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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015 O mercado energético da União Europeia e as “campeãs nacionais”: uma ameaça para segurança energética? Arthur B. Rocco 1 Resumo A integração energética na União Europeia não é um fato novo, uma vez que o próprio processo de integração iniciou- se com o tratado da Comunidade do Carvão e do Aço em 1951. Faz-se necessário assinalar a complexidade do mercado europeu de energia uma vez que nele atuam vários agentes de diversas naturezas. A interação entre agentes como as Instituições europeias (Conselho, Parlamento, Comissão), os Estados, as empresas privadas, e os cidadãos, geram resultantes que influenciam na segurança energética, na competitividade econômica, na segurança ambiental. Este artigo torna-se relevante por evidenciar os principais entraves acerca da liberalização do mercado europeu de energia e demonstrar como as campeãs nacionais favorecem as relações bilaterais, de alguns estados membros, com a Rússia. Palavras-chave: Segurança energética; Mercado energético; Campeãs nacionais. Introdução A integração energética na União Europeia (UE) não é um fato novo, uma vez que o próprio processo de integração iniciou com o tratado da Comunidade do Carvão e do Aço em 1951. Naquele período o principal objetivo era promover a paz por meio da fusão de interesses, superando rivalidades e revanchismos existentes no território europeu. A securitização de energia entrou na agenda europeia durante os anos 70, devido ao "choque do petróleo" que gerou uma crise no fornecimento. O choque do petróleo consubstanciou-se em uma redução da oferta de petróleo resultando em um considerável aumento dos preços que colocou em risco o desenvolvimento econômico e o bem-estar dos cidadãos. Assim evidenciou-se a vulnerabilidade do mercado europeu da energia, naquele tempo completamente dependente de importação de gás e petróleo - este panorama não mudou atualmente a UE importa 53% do consumo de combustíveis fósseis 2 . Em vista de reduzir essa dependência a Comissão Europeia estipulou como uma das prioridades dos objetivos postos para 2020 as seguinte metas: redução de 20% nas emissões de CO2; incluir 20% de 1 Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Siena - Itália, atualmente regular do programa de Mestrado em Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Contato e-mail: [email protected]. 2 Agência Europeia de Estatística, EUROSTAT. Disponível em http://ec.europa.eu/eurostat/tgm/table.do?tab=table&init=1&language=en&pcode=tsdcc310&plugin=1 . Último acesso 25/07/2015.

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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

O mercado energético da União Europeia e as “campeãs nacionais”: uma

ameaça para segurança energética?

Arthur B. Rocco1

Resumo

A integração energética na União Europeia não é um fato novo, uma vez que o próprio processo de integração iniciou-

se com o tratado da Comunidade do Carvão e do Aço em 1951. Faz-se necessário assinalar a complexidade do mercado

europeu de energia uma vez que nele atuam vários agentes de diversas naturezas. A interação entre agentes como as

Instituições europeias (Conselho, Parlamento, Comissão), os Estados, as empresas privadas, e os cidadãos, geram

resultantes que influenciam na segurança energética, na competitividade econômica, na segurança ambiental. Este

artigo torna-se relevante por evidenciar os principais entraves acerca da liberalização do mercado europeu de energia e

demonstrar como as campeãs nacionais favorecem as relações bilaterais, de alguns estados membros, com a Rússia.

Palavras-chave: Segurança energética; Mercado energético; Campeãs nacionais.

Introdução

A integração energética na União Europeia (UE) não é um fato novo, uma vez que o próprio

processo de integração iniciou com o tratado da Comunidade do Carvão e do Aço em 1951.

Naquele período o principal objetivo era promover a paz por meio da fusão de interesses, superando

rivalidades e revanchismos existentes no território europeu.

A securitização de energia entrou na agenda europeia durante os anos 70, devido ao "choque do

petróleo" que gerou uma crise no fornecimento. O choque do petróleo consubstanciou-se em uma

redução da oferta de petróleo resultando em um considerável aumento dos preços que colocou em

risco o desenvolvimento econômico e o bem-estar dos cidadãos. Assim evidenciou-se a

vulnerabilidade do mercado europeu da energia, naquele tempo completamente dependente de

importação de gás e petróleo - este panorama não mudou atualmente a UE importa 53% do

consumo de combustíveis fósseis2.

Em vista de reduzir essa dependência a Comissão Europeia estipulou como uma das prioridades dos

objetivos postos para 2020 as seguinte metas: redução de 20% nas emissões de CO2; incluir 20% de

1 Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Siena - Itália, atualmente regular do programa de Mestrado

em Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Contato e-mail: [email protected]. 2 Agência Europeia de Estatística, EUROSTAT. Disponível em

http://ec.europa.eu/eurostat/tgm/table.do?tab=table&init=1&language=en&pcode=tsdcc310&plugin=1. Último acesso

25/07/2015.

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energias renováveis na matriz energética da UE; e poupar 20 % da energia através do aumento da

eficiência energética.

A questão acerca do mercado de energia, mais especificamente, gás e eletricidade, reemergiu

durante os anos 80, quando a Comissão Delors identificou a necessidade de reforçar o processo de

integração econômica. A comunicação publicada pela Comissão Europeia, em 1988, intitulada "O

mercado interno da energia", ressaltou a importância na redefinição de um novo modelo de mercado

diferente aquele que na época caracterizava-se pelo controle estatal.

Quanto ao tema da segurança energética, é importante considerar as duas dimensões, nacional e

supranacional, dentro disso observa-se que há uma assimetria entre Estados-Membros no que diz

respeito às fontes de energia, o nível de desenvolvimento econômico, a eficiência energética, a

densidade demográfica. Esses fatores determinam diferentes percepções de segurança que por sua

vez moldam políticas e estratégias a nível nacional e, consequentemente, impactam na segurança

energética de todo o bloco.

Ademais alguns países têm utilizado os recursos energéticos como ferramenta para promover seus

objetivos geopolíticos. Por exemplo a Rússia, o principal fornecedor da UE, que aumentou os

preços do gás para a Moldávia, a Ucrânia e a Bielorrússia entre os anos de 2005 e 2007, a fim de

aumentar os débitos desses países e assumir as suas principais empresas de energia e controlar dutos

e linhas de transmissão.

Emerge, assim, a necessidade de coordenar a política energética a nível europeu, com intuito de

reforçar as relações com os países de trânsito e países fornecedores, de forma a prover um

fornecimento contínuo a preços razoáveis, como condição para a manutenção do bem-estar dos

cidadãos e garanta da competitividade industrial.

Este artigo tem como principal objetivo apresentar a geopolítica energética no continente europeu, e

compreender o papel das “campeãs nacionais” como a GDF Suez, Eni, Eon Hurgas, Endesa

(França, Itália, Alemanha e Espanha, respectivamente). A pergunta central deste trabalho é: as

campeãs nacionais do setor energético são uma ameaça para a segurança energética do bloco

europeu?

