o novo cÓdigo florestal brasileiro - uma analise das modificacoes e inovacÕes jurÍdicas À...

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FACULDADE SÃO LUCAS RAFAEL BANDEIRA DA SILVA O NOVO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO UMA ANÁLISE DAS MODIFICAÇÕES E INOVAÇÕES JURÍDICAS À PROTEÇÃO FLORESTAL Porto Velho 2013

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  • FACULDADE SO LUCAS

    RAFAEL BANDEIRA DA SILVA

    O NOVO CDIGO FLORESTAL BRASILEIROUMA ANLISE DAS MODIFICAES E INOVAES JURDICAS

    PROTEO FLORESTAL

    Porto Velho2013

  • RAFAEL BANDEIRA DA SILVA

    O NOVO CDIGO FLORESTAL BRASILEIROUMA ANLISE DAS MODIFICAES E INOVAES JURDICAS

    PROTEO FLORESTAL

    Monografia apresentada como exignciapara obteno do ttulo de Bacharel emDireito da Faculdade So Lucas do Cursode Direito.

    Orientador: Christian Norimitsu Ito

    Porto Velho2013

  • RAFAEL BANDEIRA DA SILVA

    O NOVO CDIGO FLORESTAL BRASILEIROUMA ANLISE DAS MODIFICAES E INOVAES JURDICAS

    PROTEO FLORESTAL

    Monografia apresentada como exigncia para obtenodo ttulo de Bacharel em Direito da Faculdade SoLucas do Curso de Direito.

    Banca Examinadora:

    .....................................................................................Prof.(a)

    .....................................................................................Prof.(a)

    .....................................................................................Prof.(a)

    .....................................................................................Prof.(a)

    .....................................................................................

    Conceito:

    .....................................................................................

    Porto Velho, .... de ......................... de ...........

  • DECICATRIA

    minha famlia, pela minhaausncia em alguns momentosenquanto estava dedicando-me aosestudos. minha querida esposa peloestmulo e apoio que me foi oferecidonos momentos em que mais precisei.Dedico este trabalho ao meu av porser um grande guerreiro e me ensinarcomo ser paciente.

  • AGRADECIMENTO

    Agradeo a Deus por me dar fora e sadepara conseguir terminar o curso de Direito.

    A todos os professores da Faculdade SoLucas que me ensinaram muito ao longo dessescinco anos.

    Aos meus colegas por cinco anos deamizade que levarei pelo resto da vida.

  • RESUMO

    Este trabalho tem como objetivo apresentar o Novo Cdigo FlorestalBrasileiro Lei 12.651/2012 e suas contribuies para a proteo do meio ambientee traz uma anlise das modificaes e inovaes jurdicas proteo florestal.Aborda os principais pontos da nova lei, em especial as reas de PreservaoPermanente, as reas de Reserva Legal e o Cadastro Ambiental Rural que foi umadas grandes inovaes do cdigo. Faz-se meno sobre o marco legal para aregularizao das propriedades, o que por muitos foi considerado verdadeira anistiaaos desmatadores. Ser feito um paralelo com o produtor rural e como estesinfluram na deciso de criao de uma nova lei.

    Palavras-chave:sustentabilidade proteo desenvolvimento recomposio - anistia

  • ABSTRACT

    This work aims to present the New Brazilian Forest Code - Law 12.651/2012and their contributions to protecting the environment and offers an analysis of thechanges and innovations legal protection forest. Covers the main points of the newlaw, especially the Permanent Preservation Areas, areas of Legal Reserve and RuralEnvironmental Registry which was one of the great innovations of the code. Mentionis made about the legal framework for the regularization of properties, which wasconsidered by many true amnesty to loggers. There will be a parallel with the farmerand how these have influenced the decision to create a new law.

    Keywords:sustainability - protection - development rebuilding - amnesty

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1: Relao de votos favorveis ao projeto por Partido.............................0000

    Figura 2: Delimitao das APP para cursos d'gua, nascentes e reservatrios artificiais................................................................................................................0000

    Figura 3: Representao das reas de APP que devem ser protegidas..............0000

    Figura 4: APP localizada na Estrada do Areia Branca a poucos quilmetros do Municpio de Porto Velho......................................................................................0000

    Figura 5: rea desmatada a poucos metros da APP mostrada na figura anterior..................................................................................................................0000

    Figura 6: rea de Reserva Legal em propriedade rural.......................................0000

  • SUMRIO

    INTRODUO.................................................................................................. 00

    1 PRINCPIOS DO NOVO CDIGO FLORESTAL BRASILEIRO................... 001.1 PRINCPIO DA COOPERAO ENTRE OS POVOS................................ 001.2 PRINCPIO DO DESENVOLVIMENTO ECONMICO............................... 001.3 PRINCPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL............................ 001.4 PRINCPIO DA PARTICIPAO................................................................. 001.5 PRINCPIO DA FUNO SCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE.......... 001.6 PRINCPIO DO POLUIDOR PAGADOR..................................................... 001.7 PRINCPIO DA PREVENO/PRECAUO............................................. 00

    2 AS REAS DE PRESERVAO PERMANETE (APP) E REAS DE USORESTRITO........................................................................................................ 002.1 AS REAS DE PRESERVAO PERMANENTE...................................... 002.1.1 reas de Preservao Permanente com a funo ambiental deproteo dos recursos hdricos......................................................................... 002.1.2 reas de Preservao Permanente com a funo ambiental deproteo da vegetao nativa e do solo........................................................... 002.1.3 Consideraes obre as APP..................................................................... 002.1.4 Da proteo das APP............................................................................... 002.1.5 Hipteses excepcionais de interveno e supresso das APP................ 002.2 AS REAS DE USO RESTRITO................................................................ 002.2.1 Dos apicuns e salgados........................................................................... 00

    3 A RESERVA LEGAL (RL).............................................................................. 003.1 PERCENTUAIS MNIMOS DE RESERVA LEGAL EM RELAO REA TOTAL DO IMVEL................................................................................ 003.3.1 Reserva Legal em regime de condomnio................................................ 00

  • 3.2 HIPTESES DE REDUO E AMPLIAO DE REAS DE RESERVA LEGAL............................................................................................................... 003.2.1 Reduo da rea de Reserva Legal........................................................ 003.2.2 Ampliao da rea de Reserva Legal...................................................... 003.3 CRITRIOS PARA LOCALIZAO DA REA DE RESERVA LEGAL ECMPUTO DAS APP........................................................................................ 003.3.1 Da localizao da rea de Reserva Legal................................................ 003.3.2 Do cmputo das APP................................................................................ 003.4 DA PROTEO DA RESERVA LEGAL...................................................... 00

    4 O CADASTRO AMBIENTAL RURAL (CAR)................................................. 004.1 SISTEMA DE CADASTRO AMBIENTAL RURAL........................................ 004.2 DESOBRIGAO DA AVERBAO DA RESERVA LEGAL NA MATRCULA DO IMVEL................................................................................. 00

    5 DAS REAS CONSOLIDADAS EM APPS E REAS DE RESERVALEGAL.............................................................................................................. 005.1 DAS REAS CONSOLIDADES EM REAS DE PRESERVAOPERMANENTE................................................................................................. 005.1.1 Parmetros para recomposio de reas consolidadas em APP at 22de julho de 2008................................................................................................ 005.1.2 Formas de recomposio das reas consolidadas em APP.................... 005.2 DAS REAS CONSOLIDADAS EM REA DE RESERVA LEGAL............. 00

    6 ANISTIA A DESMATADORES....................................................................... 006.1 MARCO LEGAL PARA A REGULARIZAO DE PROPRIEDADES.......... 006.2 RESERVA LEGAL....................................................................................... 006.3 CONVERSO DE MULTAS EM SERVIOS AMBIENTAIS........................ 006.4 O PROGRAMA DE REGULARIZAO AMBIENTAL (PRA)...................... 00

    CONCLUSO................................................................................................... 00

    OBRAS CONSULTADAS................................................................................. 00

  • 1INTRODUO

    O novo Cdigo Florestal Brasileiro, Lei n 12.651 de 25 maio de 2012, foi

    posteriormente alterado e complementado pela Lei n 12.727 e pelo Decreto n

    7.830, ambos de 17 de outubro de 2012. Este novo cdigo teve seu nascimento

    marcado por uma longa srie de debates e discusses entre os congressistas, a

    sociedade civil e o governo.

    Para chegar ao texto final do cdigo foi preciso mais de uma dcada de

    tramitao no Congresso Nacional, e pode-se dizer que sua verso final foi

    elaborada entre 2010 e 2012. O embrio do Cdigo Florestal Brasileiro foi criado

    atravs do Projeto de Lei n 1876/99 da Cmara dos Deputados, elaborado pelo

    deputado federal Srgio Carvalho do Partido Social Democrtico Brasileiro PSDB,

    de Rondnia. Na Comisso Especial da Cmara dos Deputados, teve como

    presidente o deputado Moacir Micheletto do Partido do Movimento Democrtico

    Brasileiro PMDB, do Paran, e em 2009 teve como relator o deputado Aldo Rebelo

    do Partido Comunista do Brasil PCdoB, de So Paulo.

    O deputado Aldo Rebelo percorreu o Brasil durante dois anos, nas capitais

    de todos os seus Estados e tambm em cidades pequenas. Foram realizadas

    reunies e audincia pblicas, onde foram ouvidas milhares de pessoas: produtores

    rurais, agrnomos, ex-ministros, cientistas, organizaes no governamentais

    (ONGs) ambientalistas, ribeirinhos, indgenas e os grandes empresrios rurais. O

    objetivo era promover a discusso de mudana do Cdigo Florestal para atender ao

    agronegcio.

    O texto passou por uma longa batalha at ser aprovado na Comisso

    Especial, pois do lado contrrio estavam os ambientalistas que atravs de ONGs

    exerceram presso buscando influenciar a sociedade civil e reas importantes do

    Poder Executivo para a no aprovao do texto. Pode-se dizer que foi aprovado

    mantendo-se uma proposta equilibrada, onde ficariam preservadas as florestas e as

    reas agriculturveis sob o ttulo de reas consolidadas (SODR, 2012, p.30).

    A aprovao do texto ocorreu com ampla maioria de votos na Comisso

    Especial e no plenrio da Cmara, vindo de vrios partidos polticos, e no s dos

    partidos ditos ruralistas, vencendo o agronegcio, haja vista que o nico partido que

    votou contra a aprovao foi o Partido Verde PV e o Partido Socialismo e

  • 2Liberdade - PSOL.

