o processo de urbanização no sul de minas em transição · a origem da cidade em si, muito...

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1 O processo de urbanização no sul de Minas em transição Alexandre Macchione Saes – FEA/USP Daniel do Val Consentino – Unifal/MG Michel Deliberali Marson – Unifal/MG Thiago Fontelas Rosado Gambi – Unifal/MG Introdução As abordagens sobre o significado da constituição do mundo urbano moderno alcançam as mais diversas áreas das ciências sociais: o mundo urbano que proporciona o desenvolvimento do ser político, da vida cultural e religiosa cristalizadas entre as novas instituições urbanas e, ainda, as relações sociais que tendiam a se tornar mais complexas entre os mercados e as ruas com o crescimento das cidades. Por isso, as cidades, como objeto complexo, podem ser pensadas a partir de diversos pontos de vista. Tomando o caso da sociologia urbana como exemplo, podemos distinguir duas visões que, de certo modo, se opõem: uma mais tradicional que pensa a cidade como objeto de consumo e material simbólico, como uma realidade já dada, e que, portanto, estuda o comportamento cultural e racional de seus habitantes. São os seres humanos nas cidades o objeto relevante na análise e, assim, o pesquisador dirige o seu olhar para espaços de sociabilização e estuda seus elementos. 1 Essa é uma visão válida, mas nela a preocupação fundamental não está no processo de formação das cidades em si, ou na de estruturação do espaço urbano a partir de relações econômicas e sociais. O estudo das cidades, e mais especificamente das dinâmicas de urbanização, como processos econômicos e sociais, por outro lado, só se estabeleceria na literatura sobre o tema no final dos anos 1960. Nessa linha, a cidade é vista como resultado de um processo de produção que se movimenta por contradições. O espaço deixa de ser um dado para se tornar algo formado (espontaneamente) ou construído (intencionalmente) por relações sociais. Então, o pesquisador olha para o espaço e estuda os processos que o estruturaram considerando todo o conjunto de relações internas e externas que contribuíram para defini-lo como tal. 2 Enfatiza-se, neste caso, o processo de 1 Cf.: Simmel (1987), Park (1987). 2 Cf.: Topalov (1978), Harvey (1978).

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1

O processo de urbanização no sul de Minas em transição

Alexandre Macchione Saes – FEA/USP

Daniel do Val Consentino – Unifal/MG

Michel Deliberali Marson – Unifal/MG

Thiago Fontelas Rosado Gambi – Unifal/MG

Introdução

As abordagens sobre o significado da constituição do mundo urbano moderno

alcançam as mais diversas áreas das ciências sociais: o mundo urbano que proporciona

o desenvolvimento do ser político, da vida cultural e religiosa cristalizadas entre as

novas instituições urbanas e, ainda, as relações sociais que tendiam a se tornar mais

complexas entre os mercados e as ruas com o crescimento das cidades. Por isso, as

cidades, como objeto complexo, podem ser pensadas a partir de diversos pontos de

vista.

Tomando o caso da sociologia urbana como exemplo, podemos distinguir duas

visões que, de certo modo, se opõem: uma mais tradicional que pensa a cidade como

objeto de consumo e material simbólico, como uma realidade já dada, e que, portanto,

estuda o comportamento cultural e racional de seus habitantes. São os seres humanos

nas cidades o objeto relevante na análise e, assim, o pesquisador dirige o seu olhar para

espaços de sociabilização e estuda seus elementos.1 Essa é uma visão válida, mas nela a

preocupação fundamental não está no processo de formação das cidades em si, ou na de

estruturação do espaço urbano a partir de relações econômicas e sociais.

O estudo das cidades, e mais especificamente das dinâmicas de urbanização,

como processos econômicos e sociais, por outro lado, só se estabeleceria na literatura

sobre o tema no final dos anos 1960. Nessa linha, a cidade é vista como resultado de um

processo de produção que se movimenta por contradições. O espaço deixa de ser um

dado para se tornar algo formado (espontaneamente) ou construído (intencionalmente)

por relações sociais. Então, o pesquisador olha para o espaço e estuda os processos que

o estruturaram considerando todo o conjunto de relações internas e externas que

contribuíram para defini-lo como tal.2 Enfatiza-se, neste caso, o processo de

1 Cf.: Simmel (1987), Park (1987). 2 Cf.: Topalov (1978), Harvey (1978).

2

urbanização e, por conseguinte, as relações econômicas e sociais que produzirão a

formação ou construção do espaço. As cidades e a dinâmica do mundo urbano são vistas

como agentes transformadores das relações econômicas ao longo do tempo; como os

personagens que permitem uma aceleração das atividades mercantis e,

consequentemente, da sociedade moderna.

A partir de uma perspectiva histórica das transformações urbanas, este artigo

procura entender as cidades como todos complexos que significam interações dinâmicas

entre pessoas e espaços determinados; entre cultura e economia; entre transições e

estruturas. Em suma, cidades como unidades de concretização de um mundo urbano que

permite a expansão das relações econômicas, mas que ao mesmo tempo, reproduz as

relações sociais específicas de uma determinada sociedade.

É nessa perspectiva que se discute o processo de urbanização do Sul de Minas

em sua transição para o capitalismo no final do século XIX e início do XX.3 Não há

dúvida de que esta é uma região construída também a partir dos rios e montanhas de sua

geografia, do Rio Grande às encostas da Mantiqueira, mas especialmente por seus

elementos econômicos, políticos e sociais de sua história, da emancipação da comarca

do Rio das Mortes à sanha separatista de Campanha. Nessa época de mudanças externas

e permanências internas, o Sul de Minas buscou criar uma nova identidade frente às

articulações contemporâneas do país com a economia internacional. Era o momento de

incorporar novas técnicas de produção, realinhar as funções na divisão internacional do

trabalho e consolidar as relações capitalistas na periferia. Para a região isso significou

caminhar para a urbanização e ampliar o espaço para atividades mercantis.

