o mercado de bens simbólicos

Upload: dira-souza

Post on 18-Jul-2015

1.169 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

O Mercado de Bens Simbólicos ORTIZ, Renato. p.113 - 148

TRANSCRIPT

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    1/20

    G J U - U M e d . A C o r v . . V A J ~ v . i\J~\)5~ (4 ,~i ~v~flO

    , II '.,." . I \I \ .f"~) ,~, r,~~'f\ " 1 _ ~J . " ,~ RENATO ORTIZ10

    dcada de 50 e parte da de 60 sem levarrnos em co idera-.;iio e ste sentirnento de esperanca e a profunda co iccao deseus participantes de estarern vivendo urn rn ento parti-cular da historia brasileira. A recorrente uti zacao do adje-tivo "novo" trai todo 0 espirito de uma ' oca: bossa nova,cinema novo, teatro novo, arquitetur ova, rnusica nova,sernfalarmos da analise isebiana ca ada na oposicao entrea velha e a nova sociedade. A rno mentacao politica, mes-rno quando identificadacomo pulista, impregnava 0 ar,impedindo, por urn lado, aos tores sociais perceberem quesob seus pes se construia u a tradicao moderna, mas, poroutro, lhes abria oportu idades ate entao desconhecidas.Nile deixa de ser sign if ativo apontar que varias das produ-coes culturais do pe ' do se fizeram em torno de movimen-tos, e nao exc1usiv mente no ambito da esfera privada doartista. Bossa va, teatro Arena, tropicaIismo, cinemanovo, epe da NE, eram tendencias que congregavamgrupos de pr: dutores culturais animados, se nao por umaideologiad transforrnacao do mundo, pelo menos de espe-ranea po mudanca, Neste sentido podemos dizer que cul-tura e olitica caminhavam juntas, nas suas realizacoes e

    j . , .

    SEGUNDA PARTE

    "Baby, bye , byeEu acho que yOU desligarAsfichas ja vlioterminarBye, Bye, BrasHAultima ficha caiuMas a liga9ao tft no fun"(Chico Buarque)

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    2/20

    "., \

    o Mercadode bens slmbolleosSe os anos 40 e SO podern ser considerados como mo-mentos de incipiencia de uma sociedade de consumo, as

    decadas de 60 e 70 se definern pel a consolldacao de urnmercado de bens cultura is, Existe, e claro, urn desenvolvi-menta diferenciado dos diversos setores ao longo desse pe-riodo. A televisao se concretiza como veiculo de massa emmeados de 60, enquanta 0 cinema nacional somente se es-trutura como industria nos anos 70, 0mesmo pode ser ditode outras esferas da cultura popular de massa: industria dodisco, editorial, pubiicidade, etc. No entanto, se podemosdi st inguir urn passo dife renciado de cresc imento desses se -tares, nao resta duvida que sua evolucao constante se vin-cula a razoes de fundo, e se associa a transforrnacoes estru-turais par que passa a sociedade brasileira. Creio que e pos-sivel apreenderrnos essas mudancas se tomarmos comoponto para reflexao a golpe militar de 64. 1 0 advento doEstado rni lit ar possui na verdade um duplo signi fi cado; parurn lado se define por sua dimensao politic a; por Dutro,aponta para transforrnacoes mais profundas que se reali-

    (I) Retorno neste ponte minha argumentacao desenvotvida 110 capitulo"Estado Autoritario e Culturu", in Cultura Brasileira e Identidade Nacional,op. cit.

    ,- _I.- ~ . _ ~ '

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    3/20

    114 RENATO ORT!Z

    zarn no nivel da econornia. 0 aspecto politico e evidente:repressao, censura, prisoes, exilios, 0 que e menos enfati-zado, pore rn, e que nos inre ressa di retamente , e que a Es-tado militar aprofunda medidas econornicas tornadas nogoverno Juscelino, a s quai s os econornist as se r eferem como"a segunda revolucao industrial" no Brasil. Certamente osrnili tares nao inventarn 0 capitalisrno, mas 64 eum mo-menta de reorganizacao da econornia brasileira que cadavez mais se insere no processo de internacionalizacao docapital; 0 Estado autori tario perrnit e consoi lda r no Brasil 0"capitalisrno tardio". Em terrnos culturais essa reorienta-cao econornica traz consequenc ias imedia tas, poi s, pa rale-lamente ao crescimento do parque industrial e do rnercadointe rne de bens materia ls, forta lece- se Q parque industrialde producao de cultura e 0mercado de bens culturais.

    Evidenternente a expansao das atividades culturais sefaz associada a urn controle estrito das manifestacoes que secontrapoem ao pensarnento autoritario. Neste ponto existeuma d iferenca entre 0 desenvolvimento de urn mercado dehens materials e um mercado de bens culturais, 0 ultimoenvolve uma dimensao simbolica que aponta para proble-mas ideo16gicos.expressam uma aspiracao, urn elernentopolitico ernbutido no proprio produto veiculado. Par isso.o Estado deve tratar de forma diferenciada esta area, ond~a cultura podeexpressar valores e disposicoes contrariasavontade politica dos que estao no poder. Mas e necessariaentender que a censura possui duns faces: uma repressiva,outra disciplinadora, A prirneira diz nao, e puramente ne-gativa: a outra e rnais complexa, afinna e incentiva urndeterminado tipo de orientacao. Durante a periodo 1.964-1980, a censura nao se define exclusivarnente pelo veto atcdo e qualquer produto cultural; ela age como repressaoselet iva que imposs ibil ita a ernergencia de urn determinadopensamento ou obra artistica .. Sao censuradasas pecas tea-trais, os filrnes, os livros, mas nao 0 teatro, 0 cinema ou aindustria editorial. 0 ato censor atinge a especificidade daobra, mas nao a generalidade da sua producao, 0 movi-mento cultural p6s-64 se caracteriza por duas vertentes quenao sao excludentes: por urn lado se define pel a repressao

    A MODERNA TRADI(lo.O BRAS[LEIRA I ISideo16gica e polit ica: por outre, e urn memento da histor iabrasileira onde mais sao produzidos e difundidos os bensculturais, Isto se deve ao fate de ser 0proprio Estado auto-ritario 0 promotor do desenvolvimento capitalista na suaforma mais avancada,

    Seria importante aprofundarmos mais a questao dacensura. Qualquer pessoa que se interesse pela historia cul-tural brasi le ira deste pericdo te rn que enfrenta -la . 0 impor-tante, porem, e d imensionar seus efei tos, e nao confundirsua atuacao topica (que e reale considerarernos poster ior-mente no capitulo 6) e a dimcnsao estrutural do mercado debens culturais, Tomemos como base de raciocinio a Ideolo-gia da Seguranca Nacional, que constituio fundamento dopensamento militar - em relacao a sociedade. Resumida-mente se po de dizer que essa ideologia concebe a Estadocomo uma entidade politica que detern 0 monop61io dacoercao, isto e, a faeuldade de imp or, inclusive pelo em-prego da forca, as normas de eonduta a serem obedecidaspor todos. Trata-se tambern de urn Estado que e percebidocomo a cent ro nev ralg ico de todas as a tividades soc ia ls rele-vantes em termos politicos, dal urna preocupacao constante .com a questao da "integracao nacional": Uma vez que asociedade e forrnada por par tes diferenciadas , e necessariapensar uma instancia que integre, a partir de urn centro,a diversidade social. De uma certa forma, a que a Ideologiada Seguranca Nacional se propos e substituir 0 papel que asr eligioes desempenhavarn nas "soc iedades t radicioria is".Nessas sociedades, 0 universe rel igiose soldava organica-mente os diferentes niveis sociais, gerando uma solidarie-dade organica entre as partes, assegurando a realizacao dedeterminados objet ivos . Nao e par acaso, quando lemos osdocumentos dos mil ita res, que toda sua apresentacaogi raem torno de ideias como sol ida riedade (no sent ido durkhe i-miano de coesao social) e "objetivos nacionais", isto e , asmetas a se rern at ingidas, Procura-se garantir a in tegridadeda nacao na base de urndiscurso repressive que eli rnina asdis funcoes, isto e , as pra ti cas dissidentes, o rganizan do-asem torno de objetivos pressupostos como comuns e deseja-dos par todos. No entanto, como observa Joseph Camblin,