Para responder a pergunta central este artigo foi dividido em quatro sessões além das sessões,

introdutória e conclusiva. Na primeira sessão serão expostos os conceitos centrais desta pesquisa,

enquanto que na segunda sessão será apresentado brevemente o panorama internacional da

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segurança energética. Já nas sessões três e quatro serão discutidos a formação das campeãs

nacionais e o processo de liberalização do mercado europeu de energia.

A Segurança Energética

Para discutir a questão da segurança energética, tanto a nível nacional quanto supranacional, é

necessário definir alguns conceitos centrais. Segurança energética não diz respeito somente ao

equilíbrio entre demanda e oferta. A segurança energética é uma condição prévia para o

crescimento económico e para a legitimidade do poder, como define Baumann (2008, p. 4).

“[...] Qualquer interrupção de um fluxo constante de energia seria maciçamente prejudicial à

produção econômica de uma nação, à estabilidade política e ao bem-estar pessoal de seus cidadãos.

As nossas sociedades são totalmente dependentes de serviços de energia, tais como postos de

gasolina ou eletricidade. Não apenas residências privadas, mas também o setor empresarial e até

mesmo as autoridades públicas e agências governamentais apresentam extrema necessidade de

energia para funcionarem corretamente. Assim, uma oferta satisfatória de energia é uma condição

prévia para o crescimento económico e também para a legitimidade dentro de uma entidade

política."

Nota-se nesta definição de segurança energética uma abordagem multidimensional, que vai além da

preocupação com a competitividade, sustentabilidade e fornecimento contínuo a preços razoáveis.

Assim, deve ser sublinhado que o fornecimento de energia pode afetar a segurança nacional em

vários aspectos, tais como as políticas econômicas, sociais, ambientais e em casos extremos

legitimidade do governo.

O livre mercado e a livre concorrência são características de uma economia aberta, e são princípios

reconhecidos como uns dos principais valores da UE. Durante os anos de 2004 e 2006 a Sra Neelie

Kroes, Comissária da UE para a concorrência "foi mencionada na primeira página do Financial

Times 18 vezes, e seis delas se referem a fusões que elevaram as tensões entre os países europeus."

(MOTTA, RUTA, 2007, p. 2).

Percebe-se uma espécie de paradoxo na política energética da UE, os obstáculos nacionais impedem

um mercado integrado de energia, nesse sentido Baumamn (2008, p. 8) afirma que "livre fluxo de

recursos e serviços de energia é um meio adequado para evitar interrupções no fornecimento de

curto prazo e incentivar a qualidade de serviços, bem como as inovações tecnológicas no âmbito da

UE."

A leitura da securitização energética da UE elenca algumas prioridades-chave como

sustentabilidade, competitividade e segurança de abastecimento. Assim, a segurança energética

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contempla não só o bem-estar dos cidadãos da UE, o desenvolvimento econômico, a política

industrial, a proteção do ambiente, mas também as questões militares uma vez que toca o mérito da

legitimidade política.

Vale a pena mencionar que "a maioria das ameaças viajam mais facilmente em distâncias curtas do

que longas, a interdependência de segurança é normalmente modelada em clusters regionais: como

os Complexos Regionais de Segurança" (BUZAN, WEAVER, 2003, p. 4). Segundo Buzan e

Weaver é possível destacar que a processo de securitização deve levar em conta a proximidade e o

que é percebido como ameaça. Outro ponto a ser levantado é a interdependência entre os atores

dentro do mesmo complexo de segurança; isto significa que a securitização de todo o bloco depende

da interação entre eles e também a interação entre cada ator e os atores internos e externos. Sendo

assim, faz-se necessário refletir sobre "Complexos Regionais de Segurança que tornaram-se

regimes de segurança ou comunidades de segurança, e o discurso de segurança se deslocou para

além dos estados e das questões militares." (BUZAN, WEAVER, 2003, p. 46). Por conseguinte, a

nova agenda de segurança não é baseado apenas em questões militares, controlada centralmente

pelos Estados, mas é multifacetada, abrangendo diversos atores em diferentes agendas como a

ambiental, energética, econômica, política, entre outras.

Sendo assim, identificou-se que o Estado deve proporcionar a segurança energética através de um

equilíbrio entre a oferta e a procura para evitar escassez, a volatilidade dos preços e ainda garantir a

vitalidade do setor industrial e um sistema político estável.

Dentro disso emerge a necessidade de definir o conceito de segurança, Dolghi (2010, p. 76) define

segurança da seguinte forma, a "segurança representa o estado de uma entidade que tem a

percepção de que não há ameaças diretas ou indiretas que podem afetar a sua existência, ou status".

Esta definição sobre segurança é central neste trabalho pois cada Estado-membro da UE percebe a

segurança energética de forma diferente, de modo que para securitizar seus interesses eles têm

adotado estratégias diferentes. Ainda sobre as diferentes percepções de segurança, Buzan e Weaver

(2003, p. 72) afirmam que

"o que um ator vê como uma ameaça não é necessariamente em si mesmo um ator e, assim, não é

necessariamente um sujeito de uma operação de contra-securitização. As reações em cadeia são

mais complicadas pois A pode identificar B como uma ameaça, com a qual C torna-se preocupado e

identifica A como uma ameaça."

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Conclui-se então que o fato da UE apresentar um bloco único formado por vários Estados inseridos

em um complexo processo de tomada de decisões conforma um desafio para a criação de uma

política energética coerente.

Panorama Internacional

É relevante descrever o panorama internacional, que têm pressionado a UE a reforçar a sua política

energética, para identificar as razões pelas quais a UE deve construir uma política energética sólida

e coerente. A fim de abordar este debate, é importante lançar luz sobre alguns padrões dos desafios

energéticos, principalmente, a disputa entre atores nessa arena que consubstancia-se na oferta

confiável e contínua a preços razoáveis. Assim, os países produtores ricos em recursos, como o gás

e o petróleo, visam maximizar as suas receitas. Enquanto países consumidores visam comprar

recursos energéticos a preços mais baratos para garantir a competitividade econômica, e o bem-estar

dos seus cidadãos. Nesse sentido, Gal Luft (2013, p. 1) menciona o discurso da ex-secretária de

Estado dos Estados Unidos Condoleezza Rice, que por sua vez destaca como as questões

energéticas tem influenciado a diplomacia no cenário internacional.

"Nós temos que fazer algo sobre o problema energético. Posso dizer-lhes que nada realmente me

surpreendeu mais, como Secretária de Estado, do que a maneira em que a política de energia esta

[...] “influenciando” a diplomacia ao redor do mundo. Ela tem dado um poder extraordinário a

alguns estados que não estão usando esse poder em boas maneiras para o sistema internacional,

estados que de outra forma teriam muito pouca poder. " (Condoleezza Rice discurso proferido antes

da Comissão de Relações Internacionais do Senado norte americano, em 5 de abril de 2006.)