O artigo procura refazer este caminho, primeiro, com uma discussão histórico-

conceitual, que relaciona o processo de urbanização à transição para o capitalismo em

perspectiva mais ampla, e traz essa discussão para o Brasil ao abordar a formação

peculiar de suas cidades. A seguir, trata da existência de um grande capital urbano como

ator importante da transformação qualitativa da economia brasileira, de maneira geral, e

do processo de urbanização, em particular. Discute, então, os elementos históricos que

3 No Estado de Minas Gerais inteiro, apenas três regiões até a década de 1920 conseguiram cumprir essa transição: o Sul de Minas, na divisa com São Paulo e Rio de Janeiro; a Zona da Mata, também na divisa com o Rio de Janeiro; e mais fracamente o Campo das Vertentes, no centro do Estado. Eram as três regiões dinâmicas nesta perspectiva aqui considerada de transição, isto é, regiões com ferrovias, bancos, indústrias e que concentravam não somente o maior número de cidades como as maiores densidades populacionais do Estado. Assim, o sul de Minas em transição foi definido pelos aspectos representativos de uma sociedade que se integrava ao mercado capitalista. Cf. Saes, Cosentino e Gambi (2012).

3

caracterizam a urbanização do sul de Minas sem perder de vista os contextos mais

amplos em que a região está inserida e, finalmente, conclui com as questões que

amarram a problemática da urbanização ao conceito de grande capital urbano, propondo

rumos para pesquisas posteriores.

1. A transição e a transição no Brasil

A origem da cidade em si, muito anterior ao processo de transição do feudalismo

para o capitalismo, constituía uma das primordiais formas de divisão do trabalho: aquela

entre campo e cidade. Entretanto, no capitalismo esta característica da especialização de

atividades seria ainda mais desenvolta. A cidade moderna passa a ser o local em que a

divisão social do trabalho e a construção de valores de uso complexos4 são peças

intrínsecas à própria existência da vida urbana e à reprodução do capital acelerada pela

concentração tanto da força de trabalho como dos meios de produção. Inicialmente

fundadas por meio de sua vocação comercial, cidades de mercadores no alvorecer da

Idade Moderna, passaram a expandir sua área de influência para além das rotas

comerciais.5 Foi somente mais tarde que, internalizando os processos manufatureiros e

industriais, a longa transição para o capitalismo tomaria definitiva forma, com a

internalização da realização da renda por meio do processo produtivo.6

A cidade era a maior manifestação da emergência do capitalismo. Se o mundo

rural e a relação de subordinação entre camponês e senhor era a expressão da sociedade

feudal, no mundo urbano, com a idéia de liberdade (apenas formal) presente dentro dele

e a expansão das relações comerciais, estas relações sociais teriam o significado

explícito do nascimento de uma nova sociedade.7 A multiplicação das necessidades

humanas, a ampliação do consumo e a dependência entre cidadãos em função da divisão

4 De acordo com Topalov (1979), valores de uso complexos significam infra-estrutura e equipamentos coletivos de consumo, tais como saúde, educação, formação técnica, necessários à acumulação de capital. 5 Cf. Pirenne (1968). Para o debate da transição do feudalismo ao capitalismo, a interpretação de Pirenne – e o predominante papel das cidades e do comércio como elemento da transição – seria recuperada por Paul Sweezy (1977). Para as críticas conferir Dobb (1980). Na síntese, John Merrington (1989) lembra que a cidade “capitalista” foi resultado do pecado original, da necessária acumulação de capital, assim como o posterior desenvolvimento da indústria britânica. Portanto, a cidade capitalista exige mais do que o capital mercantil pode oferecer. A produção de mercadorias e capitais baseado na circulação não era suficiente para gerar o capitalismo. 6 Esse processo foi captado por uma diversidade de determinantes. No que diz respeito aos aspectos sociais, esse mundo urbano teria um significado de libertação do homem: liberdade jurídica plena, decisiva tanto na formação de uma base psicológica metropolitana e individualista como no desenvolvimento da intelectualidade (Simmel, 1967). 7 A cidade como o local do mercado; da ruptura com a economia natural (Weber, 1967).

4

social do trabalho, imputavam ao sistema econômico posição determinante na

organização da vida urbana. O campo, orientado a fornecer as mercadorias para os

habitantes da cidade, passou a se modernizar.8 A busca pelo lucro, a orientação tomada

pelos comerciantes, minavam as estruturas feudais prévias.

Assim, nos estudos sobre a economia política da cidade9, o significado do

mundo urbano na transformação da economia é reforçado. Para Milton Santos (2009,

p.113): “A circulação dos produtos, das mercadorias, dos homens e das ideias ganhou

uma tal expressão, dentro do processo global de produção, que a urbanização passou a

ser um dado fundamental na compreensão da economia”. Paul Singer (1978), por seu

turno, lembra que a origem da cidade advém do desenvolvimento das forças produtivas;

é preciso que exista produção de excedente para que o mundo urbano possa existir e se

reproduzir. Mas a partir de sua formação, a cidade incorpora as forças de reprodução da

economia capitalista, produzindo amplo progresso técnico e concentração de capitais. A

contradição intrínseca ao processo se verifica com a crescente desigualdade regional.

Logo, a urbe moderna é o lócus da socialização capitalista: cidade como lugar de

consumo, da divisão social do trabalho, do meio de produção material e de ampliação da

produtividade. Por isso mesmo, no mundo colonial português, as cidades responderiam

a desígnios particulares em função da própria subordinação colonial, não respondendo

adequadamente à construção de relações econômicas mais modernas. Foi somente em

fins do século XIX, em suma, que as cidades brasileiras entrariam por um processo

intenso de urbanização, tornando-se lócus privilegiado da constituição do capitalismo

periférico. Aos poucos, a urbanização permitiu dar andamento na ruptura com dois

problemáticos impasses na formação do capitalismo brasileiro: de um lado, ao

incorporar parcela da população rural, as cidades criavam pela primeira vez no país um

mercado de trabalho livre nacional e, paralelamente, com a expansão do transporte

ferroviário e a interligação regional brasileira, iniciava-se a constituição de um mercado

interno no país.

O estudo econômico do fenômeno urbano, portanto, fortalece os elementos para

compreender como o capitalismo nacional pôde se consolidar. Afinal, o transcorrer do

século XIX já se revestiria de aspectos sintomáticos da constituição do capitalismo no

8 A cidade moderna é aquela que passa a definir o funcionamento da produção do campo. Cf. Marx (1975), Smith (1996). 9 Cf. Santos (2009) e Singer (1978).