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    4/20

    -116 RENATO 0 RTIZ 117MODERNA TRADll;:AO BRASILEJRAesse Estado de Seguranca Nacional nao de tern apenas po-der de repressao, mas se interessa tam bern em desenvolvercer tas atividades, desde que submetidas a razao de Estado. zReconhece-se, portanto, que a cultura envolve uma relacaode pcder, que pode ser rnaletico quando nas rnaos de dissi-dentes, mas benefice quando circunscrito ao poder autori-tario, Percebe-se, pois, claramente a irnportancia de seatuar junto as esferas culturais, Sera por isso incent ivada acriacao de novas instituicoes, assim como se iniciara todourn processo de gestacao de urna poIitica de cultura. Bastalembrarmos que sao varias as entidades que surgern no pe-dodo - Conselho Federal de Cultura, Institute Nacionaldo Cinema, EMBRAFILME, FUNARTE, Pro-Memoria,etc. Reconhece-se ainda a importancia dos meios de comu-nicacao de massa, sua capacidade de difundir ideias, de sec?~l~nicar diretamente com as massas, e, sobretudo, a pos-sibilidade que tern em criar estados emocionais coletivos.Com relacao a esses meios, urn manual mil ita r se pronunciade rnaneira inequivoca: "bern utilizados pel a s elites cons-tituir-se-ao em fator rnuito importante para 0 aprimora-mento dos componentes da Expressao Polit ica; uti lizadostendenciosamente podem gerar e inc rementa r inconfor-rnismo". J 0 Estado deve, portanto, ser repressor e incenti-vador das atividades culturais.

    Se cornpararmos a ditadura militar ao Estado Novopodernos apreender algumas analogias e diferencas queesclarecem 0 papel do Estado em relacao.a cultura. Nasduas ocasioes, 37 e64, 0 que define sua politica e umavisao autoritaria que se desdobra no plano da cultura pelacensura e pelo incentive de determinadas acoes culturais.Da mesma forma que 0 governo mil ita r desenvolve ati -vidades na esfera cultural, Vargas cria uma serie de insti-tuicoes como 0 Inst ituto Nacional do Livre, 0 Ins ti tuto Na-donal do Cinema Educative, museus, bibliotecas, alern de

    .. 1 sua atuacao decisiva na area do ensino. Ao lade dessa pleia-de de prornocoes 0 brace repressor do DIP nao deixa de semanifestar. Talvez pudessemos dizer que 0 Estado mili tartern uma atuacao mais abrangente, uma vez que a politicacultural de Capanema tinha limites impastos pelo propriodesenvolvimento da sociedade brasi leira. Porern, 0 que dife- .rencia esses dois momentos e que em 64 0 regime mil ita r seinsere dentro de urn quadro econornico distinto. A relacaoque se estabelece, portanto, entre ele e os grupos ernpre-sariais e diferente, eu diria, mais organic a, pois somente apartir da decada de 60 esses grupos podem se assumir comoportadores de urn capital ismo que aospoucos se desprendede sua incipiencia. Os cient ist as polit icos tern insistido queo golpe nao e sirnplesmente uma manifestacao mil itar, eleexpressa autoritariamente uma via de desenvolvimento docapitalismo no Brasil, Esta afirmacao, que no nive! da teo-ria politica e banal, se desdobra no plano hist6rico de formaconcreta . 0 livro de Rene Dre ifuss mostra detalhadamentecomo os interesses dos mi lit ares e dos empresarios brasilei -ros se articulam para a derrubada do regime de Goulart."Os ernpresarios da esfera cultural parecem nao escapar itregra, Hal lewel obse rva que entre 0 grupode livreiros quefinanciaram as atividades do lPES estao a AGIR, Globo,Kosmos, LTB, Monterrey, Nacional, Jose Olympic, Vecchi,Cruzeiro, Saraiva, GRD.S Se lembrarmos que a partir de1966 e dado um incentive real it fabricacao de papel, e faci-litada aimportacao de novas maquinarios para a edicao,percebemos que existe c1aramente uma gama de interessescomuns entre 0Estado autoritario e a setor empresarial dolivre. Talvez 0 melhor exernplo da colaboracao entre 0 re-gime rnilitar e a expansao dos grupos privados seja 0 datelevisao." Em 1965 e criada a EMBRATEL, que inicia todauma politica modernizadora para as telecomunicacoes,

    (4) Rene Dre ltus s, 1964: A Canqu is ta do E stado, A ,a o Po ll ti ca, Pode r eJo/pe de Estado, Petr6polis. Yozes, 1981. .(5) Laurence Hallewe l, 0 Livre no Brasil, op. cit., p. 462.(6) Ver Sergio Mat to s. "0 I rn pac to da Revoluca o de 64 no Des envo lv i-mento da Televislio", Cadernos INTERCOM, a no 1 ,n ? 2 . marco d e 1982: s ob reas inovacoes tecnologicas na area da telecomunicaeao, ver "Telecomunicacoes:

    (2) Ver Joseph Comblin, A Ide%gia da Seguranca Nac iona l Rio de Ja -neiro, Civilizacao Brasileira, 1980. .(3) Manual Basico da Escola Superior de Guerra. Departamento de Estu-des MB-75. ESG, 1975. p. 121.

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    5/20

    118 RENATO ORTIZ A MODERNA TRADI

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    6/20

    l20 RENATO ORTIZ

    l . j ' :. " '~i~.~

    I1.1.~J1i

    IIIIIIIII!1

    zara e nao ha nenhurn sinal oficial ou oficioso de que vamos. . d " 11marchar na di recao mversa 0 progresso . .Se tiverrnos em mente que a constituicao de urn SIS-tema de comunicacoes economicamente forte, dependen-te da publicidade, passa no caso brasileiro necessaria-mente pelo Estado, podemos avancar no terreno de noss.adiscussao. A evolucao do mercado de propaganda no Brasilesta intimamente associada aD Estado, que e urn dos prin-cipais anunciantes. 0 governo, atraves de suas agendas,detern urn poder de "censura economica", pois ele e umadas forcas que cornpoem 0 mercado.F Nao ha, portanto,urn conflito aberto entre desenvolvimento econornico e cen-sura. Evidentemente os ernpresarios tern prejuizos com ~aspecas, livros, programas, filmes censurados, mas eles ternconsciencia que e 0 Estado repressor que fundamenta.su~satividades, A censura "excessiva" e certamente urn lll~O-modo para 0 cresc imento da industria ;u1tur.a~ , mas : st e e .0preco a ser pago pelo fato de ser 0 polo militar 0 incenti-vador do proprio desenvolvimento brasileiro. .o que caracteri za a situacao cultural nos ano~ 60 e 70 ~ avolume e a dimensao do mercado de bens culturais. Se ate adecada de SOas producoes eram rest rit as, e at ingiam ur n mi-rnero reduzido de pessoas, hoje elas tendem a ser cada vezmais diferenciadas e cobrem uma massa consumidora. Du-rante 0 periodo que estamos considerando, ~co~re ~~a for-midave l expansao, a nive l de producao, de dl s~nbulc; :ao e deconsumo da cultura; e nesta fase que se consolidam o~gra~-des conglomerados que cont rolam os meios de co~un lcaGaoe da cultura popular de massa. Os dados, qual!qu.er quesejarn e1es, confirm am 0 crescimento dessa tende~cIa. To-memos como exemplo a evolucao da producao de livros en-tre 1966 e 1980 (em rnilhoes de exemplares) .IJ