Considerando as características da cadeia de abastecimento que envolve não apenas os

consumidores e os produtores, mas também os países de trânsito. No caso da UE, a Ucrânia, a

Moldávia e a Bielorrússia são os principais corredores do gás proveniente da Rússia. Acerca do

debate sobre esse descasamento entre os produtores e os países consumidores, é importante ressaltar

a dependência de recursos da UE. Para reduzir essa dependência, os líderes da UE devem abordar as

políticas de duas maneiras: pelo lado da demanda, isto significa reduzir o consumo pela

conscientização dos consumidores e elevando a eficiência energética; e do lado da oferta, a

diversificação das fontes, dos fornecedores e das rotas de gasodutos e redes de eletricidade. A

estratégia deve ser moldada tendo em conta a escassez de recursos e os desafios das mudanças

climáticas, nesse sentido Pascual e Zambetakis (2009, p. 17) sustentam que,

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"Para sair deste ciclo de volatilidade e, em seguida, os líderes nacionais terão de alterar a estrutura

dos mercados de energia e reduzir a dependência de combustíveis fósseis e exportações de

combustíveis como uma fonte de receita. Isso exigirá investimentos em conservação para reduzir a

demanda e expandir as fontes renováveis de energia. Sustentar tais investimentos exigirá sinais de

preços consistentes para a indústria, investidores e consumidores. E isso exigirá que os líderes

nacionais tomem ações que podem ter custos financeiros e políticos de curto prazo."

Ademais os países emergentes, principalmente a Índia e a China, elevaram consideravelmente seus

níveis de consumo de energia elevando os preços do mercado internacional. (LUFT, 2013, p. 6;

PASCUAL, ZAMBETAKIS, 2009, p. 10). No entanto, a principal razão dessa instabilidade dos

preços é resultado do "jogo"3 37, com base na gestão dos recursos entre países consumidores e

produtores sobre essa dinâmica Pascual e Zambetakis (2009, p. 11/12) afirmam que,

"Para os importadores líquidos, a diversificação de fontes de energia significará crescimento do uso

de energia renovável e maior conservação de energia. Para os exportadores, a diversificação

econômica interna será importante para reduzir a dependência das receitas de exportação. No

entanto, quando os preços de energia estão altos, os exportadores têm geralmente usado receitas

para consumir mais. Quando os preços da energia estão baixos, diminui consideravelmente a

disposição política de taxar a energia para criar incentivos para a conservação e a inovação".

Outro ponto importante é o desafio das mudança climáticas, as emissões de CO2 têm aumentado e

consequentemente agravado as negociações na arena do desenvolvimento sustentável. Outra

questão a ser destacada é o risco de uma nova "corrida armamentista", visto que a volatilidade dos

preços do petróleo e do gás na cena internacional, somados à instabilidade política e econômica em

alguns produtores e países de trânsito e aos desafios das mudanças climáticas têm levado alguns

Estados a recorrerem ao uso de energia nuclear. Este recurso energético implica no enriquecimento

de uranio fato que gera tensões diplomáticas e ameaça a estabilidade do sistema internacional.

A ameaça russa

Putin afirma em sua tese de doutorado que a recuperação econômica da Rússia deve ser orientada

pelo Estado. Visto que a Rússia é uma superpotência energética, o fluxo das exportações de gás e

3 Sobre esse "jogo" vale a pena mencionar , que "a participação no mercado global de energia dos países do Golfo

Pérsico é provável que aumente e isso não tem a ver só com a geologia, mas também com a gestão dos recursos.

Enquanto os países de fora do Oriente Médio estão bombeando a toda velocidade, os produtores do Oriente Médio,

muitos deles membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), tem utilizado uma quota para

produzir bem abaixo de suas capacidades. Isto significa que o petróleo não-OPEP está se esgotando quase duas vezes

mais rápido que a Opep. A Exxon Mobil Corporation estimou que a produção não-OPEP- o que inclui a Rússia e a

África Ocidental - atingirá o pico dentro de uma década [...]". Veja mais em Gal Luft , Relatório à NATO; A

dependência de Oriente Médio da Energia.

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petróleo deveria ser controlado pelo Estado e utilizado como ferramenta para promover os objetivos

geopolíticos do Kremlin. (BRADSHAW, 2009, p. 8). Alguns dos discursos de Putin são

significativos para lançar luz sobre sua ideologia nacionalista, e também para entender o processo

de construção das campeões nacionais russas durante seus mandatos como chefe de Estado.

“Gazprom é um elemento chave do sistema de segurança energética e seu potencial de exportação

dá a Rússia uma forte influência comercial e política no mundo”. Discurso de Putin durante a

celebração do décimo aniversário da Grazpom, 14 de fevereiro de 2003.

“[...] pretendemos manter o controle estatal sobre o sistema de dutos de gás da Gazprom e mais ... a

Comissão Europeia não deve ter ilusões. No setor do gás, eles vão ter que lidar com um discurso do

Estado “. Putin em 2006. (HELÉN 2010, p. 12).

“A Rússia vai manter o controle estatal sobre a rede de gasodutos em ex-repúblicas soviéticas”.

Discurso proferido durante uma conferência com o antigo primeiro ministro alemão Gerhard

Schroder, Yekaterinburg, 09 de outubro de 2003. (HELÉN 2010, p. 19).

Putin seguindo seus objetivos e sua ideologia realizou uma transformação completa do setor

petrolífero depois substituir Yeltsin. Assim, no final do governo de Yeltsin o setor de petróleo

baseava-se em treze grandes empresas verticalmente integradas e oito delas eram propriedade

privada, em comparação com o final do segundo mandato de Putin o total de empresas de petróleo

tinha sido reduzido para cinco. Não só a nacionalização das principais empresas de energia

caracterizaram o governo de Putin, mas também o alto controle exercido sobre o preço do gás. Por

exemplo, o serviço federal dos preços foi criado para orientar o preço praticado pela Gazprom no

mercado interno. Isso significa que o gás era ofertado a um preço artificialmente reduzido no

mercado interno, enquanto que o mercado externo o preço é conduzido de acordo com o interesse

da Rússia. Como consequência desta política as exportações para a Europa correspondem a um

terço da produção e a dois terços das receitas da Gazprom (KHRUSHCHEVA 2012, p. 160). Ou

seja, o bem-estar dos cidadãos e da competitividade industrial no território russo são garantidas pelo

alto preço das importações pagos pela UE.

Outro fator que ameaça a segurança energética da UE é a relação espinhos entre os principais países

fornecedores e países de trânsito, que refletiu nas crises do gás em 2006 e 2009. Desde o acordo

CIS a Rússia tem vendido gás a preços artificialmente baixos para Moldávia, Ucrânia e

Bielorrússia, apesar disso estes países não foram capazes de pagar por suas importações gerando um

enorme débito. Gromadzki (2007, p. 20) enfatiza um ponto crucial para descrever este cenário,

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“As revoluções coloridas na Ucrânia e na Geórgia e problemas com parceiros aparentemente leais

como a Bielorrússia fizeram o Kremlin perceber que os baixos preços do gás e do petróleo

oferecidos às antigas repúblicas soviéticas não eram uma garantia de controle político da Rússia

sobre eles.”