5

Brasil: a promulgação da Lei de Terras em 1850 no que diz respeito a existência de uma

regulamentação da propriedade privada no país; a abolição da escravidão na

constituição de um mercado de trabalho livre; a Constituição de 1891, como

organização do aparato jurídico burguês; e, ainda, o desenvolvimento dos fatores de

produção, tanto em função dos setores de infra-estrutura – com a construção das

estradas de ferro e a formação das companhias de energia elétrica – como com a

expansão da produção fabril.10 Mas ainda assim, os nexos sociais e econômicos da

sociedade não permitiam a efetivação de uma reprodução social capitalista. Afinal, a

gênese do capitalismo nas mais variadas regiões deve ser resultado das “realidades

sociais, políticas, econômicas, culturais e naturais nas quais emergem” (Paula, 2002,

p.24).

No Brasil, particularmente, o que faltava ainda no século XIX era a constituição

de um mercado propriamente capitalista, que é qualitativamente distinto dos mercados

prévios. Como destaca Ellen Wood (2001) para a transição ao capitalismo na Inglaterra,

o mercado deve ser encarado não como oportunidade para agentes econômicos

favorecidos por quaisquer razões extra-econômicas, mas como um mercado cuja função

é ser imperativo e coercitivo aos agora agentes econômicos capitalistas. Assim, a

riqueza capitalista deve ser encarada não como realizada pela força coercitiva, ou pela

condição monopolista nas relações comerciais, mas pelo crescente aumento da

produtividade do trabalho. O mercado concorrencial, tanto para regular as relações

comerciais, como pelas relações no mercado de trabalho, é imperativo. Para Florestan

Fernandes (2008), essa condição poderia ser encarada como a formação de uma “ordem

social competitiva”.

O lucro comercial, portanto, ainda pré-capitalista e dominante no Brasil do

século XIX, não conseguia transpor as barreiras para a construção dos elementos

próprios da acumulação de capital.11 Por isso mesmo, a abolição rompia com o violento

regime de trabalho escravo, mas não garantia a transição do trabalho livre para todo o 10 Cf.: Para mercado de terras, Lígia Osório (2008); para mercado de trabalho, Jacob Gorender (1978); para aparato jurídico-político, Décio Saes (1990); e, para forças produtivas, João Manuel Cardoso de Mello (1982). 11 A formação das cidades brasileiras seguiu um percurso particular, todavia não menos decisivo do que aquele responsável pelas transformações na Europa (Lanna, 1995, p.21). O caráter colonial da economia brasileira havia reduzido, no limite, as funções das vilas e cidades a núcleos de exportação de produtos. Isso explicava a localização litorânea das principais cidades brasileiras até o século XIX, em que o porto era a região de onde irradiavam as estruturas urbanas. As funções das cidades eram poucas e dependentes do comércio de exportação (Costa, 1999); e a massa da população estava localizada no campo, junto aos latifúndios, enquanto os centros urbanos eram pequenos, pobres e sujos (Prado Jr., 1969, p.350).

6

país: passava-se a incorporar tecnologia e fatores de produção tipicamente capitalistas,

mas o mercado nacional ora não permitia a constituição de setores modernos pelo limite

técnico e financeiro frente aos produtos estrangeiros, ora não garantia que os elementos

coercitivos do mercado impulsionassem as transformações econômicas dos setores

emergentes nacionais.

Essa será a maior colaboração do mundo urbano moderno ao desenvolvimento

do capitalismo dentro do país. Mediante a impessoalidade, a complexidade das relações

econômicas e a expansão de um mercado competitivo nos centros urbanos, o

capitalismo pôde iniciar sua dinâmica intensa de reprodução econômica. Ao que parece,

ainda mais importante do que na transição clássica do feudalismo ao capitalismo, as

cidades tornaram-se os pontos difusores da formação do capitalismo periférico. Mais

importante do que as relações de trabalho no campo após a abolição, é na cidade, e

muito em função do aumento do número de imigrantes, que fundou-se, enfim, um

mercado de trabalho assalariado. É das atividades de serviços, como ferrovias, bancos,

empresas de serviços públicos, que as maiores oportunidades de trabalho surgem, ou

mesmo, as maiores rendas econômicas da elite nacional passam a ser realizadas.

Além de produzir este amplo progresso técnico e da divisão social do trabalho, a

expansão do mundo urbano na periferia gera também uma aceleração na contradição

entre as relações regionais. Funcionando como imã de atração do capital e trabalho,

acaba por gerar um processo cego da concentração espacial dos capitais. Mas a

concentração do capital no espaço se dá em diferentes escalas e, por isso, Castells

(1983) enfatiza as relações externas ao considerar a urbanização em países periféricos.

Para ele, os processos de urbanização em países dependentes são peculiares, posto que

inseridos num contexto de dominação pelos países do centro do capitalismo, e

expressam a dinâmica social resultante de relações capitalistas assimétricas. Processos

como este não seriam expressão de “modernização”, mas a manifestação no espaço da

acentuação das contradições sociais inerentes ao desenvolvimento determinado por uma

dependência específica no interior do sistema capitalista mundial.12

12 Castells se refere à dominação colonial, capitalista-comercial e imperialista industrial e financeira. As peculiaridades a que se refere são 1) população desenraizada, desempregada, exército de reserva de uma indústria inexistente; 2) concentração em grandes aglomerados sem integração numa rede urbana (há rede urbana no sul de Minas em transição?); 3) ausência de um continuum na hierarquia urbana; 4) distância social e cultural entre urbano e rural; 5) convivência da cidade autóctone com o que ele chama de cidade ocidental).

7

2. O grande capital urbano e a urbanização brasileira

A urbanização brasileira e o grande capital urbano, neste sentido, são os

personagens dessa transformação qualitativa na economia brasileira. É nesta cidade,

constituída em fins do século XIX, desenvolvida com os diversos planos de urbanização

dos mais variados municípios do país no início do século XX, que o capitalismo no

Brasil criou suas amarras para se constituir como sociedade brasileira. O mercado

difunde-se como meio para transpor as relações capitalistas dos centros urbanos, tanto

para as atividades rurais, como para o interior do país. Assim, a competição e o mercado

como elemento coercitivo, que garantem a superação das relações tradicionais herdadas

da colonização, emergem das novas instituições deste novo mundo urbano moderno

brasileiro. Enfim, é na ruptura com a cidade tipicamente colonial que a economia

periférica consegue alcançar aquilo que, nas palavras de Topalov (1978, p.20), podemos

chamar de “socialização capitalista das forças produtivas”.

