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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA E SUA RELAÇÃO COM A LIBERDADE E A INTEGRIDADE GILBERTO MANOEL DE SOUZA Itajaí, maio de 2007

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA E SUA RELAÇÃO COM A LIBERDADE E A INTEGRIDADE

GILBERTO MANOEL DE SOUZA

Itajaí, maio de 2007

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA E SUA RELAÇÃO COM A LIBERDADE E A INTEGRIDADE

GILBERTO MANOEL DE SOUZA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. MSc.Clovis Demarchi

Itajaí, maio de 2007

AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus, pelo dom da

vida; aos meus pais, Joel e Salete, que são o

início de tudo e fonte de inspiração, minha irmã

Josiane; ao meu irmão Josiel, enfim à minha

família pela compreensão e alento nos momentos

mais difíceis; a minha noiva Larissa, e em

especial, ao Professor MSc. Clovis Demarchi, que

marcou minha caminha nesta universidade.

DEDICATÓRIA

Dedico à todas as pessoas que fazem parte da minha vida, e à todas que sempre me auxiliaram e

auxiliam até os dias de hoje, não medindo esforços para contribuir no meu crescimento

profissional, afetivo e espiritual.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC) ,maio de 2007

Gilberto Manoel de Souza Graduando

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de

Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo

graduando Gilberto Manoel de Souza, sob o título o Princípio da Dignidade

Humana e sua relação com a Liberdade e a Integridade, foi submetida em

29 de maio de 2007 à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: MSc Geremias Moretto e MSc Josemar Sidnei Soares, e

aprovado com a nota 9,5 (nove virgula cinco).

Itajaí, maio de 2007

Professor MSc Clovis Demarchi Orientador e Presidente da Banca

Professor MSc Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

SUMÁRIO

RESUMO.......................................................................................... VII

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 4

CONSIDERAÇÕES SOBRE PRINCIPIOS E REGRAS...................... 4 1.1 SISTEMA NORMATIVO ...................................................................................8 1.2 PRINCÍPIOS E REGRAS................................................................................11 1.2.1 Os valores na constituição........................................................................15 1.2.2 Conceito de Princípio ................................................................................17 1.2.3 Conceito de Regras....................................................................................18 1.2.4 Conflito entre princípios e regras.............................................................19

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 23

DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA................ 23 2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS..........................................................................23 2.2 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988............30 2.3 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ELEMENTOS CONSTITUTIVOS.......33 2.4 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LIBERDADE ................................34 2.5 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE .37 2.6 A INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO ...................................................40 2.7 O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL..........................................48

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 51

A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL................................................... 51 3.1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LIBERDADE.............................51 3.1.1 Liberdade de expressão versus racismo.................................................52 3.1.2 Liberdade de informação versus dignidade humana..............................56 3.2 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE .58 3.2.1 Direito à saúde ...........................................................................................59 3.2.2 Amparo ao portador de deficiência e idoso.............................................62

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 63

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 66

RESUMO

A presente Monografia tem como objeto a análise do

Principio da Dignidade Humana e a sua relação com a idéia de liberdade e

integridade com base em decisões do Supremo Tribunal Federal. O seu objetivo é

analisar a posição do Supremo Tribunal Federal nas questões que envolvem o

Princípio da Dignidade da Pessoa Humana no que tange a idéia de liberdade e

integridade. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, uma discussão sobre a idéia

de princípio, analisa-se a organização normativa do Direito brasileiro. No Capítulo

2, trata-se de analisar o principio da Dignidade da Pessoa Humana nos seus

aspectos gerais. No Capítulo 3, trata de fazer uma análise breve de algumas

decisões do Supremo Tribunal Federal no que tange a relação com a idéia de

liberdade e com integridade. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com

as Considerações Finais. Quanto à Metodologia empregada o relato dos

resultados é composto na base lógica Indutiva.Nas diversas fases da Pesquisa,

foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito

Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

Palavras chave: Princípio. Dignidade da Pessoa Humana. Liberdade.

Integridade.

INTRODUÇÃO

Dentre os Direitos sempre existiu uma celeuma

doutrinária acerca daquele que seria, de fato, o núcleo central, o direito

essencial, o princípio do mundo jurídico, o princípio dos princípios ou

princípio máximo, ao qual todos os demais deveriam curvar-se em sua

compreensão e aplicação.

Tratar-se-ia de indicar o princípio a prevalecer no caso

de conflitos com outros princípios ou direito.

Hodiernamente, os doutrinadores convergem em seus

pensamentos, considerando que o princípio da dignidade humana é o

princípio fundamental do direito, que faz com que todos os outros a ele

devam obediência.

Com base neste pressuposto, a presente Monografia

tem como objeto a análise do Principio da Dignidade Humana e a sua

relação com a idéia de liberdade e integridade com base em decisões do

Supremo Tribunal Federal.

O seu objetivo é analisar a posição do Supremo

Tribunal Federal nas questões que envolvem o Princípio da Dignidade da

Pessoa Humana no que tange a idéia de liberdade e integridade.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, uma discussão

sobre a idéia de princípio, analisando a organização normativa do Direito

brasileiro, finalizando com a idéia de norma como gênero que possui os

princípios e as regras como espécies.

No Capítulo 2, tratando de analisar o principio da

Dignidade da Pessoa Humana nos seus aspectos gerais, observando a sua

2

previsão constitucional, bem como os seus elementos constitutivos, para

em seguida relacioná-lo com as idéias de liberdade e de integridade. Ao

final do capítulo se faz uma breve análise da função do Supremo Tribunal

Federal.

No Capítulo 3, tratando de fazer uma análise breve de

algumas decisões do Supremo Tribunal Federal no que tange a relação

com a idéia de liberdade e com integridade. Para isso, analisaram-se seis

decisões.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das

reflexões sobre o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Para a presente monografia foram levantadas as

seguintes hipóteses:

a) O princípio é uma norma jurídica geral e as regras ou

preceitos são as normas particulares, dotadas de menor generalidade, que,

no entanto, assim como os princípios, apresentam caráter de

normatividade, a impor condutas.

b) A Dignidade da Pessoa humana nasce com ela. É

inata, e inerente à sua essência. A Pessoa Humana já nasce com

integridade física e psíquica, mas que com o seu desenvolvimento aspectos

de sua personalidade têm de ser respeitados, tais como seu pensamento,

suas ações e seu comportamento, e isso implica no respeito à sua

liberdade, imagem, intimidade e consciência.

c) Considerando o significado dado pela Constituição à

dignidade da pessoa humana e aos direitos da personalidade, o Supremo

Tribunal Federal deve limitar a liberdade de expressão e de informação.

3

d) O que fera a integridade da pessoa humana é

incompatível com a sua dignidade, por isso, o Supremo Tribunal Federal

deve afastar qualquer ameaça a integridade da Pessoa.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na

Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de

Tratamento de Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados

expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da

Pesquisa Bibliográfica7.

1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101.

2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104.

3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

4 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 62.

5 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 31.

6 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 45.

7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luis. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 239.

CAPÍTULO 1

CONSIDERAÇÕES SOBRE PRINCIPIOS E REGRAS

Neste primeiro capítulo o objetivo da presente

monografia é discutir sobre os princípios constitucionais, no seu aspecto

geral. Observa-se que Paulo Napoleão Nogueira da Silva8, diz que

Genericamente, os princípios constitucionais estão contidos em duas

grandes divisões: os expressos e os implícitos.

Sendo que os expressos são os positivados em letra de

forma e os implícitos são os que não estão positivados, mas encontram-se

contidos nas ‘entrelinhas’ da Constituição: são os corolários9 lógicos do que

está expresso, ou então serão decorrentes do próprio conjunto

constitucional considerado como um todo homogêneo.

Seria inócuo exemplificar os princípios expressos, tão

numerosos são. Quanto aos princípios implícitos, basta verificar o exemplo

contido no art. 5º, LIII: “ninguém será processado nem sentenciado senão

pela autoridade competente”.

Essa afirmação traz nas suas entrelinhas a indagação

acerca de qual será essa autoridade competente. Em resposta, cria-se todo

um arcabouço jurídico, determinando a estrutura do Poder Judiciário.

Assim, também, o disposto pelo inciso LIV: “Ninguém

será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

8 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. 3 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2003, p. 108. 9 Adj. 1. Afirmação que se retira de uma verdade já demonstrada. 2. Conseqüência natural e

evidente; dedução. MINIDICIONÁRIO Escolar Língua Portuguesa. São Paulo: DCL, 2006. p. 195

5

A questão decorrente, óbvia, procurará definir qual será

o devido processo legal. Igualmente, em resposta a essa indagação, cria-se

todo um outro arcabouço jurídico-processual.

Quanto aos princípios constitucionais André Ramos

Tavares10, nos enfatiza seu entendimento sobre o assunto:

Os princípios constitucionais são normas presentes na Constituição que se aplicam às demais normas constitucionais. Isso porque são dotados de grande abstratividade, e têm por objetivo justamente imprimir determinado significado às demais normas. Daí resulta o que se denomina sistema constitucional,que impõe a consideração da Constituição como um todo coeso de normas que se relacionam entre si (unidade da Constituição). Os princípios constitucionais, portanto servem de vetores para a interpretação válida da Constituição.

Paulo Napoleão Nogueira da Silva11, além de classificar

os princípios constitucionais em expressos e implícitos, também os em

gerais e fundamentais.

Os princípios gerais pertencem ao Direito Constitucional

geral, isto é, ao Direito Constitucional como ciência universal. São

científicos, doutrinários. Podem ser aplicados, e o são, por qualquer ordem

estatal. Contêm postulados óbvios, unânimes e universalmente

compreendidos e aceitos, mantendo estreita ligação com a Ética, a Moral, e

a Lógica Jurídica.

Como lembra José Afonso da Silva12, pertencem aos

princípios gerais os critérios de classificação das constituições, uns

10 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito ConstitucionaL. 3 ed., São Paulo:. Saraiva, 2006.

p. 99 11 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. p. 108. 12 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo : Editora Revista

dos Tribunais, 1989..

6

doutrinários e conceituais, os de sua flexibilidade e rigidez, o da supremacia

constitucional, os relativos ao Poder Constituinte originário e derivado, e

outros. Ainda mais, destacam-se as questões da diferença entre matéria

constitucional e matéria ordinária, garantia de independência para a função

judicante, e a homogeneidade que deve haver no sistema formado pelo

conjunto de uma Constituição.

Os princípios fundamentais são os que, sem excluírem

os gerais ou com estes colidirem, apresentam-se particulares a cada ordem

estatal, ou seja, os que “explicitam as valorações políticas fundamentais do

legislador constituinte”13

Assim, em mera exemplificação, são fundamentais os

princípios que estabelecem a forma do Estado, o regime político, o sistema

de governo, o alcance dos direitos e garantias individuais.

Pinto Ferreira14 os denomina “princípios essenciais”.

José Afonso da Silva15 os qualifica como “normas-síntese”, ou “normas-

matrizes”.

É irrelevante qualquer denominação que se lhes dê,

bastando a caracterização de que traduzem a regra jurídica da escolha

política do Poder Constituinte.

Para além dos princípios fundamentais, com menor

importância do que estes, mas logicamente decorrentes desses próprios

princípios fundamentais, é possível detectar duas de suas espécies, às

13 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. p. 109. 14 FERREIRA, Pinto. Curso de direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1991. 15 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo : Editora Revista

dos Tribunais, 1989.

7

quais José Afonso da Silva16 denomina adequadamente de “princípios

sensíveis”, e “princípios estabelecidos”.

Os princípios constitucionais sensíveis serão aqueles

implícita e inquestionavelmente indicados pela Constituição. Sua violação

importa em imediata dir-se-ia automática reação. Exemplos dessa espécie

são os princípios contidos no art. 34, VII, da Constituição brasileira: se

contrariados, provocam a intervenção federal nos Estados.

Quanto aos princípios constitucionais estabelecidos,

são em certa medida particulares ao sistema brasileiro: no sistema

federativo brasileiro, os princípios constitucionais estabelecidos são aqueles

que limitam a autonomia organizatória dos Estados e municípios, isto é,

revelam previamente a forma de sua organização política. Social e

econômica.

Assim, uma vez que o mandato das Mesas do

Congresso Nacional é de dois anos, esse princípio serve como norteador

da mesma matéria em relação às Assembléias Legislativas e às Câmaras

Municipais. Conseqüentemente, as Mesas desses órgãos poderão ter

mandato de até dois anos, e não mais; e isto, porque é princípio

constitucional estabelecido que as Mesas do Poder Legislativo em qualquer

nível só poderão ter mandato máximo de dois anos, uma vez que assim o é

no modelo estampado em relação ao Poder Legislativo da União.17

Em precedência àqueles, destaca-se uma categoria

especialíssima em princípios constitucionais, aos quais denominamos

“essenciais”: são os que na Constituição brasileira estão declinadas no seu

Preâmbulo. Afinal, se um dos ditames da hermenêutica jurídica – e

constitucional – é aferir a intenção do legislador, e conseqüentemente do 16 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo : Editora Revista

dos Tribunais, 1989. 17 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. p. 110.

8

legislador constituinte, o Preâmbulo estabelece essa intenção em matéria

constitucional; logo, o disposto preambularmente ao texto, não pode ser

contrariado por qualquer ato, sob pena de inconstitucionalidade. 18

É certa, na sua maior parte a doutrina e a jurisprudência

ainda não se deram conta da importância do Preâmbulo. E isto, por uma

razão inconsistente e insustentável, mas que decorre, ainda uma vez, da

cultura positivista: o Preâmbulo não contém enumeração! Mas, é óbvio que

suas disposições têm – e isso deve ser reconhecido – natureza jurídica.

1.1 SISTEMA NORMATIVO

Para Nagib Slaibi Filho19 a Constituição, quanto aos

demais textos legislativos, deles se diferenciam pelo caráter de supremacia,

mas a eles se iguala porque também, como eles, integram um sistema

normativo.