Quando a Ucrânia, a Moldávia e a Geórgia declararam seus planos de aderir à UE e à aliança Euro-

Atlântica determinou as mudanças na relação com a Rússia. Visto que o parlamento russo votou a

favor de que todos os membros da CEI deveriam pagar preços internacionais para o gás.

(GROMADZKI, 2007, p. 21). O quadro 1 ilustra os preços do gás praticado para alguns países de

trânsito das exportações para UE.

2005 2006 2007

Moldávia 80 110-160 170

Bielorrússia 47 47 100

Ucrânia 50 95 130

Quadro 1: Preço do gás pago pela Moldávia, Bielorrússia e Ucrânia 2005-2007 (USD).

Fonte: Gromadzki, Energy Game (2007).

Assim, percebe-se que a Rússia tem elevado o preço das commodities de energia vendidos a estes

países, que somados à falta de competitividade e à ineficiência energética resultaram em débitos

inacessíveis. Devido a estes débitos a Gazprom vem tomando os ativos das empresas de energia nos

países de trânsito. Por exemplo, em 2007, a Rússia controlava 63% da principal companhia de gás

da Moldávia; em 2011 a Bielorrússia cedeu 50% da Beltransgaz para Gazprom, além disso, 42% de

uma, das duas refinarias da Bielorrússia, foram tomadas; na Ucrânia quatro de seis companhias

petrolíferas foram assumidas pelas corporações russas algo entorno de 90% da produção de petróleo

ucraniana. (GROMADZKI, 2007, p. 26)

Em relação aos membros da UE é possível afirmar que a estratégia russa difere consideravelmente

de acordo com cada membro e seus interesses. As Repúblicas Bálticas (Lituânia, Letônia, Estônia)

apresentam uma vulnerabilidade considerável devido a alguns fatores como a infraestrutura

energética que foi construída no período soviético, a falta de recursos naturais e a classe política

corrupta. (GRIGAS, 2012, p. 3). O fator da identidade deve ser considerado como uma das mais

importantes ferramentas russas para exercer a sua influência nessa área, visto que a minoria russa

conta com 30% da população nessa região. Nesse sentido Grigas (2012, p. 9) afirma que

“A utilização do soft power da Rússia no Báltico é melhor exemplificado pela criação, manutenção

e suporte de redes de influência do Kremlin nas esferas cultural, econômica e política. A Rússia

mantém essas redes através da sua política nacionalista, construindo um legado soviético,

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beneficiando-se de uma população formada por minorias russas na Letônia e Estônia e ainda a

familiaridade das populações em todos os três Estados com a língua e a cultura russa”.

Em relação ao mercado de petróleo nessa região o abastecimento deveria ser fornecido por outros

fornecedores fato que reduziria a sua dependência. O principal poder de barganha desses países é o

corredor para transportar petróleo até Kaliningrado (território russo), que transporta o petróleo e o

gás da Rússia até Kaliningrado atravessando o território da Lituânia. Entretanto o mercado de gás é

limitado pela falta de infraestrutura, e ainda as empresas de gás Eesti, Latvijas Gaze, e Lietuvos

Dujos são controladas pela Gazprom. Nessa cenário tanto a falta de infraestrutura quanto a elevada

dependência dos produtos da Gazprom tornam o mercado de gás das Repúblicas Bálticas muito

rentável, uma vez que estes países são membros da UE e pagam preços internacionais de gás.

Também é relevante destacar que o processo de abertura do mercado energético estava ameaçando

os interesses da Gazprom nessa área, a fim de securitizar os interesses russos a Gazprom ofereceu

15% de desconto nos preços do gás para a Estônia e a Letônia forçando-os a escolher o “sistema de

transmissão independente “. (GRIGAS 2012, p. 11)

No que diz respeito ao mercado polaco, a Rússia fornece 91% do petróleo e 57% do gás, mas o

setor elétrico polonês é altamente dependente do carvão e é considerada um dos mais altos níveis de

emissão de CO2 de todo o bloco. O Sistema Europeu de Comércio de Licenças de Emissão

Emissões da União Europeia (EU-ETS) tem pressionado a mudança para outras fontes como o gás,

o que pode aumentar a dependência polaca sobre os recursos russos. A fim de reduzir a

vulnerabilidade a Polônia está iniciando a exploração do gás de xisto, mas até agora tem enfrentado

barreiras como os interesses dos ambientalistas.

Além disso, a Alemanha – o maior importador de recursos da Rússia – construiu um oleoduto em

parceria com a Rússia, o corredor Norte Stream; evitando passar através das Repúblicas Bálticas e

da Polônia, a fim de transportar o petróleo diretamente para Kaliningrado e Alemanha. Esse

gasoduto aumenta a vulnerabilidade destes países, por exemplo, o fluxo que atravessava a Polônia

foi reduzido, e as repúblicas bálticas foram isoladas reduzindo o poder de barganha frente aos

interesses dos russos. Considerando o mercado alemão, é possível afirmar que há equilíbrio nessa

relação; isso significa que, de um lado a Alemanha é o maior importador de gás russo e, por outro

lado, a Alemanha é o maior credor internacional russo. (HELÉN 2010, p. 22).

A Polônia, as Repúblicas Bálticas, e outros países menores (politicamente falando) ficaram isolados

e mais vulneráveis, por isso eles tem apoiado a Comissão Europeia no que diz respeito à criação de

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um mercado europeu de energia integrado, mas para isso terão que superar a resistência da

Alemanha e da França.

A formação das Campeãs Nacionais

O conceito de campeões nacionais não está definido de modo uniforme pela literatura. Entretanto é

possível concordar com as características levantadas por Neven Damien (2007, p. 1) : "se refere a

empresas que são objeto de um tratamento especial por parte dos governos, pois apresentam alguma

dimensão nacional em sua operação". A Organização para a Cooperação Econômica e

Desenvolvimento (OCDE) em sua visão geral sobre a Política de Concorrência, da Política

Industrial e Campeões Nacionais lança luz sobre esses conceitos. Mesmo sem uma definição precisa

sobre o conceito de campeões nacionais, é possível afirmar que campeões nacionais são

organizações apoiadas pelos Estados de várias maneiras como encorajadores de fusões nacionais,

ou auxílios estatais (acesso ao crédito, obstáculos na regulamentação), ou para evitar a tomada de

uma empresa nacional por uma corporação estrangeira. (OCDE 2009, p.8).