Num processo que se acelera ao longo do século XIX, a incorporação do setor

comercial às estruturas nacionais possibilitou que as cidades passassem de simples

portos exportadores à função de centros comerciais de relevante peso. O mercado

interno cresceu, e conseqüentemente, o volume de importações e de relações

comerciais. O crescimento das cidades foi reforçado com o início da construção das

ferrovias nos anos 1850 e a mudança paulatina do mundo rural para as cidades. Emergia

um novo grupo social formado pelos fazendeiros e pelos grandes comerciantes de

importação e exportação que no meio urbano passariam a diversificar seus

investimentos: nascia o grande capital urbano.

O grande capital urbano, deste modo, sendo originário das atividades mercantis,

tendeu a estender e criar novas formas de empregar os ganhos em empreendimentos

característicos do mundo capitalista: ferrovias, bancos, empresas de serviços urbanos, e

ainda, as primeiras indústrias. É preciso salientar que com a abolição em 1888, os ativos

urbanos valorizaram-se, libertando também capital para novos investimentos. Mesmo

que subordinado e dependente das atividades mercantis, o grande capital urbano

inclinou-se a se diferenciar das atividades agrícolas e controlar importantes redes de

decisão política: era a decadência do tradicional coronel com poder local (Leal, 1975).

Esse processo de diversificação do capital se disseminou por todo o país. Capitais e

centros econômicos regionais como Salvador, Recife, Manaus, Rio de Janeiro e São

8

Paulo foram exemplos categóricos dessa expansão do capital mercantil para setores

ligados ao mundo urbano.

Contudo não foram casos isolados. Cidades que se beneficiavam de avanços

econômicos, como o caso do interior paulista, viram também transformações das formas

de investimento dos grupos locais. Os municípios, com a Constituição de 1891,

assumiam maior autonomia financeira sobre sua administração, garantindo uma

expansão vigorosa das reformas urbanas. A partir de então: “competiria ao governo

municipal decretar impostos para custeio dos seus serviços, organizar o orçamento de

sua despesa e receita, e em geral promover e zelar, conforme mais conveniente

entender, tudo o que se refere à sua vida econômica a administrativa” (Brasil, 1891,

p.6). As freguesias e paróquias, domínios administrativos da Igreja dominantes no

Brasil colonial e monárquico, abrem espaço para a ascensão definitiva dos distritos e

municípios: uma cidade com preceitos jurídicos e políticos modernos, controlada por

novos grupos sociais, e resultantes da separação entre Igreja e Estado.

Nas palavras de Emília Viotti da Costa (1999, p.256), “cresceu a tendência em

promover melhoramentos urbanos. Aumentou o interesse pelas diversões públicas, a

construção de hotéis, jardins e passeios públicos, teatros e cafés”. E como continua a

autora: “melhorou o sistema de calçamento, iluminação e abastecimento de água.

Aperfeiçoaram-se os transportes urbanos. O comércio urbano ganhou novas dimensões,

bem como o artesanato e a manufatura”. Na longa lista de atividades sob jurisdição

municipal, constavam: instrução primária, saúde pública terrestre, limpeza da cidade,

remoção e destruição do lixo, arrasamento de morros, aterro de pântanos, canalização de

rios e valas, iluminação pública, abastecimento de água, esgoto e construção de casas

para habitação de operárias e classes pobres. E, enfim, as cidades possuíam maiores

recursos financeiros e autonomia para recorrer aos empréstimos estrangeiros, como fez

o Prefeito Pereira Passos para o Distrito Federal em 1906 ou Presidente de Estado Júlio

Bueno Brandão para Minas Gerais em 1910.

Aproveitando a ampliação de recursos internos e abundância de capitais

externos, as cidades na segunda metade do século XIX procuravam vias para fomentar a

modernização. A tentativa de introduzir as novidades dos padrões de consumo e das

melhorias da infra-estrutura urbana existentes na Europa tinha maior êxito conforme a

9

riqueza das elites locais.13 Mas o grau de urbanização, isto é, de melhoramentos urbanos

e recursos materiais do município era dependente, por sua vez, do grau de conexão da

economia local com o mercado mundial: o ciclo da borracha, por exemplo, permitiu

uma rápida modernização de Belém e Manaus. O café, em especial no estado de São

Paulo, condicionou a remodelação urbana paulista, como em Santos, Campinas,

Ribeirão Preto e Araraquara entre tantos outros exemplos.14 Imponentes prédios

públicos eram erguidos, teatros luxuosos construídos, modernas linhas de bondes,

primeiramente movidos por meio da tração animal, mais tarde por eletricidade,

cortavam as ruas das cidades, que também começavam a receber iluminação pública. A

energia elétrica facilitava a instalação de fábricas mais modernas. Em síntese, a

modernização buscada pelas elites urbanas brasileiras tinha sua forma mais delineada

nos contornos modernos das cidades: a intensidade dessa modernização urbana,

entretanto, dependia dos avanços econômicos de cada região que alimentaria com

recursos a importação dos padrões de consumo tidos como mais avançados.

Por isso é possível afirmar que a transição para o século XX foi o momento em

que a urbanização tornou-se um projeto político da elite brasileira (Saes, 2010). Com os

acordos financeiros entre Campos Sales e os credores estrangeiros em 1898, abria-se um

projeto de modernização do país. Tais resultados foram vistos especialmente nas duas

primeiras décadas do século XX, quando o cenário econômico austero auxiliaria os

administradores municipais na realização dos projetos de modernização das cidades. Era

a manifestação da vitória política do grande capital urbano como condutor da política

econômica nacional. Assim tais reformas econômicas promovidas em fins do século

XX, tanto o saneamento monetário como a renegociação das dívidas estrangeiras,

facilitava a inserção brasileira no circuito dos investimentos dos países industrializados:

beneficiando-se do cenário internacional de abundância de recursos e da valorização da

13 Era uma cadeia de importação de padrões de consumo: a Belle Époque parisiense estimulava as elites latino-americanas, que reproduziam tais padrões para as elites nacionais, estas para as regionais e, finalmente, estas para as locais (Burns, 1979). A modernização tornou-se um projeto bastante amplo que atingia os países da América Latina concomitantemente quase que por completo. Entretanto o impacto desses efeitos foi desigual pelas cidades da região: capitais, cidades portuárias ou sedes de atividades econômicas eram aquelas que mais claramente apresentariam suas transformações urbanas. Rio de Janeiro, Montevidéu, Buenos Aires, Cidade do México e Santiago do Chile eram centros comerciais e políticos, incorporaram mais rapidamente as ondas de transformação (Romero, 2009). 14 Sobre a modernização das cidades paulistas: sobre São Carlos (Devescovi, 1987), Santos (Lanna, 1995), sobre Batatais (Pereira, 1999), sobre Araraquara (Vargas, 2000), sobre Ribeirão Preto (Paziani, 2004) e sobre Santa Bárbara d’Oeste, entre outras cidades, (Almeida, 2005).