Neste sentido, José Joaquim Gomes Canotilho20 afirma

que o sistema jurídico do Estado Democrático de Direito é um sistema

normativo aberto de regras e princípios.

É um sistema aberto, porque é dinâmico e receptivo às

influências externas. Nesse aspecto menciona-se a visão positivista a

limitar o mundo jurídico ao texto legal, como entendimento de Hans

Kelsen21 a considerar o sistema normativo como um sistema piramidal de

normas jurídicas positivas.

18 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de Direito Constitucional. p. 110. 19 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 67 20 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6 ed. Coimbra: Almeida, 1993. p.

70 21 Apud, SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 67

9

Outros, entre os quais Luhman,22 visualizam o sistema

normativo como um sistema circular e continuo, de criação que não se

esgota no momento da edição do texto, em que cada elemento recebe a

sua qualidade normativa de um outro elemento, sem que se possa falar em

idéia de prioridade ou de preferência.

A norma constitucional, elemento de um sistema

dinâmica, interage com todo o sistema, dispondo, até mesmo, de uma

capacidade de aprendizagem para realizar, a cada momento, os

significados de outras normas sejam consentâneos com a realidade fática.

É um sistema normativo, porque a estruturação das

expectativas do poder constituinte, referentes aos valores, programas,

funções e pessoas, é feita através de normas jurídicas, a expressar os

comandos políticos que conduziram à sua elaboração; porque comandos

dotados de politicidade, de tal gênese vai decorrer o seu caráter de

essencialidade e mutabilidade.

É um sistema de regras (ou preceitos) e princípios,

porque as normas do sistema tanto podem revelar-se através de princípios,

como sob a forma de regras. 23

Dos princípios decorrem as regras, estas dotadas de

menor generalidade, mas secundárias aos princípios que fecundam o seu

conteúdo normativo.24

André Ramos Tavares25 considera, quanto ao Sistema

Normativo, que o conjunto de normas constitucionais formam um sistema,

que no caso é, necessariamente, harmônico, ordenado, coeso, por força da

22 Apud, SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 67 23 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 67 24 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 68 25 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito ConstitucionaL. p. 98.

10

supremacia constitucional, que impede o intérprete de admitir qualquer

contradição interna.

No caso constitucional, invoca-se a idéia de ordem,

podendo-se aproveitar a lição de Norberto Bobbio26, quando afirma:

Para que se possa falar em ordem é necessário que os entes que a constituem não estejam somente em relacionamento com o todo, mas também num relacionamento de coerência entre si. Quando nos perguntamos se um ordenamento jurídico constitui um sistema, nos perguntamos se as normas que o compõem estão num relacionamento de coerência entre si, e em que condições é possível essa relação.

O sistema constitucional, contudo, é aberto

encontrando-se em constante evolução, tendo em vista o contato com a

realidade social, o que ocorre especialmente pelos valores albergados

constitucionalmente.

Do ponto de vista estritamente normativo, pode-se

considerar o sistema constitucional como um somatório de normas. Foi

recentemente que se assumiu a existência de uma categoria geral, um

gênero, que são justamente as normas27.

Desdobram-se as normas em duas espécies: as regras

e os princípios. Estas duas espécies passam a ser espécies do gênero

26 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10 ed. Brasília: UNB, 1999. p. 71. 27 Tenha-se presente que: “Deve distinguir-se entre enunciado (formulação, disposição) da norma

e norma. A formulação da norma é qualquer enunciado que faz parte de um texto normativo (de ‘uma fonte de direito’). Norma é o sentido ou significado adscrito a qualquer disposição (ou fragmento de disposição, combinação de disposição de fragmentos de disposições). Disposição é parte de um texto ainda a interpretar; norma é parte de um texto interpretado” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. p. 203)

11

norma28. Esta é a classificação que se adota também nesta presente

monografia.

1.2 PRINCÍPIOS E REGRAS

No entendimento de Nagib Slaibi Filho29 princípios e

regras ou preceito assim dispõe: “As normas podem conduzir a princípios e

a regras ou preceitos”.

O princípio é toda norma jurídica, enquanto considerada

como determinante de uma ou de muitas outras subordinadas, que a

pressupõem, desenvolvendo e especificando ulteriormente o preceito em

direções mais particulares (menos gerais), das quais determinam e,

portanto, resumem, potencialmente, o conteúdo: sejam, pois, estas

efetivamente postas, sejam, ao contrario, apenas dedutíveis do respectivo

princípio geral que as contem. “ [...] os princípios estão para as normas

particulares como o mais está para o menos, como o que é anterior e

antecedente está para o posterior e conseqüente”30.

Já as regras ou preceitos são as normas particulares,

dotadas de menor generalidade, que, no entanto, assim como os princípios,

apresentam caráter de normatividade, a impor condutas.

É regra ou preceito a norma que se extrai do disposto

nos art. 226, § 6º CF/88, in fine, de que o divorcio direto somente pode se

dar após a comprovada separação de fato por dois anos.

28 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional., p. 166-168. ; BONAVIDES,

Paulo. Curso de Direito Constitucional. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 243; ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002. p. 83.

29 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 65 30 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 96.

12

De um mesmo dispositivo, podem-se extrair princípios e

regras; v.g., do disposto no art. 45, § 1º, extrai-se o princípio de que o

numero de deputados federais em cada entidade federativa é estabelecido

proporcionalmente à população, e a regra ou preceito de que o maior

Estado contará, no máximo, com 70 deputados.

Não se pense que os princípios, pela baixa densidade

normativa, como, v.g., homem e mulheres são iguais em direitos e

obrigações, nos termos desta31 Constituição. O principio tem a sua força

normativa, pois tal força é inerente a todas as normas constitucionais.

Como espécies de normas, princípios e regras não

perdem o seu caráter de ato de poder, e, em se tratando de norma

constitucional, da imperatividade decorrente da supremacia que orna e

justifica a existência da Constituição como ato de vontade do titular da

soberania, o povo.

Dos princípios decorrem as regras, estas dotadas

de menor generalidade, mas secundárias aos princípios que fecundaram o

seu conteúdo normativo.

Os princípios têm alto grau de generalidade, as regras

grau relativamente menor de generalidade. 32

De acordo com o grau de generalidade, classificam-se

as normas em princípios e regras; e aqueles podem oferecer diferentes

patamares, a começar pelos: princípios estruturantes no dizer de José

Joaquim Gomes Canotilho,33 também denominados, na Constituição de

1988, como princípios fundamentais (os encontrados no Título I, aliás, com

31 Veja-se a criticável redação do dispositivo, ao se referir a “esta constituição”. Por acaso, poderia

se referir a outra constituição? 32 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. p.249. 33 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. p.78

13

esta denominação); a seguir os princípios gerais, mas específicos, como

aqueles referidos no caput do art. 37, a reger a Administração Pública

(legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência) até

chegar aos princípios especiais, regentes de setores mais específicos

(como, por exemplo, aqueles concernentes à licitação, descritos no art. 37,

XXI da constituição da República Federativa do Brasil.

Quanto a regras ou preceitos, são normas que, embora

ainda genéricas e abstratas, têm conteúdo de menor abstração, como, por

exemplo, a norma decorrente do disposto no art. 45, § 1º, da Constituição

de 1988, ao dispor sobre o quantitativo de deputados federais para o maior

e para o menor Estado.

Não se pense, no entanto, que, embora classificadas

pelo grau de generalidade, as normas constitucionais, que os princípios,

quer as regras ou preceitos, estejam separadas ou compartimentalizadas,

com âmbito de normatividade perfeitamente delineado; na verdade,

inseridas que estão no sistema constitucional, integram-se

harmonicamente, e buscam, umas e outras, em relação dialética,

implementar o seu âmbito normativo.

André Ramos Tavares34 tem o seguinte entendimento

quanto às normas e regras:

Em primeiro lugar, costuma-se sugerir o grau de abstração da norma como sinal distintivo entre princípio e regra, sendo aquela dotada de maior grau de abstração que esta, voltada que é para o mundo concreto. É por isso que Dworkin denomina os princípios standards.

As regras têm caráter categórico, branco-ou-preto, ou isto ou aquilo. Enquanto que princípios, de outra parte, podem apenas ser estatuídos em termos gerais, seu dignificado e conseqüências são

34 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. p. 100.

14

ambíguos. Princípios são distinguidos pelo grau de sua relevância em um caso”35.

Em segundo lugar, tem-se o grau de aplicabilidade de norma como diferenciador entre princípios e regras. Sendo aqueles dependentes de uma concretização, verdadeira integração, por parte dos operadores do Direito (principalmente o legislador, mas também o magistrado), e estas, as regras, imediatamente aplicáveis aos casos concretos.

Por fim, mas não menos importante, tem-se que os

princípios caracterizam-se por serem à base do sistema jurídico, seus

fundamentos últimos. Nesse sentido é que se compreende sua natureza

normogenética, ou seja, motivo determinante da existência das regras em

geral.

Como conseqüência da distinção operada, tem-se que

os princípios: “[...] permitem o balanceamento de valores e interesses (não

obedecem, como as regras, à ‘lógica do tudo ou nada’), consoante seu

peso e a ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes [...]”36.

Em outras palavras, os princípios são responsáveis pela

incorporação de valores fundamentais no sistema jurídico. Assim, acabam

conferindo unidade ao sistema jurídico, porque: “[...] são o fundamento de

regras jurídicas e têm uma idoneidade irradiante que lhes permite ‘ligar’ ou

cimentar objetivamente todo o sistema constitucional.”37

Não desencadeiam, pois, a eliminação de um em face

daquele que prevalecer, em caso de colisão, tal como ocorre com as regras

jurídicas.

35 Importa saber distinguir regras de princípios porque a fórmula será útil para quando preciso

identificar os próprios preceitos fundamentais. 36 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. p. 168. 37 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. p. 169.

15

Merece atenção a idéia de que os denominados

princípios (constitucionais) são normas que consagram valores que servem

de fundamento para todo o ordenamento jurídico, e irradiam sobre este

para transformá-lo em verdadeiro sistema, conferindo-lhe a necessária

harmonia. Não seria exagero dizer que “os princípios são compreendidos e

equiparados e até mesmo confundidos com os valores”38.

1.2.1 Os valores na constituição

De acordo com a teoria tridimensional do Direito – uma

das mais prestigiadas teorias acerca da elucidação e compreensão da

estrutura do Direito -, este surge por meio de uma atribuição qualitativa a

determinada ocorrência factual, por meio de um mandamento.

Assim, o Direito está erigido sobre três pilares básicos,

a saber: fato, valor e norma, na já conhecida “tríade” estrutural do Direito.

Nas palavras de seu principal expoente nacional, o Prof. Miguel Reale39,

verifica-se a existência de uma relação “fático-axiológico-normativa de

qualquer porção ou momento da experiência jurídica oferecido à

compreensão espiritual”

O primeiro dos elementos componentes da tríade

referida é o fato, que se traduz exatamente no acontecimento social, seja

ele econômico, físico, político, psicológico, religioso, ideológico, ou outro

qualquer. A este por seu turno, é atribuída uma referência de cunho

axiológico, mensurada valorativamente tomando por base a idéia que a

sociedade apresenta em relação ao fato, e que evidentemente variará

conforme a época e o lugar.

38 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, p. 259 39 REALE, Miguel. Teoria Tridimensional do Direito. 5. ed., São Paulo: Saraiva, 1994. p. 54.

16

Valor, assim atribuído ao fato fica registrado por meio

do emprego de uma norma, norma, esta consagrada dentro de determinado

ordenamento jurídico. Tais elementos coexistem e integram-se, dinâmica e

dialeticamente, e seu legado é a própria estrutura do Direito.

Essa lição se mostra extremamente preciosa para fins

de revelar a impossibilidade de afastar as normas de Direito dos valores

que são consagrados em cada estrutura jurídica existente nos diversos

países. Esse é o pressuposto com o qual deve trabalhar o operador do

Direito.

Tais valores integram o cerne do Direito. Seu endereço

natural é a Constituição, documento fundamental da ordem juridicamente

positivada. É por intermédio da noção de valores que se estará apto a

identificar aquilo que a Constituição chama de “preceitos fundamentais”.

Toda Constituição é composta por um sistema de

normas, tal como o restante do ordenamento. Sublinhe-se, nesse ponto,

que se trata de um sistema normativo em toda a sua extensão, já que se

apresenta composto por normas dotadas, sem nenhuma exceção, de

necessária imperatividade.

Apenas ocorre que a Constituição, por ser fundamento

das demais normas, ancora os principais valores a serem absorvidos e

resgatados em sua necessária desenvoltura ulterior, pelo restante das

normas integrantes do sistema jurídico.

Cappelletti40 lembra que:

[...] tem sido própria de todos os tempos à ânsia dos homens de criar ou descobrir uma ‘hierarquia’ das leis, e de garanti-la. É a

40 CAPPELETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito

comparado. Trad. de Aroldo Plínio Gonçalves. 2 ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1992. p. 11.

17

própria ânsia – ou um seu aspecto – de sair do contingente, de ‘fazer parar o tempo’, de vencer, em suma, o humano destino de perene transformação e de morte: as leis mudam, mas permanece a Lei; permanecem os Valores Fundamentais.

É correto afirmar que, de mera proclamação jurídica de

normas com superioridade hierárquica em relação às demais, a inspiração

humana alcançou, ainda, aquilo que se mostrara, até então, historicamente

improvável: traçar valores supremos, e que assumem importância ainda

maior em relação às demais normas constitucionais, embora estejam

vertidos também em roupagem constitucional41.

À jurisdição constitucional como atividade desenvolvida

pelo Tribunal Constitucional está atribuída a missão de desenvolver os

princípios constitucionais42. E essa função tem merecido, no caso dos

direitos humanos, a elaboração de institutos judiciais próprios (ações

específicas, porque adequadas a sua finalidade). Essa é a vertente para a

qual caminha o Direito contemporâneo. Confirma a assertiva, como se verá,

o próprio instituto da argüição.

