o governo do partido dos trabalhadores em...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO Centro de Ciências Humanas e Naturais Programa de Pós-graduação em História Joana D’Arck Caetano O GOVERNO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES 2009 - 2012 Vitória 2014

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPRITO SANTO

    Centro de Cincias Humanas e Naturais

    Programa de Ps-graduao em Histria

    Joana DArck Caetano

    O GOVERNO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES

    2009 - 2012

    Vitria 2014

  • Joana DArck Caetano

    O GOVERNO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES

    2009 - 2012

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Histria da Universidade Federal do Esprito Santo, como requisito para obteno do grau de Mestre em Histria Social das Relaes Polticas.

    Orientador: Luiz Cludio Moiss Ribeiro.

    Vitria 2014

  • Caetano, Joana DArck. O governo do Partido dos Trabalhadores em Cachoeiro de Itapemirim-ES-2009-2012/ Joana DArck Caetano. Vitria, 2014 110f.: il Orientador: Luiz Cludio Moiss Ribeiro Dissertao (mestrado) Universidade Federal do Esprito Santo, Programa de Ps-Graduao em Histria. 1. Partido dos Trabalhadores. 2. Cachoeiro de Itapemirim. 3. Polticas Pblicas. I. Ribeiro Luiz Cludio Moiss. II. Universidade Federal do Esprito Santo. III. Ttulo.

  • Joana DArck Caetano

    O GOVERNO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM ES

    2009 - 2012

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Histria da Universidade Federal do Esprito Santo, como requisito para obteno do grau de Mestre em Histria Social das Relaes Polticas.

    _________________________________________ Luiz Cludio Moses Ribeiro (Orientador) UFES

    __________________________________________ Pedro Ernesto Fagundes UFES

    ___________________________________________ Vitor Amorim de Angelo UVV

    Vitria, de 2014.

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo aos meus filhos Gilberto e Sofia por suportarem minha ausncia mesmo

    estando dentro de casa. A Maria, minha me, e Gilberto, meu pai (in memorian),

    pelo apoio. Gilberto, em nome de todos os irmos, por sempre me motivar. amiga

    Marcelle F. Lins por estar sempre por perto e ao meu orientador Luiz Cludio M

    Ribeiro. Sem estas e outras pessoas de minha convivncia, este trabalho no seria

    hoje realidade.

  • [...] E quem garante que a Histria carroa abandonada Numa beira de estrada Ou numa estao inglria

    A Histria um carro alegre Cheio de um povo contente Que atropela indiferente Todo aquele que a negue

    um trem riscando trilhos Abrindo novos espaos Acenando muitos braos Balanando nossos filhos [...]

    (MILANS, 1975)

  • RESUMO

    A presente dissertao analisa a trajetria do Partido dos Trabalhadores no

    municpio de Cachoeiro de Itapemirim, cidade localizada ao sul do estado do Esprito

    Santo, e a chegada ao poder nas eleies de 2008, bem como a atuao da

    administrao petista no perodo de 2009-2012. A pesquisa aponta as aes

    tomadas em relao s polticas pblicas e sociais, principalmente no tocante s

    necessidades bsicas dos cidados cachoeirenses. A discusso que permeia o

    trabalho so as comparaes entre os governos passados, de dois grupos polticos

    distintos que se revezavam no poder, e o governo do Partido dos Trabalhadores. O

    municpio de Cachoeiro de Itapemirim aponta muitas necessidades prioritrias,

    visivelmente no que concerne infraestrutura urbana dos bairros perifricos, que

    cresceram desordenadamente e sem o acompanhamento do Poder Pblico. A

    proposta apontar as melhorias ocorridas na vida dos cidados cachoeirenses e

    demonstrar os avanos com a gesto petista graas inverso de prioridades, a

    reorganizao socialista - da periferia para o centro - em relao s aes de

    governo e a aplicao dos recursos pblicos para a melhoria da qualidade de vida

    dos cachoeirenses.

    Palavras-chave: Partido dos Trabalhadores. Cachoeiro de Itapemirim. Polticas

    pblicas.

  • ABSTRACT

    This dissertation analyzes the trajectory of the Workers' Party in the city of Cachoeiro

    de Itapemirim, located in the south of the state of the Esprito Santo, and the coming

    to power in the elections of 2008, as well as the activity of the Workers Party

    administration during the period of 2009-2012. The study identifies the actions taken

    in relation to public policies and social, particularly in relation to the basic needs of

    citizens of the city. The discussion that permeates the work are the comparisons

    between the governments past, two different political groups that collect data in

    power, and the government of the Workers' Party. The municipality of Cachoeiro de

    Itapemirim points many priority needs, visibly as regards the urban infrastructure of

    peripheral neighborhoods, which grew haphazardly and without the monitoring of

    Public Power. The proposal is to point out the improvements that have occurred in

    the lives of citizens of the city and demonstrate the advances with the management

    WorkersParty thanks to priority inversion, the socialist reorganization - from the

    periphery to the center - in relation to government actions and the application of

    public resources for the improvement of the quality of life for who live in the city of the

    Cachoeiro de Itapemirim.

    Keywords: Workers Party. Cachoeiro de Itapemirim. Public policies.

  • SUMRIO

    1 INTRODUO...................................................................................................10 2 DESCOBRINDO O ESPRITO SANTO. ........................................................12

    2.1 Economia cafeeira no Esprito Santo. ..........................................13 2.2 Cachoeiro de Itapemirim passado e presente.........................14

    3 POLTICA PS DITADURA EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM E ORGANIZAO DO PT NO MUNICPIO ........................................................25 4 DESAFIOS DA GESTO PBLICA NO MUNICPIO DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM 2009-2012.................................................................................42

    4.1 A Frente Nacional dos Prefeitos como aliada do municpio.......57 4.1.1 O municipalismo e a Frente Nacional dos Prefeitos ................63 4.2 O municpio como espao do cidado ....................................... 66 4.3 Aplicabilidade do exerccio da cidadania....................................71 4.3.1 Trabalho e dignidade humana.................,..................................71 4.3.2 Educao e transformao social..............................................74 4.3.3 A infraestrutura e a segregao espacial..................................80 4.3.4 Segurana Pblica X Vulnerabilidade social.............................87 4.3.5 Sistema de Sade X Fragilidade do usurio.............................88 4.3.6 Cultura como instrumento de cidadania....................................93

    5 POLTICAS PBLICAS................................................................................ 99

    5.1 Poltica rural.................................................................................... 99 5.2 Populao urbana ....................................................................... 100

    6 CONSIDERAES FINAIS.........................................................................105

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..............................................................109

  • 10

    1 INTRODUO

    O presente trabalho prope a anlise da trajetria do Partido dos

    Trabalhadores no municpio de Cachoeiro de Itapemirim, sua chegada ao

    poder nas eleies de 2008 e atuao do governo petista no perodo de

    2009/2012 em relao s polticas pblicas e sociais, principalmente no tocante

    s necessidades bsicas dos cidados cachoeirenses.

    Neste trabalho fazemos uma investigao acerca do modo petista de

    governar em Cachoeiro de Itapemirim, que mudou o cenrio poltico, depois de

    dcadas de revezamento de dois grupos polticos no poder, e se de fato

    correspondeu s expectativas dos eleitores que apostaram na mudana

    proposta na campanha eleitoral pelo, ento candidato, hoje prefeito reeleito

    Carlos Casteglione, que representa o Partido dos Trabalhadores.

    nesse contexto que levantaremos informaes que esclaream sobre

    as aes do governo petista em Cachoeiro de Itapemirim diante dos problemas

    enfrentados pelo dirigente municipal entre 2009 e 2012 e se houve resultados

    positivos no cotidiano dos cidados cachoeirenses a partir da implementao

    de polticas pblicas no municpio localizado ao Sul do Esprito Santo.

    O que me influenciou a iniciar os levantamentos sobre este assunto foi o

    interesse em relao s novas propostas de polticas pblicas neste perodo, o

    desejo de contribuir para a construo da cidadania ativa e buscar informaes

    se houveram resultados efetivos das polticas aplicadas pelo governo petista

    em Cachoeiro de Itapemirim-ES, no que concerne ao acesso aos servios

    pblicos no cotidiano dos muncipes.

    A experincia pessoal junto aos bairros perifricos de Cachoeiro de

    Itapemirim, participando como candidata a vereadora nos anos 2000, 2004,

    2008 e 20012, pelo Partido dos Trabalhadores e atuando como agente ativa no

    cenrio poltico da cidade motivou-me a questionar os reflexos das polticas

    pblicas como resultado das aes baseadas no programa de governo do PT e

    se houve uma interveno positiva na qualidade de vida, na insero social dos

    indivduos, sua participao e conscincia poltica.

    Para que consigamos entender as aes atuais dos governantes,

    preciso que faamos um estudo do passado, que imprescindvel para a

    compreenso do presente que permeia este trabalho, em geral, a histria no

  • 11

    somente o estudo do passado, ela tambm pode ser, com menor recuo e

    mtodos particulares, o estudo do presente. (CHAUVEAU; TTARD, 1999,

    p.15).