10

moeda nacional – culminando com o padrão-ouro em 1906 – barateava-se o custo dos

projetos de urbanização.

O acelerado processo de urbanização em que o Brasil se engajou – como um

projeto político de transformação econômica e social liderada pela emergente elite

urbana – custaria profundas distorções na organização da sociedade brasileira. Se por

um lado o acelerado processo de modernização auxiliou na incorporação de fatores de

produção e, inclusive, na constituição de um mercado de trabalho no país, de outro lado,

ao ser condicionado por elementos estranhos à realidade nacional, tais transformações

tinham seu controle reduzido pelos grupos nacionais, assim como, não ocorrendo de

maneira minimamente homogênea, ampliava as disparidades sociais e regionais.

3. Urbanização no sul de Minas: elementos históricos

Nesse quadro de disparidades, a urbanização do sul de Minas se dá no contexto

contraditório em que a economia brasileira ainda é majoritariamente agrícola e

mercantil e, ao mesmo tempo, vê a construção do mundo urbano moderno de início do

século XX atrelado ao avanço do capitalismo nos países centrais. Esse contexto

contraditório é característico da transição, o rural atrasado como base econômica, ao

mesmo tempo estimula e limita o avanço do urbano moderno, criador de uma “vida de

cidade pequena” (Simmel, 1987, p.12) e de uma infra-estrutura básica para atender às

necessidades do capital. As condições para sua reprodução chegam, via provisão de

infra-estrutura, mas de modo limitado, respeitando os contornos impostos pela interação

entre o rural e o urbano. Aquelas cidades ou partes de cidades que não outorgam ao

capital as condições gerais de sua valorização simplesmente permanecem inexploradas

(Topalov, 1979, p.32).

Já é possível notar nas cidades do Sul de Minas em transição a produção de

valores de uso complexos e extrair delas uma “quantidade de consciência” diferente da

que a vida rural extrai. Na virada do século XIX para o XX, muitas dessas cidades

assistem à construção de praças, teatros e cinemas (Minas Gerais, 1909). Acompanham,

em certa medida, o processo de modernização que vinha ocorrendo nas maiores cidades

do país, cujo caso mais exemplar é o do Rio de Janeiro. As cidades da região, apesar de

não apresentarem um padrão demográfico muito diferente de outras regiões neste

11

período de transição, não geravam grandes efeitos úteis de aglomeração,15 nem

chegavam a constituir o conjunto frenético de impressões da metrópole, o turbilhão de

fenômenos responsável por sua diversidade (Simmel, 1987). Suas maiores cidades, no

Sul de Minas, como algo recorrente entre outras experiências, contavam entre 30 e 40

mil habitantes nessa época16 (Minas Gerais, 1909). Mantinham ainda o caráter simples

da vida mental de pequena cidade,

que descansa mais sobre relacionamentos profundamente sentidos e emocionais. Estes últimos se enraízam nas camadas mais inconscientes do psiquismo e crescem sem grande dificuldade ao ritmo constante da aquisição ininterrupta de hábitos (Simmel, 1987, p.12).

Apesar dessa mentalidade hipotética de vida de pequena cidade, as condições

para a expansão da produção capitalista vão se formando no sul de Minas: as cidades

entre final do XIX e início do XX começam a se dotar da infra-estrutura que garantirá

seu predomínio sobre o mundo rural.17 Concretamente, não é possível dissociar o

crescimento da população na região das transformações decorrentes da transição para o

século XX. Com uma população de aproximadamente de 260 mil habitantes em 1872, o

Sul de Minas em 1907 já apresentava quase 730 mil habitantes e, finalmente, mais de 1

milhão em 1920. Região que sustentava cerca de vinte por cento da população do

Estado de Minas Gerais, teve “dois grandes ciclos econômicos” que incentivaram o

crescimento urbano: uma primeira fase por conta dos circuitos de abastecimento da

Corte, e uma segunda fase, por conta da expansão econômica cafeeira.

Assim, com a ampliação das atividades econômicas e da população, nasciam os

novos municípios. Alfenas, Boa Esperança, Três Corações e Varginha, por exemplo,

faziam parte desta segunda fase de emancipação de municípios, entre as décadas de

1860 e 1880, como resultado da introdução do café na região (Anexo 1). Com a 15 Benefícios decorrentes da concentração espacial (Topalov, 1978). 16

Se considerar a comparação com São Paulo, conforme o censo de 1912, o perfil populacional das cidades do estado, de maneira geral, era muito próximo ao paulista. Em Minas Gerais encontramos apenas uma cidade com mais de cem mil habitantes (em São Paulo eram duas); quatorze cidades entre cinqüenta e cem mil habitantes (em São Paulo eram sete); e, setenta e sete cidades com população entre vinte e cinquenta mil habitantes (em São Paulo eram 52). IBGE. Annuario estatistico do Brazil 1908-1912. Rio de Janeiro: Directoria Geral de Estatistica, v. 1-3, 1916-1927. 17 Embora haja predominância do urbano, a formação da cidade é resultado de um processo histórico e não de uma geração espontânea, o que mistura o rural com o urbano, pois há permanência dos comportamentos anteriores que, se não eram urbanos, eram rurais. Assumindo aqui que o rural vem primeiro e depois o urbano. Mas é preciso atentar para o processo contrário, o rural que sai do urbano. Cf. Jacobs (2009).