1.2.2 Conceito de Princípio

A respeito do conceito de princípio, diz Ivo Dantas43 que:

Princípios são categoria lógica e, tanto quanto possível, universal, muito embora não possamos esquecer que, antes de tudo, quando incorporados a um sistema jurídico-constitucional-positivo, refletem a própria estrutura ideológica do Estado, como tal,

41CAPPELETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito

comparado. p. 20. 42 HECK, Luís Afonso. O Tribunal Constitucional Federal e o desenvolvimento dos princípios

constitucionais : contributo para uma compreensão da jurisdição constitucional federal alemã. – Porto Alegre: Sergio Fabris, 1996. p. 167.

43 DANTAS, Ivo. Princípios Constitucionais e Interpretação Constitucional. Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 1995, p. 59.

18

representativa dos valores consagrados por uma determinada sociedade.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho44, ao tratar do tema,

realiza algumas ponderações, nas quais explica:

os juristas empregam o termo ‘princípio’ em três sentidos de alcance diferente. Num primeiro, seriam ‘supernormas’, ou seja, normas (gerais ou generalíssimas) que exprimem valores e que por isso, são ponto de referência, modelo, para regras que as desdobram. No segundo, seriam standards, que se imporiam para o estabelecimento de normas específicas – ou seja, as disposições que preordenem o conteúdo da regra legal. No último, seriam generalizações, obtidas por indução a partir das normas vigentes sobre determinada ou determinada matérias. Nos dois sentidos, pois, o termo tem uma conotação prescritiva; no derradeiro, a conotação é descritiva: trata-se de uma ‘abstração por indução’.

1.2.3 Conceito de Regras

Barroso45 conceitua Regra Jurídica como “proposições

normativas aplicáveis sob a forma de tudo ou nada.(...) Se os fatos nela previstos

ocorrerem, a regra deve incidir, de modo direto e automático, produzindo seus

efeitos”.

Para Willis Santiago Guerra Filho, são esquemas estruturados

nos moldes “previsão normativa com conseqüência jurídica”46.

44 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direito Constitucional do Trabalho: Estudos em

Homenagem ao Prof. Amauri Mascaro Nascimento. Rio de Janeiro LTR, 1991, Vol. I. p. 73-74. 45 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma

dogmática constitucional transformadora. 3a ed, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 30

46 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria Processual da Constituição. 2 ed. São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002. p. 52

19

Pode-se aduzir, então, que a norma é considerada uma

Regra, quando nela se vislumbra um comando definitivo, em que se revela

uma autoridade imediata para sua aplicação. É um mandato definitivo que

exige que se faça exatamente o que é descrito.

1.2.4 Conflito entre princípios e regras

No entendimento de Nagib Slaibi Filho47 no que se

refere a conflito de princípios tem o seguinte entendimento: Constituições

democráticas, nascidas de intenso debate e de demorado consenso entre

diferentes ideologias políticas, como a Constituição brasileira de 1988, pode

expor em seus dispositivos normas que se mostram conflitantes nos valores

tutelados, o que se vê pelos princípios que albergam justamente tais

valores.

Por sua vez, Canotilho48 diz:

O fato de a constituição constituir um sistema aberto de princípios insinua já que podem existir fenômenos de tensão entre vários princípios estruturantes ou entre os restantes princípios constitucionais gerais e especiais. Considerar a constituição como uma ordem ou sistema de ordenação totalmente fechado e harmonizante significaria esquecer, desde logo, que ela é, muitas vezes, o resultado de um compromisso entre vários actores sociais, transportadores de idéias, aspirações e interesses substancialmente diferenciados e até antagônicos ou contraditórios. O consenso fundamental quanto a princípios e normas positivo-constitucionalmente plasmados não pode apagar, como é óbvio, o pluralismo e o antagonismo de idéias subjacentes ao pacto fundador.

Ainda...

A pretensão de validade absoluta de certos princípios com sacrifício de outros originaria a criação de princípios

47 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 68. 48 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. p.106,107.

20

reciprocamente incompatíveis, com a conseqüente destruição da tendencial unidade axiológico-normativa da lei fundamental. Daí o reconhecimento de momentos de tensão ou antagonismo entre os vários princípios e a necessidade de aceitar que os princípios não obedecem, em caso de conflito, a uma lógica do “tudo ou nada”. Assim, por exemplo, se o principio democrático obtém concretização através do principio majoritário, isso não significa desprezo da proteção das minorias; se o princípio democrático, na sua dimensão econômica, exige intervenção confirmadora do Estado através de desapropriações e nacionalizações, isso não significa que se posterguem os requisitos de segurança inerentes ao principio do Estrado de direito (princípio da legalidade, principio da justa indenização, principio de acesso aos tribunais para discutir a medida de intervenção etc.).

A densidade dos princípios constitucionais não resulta apenas de sua articulação com outros princípios ou normas constitucionais de maior densidade de concretização. Longe disso: o processo de concretização constitucional assenta, em larga medida, nas densificações dos princípios e regras constitucionais feitas pelo legislador (concretização legislativa) e pelos órgãos de aplicação do direito a problemas concretos, designadamente os tribunais (concretização judicial). Qualquer que seja a indeterminabilidade dos princípios jurídicos, isso não significa que eles sejam impredictíveis. Os princípios não permitem opções livres aos órgãos ou agentes concretizadores da constituição (impredictibilidade dos princípios); permitem, sim, projeções ou irradiações normativas com um certo grau de discricionariedade (indeterminabilidade), mas sempre limitadas pela juridicidade objetiva dos princípios. Como Dworkin, “o direito – e desde logo, o direito constitucional – descobre-se, mas não se inventa”.

No mesmo diapasão, os ensinamentos de Clémerson

Melin Cléve49:

A Constituição contém um “registro de aprendizagem”50, por isso que se comunica continuamente com a realidade histórica. A

49 Apud. SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 69-70. 50 O “registro de aprendizagem” ou a “capacidade de aprendizagem”, segundo Canotilho.

Significam a disponibilidade das normas constitucionais para captarem mudança da realidade e estarem abertas às concepções cambiantes da verdade e da justiça.

21

baixa densidade normativa da Constituição e a alta abstração de seus comandos constituem meios adequados para garantir a constante evolução de seu significado e o ajustamento de seu sentido às exigências da realidade sem a necessidade de se convocar a todo o instante a manifestação do poder constituinte derivado. A abertura da Constituição permite o que a doutrina vem chamando de mutação constitucional para o efeito de acompanhar a história e o seu progresso. A força normativa da Constituição implica, pois, a construção de uma via de duas mãos: a Constituição conforma a realidade, mas ao mesmo tempo é, de certo modo, também por ela (pela realidade) conformada. A Constituição:

a) determina os princípios diretores segundo os quais se deve formar a unidade política e prosseguir a atividade estatal;

b) regula o processo de solução de conflitos dentro da comunidade;

c) ordena a organização e o processo de formação da unidade política e da atuação estatal.

d) cria os fundamentos e normativiza os princípios da ordem jurídica global.

A doutrina vem procurando definir a Constituição como

“um sistema aberto de princípios e preceitos” (Canotilho). Os Princípios,

ninguém desconhece, possuem características que os diferenciam das

regras ou preceitos.

Dispõem de maior grau de abstração e, portanto, menor

grau de densidade normativa, e bem por isso sintetizam, fundamentam e

estruturam o sistema constitucional. Alem disso, condensam as idéias

estruturais dos sistema, razão pela qual, em geral, os preceitos constituem

desdobramentos de idéias-sínteses engessadas nas disposições

princípiológicas. Os princípios, mesmo que implícitos, e inclusive aqueles

enunciados no preâmbulo, dispõem de uma funcionabilidade. Ou seja,

prestam-se para alguma coisa. São, pois, funcionais. Eles cimentam a

22

unidade da Constituição, indicam o conteúdo do direito de dado tempo e

lugar e, por isso. Fixam standards de justiça, prestando-se como

mecanismos auxiliares no processo de interpretação e integração da

Constituição e o direito infra-constitucional. Mais do que isso, experimentam

uma eficácia mínima, ou seja, se não podem sofrer aplicação direta e

imediata, exigindo no mais das vezes (não é o caso dos princípios-garantia)

integração normativa decorrente da atuação do legislador, pelo menos

cumprem eficácia derrogatória da legislação anterior e impeditiva de

legislação posterior, desde que incompatíveis com seus postulados. Alias,

também as normas programáticas atuam, pelo menos, essas últimas

funções. Daí por elas operam, no mínimo, uma eficácia negativa,

paralisando os “efeitos de toda e qualquer norma jurídica contrária a seus

princípios”51.

51 SLAIBI FILHO,Nagib. Direito Constitucional. p. 70,71,72.

CAPÍTULO 2

DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O princípio da dignidade da pessoa humana encontra,

assim como direito à vida, alguns obstáculos no campo conceitual. Aliás,

em boa medida as dificuldades são aquelas próprias dos princípios, normas

que, como já se verificou, são extremamente abstratas, permitindo diversas

considerações, definições e enfoques os mais variados.

Contudo, como bem oportunamente pondera Ingo

Wolfgang Sarlet52, é bem possível visualizar inúmeras situações na qual a

dignidade da pessoa humana restou absolutamente violada.

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Luiz Antonio Rizzatto Nunes53, ao investigar acerca do

significado da categoria Dignidade, alerta inicialmente para o fato de que o

conceito de Dignidade não deve ser relativizado, ou seja, variável segundo

o sentido de bem e mal ou de acordo com o momento histórico vivido.

Lembra, ainda, que o valor da Dignidade da Pessoa Humana tem sido

erigido à categoria de Princípio constitucional em várias legislações em

todo o mundo em razão de que o ideal e o pensamento jurídico mundial têm

evoluído de uma forma muito positiva.

52 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na

Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 39. 53 NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana:

doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 46-47.

24

O reconhecimento do valor da Dignidade da Pessoa

Humana é fruto de uma evolução histórica pela qual passou a humanidade.

Após algumas experiências muito negativas, tais como o totalitarismo54

assistido na Alemanha e na Itália, o mundo vem gradualmente admitindo na

Pessoa Humana o centro e a razão de ser da própria vida, e, por esta

razão, a vida de todos deve ser digna55.

Por outro lado, as categorias ser humano e Pessoa

Humana nem sempre foram tidas como sinônimas, e isto por que durante

algum tempo na história do homem somente alguns foram considerados

dotados do predicado Dignidade.

Cleber Francisco Alves56 comenta que antes do

cristianismo somente eram consideradas Pessoas, do ponto de vista

jurídico, isto é, enquanto seres titulares de direitos, os seres que

desempenhavam papéis excepcionais na Sociedade.

Sarlet traz que já no pensamento estóico57 a Dignidade

era concebida como qualidade inerente ao ser humano, que o distinguia

dos demais seres vivos. Esta noção estava ligada à noção de liberdade

pessoal do indivíduo, que é livre e responsável por seus atos e seu destino,

e também à idéia de que todos os homens são iguais em sua natureza, e,

54 Segundo Nicola Abbagnano, a categoria totalitarismo corresponde à teoria ou prática do Estado

totalitário, vale dizer, do Estado que pretende identificar-se com a vida dos seus cidadãos. Esse termo foi cunhado para designar o fascismo italiano e o nazismo alemão. Às vezes também é usado para designar qualquer doutrina absolutista, em qualquer campo a que se refira. (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 2003. p. 963).

55 LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: companhia das Letras, 1999. p. 133.

56 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: o enfoque da doutrina social da Igreja. São Paulo: Renovar, 2001. p. 112.

57 “Estoicismo - Uma das grandes escolas filosóficas do período helenista, assim chamada pelo pórtico pintado onde foi fundada, por volta de 300 a C., por Zenão de Cicio. Os principais mestres dessa escola foram, além de Zenão, Cleante de Axo e Crisipo de Soles. Com as escolas da mesma época, epicurismo e ceticismo, o estoicismo compartilhou a afirmação do primado da questão moral sobre as teorias e o conceito de filosofia como vida contemplativa acima das ocupações, das preocupações e das emoções da vida comum.” (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. p. 375)

25

por isso, merecem ser tratados com a mesma Dignidade. Assinala, ainda,

que durante o medievo tal concepção, de inspiração cristã, continuou a ser

sustentada. Na Idade Moderna, o ser humano era tido como um ser

racional, livre e independente, e que por esta razão comanda seu próprio

destino58.

Cleber Francisco Alves59 observa que é com o advento

do cristianismo, com suas idéias de igualdade entre os homens, que todo o

ser humano passa a ser tido como Pessoa Humana, ou seja, como sujeito

dos mesmos direitos. Nesse momento, observamos que as categorias ser

humano e Pessoa Humana passam a se identificar.

Pode-se afirmar, portanto, que se a concepção de

Dignidade está hoje diretamente relacionada com a concepção de Pessoa

Humana isso é devido, em boa parte, ao cristianismo60. A própria criação

bíblica do homem, trazida pelo livro Gênesis, do Velho Testamento, dá uma

idéia do sentido da Dignidade do ser humano, eis que Deus teria criado o

homem à sua imagem e semelhança61.

58 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na

Constituição Federal de 1988. p. 30/31. 59 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: o

enfoque da doutrina social da Igreja. p. 112/113. 60 Lafer assinala, quanto à contribuição dada pelo cristianismo à evolução da idéia do valor da

pessoa humana e de sua dignidade, o seguinte: “O cristianismo retoma e aprofunda o ensinamento judaico e grego, procurando aclimatar no mundo, através da evangelização, a idéia de que cada pessoa humana tem um valor absoluto no plano espiritual, pois Jesus chamou a todos para a salvação. Neste chamado não “há distinção entre judeu e grego” (são Paulo, Epístola aos Romanos, 10,12), pois “não há judeu, nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (são Paulo , Epístola aos Gálatas, 3, 28). (LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. p. 119)

61 Em nota de pé de página, Ingo Wolfgang Sarlet, citando Christian Starck, alerta para o fato de que, na realidade, não se encontra na Bíblia um conceito de dignidade. O que há é uma concepção do ser humano que “tem servido como pressuposto espiritual para o reconhecimento e construção de um conceito e de uma garantia jurídico-constitucional da dignidade da pessoa [...]”. (SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. p. 30.)