    O que se busca a investigao em relao aos reais resultados no

    avano da democracia e da construo da cidadania no municpio de

    Cachoeiro de Itapemirim-ES, a partir da chegada do Partido dos Trabalhadores

    ao poder local e a formulao das polticas pblicas da gesto do prefeito

    Carlos Casteglione, eleito pelo voto popular em 2008, com promessa de

    mudana na poltica e apresentando bandeiras sedutoras, principalmente para

    a classe menos favorecida, em geral moradores da periferia, como por

    exemplo, a inverso de prioridades, que consiste em comear a trabalhar as

    necessidades urgentes, da periferia para o centro,

    [...] Inverter prioridades significa se contrapor a uma imagem de administrao elitista e transformar os valores que norteiam o julgamento feito pela populao de uma administrao, consolidando uma outra vinculada ao respeito dos direitos sociais e da cidadania. A inverso de prioridades traduz tambm uma nova concepo de desenvolvimento, onde a realocao dos fundos pblicos se apia numa proposta de organizao socialista do territrio, de desconcentrao urbana e isonomia social na cidade [...] (BITTAR, 1992, p. 27)

    Neste contexto, o municpio de Cachoeiro de Itapemirim aponta muitas

    necessidades prioritrias, visivelmente no que concerne infraestrutura urbana

    dos bairros perifricos, que cresceram desordenadamente e sem o

    acompanhamento do Poder Pblico que os relegou por muito tempo. Outros

    servios essenciais como moradia social, transporte pblico, iluminao pblica

    e espaos de lazer ainda so reclamados pela populao cachoeirense,

    evidenciando uma demanda reprimida desses servios. A proposta deste

    trabalho analisar a gesto petista quanto aplicao dos recursos pblicos

    que visem melhorias na vida do cachoeirense, com foco na inverso de

    prioridades.

  • 12

    2 DESCOBRINDO O ESPRITO SANTO

    O Estado do Esprito Santo est entre os menores estados, em termo de

    extenso territorial, da federao brasileira. Constitudo de 78 municpios e

    tendo como capital Vitria, agraciado por fazer limite com o Oceano Atlntico,

    possibilitando a atividade porturia que muito contribui para o desenvolvimento

    econmico. Limita-se tambm ao Norte com a Bahia, ao Sul com o Rio de

    Janeiro e a Oeste com Minas Gerais.

    O Esprito Santo, no incio do povoamento no Brasil, possua densa

    mata e os ndios habitantes destas terras seriam mais hostis que em outras

    regies. Se comparado s capitanias mais prximas, o desenvolvimento do

    Esprito Santo foi tardio. Seu povoamento se deu lentamente, com poucos

    ncleos, e mais concentrados na ilha, atual capital.

    Segundo Gabriel Bittencourt,

    vista como um obstculo imposto colonizao portuguesa, no incio da fase colonial, toda a regio capixaba era coberta por uma exuberante floresta tropical que atingia cerca de 90% do atual territrio do estado. Aliados densa floresta, os rios encachoeirados para o interior e o indgena adverso, pareciam completar o quadro desfavorvel. Sobretudo, se levarmos em considerao que a colonizao brasileira tomou o aspecto de uma verdadeira empresa comercial, particularmente pela agricultura, cujos estmulos eram provenientes do exterior. (BITTENCOURT, 2006, p. 106-107)

    Os ndios botocudos, considerados selvagens hostis e perigosos pelo

    colonizador, e a preferncia pelos caminhos do Rio de Janeiro para transportar

    os minerais e pedras preciosas e assim evitar o contrabando pelo Rio Doce,

    tambm foram causas que impediram a interiorizao do Esprito Santo. A

    descoberta do ouro nos fins do sculo XVII e incio do sculo XVIII ao invs de

    servir de alavanca para o desenvolvimento local, foi motivo de isolamento

    proveniente de planos estratgicos para proteger a capitania de ataques

    estrangeiros e obstar o contrabando pelo litoral espritossantense.

    Somando a esses fatores, o acar, responsvel pelo aparecimento de

    vilas e povoados que contavam com uma pequena populao, foi perdendo

    fora por causa do direcionamento desta economia para o Nordeste aucareiro

    que atraia capitais disponveis ao acar colonial por oferecer melhores

  • 13

    condies para esse tipo de agroindstria. Alm disso, os desbravadores das

    terras capixabas no demonstravam interesse na agricultura, pois o foco de

    suas atenes eram o descobrimento e a explorao de metais preciosos.

    2.1 Economia cafeeira no Esprito Santo

    Com a decadncia da economia aucareira, uma nova economia vai

    ganhando forma e musculatura no Esprito Santo, a economia cafeeira, a partir

    de meados do sculo XIX. O solo capixaba possua fertilidade e condies

    favorveis ao plantio do caf, pois suas terras ainda eram virgens e

    desabitadas, fator que propiciava facilidades para a lavoura da rubicea.

    no Esprito Santo, os cafezais aumentavam continuamente. Na medida em que, iniciando-se o lento arranco para o desenvolvimento material e capitalista do Pas, o caf dilatava a fronteira agrcola, monopolizava tambm a rea ocupada pela lavoura canavieira que terminar, praticamente, por ceder todo seu espao. (BITTENCOURT, 2006, p.163)

    Neste caso, novas terras foram sendo ocupadas para atender s

    necessidades do mercado produtor. A essa altura, cresce o interesse do

    governo no incremento do povoamento da provncia do Esprito Santo, o que

    resultava em preos mais baixos das propriedades como forma de incentivo.

    Estes fatores promoveram a expanso da cafeicultura nas terras ao sul do

    Esprito Santo e foram determinantes para a ocupao econmica da regio e

    fundao do ncleo urbano de Cachoeiro de Itapemirim,

    neste perodo, a fertilidade do solo e o clima de altitude foi o incentivo para o cultivo dos cafeeiros do tipo Bourbon, como em Itaperuna e Carangola, de onde vinham a maior parte dos fazendeiros que se tornariam os grandes proprietrios nos contrafortes meridionais da Serra descendo, pouco a pouco, os vales dos rios Itabapoana e Itapemirim, assinalando a fundao de Cachoeiro de Itapemirim, convertida em grande emprio comercial a partir do meado do sculo XIX. (BITTENCOURT, 2006, p.246)

    Nesse contexto, o municpio de Cachoeiro de Itapemirim foi se

    consolidando com base na economia cafeeira e, posteriormente, novas

    condies econmicas contriburam para o seu desenvolvimento, culminando

  • 14

    em sua emancipao poltica em 25 de maro 1867. A produo de caf foi a

    base da economia para a formao do municpio.

    2.2 Cachoeiro de Itapemirim passado e presente

    O municpio de Cachoeiro de Itapemirim est localizado no sul do

    Estado do Esprito Santo, encravado entre as montanhas e s margens do rio

    Itapemirim, que atualmente atravessa a cidade de norte a sul. No entanto,

    passou por vrias etapas polticas at ganhar o ttulo de municpio emancipado.

    Primeiro foi freguesia (1856), com o nome de Parchia de S. Pedro das

    Cachoeiras de Itapemirim, depois foi vila (1867), posteriormente comarca

    (1876), e finalmente cidade, tendo como primeiro prefeito o Coronel Francisco

    de Carvalho Braga, de famlia portuguesa, da cidade de Braga e pai do poeta

    Newton Braga e do cronista Rubem Braga. A origem do municpio pode ser

    verificada na descrio de alguns historiadores, entre eles, Antnio Marins,

    habitaes ribeirinhas, disseminadas rio abaixo; s vezes rodeadas de palissadas protectoras, habitadas por caboclos e mestios. Pequenas roas em volta, onde por egual se cultivava a mandioca as bananeiras e algumas touceiras de canna de assucar. A pesca e a caa provio fartamente vida. Raizes e benzeduras, curavo os males do corpo. (MARINS, 1919, p.135)

    O nome do municpio alvo de curiosidade devido utilizao do

    substantivo masculino cachoeiro ao invs de cachoeira, porm, na poca,

    isso era uma maneira prpria dos brasileiros, principalmente dos habitantes do

    Esprito Santo. H tambm outras verses como: que veio da simplificao

    popular de encachoeirado, que existia na margem esquerda do rio um cajueiro

    e os navegantes do rio o chamavam de cajueiro do Itapemirim etc. Passou a

    receber vrias denominaes at ser o que foi grafado definitivamente

    Cachoeiro de Itapemirim, no ato da instalao da comarca, em 1877, na

    regncia da Princesa Isabel e tambm em 1884, quando a Cmara Municipal

    informou para o Dicionrio Geogrfico do Brasil que A sede do municpio

    Cachoeiro de Itapemirim.