    A MODERNA TRADI(AO BRASILEIRA 121censura nao acompanha a evolucao dos costumes". 9 A cri-tic a se desloca, desta maneira, do polo politico para 0 eco-nomico. Ela e "excessivamente rigorosa", au "nao acorn-panha a evc lucao dos costumes", 0 que significa que suaatuacao traz prejuizos materiais para 0 lado empresarial.Tania Pacheco tern razao quando afirrna que 0 objet ivo dosempresarios teatrais e sugerir urn pacto com 0 poder, pro-curando desta forma garantir 0 financ iarnento das obrasteatrais pelo Estado. Este tipo de estrategia nao se lirnita,porern, a uma esfera altamente dependente de verb as esta-tais como 0 teatro ou 0 cinema, eia e mais geral. Quando aTV Globo e a TV Tupi assinam urn protocolo de autocen-sura em 1973, procurando controlar 0 conteudo de suasprogramacoes, 0 que essas emissoras estao fazendo e cir-cunscrever a vontade de se conquistar 0 mercado a qual-quer.preco, aceitando-se cumprir os compromissos adqui-ridos anteriormente junto ao Estado mill tar. 10 Se elas cor-tam ou redimensionam determinados program as popula-rescos (Chacrinha, Derci Goncalves, etc.) e porque 6 neces-saria garantir 0 pacta com os rnilitares, que veem esse tipode espetaculo como "degradante" para a formacao do ho-mern brasi lei ro definido segundo a ideologia da SegurancaNacional. A contradicao entre cuItura e censura nao se ex-pressa, pois, em terrnos estruturais, mas ocasionais, ta-ticos, por i sso e possivel deslocar a questao para 0 planoeconornico. A conferencia de Mauro Sall es, que haviamoscitado anteriormente, 6 sugestiva quando afirma que "6 deuma imprensa livre econornicamente, com sua sobrevi-vencia garantida pela receita de uma publicidade julgadaem bases tecnicas, que se deve esperar uma imprensa livreem termos politicos. E certo que estamos todos ainda a bra-GO S com problemas da censura. Mas tarnbem 6 certo que oscensores sao passage iros e a censura nao se insti tucional i-

    i!iII\I

    (9) "I Congresso da Industria Cinematografica ", Filme e Cultura, n~ 22,novembro/dezembro de 1972, p. 14.(!O) Sabre 0 pac ta en tr e TV Globo e Tup i, e a censur a aos pr og rur na spopularescos, ver Sonia Miceli, "Irnitacfio da Vida: Pesquisa Explcraturia sobre aTeiencvela", lese de mestrado, FFLCH. USP, 1973.

    (11) Mauro Salles, op. cit., p. 9. .(12) Sobre a papel do governo como anunciante. vel ' t . :t arco A. RodriguesDins, "Poli ti ca de Cornunicacao no Brasi l" , i ll Jorge Wer theIm {org. ), Mews deComunicaciio: Realidade e Mito, SiloPaulo, Cia. Ed. Nacional. 1979. . ..(13) Laurence Hallewel, op. cit . p, 510. Os dados sobre a se to r l lv re ir oprovern da mesma fonte.

    L_ .. . ~ _

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    7/20

    r :

    12 2 RENATO ORTIZ

    ' : , . 1' , ' : ' :' .--!~' . : j

    J'.]

    '.,

    A MO D ER N A TRADl

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    8/20

    124 RENA TO ORTIZ A MODERNA TRADICAO BRASILElRA 12S

    publico masculino: autom6veis (Qualm Rodas), chofer decaminhao (0 Carreteiro), sexo (Playboy), motocic1eta(Moto), futebol (Placar), navegacao (Esportes Nauticosi,economia e neg6cios (Exame). A editora procura, desta for-rna, cobrir 0 interesse des leitores potenciais, da carnadadominante aos setores medias e a franja superior da classetrabalhadora, que ern boa parte e excluida do sistema deen sino apos a conclusao dos estudos primaries. Para estacamada, os fasciculus cumprem uma funcao dida ti ca, di s-correndo sobre a hist6ria dos homems, a ciencia, e as artes.A te mesmo para 0 cinema nacional, pelo tipo de pro-ducao que demanda uma grande soma de investimento, 0quadro atual, apesar das dificuldades, e radical mente dis.t into dos anos SO . Com a criacao do Institute NacionaI doCinema, em 1966, e posteriormente da EMBRAFILME , aprcducao cinernatrografica conhece sem duvida urn rno-mento de expansao, No periodo de 1957 a 1966, a pro-ducao de Ioriga-metragem atingia uma media de 32 filrnespor ano: nos anos 19671969, quando 0 INC corneca a atuar ,e la passa para SO fi lmes." Com 0 surgimento da EMBRAFILME, a politica do Estado se torn a mais agressiva, au-mentandoas medidas de protecao do mercado, e dando urnmaior incentive a producao. Em 1975 sao produzidos 89filmes, e em 1980, 103 peliculas.17 Nao devemos, porern,nos entusiasmar muito com a qualidade desta industriabrasileira; a maior parte dos filrnes sao pomograficos aupornochanchadas. Em 1979 eles to tal izavam apenas 8 0 / 0 daproduGiio,. mas em 1984, com a crescirnento do rnercado,chegam a cornpor 71% do que e produzido.'"

    Nao e somente 0 cinema brasiIeiro que se expande.Mu ita s v ez es uma oposicao muito rigida entre 0 nacional eo est range iro, que e sem duvida real e importante no campocinematografico, nos impede de perceber que : 0 proprio

    (16) Ver Alcirio Teixeira deMelo, Legislaciio do Cinema Brasileiro , Ri o deJaneiro, EM8RAFILME, 1977.(17) "Cinema Brasileiro: Evolucao e Desernpenho", Siio Paulo, Pesquisa5,FundaQaoJapao, 19B5,p.4S.(l.S) Jamal da Tela, MEC, EMBRAFILME, marco de 1986, p. 3.

    . : : ~,~"

    habito de ir ao cinema que se consolida no periodo que es-tamos considerando, Na decada de 70 a evolucao do rni-rnero de espectadores e a seguinte: em 19n, 203 rnilhoes:atinge em 1976 urn pica de 250 rnilhoes: e cai em 1980 para164 mi lhoes." Muitas vezes esses dados sao conside radosexclusivamente como expressao do declinio do cinema emcontraposicao a outras formas de lazer, em particular a te-levisao, lsto e , sem duvida , verdade iro. Pore rn, se introdu -zirmos uma dirnensao historica em nossa analise, e to-rnando-se alguns dados de outros paises, : possivel enca-minhar nossa reflexao para uma outra direcao. Conside-remos, por exemplo, a evolucao do mimero de espec tadoresem outros paises (em milhoes): 10Paises NQ de espectadores Decl ii o em "1 , dornelhor unoMelhor ano 1970 ate 1970EVA 4400 (1946)

    , : ~ > ' j t : n ' ~79Ingluterra 1430(1949) 86A!emanha Oc. 818(1956) 80Japao 1127 (1958) 247 78

    Franca .411 (1957) 183 5SItalia 819 (1955) 556 J2

    Uma primeira conclusao, ja conhecida de todos, se im-poe: a queda da frequencia ao cinema e urn fenornenomundial, Sao varias as razoes que concorrem para i550: 0preco das entradas, 0 feehamento dos cinemas de bairro,sua concentracao nos centros urbanos em zonas servidaspor uma maior estru tura de lazer, como restaurantes, shop-ping centers, e, e claro, a concorrencia de outros meios , comoa te levisao cornercial , a cabo, eo videocassete, a le rn de for-mas alternativas de lazer, como 0 tur ismo, os passeios , 0autom6ve l. Como entender a evolucao do cinema no Brasil ,colocando-o no contexte inte rnac iona l? 0 grafi co abaixo :sugestivo,

    (19) "Cinema Brasilciro: Evolucno e Desernpenhn", op. c i t . p. 134.(20) idem, p. 114. Sabre 0 declinio da freqiiencia ao cinema, ver Rene

    Bonnell, Le Cinema Exploit i;Paris, Seuil, 1978.