26

Portanto, a categoria Dignidade pode ser compreendida

como qualidade daquele que é digno, superior, merecedor de respeito e

consideração. A Dignidade da Pessoa Humana, desta forma, não pode ser

aferida em valor monetário, não pode ser substituída por qualquer outra

coisa.

Conforme já mencionado, é reconhecido dentre teóricos

contemporâneos62 que o cristianismo teve uma influência inicial para o

desenvolvimento de direitos de personalidade intimamente relacionados

com a Dignidade da Pessoa Humana. Cleber Francisco Alves ressalta,

porém, que foi somente no século XVIII, com a Escola do Direito Natural63,

que tais direitos foram exaltados, a ponto de serem reconhecidos como

direitos naturais da Pessoa Humana, existentes antes mesmo do Estado, e

unidos indissoluvelmente à pessoa64.

Esse pensamento conduz à idéia de que a Dignidade é

atributo de todas as Pessoas, em razão do simples fato de que todas

possuem a mesma natureza e isso faz delas iguais entre si.

Há que se considerar, contudo, que sob o enfoque do

direito natural os direitos da personalidade constituíram inicialmente

limitações ao poder do Estado. O homem burguês individualista tinha seu

interesse voltado à não intervenção estatal. Na realidade, a proclamação de

direitos de primeira geração65 (de liberdade) visava proteger o cidadão

62 Pode-se citar Luiz Antonio Rizzatto Nunes, Ingo Wolfgang Sarlet e Cleber Francisco Alves 63A expressão direito natural apresenta inúmeras e diferentes concepções: direito natural divino;

direito natural cósmico; direito natural racional. Para a lógica do presente estudo, direito natural designa direito produzido e reconhecido pelo homem como um ser racional.

64 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: o enfoque da doutrina social da Igreja. p. 113/114.

65 Lafer, acerca dos direitos de primeira geração, esclarece o seguinte: “[...] num primeiro momento, na interação entre governantes e governados que antecede a Revolução Americana e a Revolução Francesa, os direitos do homem surgem e se afirmam como direitos do indivíduo face ao poder do soberano no Estado absolutista. Representavam, na doutrina liberal, através do reconhecimento da liberdade religiosa e de opinião dos indivíduos, a emancipação do poder político das tradicionais peias do poder religioso e através da liberdade de iniciativa econômica a

27

burguês contra as intervenções estatais, especialmente em seus negócios,

e não propriamente a Pessoa Humana. Nada obstante tal constatação,

pode-se considerar que o reconhecimento de direitos da personalidade

nessa etapa da evolução da idéia de Dignidade da Pessoa significou uma

positiva contribuição à idéia que concebemos hoje acerca de Dignidade da

Pessoa Humana.

Cleber Francisco Alves66 observa, ainda, que foi

somente no século XX, com o aparecimento dos regimes democráticos

econômico-sociais, nos países da Europa Ocidental e nos Estados Unidos

da América, que os direitos do homem deixaram de ser concebidos

estritamente como meios de limitação de poder. Surge assim um novo

domínio das liberdades individuais, eis que os direitos sócio-econômicos

passam a ser tidos como asseguradores a todos os governados de

condições materiais de exercícios de tais liberdades.

emancipação do poder econômico dos indivíduos do jugo e do arbítrio do poder político. Os direitos humanos da Declaração da Virgínia e da Declaração Francesa de 1789 são, neste sentido, direitos humanos de primeira geração, que se baseiam numa clara demarcação entre Estado e não-Estado, fundamentada no contratualismo de inspiração individualista. São vistos como direitos inerentes ao indivíduo e tidos como direitos naturais, uma vez que precedem o contrato social. Por isso, são direitos individuais: (I) quanto ao modo de exercício – é individualmente que se afirma, por exemplo, a liberdade de opinião; (II) quanto ao sujeito passivo do direito – pois o titular do direito individual pode afirmá-lo em relação a todos os demais indivíduos, já que estes direitos têm como limite o reconhecimento do direito do outro [...]. Na evolução do liberalismo o individualismo ver-se-ia complementado pelo reconhecimento, não contemplado na Declaração de 1789, dos direitos individuais exercidos coletivamente. É a liberdade de associação, reconhecida na Primeira Emenda da Constituição Americana, que permitiu o aparecimento dos partidos políticos e dos sindicatos. Com efeito, no caso, trata-se de direitos que só podem ser exercidos se várias pessoas concordarem em utilizar os seus direitos numa mesma e convergente direção – por exemplo, associando-se a um partido político, a um sindicato ou concordando em fazer uma greve. Os direitos individuais exercidos coletivamente incorporaram-se, no correr do século XIX, à doutrina liberal, que neles reconheceu um ingrediente fundamental para a prática da democracia e, conseqüentemente, um dado importante na interação entre governantes e governados, que favorece, ex parte populi, a liberdade ao ensejar o controle do todo político-econômico-social pelos governados.” (LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. p. 126/127).

66 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. p. 116.

28

O mesmo autor67 salienta que o que se deu nessa

época foi à transição de uma concepção individualista da personalidade

humana para uma visão personalista. Com esta nova visão se buscava

compatibilizar e assegurar à Pessoa Humana além da liberdade frente ao

Estado e do tratamento igualitário sob o aspecto formal, também um nível

crescente de participação política e um estágio mais concreto e efetivo de

igualdade no acesso aos bens econômicos e sociais.

Tais observações são fundamentais a fim de que se

possa compreender que, apesar de se encontrar a origem da Dignidade da

Pessoa Humana em vários relatos da história (inclusive no Velho

Testamento) o conceito de Dignidade foi se aprimorando e se consolidando

com as vicissitudes da história da humanidade.

Luiz Antonio Rizzatto Nunes68 coloca que a Dignidade

nasce com a Pessoa. É-lhe inata, e inerente à sua essência. E acrescenta

que a Pessoa Humana já nasce com integridade física e psíquica, mas que

com o seu desenvolvimento aspectos de sua personalidade têm de ser

respeitados, tais como seu pensamento, suas ações e seu comportamento,

e isso implica no respeito à sua liberdade, imagem, intimidade e

consciência (religiosa, espiritual, científica).

Pode-se compreender, portanto, que todas as esferas

acima mencionadas da personalidade da Pessoa Humana compõem a sua

Dignidade, e, por esta razão a categoria Dignidade da Pessoa Humana

representa o respeito ao ser humano em um sentido amplo, que

compreenda a Pessoa Humana por inteiro, como um ser dotado de vontade

própria, consciência e liberdade de expressão.

67 ALVES, Cleber Francisco. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. p.

117/118. 68 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana:

p. 49.

29

Ingo Wolfgang Sarlet69 afirma que as noções de

Dignidade, vida e humanidade estão umbilicalmente vinculadas e que a

idéia de Dignidade se encontra latente em tudo o que diz respeito à

essência da Pessoa Humana. Sarlet70 relaciona, ainda, a Dignidade com a

própria condição humana da Pessoa, eis que somente seria desnecessária

a preocupação com os aspectos relativos à sua Dignidade se o ser humano

pudesse renunciar à esta sua condição71.

A Dignidade hoje é reconhecida como um atributo que

caracteriza a Pessoa Humana e a distingue dos outros seres. A partir do

reconhecimento de que se trata de um valor moral inerente à Pessoa

Humana é possível afirmar que tem a característica da irrenunciabilidade, e

que todas as Pessoa são merecedoras de um tratamento digno. E isso

implica em dizer que todos os aspectos da personalidade humana devem

ser respeitados a fim de que não se macule o valor Dignidade. Se for

reconhecido que em sua natureza toda Pessoa é igual, e se a Dignidade é

uma propriedade inerente à natureza da Pessoa Humana, então é correto

também dizer que todas as Pessoas devem ser tratadas com igual respeito

e consideração.

69 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na

Constituição Federal de 1988. p. 25/26. 70 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na

Constituição Federal de 1988. p. 25/26. 71 Acerca da noção de condição humana, apresenta-se o pensamento de Hannah Arendt, no

sentido de que “[...] a condição humana não é o mesmo que a natureza humana, e a soma total das atividades e capacidades humanas que correspondem à condição humana não constitui algo que se assemelhe à natureza humana. Pois nem aquelas que discutimos neste livro nem as que deixamos de mencionar, como o pensamento e a razão, e nem mesmo a mais meticulosa enumeração de todas elas, constituem características essenciais da existência humana no sentido de que, sem elas, essa existência deixaria de ser humana. A mudança mais radical da condição humana que podemos imaginar seria uma emigração dos homens da Terra para algum outro planeta. Tal evento, já não inteiramente impossível, implicaria em que o homem teria que viver sob condições feitas por ele mesmo, inteiramente diferentes daquelas que a Terra lhe oferece. O labor, o trabalho, a ação e, na verdade, até mesmo o pensamento como o conhecemos deixariam de ter sentido em tal eventualidade. Não obstante, até mesmo esses hipotéticos viajores terrenos ainda seriam humanos; mas a única afirmativa que poderíamos fazer quanto à sua <natureza> é que são ainda seres condicionados, embora sua condição seja agora, em grande parte, produzida por eles mesmos.” (ARENDT, Hannah. A condição humana. 9 edição, Rio, Forense Universitária, 1999. p. 17/18).

30

A Pessoa Humana só tem sua Dignidade

verdadeiramente preservada se todos os aspectos de seu caráter e de sua

individualidade são também respeitados. E isso não deve significar que o

direito da Pessoa Humana de ter sua Dignidade preservada seja um direito

relativo e que possa ser levantado de acordo com as circunstâncias. Deve

ser, pelo contrário, algo bem definido, que implique em se detectar

facilmente a ocorrência de violação da dignidade do ser humano.

Portanto, concorda-se com a conclusão a que chega Luiz

Antonio Rizzatto Nunes72, no sentido de que sem vida não há Dignidade, por

outro lado, sem Dignidade só existirá vida biológica, não podendo se falar em vida

ética.

2.2 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

A Constituição de 1988 optou por não incluir a

dignidade da pessoa humana entre os direitos fundamentais, inseridos no

extenso rol do art. 5º.

A opção constitucional brasileira, quanto à dignidade da

pessoa humana, foi por considerá-la, expressamente, um dos fundamentos

da República Federativa do Brasil, consignando-a no inciso III do art. 1º.73

Parece que o objetivo principal da inserção do princípio

em tela na Constituição foi fazer com que a pessoa seja, como bem anota

72 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana:

p. 52. 73 Com a seguinte redação: Artigo 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela União

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I- A soberania; II -A cidadania; III- A dignidade da pessoa humana; IV- Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V-O pluralismo político Parágrafo único: Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

31

Jorge Miranda, “fundamento e fim da sociedade”74, porque não pode sê-lo o

Estado, que nas palavras de Ataliba Nogueira é “um meio e não um fim”75,

e um meio que deve ter como finalidade, dentre outras, a preservação da

dignidade do Homem. Nesse sentido também Fernando Ferreira dos

Santos, ao acentuar que “importa concluir que o Estado existe em função

de todas as pessoas e não estas em função do Estado. Não só o Estado,

mas, consectário lógico, o próprio Direito”76.

Celso Ribeiro Bastos77, por sua vez, conclui que com a

inserção do princípio sob comento na Magna Carta brasileira, o que se está

a indicar: “é que é um dos fins do Estado propiciar as condições para que

as pessoas se tornem dignas”.

Entretanto, a dúvida que surge é: quais seriam esses

fins; quais são essas condições e o que torna uma vida digna?

Ainda que se venha a procurar, nos parágrafos abaixo,

os contornos básicos do que seja a dignidade do Homem (a não-utilização

do ser humano como instrumento e a sua capacidade de autodeterminação,

livre de impedimentos externos e internos), não se alcançará, no entanto, o

que “efetivamente é o âmbito de proteção da dignidade”78.

Isso porque, segundo Ingo Wolfgang Sarlet79,

uma das principais dificuldades, todavia – e aqui recolhemos al lição de Michael Sachs -, reside no fato de que no caso da dignidade da pessoa, diversamente do que ocorre com as demais

74 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito constitucional. 6 ed., Coimbra: Coimbra editora, 1997. t.

4. p. 167. 75 O Estado é um Meio e não um Fim. 76 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana:

p. 92. 77 BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro

de 1988. - 2.ed., rev. e atual.São Paulo: Saraiva, 2002. v.1. p. 425. 78 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais, p. 39. 79 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. p. 38-9.

32

normas jusfundamentais, não se cuida de aspectos mais ou menos específicos da existência humana (integridade física, intimidade, vida, propriedade, etc.), mas, sim, de uma qualidade tida como inerente a todo e qualquer ser humano, de tal sorte que a dignidade – como já restou evidenciado – passou a ser habitualmente definida como constituindo o valor próprio que identifica o ser humano como tal.

Contudo, como bem pondera Ingo Wolfgang Sarlet80,

apoiado em Tischner e Renaud: “não restam dúvidas de que a dignidade é

algo real, já que não se verifica maior dificuldade em identificar claramente

muitas das situações em que é espezinhada e agredida”.

De fato, é bem possível visualizar inúmeras situações

nas quais a dignidade da pessoa humana resta absolutamente violada.

Dois exemplos de desrespeito à dignidade são colacionados por Celso

Bastos81, o qual afirma que:

a dignidade humana pode ser ofendida de muitas maneiras. Tanto a qualidade de vida desumana quanto a prática de medidas como a tortura, sob todas as suas modalidades. Podem impedir que o ser humano cumpra na terra a sua missão, conferindo-lhe um sentido.

Nessa linha de constatações, é sempre atual a lição de

Lewandowski82:

[...] os problemas relativos à institucionalização dos direitos humanos não se encontram no plano de sua expressão formal, posto que, nesse campo, grandes avanços foram feitos desde o surgimento das primeiras declarações a partir do final do século

80 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. p. 39. 81 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo:

Saraiva, 2000., v. 1. p. 425. 82 LEWANDOWSKI, Enrique Ricardo. Proteção dos Direitos Humanos na Ordem interna e

Internacional. Rio de Janeiro: Forense, 1984. p. 66.