    Atualmente, o rio Itapemirim que originou a cidade no utilizado como

    meio de transporte, suas guas diminuram bastante e seu leito foi estreitado

  • 15

    por construes muito prximas, casas, prdios e uma parte foi aterrada para a

    construo da Avenida Beira-Rio. Foram construdas barragens em partes do

    rio na tentativa de bloquear a vazo da gua em um perodo que parecia ser o

    fim do rio Itapemirim, que estava seco, com as pedras mostra e a gua muito

    poluda. O esgoto dos moradores era jogado diretamente dentro da rede

    pluvial, contaminando as guas e destruindo a fauna e a flora. A falta de

    drenagem, juntamente com a de conscincia ecolgica da populao, que joga

    todo tipo de lixo dentro do rio, inclusive mveis, foi fator determinante para

    agravar a sade do Itapemirim. O servio de saneamento e tratamento de gua

    era prestado pelo SAAE (Servio de Saneamento de gua e Esgoto), uma

    autarquia municipal. A partir do momento em que a concesso para a

    explorao desses servios passou s mos da iniciativa privada, inicialmente

    feita pela CITGUA, com a mudana de razo social para FOZ DO BRASIL e,

    atualmente, ODEBRECHT AMBIENTAL, houve um investimento na

    modernizao dos equipamentos, no atendimento ao pblico, no controle da

    qualidade da gua e na educao ambiental da populao. O resultado se

    mostrou positivo na melhora do atendimento dos servios. Em morros da

    periferia, era comum a falta de abastecimento de gua nas casas por uma

    semana, problema que hoje a populao do municpio no enfrenta mais.

    Sobre isso, Bittar pontua,

    O reconhecimento da eficcia de alguns servios pblicos organizados com a participao do capital privado no significa acatar um discurso sobre a ineficincia do Estado ou descartar processos de estatizao. A proposta neoliberal quer nos fazer crer que o Estado ineficiente por natureza, esquecendo de dizer que esta ineficincia foi produzida por um modelo de desenvolvimento que privilegiou o escoramento das classes dominantes na mquina estatal, gerando a poltica de preos subsidiados e o dficit nas empresas pblicas. (BITTAR, 1992, p.19)

    A parceria do capital privado com o poder pblico pode revelar um

    caminho mais acertado para que a populao possa ser atendida em suas

    necessidades, logicamente desde que haja o controle externo, como por

    exemplo, agncias reguladoras comprometidas com a defesa dos interesses

    dos usurios dos servios pblicos. Essa juno de interesses entre Poder

  • 16

    Pblico e empresa privada no pode ser confundida com estatizao. Neste

    mesmo sentido, Bittar faz uma reflexo sobre o assunto,

    o enfrentamento a este projeto1 exige uma reviso de concepes no

    interior da prpria esquerda. O velho discurso estatizante, que confunde socialismo com estatizao, no suficiente, para se contrapor a um discurso que prope a reforma de Estado. importante ressaltar que a sntese ou o plim-plim que passa para a populao de que a soluo a reduo do nmero de funcionrios pblicos e a substituio do Estado pela iniciativa privada. (BITTAR, 1992, p18)

    Prestar servios pblicos de qualidade responsabilidade do Poder

    Pblico, porm, no h ilcito na concesso da explorao desses servios,

    contanto que a prioridade seja o fim pblico a que se destina e que o

    compromisso e a transparncia rejam os contratos firmados entre as partes

    interessadas e tambm que isso seja aprovado pela maioria da populao.

    Dessa forma, a partir de algumas aes de preservao da cabeceira

    por parte do Comit da Bacia do Rio Itapemirim, que tem por objetivo promover

    a mobilizao da sociedade, usurios, poder pblico e entidades no

    governamentais e de aes da Concessionria de Servios de gua e Esgoto,

    atual Odebrecht Ambiental, e ainda da Agersa (Agncia Reguladora de

    Servios de Saneamento), o rio Itapemirim tem apresentado sinais de

    recuperao, e uma das comprovaes o retorno do bigu, um pssaro que

    se alimenta da pesca. Tal fato considerado pelos ambientalistas como um

    vestgio de que as guas de um rio esto com grau de despoluio bastante

    evoludo.

    Como j exposto, a sede do municpio nasceu s margens do rio e

    cercada por colinas que no passado eram lavouras de caf. Depois, passaram

    a abrigar pequenas culturas que abasteciam a cidade e, posteriormente, foram

    loteadas para dar lugar aos bairros residenciais. Mais ao longe, a rea toda

    rodeada por uma cadeia de montanhas rochosas, destacando-se uma delas

    como smbolo do municpio, o Pico do Itabira ou Pedra do Itabira, tombada

    como patrimnio natural pelo Conselho Estadual de Cultura,

    1 Refere-se ao projeto neoliberal que tem como eixo o repasse de recursos pblicos para

    setores privados

  • 17

    Para alm da zona urbana comeam as grandes montanhas rochosas, que emergem de valles profundos, talhados em socalcos e alcantis em cujas bases serpeam em rpidos declives e correm amortecidas nas planuras alagadas onde vicejam gramneas densas, as aguas dos innumeros ribeires , que cruzam por todas as terras dos districtos, banhando-as fartamente. De toda cidade avista-se, como vedetta mudo das geraes que passam. A rocha Itabira de bizarra estructura (1), destacando-se no azul do firmamento. (MARINS, 1919, p.47)

    O desenvolvimento do vale do Itapemirim foi fundamental para a

    formao do municpio de Cachoeiro de Itapemirim, que se tornou um

    importante plo da economia da provncia do Esprito Santo. Sobre o novo

    cenrio da regio sul o

    grande entusiasta do desenvolvimento do vale do Itapemirim, o governador Francisco Alberto Rubim falou da existncia de um caxoeiro a seis lguas de distncia (hoje Cachoeiro de Itapemirim), onde mandou estabelecer, para proteo e apoio ao desenvolvimento da regio, dois quartis, um na parte norte, guarnecido por tropas da capitania do Esprito Santo, e outro no lado sul do rio, construdo e guarnecido, estranhamente por soldados da Segunda Diviso de Minas Gerais. Esses quartis, com a denominao de quartel da Barca, em homenagem ao conde da Barca, deram origem a Cachoeiro de Itapemirim e estavam situados prximos de onde hoje o Cemitrio Municipal (lado norte) e incio do bairro Baiminas (lado sul). (OLIVEIRA, 2008.p.527:528)

    O municpio de Cachoeiro de Itapemirim, cortado pelo rio, possua um

    servio de transporte rudimentar uma canoa para fazer a travessia das

    pessoas de uma margem outra, mediante o pagamento da passagem pelo

    usurio, sob um contrato firmado com a Cmara Municipal. Cada embarcao

    comportava oito passageiros e o valor da passagem era oitenta ris. O ltimo

    contratante do servio de transporte fluvial foi o negro Felipe da Silva Costa,

    em 1887. No mesmo ano, foi inaugurada a Ponte Municipal, inaugurada em 11

    de junho de 1887, e a travessia era feita sob a cobrana de pedgio at o ano

    de 1920, quando as despesas com a construo foram totalmente pagas e

    ento foi liberada a passagem gratuita. At ento, a Cmara a alugava a um

    particular para explor-la. O valor da passagem baseava-se numa tabela de

    preos que adotava critrios como: pessoa calada, carro com carga ou sem

    carga, caf ou outro produto transportado por pedestres era cobrado por quilo,

    litro ou fracionado etc. A cobrana era efetuada de um lado e do outro da ponte

    (BRAGA, 1986, p.35).

  • 18

    O lugarejo foi se desenvolvendo s margens do Itapemirim, com a

    colonizao vindo rio acima e as embarcaes sendo obrigadas a parar, devido

    s corredeiras que dificultavam a navegao, na altura do Baiminas e do lado

    norte, em frente, onde depois seria, a Fbrica de Cimento, atualmente

    desativada. Nesta regio, foram construdas as primeiras casas do municpio e,

    posteriormente, tornou-se importante polo econmico, principalmente pela

    utilizao do rio Itapemirim como transporte fluvial para passageiros e

    escoamento de produtos como madeira, caf, cana-de-acar, que eram

    transportados at o porto da Barra.

    Grandes extenses de terras foram dominadas por plantadores de caf

    formando os latifndios na regio, quando as amplas negociaes comerciais

    no sculo XIX eram realizadas pela elite cafeeira. Em 1856, viviam em

    Cachoeiro e nas grandes fazendas ao redor, 3.561 pessoas, sendo 2.141

    escravas (BRAGA, 1986, p. 25), havendo, desta forma, mais escravos que

    pessoas livres. Com a abolio da escravatura, em 1888, os libertos foram

    entregues prpria sorte. Em Cachoeiro, concentrava-se o nmero de 6.965

    dos 13.403 escravos que havia no estado no dia da abolio, considerado o

    maior contingente do Imprio (BITTENCOURT, 2006, p. 548). D-se o incio

    favelizao e, por conseguinte, desigualdade social no Brasil, refletida at

    nos dias atuais, processo que foi agravado ainda mais com o desenvolvimento

    industrial nos grandes centros urbanos e pela desvalorizao do trabalhador

    rural nesse perodo. As habitaes foram sendo construdas margem dos

    centros urbanos sem nenhum acompanhamento tcnico profissional, sem

    infraestrutura e sem o olhar criterioso do Poder Pblico. Sobre o tema, Gabriel

    Bittencourt discorre,

    A industrializao engendra um efeito social bastante adverso, sobretudo em pases de grandes desigualdades sociais e em vias de desenvolvimento. Ela eleva os ndices de favelizao nas reas urbanas, atrai trabalhadores das regies vizinhas e eleva o preo da terra urbana, desorganizando o seu espao. Enfim, promove a poluio urbana, degradando o nvel de vida nas grandes cidades [...] (BITTENCOURT, 2006, p.426)