No entanto, é fácil ser mal interpretado, ou pior do que isso, utilizar esses argumentos para fomentar

uma política protecionista. Assim, as principais diferenças em relação à política industrial e

campeões nacionais é que, o primeiro objetiva melhorar o bem-estar dos consumidores a longo

prazo por meio da correção de falhas de mercado, melhorando a competitividade da indústria

nacional, favorecendo uma indústria inovadora, que seja intensiva em conhecimento a fim de

promover desenvolvimento Econômico. (OCDE, 2009, p. 15). O segundo visa criar uma forte

organização nacional por meio de fusões, a fim de proteger o mercado nacional, algumas vezes isso

é um discurso que não é pautada por motivos econômicos, mas sim por uma política protecionista

que visa securitizar os interesses nacionais, não levando em consideração a eficiência nem as falhas

de mercado, nem o futuro bem-estar dos cidadãos.

Quanto aos efeitos negativos das fusões ou monopólios nas estruturas de mercado devem ser

clarificadas; nesse sentido, André Luiz et al (2007, p. 2) afirmam, que "as estruturas de mercado

altamente concentradas são, pois, consideradas indesejáveis por razões de ineficiência". Outro

ponto levantado por André Luiz et al (2007, p. 3) é que "em qualquer caso, o resultado do exercício

de poder de mercado é uma transferência de riqueza dos compradores a vendedores ou uma má

alocação de recursos". Nesse sentido, é possível argumentar que, em condições de mercado com

uma forte concorrência, as organizações ineficientes são obrigadas a deixar o mercado, caso não

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obtenham auxílios estatais. Assim, no longo prazo, a eficiência do setor energético poderia ser

aprimorada por meio de uma concorrência forte.

Ainda considerando os aspectos negativos das fusões, por exemplo acerca dos postos de trabalho o

argumento é que, fusões podem levar a uma racionalização das atividades oque poderia ameaçar o

emprego local. Já acerca da estrutura de mercado, alega-se que as concentrações verticais em um

mercado já concentrado poderia levar a um maior poder de mercado e os preços consequentemente

seriam mais elevados.

Os governos exercem alguma influência sobre a política de fusão, mesmo que instituições

independentes regulem o mercado; e, finalmente, os diferentes interesses dentro da sociedade tem

sido securitizados através de lobbies promovidos por grupos organizados (MOTTA, RUTA, 2007,

p. 8). Em relação ao fato de que os Estados tem encorajado as fusões internas no setor energético

André Luís et al (2007, p. 5) destacam que "o processo de fusões e/ou aquisições no setor elétrico, a

teoria econômica recomenda que o controle e regulação de tais atos de concentração devem ser

mais severos do que em outros setores da economia". Assim, afirma-se que os rendimentos

daqueles que comercializam em regime de concentração de mercado implica em perdas para os

consumidores, portanto como resultado da ausência de competição tem-se um mercado ineficiente.

Outros fatores chave como: o tamanho do mercado e a localização geográfica; as autoridades

reguladoras nacionais; os interesses governamentais; e o nível da abertura do ambiente econômico,

são alguns determinantes nessa cadeia que caracterizam o processo de construção de campeões

nacionais.

Alguns argumentos positivos foram encontrados na literatura e devem ser ressaltados a fim de

compreender como os Estados têm modelado suas estratégias nacionais. Em primeiro lugar, trata-se

de um argumento subjetivo, pois as pessoas tendem a confiar mais em organizações nacionais,

especialmente quando se está ligada a questões de segurança como a energia. Assim, alguns

políticos tomadores de decisão têm utilizado esse fator, a fim de moldar a opinião pública nacional.

(MOTTA, RUTA, 2007, p.18). Em segundo lugar, pode ser identificada como uma razão

econômica, ou seja, preços mais baixos poderiam ser ofertados por meio de fusões verticais pois

aumentaria a eficiência por meio da comercialização vertical resultando em menores custos. (DA

SILVA LEITE et al, 2007, p. 11). Em terceiro lugar, as fusões também podem afetar os postos de

trabalho de positivamente. Por exemplo, alguma organização de sucesso poderia comprar (parte ou

por inteiro) outra mais ineficiente, em dificuldades financeiras, nesse sentido os empregos locais

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seriam protegidos.4

Examinando os campeões nacionais de energia dentro das fronteiras da UE, o caso alemão pode ser

considerado um dos casos mais emblemáticos. Para começar com a Eon, é uma empresa que tem

negócios em vários setores como a energia (eletricidade e gás natural), telecomunicações, produtos

químicos e, além disso, é o primeiro fornecedor de eletricidade e gás na Alemanha e Reino Unido.

Caracteriza-se como uma empresa verticalmente integrada (geração, transmissão, fornecedora), e

suas atividades fora da Alemanha estão concentradas no Reino Unido, Suécia, Itália, Hungria,

Polônia, República Checa, Lituânia. (CODOGNET et al, 2003, p. 23/25).

A Rhurgas, por sua vez, foi a maior empresa de gás alemã, isso significa que; que tem a maior rede

de gasodutos e a maior capacidade de armazenamento de todos os concorrentes do mercado alemão

de gás, 60% do gás alemão é comercializado através de gasodutos da Rhurgas. Além disso, esta

empresa tem contratos com os principais países que fornecem gás para Alemanha como Rússia,

Noruega, Reino Unido e Países Baixos (CODOGNET et al, 2003, p. 23/25).

O processo de fusão iniciou-se em julho de 2001, quando a Eon começou a comprar ações dos

acionistas da Rhurgas. Assim, em janeiro de 2002, o Bundeskartelammt (autoridade de

concorrência relevante) e a Monopolkomission (papel consultivo) bloqueou a aquisição da

participação majoritária na Gelsenberg, consequentemente bloqueando todo o processo de fusão

entre a Eon e Rhurgas. Apesar deste veto por parte da autoridade nacional da concorrência em

fevereiro de 2002 a Eon continuou determinada a levar a cabo o processo de fusão, usando

argumentos persuasivos (segurança da oferta, a competitividade internacional, a salvaguarda do

emprego no setor da energia, e as metas ambientais) (LIEB-DÓCZY, 2002). Então por meio de um

decreto ministerial, que ignorou veto anterior, em julho de 2002 o Ministério da Economia alemão

permitiu que a fusão fosse realizada.5 Essa permissão foi dada com algumas condições impostas

pelo ministro alemão, como facilitar o acesso dos concorrentes às redes de gasodutos da Eon-

Rhurgas e também forçou a venda de ações, que garantiam participações em outras empresas

(MOTTA, RUTA, 2007 p. 9/11)6.

4 European Foundation for the Improvement of living and Working Conditions. Case Studies: The Consequences of

mergers and acquisitions, 2. 2008 http://www.eurofound.europa.eu/docs/erm/tn0810016s/tn0810016s.pdf Accessed:

April 23, 2013. ! 5 Veja mais em; Codgnet Marc- Kevin, Glachant Jean-Michel, et. All. Mergers and Acquisitions. 23-25. Motta

Massimo, Ruta Michele. Mergers and National Champions, 9-11. Andre Luís da Silva Leite, Nivalde J. de Castro,

Maria Isabel R. T. Soares. Electric Sector Mergers and Acquisitions 11-12. 6 Veja mais em; Codgnet Marc- Kevin, Glachant Jean-Michel, et. All. Mergers and Acquisitions. 23-25. Andre Luís da

Silva Leite, Nivalde J. de Castro, Maria Isabel R. T. Soares. Electric Sector Mergers and Acquisitions 11-12.