    Figura 1: Relao de votos favorveis ao projeto por Partido

    Uma vez que foi aprovado na Cmara dos Deputados, o texto seguiu para o

    Senado, por onde passou por quatro comisses. Trs comisses tiveram como

    relator o senador Luiz Henrique da Silveira, do PMDB de Santa Catarina, e uma

    comisso teve a relatoria do senador Jorge Viana do Partido dos Trabalhadores

    PT, do Acre. Ambos os relatores j foram governadores dos seus respectivos

    Estados.

    No Senado, o texto passou por inmeras audincias pblicas antes de sofrer

    modificaes. As audincias contaram com a participao de todos os segmentos

    interessados, foram ouvidos vrios ex-ministros do Meio Ambiente e da Agricultura.

    As modificaes ocorridas no Senado foram importantes, o que trouxe maior

    segurana jurdica no texto, como em questes de competncia de legislao

    concorrente sobre o meio ambiente. O texto ento foi aprovado por maioria de votos

    em todas as comisses, obtendo unanimidade de votos na Comisses de Agricultura

    e Reforma Agrria, o que demonstrava que este atendia aos interesses dos

    ruralistas.

    Uma vez aprovado no Senado, seguindo o rito parlamentar, o texto retornou

    Cmara dos Deputados para que a casa pudesse apreciar as modificaes. Nesse

    retorno, o relator foi o Deputado Paulo Piau do PMDB de Minas Gerais. Houve

  • 3divergncias entre as casas, pois o Senado alterou uma questo-chave aprovada

    pela maioria dos deputados: houve modificao de que as reas historicamente

    ocupadas em rea de Preservao Permanente (APP) estavam consolidadas. Mais

    uma vez foram realizadas vrias rodadas de negociaes, e ao final ficou claro que

    o texto ainda precisava de modificaes. O texto passou por nova votao, sendo

    aprovado pela maioria dos deputados e enviado para a apreciao e sano

    presidencial.

    O novo cdigo ento foi sancionado, mas com doze vetos e trinta e duas

    modificaes, passando a ser a Lei n 12.651 de 2012. Para suprimir esses

    dispositivos vetados, houve a edio da Media Provisria n 571/2012.

    O art. 61, considerado um dos artigos mais polmicos do novo cdigo foi

    vetado, sendo subdividido em 61-A, B e C. Este artigo foi modificado para prever a

    recuperao das APP beira de rio de acordo com o tamanho da propriedade, e no

    mais pelo tamanho do rio. Outro ponto importante foi a permisso de recomposio

    das APP com o plantio de rvores frutferas.

    A Medida Provisria foi encaminhada ao Congresso Nacional para ser

    apreciada e votada. Novamente houve um longo perodo de negociaes, sob a

    relatoria do senador Luiz Henrique da Silveira, e novas alteraes foram trazidas.

    Finalmente o novo Cdigo Florestal foi aprovado pelo Congresso Nacional.

    A MP 571/2012 foi convertida na Lei n 12.727 que trouxe mais alteraes

    Lei 12.651/2012, novamente sancionada pela Presidente com vetos, no total de

    nove. Para suprir as lacunas deixadas pelos vetos, foi editado o Decreto n 7.830, o

    que pode se tornar um problema futuro, pois no teve o condo de regulamentar,

    como da natureza dos decretos, e sim legislou, o que funo do Congresso

    Nacional. Houve novas alteraes no art. 61, como por exemplo, o veto no 3 do

    61-A, que autorizava a recomposio das APP somente com o uso de rvores

    frutferas.

    Apesar de todas as alteraes sofridas pelo novo Cdigo Florestal Brasileiro,

    alguns acreditam que esta lei representa um grande avano em termos ambientais,

    se comparado ao cdigo anterior. No entanto para quem pesquisa a fundo as

    mudanas, ver que o cdigo apresenta algumas deficincias que sero

    apresentadas ao longo desta pesquisa. Vejamos um comentrio nova lei:

  • 4Com a nova lei iremos subtrair da produo de alimentos reasagriculturveis sem contrapartida significativa para o meio ambiente e semum fundamento tcnico especfico. Em muitos casos teremos uma involuoda proteo ambiental. uma perda de ativos, no mnimo desnecessria.

    Defendemos com todo vigor a preservao das APPs e dasflorestas em geral, mas com objetividade, com lgica, e nunca jogando forareas agricultveis produtoras de alimentos que so um patrimnio dointeresse da coletividade, e no apenas do proprietrio. [] (SODR, 2012,p.38)

    Em seguida, o mesmo autor afirma:

    importante observar o enorme avano obtido no sentido depreservao das florestas. A situao anterior ao novo Cdigo Florestal eraa da existncia de uma legislao inaplicvel. Agora temos uma legislaoaltamente protecionista, mas realista e aplicvel na maioria dos casos. Emtermos de proteo ao meio ambiente tivemos um aumento significativo deproteo. Tivemos a confirmao do princpio de que as regras jurdicas noexistem para engessar o homem, mas para ser um instrumento praticvelque promova o bem comum, que seja realizvel e no apenas utpico.(SODR, 2012, p.40)

    Pelo comentrio apresentado, pode-se dizer que os debates anteriores

    criao do novo Cdigo Florestal Brasileiro foram marcados por duas posies

    opostas. De um lado estavam os ambientalistas cujo o objetivo maior que

    houvessem a conservao das florestas e que fossem realizados estudos tcnicos

    cientficos para embasar a mudana do Cdigo Florestal, pois alegavam que as

    reas desmatadas eram suficientes para aumentar a produo agrcola no Brasil.

    Os ambientalistas defendiam que um novo cdigo no era necessrio, pois o

    anterior fazia bem o seu papel, uma vez que protegia reas naturais que sustentam

    a vida e a economia do pas e que as alteraes trazidas pelo novo cdigo coloca

    em risco as reas naturais. Do outro lado, aqueles que defenderam a criao do

    novo cdigo entendem que o tema desenvolvimento sustentvel, ou ento a palavra

    sustentabilidade, so termos obrigatrios em assuntos que venham discutir sobre

    preservao ambiental alinhada com o crescimento econmico e que o tema deve

    ser alinhado com as mudanas trazidas pelo novo cdigo, o que ser benfico para

    os produtores, para o meio ambiente e para o pas.

    Para os que defendiam o novo Cdigo Florestal, a reforma se fazia

    necessrio, posto que a lei anterior colocava na ilegalidade 92% das propriedades

    rurais no Brasil (SODR, 2012, p.45). Reformar era uma necessidade para o pas,

    inclusive para se ter um marco legal vivel que permitisse atuar na preservao

  • 5ambiental de forma efetiva. (SODR, 2012, p.45)

    Para a Sociedade Brasileira para o Progresso da Cincia SBPC, a

    Academia Brasileira de Cincia ABC e o Grupo de Trabalho do Cdigo Florestal,

    um novo Cdigo Florestal deveria:

    Se fundamentar numa construo participativa, de consenso, comconsulta de todos os setores diretamente envolvidos com a temtica e quetodas as proposies feitas devero estar fundamentadas no conhecimentocientfico sobre o respectivo tema. [...]

    Dever estar fundamentado na viso integrada da propriedaderural, dentro da perspectiva de sua adequao ambiental, considerando asreas de produo agrcola, as reas de preservao e uso misto,incorporando para estas todas as possibilidades de Pagamento por ServiosAmbientais. (SILVA, 2011, p.88-89)

    Os posicionamentos postos na mesa de discusso traziam para o novo

    Cdigo Florestal mudanas significativas que estaremos discorrendo ao longo da

    monografia.

    1 PRINCPIOS DO NOVO CDIGO FLORESTAL BRASILEIRO

  • 6O texto original do artigo 1 da Lei 12.651/2012 que foi votado na Cmara

    dos Deputados, como na maioria dos primeiros artigos de outros cdigos,

    disciplinava claramente o objeto da presente lei, contudo no se preocupou em fixar

    os princpios que deveriam servir como base para interpretao e aplicao do

    cdigo. Isso fez com que o Senado mudasse o texto, entretanto o artigo foi vetado

    totalmente pela Presidente da Repblica. Segundo a Presidente, o texto

    apresentava imprecises, sem qualquer fundamento na Constituio Federal, ou

    seja, deixou de trazer um rol de princpios.

    O incio da composio de um ato legislativo deve ter como primeiro ponto a

    escolha dos valores e princpios que se deve consagrar, ou seja, o que se deseja

    infundir no ordenamento jurdico (NADER, 2007, p.200). So os princpios que vo

    dar consistncia ao direito a ser protegido. A qualidade da lei depende desses

    princpios.

    Maria Helena Diniz, sobre os princpios gerais do direito, destaca o seguinte

    entendimento:

    Os princpios gerais do direito, entendemos, no so os preceitosde ordem tica, poltica, sociolgica ou tcnica, mas elementoscomponentes do direito. So normas de valor genrico que orientam acompreenso do sistema jurdico, em sua aplicao e integrao, estejamou no positivas. [] (DINIZ, 2009, p.477)

    No direito, podemos observar ento que os princpios permitem que

    faamos a correta interpretao do sistema jurdico e que saibamos qual a melhor

    maneira de suprir as deficincias que possam surgir, ou seja, servem como

    instrumentos de orientao (SODR, 2012, p.57). Muitas vezes, diante de uma

    demanda judicial, os princpios podem se sobressair aos dispositivos de uma lei.

    Passarei a apresentar ento os princpios consagrados na Lei 12.651 para

    melhor entendimento deste novo cdigo.

    1.1 PRINCPIO DA COOPERAO ENTRE OS POVOS

    O princpio da cooperao entre os povos esta consignado na Constituio

    Federal de 1988, que apresenta previso deste princpio em seu artigo 4, inciso IX.

    H previso tambm no artigo 4 da Lei 6.938/81, combinados com os artigos 77 e

  • 778 da Lei 9.065/98.

    Este princpio est consagrado no novo Cdigo Florestal no artigo 1-A,

    inciso I, no qual o Brasil faz a afirmao de seu compromisso soberano com a

    preservao das suas florestas e demais formas de vegetao nativa, bem como da

    biodiversidade, do solo e dos recursos hdricos e da integridade do sistema

    climtico, para o bem estar das geraes presentes e futuras.

    Este princpio prev a cooperao entre os povos visando a preservao do

    meio ambiente. Na rea ambiental, destaca-se esse princpio pelo fato de que as

    agresses ao meio ambiente no ficam restritas ao limite territorial do pas em que

    ocorrem, mas pelo contrrio, podem espalhar-se entre os pases vizinhos

    (CHIUVITE, 2010, p.42).

    O Brasil um Estado independente e soberano, entretanto est relacionado

    com outros pases igualmente soberanos, por tratados e convenes internacionais

    onde todos se comprometem na prtica de preservao do meio ambiente.