33

XVIII. As dificuldades localizam-se precisamente no plano de sua realização concreta de sua exigibilidade.

2.3 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ELEMENTOS CONSTITUTIVOS

Nagib Slaibi Filho83, assim dispõe do assunto:

Como fundamento da atividade estatal, a Constituição coloca a dignidade da pessoa humana, o que significa, mais uma vez, que o homem é o centro, sujeito, objeto, fundamento e fim de toda a atividade pública.

O princípio democrático do poder exige que à pessoa

humana, na inteireza de sua dignidade e cidadania, se volte toda a

atividade estatal.

Nesse aspecto, na interpretação axiológica, que leva

em conta os valores protegidos pela norma jurídica, pode-se dizer que o

valor supremo da Constituição é o referente à dignidade da pessoa

humana.84

O Estado não é mais o poder inerte e sim uma

organização eminentemente intervencionista e assistencialista, ao menos

quando exigirem as formas de discriminação da pessoa.

O princípio da dignidade é reafirmado no art. 5º, incisos

III (ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou

degradante);

83 SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. p. 154,155 84 Capistrano de Abreu, de forma humorística, disse que à Constituição bastavam dois artigos: Art.

1º Todo Brasileiro é obrigado a ter vergonha na cara. Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário... Nesta mesma idéia de Constituição sucinta, poder-se-ia pensar que todas as disposições constitucionais pudessem se resumir no seguinte: Artigo Único. Respeita a dignidade da pessoa humana.

34

X (inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas);

XLI (punição pela lei da discriminação);

XLIII (inafiançabilidade e insuscetibilidade de graça ou anistia da tortura e crimes hediondos, inclusive instituindo o dever de garantia por todos os membros da sociedade);

XLIX (respeito à integridade física e moral do preso);

No art. 7º, incisos IV (salário mínimo, fixado em lei,

capaz de atender às necessidade básicas do trabalhador e às de sua

família) e

XXX (proibição de discriminação por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, o que é valido também para o serviço público, pelo art. 39, § 3º);

A importância do valor da dignidade da pessoa humana

sobressai na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, das

Nações Unidas, que assim começa:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.

2.4 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LIBERDADE

No campo jurídico, a liberdade de cada indivíduo e sua

limitação advém do próprio princípio da legalidade, de tal sorte que

ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de

lei (artigo 5º.II da Constituição Federal).

35

No mais, a tutela da liberdade, na Constituição Federal,

é extensa, compreendendo as liberdades do artigo 5º e diversos

dispositivos constitucionais correlatos, inclusive a liberdade econômica e

social.

José Afonso da Silva, após esclarecer que o direito

tutela a liberdade externa ou objetiva (ou seja, a liberdade que permite ao

homem atuar, concretizar a escolha realizada no mundo exterior) classifica

as liberdades em cinco tipos, a saber: a liberdade da pessoa física; a

liberdade de pensamento e suas correlatas; a liberdade de expressão

coletiva em suas várias formas; a liberdade de ação profissional; a

liberdade de conteúdo econômico e social85.

O cerne da liberdade da pessoa física é o direito de ir e

vir, a liberdade de locomoção prevista no artigo 5º., XV da Constituição

Federal, a qual se liga uma garantia específica, que é o habeas corpus

(artigo 5º., LXIX da Constituição).

A liberdade de pensamento compreende – ainda

conforme José Afonso da Silva - a liberdade de consciência e crença

(artigo 5º., VI) e a liberdade de crença religiosa e de convicção religiosa

(artigo 5º., VIII) - a última, contudo, que não pode ser invocada para que a

pessoa se exima de obrigação legal a todos imposta ou se recuse à

prestação alternativa fixada em lei 86.

Inclui também, segundo o autor, a liberdade de

comunicação, que consiste “num conjunto de direitos, formas processos e

veículos que possibilitam a coordenação desembaraçada da criação,

expressão e difusão do pensamento e da informação”87 e que se extrai da

85 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 235 86 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 242. 87 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 243.

36

conjugação dos incisos IV, V, IX, XII e XIV do artigo 5º e artigos 220 a 224

da Constituição Federal.

O autor disserta, ainda, sobre as liberdades de

expressão coletiva (ou seja, aquelas que são exercitam no meio dos

demais indivíduos), especialmente a liberdade de reunião (artigo 5º., XVI da

Constituição Federal) e de associação (artigo 5º., XVIII da Constituição

Federal) e, também, um catálogo de direitos correlatos, a saber: o direito à

informação, o direito à representação coletiva (artigo 5º., XXI e artigo 8º.,

VIII) , o direito à participação direta dos cidadãos no processo político e

decisório (artigos 14, I e II, 29 XIII e 61, parágrafo 2º da Constituição

Federal e o de participação em geral (artigo 10 e 11 e 194, VIII e 198, III

da Constituição) e o direito dos consumidores (artigo 5º., XXXII da

Constituição) 88.

A liberdade de exercício de ofício e profissão é

consagrada no artigo 5º., XIII da Constituição Federal, que condiciona o

exercício desta liberdade à observância das qualificação profissionais

previstas em lei.

Por fim, José Afonso da Silva considera a existência de

liberdades de conteúdo econômico e social, a saber, a liberdade

econômica, a livre iniciativa, a liberdade de comércio, liberdade ou

autonomia contratual, liberdade de ensino e trabalho que são tuteladas

pelos direitos econômicos e sociais89.

As liberdades são asseguradas por um complexo de

garantias, que são os instrumentos por meio dos quais é possível assegurar

o exercício e o gozo dos direitos e prerrogativas, a saber, o direito de

88 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 258-269. 89 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 258-269.

37

petição (artigo 5º., XXXIV da Constituição Federal) 90, o habeas corpus

(artigo 5º., LXVIII) 91, o habeas data artigo 5º., LXXII) 92, o mandado de

injunção (artigo 5º., LXXI) 93 e o mandado de segurança, individual e

coletivo (artigo 5º., LXIX e LXX). 94

2.5 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE

Sobre a fragilidade humana e a proteção da integridade

física do ser humano é possível divisar no direto constitucional brasileiro

duas grandes vertentes de preocupação.

A primeira, com relação à proteção à maternidade, a

infância e à adolescência; o direito ao amparo pelo sistema de seguridade

social; e a proteção à terceira idade.

A segunda, com relação ao exercício do poder

coercitivo do Estado sobre a pessoa física dos presos.

Quanto à proteção à maternidade, e ao direito das

crianças e adolescentes, já tratamos retro no tópico sobre a dignidade da

90 José Afonso da Silva, citando Claude Albert Colliard, define o direito de petição como “o direito

que pertence a uma pessoa de invocar a atenção dos poderes públicos sobre uma questão ou uma situação, seja para denunciar uma lesão concreta e pedir a reorientação da situação, seja para solicitar uma modificação do direito em vigor no sentido mais favorável a liberdade” (SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 443).

91 È o remédio constitucional cabível sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder

92 É o remédio constitucional cabível para assegurar o conhecimento de informações relativos à pessoa do impetrante constantes em registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público e para retificá-los.

93 É o remédio constitucional cabível quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

94 É o remédio constitucional para proteger direto líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público, e será coletivo quando impetrado por partido político com representação no Congresso nacional ou organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano na defesa dos interesses de seus membros e associados.

38

pessoa humana enquanto direito ao nascimento e, em última instância, á

própria vida.

A seguridade social no Brasil compreende um conjunto

integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade

destinados a assegurar o direito à saúde, à previdência e à assistência

social (artigo 194 da Constituição Federal).

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido

mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de

doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e

serviços para sua promoção, proteção e recuperação (artigo 196 da

Constituição Federal) 95.

A previdência social objetiva a cobertura dos eventos de

doença, invalidez, morte e idade avançada; a proteção à gestante; a

proteção ao trabalhador em situação de desemprego voluntário; o salário

família e o auxílio reclusão para os dependentes dos segurados de baixa

renda e a pensão por morte do segurado ao cônjuge ou companheiro e

dependente (artigo 201 e incisos) 96.

95 Para Marga Bath Tessler, o direito à saúde se constitui tanto direito humano social quanto

dever do Estado que está comprometido com a adoção de políticas de saúde, ações e diretrizes. Constitui-se, neste quadro, direito público subjetivo e é plenamente exigível, inclusive em ação contra o próprio Estado (embora a autora ressalte que boa parte da jurisprudência se inclina pela necessidade da intermediação legislativa para a implementação deste direito). De qualquer sorte, a autora sublinha que deve ser observado, quanto às pretensões requeridas pelas pessoas, a reserva do possível, ou seja,a compatibilidade das prestações requeridas com as possibilidades da realidade. (TESSLER, Marga Barth. O Direito à Saúde: a saúde como direito e como dever na Constituição Federal de 1988. Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, v. 12, n. 40, 2001, p. 75-108.)

96 Conforme José Afonso da Silva, “A Constituição deu contornos mais precisos aos direitos de previdência social (artigos 201 e 202) mas seus princípios e objetivos continuam mais ou menos idênticos ao regime geral de previdência social consolidado na legislação anterior, ou seja, funda-se no princípio do seguro social, de sorte que os benefícios e serviços se destinam a cobrir eventos de doença, invalidez, morte, velhice e reclusão, apenas do segurado e seus dependentes. Isto quer dizer que a base da cobertura assenta no fator contribuição e em favor do contribuinte e dos seus”. (SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 310).

39

A assistência social será prestada a quem dela

necessitar, independente de contribuição e seu fomento advém do princípio

da solidariedade, pois custeada pelo orçamento geral da seguridade social

– e não pela contribuição individual (artigos 203 e 204 da Constituição

Federal).

Quanto aos idosos, o artigo 230 da Constituição

estabelece que a família, a Sociedade e o Estado têm o dever de amparar

as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade,

defendendo sua dignidade e bem estar e garantindo-lhes o direito à vida.

Conclui-se, pois, que existe intensa preocupação

constitucional no sentido de um amparo mínimo à fragilidade humana, que

envolve a participação da Sociedade e do Estado num sistema triplo de

prevenção, qual seja, de saúde, previdência social e assistência.

A segunda vertente referente à dignidade está ligada a

aspectos penais.

O artigo 5º., III da Constituição estabelece que ninguém

será submetido à tortura ou a tratamento desumano ou degradante.

A Constituição também assegura o respeito a

integridade física e moral dos presos (artigo 5º., XLIX) e proíbe as penas

de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados e os banimentos

(artigo 5º., XLVII).

Também dispõe que a pena deverá ser cumprida em

estabelecimentos distintos, adequados à natureza do delito, a idade e o

sexo do apenado (artigo 5º., XLVIII) , e será permitido às presidiárias as

condições para permanecer com seus filhos durante o período de

amamentação (artigo 5º., L).

40

Como salienta Maria Helena Diniz, “não se pode impor

pena privativa de liberdade sem garantir os direitos inalienáveis do ser

humano, sem protegê-lo de um ambiente que não preserve a sua qualidade

de vida (...) Urge acabar com o sofrimento imposto pela rotina na prisão e

adotar medidas que punam o delito, e, concomitantemente, reeduquem o

criminoso.” 97

De fato, no Estado Democrático de Direito, mesmo que

se imponha restrições à liberdade em face dos interesses e da preservação

da Sociedade, ainda assim a dignidade da pessoa humana tem que se

preservada: o regime carcerário não importa em derrogação desta

intangibilidade que faz de cada nós um ser moralmente insubstituível e

nossa civilidade decorre de nossa capacidade de reconhecer esta

qualidade mesmo com relação àquele que se mostra um infrator das regras

estabelecidas no seio da comunidade moral.

2.6 A INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

Em sentido amplíssimo, interpretar constitui o ato de

atribuir um sentido, um valor a um objeto enquanto fenômeno cultural

resultado de uma atividade humana [...]. [Em sentido amplo] é compreender

um signo lingüístico, ou seja, atribuir um significado a um determinado

signo de linguagem de acordo com as regras de sentido dessa mesma

linguagem [...] compreender, entender os atos de comunicação. [...] [Em

sentido estrito], determinação do significado de uma expressão quando

existam dúvidas em um caso concreto de comunicação e determinar o

sentido e o alcance das expressões do Direito98.

97 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito 2. ed. São Paulo : Saraiva, 2002. p. 178. 98 SILVA, Celso de Albuquerque. Interpretação constitucional operativa. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 2001. p. 22.

41

Muito embora se compreenda que a interpretação está

inserida num plano hermenêutico impregnado pela filosofia da linguagem99,

não se pode fugir de uma compreensão que parta do texto constitucional,

sob pena de se aderir a um relativismo impróprio ao Estado de Direito.

Em outras palavras, interpretar é a compreensão que

produz o sentido feito por um intérprete inserido num mundo

lingüisticamente constituído e que não há uma essência do qual decorra um

sentido escondido no texto da norma que possa ser “descoberto”; porém,

condiciona-se esta interpretação a uma razão emancipatória do direito

fundada nas premissas de que a Constituição é um espaço garantidor de

relações democráticas entre Estado e Sociedade e que ela é o “topos”

hermenêutico que conforma toda interpretação, como materialização

jurídica do contrato social que coloca instrumentos para concretização dos

objetivos traçados pela Sociedade100.

Para Konrad Hesse, a tarefa da interpretação

constitucional “é encontrar o resultado constitucionalmente exato em um

procedimento racional e controlável, fundamentar esse resultado racional e

controlavelmente e, deste modo, criar a certeza jurídica e previsibilidade –

não, por exemplo, somente decidir por causa da decisão.” 101

Nos casos que se apresentam, por exemplo, incumbe

ao operador jurídico brasileiro que lida com as questões judiciais cotidianas

onde a dignidade da pessoa humana se apresenta ao debate, assumir o

verdadeiro papel de Hércules ou seja, deve construir um esquema de

99 Para o tema, conferir STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração

hermenêutica da construção do Direito. 5 ed., rev e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

100 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise: p. 229-231/246-247. 101 HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha. Porto

Alegre, Sérgio Antonio Fabris, 1998.p. 55.