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Em 2012 a Eon gerou um total de 132 bilhões de euros em vendas, empregando mais de 72.000

pessoas e diversificando suas atividades (renováveis, geração de energia, gás natural, distribuição,

comercialização de energia, varejo e distribuição) também ampliou suas atividades para o Brasil,

Turquia e Norte da África.7 Além disso, tornou-se o maior acionista estrangeiro da Gazprom.

(HELÉN, 2013, p. 12) Assim, no final desta fusão a Eon passou a controlar toda a cadeia do

mercado de energia (produção, importações, redes e varejo). Evidenciou-se, desse processo de

fusão, que o regulador foi influenciado pelos interesses nacionais.

Faz-se importante frisar que as campeãs nacionais Eon e Gazprom têm uma relação de parceria, "o

campeão nacional Alemanha é o maior acionista estrangeiro da Gazprom (6,5%)" (HELÉN, 2013,

p. 12). Acerca dessa relação amigável entre Alemanha e a Rússia Smith (2008, p. 23) ressalta "a

E.ON Ruhrgas e outras empresas de energia alemãs têm sido concedido o acesso ao setor

estratégico da Rússia, onde poucas outras empresas ocidentais estão autorizados a operar". Ainda

sobre as campeãs nacionais, é importante citar o fato que, essa relação especial não é um privilégio

alemão, países como a Espanha, Itália e França também utilizam da negociação de posições

favorecidas bilateralmente com a Rússia utilizando suas campeãs nacionais como ENDESA, ENI,

GDF -SUEZ, respectivamente. Nesse sentido é importante notar o discurso de Konstantin

Kosachev8

"Nós estamos saturados e cansados de lidar com burocratas de Bruxelas. Na Alemanha, Itália,

França, podemos conseguir muito mais. A UE não é uma instituição que contribui para o nosso

relacionamento, mas uma instituição que retarda o progresso."

Dentro desse contexto a Comissão Europeia está pressionando pela integração do mercado de

energia, esse projeto tem sido apoiado pelo Reino Unido, pela Finlândia, pelas Repúblicas bálticas e

a Polônia, enquanto que outros membros como Itália, Espanha, Alemanha e França estão

negociando de forma bilateral com o principal fornecedor da UE. Concluindo, finca nítido que a

estratégia russa tem como objetivo principal utilizar sua campeã nacional para negociar de forma

bilateral e assim dividir e enfraquecer a posição do bloco.

A Comissão Europeia tem tomado medidas contra a estatal russa, Gazprom. Em 04 de setembro de

2012, a Comissão abriu um processo antitruste contra a Gazprom, com base no artigo 102.º do

7 EON website http://www.eon.com/en/about-us/profile.html. Accessed July 20, 2013

8 The chair at the Duma`s international committee. apud Mark Leonard and Popescu Nicu. “A power audit of EU-

Russia relations”. European Council on Foreign Relations ecfr.eu. November 2007. Accessed May 13 2013,

http://ecfr.eu/page/-/ECFR-02_A_POWER_AUDIT_OF_EU-RUSSIA_RELATIONS.pdf . ECFR interview in

Moscow, 4 July 2007. apud Mark Leonard and Popescu Nicu, “A power audit of EU- Russia relations”

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Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE). Nesse procedimento a Gazprom está

sendo investigada pela prática abusiva de uma posição dominante nos mercados de gás, na Europa

Central e no Leste Europeu.9 Mais especificamente a Gazprom foi acusada: de ter impedido a

diversificação do abastecimento de gás; por praticar preços não equitativos, e injustos anexando o

preço do gás ao do petróleo.10

Nesse sentido Sartori (2013, p. 9) afirma que

"De acordo com os detratores da Rússia, este é o resultado da estratégia da Gazprom de dividir a

UE em duas partes. Por um lado, a empresa disse ter desenvolvido relações bilaterais preferenciais

com clientes-chave europeus ocidentais, aos quais dá algumas concessões, em particular a

concessão de preços de gás mais baratos e melhores condições contratuais. Por outro lado, a

Gazprom disse ter estabelecido as práticas comerciais desleais que resultam em preços mais

elevados e forte dependência de gás na Europa Oriental, a fim de preservar a alavancagem

econômica da Rússia e exercer a sua influência política na região."

É relevante notar que este procedimento não é contra Gazprom mas faz parte de uma política mais

ampla que consiste na abertura dos mercados de eletricidade e de gás dentro das fronteiras da UE.

Vale ressaltar também que outras empresas de energia estão sendo investigadas (GDF, ENDESA, a

ENI, Eon Rhurgas, RWE, OMV).

No entanto, é importante notar que a Gazprom tem conseguido aumentar a dependência energética

do bloco europeu. A empresa russa tem promovido a diversificação das rotas (construindo novos

gasodutos: North Stream, South Stream, Yamal-Europa e comprando ações em gasodutos como o

Wingas64 alemão e o BBL65). Ademais a Gazprom tem reforçado a sua posição por meio de

aquisições no setor de armazenamento, a fim de combater as discrepâncias cíclicas de consumo e

evitar interrupções no fluxo de abastecimento durante os picos sazonais. (SARTORI, 2013, p. 8).

Certamente este procedimento legal foi percebido como uma ameaça para os interesses russos, ao

qual Putin respondeu prontamente por meio de uma ordem executiva chamada "On Measures to

protect Russia Federation Interest in Russia Legal Entities` Foreign Economic Activities". Este

documento listou algumas empresas estratégicas (Gazprom foi incluída), e essas empresas e suas

subsidiárias, ficaram proibidas de conceder informações às autoridades estrangeiras sem antes a

autorização do respectivo órgão executivo federal, e sob aprovação do governo russo (SARTORI,

2013, p. 10).

9 European Commission. “Antitrust opens proceedings against Gazprom”. Press release IP/12/937. Brussels September

04, 2012. Accessed July 10, 2013, http://europa.eu/rapid/press-release_IP-12-937_en.htm. 10

European Commission. “Antitrust opens proceedings against Gazprom”. Press release IP/12/937. Brussels

September 04, 2012. Accessed July 10, 2013, http://europa.eu/rapid/press-release_IP-12-937_en.htm.

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Liberalização do mercado energético

Antes de começar a falar sobre o quadro regulatório é necessário compreender a importância da

liberalização do mercado energético para securitizar os interesses da UE, nesse sentido Eikeland

(2004, p. 1) destaca que

"A principal ideia por trás do mercado interno da energia é a livre concorrência entre as empresas

de energia em toda a Comunidade Europeia a qual levaria a enormes ganhos de eficiência, preços

mais baixos e mais equitativos para os consumidores em toda a Comunidade, resultando no

aumento da competitividade industrial, no crescimento econômico e aumentando o bem-estar."