    Antnio de Azevedo Sodr entende tambm que quando o artigo 1-A, inciso

    I da Lei 12.651, traz a expresso afirmar o compromisso soberano do Brasil[grifo nosso] com a preservao de suas florestas e demais formas de vegetao,isso lembra a importncia de afastarmos quaisquer interferncias aliengena na

    gesto das questes internas sobre a produo e da conservao da flora. O

    doutrinador afirma que nas ltimas dcadas, lobbies externos se esmeraram em

    querer ditar e influenciar os nossos governantes a legislar no no interesse nacional,

    mas sim de acordo com o interesse de produtores rurais de outros pases,

    especialmente norte-americanos e europeus interessados em reduzir a rea

    agriculturvel brasileira. (SODR, 2012, p.59).

    Diante do entendimento de Antnio Sodr podemos destacar tambm o

    princpio da soberania nacional.

    1.2 PRINCPIO DO DESENVOLVIMENTO ECONMICO

    O novo Cdigo Florestal traz o reconhecimento normativo da importncia

    das atividades relacionadas agricultura, pecuria e quelas dependentes ou

    relacionas vegetao, como imprescindveis para o desenvolvimento econmico e

    social do pas.

  • 8O inciso II do artigo 1-A traz a palavra agropecuria como funo de

    importncia estratgica para o crescimento econmico. O mais correto seria separar

    as atividades agrcolas e as de criao, porque no apenas a pecuria apta a

    figurar nesse patamar. A palavra agropecuria deve ento alcanar todos os tipos de

    criao de animais. (POLZIO JNIOR, 2012, p.9)

    Esse reconhecimento normativo se d pelo fato de o Brasil ter na sua

    produo agrcola um esteio. De acordo com o senso agropecurio do IBGE de

    2006, a produo agrcola brasileira ocupa 27% de todo territrio nacional e essa

    pequena parcela tem garantido alimentos para toda populao. Em 2011, o Brasil

    exportou U$ 94,958 bilhes, o que foi responsvel pelo supervit de dezenas de

    bilhes de dlares em nossa balana comercial. (SODR, 2012, p.60)

    No se pode esquecer que o princpio da ordem econmica conforme a

    Constituio Federal traz a defesa do meio ambiente como princpio que deve ser

    observado. Vejamos:

    Art. 170. A ordem econmica, fundada na valorizao do trabalhohumano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existncia digna,conforme os ditames da justia social, observados os seguintes princpios: [...]

    VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamentodiferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e servios e deseus processos de elaborao e prestao;[] (BRASIL, 1988)

    A ttulo de exemplo, a explorao econmica de um imvel rural em

    desacordo com as normas ambientais ser passvel de restries impostas pelo

    Poder Pblico, como a desapropriao em razo do descumprimento da funo

    socioambiental (LEHFELD, 2012, p.11), princpio este apresentado mais adiante.

    Portanto, o crescimento econmico deve ocorrer, mas sem comprometer a

    sustentabilidade ambiental.

    1.3 PRINCPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

    O Cdigo Florestal ratifica a tutela do meio ambiente esculpido na

  • 9Constituio Federal de 1988 no artigo 225:

    Art. 225. Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida,impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo epreserv-lo para as presentes e futuras geraes [grifo nosso].

    Esse princpio procura compatibilizar desenvolvimento econmico-social e

    preservao da qualidade do meio ambiente. Para que seja alcanado o

    desenvolvimento sustentvel, a proteo do meio ambiente deve constituir parte

    integrante do processo de desenvolvimento e no pode ser considerada

    isoladamente em relao a ele. (CHIUVITE, 2010, p.33).

    Existem vrios conceitos sobre desenvolvimento sustentvel, para este

    estudo adotamos o de Chiuvite, que de forma simplificada conceitua o

    desenvolvimento sustentvel como aquele que atende s necessidades do presente

    sem comprometer a possibilidade de as geraes futuras atenderem as suas

    prprias necessidades (CHIUVITE, 2010, p.34).

    O princpio do desenvolvimento sustentvel, alm de estar previsto em

    vrios dispositivos nacionais, tem previso tambm em mbito internacional.

    No Cdigo Florestal, este princpio trazido no inciso III, do artigo 1-A.

    Detalhe que este dispositivo traz no texto somente ao governamental de

    proteo e uso sustentvel das florestas, o que trata-se de uma evidente

    impropriedade, pois nos leva a entender que s haver ao governamental quando

    houver florestas, deixando de fora as demais formas de vegetao. A compreenso

    desse dispositivo deve compreender as florestas e as demais formas de vegetao.

    (POLZIO JNIOR, 2012, p.10)

    1.4 PRINCPIO DA PARTICIPAO

    Encontrado no inciso IV do artigo 1-A, que ratifica o artigo 225 da

    Constituio Federal. dever de todos os entes federados juntamente com a

    sociedade civil a defesa do meio ambiente, uma vez que a proteo ao meio

    ambiente direito de todos.

    Nesse sentido, quanto a competncia material, a tutela do meio ambiente

    comum a todos os entes da Federao. O artigo 23, incisos VI e VII da Constituio

  • 10

    Federal diz que competncia comum dos entes federados proteger o meio

    ambiente e combater a poluio em qualquer das suas formas, bem como preservar

    as florestas, a fauna e a flora. Quanto a competncia legislativa, em matria

    ambiental ela concorrente. Nos termos do artigo 24 da Constituio Federal, as

    unidades da federao podem legislar concorrente sobre produo e consumo,

    florestas, conservao da natureza, proteo ao meio ambiente, controle da

    poluio, responsabilizao por danos ocorridos ao meio ambiente, e outros . Os

    municpios possuem competncia suplementar, de acordo com o artigo 30 da

    constituio que atribui aos municpios competncia suplementar legislao

    federal e estadual quando couber. (LEHFELD, 2012, p.14-15)

    A participao da sociedade civil pode ocorrer das seguintes formas:

    A participao cidad d-se, formalmente, em razo da presenapor lei de representantes da sociedade civil nos principais rgosambientais (como por exemplo o Conselho Nacional do Meio Ambiente CONAMA) em por meio de instrumentos de democracia participativa, comoaudincias pblicas, consultas pblicas, projetos de iniciativas popular (art.14 da CF/1988, regulamentado pela Lei n. 9.709/1988), ao popularambiental (art. 5., LXXIII, da CF/1988), regulamentado pela Lei n.4.717/1965) e outros. (LEHFELD, 2012, p.15)

    Dessa maneira assegurado sociedade a participao no desenvolvimento do Cdigo

    Florestal.

    1.5 PRINCPIO DA FUNO SCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

    O princpio da funo socioambiental da propriedade, que vai alm do

    princpio da funo social da propriedade.

    O novo Cdigo Florestal Brasileiro, no caput do art. 2, traz a importante

    redao:

    Art. 2 As florestas existentes no territrio nacional e as demaisformas de vegetao nativa, reconhecidas de utilidade s terras querevestem, so bens de interesse comum a todos os habitantes do Pas ,[grifo nosso] exercendo-se os direitos de propriedade com as limitaes quea legislao em geral e especialmente esta Lei estabelecem.

    De acordo com o artigo em comento, as florestas e as demais formas de

    vegetao so consideradas como bens de interesse comum a todos os habitantes

    do pas, e em razo disso o exerccio do direito de propriedade sofre limitaes em

  • 11

    prol da coletividade.

    O artigo 1-A, , inciso III do Cdigo Florestal estabelece que a explorao

    da propriedade rural deve observar a proteo dos recursos ambientais,

    especialmente aqueles relacionados s florestas e vegetaes nativas.

    A Constituio Federal, no artigo 5, inciso XXIII afirma que a propriedade

    dever atender a funo social. O artigo 186 fixou os requisitos que a propriedade

    rural dever atender para cumprir a sua funo social, sob pena de desapropriao

    caso os requisitos deste artigo, que devem ser atendidos de forma simultnea, no

    sejam atendidos. J o artigo 225, 1, reafirma o que diz o Cdigo Florestal, onde

    todos tem direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso

    comum do povo, e portanto o Poder Pblico est incumbido de proteger este direito

    atravs de vrias aes.

    O Cdigo Civil Brasileiro, no artigo 1.228 e 1 determina que o proprietrio

    tem a faculdade de usar, gozar, dispor da coisa e reav-la, contudo este direito de

    propriedade deve ser exercido levando em conta a preservao ambiental. Vejamos

    o que diz este artigo:

    Art. 1.228. O proprietrio tem a faculdade de usar, gozar e disporda coisa, e o direito de reav-la do poder de quem quer que injustamente apossua ou detenha.

    1 O direito de propriedade deve ser exercido em consonnciacom as suas finalidades econmicas e sociais e de modo que sejampreservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, aflora, a fauna, as belezas naturais, o equilbrio ecolgico e opatrimnio histrico e artstico, bem como evitada a poluio do ar edas guas [grifo nosso]. (BRASIL, 2012)

    Os bens ambientais possuem duas caractersticas importantes: uma que

    so essenciais para a qualidade de vida e o outro que so bens de uso comum.

    Assim, so difusos, indivisveis, podendo ser gozados por toda e qualquer pessoa

    dentro dos limites constitucionais (LEHFELD, 2012, p.10).

    Importante dizer que bens de uso comum no podem ser confundidos como

    bens de domnios pblicos, pois o domnio de florestas podem ser pblico ou

    privado. Mas o que deve ser entendido que a expresso bens de interessecomum [grifo nosso] deve ser entendido como a faculdade constitucionalmentegarantida de exigir, administrativamente ou judicialmente, do titular do domnio

    florestal ou de outras formas de vegetao nativa que este mantenha preservada

  • 12

    (LEHFELD, 2012, p.10).

    Pelo princpio da funo socioambiental da propriedade, busca-se afirmar

    que o direito de propriedade deve ser exercido levando-se em conta a noo de

    sustentabilidade ambiental.

    1.6 PRINCPIO DO POLUIDOR PAGADOR

    Paulo Affonso Leme Machado leciona que:

    O uso dos recursos naturais pode ser gratuito como pode serpago. A raridade do recurso, o uso poluidor e a necessidade de prevenircatstrofes, entre outras coisas, podem levar cobrana do uso dosrecursos naturais. A valorizao econmica dos recursos naturais nopode ser admitida para excluir faixas da populao de baixa renda. Oprincpio do usurio-pagador contm tambm o princpio do poluidor-pagador, isto , aquele que obriga o poluidor a pagar a poluio quepode ser causada ou que j foi causada. (MACHADO apud POLZIOJNIOR, 2012, p.17)

    A origem deste princpio est baseado no direito econmico, com o

    reconhecimento de que o preo dos produtos deve compensar a degradao

    ambiental. Entretanto, este princpio no significa que est garantido o seu direito de

    poluir desde que o poluidor possa arcar com os custos, ou seja, esse princpio no

    visa legitimar a poluio.