    Por causa da alta demanda de transporte de caf, o rio Itapemirim

    passou a ser insuficiente nessa funo, e para atender a essa necessidade,

    foram construdas as ferrovias Caravelas (1887), Leopoldina Railway (1903) e

  • 19

    Estrada de Ferro Itapemirim (1926), transformando a paisagem natural do

    municpio,

    (...) mesmo a zona cafeeira de Cachoeiro de Itapemirim era considerada mal servida de meios de transportes. At a chegada dos trilhos da Leopoldina Railway (1903). O sistema integrado pela Estrada de Ferro Caravelas (inaugurada em 1887), era tido como insuficiente: uma ferrovia acanhada, mal construda e encravada num porto fluvial sem boas condies navegabilidade. Da a criao posteriormente, da Estrada de Ferro de Itapemirim (1926), cujo leito acompanhava parte do curso do rio do mesmo nome e visava beneficiar a produo do baixo Itapemirim, particularmente da Usina Paineiras. (BITTENCOURT, 2006, p.306)

    A construo das ferrovias foi de grande importncia para o

    desenvolvimento econmico do municpio que, geograficamente, posicionava-

    se em local estratgico e isso facilitava o escoamento da produo de caf e a

    articulao econmica entre os municpios limtrofes,

    Cachoeiro de Itapemirim constitua um entroncamento ferrovirio; alm das linhas para o Rio de Janeiro e para Vitria, possua outras para o litoral (at Barra do Itapemirim e Maratazes, ferrovia construdas nos anos 1920 pelo governo estadual), para Castelo e uma ainda que, passando por Alegre e Guau, chegava a Carangola, j em Minas Gerais. (ACHIAM, 2010 p.58)

    Embora a principal atividade econmica fosse a lavoura de caf, outras

    vocaes econmicas foram surgindo, e com o fornecimento de energia

    eltrica e de cursos de gua que possibilitavam sua gerao (Cachoeiro foi a

    dcima cidade do pas e a primeira do estado a adquirir luz eltrica), o

    municpio passou a ser atrativo para investimentos dos governantes estaduais

    e empreendedores particulares que traziam divisas e desenvolvimento para o

    municpio,

    Fbricas de tecidos, de cimento, de leos, serrarias, usinas de acar e novas unidades de produo de energia eltrica, dentre outras atividades, passaram a se instalar na regio. Empregos surgiram, e com isso o comrcio ampliou seu mercado consumidor, tornando-se tambm uma atividade econmica importante para o municpio. (BORGES, SALDANHA, 2011, p. 170)

    Em relao importncia poltica do municpio, Cachoeiro de Itapemirim

    foi bero de quatro presidentes do Estado: Jernimo de Sousa Monteiro (1908-

    1912), Marcondes Alves de Souza (1912-1916), Bernardino de Sousa (1916-

    1920) e Florentino Avidos (1924-1928). No que tange cultura, o teatro

  • 20

    remonta segunda metade do sculo XIX, precisamente em 1866, quando

    surgiu o S.P. ENSAIOS DRAMTICOS. Posteriormente, foi fundada a

    Sociedade de Recreio Dramtico Cachoeirense, que apresentava peas e

    atraa muitas pessoas para os espetculos. No incio do sculo XX, as

    apresentaes aconteciam no Caadores Carnavalesco Clube e depois no

    Cine Teatro Central. Havia ainda o Cine Teatro Santo Antnio e o Cine

    Guandu. A msica tambm se fez presente por meio da Escola de Msica de

    Cachoeiro de Itapemirim, criada em 1930 pelo professor Alfredo Herkenhoff,

    que oferecia aulas de solfejo, violino, piano, violoncelo, cornetin, trombone,

    flauta, saxofone e canto, e no que se refere bandas de msica, ainda mais

    longnquo os registro, pois datam de 1880, 1900, 1917, 1922 e 1931, entre

    elas, duas mantm sua atividades, a banda Lira de Ouro (1922) e a banda 26

    de julho (1931). Outras aes culturais aconteciam, como festejos

    carnavalescos, temporadas de jantares danantes no Hotel Itabira, concurso

    promovido pela loja Nova Sria sobre conhecimentos gerais, com prmios que

    iam desde boneca a caminho, construes de coretos em praas pblicas, em

    geral utilizado pelas bandas musicais que atraam tanto o pblico infantil como

    o adulto. No campo das letras, tambm havia bons atrativos como os poetas

    dr. Frederico Codeceira e Newton Braga, o cronista Rubem Braga que em 1936

    escreveu e publicou O Conde e o Passarinho e bateu recorde de vendas na

    cidade.A venda de livros em Cachoeiro era considerada um bom negcio entre

    o exploradores do ramo, uma vez que os cachoeirenses mostravam-se vidos

    por leitura de todo o tipo. O gosto literrio variava de autores estrangeiros como

    Ea de Queiroz, Delly e Ardel a autores nacionais como Jos de Alencar,

    Castro Alves, Casimiro de Abreu e outros.

    Cachoeiro de Itapemirim foi palco de muitas atividades culturais e a vida

    social se enchia de encantos. Houve tempos de glria no s no campo

    econmico, mas tambm no poltico e cultural,2

    Ns estamos falando com os olhos do passado, quando Cachoeiro subiu, elevou-se e ocupou a posio de capital da indstria do Estado, conceito que, alis, tambm chegou a alcanar na rea concernente poltica, bem como, no espao cultural [...] (MACIEL, 2003, p.37/38)

    2 Ver Maciel, 2003.

  • 21

    Nessa poca, Cachoeiro de Itapemirim atraa os olhares de polticos

    influentes, investidores, empresrios da indstria e do comrcio e

    trabalhadores de outros lugares para se estabelecerem na sede do municpio.

    Assim, como em todo centro urbano brasileiro, os trabalhadores foram

    brotando, vindos do campo para vender sua fora de trabalho nas indstrias

    que se instalavam no municpio. Sem opo de moradia no centro, foram

    construindo seus barracos nas reas perifricas da cidade. Jos Eli da Veiga

    sustenta que os fenmenos de aglomerao e de congesto urbana so

    obviamente inseparveis da debilitao de certas regies e do xodo rural.

    (VEIGA, pg. 281).

    No centro da cidade, precisamente nas ruas 25 de maro, Moreira, Dona

    Joana, Costa Pereira, Cel. Francisco Braga, Prof. Quintiliano, Bernardo Horta,

    Praa Jernimo Monteiro , assim como na rua Moreira, do outro lado do rio,

    alm de outras vias centrais, foram construdos os prdios ou casas para os

    moradores das famlias mais tradicionais, e no entorno foram surgindo

    empreendimentos como o Mercado Municipal, Palcio Bernardino Monteiro,

    que posteriormente se transformou em colgio, Igreja Nosso Senhor dos

    Passos, Centro Operrio e Proteo Mtua, a Escola Gracia Guardia, Catedral

    de So Pedro, o Iate Clube, a Escola Liceu Muniz Freire, o Frum, a Escola de

    Comrcio, o Mercado da Pedra, a Agncia dos Correios, agncias bancrias,

    cartrios e, posteriormente, hotis, restaurantes, livrarias, clubes, teatros,

    cinemas, lojas comerciais, fbricas, supermercados, farmcias, entre outras

    atividades necessrias populao cachoeirense.

    Com o passar dos anos, ocorreram diversas transformaes no espao

    geogrfico. Em 1995, houve a retirada dos trilhos do centro da cidade para dar

    lugar construo de uma das principais vias, a Linha Vermelha. A cidade

    perdeu o ttulo de polo econmico, em razo de fechamentos ou transferncias

    de indstrias para outros lugares, em consequncia dos altos impostos e da

    guerra fiscal, agregados falta de capacitao profissional e de investimentos

    e o no acompanhamento da modernizao dos equipamentos. No entanto,

    com a descoberta das jazidas minerais na regio, os investimentos migraram

    para a explorao do setor de mrmore, granito e rochas ornamentais.

    Segundo Manoel Gonalves Maciel, em 1990 acontecia a 2 Exposio de

  • 22

    Mrmore e Granito de Cachoeiro de Itapemirim e a beleza e alta qualidade e

    variedade das amostras seria motivo de

    atrao irresistvel aos antigos gregos, egpcios e romanos que ornamentavam suas construes com mrmores rarssimos- os palcios, os templos, as manses e os teatros; fascinaria aos orgulhosos faras, que irigiam enormes construes, ornamentando-as com mrmores especiais dificilmente encontrados; causaria deslumbramento ao rei Artaxerxes da Prsia, que pavimentava seus palcios com os preciosssimos mrmores de Paros. Superaria as belezas dos palcios Assrios-Babilnicos, as enormes construes consagradas ao culto da divindade, o templo da Fortuna Viril. O famoso templo de Jerusalm. Tudo edificado de mrmore esmeraldino. E, pode-se dizer, os blocos marmreos expostos nesta exposio, procedentes de Gironda, Itaca, Prosperidade, Vargem Alta etc... causaria superioridade s cavas da Ilha de Paros, na Grcia, s cavas do Lcio, s massas de Carrara, na Itlia, aos mrmores Porfiro rubro do Egito, ao Altssimo, o Corchia, o Monte Costa, o Estaturio, o Porraci e o Branco Altssimo, antigamente muito famosos. (MACIEL, 2003, p.396/397)

    Entretanto, o mrmore de Cachoeiro somente foi reconhecido por sua

    variedade e qualidade no final da segunda metade do sculo XX, pois, at

    ento, a explorao desses minerais era duvidosa. Ainda que alguns gelogos

    atestassem sua existncia no Brasil, raramente eram encontrados e, ainda

    assim, apresentavam qualidade muito abaixo da expectativa. A preferncia era

    pelo mrmore da Frana, Alemanha, Holanda, Grcia e de outros pases de

    onde eram importados para c. Um dos mais famosos era o mrmore de

    Carrara, da Itlia, cobiado pelo mundo todo. Atualmente, o municpio de

    Cachoeiro de Itapemirim promove a Feira Internacional do Mrmore e Granito,

    que est na 25 edio e atrai pessoas de todo o mundo interessadas no

    negcio das rochas ornamentais.