    . ,~.

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    9/20

    126 RENATa ORTIZ

    Evo1u~1io do numcro de c inemas

    J50030002500~d~ 2000. .

    "0E 1500i:,~c 1000

    ~O O

    ar- " " ; ; : ; ,. , :g ,_ e- :;; ,. , ,() r-- 0- t: r-; ~~"- ~ ;;: .. ,,. -r '" :9 ,n : : s :: ; > : : ~ s o : : ' . : 2: s :: ~ ;:: c- ~ ~ : ' . :

    Se tomarmos a curva de evolucao do mimero de salascomo correlata a frequencia, observarnos que e entre 1975 e1976 que se atinge urn pice de espectadores, Isto significaque 0 processo de expansao do publico, que foi variado nosdiversos pai ses, a tingindo urn maximo em 1946 nos EstadosUnidos, 1955 na Italia, 1957 na Franca, s6 ocorre no Brasilem meados da decada de 70, Como 0 pr6prio gra fico su-gere, durante a decada de 50 e metade da de 60, 0 nu merode salas de cinema permanece praticamente a mesrno: aformacao de urn verdadeiro mercado de consume de filmesse da somente em 1967, conseguindo se manter num pa-tamar mais elevado pe lo menos ate 1979. A parti r da i, 0 ci-nema se equipara a s dif iculdades que 0 rnercado de f ilmes

    "

    A MODERNA TRADI

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    10/20

    128 RENATO ORTIZ A M OD ERN A T RA DT CA O B RA SIL E!RA 12 9de aparelhos, ja em 1970 ela era de 860 mil unidades, vo-lume que cont rasta r adicalmente com 0 da decada anter ior,e que el imina a necessidade de importacao. A implantacaoda televisao como meio de rnassa pode ser avaliada quandoexarninamos a evolucao do nurnero de aparelhos em usa : 2

    6S 70 7S

    integrar 0 habito dos consumidores. Isto se deve substan-cialmente a uma generalizacao do usa do cassete nos auto-m6veis enos momentos de lazer fora de casa. Mas 0 que: osnurneros indicam e, sobretudo, 0 aurnento do volume de. v endas, que no periodo cresce de 2S rnilhoes para 66 rni-lhoes de discos comercializados anualmente. 0 LP, que foiintroduzido em 1948, mas ate a decada de 60 era aindaconsiderado urn praduto caro , cada vez mais e caracterizadocomo urn elemento de consumo, inclusive das classes maisbaixas. 0 mercado de discos nao opera somente com a es-trategia de diferenciacao dos gostos segundo as classes so-ciais. Ele descobriu uma forma de penetrar junto as ca-madas mais baixas, desenvolvendo os "albuns cornpila-dos", discos ou fitas cassetes reunindo uma selecao de rmi-s icas de diferentes gravadoras. A Sam Livre, vinculada itRede Globe de Televisao, se especializou no ramo das rnu-sicas de novela, deslocando do mercado inclusive as multi-nac iona is. Inicianda suas at ividades em 1970 com 0 cornpi-Iado da trilha sonora da novela 0 Cafona, ja em 1976 setorna lider do mercado fonografico, e em 1982 detern 25%do seu faturamento.

    Penso que 0que melhor caracteriza 0advento e a conso-lidacao da industri a cultu ral no Brasil e 0 desenvolvimentoda televisao. Virnos como nos anos SO 0 eircuito televisivoera predominantemente loca l, enfren tando problemas: tee-nicos consideraveis . Com 0 investimento doEstado na areada telecomunicacao, os grupos privados tiverarn pela pri-meira vez a oportunidade de concretizarem seus objetivosde integracao do mercado. Como dira tim executive: "A te-lev isao, por sua simples existencia, prestou urn grande ser-vico a economia brasiIeira: integrou as consumidores, po-teneiais au nao, numa economia d e mercado", 25 Para issofoi necessaria urn incremento na producao de aparelhos, nasua distribuicao, e a melhoria das condicoes tecnicas. Comoo videoteipe, a transmissao em cores, a edicao eletronica,este ultimo ponto pod e ser garantido. Quanto a prcducao

    ,.I

    il,I'i

    Evolucao do total de nparelhos (PB&C) em uso no pais

    2

    (25) Arce, "Televisao: Ano 25/10 de Conquistas de Cornercializacllo",op. c i t . . p. 66.

    50 60 80

    p.66. (26) Geraldo Lei te , "A Necessidade de uma Ecologia da Midia", op. cit . .

    ss

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    11/20

    "130 RENATO ORTIZ

    Esses dados podem ser melhor cornpreendidos quandocomparamos a evolucac de numero de dornicilios com tele-visao. Em 1970 existiam 4 milhoes 259 mil domicilios comaparelhos de televisao, 0 que significa que 56% da popu-lacao era atingida peIo ve iculo: em 1982. este numero passapara 15 milhoes 85S mil, 0 que corresponde a 73% do to-tal de dornicilios existentes." Por outre lado, coma rnos-t ram alguns estudos de rnercado, 0 habito de assisti r tel e-visao se consolida definit ivamente , e se dis semina par todasas classes sodas. 2a .

    Herbert Schiller, num de seus artigos, observa que acomunicacao segue 0 capital, e que 0 capital se relacionaintrinsecamente com a publicidade. Na verdade, seria im-possivel considerarmos 0advento de uma industri a culturalsem levarrnos em conta a avanco dapublic idade ; em grandeparte, e at raves deIa que todo 0 cornplexo de cornunicacacse mantem. 0caso brasi leiro nao foge a regra. Basta olhar-rnos como evolui 0 investimento em propaganda neste pe-riodo (em milhoes de cruzeiros): 29

    Ana Total investido % sabre 0 PNB1964 15 2 0.801966 44 0 0,951968 960 1,001970 1840 1,051972 3460 1.251974 6300 1.291976 12600 1,28

    (27) Ver Mercado Brasileiro de Comunicaciio, Brasilia. Presidencia daRepublica, Secretaria de Imprensa e Divulgncjio, 1983, p. 87, Consultar tarubernBriefing, "Os Trinta Anos da Televisao", op. cit. .(28) Ver M[diae Mercado, SiloPaulo. Lintas, 1984, Varies estudos sabrea penetracao da televisao junto as diferentes classes e piiblicos consumidores po-dem .serencontrados , para a decada de 70. na revis ta Mercado Global, que erapublicada pela Rede Globo de Televisao.(29) Fonte: "A Televisao Brasileira", Mercado Global, n?s 31/32, ana 3 ,11.12.1976, p. 20. 0 dado de 1976fai ret irado de Rober to Amaral Vieira, "Al ie-nacao e Comunlcacao..o Caso Brasilelro", ill Comunicaciio de Massa: 0 impasseBrasileiro, Rio de Janeiro, Forense, 1978, p. 100. .