    Este princpio possui duas rbitas de alcance: o carter preventivo, que

    busca evitar a ocorrncia de danos ambientais; e carter repressivo, que uma vez

    que o dano tenha ocorrido dever ser reparado.

    Na primeira rbita, impe-se ao poluidor o dever de arcar com as despesas

    da preveno dos danos ao meio ambiente que a sua atividade possa causar, pois

    cabe a ele o uso das ferramentas necessrias preveno dos danos. Na segunda

    rbita, este princpio impe que ocorrendo danos ao meio ambiente em razo da

    atividade desenvolvida, o poluidor ser responsvel pela sua reparao. O princpio

    do poluidor-pagador determina a incidncia e aplicao de alguns aspectos do

    regime jurdico da responsabilidade civil aos danos ambientais: a responsabilidade

    civil objetiva; a prioridade da reparao especfica do dano ambiental; solidariedade

    para suportar os danos causados ao meio ambiente. (FIORILLO apud POLTZIO

    JNIOR, 2012, p.18-19)

  • 13

    O princpio do poluidor-pagador est implcito no artigo 2, 1 do Cdigo

    Florestal que diz que s aes ou omisses contrrias disposio do cdigo

    florestal so consideradas uso irregular da propriedade, aplicando-se o

    procedimento sumrio do inciso II do artigo 275 do Cdigo de Processo Civil, sem

    prejuzo da responsabilidade civil nos termos da Lei n 6.938/19811 e das sanes

    administrativas, civis e penais.

    1.7 PRINCPIO DA PREVENO/PRECAUO

    Este princpio um dos mais importantes do direito ambiental, uma vez que

    os danos ambientais na maioria das vezes so irreversveis e irreparveis.

    O princpio da preveno no tem por objetivo imobilizar as atividades

    humanas. No se trata da preveno que tudo impede ou que tudo pode ocasionar

    catstrofes ou males, e sim garantir a sadia qualidade de vida das geraes futuras

    humanas e continuidade da natureza existente no planeta. (MACHADO apud

    POLZIO JNIOR, 2012, p.21)

    Para prevenir a ocorrncia dos danos, por exemplo, no caso de construo

    de um grande empreendimento, deve ser utilizado instrumentos para tanto, tais

    como o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatrio de Impacto no Meio Ambiente

    (EIA/Rima), incentivos fiscais e eventualmente uma legislao que possa impor

    severas multas e sanes como forma de prevenir aes danosas. O princpio da

    preveno trata de riscos ou impactos j conhecidos pela cincia, e aplicado com

    o objetivo de impedir a ocorrncia de danos ao meio ambiente, por meio de medidas

    de proteo antes da implantao de empreendimentos e atividades consideradas

    efetivas ou potencialmente poluidoras. (CHIUVITE, 2010, p.38)

    2 AS REAS DE PRESERVAO PERMANETE (APP) E REAS DE USO

    RESTRITO

    2.1 AS REAS DE PRESERVAO PERMANENTE

    1 LEI n 6.938, de 31 DE agosto de 1981 - Dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, seusfins e mecanismos de formulao e aplicao, e d outras providncias.

  • 14

    O artigo 3 do Cdigo Florestal conceitua rea de Preservao Permanente

    como partes de terras de valor inestimvel, na qual devem ser permanentemente

    preservadas a cobertura vegetal. Trata-se de espao territorial especialmente

    protegido. Na Constituio Federal, a proteo dessas reas esto previstas no

    artigo 225, 1, inciso III.

    As APP, que no Cdigo Florestal esto previstas no artigo 4, possuem

    caracterstica nica em relao aos demais espaos protegidos no que se refere ao

    ato de criao, pois o cdigo estabelece a proteo dessas reas pelo s efeito da

    lei, em funo de sua localizao, nos limites estabelecidos pelo prprio cdigo. As

    APP podem incidir sobre o patrimnio pblico e o privado. (LEHFELD, 2012, p.69)

    A funo das APP so de proteger reas cobertas ou no por vegetao

    nativa, com o papel ambiental de preservar os recursos hdricos, a paisagem, a

    estabilidade geolgica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gnico de fauna e flora,

    proteger o solo e assegurar o bem das populaes humanas.

    O artigo 4 do Cdigo Florestal que trata das APP, foi considerado um dos

    artigos mais polmicos da lei o que futuramente poder gerar maiores

    questionamentos na ordem jurdica.

    Segundo Sodr, provavelmente ser questionado o direito constitucional de

    propriedade, uma vez que a lei no pode prejudicar o direito adquirido, os efeitos da

    intertemporalidade2 das leis, a falta de isonomia, entre outros. O doutrinador entende

    que quanto as APP, observando o princpio da competncia, o mais correto seria

    deixar a cargo dos Estados legislar sobre o regime de proteo dessas reas,

    devendo-se levar em conta como a terra est sendo empregada, o relevo, a fora

    das guas na regio, a sinuosidade do curso d'gua, entre outros. (SODR, 2012,

    p.88)

    Outro ponto polmico com relao as APP que a preservao das reas

    agriculturveis no foram mantidas pelo Senado Federal, ao contrrio do primeiro

    texto aprovado na Cmara. Dessa forma, estima-se que dezenas de milhes de

    hectares fiquem na ilegalidade, o que implica na destruio das reas j

    agriculturveis j consolidadas, com nus exclusivamente dos agricultores, na busca

    2 Para facilitar a compreenso, a intertemporalidade da lei significa resolver o conceito da lei no tempo, conciliando a aplicao da lei nova com a anterior.

  • 15

    da preservao ambiental.

    Como forma de amenizar o problema, o Cdigo Florestal trouxe em suas

    disposies transitrias o artigo 61-A que autoriza a continuidade das atividades

    agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em reas j consolidadas em 22

    de julho de 2008 desde que requisitos sejam cumpridos. Mais adiante ser

    comentado sobre as reas consolidadas em APP.

    2.1.1 reas de Preservao Permanente com a funo ambiental de proteo dos

    recursos hdricos

    Em um primeiro momento, a proteo das APP decorre de sua funo

    ambiental de preservao dos recursos hdricos, decorrentes dos cursos d'gua

    corrente (artigo 4, incisos I a IV), e de gua parada, como lagos, lagoas naturais

    (inciso II) e reservatrios artificiais (inciso III).

    Nesse sentido, so reas de preservao permanente as faixas marginais

    de qualquer curso d'gua natural e perene e intermitente, excludos os efmeros,

    desde a borda da calha do leito regular, em largura mnima de: 30 metros, para

    curso d'gua de menos de 10 metros de largura; 50 metros, para curso d'gua que

    tenham de 10 a 50 metros de largura; 100 metros, para curso d'gua que tenham de

    50 a 200 metros de largura; 200 metros, para curso d'gua que tenham de 200 a 600

    metros de largura; 500 metros, para curso d'gua que tenham largura superior a 600

    metros.

    So tambm APP as reas no entorno de nascentes e olhos d'gua perenes,

    qualquer que seja a sua situao topogrfica, no raio mnimo de 50 metros (inciso

    IV). O artigo 3 do Cdigo Florestal traz o conceito de nascente em olhos d'gua,

    onde nascente so consideradas como o afloramento natural do lenol fretico que

    d origem a um curso d'gua, enquanto que olho d'gua consiste no afloramento

    natural do lenol fretico, mesmo que intermitente.

    O atual Cdigo Florestal estabelece a medida dessas reas a tomar como

    referncia a borda da calha do leito regular. Antes a medio dessas reas

    orientavam-se pelo Cdigo das guas, Decreto n 24.643/1943, que estabelecia

    como marco inicial de medio a linha da preamar mdia ou linha das enchentes

    ordinrias. Pela opo do Cdigo Florestal, a medio pela borda da calha do leito

  • 16

    regular implica reduo considervel das reas protegidas, com efeitos negativos do

    ponto de vista da biodiversidade, do controle das enchentes e do processo erosivo

    (JURAS apud LEHFELD, 2012, p.72).

    A funo ambiental das APP ao longo dos cursos d'gua relaciona-se

    diretamente com a manuteno do leito, prevenindo a sua extino, a queda de

    barrancos e encostas, bem como o assoreamento3. Constitui-se na importante

    preservao da vegetao que margeia os curso d'gua, lagos e reservatrios

    naturais ou artificiais. Essa vegetao conhecida como mata ciliar, que possui

    significado ambiental relevante, merecendo proteo legal.

    As matas ciliares possuem dupla funo: a primeira consiste em assegurar a

    estabilidade do solo, a partir de sua fixao, evitando desbarrancamentos e

    assoreamentos; a segunda funo biolgica, pois contribui para os estoque de

    nutrientes, graas a folhas e razes que chegam s guas. Alm dessas funes, a

    mata ciliar, com a cobertura das copas, ou mesmo com as vegetaes rasteiras e

    suas razes na linha da gua, ajuda na formao de espaos adequados para a

    multiplicao e proteo da fauna aqutica. (LEHFELD, 2012, p.73)

    So consideradas tambm APP as reas no entorno de lagos e lagoas

    naturais. O Cdigo Florestal determina a preservao de 100 metros, em zonas

    rurais, exceto para corpo d'gua com at 20 hectares de superfcie, cuja marginal

    ser de 50 metros. Para lagos e lagoas em reas urbanas, a preservao dever ser

    de trinta metros. Lagos consistem em guas paradas, que podem variar em

    tamanho, extenso e profundidade, cuja as guas podem ser provenientes de

    chuvas, de uma nascente ou at mesmo de um curso d'gua. Lagoas so lagos de

    pequena dimenso. A proteo dos lagos e lagoas se justifica por serem de fcil

    degradao ambiental, uma vez que suas guas se renovam lentamente.

    Por fim, so reas de Preservao Permanente as reas no entorno de

    reservatrios artificiais e as reas no entorno das nascentes e dos olhos d'gua

    perene, qualquer que seja a sua dimenso.

    As reas no entorno das nascentes e dos olhos d'gua perenes, qualquer

    que sejam a sua situao topogrfica, devem ser protegidos no raio mnimo de 50

    metros.

    3 Assoreamento a obstruo, por sedimentos, areia ou detritos quaisquer, de um esturio, rio, baa, lago ou canal. Este fenmeno consiste no princpio da desertificao.