    A primeira marmoraria era a do Sr. Waldemar Alves Tavares, instalada

    na regio central da cidade, na Rua 25 de maro, e consta de junho de 1919,

    com o nome de Marmoraria Itabira. Por muitos anos, era a nica marmoraria

    existente e trabalhava com a construo de mausolus, lpides, catacumbas,

    estatuetas de mrmore, mesas, lavatrios e outros objetos de utilidade

    domstica.

    O municpio, aps o investimento no setor do mrmore e granito, deu um

    salto na modernizao e passou a ser destaque no ramo, no sul do estado do

    Esprito Santo, tornando-se responsvel pelo fornecimento de 80% do mercado

  • 23

    brasileiro de mrmore, sendo o maior plo de beneficiamento de rochas e

    fabricao de mquinas e equipamentos para o setor de rochas das Amricas.

    Quanto agricultura, principalmente de carter de subsistncia, o cultivo

    se d em pequenas reas e a produo atende apenas ao consumo local;

    podendo-se destacar a cafeicultura, na especificidade do caf conilon. No

    entanto, diante das dificuldades enfrentadas pelos agricultores, pela ausncia

    do Estado nos incentivos financeiros e nos servios pblicos, grande parte da

    nova gerao busca oportunidades no centro urbano,

    Os jovens adultos se dirigem para os centros urbanos, onde acreditam encontrar trabalho. Os habitantes do meio rural sustentam e criam a populao jovem a seu cargo, no perodo em que ela quase improdutiva; no momento em que os jovens adultos se tornam plenamente produtivos, o meio rural perde sua fora de trabalho, em benefcio da cidade, que no a criou e nem a sustentou. (Queiroz, 1978, p.211)

    Essa populao rural certamente no deixaria seus hbitos, costumes,

    valores, cultura e seu lugar, para viver em um espao que o oprime por no

    reconhecer sua identidade de trabalhador rural se encontrasse respaldo do

    Poder Pblico. A esse respeito, Veiga formula uma opo de articulaes

    intermunicipais para desenvolver um plano de desenvolvimento microrregional,

    Todavia, o que mais interessa no comparar a participao demogrfica dos espaos mais urbanos, mais rurais ou intermedirios. O que importa entender que o futuro dessas populaes depender cada vez mais de articulaes intermunicipais capazes de diagnosticar as vocaes do territrio que compartilham, formular um plano de desenvolvimento microrregional, e viabilizar seu financiamento com imprescindvel apoio das esferas governamentais superiores. (VEIGA, 2002, p.36).

    As comunidades rurais e os centros urbanos so interligados pelos

    interesses de satisfao das necessidades bsicas um do outro, de forma que

    cidade e campo se reconheam interdependentes. As cidades tm sua

    importncia para o campo na oferta de produtos industrializados, como

    vestimentas, calados, medicamentos, eletrodomsticos e outros, alm de

    maquinrios, fertilizantes, insumos etc. O campo, por sua vez, tem importncia

    para a cidade quando fornece matrias-primas para a indstria e alimentos

    para sustentao da populao. Assim, existe uma necessidade latente de uma

  • 24

    organizao envolvendo os dois seguimentos, inclusive entre municpios, para

    que haja um desenvolvimento regional em que todos possam ser beneficiados.

  • 25

    3 POLTICA PS DITADURA EM CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM E ORGANIZAO DO PT NO MUNICPIO

    Em 10 de fevereiro de 1980 foi aprovado pelo movimento pr-PT, no

    Colgio Sion, em So Paulo-SP, o Manifesto Partido dos Trabalhadores,

    publicado no Dirio Oficial da Unio, em 21 de outubro de 1980. De acordo

    com o documento, o Partido dos Trabalhadores surge da necessidade sentida

    por milhes de brasileiros de intervir na vida social e poltica do pas para

    transform-la. Havia grande nsia de liberdade e democracia por parte do povo

    brasileiro, que vivia os derradeiros momentos da ditadura militar, ainda sob

    forte temor. Por isso, talvez, a urgncia em construir um novo caminho poltico

    para trilhar. O momento era propcio3 e frtil para a formao de um partido que

    tinha como proposta a incluso das massas nas decises internas e ainda na

    defesa dos direitos dos trabalhadores.

    No seio da organizao do Partido dos Trabalhadores, segundo o

    documento de fundao, havia lugar para todos que montaram uma dura

    resistncia democrtica, incluindo operrios industriais, assalariados do

    comrcio e dos servios, funcionrios pblicos, moradores da periferia,

    trabalhadores autnomos, camponeses, trabalhadores rurais, mulheres,

    negros, estudantes, ndios e outras minorias exploradas pelo capitalismo.

    De acordo com o Manifesto, para que o PT pudesse desenvolver sua

    estratgia, seria necessria uma relao permanente com os movimentos

    sindical e populares que lhe deram origem. Isso revela a dependncia inicial do

    PT dessas organizaes, que foram frentes de luta e resistncia contra a

    opresso a que durante longo tempo foi submetido o povo brasileiro4.

    O manifesto afirma ainda que o partido diferente por ser democrtico

    amplo e aberto e que so as bases que mandam. Ele se faria presente em

    todas as lutas do movimento popular, a fim de respeitar e defender a

    autonomia das organizaes populares e tambm por seu objetivo poltico:

    lutar pela construo de uma democracia que garanta aos trabalhadores, em

    todos os nveis, a direo das decises polticas e econmicas do pas.

    3 O perodo anterior ao citado, foram os anos de Ditadura Militar no Brasil. O momento se torna propcio, pois a democracia restabelecida aps o fim do regime, em 1985. 4 Manifesto do Partido dos Trabalhadores de 1980, escrito em 1980 aps a consolidao do partido no

    cenrio poltico.

  • 26

    No Esprito Santo, assim como nos outros estados e municpios do pas,

    a formao do PT seguiu os passos do PT Nacional, com o mesmo perfil de

    dirigentes e filiados, orientados pela mesma proposta de construo de

    democracia, direito cidadania e que o povo pudesse atuar como dono do

    poder. Com correntes de pensamentos diferentes, que divergiam entre si, mas

    que convergiam quando se tratava de mudana na poltica do pas, de maneira

    que os trabalhadores fossem os beneficiados, o PT capixaba foi se

    consolidando e se organizando a partir do apoio popular e das lideranas que

    foram surgindo,

    do meio sindical, despontaram duas grandes figuras na fundao do PT no Esprito Santo: o mdico Vitor Buaiz, cuja candidatura ao governo do Estado no incio das conversas parecia certa, e o jornalista Rogrio Medeiros. Dos movimentos populares e da Igreja progressista, despontou Cludio Vereza, e dos movimentos de resistncia armada apareceu Perly Cipriano. Por ocasio da importante posio poltica que ocupavam nas suas entidades sindicais e movimentos sociais, essas quatro lideranas acabaram tomando a dianteira no processo de fundao do partido aqui no Esprito Santo [...](OLIVEIRA, 2011, p.85/85)

    O PT capixaba, seguindo as diretrizes do diretrio nacional, lanou

    candidatura prpria na primeira eleio ps-ditadura militar, com o nome de

    Perly Cipriano para candidato a governador e tinha sua plataforma alicerada

    no moralismo, na anticorrupo e na mobilizao das massas. Utilizou-se da

    campanha eleitoral como meio de organizar a classe trabalhadora na luta por

    mais liberdade, melhores condies de vida e combate ao poder econmico.

    A abertura poltica em Cachoeiro de Itapemirim acompanhou a

    redemocratizao do pas. No intuito de fundar o Partido dos Trabalhadores,

    houve grande esforo das foras de esquerda. Um grupo de pessoas com

    afinidade poltica de esquerda, composto por Pedro Correia Reis, Jos

    Paradella Netto, Lcio Pinto, Mauricio Luiz Daltio e outros, trabalhou em prol

    de filiaes de seus familiares e de simpatizantes, com o fim de atingir o

    nmero mnimo exigido pelo Cartrio Eleitoral para registro de partido. Era um

    perodo muito difcil para agregar adeptos, pois a lembrana da ditadura militar

    estava ainda latente na memria das pessoas, o que intimidava a participao

    ativa do cidado na vida poltica.

  • 27

    O nmero de filiados fora suficiente para o registro do Partido dos

    Trabalhadores. Muitas eram as dificuldades a serem vencidas. Alm das

    burocrticas, havia as de cunho financeiro e de formao ideolgica. Ser

    membro de partido de esquerda naquele momento era arriscar o emprego, as

    relaes sociais e s vezes, a prpria pele. Numa sociedade conservadora, era

    comum, naquele momento, rotular como baderneiro, anarquista e comunista

    aquele que optava por uma ideologia diferente da convencional.