42

princípios abstratos e concretos que forneça uma justificação coerente às

disposições legais e legislativas102.

Essa interpretação, contudo, não é exclusiva dos

órgãos jurisdicionais, como o STF, mas sim de toda a Sociedade. Os

tribunais tem, somente, a atribuição de proferir a última palavra num

determinado contexto103.

Os métodos clássicos de interpretação104 são os

gramatical, sistemático, histórico e teleológico. Estes métodos não são

absolutos e, portanto, usados conjuntamente, podem convergir ou divergir

entre si.

A interpretação gramatical reconhece a necessidade de

busca do sentido dos vocábulos do texto positivado para que se determine

a norma a partir da análise de seus sentidos de seus vocábulos. No caso

específico da Constituição, que possui enunciados abertos como

conseqüência do processo dialético de sua construção, deve-se atentar a

102 DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. Tradução de Nelson Boeira. São Paulo:

Martins Fontes, 2002. p. 182. 103 “Propõe-se, pois, a seguinte tese: no processo de interpretação constitucional estão

potencialmente vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível estabelecer-se um elenco cerrado ou fixado com numerus clausus de intérpretes da Constituição “[...] cidadãos e grupos, órgãos estatais, o sistema público e a opinião pública [...] são intérpretes constitucionais em sentido lato [...]. Subsiste sempre a responsabilidade da jurisdição constitucional, que fornece, em geral, a última palavra sobre a interpretação” (HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a Sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1997. p. 13-14).

104 Em outras palavras, os métodos que a doutrina tradicional identifica como espécies de processos de interpretação das normas. Eles serão apresentados apenas a título ilustrativo, pois, consoante doutrina mais atualizada (confira-se a seguir), a interpretação constitucional opera-se por princípios especificamente constitucionais, vale dizer, por métodos orientados a partir das características inerentes a uma teoria material da Constituição que se utilize da idéia de normas como regras ou princípios (confira-se retro).

43

dois postulados: de que a Constituição deve ser interpretada como um todo

e de que ela não possui palavras contraditórias, inúteis ou supérfluas105.

A interpretação histórica busca o sentido da norma no

processo de sua criação. Seu uso tem sido minimizada pela doutrina e

jurisprudência, citando-se o caso o caso extremado de decisão da corte

suprema norte-americana que considerou, como argumento, o fato de não

existir telefones na época da edição do texto fundamental 106.

A interpretação sistemática parte da premissa de que o

direito não é um todo aleatório, mas sim com conjunto lógico e estruturado,

vale dizer, do princípio da unidade do ordenamento. Ou seja, busca-se a

conexão da norma com o ordenamento107.

A interpretação teleológica busca o fim da norma a

partir da distinção entre ratio legis (fundamento racional) da occasio legis

(circunstância histórica)108.

Apesar destes métodos tradicionalmente identificados,

como bem lembra Streck, não há sentido em pensar na interpretação

jurídica como um resultado da aplicação de métodos, pois isso insere o

Direito no paradigma metafísico-objetificante, já que o que existe é a nossa

relação com o mundo. Para ele, não há métodos gramatical, lógico etc.,

mas sim elementos que concorrem para o ato interpretativo109.

Este ato de interpretação constitucional está sujeito a

certos pressupostos. Ela deve observar características próprias da norma

constitucional. A primeira, a idéia de supremacia da Constituição. Pela 105 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da norma constitucional. 3. ed. São

Paulo: Saraiva, 1999. p. 126-131. 106 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 131-134. 107 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 134-136. 108 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 137-139. 109 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise, p. 308-310/318-319.

44

segunda, a natureza de sua linguagem, que abraça uma “liberdade de

conformação” pelo uso de cláusulas gerais. Além dessas, a especificidade

técnica, pois a Constituição, além de possuir normas de comando, tem,

também, normas de organização e competência e normas programáticas,

que refletem fins e valores a serem alcançados. Por fim, a natureza política

da Constituição, que materializa uma tentativa de conversão de poder

político pré-jurídico em poder jurídico, fato que implica o reconhecimento da

dimensão política da interpretação constitucional que, não obstante, é

jurídica e deve buscar uma racionalidade possível110.

Como bem lembra Barroso, “o ponto de partida do

intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o

conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus

postulados básicos e seus fins”111.

A violação do princípio da supremacia da Constituição

que, por sua vez, fruto da percepção da hierarquia do poder constituinte

sobre os constituídos, permite o “judicial review”, ou seja, o controle de

constitucionalidade, que encontra seu fundamento histórico na célebre

decisão do Juiz Marshall, ao decidir o caso Marbury vs. Madison, em

1803112.

A idéia de presunção de validade da lei decorre do

desdobramento do Poder Estatal em três esferas; assim, “embora se haja

reservado ao Judiciário o papel de intérprete qualificado das leis, os

110 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 107-112. 111 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 147. Aliás, STRECK

confirma que “Os princípios, enquanto valores fundamentais, governam a Constituição, o regime e a ordem jurídica [...] [e] todos os dispositivos constitucionais são vinculativos e têm eficácia” (Hermenêutica Jurídica e(m) crise, p. 247-248).

112 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 159-167.

45

Poderes se situam em plano de recíproca igualdade e os autos de cada um

deles nascem com presunção de validade”113.

Pelo princípio da presunção da constitucionalidade das

leis surgem duas conseqüências práticas:

a) na dúvida, a norma deve ser declarada constitucional

(a inconstitucionalidade não se presume);

b) se houver mais de uma interpretação da norma,

deve ser acolhida a que seja constitucional114. Enquanto a primeira tem sua

matriz no constitucionalismo norte-americano, a segunda conseqüência é

uma construção da jurisprudência constitucional alemã, que criou a

interpretação conforme a Constituição, mecanismo que não é apenas

hermenêutico, mas também, e principalmente, de controle de

constitucionalidade, ainda que parcial sem redução de texto115. Este

princípio só pode ser utilizado quando há um espaço de decisão, mas deve-

se utilizá-lo com parcimônia, para evitar a extensão indevida do escopo da

norma, o que implicaria papel de “legislador positivo”116.

No Brasil, segundo Barroso, a prática jurisprudencial

brasileira consolidou-se no sentido de que “a dúvida milita em favor da lei,

que a violação da Constituição há de ser manifesta e que a

inconstitucionalidade nunca se presume. É igualmente vetusta a convicção

de que, entre exegeses possíveis, prefere-se a que não infirme o ato de

autoridade”117.

113 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p.167. 114 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 167-180. 115 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 180-184. 116 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 184-187. 117 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 176.

46

Há, ainda, o princípio da unidade da Constituição, pelo

qual a Constituição, sendo conformadora de todo o ordenamento estatal,

também é una, ligando os diversos elementos do sistema jurídico. Porém,

por retratar um pacto político realizado entre diversas forças, a Constituição

tem, em si, tensões normativas, cuja solução exige uma ponderação dos

princípios. Essa unidade implica, também, na ausência de hierarquia entre

os dispositivos constitucionais, se admita que as cláusulas pétreas e os

princípios fundamentais (Democracia, República e Federação) possuam

uma ascendência axiológica, mas não normativa118.

O princípio da razoabilidade decorre da interpretação da

cláusula “due process of law”. Este comando passou de uma natureza

processual, garantindo a regularidade procedimental, para uma natureza

material, visando controlar a adequação dos motivos do legislador aos fins

e legitimidade. Este controle é feito pela verificação da racionalidade e

proporcionalidade dos motivos (fato) e meios (usados) aos fins visados,

tanto interna (em relação à própria medida), quanto externa (adequação à

Constituição)119. As linhas alemã e norte-americana diferem quanto ao

fundamento do princípio da razoabilidade, a alemã entende que ele é um

princípio constitucional implícito e não escrito, a norte-americana defende

que ele decorre do sentido substancial da cláusula do devido processo

legal120.

O princípio da proporcionalidade, por sua vez, é de

origem alemã, e consiste na análise de três pontos: a) adequação (se o

meio alcança os fins); b) necessidade ou exigibilidade (inexistência de outro

118 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 188-194. 119 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 209-217. 120 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, 228.

47

meio); e c) proporcionalidade em sentido estrito (relação custo vs.

benefício)121.

Segundo Barroso, o princípio da efetividade deve ser

analisado a partir da distinção dos planos do mundo jurídico: existência

(presença dos elementos constitutivos), validade (preenchimento de

atributos legalmente exigidos) e eficácia (aptidão para produzir efeitos

jurídicos). A efetividade é a concretização, no mundo físico, do comando

normativo, ou seja, se os efeitos jurídicos ocorrem ou não122. As normas

constitucionais, por sua vez, conforme a classificação de José Afonso da

Silva podem ser de eficácia plena123, eficácia contida124 e eficácia

limitada125. No entanto, mudando o foco da eficácia jurídica para a

efetividade, Loewenstein faz uma classificação ontológica, qual seja, prevê

dois extremos entre Constituição normativa (vivamente integrada na

Sociedade) e semântica (serve apenas ao detentor do poder), que são

intermediados pela Constituição nominal (o processo político não se ajusta

por completo à Constituição, embora esta seja prospectiva e a discrepância

quanto aos seus pressupostos econômicos e sociais tende a ser vencida

com o tempo)126.

Pelos fins da Constituição, ela possui normas de

organização (do Estado), normas definidoras de direitos (geram direitos

subjetivos, isto é, direitos que além de implicarem um dever jurídico a

outrem, são protegidos pelo direito de ação genérico) e normas

programáticas (definem fins e objetivos a serem alcançados, mas não

geram direitos subjetivos); estas últimas possuem, para sua defesa,

121 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 218-219. 122 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 235-236. 123 Incide imediatamente, não precisando de norma infraconstitucional. 124 Incidem incidir imediatamente, mas a norma infraconstitucional pode limitá-la. 125 Dependem de norma infraconstitucional para incidirem. 126 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 239-241.

48

mecanismos do mandado de injunção e da inconstitucionalidade por

omissão127.

Diante disso tudo, especialmente considerando o papel

dos intérpretes da Constituição128 e da sua função política diretiva e

prospectiva, surge a importância da interpretação evolutiva como processo

de atualização normativa do texto constitucional, refletindo as modificações

históricas ou de fatores políticos e sociais129. Este processo teria limites no

próprio sentido dos vocábulos e nos princípios fundamentais do sistema130,

mas permite a manutenção da força normativa da Constituição e da sua

pretensão de eficácia.

2.7 O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Supremo Tribunal Federal é o órgão máximo do

Poder Judiciário nacional.

O STF é composto de onze Ministros, escolhidos dentre

cidadãos brasileiros natos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta

e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada,

nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada sua escolha

127 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 242-245. 128 BARROSO, citando HABËRLE, aponta que a interpretação constitucional é um processo

aberto, já que diversas pessoas, no cotidiano, interpretam-na, e, a partir daí, demarcam seus direitos, resolvendo, informalmente, conflitos interpessoais (BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 115-120). Com efeito, HÄBERLE diz “O conceito de interpretação reclama um esclarecimento que pode ser assim formulado: quem vive a norma acaba por interpretá-la ou pelo menos co-interpretá-la. [...] Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete desta norma” (HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional, p. 13/15).

129 “A interpretação evolutiva é um processo informal de reforma do texto da Constituição. Consiste ela na atribuição de novos conteúdos à norma constitucional, sem modificação do seu teor literal, em razão de mudanças históricas ou de fatores políticos e sociais que não estavam presentes na mente dos constituintes” (BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 144).

130 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 146.

49

pela maioria absoluta do Senado Federal, nos termos do artigo 101, caput e

parágrafo único da Constituição.

O cargo de Ministro do STF é vitalício, com

aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade

Segundo o artigo 102, caput da Constituição Federal, a

principal competência do Supremo Tribunal Federal é a guarda da

Constituição.

Ao Supremo Tribunal Federal, pois, cabe estabelecer a

interpretação válida do texto constitucional, o que se dá, como visto supra,

pelas vias do controle difuso e concentrado de constitucionalidade.

Além da guarda da Constituição por meio das vias do

controle de constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal também

possui competência conforme a dicção do artigo 102,I da CF: a) penal

originária com relação às pessoas elencadas no artigo 102,I,alíneas b e c;

b) para processar e julgar originariamente o habeas corpus em que figure

como paciente as pessoas indicadas anteriormente, bem como mandado

de segurança e habeas data em face de atos das pessoa indicadas no

artigo 102, I, alínea d; c) para dirimir o litígio entre Estado estrangeiro ou

organismo internacional e a União, Estado, o Distrito Federal ou Território;

d) para dirimir as causas e conflitos entre a União e os Estados, a União e o

Distrito Federal e uns e outros, inclusive quanto à administração indireta; e)

para deferir a extradição solicitada por Estado estrangeiro; f) para processar

e julgar originariamente o habeas corpus quando o coator for Tribunal

Superior ou o coator ou paciente for autoridade ou funcionários com atos

sujeitos ao STF ou se trata de crime sujeito à jurisdição do STF; g) a

revisão criminal de seus julgados, bem como a execução de suas

sentenças; h) a reclamação para preservação de suas competências e

garantia da autoridade de suas decisões; i) dirimir as ações de interesse da

50

magistratura; j) processar e julgar os conflitos de competência entre os

Tribunais Superiores; k) processar e julgar o mandado de injunção quando

a elaboração da norma regulamentadora for de competência das pessoas

nominadas no artigo 102,I, alínea q; l) processar e julgar as ações contra o

Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público.

Consoante o artigo 102, alínea II, o STF tem

competência para julgar em recurso ordinário o habeas corpus, o habeas

data o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais

superiores se denegatória a decisão, bem como o crime político.