  • 17

    Reservatrios so construes que servem para represar gua. Possuem

    mltiplas finalidades, como irrigao, produo de energia, dessedentao de

    animais, abastecimento humano, entre outros (LEHFELD, 2012, p.73). O cdigo no

    define os limites para APP no entorno de reservatrios, cuja a definio dos limites

    sero fixados por licena ambiental, ato administrativo, cujo o procedimento para

    obteno da licena submete-se s normas determinadas pela Lei n 6.938/1981 e

    resoluo CONAMA n 237/1997. Essa omisso resolvida pela Resoluo n

    302/2002 do CONAMA, que em seu artigo 3 delimita:

    Art. 3 Constitui rea de Preservao Permanente a rea comlargura mnima, em projeo horizontal, no entorno dos reservatriosartificiais, medida a partir do nvel mximo normal de:

    I - trinta metros para os reservatrios artificiais situados em reasurbanas consolidadas e cem metros para reas rurais;

    II - quinze metros, no mnimo, para os reservatrios artificiais degerao de energia eltrica com at dez hectares, sem prejuzo dacompensao ambiental.

    III - quinze metros, no mnimo, para reservatrios artificiais noutilizados em abastecimento pblico ou gerao de energia eltrica, comat vinte hectares de superfcie e localizados em rea rural. (BRASIL, 2013)

    A licena ambiental com a definio da faixa de preservao permanente

    depender de prvio estudo de impacto ambiental do empreendimento bem como de

    seu relatrio de impacto ambiental ao meio ambiente (EIA/RIMA).

    Figura 2: Delimitao das APP para cursos d'gua, nascentes e reservatrios artificiais

    2.1.2 reas de Preservao Permanente com a funo ambiental de proteo da

    vegetao nativa e do solo

  • 18

    Em um segundo momento, o Cdigo Florestal considera como APP aquelas

    com funo ambiental de proteo no s das florestas ou demais formas de

    vegetao, mas o solo no intuito de assegurar a estabilidade geolgica de

    determinadas reas como as encostas, as restingas, topos de morro, chapadas, os

    manguezais, reas de altitudes superiores a 1.800 metros e as veredas.

    De acordo com o Cdigo Florestal devem ser protegidos:

    As encostas ou partes destas com declividade superior a 45, equivalente a

    100% na linha de maior declive;

    As restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

    Os manguezais, em toda a sua extenso;

    As bordas dos tabuleiros ou chapadas, at a linha de ruptura do relevo, em

    faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projees horizontais;

    No topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mnima de 100

    (cem) metros e inclinao mdia maior que 25, as reas delimitadas a partir

    da curva de nvel correspondente a 2/3 (dois teros) da altura mnima da

    elevao sempre em relao base, sendo esta definida pelo plano

    horizontal determinado por plancie ou espelho dgua adjacente ou, nos

    relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais prximo da elevao;

    As reas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que

    seja a vegetao;

    Em veredas, a faixa marginal, em projeo horizontal, com largura mnima de

    50 (cinquenta) metros, a partir do espao permanentemente brejoso e

    encharcado.

    A proteo dessas reas refere-se diretamente funo do solo como bem

    ambiental, independente da presena de florestas ou demais formas de vegetao.

    Mesmo que no haja cobertura do solo, impe-se a proteo da rea nos termos e

    limites determinados pelo Cdigo Florestal. (LEHFELD, 2012, p.76)

  • 19

    Figura 3: Representao das reas de APP que devem ser protegidas

    2.1.3 Consideraes obre as APP

    Embora o Cdigo Florestal trate as APP como reas que so especialmente

    protegidas pela sua funo ambiental, seja para a proteo dos recursos hdricos e

    da vegetao nativa e do solo, o artigo 4, mais propriamente os seus pargrafos, e

    o artigo 5 merecem algumas consideraes:

    No caso de reas rurais com at 20 hectares, as reas no entorno dos

    reservatrios d'gua artificias tero no mnimo 15 metros (1 do artigo 4).

    Lembrando que a Resoluo n 302/2002 do CONAMA estabelece APP de

    100 metros para as reas rurais.

    Lagos e reservatrios em que fiquem situados em imvel rural ou urbano com

    rea menor que 1 hectare no precisam reservar faixa de proteo. A

    vegetao nativa deve ser preservada sendo vedada nova sua supresso

    (4 do artigo 4). Poder ocorrer supresso caso rgo ambiental autorize.

    Fica autorizado somente s pequenas propriedades ou posse ruralfamiliar [grifo nosso], o plantio de culturas temporrias e sazonais de vazantede ciclo curto na faixa de terra que fica exposta no perodo de vazante de rios

    e lagos, desde que no importe em desmate ou violao da fauna (5 do

  • 20

    artigo 4). o perodo de estiagem, onde a terra fica exposta, at que

    novamente as guas se elevem e fique submersa.

    De acordo com o 6, do artigo 4, os imveis de at 15 mdulos fiscais[grifo nosso] podem promover a prtica da aquicultura4 nos cursos d'gua e

    lagos, e fica admitido o emprego da infraestrutura fsica para o emprego

    dessa prtica, desde que sejam obedecidos os seguintes requisitos: I que

    sejam adotadas prticas sustentveis de acordo com as normas dos

    Conselhos Estaduais do Meio Ambiente; II esteja de acordo com os planos

    de bacias ou de recursos hdricos; III que tenha licena expedida pelo rgo

    ambiental competente; IV que o imvel rural esteja cadastrado no Cadastro

    Ambiental Rural (CAR).

    O artigo 5 estabelece que quando houver implantao de reservatrio de

    gua para a gerao de energia eltrica ou abastecimento pblico, conforme

    estabelecido em licenciamento ambiental, a faixa de entorno do reservatrio

    dever observar os limites fixados no caput deste artigo (faixa mnima de 30

    metros e mxima de 100 metros em rea rural, e faixa mnima de 15 metros e

    mxima de 30 metros em rea urbana), ficando obrigado o empreendedor a

    aquisio, desapropriao ou instituio de servido administrativa, conforme

    o que se revele melhor para a defesa do interesse pblico.

    O artigo 6 do Cdigo Florestal tambm merece destaque, pois alm do que

    foi considerado no artigo 4 como APP, ao chefe do Poder Executivo o legislador

    conferiu a prerrogativa de declarar como rea de Preservao Permanente, caso

    haja interesse social, que determinada rea seja permanentemente preservada, com

    o objetivo de conter a eroso do solo, mitigar riscos de enchentes, deslizamentos de

    terra e de rocha. Vladimir Polzio Jnior faz a seguinte crtica sobre este dispositivo:

    [] Na redao do dispositivo, contudo, h uma impropriedade dolegislador ao estabelecer ser necessrio interesse social para quedeterminada rea seja declarada, pelo Chefe do Poder Executivo, depreservao permanente e de interesse social. que o interesse social pressuposto para que se legitime a decretao de permanente preservao,no se podendo imaginar que um elemento autorizativo sirva comofundamento para seu prprio reconhecimento posterior. Explico: se a reafor de interesse social, ela pode ser declarada de preservao permanentejustamente porque j de interesse social, pois no o decreto que

    4 A aquicultura consiste na prtica de produo de organismos aquticos, como a criao depeixes, molsculos, crustceos e anfbios, seja em guas doces ou salgadas.

  • 21

    estabelece ser o local de interesse social. Na verdade, o interesse social anterior ao decreto, que apenas o reconhece. (POLZIO, 2012, p.66-67)

    2.1.4 Da proteo das APP

    As reas consideradas como de preservao permanente pelo Cdigo

    Florestal, ou declaras pelo Chefe do Executivo so bens ambientais de interesse

    comum, demandando uma responsabilidade solidria do Estado e da sociedade na

    sua proteo (LEHFELD, 2012, p.90) e devem ser mantidas pelo proprietrio,

    possuidor ou ocupante a qualquer ttulo, seja pessoa fsica ou jurdica, de direito

    pblico ou privado (artigo 7), pois de acordo com a Constituio Federal esses

    espaos territoriais so especialmente protegidos (artigo 225, inciso III, da CF/1988).

    O atual Cdigo Civil Brasileiro, define que proprietrio aquele que tem a

    faculdade de usar, gozar e dispor do bem, com o direito de reav-lo do poder de

    quem injustamente o possua ou detenha (artigo 1.228 do CC/2002); aquele que

    consta no cartrio de registro de imveis como dono do bem, que possui ttulo de

    aquisio. Possuidor quem aparentemente dono, mas que no possui ttulo de

    aquisio; o possuidor no proprietrio, somente tem a faculdade de usar e gozar

    da coisa, mas no tem o direito de dispor. O ocupante aquele que no o

    proprietrio ou possuidor, mas que, em nome dele, administra o bem. Fato que

    todos so responsveis pela manuteno da vegetao de uma rea de

    Preservao Permanente.

    Havendo supresso de vegetao situadas em APP, o proprietrio,

    possuidor ou ocupante a qualquer ttulo fica obrigado a promover a recomposio da

    vegetao, ressalvados os casos previstos em lei.

    Essa obrigao de recomposio das APP decorre tambm de mandamento

    constitucional, nos termos do artigo 225, 1, inciso I, que determina preservar e

    restaurar os processos ecolgicos essenciais e prover o manejo ecolgico das

    espcies e ecossistemas.

    A regra do Cdigo Florestal a no supresso de vegetao em APP, por

    isso o procedimento no deve ser facilitado. O artigo 8 do Cdigo Florestal que traz

    os casos excepcionais, devem ser interpretados de forma restritiva, sendo

    necessria autorizao do rgo ambiental competente.

    A obrigao de recomposio das APP so de direito real, chamada de

  • 22

    propter rem, portanto transmitida ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de

    transferncia de domnio ou posso do imvel rural. Isso significa que impe, quele

    que exercer de fato a administrao da rea, a responsabilizao pela restituio da

    rea suprimida. Assim, no ter razo aquele que justifica o desmate da rea que

    agora lhe foi adquirida imputando a supresso da vegetao ao antigo proprietrio

    ou possuidor, ou ainda a terceiros desconhecidos.

    Se a supresso ocorreu aps o dia 22 de julho de 2008, no sero

    concedidas novas autorizaes de supresso nas hipteses permitidas pelo Cdigo

    Florestal. A data fixada diz respeito ao momento de publicao do Decreto n 6.514

    que ocorreu em 22 de julho de 2008. No h qualquer fundamento jurdico para a

    fixao dessa data como limite para regularizao dos imveis rurais. A regra

    deveria ser aplicadas para todas as supresses irregulares em APP. (LEHFELD,

    2012, p.93).

    Figura 4: APP localizada na Estrada do Areia Branca a poucos quilmetros do Municpio de

    Porto Velho.

  • 23

    Figura 5: rea desmatada a poucos metros da APP mostrada na figura anterior

    2.1.5 Hipteses excepcionais de interveno e supresso das APP

    Como j foi dito, a regra trazida no Cdigo Florestal a no supresso das

    APP, porm sabemos que cada regra comporta suas excees.