    A primeira diretoria do PT foi empossada no dia 19 de julho de 19815,

    durante a conveno municipal, nas dependncias da Cmara de Vereadores

    de Cachoeiro de Itapemirim, presidida pelo senhor Pedro Correia Reis. A

    eleio contava com uma nica chapa para concorrer ao diretrio municipal,

    formada por: Pedro Correia Reis, Jos Paradella Netto, Maurcio Luiz Daltio,

    Rogrio Tavares da Assumpo, Ronaldo Santana, Tissiani Ferreira Ges

    Cavalcanti, Saulo Tavares Severo e Jacy do Nascimento, alm dos suplentes

    Paulo Antnio de Alvarenga Moura, Carlos Gamba de Paz e Valdemir Silva

    Motta. Compareceram 87 filiados na conveno, contabilizando 85 votos a

    favor da chapa nica, um voto em branco e outro nulo.

    Desse diretrio, a primeira Comisso Executiva do PT ficou assim

    constituda: presidente: Pedro Correia Reis; vice-presidente: Jos Paradella

    Netto; secretrio: Maurcio Luiz Daltio; tesoureiro: Rogrio Tavares da

    Assumpo; 1 suplente: Saulo Tavares Severo e 2 suplente: Jacy do

    Nascimento. Todas as convenes e eleio de diretrio eram acompanhadas

    por um observador da Justia Eleitoral, designado pelo Juiz Eleitoral da Zona,

    que assinava o livro de ata por ltimo. Nesta conveno, especificamente, no

    foi possvel identificar o nome do representante da Justia Eleitoral, por causa

    da assinatura ilegvel.

    Em 1982, com um ano de fundao, o Partido dos Trabalhadores

    apresentou chapa completa para disputar as eleies. O candidato escolhido

    pelo PT para concorrer eleio de prefeito foi Pedro Correia Reis, tendo como

    vice-prefeito foi Carlos Gamba de Paz. A disputa foi com Roberto Valado,

    vice Ilo Coelho pelo MDB (Movimento Democrtico Brasileiro), e Alicio Franco,

    com vice Joo Atayde pela ARENA (Aliana Renovadora Nacional), saindo

    5 Fonte livro de Ata, pginas 2 e 3 , do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim

  • 28

    vitorioso Roberto Valado, que tinha um histrico no movimento estudantil e

    na resistncia contra a ditadura militar, em Cachoeiro de Itapemirim. A votao

    do candidato pelo Partido dos Trabalhadores foi irrisria, porm importante

    para marcar presena no processo eleitoral no municpio. Alm disso, as

    condies para participar da disputa eram precrias: inexperincia eleitoral,

    dificuldade financeira, poucos militantes conscientes da importncia do

    momento, j que a maioria dos filiados foi para cumprir a exigncia quantitativa

    da legislao eleitoral. Em reunio da Executiva, o tema amplamente

    discutido,

    o tesoureiro Paradella abriu os trabalhos colocando as pautas: cartaz, plstico, pixao e a carta dos candidatos aos eleitores. Assim a palavra foi passada a companheira Lurdinha que disse que foram encomendados 5000 cartazes na Frangaf, ficando o oramento em CR$ 2.250 [...] Antes de passar para o assunto de pixao falaram Saint Clair e Paradella falando que ajudariam no pagamento do cartaz. Sobre a pixao falou Fernando que a mesma no deve ser feita indiscriminadamente e tambm mal feita pois se tornaria poluio visual, deu a ideia de uma placinha para se pixar, usou a palavra Nevton falando que a pixao importante para botar os nomes na rua, para que todos saibam dos candidatos do PT e sugeriu seu nome para pixar. Foi decidido, ento que se criasse um comit de pixao com Saulo, Nevton, Mizoca e Joaquim (confirmar).[...]

    6

    As dificuldades eram grandes, inclusive na organizao dos

    documentos, j que os livros de atas no eram organizados em sequncia

    numeral, precisando buscar a ordem dos acontecimentos de acordo com as

    datas das reunies. Os membros do diretrio exerciam os cargos que lhe eram

    confiados mesmo com as limitaes de cada um, por isso, s vezes, o

    pesquisador se depara com dificuldades na investigao.

    Em 1984, o PT realizou nova conveno, em 08 de janeiro, s 18

    horas, nas dependncias da Cmara Municipal de Vereadores, com a presena

    do observador da Justia Eleitoral Tarcsio Rabelo Cabral7, desta vez com a

    participao de 81 filiados que votaram na nica chapa apresentada, sem

    registro de voto branco e nulo. A nova Executiva para o exerccio do mandato

    ficou assim composta: presidente: Pedro Correia Reis; vice-presidente:

    6 Extrado do livro ata pginas 19 e 20, da reunio realizada na sede provisria do PT, instalada no

    Sindicato dos Ferrovirios, em 17/05/1986. 7 Fonte livro Ata, pag. 11 do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim

  • 29

    Octacilino Nunes dos Santos; secretrio: Saulo Tavares Severo; tesoureiro:

    Nelson Luiz dos Santos e suplentes Jos Paradella Netto e Ailton Antonio

    Sabino.

    Em 1986, foi realizada nova conveno partidria, no dia 13 de abril, na

    Cmara Municipal de Cachoeiro de Itapemirim, s 09:00 horas8, acompanhada

    pelo observador da Justia Eleitoral Waldeir Garrute, desta vez com a

    participao de 101 filiados, sem nenhum registro de voto branco e nulo e 01

    voto contra a chapa apresentada, que ficou assim composta: presidente: Pedro

    Correia Reis; vice-presidente: Valdemir Silva Motta; secretrio: Luis Fernando

    Novoa Garzu; tesoureiro: Jos Paradella Netto e vogais: Saint Clair Lopes e

    Cedecias Gonalves Pereira.

    No incio de 1987, o presidente Pedro Correia Reis pediu para se afastar

    da presidncia do PT por motivos de sade9 e foi instituda uma Comisso

    Provisria que teve como presidente Maria de Lourdes Savignon, em um

    mandato tampo at setembro, quando foi realizada nova conveno, em 27

    do mesmo ms, na Cmara Municipal de Vereadores e acompanhada pelo

    observador Eleitoral Fernando dos Santos Ayub, em que foi eleita uma chapa

    de diretrio. Conforme ata de reunio do partido, pgina 16 e pgina 19 (verso)

    entende-se que o cargo de presidncia foi ocupado por Maria de Lourdes

    Savignon, embora no esteja explcita esta informao.

    De acordo com registro em ata, de uma reunio ocorrida em nove de

    maro de 1987, o PT enfrentava problemas com um de seus fundadores,

    Rogrio Medeiros, que fazia crticas ao partido atravs da imprensa e em carta

    dirigida Executiva Regional, que a respondeu. Por sua vez, a Executiva

    Municipal criticava Rogrio Medeiros por ter confeccionado panfleto junto com

    Gerson Camata, o que demonstrava ato falho por parte do membro, pois

    Camata no estava na Coligao com o PT. Divergncias internas j eram

    muito comuns dentro do PT, quando a ento deputada federal Maria de

    Lourdes Savignon (Lurdinha) denunciou o filiado e militante Fernando Netto

    por ter declarado no programa de rdio Momento Poltico na Rdio Cachoeiro

    que,

    8 Fonte livro Ata pg. 13 e 14 do Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim

    9 Informao obtida do filiado e militante Antnio Carlos de Oliveira.

  • 30

    a populao deveria prevenir-se contra os polticos profissionais que se recanditariam este ano, inclusive a deputada Lurdinha que havia faltado a votaes essenciais no Congresso no ano passado, especialmente a do oramento federal

    10

    Os conflitos internos eram levados para conhecimento e deliberao

    das instncias partidrias que abriam discusses sobre o assunto para

    solucionar o problema. No caso acima citado, a deliberao culminou na ida do

    presidente do PT local Rdio para esclarecer a situao, alm de gerar uma

    representao ao Diretrio Regional para ver se o caso seria passvel de ser

    submetido Comisso de tica, j que o comportamento do filiado, na

    concepo unnime dos presentes reunio, foi de despeito s normas

    partidrias, caracterizando uma difamao injustificada imagem do partido.

    As divergncias internas no se tratavam apenas de discordncias de opinies,

    as candidaturas individualistas e defesa de interesses prprios sempre

    apareciam nos debates e eram discutidas fervorosamente entre os filiados e

    devidamente documentadas em livro de ata.

