. Esta não pode e não deve ser vista como uma aula em que a máquina ensina e o professor não tem mais nada a fazer a não ser pedir silêncio ou que os alunos voltem a suas cadeiras ou garantir que eles não estejam aproveitando o momento para acessar seu e-mail ou visitar sites inadequados. Exercer esse papel é muito frustrante. No entanto, uma aula em que o professor aproveita para perceber que estudantes trabalham bem, quais precisam de ajuda, de que ajuda necessitam e pelo que se interessam é extremamente gratificante para todos.

É muito provável que, quando as escolas estiverem repletas de animadores da inteligência coletiva conscientes da relevância de orientar, observar e registrar o desenvolvimento de seus alunos, eles passem a ser chamados simplesmente de “professores”. Afinal, desde sempre a função do professor foi ajudar os estudantes a aprender. No entanto, com a obrigação de transmitir uma quantidade enorme de conteúdos, muitas vezes falta tempo para observar e orientar os alunos. É tirando do professor a obrigação de transmitir conteúdos que a cibercultura pode ajudar todos a aprender mais e a se conhecer melhor.

Referências bibliográficas

DEMO, Pedro (2000). A criança é um grande pesquisador. Acesso em: 13 jan. 2005.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1999.

RAMAL, Andrea Cecília (2000). Avaliar na cibercultura. Revista Pátio. Acesso em: 13 jan. 2005. .

Dica Educacional

É possível ser um animador da inteligência coletiva em qualquer ida ao laboratório de informática e até em trabalhos na sala de aula. No entanto, vale a pena experimentar as estratégias acima, especialmente com os conteúdos multimídia do portal. Esses materiais, aparentemente suficientes para os estudantes aprenderem os mais variados temas, podem ser muito mais bem explorados por professores atentos a como seus alunos estão trabalhando e desenvolvendo-se.

1 - Esse termo aparece em outros textos com nomes diferentes. Andréa Cecília Ramal (2000), por exemplo, o denomina “dinamizador da inteligência coletiva do grupo”. 2 - Ver Demo (2000)