    No caso das APP, a supresso de suas reas somente podero ocorrer

    quando se tratar de hipteses de utilidade pblica, interesse social ou de baixo

    impacto ambiental. O 4 do artigo 8 do cdigo veda o direito regularizao de

    futuras intervenes ou supresses de vegetao nativa. Este artigo afasta a

    possibilidade de futuras violaes, porm est implcito que todas as irregularidades

    havidas antes da vigncia da lei podero ser regularizadas (POLZIO, 2012, p.76).

    Para melhor entendimento dessas hipteses de interveno e supresso

    permitidas pelo cdigo em APP, se faz necessrio a compreenso dos termos

    utilidade pblica e interesse social, que aparentemente so sinnimos, mas

    apresentam significados diferentes. Lehfeld diferencia da seguinte forma:

    Utilidade pblica: condiz com a convenincia e oportunidade daAdministrao Pblica em qualificar determinadas atividades ou obras,dando-lhes, portanto, um regime de direito pblico, com todas as suasprerrogativas e sujeies decorrentes dos princpios da supremacia dointeresse pblico sobre o privado e indisponibilidade do interesse social.

    Interesse social: compreende a melhora da vida em sociedade,buscando reduzir, por exemplo, as desigualdades sociais. So atividadesque no se destinam ao interesse da Administrao Pblica ou de seusdelegados, mas sim coletividade. (LEHFELD, 2012, p.47)

    As atividades de baixo impacto ambiental so apresentadas no artigo 3,

  • 24

    inciso X do Cdigo Florestal. Importante observao se faz alnea k deste artigo,

    que considera atividades de baixo impacto ambiental outras aes ou atividades

    similares reconhecidas por ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA)

    ou dos Conselhos Estaduais do Meio Ambiente. Lehfeld entende como temerria a

    possibilidade de se considerar atravs de atos de rgo ambiental federal ou

    estadual atividades como de baixo impacto ambiental, uma vez que algumas

    entidades da Administrao Pblica submetem-se a um cdigo poltico-econmico

    que por vezes, no demanda participao democrticas em suas decises

    (LEHFELD, 2012, p.54-55).

    O artigo 3 do Cdigo Florestal traz exemplos de atividades que autorizam a

    supresso de APP por utilidade pblica, interesse social e baixo impacto ambiental:

    Utilidade pblica atividades de segurana nacional e proteo

    sanitria; obras de infraestrutura destinadas concesses de

    servios pblicos essenciais; obras de defesa civil; atividades que

    proporcionem melhorias na proteo de funes ambientais; outras

    atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas quando

    inexistir alternativa tcnica e locacional ao empreendimento proposto

    definidas em ato do Chefe do Poder Executivo Federal.

    Interesse social atividades imprescindveis proteo da

    integridade da vegetao nativa; a explorao agroflorestal

    sustentvel na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por

    povos ou comunidades tradicionais, desde que no descaracterize a

    cobertura vegetal e no prejudique a funo ambiental da rea;

    implantao de infraestrutura pblica, observadas a condies

    estabelecidas em lei; regularizao fundiria; implantao de

    instalaes necessrias captao e conduo de gua e de

    afluentes tratados, cujo os recursos hdricos so partes integrantes e

    essenciais da atividade; atividades de pesquisa e extrao de areia,

    argila, saibro e cascalho, desde que autorizadas por autoridade

    competente; outras atividades similares devidamente caracterizadas e

    motivadas em procedimento administrativo prprio quando inexistir

    alternativa tcnica e locacional atividade proposta, definidas em ato

  • 25

    do Chefe do Poder Executivo Federal.

    Atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental a abertura de

    pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhes, quando

    necessrias travessia de um curso dgua, ao acesso de pessoas e

    animais para a obteno de gua ou retirada de produtos oriundos

    das atividades de manejo agroflorestal sustentvel; implantao de

    instalaes necessrias captao e conduo de gua e efluentes

    tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da gua,

    quando couber; implantao de trilhas para o desenvolvimento do

    ecoturismo; construo de rampa de lanamento de barcos e

    pequeno ancoradouro; construo de moradia de agricultores

    familiares, remanescentes de comunidades quilombolas e outras

    populaes extrativistas e tradicionais em reas rurais, onde o

    abastecimento de gua se d pelo esforo prprio dos moradores;

    construo e manuteno de cercas em propriedades; pesquisa

    cientfica relativa a recursos ambientais, respeitados outros requisitos

    previstos na legislao aplicvel; coleta de produtos no madeireiros

    para fins de subsistncia e produo de mudas; plantio de espcies

    nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtos

    vegetais, desde que no implique supresso da vegetao existente

    nem prejudique a funo ambiental da rea; explorao agroflorestal

    e manejo florestal sustentvel, comunitrio e familiar, incluindo a

    extrao de produtos florestais no madeireiros, desde que no

    descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem

    prejudiquem a funo ambiental da rea; outras aes ou atividades

    similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental

    em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente ou dos Conselhos

    Estaduais de Meio Ambiente;

    2.2 AS REAS DE USO RESTRITO

    O Cdigo Florestal trata algumas reas como de uso restrito em razo de

    sua importncia ambiental e funo ecolgica (Captulo III, artigos 10 e 11). Essas

  • 26

    reas so passveis de explorao econmica, no se submetendo ao tratamento

    jurdico que o cdigo d explorao florestal, mas sim possui regime jurdico

    especfico, teoricamente mais rigoroso quando da utilizao de seus recursos

    ambientais.

    Esta categoria trata-se de uma inovao do novo Cdigo Florestal, visto que

    no existia no antigo. Sodr entende que as reas de uso restrito seriam

    enquadradas entre as APP, caracterizadas pelo seu carter inexplorvel, e os locais

    de explorao. (SODR, 2012, p.105)

    So consideradas reas de uso restrito o pantanal, as plancies pantaneiras

    e as reas de inclinao entre 25 e 45. Nessas reas so permitidas a explorao,

    mas de uso restrito.

    O Pantanal nasceu a cerca de 60 milhes de anos, quando a elevao da

    Cordilheira dos Andes criou uma barreira para as guas e possui o tamanho de 210

    mil km. Mais de dois teros dele fica entre os Estados do Mato Grosso e Mato

    Grosso do Sul, e a outra parte fica dividida entre a Bolvia e Paraguai. O Pantanal

    formado por campos inundados, brejos permanentes, manchas de matas, cercado

    em grande extenso por vegetao seca. Seu clima nitidamente tropical, mido e

    quente. (LEHFELD, 2012, p.104)

    No caso do Pantanal, a explorao somente ser permitida se ocorrer de

    maneira ecologicamente sustentvel e obedecendo as recomendaes tcnicas dos

    rgos oficiais de pesquisa. Entretanto, novas supresses de vegetao nativa ficam

    condicionadas autorizao do rgo estadual do meio ambiente.

    As recomendaes tcnicas partiro de rgos oficiais, e como h

    divergncia entre pesquisadores, importante que a legislao de cada estado

    busque solues lgicas e factveis. (SODR, 2012, p.105)

    Quanto as reas de inclinao entre 25 e 45, o cdigo abre a possibilidade

    de manejo sustentvel e o exerccio de atividades agrossilvipastoris e infraestrutura

    fsica a ela associada. Vale lembrar que em encostas com nvel de inclinao

    superior a 45 so consideradas como APP, sendo vedadas qualquer tipo de

    explorao ou supresso, salvo as situaes de utilidade pblica, de interesse social

    ou baixo impacto ambiental.

    O artigo 3, inciso VI do Cdigo Florestal conceitua manejo florestal como

    um conjunto de programas e aes para administrar a explorao da vegetao

  • 27

    natural para a obteno de benefcios econmicos, sociais e ambientais sociedade

    e ao Poder Pblico a partir da utilizao, cumulativa ou alternativamente, de

    espcies madeireiras ou no, de produtos e subprodutos da flora, e de outros bens e

    servios de natureza ambiental, com a manuteno do ecossistema do manejo[grifo nosso].

    J atividades agrossilvipastoris a combinao de rvores, cultura agrcola

    forrageira e/ou animais numa determinada rea e ao mesmo tempo, ou de forma

    sequencial. As atividades agrossilvipastoris nas encostas deve observar as boas

    prticas econmicas, consideradas aquelas que conciliem a produtividade

    agropecuria e florestal com a reduo de impactos ambientais, como forma de

    promoo do desenvolvimento ecologicamente sustentvel (LEHFELD, 2012,

    p.106). Essas prticas visam resultar na viabilidade econmica e social da atividade

    de baixo impacto ambiental, com a gerao de produtos saudveis e isentos de

    contaminao e resduos. Para isso deve ocorrer nas atividades agroeconmicas a

    aplicao de conhecimento e inovao tecnolgica no uso sustentvel dos recursos

    naturais para a produo.

    As reas de uso restrito, em razo de sua funo ecolgica, so objeto de

    programa de apoio e incentivo conservao do meio ambiente. O Cdigo Florestal

    em seu artigo 41, estabelece aes que visam incentivar ou mesmo retribuir aqueles

    que conservam essas reas.

    2.2.1 Dos apicuns e salgados

    Como desdobramento do Capitulo III, a Medida Provisria n 571/2012, que

    foi convertida na Lei n 12.727/2012 incluiu o Captulo III-A, dando tratamento

    jurdico pelo Cdigo Florestal aos apicuns e salgados, pois o projeto de lei da

    Cmara dos Deputados que aps a aprovao do texto foi enviado para o Senado

    Federal no trazia em sua redao original tratamento jurdico para essas reas.

    A zona costeira, considerada como patrimnio nacional possui como

    caracterstica a presena de solos salinos que so conhecidos como apicuns e

    salgados. De acordo com o artigo 3, inciso XV, do Cdigo Florestal, apicuns so

    reas de solos hipersalinos situadas nas regies entremars superiores, inundadas

    pelas mars de sizgias, que apresentam salinidade superior a 150 por 1.000,

  • 28

    desprovidas de vegetao vascular. J os salgados so reas situadas em regies

    com frequncia de inundaes intermedirias entre mars de sizgias e de

    quadratura, com solos cuja a salinidade varia entre 100 parte por 1.000, onde pode

    ocorrer a presena de vegetao herbcea especfica (artigo 3, inciso XIV).

    Essas reas podem ser utilizadas em atividades de carcinicultura e salinas.

    Carcinicultura refere-se a um ramo da aquicultura que consiste na criao de

    crustceos, especialmente camares, em cativeiros. Salina a rea de produo de

    sal marinho em razo da evaporao do mar ou de lago constitudo de gua

    salgada.