Outro ponto importante é a falta de harmonização (técnica, regulatória e política) que impede a

redução das assimetrias entre os Estados, portanto faz-se necessário criar uma convergência das

políticas energéticas nacionais para promover a segurança energética para todo o bloco. "Os

problemas de harmonização podem, contudo, ser mais facilmente corrigidos que os problemas que

derivam de diferenças fundamentais de interesses entre os Estados membros." (EIKELAND, 2004,

p. 1). Por isso, um instrumento de mercado pode levar à convergência dos interesses privados e,

consequentemente, promover os esforços nacionais possibilitando, assim, a UE de falar em uma

"única voz ", no que diz respeito o setor da energia.

Os mercados de energia, até a década de 90, eram caracterizados por exclusividade no fornecimento

(dentro de determinado espaço), isso significa que os mercados de, gás e eletricidade, eram

operados por empresas públicas responsáveis por fornecer energia para todos os consumidores. O

controle do monopólio sobre as linhas de transmissão nacionais e gasodutos resultam, portanto, de

um padrão histórico. De acordo com Eikeland (2004, p. 14) "privatizações foram autorizados em

alguns países, mas ainda mantidas sob controle governamental em direitos de monopólio exclusivo

de troca".

Os esforços da UE se concentraram em dividir essa cadeia de geração, produção, transmissão e

distribuição, para reduzir o poder das empresas estatais nos mercados de gás e eletricidade. Acerca

disso Eikeland (2004, p. 15) ensina que

"Independentemente de propriedade, a evolução das estruturas implicaram em fortes ligações

verticais nas cadeias de fornecimento de gás e de eletricidade estabelecidas através de contratos de

fornecimento de longo prazo, entre produtores estrangeiros e consumidores de gás com direitos

exclusivos de importação. Uma parte importante dos esforços da UE em criar um mercado interno

de energia direciona-se a reestruturação do fornecimento de energia - a abolição de juris e de facto

dos direitos de monopólio. Como as operações da eletricidade e de gás ainda teriam um caráter

natural monopolístico, se tornou fundamental separar estas das empresas comerciais (vendas de

eletricidade e gás) para evitar as práticas anti-concorrenciais de subsídios cruzados e as barreiras de

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acesso."

Uma base jurídica importante para liberalização do mercado europeu de energia foi lançada pela

Comissão Dellors em 1985 quando foi publicado o Livro Branco sobre o Mercado Interno, esse

documento estabeleceu a base para o Ato Único Europeu (AUE), assinado em 17 de fevereiro 1986.

As principais características deste tratado foram: a instituição do mercado interno; mudanças no

processo de tomada de decisão como no Conselho (que era por unanimidade e passou a ser por

maioria qualificada); Além disso, os poderes do Parlamento foram reforçados. Acerca do mercado

interno o AUE determina

"Artigo 8.º-A Comunidade adotará as medidas destinadas a estabelecer progressivamente o

mercado interno durante um período que termina em 31 de Dezembro de 1992, em conformidade

com as disposições do presente artigo e dos artigos 8b, 8c, 28, 57 (20, 59, 70 (1), 84, 100a, e 100b e

sem prejuízo das demais disposições do presente Tratado. O mercado interno compreende um

espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais

é assegurada de acordo com o disposições do presente Tratado."11

Continuando com as considerações sobre o livre mercado, em relação ao setor energético Eikeland

(2004, p. 15) ressalta

"A livre concorrência deve significar que os consumidores de energia são livres de escolher o

serviço de empresas em toda a Europa, enquanto os fornecedores, por sua vez deve encontrar não há

barreiras para o transporte de eletricidade e gás através das fronteiras nacionais. Embora necessário,

garantir essa liberdade de escolha está longe de ser suficiente para uma concorrência justa."

Naquela época, o objetivo da Comissão era impulsionar o processo de integração por meio da

integração dos mercados, o setor energético entrou na agenda da Comissão em 1988, quando foi

promulgado o Livro Verde intitulado “Mercado Interno da Energia”. As principais preocupações

apresentadas neste documento foram o custo das importações de energia que eram equivalentes a

0,5% do PIB da Comunidade.

Este documento sublinha que os monopólios no fornecimento de gás e eletricidade era um dos

principais obstáculos para a construção de um mercado de energia integrado. Com o objetivo de

reduzir as barreiras e garantir um mercado de energia integrado, a Comissão recomendou quatro

ações: a eliminação de barreiras técnicas na fabricação de sistemas de energia; a abertura dos

contratos públicos; a harmonização dos impostos indiretos; e investimentos em uma rede europeia

11 The Single European Act Luxemburg, 17

th February 1986. Accessed July 10, 2013,

http://ec.europa.eu/economy_finance/emu_history/documents/treaties/singleuropeanact.pdf!

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de infraestrutura.12

Além disso, o Livro Verde reconheceu a necessidade de aprimorar o quadro

regulatório promulgando diretivas extras. Mesmo com as metas semelhantes, reduzir as barreiras

comerciais e impulsionar a concorrência, a abordagem deve ser diferente visto que cada mercado

tem suas especificidades. Os pacotes legislativos foram divididos em três etapas. O quadro 2 resume

passo a passo a implementação gradual da legislação que versa sobre a liberalização do mercado

europeu.

Primeiro Pacote Segundo Pacote Terceiro Pacote

Adoção 1996 (eletricidade)

1998 (gás).

2003 2009

Implementação

prazo

1998 (eletricidade)

2000 (gás).

2004 2011 (requerimentos de

desagregação 2012).

Abertura para

concorrência no

fornecimento do

varejo

Gás: mínimo de 20%

do mercado a ser

aberto à concorrência

até 1998; 28%, em

2003; e 33% até 2008.

Eletricidade 30% do

abastecimento de

grandes usuários e

distribuidores para ser

competitivo até 2003.

Fornecimento a todos

os consumidores de

eletricidade e gás

residencial a ser aberto

à concorrência até

2004 e todos os

consumidores

residenciais até 2007.

Terceira parte acesso

às infraestruturas de

transporte e

armazenamento

Escolha de três

modelos

(regulamentado,

negociado, único

fornecedor), todos

permitindo recusa de

acesso por razões de

falta de capacidade.

TPA regulamentado

obrigatório. Tarifas

(ou metodologias

tarifárias) para ser

aprovado por um

regulador nacional.

Fortalecimento do TPA

aplicado a todos os

operadores TSO, DSO.

12

European Commission. “Overview of Regulation in the EU and European Countries on the Verge of EU

Membership.” Accessed July 28, 2013, http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docgener/studies/pdf/chap3.pdf!