    Em 1988, aconteceu a Conveno Municipal do PT para escolher a

    chapa de candidatos a prefeito, vice-prefeitos e vereadores. O evento ocorreu

    no dia 29 de julho de 1988, na Cmara Municipal de Cachoeiro de Itapemirim e

    foi acompanhado pelo observador Eleitoral Waldeir Garrute. O candidato

    escolhido para prefeito foi Elieser Rabello, vice-prefeito Jos Irineu de Oliveira,

    e para vereadores: lvaro Luiz Duarte Carneiro, lvaro Scalabrin, Caetano

    Paiva Simonato, Carlos Roberto Casteglione Dias, Cludio de Moraes

    Machado, Delza Maria Dalto, Edimar Augusto Rabello, Eliezer Malta Aniceto,

    Gelson Correia Chagas, Joaquim Neiva de Resende Junior, Joaquim Tom

    Francisco, Jorge Marcos dos Santos Cipriano, Jos Antonio Souto Siqueira,

    Jos Maria Gomes, Jos Paradella Netto, Josias Gonalves da Silva, Luiz

    Carlos Poloni, Mrcio Guimares Fontes, Maria Geri Gonalves, Maria de

    Lourdes Savignon, Maria Nomia Paulino, Mrio Canci Costa, Milton Supelete,

    Nevton Roberto Ornelas Passos, Osias Gripp Silveira, Pedro Correia Reis,

    Pedro Gava, Pedro Paulino da Silva, Ricardo Ferraz da Silva, Roberto Antonio

    Carletti, Samir Hatum de Almeida, Sandra Maria Casagrande Coelho, Valdemir

    10 Fonte Ata de reunio da Comisso Executiva Provisria, em 06/02/1990, pgina 05, Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.

  • 31

    Silva Motta, Valmir de Arajo, Wasny Alexandre Correa. Como se observa, o

    PT mais uma vez lanava chapa completa.

    Nesta eleio foram eleitos dois vereadores, lvaro Scalabrin, professor

    e atuante na Igreja Catlica, com apoio da CEB`s (Comunidades Eclesiais de

    Base), conforme declarao do militante Mizoca em ata da reunio da

    Executiva Municipal do dia 13 de abril de 1986, e Luiz Carlos Poloni, que era

    locutor de programa local de rdio e ganhou popularidade com a tradicional

    orao da Ave Maria, s 18 horas. A candidatura majoritria municipal, embora

    tenha marcado espao, no logrou xito. Todas essas pessoas se agruparam

    em torno de um objetivo: mudanas na poltica local. Maria de Lourdes

    Savignon explana sobre as dificuldades do processo de transformao da

    sociedade, a qual o PT almejava naquele momento atravs da participao

    popular, e cita as bandeiras polticas do partido no parmetro nacional: jornada

    de trabalho de 40 horas semanais, salrio mnimo compatvel com as

    necessidades de sobrevivncia do trabalhador, estabilidade de emprego,

    reforma agrria, reforma tributria, ensino pblico e gratuito, no pagamento da

    dvida externa, contra a fome, misria e inflao11.

    Os dirigentes do partido queriam a reverso do quadro poltico, social e

    econmico do pas e a transformao da sociedade, com base na mxima

    sociedade justa e igualitria. Com apoio de parte da Igreja Catlica e

    orientados por intelectuais da esquerda, os militantes organizaram passeatas

    contra o capitalismo e um dos alvos foi o monoplio da empresa de transporte

    coletivo. Alm disso, havia forte movimento para uma transformao interna

    por maior envolvimento dos filiados, visando melhor organizao em torno do

    objetivo da mudana. Para tanto, o debate de uma das reunies teve como

    foco principal a apresentao de um plano de ao,

    para organizao de nosso partido (almejamos e) apresentamos o seguinte plano de ao, dividido em duas partes; apresentaremos nossa proposta para debate com o grupo aqui presente e na Conveno Oficial: A) Nvel Interno: - instalao da sede dentro dos prximos 60 dias, reorganizao das fichas dos filiados- atualizao de endereos; trabalhar p/ a organizao e construo do partido- participao ampla dos filiados- trabalho nos bairros; prioridade na conduo do partido; criao da comisso de finanas; criao da comisso de organizao; criao de Secretarias de Movimento

    11 Fonte livro Ata pgina 33, sobre a pr- conveno do PT em 30 de agosto de 1987.

  • 32

    Popular e Sindical; criao de Secretaria de Formao e Informao Poltica, preparao dos militantes a respeito das polticas sociais; criao de comisso de informao; criao de comisso para levantamento da situao poltico-econmica e social de Cachoeiro; estabelecer atividades do partido a cada trs meses.

    12

    O PT de Cachoeiro iniciou o ano de 1989 com dois vereadores eleitos e

    uma deputada federal, j que Maria de Lourdes Savignon (Lurdinha), como

    primeira suplente, tinha ocupado a vaga de Vitor Buaiz, que havia sido eleito

    para a Prefeitura de Vitria. O Partido no municpio, portanto, estava com uma

    grande responsabilidade, j que haveria eleio para presidente da Repblica,

    pela primeira vez pelo voto direto depois da redemocratizao do pas, e o

    candidato petista Luiz Incio Lula da Silva, que disputaria com grandes

    chances de vencer, abalava as estruturas do poder vigente, ou seja, das

    foras polticas de direita que h anos se revezavam no comando poltico e

    econmico do pas.

    [...] fora de dvidas, porm, que vieram a revelar-se particularmente danosas entre os veculos de comunicao a partir da campanha, para a presidncia da Repblica de Fernando Collor cuja imagem de heri moo, caador de marajs, foi, em grande parte, uma criao irresponsvel da mdia, com destaque para a Rede Globo- e tambm uma construo ideolgica . Afinal, a administrao jornalstica do crescimento de Collor foi um recurso para barrar, na poca, a ascenso de Lula, cujos ndices de aceitao na opinio pblica atemorizava o status quo.[...] (GOMES, 2001, p.598/599)

    Para tentar minimizar os danos do massacre miditico, a Executiva

    Municipal organizava arrasto13 no centro da cidade para entrega de

    panfletos, formao poltica com o objetivo de preparar os militantes para o

    discurso de pedir o voto, realizao de feijoadas para arrecadar recursos

    financeiros para a FBP (Frente Brasil Popular), carta para os filiados explicando

    Porque votar em Lula, a fim de facilitar os argumentos para a campanha, e

    outras aes que visava fortalecer a candidatura petista. O desfecho desta

    campanha eleitoral, a maioria do povo brasileiro conhece: a eleio foi para o

    segundo turno e Fernando Collor ganhou a eleio para presidente da

    Repblica.

    12 Fonte livro de Ata pg. 30/31, Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim.

    13Caminhada dos militantes pelo centro da cidade distribuindo materiais de campanha eleitoral.

  • 33

    Em 1990, a Comisso Executiva Provisria se reuniu mais vezes, pois

    muita ao poltica estava em pauta. Lula havia perdido a eleio para

    Fernando Collor de Melo, governador do Alagoas, que havia ganhado

    popularidade com a bandeira de Caador de Maraj, que consistia em

    exonerar os servidores pblicos que ocupavam cargos de altos salrios. O PT

    de Cachoeiro mantinha dois vereadores e uma deputada federal e organizava a

    poltica partidria e a oposio ao ento prefeito Theodorico de Assis Ferrao.

    Os vereadores se revezavam na liderana da bancada petista na Cmara de

    Vereadores.

    Em 1991, o PT de Cachoeiro discutia a criao de uma Frente

    Progressista, a abertura da imprensa local ao PT e a formao de uma

    comisso para discutir e elaborar um programa de governo para a prefeitura,

    tendo como tarefa inicial um estudo sobre a realidade do municpio para

    embasar a proposta. Ainda no mesmo ano, o PT discutia em suas reunies de

    diretrio a oposio ao governo Collor e seus aliados no Esprito Santo, a

    oposio ao governo Ferrao; uma administrao popular como mecanismo de

    democracia participativa; prioridade para as reas sociais; moralidade e

    legalidade com a coisa pblica; defesa das conquistas e dos direitos dos

    trabalhadores. O PT reunia o diretrio em reunio ampliada (aberta aos filiados

    sem cargo de dirigentes) para assistir ao Programa Nacional do PT na

    televiso, planejava a tradicional alvorada dos trabalhadores para o 1 de maio

    e iniciava uma crise com o vereador lvaro Scalabrin devido s suas ausncias

    nas reunies do partido e falta da contribuio partidria, de ordem

    estatutria no PT.14 Neste ano, conforme registro no livro de Ata de 1989 a

    1994, as reunies foram mais intensas, extensas e frequentes, s vezes com

    03 (trs) reunies no mesmo ms, como no caso de outubro e novembro. Os

    assuntos de pauta demonstravam a preocupao dos dirigentes com uma

    formao poltica permanente para os filiados para que cada um fosse um

    militante, e para isso seria formada uma comisso de nucleao. Havia ainda a

    preocupao do partido em intervir organizadamente no movimento social por

    meio de comisses sindicais e de movimento popular.

    14Fonte livro de Ata 21/03/1991, 01/04/1991 e 18/04/1991, Partido dos Trabalhadores de

    Cachoeiro de Itapemirim.

  • 34

    Em 1992, o PT investiu no fortalecimento do partido atravs da

    participao das bases, inclusive em outros municpios, intervindo na eleio

    de chapas de sindicatos, organizao partidria, realizao de encontros, e

    tambm enfrentou crises internas como dificuldades financeiras para manter as

    aes do partido, caso dos vereadores acusados de destoarem da linha

    partidria nos discursos na tribuna da Cmara e de no contriburem

    financeiramente (com ameaas de encaminhamento para a Conselho de tica

    Interna do partido, o que resultou no pedido de afastamento do vereador

    reeleito lvaro Scalabrin do quadro de filiados do PT), denncias internas entre

    chapas que disputavam direo de sindicatos, denncia de irregularidades na

    administrao de sindicatos( Comrcio e Sade) conduzido por filiados do

    partido, e outras divergncias entre membros da direo partidria. Neste ano

    o partido teve como candidato a prefeito o mdico cirurgio Fernando Antnio

    Ferreira Netto e como vice Maria de Loudes Savignon. O prefeito Theodorico

    de Assis Ferrao foi sucedido por Jos Tasso de Andrade, que teve seu apoio.