    O Cdigo Florestal apresenta os requisitos das atividades de carcinicultura e

    salinas e vale lembrar que, a explorao dessas atividades somente ocorrer aps

    licenciamento ambiental (artigo 11-A, inciso III), por se tratar de atividade de impacto

    ambiental, principalmente quanto aos processos ecolgicos essenciais dos

    manguezais e a necessidade de uso racional dos recursos naturais presentes nos

    apicuns e salgados. Acima de 50 hectares obrigatoriamente h a necessidade de

    estudo prvio de impacto ambiental e a apresentao do relatrio de impacto

    ambiental (EIA/RIMA). Se a rea for de at 50 hectares e no causar significativa

    degradao ao meio ambiente, haver a dispensa do EIA/RIMA.

    O 7 do artigo 11-A veda a manuteno, licenciamento ou regularizao de

    ocupao ou explorao irregular em apicum ou salgado, ressalvadas as excees

    previstas, como a possibilidade de regularizao das atividades e empreendimentos

    de carcinicultura e salinas cuja ocupao e implantao tenha ocorrido antes de 22

    de julho de 2008, nos termos do 6. (LEHFELD, 2012, p.122)

  • 29

    3 A RESERVA LEGAL (RL)

    A Reserva Legal um dos institutos jurdicos mais importantes para a

    efetivao de uma poltica de preservao florestal do pas (LEHFELD, 2012, p.128).

    O artigo 3, inciso III do Cdigo Florestal conceitua Reserva Legal como:

    rea localizada no interior de uma propriedade rural, delimitadanos termos do art. 12, com a funo de assegurar o uso econmico demodo sustentvel dos recursos naturais do imvel rural, auxiliar aconservao e reabilitao dos processos ecolgicos e promover aconservao da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteo de faunasilvestre e da flora nativa. (BRASIL, 2012)

    As reas de Reserva Legal so terras que, por imposio legal, devem ser

    naturalmente preservadas, pois o Cdigo Florestal detalha a sua delimitao e a

    forma de como deve acontecer a sua proteo.

    Essa imposio legal trata-se de restrio ao exerccio da propriedade que

    possui amparo constitucional, que determina que primeiramente o imvel deve

    cumprir a sua funo social, e depois afirma que o meio ambiente ecologicamente

  • 30

    equilibrado direito de todos. Temos assim consolidado o princpio da funo

    socioambiental da propriedade.

    A Reserva Legal, portanto, ser exigida de proprietrio ou possuidor de

    imvel rural. possvel a insero de Reserva Legal mediante lei municipal que no

    poder desobrigar a manuteno dessas reas nos percentuais definidos pelo

    Cdigo Florestal.

    Importante dizer que a manuteno de Reserva Legal pelo proprietrio de

    imvel rural no desobriga a manuteno de APP. No entanto, o Cdigo Florestal

    permite o cmputo das APP no clculo de percentual da Reserva Legal. Salienta-se

    tambm que a obrigao de destinao de parte do imvel para rea de Reserva

    Legal exigida pelo novo Cdigo Florestal continuam, parcialmente, com os mesmos

    limites exigidos pelo cdigo anterior.

    Quanto aos limites mnimos exigidos pelo cdigo para reas de Reserva

    Legal, h uma exceo no artigo 68 fixado nas disposies transitrias do Cdigo

    Florestal, que expressamente desobriga os proprietrios ou possuidores de

    recomporem, regenerarem ou compensarem as reas de Reserva Legal que tenham

    sidos suprimidas com observncia dos percentuais exigidos pela legislao vigente

    poca. Vale lembrar que para o proprietrio ou possuidor de imvel rural que

    possurem rea consolidada em Reserva Legal, mas que esteja amparado por

    legislao vigente poca, devero indicar meios de prova para a demonstrao da

    situao referida.

    Figura 6: rea de Reserva Legal em propriedade rural

  • 31

    3.1 PERCENTUAIS MNIMOS DE RESERVA LEGAL EM RELAO REA TOTAL

    DO IMVEL

    Os percentuais mnimos de Reserva Legal so estabelecidos pelo artigo 12,

    inciso I e II do novo Cdigo Florestal.

    Para imveis localizados na Amaznia Legal, os percentuais so:

    80%, quando situados em reas de florestas;

    35%, quando localizado em rea de cerrado;

    20% em reas de campos gerais.

    Nas demais regies do pas, o cdigo estabelece a exigncia de no mnimo

    20% de Reserva Legal da rea do imvel rural.

    O artigo 3 do Cdigo Florestal estabelece que a Amaznia Legal esta

    compreendida pelos Estados do Acre, Par, Amazonas, Roraima, Rondnia, Amap

    e Mato Grosso e as regies situadas ao norte do paralelo 13S, dos Estados do

    Tocantins e Gois, e ao oeste do meridiano de 44W, do Estado do Maranho.

    Dentro do ecossistema da Amaznia Legal, encontram-se as reas de florestas,

    cerrados e campos gerais, sendo que o cdigo determinou um percentual mnimo

    em relao rea do imvel rural localizado nessas regies para fins de Reserva

    Legal.

    As florestas so entidades fisionmicas de vegetao queoferecem uma extensa gama de comunidades vivas, radicalmentediferentes, em funo dos climas, dos solos e da repartio biogeogrfica deseus diversos componentes florsticos ou faunsticos (CHARBONNEAUapud LEHFELD, 2012, p.129-130). Cerrado o tipo de vegetao queocorre no Planalto Central Brasileiro, em certas partes da Amaznia e doNordeste, em terreno geralmente plano, caracterizado por rvores baixas earbustos espaados, associadas gramneas, tambm denominado decampo cerrado. um dos grandes biomas brasileiros que abrange vriosEstados, alm do Distrito Federal (MILAR apud LEHFELD, 2012, p.130).Campos Gerais, por sua vez, so terras planas, ou quase planas, emregies temperadas, tropicais ou subtropicais, de clima semirido ousubmido, cobertas de vegetao em que predominam as gramneas, svezes com presena de arbustos e espcies arbreas esparsas, habitadaspor animais corredores e pssaros de viso apurada e colorao protetora(Idem, Ibidem).

    Portanto, o imvel situado em alguma dessas reas devero obedecer esses

  • 32

    ndices.

    Outro ponto importante que em caso de fracionamento de imvel rural,

    inclusive para assentamentos de reforma agrria, o 1 do artigo 12 estabelece que

    ser considerada para efeitos de Reserva Legal, a rea do imvel rural antes do

    fracionamento, para fins de manuteno de rea com cobertura de vegetao nativa.

    As obras e atividades pblicas no esto sujeitas constituio de Reserva

    Legal, conforme os pargrafos 6 e 7 do artigo 12. Assim, empreendimentos de

    saneamento bsico, reas desapropriadas com o objetivo de implantar e ampliar

    rodovias e ferrovias, bem como reas adquiridas ou desapropriadas por detentor de

    concesso, permisso e autorizao de para explorao de energia hidrulica, por

    meio de infraestrutura fsica necessria, no submetem exigncia de Reserva

    Legal. Essa desobrigao justifica-se pela natureza pblica das obras e servios

    prestados, porm no se exclui da apreciao do Poder Pblico do princpio da

    eficincia na prestao dessas atividades, bem como da funo socioambiental da

    propriedade, o que inclui a utilizao racional dos recursos.

    3.3.1 Reserva Legal em regime de condomnio

    O cdigo anterior j permitia este instituto e o novo diploma tambm permite

    a instituio de Reserva Legal sob regime de condomnio.

    Sob este regime, pode os proprietrios ou possuidores de imvel rural que

    no possurem em seus imveis rurais percentual mnimo de Reserva Legal exigido

    pela lei, podero em conjunto adquirir outro imvel e destin-lo a compensar as

    Reservas de suas propriedades, respeitando o percentual mnimo previsto no artigo

    12 do Cdigo Florestal em relao a cada imvel, considerando inclusive o imvel

    adquirido para este fim.

    O Cdigo Florestal admite que no parcelamento de imveis rurais, a rea de

    Reserva Legal tambm poder ser agrupada sob o regime de condomnio.

    Esta forma de condomnio foi implantada no Estado de Rondnia no

    Municpio de Machadinho do Oeste, onde foram criadas 16 reservas florestais em

    bloco. (RONDNIA, 2012)

    3.2 HIPTESES DE REDUO E AMPLIAO DE REAS DE RESERVA LEGAL

  • 33

    3.2.1 Reduo da rea de Reserva Legal

    O Cdigo Florestal admite que o Poder Pblico Municipal reduza a rea de

    Reserva Legal em at 50%, para fins de recomposio em imvel localizado na rea

    de floresta da Amaznia Legal caso o municpio tiver mais de 50% da rea ocupada

    por unidades de conservao na natureza e por terras indgenas homologadas.

    Importante ressaltar que a permisso de reduo de rea de Reserva legal nesse

    caso ser apenas para fins de recomposio [grifo nosso], o que em tese a partirda vigncia do novo Cdigo Florestal fica proibido novos desmatamentos.

    O artigo 225, 1 da Constituio Federal incumbe ao Poder Pblico definir,

    em todas as unidades da Federao, espaos territoriais e seus componentes

    especialmente protegidos, sendo a sua alterao e supresso permitidas somente

    por lei, vedadas qualquer utilizao que comprometa a integridade dos atributos que

    justifiquem a sua proteo. Entre esses espaos territoriais a serem especialmente

    protegidos esto as unidades de conservao, que de acordo com o artigo 2, inciso

    I da Lei n 9.985/2000 :

    O espao territorial e seus recursos ambientais, incluindo asguas jurisdicionais, com caractersticas naturais relevantes, legalmenteinstitudas pelo Poder Pblico, com objetivos de conservao e limitesdefinidos, sob o regime especial de administrao, ao qual se aplicamgarantias adequadas de proteo. (BRASIL, 2000)

    Conforme o Estatuto do ndio (Lei n 6.001/1973), a Unio poder

    estabelecer em qualquer parte do territrio brasileiro reas reservadas posse e

    ocupao pelos ndios, nas quais eles possam viver e obter meios de subsistncia,

    com direito a usufruto e utilizao das riquezas naturais e dos bens nelas existentes,

    respeitadas as restries legais, como por exemplo, o prprio Cdigo Florestal. O

    Decreto n 1.775/1996 define os procedimentos administrativos para a demarcao

    das terras indgenas, onde fica responsvel a Fundao Nacional do ndio orientar a

    demarcao das terras indgenas com auxlio de grupo tcnico especializado,

    preferencialmente composto por servidores do prprio rgo federal.