51

CAPÍTULO 3

A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O objetivo deste capítulo é investigar acórdãos e

decisões do Supremo Tribunal Federal no qual o postulado da dignidade da

pessoa humana foi invocado e utilizado como fundamento de decidir.

Para a análise foram selecionadas as decisões em que

a dignidade da pessoa humana foi expressa e efetivamente utilizada como

um dos fundamentos basilares para a conclusão judicial.

Outro critério de seleção foi a opção pelos acórdãos e

decisões que, pela repetição, em casos semelhantes, apontam para um

padrão em torno do significado atribuído à dignidade da pessoa humana.

Analisou-se casos em relação a Liberdade e a

Integridade da pessoa humana. Para a presente monografia, foram

analisadas duas decisões para cada situação.

3.1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LIBERDADE

Na associação entre dignidade da pessoa humana e

aspectos da liberdade, duas decisões do Supremo Tribunal Federal se

destacaram.

A primeira foi proferida nos autos do Habeas Corpus

82424/RS que tratou do direito a liberdade de expressão versus racismo.

52

A segunda foi proferida nos autos do Agravo de

Instrumento n º 496406/SP, referente ao caso “Escola Base”, no qual se

verificou o conflito entre a liberdade de informação e a dignidade da pessoa

humana e da integridade da honra e da imagem.

3.1.1 Liberdade de expressão versus racismo

Contra a decisão do Superior Tribunal de Justiça, foi

ajuizado o Habeas Corpus 82424/RS131, em favor do paciente que foi

131 HC 82424/RS. Relator para o Acórdão Ministro Maurício Correia. Coator: Superior Tribunal de

Justiça. Pubicado no DJ 19/3/2004 PP 00017. Assim ementado: “HABEAS-CORPUS. PUBLICAÇÃO DE LIVROS: ANTI-SEMITISMO. RACISMO. CRIME IMPRESCRITÍVEL. CONCEITUAÇÃO. ABRANGÊNCIA CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. LIMITES. ORDEM DENEGADA. 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros "fazendo apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias" contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII). 2. Aplicação do princípio da prescritibilidade geral dos crimes: se os judeus não são uma raça, segue-se que contra eles não pode haver discriminação capaz de ensejar a exceção constitucional de imprescritibilidade. Inconsistência da premissa. 3. Raça humana. Subdivisão. Inexistência. Com a definição e o mapeamento do genoma humano, cientificamente não existem distinções entre os homens, seja pela segmentação da pele, formato dos olhos, altura, pêlos ou por quaisquer outras características físicas, visto que todos se qualificam como espécie humana. Não há diferenças biológicas entre os seres humanos. Na essência são todos iguais. 4. Raça e racismo. A divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente político-social. Desse pressuposto origina-se o racismo que, por sua vez, gera a discriminação e o preconceito segregacionista. 5. Fundamento do núcleo do pensamento do nacional-socialismo de que os judeus e os arianos formam raças distintas. Os primeiros seriam raça inferior, nefasta e infecta, características suficientes para justificar a segregação e o extermínio: inconciabilidade com os padrões éticos e morais definidos na Carta Política do Brasil e do mundo contemporâneo, sob os quais se ergue e se harmoniza o estado democrático. Estigmas que por si só evidenciam crime de racismo. Concepção atentatória dos princípios nos quais se erige e se organiza a Sociedade humana, baseada na respeitabilidade e dignidade do ser humano e de sua pacífica convivência no meio social. Condutas e evocações aéticas e imorais que implicam repulsiva ação estatal por se revestirem de densa intolerabilidade, de sorte a afrontar o ordenamento infraconstitucional e constitucional do País. 6. Adesão do Brasil a tratados e acordos multilaterais, que energicamente repudiam quaisquer discriminações raciais, aí compreendidas as distinções entre os homens por restrições ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica, inspiradas na pretensa superioridade de um povo sobre outro, de que são exemplos a xenofobia, "negrofobia", "islamafobia" e o anti-semitismo. 7. A Constituição Federal de 1988 impôs aos agentes de delitos dessa natureza, pela gravidade e repulsividade da ofensa, a cláusula de imprescritibilidade, para que fique, ad perpetuam rei memoriam, verberado o repúdio e a abjeção da Sociedade nacional à sua prática. 8. Racismo. Abrangência. Compatibilização dos conceitos etimológicos, etnológicos, sociológicos, antropológicos ou biológicos, de modo a construir a definição jurídico-constitucional do termo. Interpretação teleológica e sistêmica da Constituição Federal, conjugando fatores e circunstâncias históricas, políticas e sociais que regeram sua formação e aplicação, a fim de obter-se o real sentido e alcance da norma. 9. Direito comparado. A exemplo do Brasil as legislações de países organizados sob a égide do estado moderno de direito democrático igualmente adotam em seu ordenamento legal punições para delitos que estimulem e propaguem segregação racial. Manifestações da Suprema Corte Norte-Americana, da Câmara dos Lordes da Inglaterra e da Corte de Apelação da Califórnia nos

53

condenado pelo delito de discriminação contra os judeus. Segundo os

impetrantes, este delito não tem conotação racial para lhe atribuir

imprescritibilidade que, pelo artigo 5º, XLII da Constituição, ficou restrito ao

crime de racismo. Citando autores judeus, os impetrantes afirmam que os

judeus não são raça (mais sim comunidade religiosa), requerendo a

concessão da ordem para afastar a imprescritibilidade e declarar a

prescrição da pretensão punitiva.

O paciente fora condenado por ter, na qualidade de

escritor e sócio da empresa “Revisão Editora Ltda” editado, distribuído e

vendido obras anti-semitas de sua autoria e de terceiros. Nelas, segundo os

termos da denúncia, são abordadas e sustentadas mensagens anti-

semitas, discriminatórias e racistas que, com isso, incitam e induzem à

discriminação racial.

Estados Unidos que consagraram entendimento que aplicam sanções àqueles que transgridem as regras de boa convivência social com grupos humanos que simbolizem a prática de racismo. 10. A edição e publicação de obras escritas veiculando idéias anti-semitas, que buscam resgatar e dar credibilidade à concepção racial definida pelo regime nazista, negadoras e subversoras de fatos históricos incontroversos como o holocausto, consubstanciadas na pretensa inferioridade e desqualificação do povo judeu, equivalem à incitação ao discrímen com acentuado conteúdo racista, reforçadas pelas conseqüências históricas dos atos em que se baseiam. 11. Explícita conduta do agente responsável pelo agravo revelador de manifesto dolo, baseada na equivocada premissa de que os judeus não só são uma raça, mas, mais do que isso, um segmento racial atávica e geneticamente menor e pernicioso. 12. Discriminação que, no caso, se evidencia como deliberada e dirigida especificamente aos judeus, que configura ato ilícito de prática de racismo, com as conseqüências gravosas que o acompanham. 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. 14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. 15. "Existe um nexo estreito entre a imprescritibilidade, este tempo jurídico que se escoa sem encontrar termo, e a memória, apelo do passado à disposição dos vivos, triunfo da lembrança sobre o esquecimento". No estado de direito democrático devem ser intransigentemente respeitados os princípios que garantem a prevalência dos direitos humanos. Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável. 16. A ausência de prescrição nos crimes de racismo justifica-se como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã, para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem. Ordem denegada.

54

O relator para o acórdão, em suas razões de decidir,

invocou o mapeamento do genoma humano. Deste foi concluído que o ser

humano não é uma espécie antiga o suficiente para possuir raças: os seres

humanos são geneticamente iguais.

Nesta análise, torna-se necessári a interpretação do

artigo 5º, XLII da Constituição que considera o crime de racismo como

inafiançável e imprescritível?

Para o relator, a divisão dos seres humanos em raças

decorre de um processo político, social e histórico de intolerância dos

homens. Dessa divisão socialmente construída resultaria a discriminação.

Para ele, é sob esta ótica (o racismo é um processo

político, social e histórico de intolerância) é que deve ser interpretado o

artigo 5º, XLII da Constituição. Não deve, portanto, ser interpretado sob a

ótica do que seja uma raça, já que, cientificamente, não existem raças.

O racismo, pois, para o relator, é uma valoração

negativa de um determinado grupo humano que tem por substrato

características semelhantes distintas do grupo dominante. Por esta

valoração negativa, deve-se dispensar tratamento desigual ao grupo assim

valorado negativamente, com relação ao grupo dominante.

Neste sentido, o relator aponta que o nazismo se

constitui uma prática racista com relação ao povo judeu porque propugna a

eliminação dos direitos dos judeus à cidadania, daí evoluindo para

barbáries que eliminam a dignidade do ser humano.

O relator ressalta que o racismo é prática inaceitável: o

respeito ao valor fundamental da pessoa humana é premissa básica do

Estado de Direito e sua desconsideração permite o surgimento de

Sociedades totalitárias.

55

Neste contexto, nada pode ser mais aviltante à

dignidade do homem que ser discriminado e inferiorizado no seu próprio

meio social.

Nas palavras do relator, a Constituição Federal dispõe

aos agentes de delitos desta natureza, pela gravidade e repulsividade da

ofensa, a cláusula da imprescritibilidade, para que fique permanentemente

verberado o repúdio e a abjeção da Sociedade nacional à sua prática.

Por outro lado, a previsão de liberdade de expressão

não assegura o direito à incitação ao racismo até porque um direito

individual não pode se opor aos Direitos da Humanidade.

O voto do Ministro Gilmar Mendes chama a atenção

para a teoria do discurso de ódio, salientando que “a discriminação racial

levada a efeito pelo exercício da liberdade de expressão compromete um

dos pilares do sistema democrático, a própria idéia de igualdade”. A seguir,

invocando o princípio da proporcionalidade, acompanhou o voto do relator

para o acórdão.

É oportuno notar que houve um extenso debate ao

longo do julgamento, no sentido de que se a publicação realizada pelo

paciente seria suscetível de efetivamente incitar a prática de racismo, ou

se, por absoluta insuficiência dos meios para a incitação ao racismo, não

seria o caso de se preservar a liberdade de expressão. Esta tese, contudo,

não foi acolhida pela maioria, que votou no sentido de que efetivamente a

liberdade de expressão não sobrepuja o direito à não discriminação racial.

56

3.1.2 Liberdade de informação versus dignidade humana

No caso do Agravo de instrumento n º 496406132, a TV

Globo de São Paulo Ltda interpôs agravo de instrumento contra decisão do

Tribunal de Justiça de São Paulo que não conheceu de recurso

extraordinário.

No âmbito do recurso, restou esclarecido que o Tribunal

de Justiça de São Paulo manteve a decisão de primeiro grau que condenou

a agravante ao pagamento de indenização por danos morais, por

considerar que a divulgação de fatos não devidamente checados

configurava irresponsabilidade e abuso do exercício da liberdade de

informar.

Na sua insurgência, a agravante sustentou que o teor

da condenação importa em restrição à liberdade de informação e a seu

corolário que é a liberdade de imprensa.

Ao analisar o recurso, o Ministro relator assinalou que o

Supremo Tribunal Federal, ao superar os antagonismos existentes entre

princípios constitucionais, deve utilizar critérios que lhe permita, sob uma

132 AI 496406/SP. Relator Ministro Celso de Mello. Agravante: TV Globo de São Paulo Ltda.

Agravado: Saulo da Costa Nunes e outros. Publicado no DJ 10/8/206 PP 00041. Assim ementado: “Caso Escola Base. Liberdade de informação. Prerrogativa constitucional que não se reveste de caráter absoluto. Situação de antagonismo entre o direito de informar e os postulados da dignidade da pessoa humana e da integridade da honra e da imagem. A liberdade de imprensa em face dos direitos da personalidade. Colisão entre direitos fundamentais, que se resolve, em cada caso, pelo método da ponderação concreta de valores. Magistério da doutrina. O exercício abusivo da liberdade de infromar, de que resulte injusto gravame ao patrimônio moral/material e à dignidade da pessoa lesada, assegura, ao ofendido, o direito à reparação civil, por efeito do que determina a própria Constituição da República (CF artigo 5º, inciso V e X). Inocorrência em tal hipótese de indevida restrição judicial à liberdade de imprensa. Não percepção do artigo 52 e do artigo 56, ambos da Lei de Imprensa, por incompatibilidade com a Constituição de 1988. Dano Moral. Ampla reparabiidade. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Exame soberano dos fatos e provas efetuados pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Matéria insuscetível de revisão em sede recursal extraordinária. Agravo de Instrumento improvido.”

57

perspectiva axiológica concreta, qual deve ser o direito a preponderar, sem,

com isso, esvaziar o conteúdo essencial dos direitos fundamentais.

A partir desta terceira premissa o relator reconheceu

que os direitos à personalidade, como os pertinentes à incolumidade da

honra e à preservação da dignidade pessoal dos seres humanos,

“representam limitações constitucionais externas à liberdade de expressão,

verdadeiros contrapesos à liberdade de informação”.

Neste contexto, a liberdade de informação não esvazia

o conteúdo de outras garantias constitucionais, muito menos o direito à

indenização por danos materiais, morais e à imagem.

O relator – citando o acórdão do Tribunal de Justiça de

São Paulo - assinalou que ninguém nega o direito de livre expressão à

atividade intelectual, artística, científica, e de comunicação independente de

censura ou licença (artigo 5º, IX e 220, parágrafos 1º e 2º). Porém, a

mesma Constituição assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida

privada, da honra e da imagem das pessoas, prevendo indenização em

caso de violado (artigo 5º. X).

Concluiu, assim, que se faz necessário encontrar o

ponto de equilíbrio entre estas previsões constitucionais, considerando o

princípio de unidade da Constituição e, ainda, a inexistência de direitos

absolutos.

Para ele, o equilíbrio consiste justamente no

entendimento de que os direitos da personalidade se constituem numa

limitação á liberdade de expressão e informação.

Considerando, pois, o significado especial dado pela

Constituição à dignidade da pessoa humana e aos direitos da

personalidade, concluiu o STF que estes se traduzem em limitações à

58

liberdade de expressão e de informação.