12

disseminação da produção cafeeira entre os municípios do Sul de Minas, novo

movimento de formação de municípios, ainda mais vigoroso, teria início nas duas

primeiras décadas do século XX. O ano de 1911, por exemplo, seria o ano de formação

de 12 novos municípios no Sul de Minas, resultado da emancipação de antigos distritos

que cresciam e reivindicavam sua autonomia política. A região administrativa passava,

então, de 36 para 48 municípios. Por meio desta tendência de formação de novos

municípios, o Sul de Minas se destacava como uma região dinâmica na expansão das

atividades urbanas em comparação ao restante do Estado de Minas Gerais. Em 1872, a

concentração de municípios na região era de 22%, alcançando 27% na primeira década

do novecentos.18

Gráfico 1. Número de cidades e população em milhares

Sul de Minas (1872, 1907, 1912, 1920)

0

10

20

30

40

50

60

70

80

0 10 20 30 40 50

Número de cidades

Mil

hab

itan

tes 1872

1907

1912

1920

Fonte: IBGE. Annuario estatistico do Brazil 1908-1912. Rio de Janeiro: Directoria Geral de Estatistica, v.

1-3, 1916-1927.

Como indicado acima, os dados coletados nos censos demográficos, entre 1872 e

1920, indicam esse aumento significativo do número de cidades no Sul de Minas, isto é,

novas cidades se formam ou se desmembram de outras já existentes ao longo do

período. Mas, ainda mais importante é considerar que, apesar da população aumentar

em várias dessas cidades, o que indica um processo de expansão urbana em curso, foi

mantido na região um padrão de formação de cidades medianas. Como é possível

observar no gráfico abaixo, as cidades para todos os censos permanecem sem grande

disparidade entre suas populações. Mas mais importante, ao que parece, mesmo com

18 IBGE. Annuario estatistico do Brazil 1908-1912. Rio de Janeiro: Directoria Geral de Estatistica, v. 1-3, 1916-1927.

13

uma ligeira expansão populacional, estes municípios medianos não constituíam vidas

efetivamente urbanas.

Seguindo a classificação tomada por Yves Leloup, o Sul de Minas em 1920 não

teria nenhuma cidade (como núcleo urbano) com mais de 20 mil habitantes. Para o

autor, o núcleo urbano do município era a população total deste menos os cidadãos

referentes aos distritos, e ainda, considerar apenas como centros urbanos, as sedes de

cidades que apresentariam mais do que cinco mil habitantes. Em suma, apesar de 48

municípios, segundo o critério de Leloup, o Sul de Minas teria em 1920, apenas 5

cidades com população entre sete e doze mil habitantes, outras 4 entre cinco e sete mil

habitantes e, finalmente, mais três entre quatro e cinco mil habitantes (Leloup, 1970).

Diferentemente da Zona da Mata com Juiz de Fora, da área central a partir da década de

1920 com Belo Horizonte e de Teófilo Otoni para o Vale do Mucuri, a região do Sul de

Minas seria marcada por uma profunda fragmentação de sua população em cidades

pequenas e medianas, sem um centro irradiador das atividades econômicas.

Ainda que sem a criação de uma grande cidade irradiadora de dinamismo, o

crescimento populacional e a concentração de municípios na região foram

acompanhados por mudanças qualitativas na infra-estrutura urbana. Como vimos, a

constituição de 1891, ao outorgar maior autonomia financeira aos municípios, fomentou

a tendência de aumento nos investimentos em melhorias urbanas (Costa, 1999). Em

Minas Gerais, particularmente, a lei n.546, de 27 de setembro de 1910, garantia

empréstimos do Estado para melhoramentos urbanos (Minas Gerais, 1914). Esse

movimento regional em compasso com o movimento nacional atesta a existência de um

projeto político mineiro que passava pela proposta de valorização do mundo urbano

encabeçado pelo Estado, e que era seguido à risca pelas cidades do Sul de Minas.

Costa (1999) diz que, nesse contexto de preocupação governamental com o

urbano, foi estimulada a construção de hotéis, jardins, teatros, cafés e destaca as

melhorias nos sistemas de calçamento, iluminação, transportes e abastecimento de água.

Essas seriam, portanto, características que indicariam certo processo de urbanização. É

o que também diz Wirth para o caso de Minas Gerais (1982, p.93):

A predominância da cidade, especialmente da grande cidade, poderá ser encarada como uma conseqüência da concentração, em cidades, de instalações, e atividades industriais e comerciais, financeiras e administrativas, de linhas de transporte e comunicação e de equipamento cultural e recreativo como a

14

imprensa, estações de rádio, teatros, bibliotecas, museus, salas de concerto, óperas, hospitais, instituições educacionais superiores, centros de pesquisa e publicação, organizações profissionais e instituições religiosas e beneficentes.

Se tomarmos as descrições do anuário histórico-corográfico de Minas Gerais de

1909 para as cidades do sul de estado podemos vislumbrar justamente esse processo.

Vejamos o caso de Campanha, município com mais ou menos 20 mil habitantes em

1900. O anuário (1909, p.295-6; p.303) destaca o teatro, a biblioteca, os hotéis, o

abastecimento de água, o serviço de correios e a ampla cadeia pública:

A cidade possui um hospital de caridade (...); uma praça de mercado, boa iluminação pública, o Colégio Sion, o Noviciado dos Padres Jesuítas, teatro, uma excelente biblioteca pública, 5.000 volumes (...), estação férrea da Cia Muzambinho, cemitério público, vários templos e prédios excelentes (...). Há na cidade regular suprimento de água para as necessidades da população, sendo proveniente de fontes públicas e particulares, cisternas, etc. A municipalidade possui um encanamento, obra de valor, e que hoje não se faria com poucas centenas de contos, e que é destinado a trazer água aos pontos mais elevados da Campanha. (...) Foi criada a diocese de Campanha por decreto pontifício de 8 de setembro de 1907. (...) Publica-se na cidade a mais velha das folhas do Estado, o ‘Monitor Sul Mineiro’, com 35 anos de existência. (...) A sub-administração dos Correios da Campanha compreende todas as agências postais do sul e sudoeste do Estado de Minas. (...) O teatro São Cândido existente na cidade foi reconstruído em 1907. (,,,) A cadeia de Campanha é uma das melhores de Minas e tem capacidade para guardar 100 presos.