    O Poder Pblico Estadual, de acordo com o artigo 12, 5 do Cdigo

    Florestal, ouvido o Conselho Estadual do Meio Ambiente poder tambm reduzir

  • 34

    para at 50% a rea de Reserva Legal de imvel situado em rea de Amaznia

    Legal, quando o Estado tiver Zoneamento Ecolgico-Econmico (ZEE) aprovado e

    mais de 65% do seu territrio ocupado por unidades de conservao da natureza de

    domnio pblico, devidamente regularizada e por terras indgenas homologadas.

    Zoneamento Ecolgico-Econmico, de acordo com o artigo 2 do Decreto n

    4.297/2002, trata-se de:

    Instrumento de organizao do territrio a ser obrigatoriamenteseguido na implantao de planos, obras e atividades pblicas e privadas, eestabelece medidas e padres de proteo ambiental, dos recursos hdricosde do solo e a conservao da biodiversidade, garantindo odesenvolvimento sustentvel e a melhoria das condies de vida dapopulao. (BRASIL, 2002)

    O ZEE estadual decorre de competncia administrativa comum e legislativa

    concorrente em matria ambiental atribuda pela Constituio Federal aos entes

    federativos, contudo deve levar em considerao a metodologia unificada

    estabelecido pela norma federal (Decreto n 4.297).

    facultado tambm ao Poder Pblico, quando indicado pelo ZEE, reduzir o

    percentual mnimo de Reserva Legal de 80% para at 50% de imveis com rea

    rural consolidada, exclusivamente para fins de sua regularizao por meio de

    recomposio, regenerao ou compensao da Reserva Legal, excludas as reas

    prioritrias para conservao da biodiversidade, dos recursos hdricos, bem como

    dos corredores ecolgicos.

    Nesse sentido, de acordo com o artigo 13, inciso I do Cdigo Florestal, o

    proprietrio ou possuidor de imvel rural que detinha, antes de 22 de julho de 2008,

    rea de Reserva Legal inferior aos limites estabelecidos no artigo 12, poder

    regularizar a sua situao.

    No caso de reduo da rea de Reserva Legal para at 50% exclusivamente

    para fins de regularizao de imvel com rea consolidada situado em rea de

    floresta na Amaznia Legal, o proprietrio ou possuidor que manter a Reserva Legal

    conservada e averbada em percentuais superiores aos exigidos, poder instituir

    servido ambiental sobre a rea excedente e Cota de Reserva Ambiental.

    A servido ambiental tem previso no artigo 9-A da Lei n 6.938/1981 com

    redao dada pelo prprio Cdigo Florestal (Lei n 12.651/2012, artigo 78). Poder

  • 35

    ser gratuita ou onerosa, perptua ou temporria, neste ltimo caso no prazo mnimo

    de 15 anos. Quando instituda a servido, o proprietrio ou possuidor abre mo da

    explorao da rea total ou parcial do imvel, ficando impedido de explorar

    economicamente seus recursos florestais. Vale lembrar que o instituto da servido

    no se aplicam as APP. A Cota de Reserva Ambiental (CRA) instituda no artigo 44

    do Cdigo Florestal, ttulo representativo de reas de vegetao nativa existente

    ou em processo de recuperao. O objetivo do CRA servir como ttulo que poder

    ser negociado no mercado, para atender a compensaes exigidas em lei. Aquele

    que estiver em dbito ambiental por no atenderem ao mnimo exigido de rea de

    Reserva Legal poder adquirir um ttulo de crdito de Cota de Reserva Ambiental

    daquele que possui o ttulo, como uma forma de compensar o prejuzo (LEHFELD,

    2012, p.44).

    3.2.2 Ampliao da rea de Reserva Legal

    De acordo com o artigo 13, inciso II, as reas de Reserva legal podem ser

    ampliadas em at 50% dos percentuais previstos no artigo 12 do Cdigo Florestal,

    com o objetivo de cumprir as metas internacionais de proteo da biodiversidade ou

    reduo de emisso de gases de efeito estufa.

    Antnio de Azevedo Sodr entende que a ampliao da Reserva Legal pelo

    Poder Executivo pode ter a sua constitucionalidade questionada, uma vez que

    somente poderia ocorrer em virtude de lei. Segundo o doutrinador, esta vedao

    vem disposta na prpria Constituio Federal em seu artigo 225, 1, inciso III.

    Vejamos:

    Art. 225. Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamenteequilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade devida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo epreserv-lo para as presentes e futuras geraes.

    [] 1 - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao

    Poder Pblico: [] III - definir, em todas as unidades da Federao, espaos

    territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo aalterao e a supresso permitidas somente atravs de lei [grifo nosso],vedada qualquer utilizao que comprometa a integridade dos atributos que

  • 36

    justifiquem sua proteo; (BRASIL, 2012)

    Por fim, entende que somente a lei poderia dispor sobre tal ampliao e no

    ato administrativo. Caso seja necessria a ampliao de rea de Reserva Legal por

    ordem de rgo do Poder Executivo utilizando-se do disposto no artigo 13, inciso II,

    do Cdigo Florestal, necessrio se faz haver compensao financeira ao proprietrio

    equivalente ao valor da rea ampliada e de sua produo comprovada. (ANTUNES

    apud SODR, 2012, p.121)

    3.3 CRITRIOS PARA LOCALIZAO DA REA DE RESERVA LEGAL E

    CMPUTO DAS APPS

    3.3.1 Da localizao da rea de Reserva Legal

    O artigo 14 do Cdigo Florestal estabelece os critrios para localizao da

    rea de Reserva Legal em uma propriedade. A escolha da rea de Reserva Legal

    no se d por livre disposio do proprietrio ou possuidor do imvel rural, mas sim

    por aprovao de rgo estadual integrante do SISNAMA ou instituio por ele

    habilitada. A localizao da Reserva Legal somente poder ser realizada aps a

    inscrio do imvel no Cadastro Ambiental Rural (CAR) que ser apresentado mais

    adiante.

    A escolha da rea de Reserva Legal dever conforme o cdigo, levar em

    considerao os seguintes estudos e critrios: o plano de bacias hidrogrficas; o

    Zoneamento-Ecolgico-Econmico; a formao de corredores ecolgicos com outra

    Reserva Legal; com APP; com unidades de conservao da biodiversidade; e com

    rea de maior fragilidade ambiental. Portanto, esta escolha se dar por ato

    discricionrio, com o objetivo de garantir a preservao de uma rea que contenha

    atributos de flora, fauna e minerais com relevncia, em detrimento de outras reas

    no interior da propriedade que no o possuam ou no o possuam em destaque

    (CARADORI apud LEHFELD, 2012, p.141).

    Antnio de Azevedo Sodr entende que este artigo trar pela frente srios

    problemas burocrticos, uma vez que em boa parte das propriedades a rea de

    Reserva Legal j esto estabelecidas. A lei determina que a localizao da rea de

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    Reserva Legal deve levar em considerao uma sria de critrios tcnicos, cabendo

    ao rgo estadual integrante do SISNAMA aprovar a sua localizao. O doutrinador

    interpreta o dispositivo entendendo que a escolha da Reserva Legal pelo rgo

    estadual no pode ser atribuda como obrigao, uma vez que o caput do artigo 14

    traz o termo levar em considerao [grifo nosso]. Este entendimento se reforatambm pela hiptese em que o Cdigo Florestal no obriga os proprietrios a

    recompor a Reserva Legal que esteja cumprindo ndices definidos em leis anteriores,

    da mesma forma entende-se que deve ser aplicado para o local onde elas j esto

    situadas. Portanto, os critrios estabelecidos para a localizao da Reserva Legal

    trazidos pelo novo Cdigo Florestal deve ser aplicado para reas que ainda no

    possuam Reserva Legal definida. (SODR, 2012, p.124)

    O 2 do artigo 14, veda a imposio de sanes administrativas ao

    proprietrio ou possuidor aps a protocolizao da documentao exigida para

    localizao da rea de Reserva Legal pelo rgo estadual competente, pois a

    eventual demora na apreciao do pedido de localizao da rea de Reserva Legal

    no pode ensejar em penalizao ao proprietrio ou possuidor do imvel rural.

    Lehfeld entende que o 2 carece de sustentao jurdica plausvel em

    virtude do sistema poltico-normativo de tutela ambiental, pois o mero protocolo no

    pode fundamentar a no aplicao de sanes administrativas devidas ao

    proprietrio ou possuidor de imvel rural quando descumpridas as exigncias legais

    relativas Reserva Legal. Este doutrinador entende que a aprovao da localizao

    da rea de Reserva Legal deveria ser tratado de forma mais rigorosa, atribuindo s

    autoridades ambientais responsabilidades pela demora em sua formalizao.

    (LEHFELD, 2012, p.142-143)

    3.3.2 Do cmputo das APP

    O anterior Cdigo Florestal somente admitia o cmputo das reas relativas

    vegetao nativa existente em APP no clculo percentual de Reserva Legal desde

    que no implicasse converso de novas reas para uso alternativo do solo, e

    quando a soma de vegetao em APP e Reserva Legal excedesse a 80% da

    propriedade localizada na Amaznia Legal; 50% da propriedade rural localizada nas

    demais regies do pas; e 25% da pequena propriedade rural. A atual legislao,

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    dispensa essa obrigatoriedade quanto no conservao de novas reas para uso

    alternativo do solo, quando as APP conservadas ou em processo de recuperao,

    somadas s demais florestas ou outras formas de vegetao nativa existentes no

    imvel localizado em reas de floresta na Amaznia Legal ultrapassarem 80%,

    conforme dispe o artigo 4, inciso I, do artigo 15.

    O cmputo somente ser admitido se observado os seguintes critrios: o

    benefcio no implique a converso de novas reas para uso alternativo do solo; a

    rea a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperao, conforme

    comprovao do proprietrio ao rgo ambiental estadual; e o proprietrio ou

    possuidor tenha requerido incluso do imvel no CAR.

    Mesmo sendo computada a APP, o seu regime de proteo no se altera, ou

    seja, continua prevalecendo as exigncias legais definidas no artigo 7 do Cdigo

    Florestal que estabelece o regime de proteo das APP, sendo vedada em regra a

    sua interveno ou supresso, ressalvadas as hipteses de utilidade pblica,

    interesse social ou atividade de baixo impacto ambiental (artigo 8).

    O Cdigo Florestal tambm admite que o proprietrio ou possuidor de imvel

    rural com Reserva Legal conservada e inscrita no CAR, na qual a rea ultrapasse o

    mnimo exigido pelo cdigo, poder esta utilizar a rea excedente para fins de

    constituio de servido ambiental, Cota de Reserva Ambiental (CRA) ou outros

    instrumentos congn