    A MODERNA TRADICAo BRASILEIRA 1.'\1Pode-se observar que a partir de 1968 0 total de inves-timento da urn salto para atingir niveis ate entao desconhe-cidos, Maria Arminda Arruda, quando analisa 0 desenvol-vimento da pubUcidade brasi lei ra entre 1970 e 1974, mostra

    que essas taxas de crescimento nao ocorrem em nenhumoutro p a i s , mesmo os mais avancados, 0 que permite queeni1972' oBrasil sup ere paises como Italia, Holanda e Aus-tralia, para se constituir em 19740 setimo mere ado de pro-paganda do mundo." Se entre 1935 e 1954 0 mercado deagencias publicl tarias permanece inalterado (5 6 em 1954 ecriada uma agencia importante, a Leo Burnett), 0quadromuda radicalmente nos anos 60 com 0 surgimenta da maio-ria de agencias que.hoje atuam no mercado: Esquire, A l-vares Penteado, JMM, Mauro Salles, MPM, DPZ, Proeme,Propeg, Artplan, Lage, P. A, Nascimento, Alcantara MEt-chado, Denison, Norton, Benson." 0 desenvolvimento dasatividades profissionais ligadas a propaganda j a vinha serealizando desde a dec ada de SO, com a criacao da primeiraescola de propaganda, a Casper Libero (1951), e a fundacaoda Associacao Brasileira de Agencias de Propaganda. Masenos anos 60 que ele se intensifica, a profissao de publici-tario ganha a universidade e tern 0 seu reconhecimento emnive l superior. Sao criadas as escolas de cornunicacao: ECA(1966), Alvares Penteado (1967), UFRJ (1968), ISCM(1969); e prol iferam novas associacoes que congregam pro-fissionais: Associacao Brasileira de Anunciantes (1961),Conselho Nacional de Propaganda (1964), Federacao Bra-si lei ra de Marke ting (1969). Este cresc imento na area publi -citar ia demanda services especializados, pais, agora, 0mer-cado tem que ser bern dimensionado, medido segundo cri-terios objetivos, de preferencia "cientificos", para que sepossa fazer urn calculo entre as pretensoes dos clientes e acapacidade de absorcao do produto. Nao e par acaso que adecada de 60 assiste tambern a urn processo de multipli-cacao dos institutos de pesquisas mercadologicas: lye

    ( 30) Mari a Anni nda Ar ruda, "A Embal agem do Sist ema", le se de mesotrado, FFLCH, USP, 1978. .(31) Ver Ricardo Ramos, op: cit., e L. E. Carvalho e Silva , op. c it .

    .'

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    12/20

    132 RENATa ORTIZ(1961), Mavibel (1964), Ipsem (1965), Gallup (1967), De~manda (1967), Simonsen (1967), Ipape (1968), Audi-T'V(1968), Sercin (1968). Nielsen (1969), LPM (1969).

    Se nas decadas de 40 e 50 faltava as emissoras de radioe de televisao 0 trace integrador para caracte riza-Ias comouma indus tr ia cultural. temos agora uma transforrnacao. 0case da televisao e evidente, uma vez que 0 Estado possi-bilita a transmissao em rede a partir de 1969. Mas tarnberno radio acompanha as mudancas mais gerais da sociedade,p ressionado sobretudo pe la diminu icao do investimento empropaganda. 0 quadro do percentual de participacao dosveiculos de cornunicacao no investimento publ ic it ario eclaro: Jl

    Ana TV Revista Radio Jornal Outros1 9 6 2 24,7 27,1 23,6 18,1 6,51972 46,1 16,) 9,4 21,8 6,41982 61,2 12,9 8,0 14,7 3,2

    A fase de aura do radlo pode existir porque este veiculoconcentrava a massa de inves timento publici tario disponivelria epoca. Com 0 deslocamento da verba publicitaria para at el evisao, sua exploracao comercial t eve que levar em contanovas fatores de mercado, caminhando para a especiali-zacao das ernissoras e a formacao de redes, Este processo deespecializacao nao e exclusive do radio, ele atende uma irn-posicao mais geral da industria cultural que tern necessi-dade de responder a demanda de urn mercado onde ex isternfaixas economicas diferenciadas a serem exploradas, Asempresas radiofonicas procuram, desta forma, ofereceruma progra rnacao uni ficada, e espec ifi ca para urn determi-nado tipo de publico, dando assim maiores opcoes para 0anunciante. Trata-se, portanto, de urn sistema que ira-balha associado a s analises de audiencia, pais elas sao asr inicas garantias, para 0 c1iente, que a emissora realrnenteatinge deterrninada camada ou publico. Porem, como 0

    (32) Fonte: Meioe Mensagern e Grupe Midia.

    II.JIIiI!III

    A MODERNA TRADI(AO BRASILEJRA JJJmercado : rest rito , sofre uma concorre rrcia cerrada da te le-visao, urna nova terrdencia se esboca para a maxirnizacaodos lucros: a formacao de redes. Gisela Ortriwano observaque essas redes nacionais, que integrarn emissoras regie-nals, transmitem uma prcgramacao unificada para os maisdiversos pontes do pais. " 0 objetivo principal dessa novatendencia esta l igado unicamente a fa tores economicos: for-talecer 0 rad io como al te rnat iva public it ari a, procurandoobter maior lucratividade corn rnenor investimento. Asemissoras que fazem parte de uma rede recebem, ao mesmotempo, programacao e patrocinador."JJ Hi duas maneirasdessas redes operarem. A primeira atraves das produtorasradiofonicas: a Studio Free e a L&C trabalham dire tamentecom as agencias e os anunciantes, possibilitando ao clienteconhecer de anternao a programacao na qual seu anunciose ra inse rido ..A L&C desenvolveu urn tipo de progra rnacaointegrada, com rmisica caracte risti ca , vinhetas, alem, e cia-ro, da gravacao dos comerciais. Este material e enviadopara as "regionais" onde sera veiculado. "Para atender ospedidos rnusicais, foram criados personagens com vozesmasculinas e feminines, que atendem pelo mesmo nome emtodas as localidades. A programacao nacional reserva es-paces para a prestacao de services e as entradas publicita-ri as locai s."J~ A segunda forma e a das emisso ras emrede,geralmente propriedade de urn unico concessionario. Saovaries os exemplos: Sistema Globo de Radio, formado par13 emissoras AM e cinco FM, que atua nos est ados de SaoPaulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, RioGrande do SuI e Bahia; a Transamerica, composta por 28emissoras atingindo os estados de Sao Paulo. Rio de Janei roPernambuco, Parana, Bahia, MinhasGerais, Sergipe,Para, Santa Catarina, Maranhao] Paraiba, Mato Grosso eBrasilia. Poderiamos ainda citar outros exernplos, como aRede.Capital de Comunicacao, a Rede Brasil Sul de Cornu-nicacao, a Rede Manchete de Radio. 0 espaco de irra-diacao tende a se arnpliar, mas 0 publico atingido nao e

    (33) Gisela Ortriwano, A Informaciio no Radio, op. cit ., p, 31.(34) Idem. pp. 31-32.

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    13/20

    A MODERNA TRAD!(AO BRASILE!RA:1 4 RENATO ORTIZmais caracterizado como local, ele se integra dentro domere ado nacional consumidor. Esta nova fase de desenvol-vimen to do radio nao se esquece inclusive de absorver urntrace definidor da industria cultural segundo Adorno eHorkheimer: a padronizacao. Nao s6 os program as sao pa-dronizados, mas a publicidade e ate mesrno as vozes dosapresentadores.