Itajubá, uma das cidades mais prósperas do Sul de Minas à época, com uma

população de mais de 40 mil habitantes, já contava com a energia elétrica, que

impulsionava o dinamismo do município. Diz o mesmo anuário (1909, pp.518-23) sobre

a cidade:

A cidade de Itajubá (...) é iluminada à luz elétrica, instalada a 12 de janeiro de 1907, com grandes festejos populares, e por iniciativa da Câmara Municipal presidida pelo farmacêutico sr. José Manso Pereira Cabral. (...) Possui a cidade um Instituto de Educação secundária equiparado ao Ginásio Nacional. Itajubá tem três igrejas (...). Tem o lugar um cemitério que era pequeno, mas que vem sendo aumentado (...) Contava a cidade cerca de 450 casas, das quais 59, seguramente, feitas nos últimos 10 anos; tem um bom teatro com o nome de Santa Cecília (...), uma cadeia com acomodações para 20 presos, tendo no pavimento superior sala para as sessões do júri e da municipalidade; uma

15

praça de mercado (...), pretendendo-se substituí-la por um edifício melhor (...), tinha banda de música boa (...) As ruas são bem calçadas (...) Nos subúrbios da cidade existem fontes de água boa, havendo em diversas casas cisternas. (...) Em 1884, fora fundada na cidade, a Biblioteca Machado de Assis (...) Havia então na cidade uma “Sociedade Dramática”, a loja maçônica “Deus e Humanidade”, 2 tipografias, colégios, fábricas e outros melhoramentos locais”.

Pouso Alegre também contava com energia elétrica desde 1907 e tinha, segundo

o anuário, o melhor teatro do sul de Minas, com capacidade para quase 1000 pessoas.

Era sede da diocese, com uma catedral para cerca de 3000 pessoas, e, em 1904, havia

sido inaugurado o Ginásio Nacional, com cursos superiores de medicina, direito,

engenharia, seminário maior, farmácia e odontologia (Minas Gerais, 1909, pp.844-58).

Interessante notar a referência às mudanças ocorridas na cidade após a proclamação da

República:

Depois da República, foi grande a transformação material e moral operada em Pouso Alegre: a comarca subiu de entrância, criou-se a diocese católica, fundaram-se seminário, catedral, colégios e fábricas; apareceram jornais novos, foi instalada a iluminação elétrica, e estendeu-se por maior área a cidade (Minas Gerais, 1909, pp.845-6).

De maneira geral, é recorrente a presença de teatros, praças, igrejas, hospitais,

colégios, ferrovias e bondes, hotéis, calçamento, iluminação pública e outras

características citadinas nas descrições das cidades sul-mineiras apresentadas no

documento. Apesar do caráter impressionista de muitas dessas descrições, elas são

ilustrativas do processo de urbanização que estava em curso na região combinado com o

avanço da indústria, das ferrovias e dos bancos (Saes, Cosentino, Gambi, 2012).

Mas afinal, qual é o impacto da formação de suposto novo mundo urbano na

construção das relações capitalistas no Sul de Minas? As mudanças quantitativas e

qualitativas apontadas acima indicam o fortalecimento do mundo urbano, das atividades

comerciais citadinas, e da necessidade de construção de aparatos políticos que

sustentassem os municípios. Portanto, a urbanização de transição para o século XX

possui um significado ainda mais particular do que aquele presente nos sinais de

modernidade existentes nas origens de Minas Gerais, de sua “vocação urbana” (Paula,

2007, p.42). Apesar de a Província durante os séculos XVIII e XIX ser “a região mais

urbanizada e populosa do Brasil”, com níveis de urbanização e dinâmica demográfica

que poderia ser ressaltada em comparação com o padrão urbano do conjunto do Novo

16

Mundo e da Europa (Paula, 2007, p.39), isto não garantia a superação das amarras

escravistas e coloniais na construção de um mercado interno pleno.

Essas condições emergiam na construção do mundo urbano moderno de início

do século XX, permeado pela crescente monetarização das atividades econômicas, pela

incorporação das técnicas e padrões de consumo modernos, resultantes da Segunda

Revolução Industrial. O crescimento do número de cidades e de suas populações, a

formação da malha ferroviária e a formação de bancos e indústrias indicam que a região

seguia os rumos da integração da economia brasileira com o mercado externo,

internalizando as relações capitalistas para seu território.

Mas o que permite considerar o Sul de Minas com essa dinâmica própria, e por

isso, pensar em sua regionalização e urbanização, é uma certa homogeneidade no perfil

das cidades e a intensidade das transformações econômicas do período. A região, não há

dúvidas, integrou-se no mercado capitalista nacional, mas diferentemente da Zona da

Mata e Central, não conseguiu criar uma plena hierarquização de suas cidades.

Permaneceu com um perfil citadino muito próximo: pequenas e medianas cidades,

mercados consumidores restritos e, conseqüentemente, atividades econômicas de caráter

local. Por isso um grande número de indústrias, mas pequenas. Por isso um grande

número de bancos, mas também pequenos. Assim, as relações econômicas capitalistas

avançavam, mas vagarosamente (e com uma intensidade limitada).

Considerações finais: entre o grande capital urbano e o Estado

Os processos de urbanização das cidades brasileiras na passagem para o século

XX assumem características distintas. As capitais, maiores cidades do país,

impulsionadas pelas possibilidades de investimento que se abriam com a abolição da

escravidão, experimentaram concretamente o transbordamento do capital mercantil para

atividades relacionadas ao mundo urbano. O Brasil, nessa época, vivia sua belle époque.

O grande capital urbano cumpria o seu papel na dinamização da economia nacional ao

promover as condições de produção e circulação de mercadorias e de reprodução da

força de trabalho necessárias ao funcionamento de uma economia capitalista. Em outras

palavras, é ele quem garantirá a necessária socialização capitalista das forças

produtivas.

No interior, as cidades que se beneficiavam dos avanços econômicos do país

também se transformavam, ainda que de modo limitado. Cidades do interior mineiro e

17

paulista viram a chegada da modernização por meio do investimento na construção de

teatros, cafés, hotéis, praças e calçamento de ruas, e no fornecimento de iluminação,

água e transportes. Mas será que no interior havia espaço para um grande capital

urbano? As cidades do interior, e especificamente do Sul de Minas, ofereceriam

rentabilidade suficiente para incentivar o investimento desse capital nos melhoramentos

urbanos?