3.2 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE

Na dimensão sobre a fragilidade humana e a proteção

da integridade do ser humano é possível vislumbrar, duas linhas de

preocupação, a saber:

- a primeira, com relação à proteção à maternidade, a

infância e à adolescência; o direito ao amparo pelo sistema de seguridade

social; e a proteção à terceira idade; e

- a segunda com relação às garantias penais.

Para a presente monografia, a análise ateve-se

somente a parte da primeira linha de preocupação.

Observa-se que o Supremo Tribunal Federal vem

concretizando o princípio da dignidade da pessoa sob dois aspectos, a

saber:

a) de um lado, mostrando uma preocupação com o

direito à saúde, estabelecido no acórdão proferido nos autos do Agravo

Regimental em Recurso Extraordinário n º 271286/RS133 que determina a

distribuição gratuita de medicamentos a pessoa destituída de recursos

financeiras e portadora do vírus HIV134; bem como no aresto proferido nos

133 RE-AgR 271286/RS. Relator Ministro Celso de Mello Agravante: Município de Porto Alegre.

Agravada: Diná Rosa Vieira. Publicado no DJ 24/11/2000 PP 00101 e Ementário vol 02013-07 PP 01409.

134 Foram coletadas outras 67 decisões no mesmo sentido para doenças graves e dispendiosas, dentre as quais menciono: AI nº 507072/MG, Relator Ministro Joaquim Barbosa para pessoa com de esclerose lateral amiotrófica; o AI n º 570455/RS Relator Celso de Mello, referente a pessoa portadora de glaucoma crônico; e o RE n º 431150/ES Relator Ministro Sepúlveda Pertence, ligado ao caso de uma pessoa com esclerose múltipla.

59

autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n º 2435-3 RJ135, no qual se

considera constitucional a lei do Estado do Rio de Janeiro que obriga as

farmácias a dar descontos a idosos na compra de medicamentos;

b) de outro lado, a posição recente do Supremo Tribunal

Federal no sentido de permitir ao juiz de primeiro grau a concessão do

benefício assistencial previsto no artigo 203, V136 da Constituição Federal

nos casos em que a renda familiar é superior a ¼ do salário mínimo, apesar

do próprio Supremo anteriormente ter declarado a constitucionalidade do

artigo 20 e seu parágrafo 3º da Lei n º 8.742/93 nos autos da ADIn 1231,

publicada no ano de 2001.

Esta última posição do STF se externa por meio de

diversas decisões, dentre as quais se a analisa a proferida na Reclamação

n º 3805/SP137.

3.2.1 Direito à saúde

O Município de Porto Alegre interpôs agravo regimental

da decisão proferida em Recurso Extraordinário. Neste, por conta do

135 ADI 2435-3 MC /RJ. Relatora Ministra Ellen Gracie. Requerente: Confederação Nacional do

Comércio. Requerido: Governador do Estado do Rio de Janeiro. Publicada no DJ 31-10-2003 PP 00014 Ementário vol 02130 PP 0215. Assim ementada:” Ação Direta de Inconstitucioanalidade.. Lei 3542/01 do Estado do Rio de Janeiro, que obrigou farmácias e drogarias a conceder descontos a idosos na compra de medicamentos. Ausência de periculum in mora tendo em vista que a irreparabilidade dos danos decorrentes da suspensão ou não da lei se dá de forma irremediável, em prejuízo dos idosos, da sua saúde e da própria vida. Periculum in mora inverso. Relevância ademais do disposto no art. 230, caput da CF, que atribui à família, à Sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. Precedentes: ADI n° 2.163/RJ e ADI nº 107-8/AM. Ausência de plausibilidade jurídica na alegação de ofensa ao § 7º do art. 150 da Constituição Federal, tendo em vista que esse dispositivo estabelece mecanismo de restituição do tributo eventualmente pago a maior, em decorrência da concessão do desconto ao consumidor final. Precedente: ADI nº 1.851/AL. Matéria relativa à intervenção de Estado-membro no domínio econômico relegada ao exame do mérito da ação. Medida liminar indeferida.”

136 “Artigo 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (...) V- a garantia de um salário mínimo de beneficio mensal à portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

137 Rcl 3805/SP. Relatora Ministra Carmen Lucia. Reclamante: Instituto Nacional do Seguro Social, Reclamado: Juiz de Direito da 3ª Vara da Comarca de Jaboticabal. Publicada no DJ 18/10/2006 P 00041.

60

Município e do Estado do Rio Grande do Sul, foi assegurada a distribuição

gratuita de medicamentos à agravada. Tratava-se de pessoa portadora do

vírus HIV sem recursos financeiros para arcar com a compra dos remédios

vitais ao controle da doença.

Em suas razões de recorrer, o Município alegou falta de

previsão orçamentária específica e inobservância da repartição de

responsabilidades quanto ao custeio da saúde, que se estende também ao

governo federal.

Ao decidir, o Ministro relator apontou que a questão era

ou proteger o direito à vida e à saúde, que se qualifica como direito

subjetivo inalienável assegurado a todos pela Constituição da República

(artigo 5º caput e artigo 196), ou fazer prevalecer um interesse financeiro e

secundário do Estado. Ele entendeu, frente a este dilema, que razões de

ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só opção: a que privilegia o

respeito à vida e à saúde humana.

Com esta decisão, o Ministro vislumbrou a

concretização de preceito fundamental da Constituição da República (artigo

5º e artigo 196), traduzindo-se num gesto reverente e solidário de apreço à

vida e à saúde das pessoas, especialmente aquelas que nada têm e nada

possuem além da consciência de sua própria humanidade e da sua

essencial dignidade.

Já na Medida Cautelar em Ação Direta de

Inconstitucionalidade n º 2435/RJ, a Confederação Nacional do Comércio

impugnou a Lei n º 3542/01 do Estado do Rio de Janeiro que obrigava as

farmácias e drogarias situadas no referido estado a conceder descontos

para consumidores maiores de 60 anos, nos percentuais de 15% a 30% de

acordo com a idade do idoso.

Como argumento, a Confederação Nacional do

Comércio aduziu que a referida lei feria o princípio da livre iniciativa e

concorrência inseridos no art. 170, caput, da Constituição, constituindo-se

61

intervenção indevida do Estado na economia.

Aduziu, ainda, que houve violação do art. 3º, IV da

Constituição Federal, bem como do princípio da igualdade inserido no artigo

5º daquela norma, pois a lei discriminaria as pessoas de acordo com o

critério de idade.

Em sua defesa, o Estado do Rio de Janeiro aduziu que

a referida lei se insere em sua política em defesa das pessoas de terceira

idade, e amparou sua ação nos artigos 1º, III (dignidade da pessoa

humana); 3º, I (ser fundamento do Estado a construção de uma Sociedade

livre, justa e solidária) e 203 (que confere à família, à Sociedade e ao

Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando-lhes uma vida

digna), todos da Constituição.

A Ministra relatora entendeu que era caso de

indeferimento da medida liminar por ausência de “periculum in mora”. Para

ela, a irreparabilidade dos danos decorrentes da suspensão ou não da lei

se daria de forma irremediável, em prejuízo dos idosos, da sua saúde e da

própria vida, que se vêem beneficiados pela política de descontos.

Considerou, ainda, a relatora, que o perigo na demora

no julgamento do processo era reversa. Ponderou que o comando do art.

230, caput da CF, que atribui à família, à Sociedade e ao Estado o dever de

amparar as pessoas idosas, defendendo sua dignidade e bem-estar e

garantindo-lhes o direito à vida.

Ambas as decisões apontam pela existência de vetores

no sentido de que é necessário se preservar a dignidade da pessoa

humana em face da fragilidade de sua existência – doença e velhice.

Concluíram que essa preservação é responsabilidade tanto do Estado, em

qualquer de suas esferas, quanto da Sociedade.

Na última decisão, ainda que por maioria, é possível

dizer que ela foi inovadora ao apontar para uma possível atribuição de

responsabilidade ativa aos particulares para implementação dos direitos e

62

garantias individuais consubstanciadas na Constituição.

3.2.2 Amparo ao portador de deficiência e idoso

O Instituto Nacional do Seguro Social interpôs a

Reclamação n º 3805/SP contra ato do juiz de direito da 3ª Vara da

Comarca de Jaboticabal, que deferiu o benefício previsto no artigo 203, V

da Constituição Federal, para entidade familiar, composta por duas

pessoas, que recebia um salário mínimo mensal. Segundo a Autarquia

previdenciária, o valor era superior ao limite de ¼ do salário mínimo per

capita previsto no artigo 20 da Lei 8.742/1993 (que dispõe sobre a

assistência social). Afirmou que esta norma restritiva foi declarada

constitucional pelo STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade n º

1232/2001.

A Ministra relatora negou seguimento à reclamação,

aduzindo que o juiz “a quo” não descumpriu o teor do decidido pelo STF na

ADI 1232/2001.

Isto porque, para a Ministra, a pobreza extrema é a

marca de uma inferioridade com relação ao que é considerado como

normal e uma dependência com relação aos outros. É um estado de

exclusão que implica na ajuda permanente de outro. É, acima de tudo, feita

de humilhação e de privação.

Para ela, este estado de miséria é incompatível com a

dignidade da pessoa humana garantido pelo artigo 1º, III, da Constituição

da República, e a política definida para ignorar a miserabilidade de

brasileiros é incompatível com os princípios postos no artigo 3º e seu

incisos.

Neste quadro, concluiu a ministra, a sentença “a quo”

apenas teria dado cumprimento a Constituição da República, sendo, por

isso, mantida pelo STF, que é o seu guardião.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente Monografia teve como objeto a análise do

Principio da Dignidade Humana e a sua relação com a idéia de liberdade e

integridade com base em decisões do Supremo Tribunal Federal.

O seu objetivo foi o de analisar a posição do Supremo

Tribunal Federal nas questões que envolvem o Princípio da Dignidade da

Pessoa Humana no que tange a idéia de liberdade e integridade.

Para tanto, o Capítulo 1, fez uma discussão sobre a

idéia de princípio, analisando a organização normativa do Direito brasileiro,

finalizando com a idéia de norma como gênero que possui os princípios e

as regras como espécies. Destaca-se:

- Os princípios gerais pertencem ao Direito

Constitucional geral, isto é, ao Direito Constitucional como ciência universal.

São científicos, doutrinários. Podem ser aplicados, e o são, por qualquer

ordem estatal. Contêm postulados óbvios, unânimes e universalmente

compreendidos e aceitos, mantendo estreita ligação com a Ética, a Moral, e

a Lógica Jurídica.

- Os princípios constitucionais sensíveis serão aqueles

implícita e inquestionavelmente indicados pela Constituição. Sua violação

importa em imediata dir-se-ia automática reação. Exemplos dessa espécie

são os princípios contidos no art. 34, VII, da Constituição brasileira: se

contrariados, provocam a intervenção federal nos Estados.

- A norma constitucional, elemento de um sistema

dinâmica, interage com todo o sistema, dispondo, até mesmo, de uma

capacidade de aprendizagem para realizar, a cada momento, os

significados de outras normas sejam consentâneos com a realidade fática.

64

- O princípio é toda norma jurídica, enquanto

considerada como determinante de uma ou de muitas outras subordinadas,

já as regras ou preceitos são as normas particulares, dotadas de menor

generalidade, que, no entanto, assim como os princípios, apresentam

caráter de normatividade, a impor condutas.

No Capítulo 2, tratou-se de analisar o principio da

Dignidade da Pessoa Humana, destaca-se:

- O princípio da dignidade da pessoa humana encontra,

assim como direito à vida, alguns obstáculos no campo conceitual. Aliás,

em boa medida as dificuldades são aquelas próprias dos princípios, normas

que, como já se verificou, são extremamente abstratas, permitindo diversas

considerações, definições e enfoques os mais variados.

- Por outro lado, as categorias ser humano e Pessoa

Humana nem sempre foram tidas como sinônimas, e isto por que durante

algum tempo na história do homem somente alguns foram considerados

dotados do predicado Dignidade.

- Portanto, a categoria Dignidade pode ser

compreendida como qualidade daquele que é digno, superior, merecedor

de respeito e consideração. A Dignidade da Pessoa Humana, desta forma,

não pode ser aferida em valor monetário, não pode ser substituída por

qualquer outra coisa.

No Capítulo 3, tratou-se de fazer uma análise breve de

algumas decisões do Supremo Tribunal Federal no que tange a relação

com a idéia de liberdade e com integridade.

Quanto às hipóteses, observa-se:

A primeira hipótese: O princípio é uma norma jurídica

geral e as regras ou preceitos são as normas particulares, dotadas de

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menor generalidade, que, no entanto, assim como os princípios,

apresentam caráter de normatividade, a impor condutas. Foi confirmada.

A segunda hipótese: A Dignidade da Pessoa humana

nasce com ela. É inata, e inerente à sua essência. A Pessoa Humana já

nasce com integridade física e psíquica, mas que com o seu

desenvolvimento aspectos de sua personalidade têm de ser respeitados,

tais como seu pensamento, suas ações e seu comportamento, e isso

implica no respeito à sua liberdade, imagem, intimidade e consciência. Foi

confirmada.

Terceira hipótese: Considerando o significado dado

pela Constituição à dignidade da pessoa humana e aos direitos da

personalidade, o Supremo Tribunal Federal deve limitar a liberdade de

expressão e de informação. Foi confirmada.

Quarta hipótese: O que fera a integridade da pessoa

humana é incompatível com a sua dignidade, por isso, o Supremo Tribunal

Federal deve afastar qualquer ameaça a integridade da Pessoa. Foi

confirmada.

Quanto à Metodologia empregada foi utilizado o Método

Indutivo. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do

Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

Por derradeiro observa-se que a intenção do graduando

quanto ao trabalho desenvolvido foi o de cumprir uma tarefa exigida pela

legislação quanto à elaboração de um trabalho de conclusão de curso, bem

como não teve a intenção de abranger o tema na sua totalidade, mas,

poder contribuir com a discussão sobre a temática da dignidade humana.

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