    Dentro deste quadro, a pr6pria concepcao de a tividadegerene ia I se modi fica. Varies sociologos tern insi st ido que amodernizacao da sociedade brasi le ira impl icou a mudancada mentalidade empresarial, seja no setor industrial, comoestudou Fernando Henrique Cardoso, seja na a rea vinculadaao Estado. Lucio Kowarick mostra que a ideia de planeja-mento.econornico somente ses is tematiza com 0plano de me-tas deIuscel ino Kubi tschek; Octavio Ianni considera que e apartir do golpe militar.que 0 planejamento adquire uma di-mensao individualizada, conferindo a polit ica govern a -mental urna especificidade que ela nao possuia ate entao, J5A industria cultural nao escapa a este processo de trans-formacao; as capitaes de industria dos anos anteriores de-vern ceder lugar ao manager. 0 espir ito empreer idedor-aventure iro de Chateaubriand carac teri za toda uma epoca,mas ele e inadequado quando Se aplica ao capital ismo avan-cado, Nos an o s 60 e 70, os grandes empreendedores do se-tor cultural sao outros. Homens que administrant conglo-merados englobando diversos setores ernpresa ria is, desde aarea da industri a cultural a industri a propriarnente di ta.Civita: Editora Abril, Distribuidora Nacional de Publi-cacoes, Centrais de Estocagem Frigorificada, Quatro Ro-das Hotels, Quatro Rodas Ernpreendimentos Turisticos.Roberto Marinho: TV Globo, Sistema Globe de Radio RioGrafica, VASGLO (prornocao de espetaculos), Tel;om;Galeria Arte Global, Fundacao Roberto Marinho, Frias eCa lde ira: Folha da Manha S. A., Impress, Cia . Li thogr&fihaYpiranga, Ultima Hera, Noticias Populares, Fundacao

    Casper Libero. Contrariarnente ao espirito capitalista we-beriano, que se fundamentava no individuo, trace cor-respondente ao inicio do capitalismo, os novos proprie-tarios sao hornens de organizacao, e de uma certa formase perdem na impessoal idade dos "irnperios" que COtlS-truiram.Eles devem contrabalancar sua vontade individual esubrnete-Ia a racionalidade da propria empresa que engen-draram. A hist6ria das organizacoes que construiram naocoincide mais com a hist6ria individua l do seu fundador;ela se apoia e se sustenta no esforco de inumeros profis-sionais, alguns mais conhecidos, outros an6nimos, que re-produzem e recriam a racionalidade da ernpresa no seu dia-a-dia. A esse respeito, a fala de Walter Clak e significativa.Comparando dois tipos de ernpresarios, Pipa Amaral, daantiga TV Rio, e Roberto Marinho, ele dira: "Acho que 0sujeito que teve a ideia mais grandiosa de TV no Brasil foi 0Pipa Amaral, urn personagern incrivel, com visao mais gi-gantesca do veiculo do que 0 propr io Chateaubr iand. Apren-di muito com ele, mas seu grande defe ito e que nao confiavaem ninguern, nernno proprio filho, nao delegava nada"."Em relacao a Roberto Marinho: "0 sucesso da TV Globotern a ve l' com 0 fato do Rober to Marinho tee entregue a TVpara que 0 Walter Clark, 0 Joe Wallach, 0 Boni, 0 JoseUlisses Arce e 0 Jose Otavio Castro Neves, a fizessem" .37Pip a Amaral ainda retem as traces da individualidade as-cet ica que concebe 0 ator social como demiurgo de qual-quer tipo de empreendimento. Mas ele nao "delega nada",isto e , impede que se forme uma equipe de colaboradoresessenciais para 0 funeionamento da organizacao. RobertoMarinho compreende melhor os novas tempos, e se con-forma ao anonimato de sua propria criacao, Restam a essesnovas .empreendedores premios de consolacao para que se-jam reconhecidos socialmente na sua individualidade, ascomendas, as biografias encomendadas, a promocao das

    (35) Lucio Kowarick, "Estrategias do Planejamento Social no Brasil", Ca -d~mos do CEBRA?, 2, 1976; Octavio Ianni. Estado e Planejamento no Brasil,RIOde Janeiro, CivilizaCiioBrasileira, 1979.(36) A Vida de Wal ter Clark , op, cit. pp. 41-42.(37) Idem, pp. 4849.i

    ~L------------~------------------------------------, ' ' '' ' ' '~ ' _ - . . i; '10 '\ '

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    14/20

    136 RENATO ORTIZA MODERNA TRADIC;:AO BRASILE[RA

    tel enovelas, e verti cal , sequencia de programas, buscandofixar 0 t ele spectador num (mica canal. A empresa inventaseu proprio lagotipo e passa a promover a si mesma. Desen-volve-se tarnbern a racionalizacao do tempo dos cornerciais .A Excelsior e a primeira em isso ra de televisao a conceberuma identidade entre tempo e espaco comercial. Os pro-gram as tendem agora a nao ser mais vendidos ao patroci-nador , para se transformarem em veiculo do produto a seranunciado, em tempo cornerciali zavel cornprado pelo cli en-teo Da mesma forma qu e 0 anunciante cornprava 0 espacono jornal, ele podia adquirir um "espaco de tempo" no vi-deo para veicular sua rnensagern publicitaria. Tempo semcontetido, vazio, abs trato, por tanto mensuravel e comercia-lizavel.ATV Globo aprofunda essas mudancas. No inicio,como observa Maria Rita Kehl, ela e dirigida por pessoasdo meio artistico e jornalistico, mas logo ha uma modifi-cacao no quadro da direcao, 42 Os novas administradoressao executivos provenientes das areas de marketing e plane-jamento: "Acabava a fase em que os vales eram concedidospelo proprietario da ernissora, que tarnbern negociava ca-che e assinava cheque. Urn americana que durante muitosanos havia cuidado da area administrativa, Joe Wallach, foicontratado para gerir a area administrativa da Globe, irn-plantando urn sistema mais empresarial de gestae. Urn ho-mem de vendas, bastante calejado pelo mercado, Jose Ulis-ses Arce, ficou responsavel pel a area de vendas. No mesmonivel hierarquico que 0 da adrnini st racao e 0 da producao eda programacao, seria contratado algurn tempo depois 0Boni. Como regente dessas tres areas ficava Walter Clark,com a visao de homem de marketing que era"." Esta des-cricao da revis ta Briefing e entusiasta, ela preza os va loresda racionalidade desses hornens-empresa, mas, para alerndo seu tom ideologico , ela aponta para transforrnacoes pro-fundas par que passa 0 s is tema televis ivo quando adrninis-

    (42) Mar ia Ri ta Kehi, Ref lexi io para uma His /aria da TV Globo; Rio deJaneiro. FUNARTE, 1982.(43) Revista Briefing, "Trinta Aries de Televisao", op, cit .