Na literatura sobre a industrialização e urbanização de São Paulo foi formulado

o conceito do grande capital cafeeiro, aquele formado na origem pelos grandes

fazendeiros que diversificavam seus investimentos em ferrovias, bancos e empresas de

serviços públicos. Neste trabalho estendemos o conceito acreditando que diferentes

elites regionais, oriundas de diferentes negócios, seguiram os mesmos percursos de

investimentos dos fazendeiros paulistas, formando o grande capital urbano (Silva, 1976;

Saes, 1986 e Kugelmas, 1986).

É na mistura do urbano com o rural que as cidades do sul de Minas vão

promovendo sua transição para o capitalismo. A partir das idéias de transição e

urbanização, podemos pensar em cidades formadas espontaneamente por processos

históricos ou em cidades, embora inicialmente formadas de modo espontâneo,

construídas tendo em vista as necessidades do capital. A criação da infra-estrutura

urbana é um fato no sul de Minas na passagem do século XIX para o XX. Mas será que

podemos distinguir aqui a atuação do grande capital urbano? A urbanização do sul de

Minas em transição pode ser pensada como um transbordamento do café? Qual a

relação dela com o capital cafeeiro ou com o grande capital urbano?

Além disso, uma das contradições da urbanização capitalista é de que o capital

não produz certos valores de uso complexos necessários à acumulação. Assim, abre-se

também um espaço para os investimentos do setor público no provimento da infra-

estrutura urbana. A constituição de 1891 e a lei estadual de 1910 incentivavam os

municípios a fazerem tais investimentos. Qual a participação e a intenção do Estado na

construção dos melhoramentos urbanos? Em síntese, como se deu o financiamento da

urbanização sul-mineira?

O financiamento privado da infra-estrutura urbana só será feito onde houver

atividades econômicas que irão utilizar essa infra-estrutura, quer dizer, onde houver

rentabilidade suficiente para o capital. Como vimos, as cidades do Sul de Minas

receberam melhoramentos urbanos. Se o grande capital urbano os financiou, é porque

18

essas cidades podem ser vistas como espaços geradores de rentabilidade para o capital.

No entanto, o seu tamanho e seu desenvolvimento posterior nos levam a considerar

limitada a acumulação de capital gerada nessas cidades. Por isso, o investimento

público deve ter tido papel importante nesse processo. O Sul de Minas não era, de modo

algum, uma região inexplorada pelo capital, pois lhe oferecia condições para sua

valorização. Mas era, sem dúvida, uma exploração limitada, suficiente para fazer

avançar as relações capitalistas até certo ponto. A pesquisa sobre o padrão de

financiamento da urbanização sul-mineira pode ajudar na explicação da dinâmica

econômica regional posterior e a entender um processo que talvez tenha ficado a meio

passo, entre o grande capital urbano e o Estado, entre a modernidade e o atraso relativo.

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21

ANEXO 1

População total, imigrantes, área cultivada total e de café e pés de café em 1920

Total da área cultivada (ha)

Área cultivada de café (ha)

Pés de café Imigrantes População

total Aiuruoca 4.193 119 89.605 254 31.963 Alfenas 5.258 1.723 1.292.200 502 28.434 Arceburgo 5.724 4.672 3.504.366 808 6.645 Areado 2.862 1.396 1.047.150 247 10.261 Baependi 2.877 650 487.800 144 20.680 Boa Esperança 5.962 1.375 1.031.250 136 22.348 Cabo Verde 6.387 3.560 2.669.983 258 19.425 Caldas 6.840 539 404.551 287 28.951 Cambuí 8.341 768 576.332 82 25.252 Cambuquira 1.343 99 74.300 169 7.744 Campanha 3.378 1.698 1.273.200 208 12.367 Campestre 5.330 2.742 2.056.600 137 15.254 Campos Gerais 5.892 1.262 946.200 168 21.810 Carmo do Rio Claro 4.661 1.283 962.283 248 17.729 Cássia 3.590 1.725 1.293.966 486 31.596 Caxambu 545 33 24.400 371 12.079 Conceição do Rio Verde 1.414 354 265.800 121 6.258 Cristina 4.639 52 39.216 157 18.445 Elói Mendes 8.276 5.522 4.343.866 198 13.138 Extrema 8.847 1.398 1.045.478 290 8.919 Guaranésia 12.724 10.024 7.310.800 1991 25.135 Guaxupé 10.846 7.020 5.309.833 1649 16.701 Itajubá 12.754 1.490 1.117.800 588 45.259 Jacuí 2.078 745 658.400 96 10.341 Jaguary 21.524 639 479.200 146 27.584 Jacutinga 14.603 11.084 8.313.250 2230 20.615 Lambari 1.876 36 27.199 222 9.025 Machado 14.569 10.127 7.595.133 658 29.357 Maria da Fé 1.724 3 2.599 169 7.770 Monte Santo 27.241 21.670 16.252.866 1806 30.570 Muzambinho 12.043 5.384 4.037.733 857 33.985 Ouro fino 22.513 8.930 6.697.570 2274 48.467 Paraguaçu 3.860 3.397 2.547.799 134 10.546 Paraisópolis 31.113 3.314 2.485.399 155 60.817 Passa Quatro 774 8 6.175 195 9.648 Passos 4.118 1.480 1.109.900 547 31.815 Poços de Caldas 1.572 1.022 766.700 2017 14.587 Pouso Alegre 29.347 1.685 1.263.800 605 67.401 Pouso Alto 3.283 137 102.600 302 22.770 Sta Rita do Sapucaí 11.165 4.438 3.328.199 333 16 595 S. G. do Sapucaí 5.561 1.298 973.171 226 25.865 S. Jose dos Botelhos 4.345 2.245 1.683.800 221 10.793 S. S. do Paraíso 23.046 19.653 14.739.633 1854 37.537 Silvianopolis 10.152 756 567.199 65 20.764 Três Corações 1.826 518 388700 336 12.262

22

(Fonte: Minas segundo o recenseamento de 1920. Belo Horizonte: Secretaria da Agricultura, 1924)

Três Pontas 5.689 4.125 3.094.116 507 19.979 Varginha 7.684 5.859 4.394.600 1030 22.457 Virgínia 4.789 9 7.000 29 9.791 Total 399.178 158.066 118.689.720 26513 1.057.734