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Desagregação da

infraestrutura de

transporte e

armazenamento da

geração, produção, e

fornecimento

TSO13

e DSO14

obrigados a terem

identidades e contas

separadas, e sujeitos a

barreiras de

informação e

obrigações de não-

discriminação, mas era

permitido fazer parte

de grupos com

interesses no

fornecimento de

geração, produção, etc.

TSO e DSO obrigados

a apresentarem forma

jurídica separada.

TSO e DSO foram

obrigados a estar sob

propriedades distintas

ou a serem gerenciados

por um operador de

rede independente,

sujeito a restrições

severas.

Geração de

eletricidade

Estados poderiam

escolher entre os

sistemas de

autorização e de

licitação para

incrementar a

capacidade de

produção (licitação

permite aos Estados

planejarem

centralmente a

capacidade).

Sistema obrigatório de

autorização que

obrigava toda

capacidade de geração

a obedecer todos os

requisitos legais.

Quadro 2: Resumo dos três pacotes legislativos do setor energético.

Fonte: Daniel Harrison, Alastair Mordaunt p.2.

Acerca dos três pacotes legislativos é relevante destacar os resultados da implementação deste

quadro jurídico durante os últimos anos. Em 09 de junho de 2011, a Comissão aprovou um relatório

intitulado "2009- 2010 Relatório sobre os progressos na criação do mercado interno de eletricidade

e gás"15

nesse relatório, a Comissão sublinhou a decepção com o atraso na transposição do terceiro

pacote. Partindo do princípio que o prazo acordado para a transposição era até 03 de março, e em 01

de junho nenhum Estado-Membro tinha ainda comunicado à Comissão a plena transposição da nova

legislação. Ainda acerca da transposição do terceiro pacote legislativo da Comissão salienta que

"Desde setembro de 2011, a Comissão lançou 19 processos de infração por não transposição da

Diretiva 2009/72 / CE e 19 casos de não transposição da Diretiva 2009/73/CE. Até 24 de Outubro

de 2012, apenas 12 casos foram encerrados e o resto dos processos estão em curso."16

13

TSO, Operador do Sistema de Transmissão. 14

DSO, Operador do Sistema de Distribuição. 15

European Commission. Commission Staff Working Document. “2009- 2010 Report on progress in creating the

internal gas and electricity market”. Brussels 9 June, 2011,

http://ec.europa.eu/energy/gas_electricity/legislation/doc/20100609_internal_market_report_2009_2010.pdf! 16

European Commission. Communication from the ComMission to the European Parliament, The Council, The

European Economic and Social Committee and The Committee of the Regions. “Making the internal energy market

work.”: COM(2012) 663 final. Brussels, 15 November, 2012. Accessed July 23, 2013, http://eur-

lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2012:0663:FIN:EN:PDF!

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Em relação ao segundo pacote foi ainda pior, pois em junho de 2009 (depois de 4 e 6 anos do

lançamento do pacote legislativo para a eletricidade e para o gás, respectivamente), a Comissão

abriu processo contra 25 infrações de 25 Estados-Membros devido a não conformidade com o

regulamento.

Conclusão

Em relação à integração do mercado da energia é possível afirmar que, ele está enfrentando alguns

desafios como: viabilidade física, harmonização (técnica e financeira) e a supremacia dos interesses

nacionais. Para construção da parte física os fundos devem ser direcionados pela Comissão e

aprovados pelo Parlamento e pelo Conselho. Então, nesse ponto é fundamental resolver a

sobreposição e a “cacofonia” existente entre as instituições, assim limitando as divergências que

atrasam consideravelmente o processo de alocação dos fundos. A fim de promover a harmonização

jurídica e técnica para construir interconexões mais eficientes entre os mercados nacionais de

energia foram criadas autoridades em nível supranacional como Agency for Cooperation of Energy

Regulators (ACER) e Council of European Energy Regulators (CEER).

Assumindo que a segurança é a percepção acerca de uma ameaça, e a segurança energética

consubstancia-se no equilíbrio contínuo entre oferta e demanda, logo a forma a qual a oferta satisfaz

a demanda implica em na percepção maior ou menor de segurança. Dentro disso existe uma

acentuada assimetria entre os Estados-Membros, em matéria de segurança energética, devido a

diversos fatores (localização geográfica, a demanda doméstica, a opinião pública, história nacional,

os recursos nacionais, a densidade demográfica, a condição de mercado e o nível de

desenvolvimento) o que resulta nas divergências quanto às estratégias e interesses nacionais.

Portanto, auferiu-se que as campeãs nacionais são organizações apoiadas pelos Estados

(subsidiando e ou encorajando fusões nacionais) e que essas fazem partes de estratégias pautadas

puramente na maximização dos interesses nacionais. Tais estratégias acarretam impactos negativos

como a redução da concorrência, a distorção dos mercados e a redução do bem-estar dos

consumidores. Outro impacto negativo importante é a má alocação de recursos que impacta na

mudança do paradigma energético – dos combustíveis fósseis para renováveis. Ademais, alguns

países como Espanha, França, Itália e Alemanha tem utilizado as suas campeãs nacionais para

negociar de forma bilateral com a Rússia, enfraquecendo, assim, o poder de barganha do bloco. Não

foi encontrado nenhum argumento coerente, econômico ou político, para advogar em favor das

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campeões nacionais como um instrumento válido para aumentar a segurança energética da UE. Por

conseguinte, concluiu-se que as campeãs nacionais no setor de energia devem ser consideradas uma

ameaça para a segurança energética da UE.

O processo de desmantelamento, iniciado no início dos anos 90, com o objetivo de evitar

concentrações horizontais (fusões através de concorrentes do mesmo produto) e concentrações

verticais (fusões entre concorrentes na mesma cadeia de produção), é crucial para aumentar o

número de concorrentes e promover um mercado mais eficiente, nesse sentido, preços mais baixos

para os consumidores.

É certo que a era de fontes de energia fácil acabou "com uma melhor cultura da concorrência os

cidadãos iriam entender os custos da política distorcida de fusão que visa proteger campeões

nacionais ineficientes." (MOTTA, RUTA, 2007, p. 18). A má alocação de recursos aumenta a

dependência das importações fato que ameaça o desenvolvimento econômico de todo o bloco, a

estabilidade política e o bem-estar social.

A Comissão tem atuado em diferentes frentes para reduzir tal dependência, como a redução de

emissões, o aumento da eficiência energética, e a diversificação de fornecedores e rotas. Entretanto

se os Estados Membros continuarem a promover os interesses nacionais, agindo individualmente no

setor da energia, as estratégias da Comissão não trarão os resultados esperados. Outro ponto que

poderia ser levantado nessa discussão, sobre a abordagem teórica realista das Relações

Internacionais é que os países utilizam o processo de integração regional para maximizar seus

interesses, nesse caso por meio das campeãs nacionais. Em setores estratégicos, como o energético,

os Estados são sempre relutantes em transferir o seu poder de decisão (soberania) para o nível

supranacional.

Referências Bibliográficas

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