    artes, atividades que trazern prestigio mas que sao vividascomo subproduto de suas tarefas comerciais, J!IP?de-se perceber com clareza a mudanca do etas ern-~resana l quando se toma 0exernplo da televisao. Neste sen-tido, a TV Excelsior, fundada em 1960, da. urn primeiro

    passo no processo de racionalizacao. 0 depoimento de Al-varo Moya~ seu primeiro diretor art is tico, e i lustrativo: "ATV Excelsior era 0 grupo Simonsen, e 0 sonho deles erafazer a ITT no Brasil. Eles e que tinham montado urna redepara a televi.sao Tupi na inauguracao de Brasi lia; f izeramuma transmissao simultanea da inauguracao. Entao 0 Si-n:o_nsen sen~iu que podia fazer uma rede e dominar a tele-vi sao, eles tinha rn uma visao empresa rial " .390 testemunho~e Walt~r Simon~en Neto caminha na mesmadirecao: "Naepoca nos procuravamos criar uma cadeia no estilo da Glo-bo ' .Quan,do ~u digo no est ilo da Globe, e no sentido ernpre-sanal. Nos tinhamos consciencia de que se n6s produzis-semos uma boa programacao, essa programacao teria urnmercado ,dentr? do Brasil, rnuito maior do que os filmes,porque nos estavamos vendendo cultura brasileira - as no-velas que cornecamos a Iazer, os programas hurnoris-ticos";'? A ideia de "vender cul tural ', colocada de maneiratao explicit a, abria a possibi lidade de se plane jar 0 investi-mento em terrnos de uma racionalidade empresarial. Tal-vez.o q,-:e0gr~po Simonsen nao percebesse, como veremosma:s. adiante, e que 0 nac ional isrno do momento lhes seri apoht1c~men~e adverso. A grande inovacao introduzida pelaExc: lslOr foi a raciona lizacao do.uso do tempe." A progra -macae passa agora a obedecer determinados horarios naose atrasa mais, ela e horizontal , program as diari es como as

    'III]l1iI

    :1!II-IIiIII

    , (38), Urn eX~tnplo t ipico des te t ipo de est ra tegia 6 "biografia' e~tomen.dada de Vi ct or Ci vita , que te rn por ob je tivo enal te ce r a s obr . dV L F . ras e sua peSSOR.er ,urlo ernand_o Mer~ad~n~e. Victor Civita, Sao Paulo, Nova Cultural , 1987.Ou ainda promo~~es de insutuicoes como a Fundacao Roberto Marinho.(39} Depo~mento de Alvaro Maya, (FUNARTE}.(40) Depoimento deWalter Simonsen Neto (FUNARTE).(41) Sobre a Excelsior, '1erEdgar Amorin, Historic do TV Excelsio SCPaulo !DART' ... - j r, ao.' ' rmmco., e Alcir Costa. Excelsior: Des'rr"i~iio de um Imperioop: ell. . '

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    15/20

    138 RENATO ORT1Z A M ODE RNA TRADI

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    16/20

    !,

    140 RENATO ORTrZcionavam como contrapeso ao processo de racionalizacao,uma vez que 0 "trabalho em migalhas" dos reda tores podiaserjuntado neste espaco secretado pela propria empresa.Em 1962, a Folha e adquirida pelo grupo Frias-Cal-deira, e passa ao longo dos anos par urna reestruturacaoprofunda. De inicio uma reforrna tecnologica, economica ecomercial, medidas compativeis para uma ernpresa queagora seria parte de todo urn conglornerado. Depois mu-dancas substanciais no processo mesmo do trabalho jorna-I is ti co . U r n novoManual de Redaciio fo i e laborado , procu-rando planejar melhor as atividades e homogeneizar 0 m e -toda deproducao dojornal . Com a autornacao do jornal, acornposicao dos artigos setornou mais agii e precisa, irnpri-mindo uma velocidade mais rapida nil Iabricacao da pro-duto, Como observa urn dos tecnicos: "0 sistema Folhas determinais veio trazer velocidade e aut~nticidade maior a sinforrnacoes, uma vez que nos permitiu eliminar etapas noprocesso industrial graficc" .4g E di fic il perceber a relacaoentre auten tic idade da noticia e velocidade daImpressaomas fica claro que a adocao do novo sistema reduziuo tern:po deproducao industrial , diminuindo os custos e aumen-tando aagilidade do processo. Este t ipo de tecnologia ofe-reee ainda vantagens cornerciais: "nos balcoes de anuncioonde ja estao instalados as terrninais, a anunciante pode teruma visao exata da sua publicidade cIassificada par secoese ordem alfabetica, fazendo 0 ajuste na hora, se desejar. 0sistema fornece varias possibilidades de preco das insercoese fatura imediata" .50 Nao e supreendente que dentro dessesparametres a filosofia da ernpresa se rnodifica: nesse sen-t ide a fala de urn executivo e esc1arecedora."Temos com-batido a ideia de que 0jornalismo tem uma missao a' cum-prir, no senti do mais poiitico-partidario au romantico, meiomistico, que existe em torno disso: a rnissaodaimprensa. Agente procura ver a irnprensa como urn service publico

    (49) Ver Regina Festa , "0. Computadores Revolucionam a Foihu de S.Paulo e 0Jornalismo Brasileiro", Institute para America Latina Sao Paulo 1986pp.13-14. ' .,

    (50) Idem. p. 13.

    . . .~------.-- ------.

    II .

    A MODERNA TRAD!CAO BRA$ILEIRA 141prestado POl' particulates, dai a gente estar sernpre procu-rando saber onde esta 0 interesse do lei tor e vamos satis-fazer esse interesse - porque a gente quer fazer urn jorna-lismo mais exato, mais agudo, mais agressivo, a gente quervender mais jornal, subir sua circulacao" .S! Se lernbrarmosque a ideia d~missao encerra urna dimensao religiosa, po-demos dizer com Max Weber que assistirnos a realizacao deurn exemplo claro de secularizacao, de desencantamento domundo. A "missac" e substituida pelo calculo, 0 lado "exa-tidao" buscando eliminar as elementos "politico" e "ro-rnantico" que inslstern em desafiar as norm as da prcducaoindustrializada.o processo de racionalizacao da sociedade irnplicatarnbem nurn novotipo de relacionamento entre a ernpresa eo empregado. 0 antigo "acordo de cavalheiros", que existiano radio e na televisao, tinha que ser quebrado como umaexigencia dos novas tempos. Nocaso da televisao, isto ocor-re com a entrada da TV Excelsior no mercado. 0 depoi-mento deWalter Simonsen Neto e sugestivo: "Naquela epa-ca, isso em 59, por ai, havia uma coisa odiosa que era 0chamado convenio entre as estacoes, ou seja, urn determi-nado artista au elemento que trabalhasse nurna estacao efosse dispensado dela por algurn motivo, nao era contra-tado por outra estacao. Eu me lembro que 0 primeiro casodesses que ocorreu comigo ja na direcao da estacao, foi urncaso com 0 Silvio Caldas. Na epoca ele tinha urn prograrnade muito sucesso na Record, mas ele brigou nao sei porque, saiu, e eu 0 contratei, 0 Edmundo Monteiro, que eradiretor geral daTupi em Sao Paulo pediu a meu pai que fi -zessemos uma reuniao com ele, e cbegou inclusive a arnea-car meu pai, Esse foi 0 primeiro passe para a quebra dochamado convenio" .;2 Do ponto de vista subjet ivo, essa ati-tude talvez pudesse ser interpretada como a cornpreensaode urriempresario em relacao as dificuldades pelas quaispassavam os artistas, A perspectiva sodo16gica nos orienta

    (S1} Entrevista de Ot:1vio Frias Filho, editor-chefe, a Gisela Goldenstein.op, cit . p, lSS. .(52) Depoimento de Walter Simonsen Neto (FUNARTE) .

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    17/20

    -142 RENA TO ORTIZ 143MODERNA TRADl

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    18/20

    144 RENATa ORTIZ

    E interessante observar que no Brasil a telenovela foiescolhida como 0 produto par excelencia da atividade tele-visiva, Contrariamente ao s Estados Unidos, onde a soap-opera seguiu na televisao 0 esquema do radio, se dirigindo aurn publ ico feminino durante 0 horario da tarde. a novelase transformou entre nos num produto prime-time, e paraeta convergiram todas as atencoes (de melhoria do padraode qual idade e dos investimentos). 0 interesse comercialque exist ia em relacao a s radicnovelas no Brasi l se transfere,portanto, para as telenovelas, as firmas preferindo urn tipode investimento seguro para atingir urn publico de massa.No inicio, algumas multinacionais como Colgate Palmolivee Gessy Lever procuraram repetir 0 esquema que man-tinharn no radio, produz indo paralela rnente a s emissorasalgumas novelas, contratando autores e adaptadores detextos lat ino-americanos. Mas esta nova fase de indust ria-l izacao era incornpativel com a descentralizacao, 0 que fezcom que as emissoras se tornassem as unicas centrais gera-doras de programas. Nao deixa de ser irnportante sublinharque a popularidade da novela, e por conseguinte sua explo-racao comercial, vai redimensionar a lcgica da producaodas empresas, implicando no desaparecimento de g~nerosdrarnaticos que marcaram a decada de SO. Reflro-rne emparticular ao teleteatro e ao teatro na televisao, exibicoesque se vo ltavam para textos c lassicos, adaptacoes de filmes,pecas de auto res nacionais, e que atuavarn em cornpassocom 0 movimento teatral. Em 1963. momenta de experi-mentacao da prirneira novel a diaria, a Excelsior acaba comdois program as cul turai s, Teat ro 9 e Teat ro 6l Se 1964 e 0ana de 0 Direito de Nascer, exibido pela TV Tupi, eletarnbem marca 0 fi rn do Grande Tea tro Tupi , consideradoa te entao como 0 simbolo dos Diaries Associados. Em 1967a Tupi tira do ar 0 TV Vanguarda, encerrando definit iva -mente 0ciclo do teleteatro, e inaugurando-se a era da hege-rnonia da telenovela, produto de massa que canaliza toda adramaturgia televisiva brasileira,o exemplo da telenovela nos remete a discussao do re-l ac ionarnento entre as esferas de producao de bens restri tose a de bens arnpliados, que haviamos abordado anterior-

    A MODERNA TRADI

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    19/20

    14.6 RENATO ORTIZcultural deve constantemente suplantar urna contradicaofundamental entresuas estruturas burocratizadas-padro-nizadas e a originalidade do produto que ela fornece. Seufuncionamento se fundamenta nesses dais antiteticos: bu-rocracia-invencao, padrao-individualidade' _61 Sua analisesabre as estrelas de c inema e neste senti do exemplar, ele asapreende como mercadoria e como mi te ."

    Porern, seria ingenue descartar pura e sirnplesmente aanalise frankfurtiana, pois a enfase na questao da raciona-lidade nos permite captar mudancas estruturais na formade organizacao e de distribuicao da cultura na sociedademoderna. Essa transiorrnacao nao se reduz, no entanto, asua natureza economica, 0que sign ifica dizer que a cul turanao e simplesmente mercadoria, ela necessita ainda se im-par como legitirna, A cultura popular de rnassa e produtoda sociedade moderna, mas a 16gica da industria cultural eta rnbem urn processo de hegemonia. Com isso entendernosque a analise da problematica cultural deve levar em contao movimento rnais amplo da sociedade, e, ao mesma tem-po, perceber a cultura como urn espaco de lutae de dis-tincao social. Penso que 0 advento da sociedade indus tr ialnos colocou frente a uma Iorca que tende a ser hegemonicano campo da cultura. No caso brasileiro percebemos essatendencia quando cornparamos ?s anos 40 e 50 ao desen-volvimento da industri a cultural na decada de 70. A relacaode intercarnbio e cumplicidade que havia entre a esfera deproducao restri ta e a arnpliada 6 revert ida. 0 exemplo dosurgirnento da telenovela em detrirnento do teleteatro e su-gestivo, Ele aponta para 0 fato de que 0 espaco de criafivi-dade na industria cultural deve estar circunscrito a limitesbern deterrninados. Nao quero dizer com isso que a criati-vidade nao possa se expressar mais, que ela desaparecediante da produtividade do sistema, mas charnar a atencaopara 0fato de que sua maniiestacao se torna cada vez maisd ific il , encon tra menos espaco, e esta agora subordinada a

    A MODERNA TRADl~AO BRASILEIRA 147

    mente. Narmalmente esse debate tern side traduzido na li-teratura sabre cornunicacao de massa como uma oposicaoentre cultura de rnassa e cultura de elite. 0 serninario diri-gido por Lazersfeld, em 1959, organizado pelo TamimentInst itu t e a r evist a Daedalus, ilust ra bern como se dividemas opiniees dos intelectuais e dos especialistas quando tra-tam da questao." No caso da. escola de Frankfurt, creio queem Iinhas gerais suas ideias sao conhecidas. Numa socie-dade de consume a cultura se torna mercadoria, seja paraaquele que a fabrica ou a ccnsorne. Na medida em que asociedade avancada e caracterizada pela regressao da audicao, isto e , pela incapacidade de reconhecer a novo, pro-dutores e consurnidores fariam parte de urn mesmo polo,reforcando 0 sistema de dorninacao racionaL soNao querome alongar neste texto sabre as questoes te6ricas, sao varia sas criticas que pcderiamos levantar; pessoalmente pensoque a perspectiva frankfurtiana que ve a ideologia exclusi-vamente como tecnica, 0 que s ignifica ass irni lar a cultura amercadoria, tern 0 merito de chamar a atencao para certosproblemas, mas nos impede de compreendermos outros, Eudiria que a cultura, mesmo quando industrializada, nao enunca inteirarnente mercadoria, ela encerra urn "valor deuso" que e intrinseco a sua manifestacao, H . uma dife-renca.entre urn sabonete e urna opera de sabao. 0 primeiroe sernpre 0 mesmo, e sua aceitacao no mercado dependeinclusive desta "eternidade" que garante ao consumidor aqua lidade de urn padrao. A segunda possui uma unicidade ,por mais que seja u rn produto padronizado. Por isso pre firoa postura de Edgar Morin quando afirrna que "a industria

    (59) Ver Norman Jacobs (org.). Culture for Millions, op, cit. Sobre 0mesmo debate, Georges Friedman, "Culture pour les Mil lions" . i n Ces Mer-veilleux Instruments, Paris, Denoet, 1979.(60) Sliovarios osescritos sabre a cultura como mercadoria. Seguindo est.t radi~ao tcrnos, no caso da i rnprensa , Ciro Marcondes Filho, 0 Capital da Notl-cla ; 550 Paulo, Atiea. 1986. E s intornat lco que urn autor como Hoffman. que r iaAlernanha tern deferidido a tese da "irnprensa como negocio", tenharecentementesublinhado os impasses deste tipo de abordugem exclusivamente econornicn. VerB. Hoffman, "On the Development of a Mater ia li st Theory 01Mass Communi -calion in West Germany". ill Media. Culture and Society. n~especial After theFrankfurt School, vel . 5 , n~ 1, janeiro de1985. (61) Edgar Morin. L'Esprit du Temps, Paris. Grasset, 1962. p. 27..(62) Edgar Morin, Les Stars. Paris. Seuil , 1972.

    . . . . . ;-~\~ .

  • 5/16/2018 O mercado de bens simb licos

    20/20

    1_

    148 RENATO ORTIZ

    o popular e 0 nacional

    16gica comercia l." UtiI izando uma expressao de Foucault ,eu diria que a industria cultural age como uma instituicaodi scip linadora enri jecendo a cul tura . Se nos anos passadosera possivel urn transite entre as areas "eruditas" e de"rnassa" nos moldes como a anali samosante riormente .. i stose devia a propria incipiencia da sociedade de consumobrasil eira ; a distincao social confe rida pela cul tura "a rtis-ti ca" cumpria um papel suplet ivo no subdesenvolvimentoda esfera de bens ampliados, Morin tern razao quando dizque a indust ria cultural t em necessidade da invencao, mas enecessaria completar 0 pensamento e afirrnar que a rel;