    Em 1994, o partido no tinha representante no parlamento local e

    precisava articular a candidatura de Vitor Buaiz para governador e a de Lula

    para presidente. Animados pelos bons ventos que sopravam no cenrio poltico

    estadual, com o candidato ao governo com grandes chances de vencer, j que

    teve a sua administrao como prefeito aprovada pela populao da capital, e

    no cenrio nacional Lula liderava as intenes de voto aps a decepo

    popular com o impeachment de Fernando Collor de Mello, ocorrido em 29 de

    setembro de 1992, aps escndalo revelado pelo seu irmo Pedro Collor de

    Mello, o PT se organizava para o processo eleitoral. O candidato petista Vitor

    Buaiz foi eleito para o governo do estado e Lula novamente perdeu a eleio,

    desta vez para Fernando Henrique Cardoso, ministro da Fazenda de Itamar

    Franco, que lanou a moeda real e prometeu controlar a inflao, o grande

    pesadelo do povo brasileiro naquela poca.

    A militncia decepcionou-se com a derrota de Lula, mas manteve a

    esperana de uma nova poltica para o estado com a vitria do candidato ao

    governado pelo partido. No entanto, correntes internas do partido passaram a

    discordar do posicionamento poltico de Vitor Buaiz diante da conjuntura

    poltica nacional,

  • 35

    [...] Carlos diz que o governador est contrariando todos os nossos princpios e tambm o modo petista de governar, e isto est tendo repercusso nacional negativa. A gota dgua foi as demisses no Banestes

    15 sem nenhum critrio. O tribunal de Contas rejeitou as

    contas do governador. Infelizmente as prticas de Vitor Buaiz esto indo de

    16 encontro a poltica neoliberal de FHC

    17, partindo da

    entrevista concedida a revista Veja18

    nas pginas amarelas, em que declara apoio a reeleio de FHC, e elogia politicamente Paulo Maluf e critica Erundina.[...]

    19

    Em Cachoeiro, 1996, o PT estava sem representao no Legislativo,

    considerando que o vereador reeleito lvaro Scalabrin havia sado do partido e

    Luiz Carlos Poloni saiu antes, foi para o PPS, mas no se reelegeu. Nessa

    eleio, o partido fez coligao com o PSB (Partido Socialista Brasileiro), com o

    nome de Jos Irineu de Oliveira (PT) para candidato a prefeito e Carlos

    Quintino (PSB) como vice-prefeito. Essa chapa disputou com Nasser Yussef

    (PMDB) e Theodorico de Assis Ferrao (PTB), que venceu a eleio. Por

    exigncia do PSB, a coligao para a chapa proporcional (vereadores) excluiu

    o PCdoB (Partido Comunista do Brasil). O PSB elegeu dois vereadores e o PT

    no conseguiu eleger nenhum, ficando mais uma vez sem representao na

    Cmara de Vereadores. Assim, as dificuldades polticas e financeiras eram

    grandes, ficando o partido dependente do empenho da militncia, que mantinha

    uma pequena sala alugada, sem banheiro, de assoalho de madeira, no prdio

    do antigo Cine Broadway, no centro da cidade, na tradicional Praa Vermelha.

    O PT, principalmente o de Cachoeiro, estava em rota de coliso com o

    Governo Estadual (PT), pois este construa em nome da governabilidade 20

    alianas com adversrios polticos como Ricardo Ferrao, deputado estadual e

    presidente da Assembleia, e o pai Theodorico de Assis Ferrao, ento

    deputado federal e pretenso candidato prefeitura em 1996. Esse episdio

    deixava o PT de Cachoeiro em situao de constrangimento e fragilidade, pois

    se via obrigado a defender o governador diante das crticas da oposio,

    enquanto ele mesmo no fazia segredo de sua aproximao com os

    adversrios locais.

    15 Banco do Estado do Esprito Santo S/A 16

    Supes-se que seja ao encontro e no deencontro. 17

    Fernando Henrique Cardoso, presidente do Brasil (1995-1998 e 1998-2002) 18

    Editora Abril,Revista Veja Edio 1467, p. 9-11, 23 de outubro de 1996. 19

    Fonte livro de Ata de 05/11/1996. 20

    Governabilidade argumento utilizado pelo governador para propor e fechar alianas com adversrios polticos.

  • 36

    Em 1998, mais uma vez o PT se organizou para ir s ruas em busca de

    votos para Lula. Havia uma esperana por parte da militncia de uma virada na

    eleio presidencial. No foi ainda desta vez. Novamente Fernando Henrique

    Cardoso ganhou a eleio no 1 turno. No entanto, essa jornada Brasil afora

    rendeu frutos para o fortalecimento do partido em colgios eleitorais

    importantes, como So Paulo (FRIZZO, 2012). Alm disso, as Caravanas da

    Cidadania, em que Lula percorreu 359 cidades brasileiras21 , entre 1993 a

    1996, contriburam para a aproximao entre o povo, Lula e,

    conseqentemente, o PT, pois a imagem de um era vinculada a do outro.

    Em terras capixabas, o PT vivia a angustiante tentativa de se reerguer,

    depois de quatro anos de governo petista de Vitor Buaiz, que no

    correspondeu s expectativas do povo e da militncia, em parte por causa da

    conjuntura poltica e econmica, pois Fernando Henrique Cardoso era o

    Presidente do PSDB, antagnico ao PT, e em parte por conflitos internos com

    os correligionrios pelos mais diversos motivos. Vale lembrar que Vitor Buaiz

    tinha sido prefeito de Vitria e conquistou a populao da capital com o modo

    petista de governar. Os problemas administrativos e polticos no governo

    resultaram no encolhimento da bancada na Assemblia Legislativa, com a

    reeleio de apenas um deputado estadual (Cludio Vereza), dos cinco que o

    partido possua.

    Em Cachoeiro de Itapemirim, a situao tambm era muito difcil. No

    havia representatividade no Legislativo e vivia-se uma profunda crise interna

    por conta das constantes disputas entre as duas tendncias, a Articulao do

    A, ligada a Vitor Buaiz, Perly Cipriano e Rogrio Medeiros e chamada

    internamente de maneira pejorativa por turma do im, por abrigar as lideranas

    em Cachoeiro que eram tratadas pelo diminutivo, como Joaquim (Joaquim

    Neiva) Chiquim (Francisco Temporim) , Tonim, (Antonio Carlos de Oliveira)

    Nevim (Nevton Ornellas Passos), e a Articulao do B, ligada a lideranas

    estaduais como Cludio Vereza, Iriny Lopes, Jos Otvio Baioco e Joo

    Carlos Coser, e em Cachoeiro representada por Jos Irineu de Oliveira,

    Mauricio Daltio, Carlos Casteglione, Lurdinha Savignon, Augusto Cesar

    21 Ver Davis Sena Filho, blog Palavra Livre , Lula, as caravanas da cidadania e a direita

    derrotada. Disponvel em . Acesso em 31/05/2013.

  • 37

    Fonseca e outros. Este grupo, por sua vez, era chamado de forma pejorativa

    de igrejeiros, pela ligao que mantinha com as Comunidades Eclesiais de

    Base da Igreja Catlica. Embora fragilizado politicamente e sem estrutura para

    disputar eleio, ainda assim o partido ousou lanar o nome do advogado e

    dirigente partidrio Jos Irineu de Oliveira para disputar uma vaga de

    Deputado Estadual. Diante do quadro de desgaste de identidade partidria,

    muitos militantes optaram por assumir outras candidaturas em outros partidos.

    Foi uma campanha cansativa e desgastante, em todo o sul do estado, e a

    hostilidade dos eleitores era visvel. O saldo de votos para o candidato Jos

    Irineu foi irrisrio, mas contribuiu para reeleger Cludio Vereza, nica voz de

    oposio ao governo de Jos Igncio Ferreira, que mergulhou o estado em um

    caos econmico, social e moral, devido ao elevado grau de corrupo dentro

    do seu governo, provocando o descrdito.

    Foi nessa situao de fragilidade que o PT de Cachoeiro chegou em

    2000 para disputar as eleies municipais. Havia uma ampla discusso interna

    acerca da disputa eleitoral, havendo quem defendesse apoiar candidaturas de

    outros partidos em troca da vaga de vice na chapa e os que defendiam

    radicalmente uma candidatura prpria. Considerando uma boa opo para as

    negociaes, o partido apresentou a candidatura de Carlos Roberto

    Casteglione Dias. No Encontro Municipal em que as foras polticas internas se

    dividiam entre candidatura prpria e coligao, a corrente que defendia a

    primeira opo se saiu melhor,

    finalmente venceu a posio pela candidatura prpria, e o nome de Carlos Casteglione foi confirmado como candidato a prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, sendo que a candidata a vice-prefeita foi Arlete Augusta Thomaz, depois da desistncia de Jos Paradella Netto, o primeiro indicado. Parte da ento direo da poca afirma que esse foi o encontro municipal do PT mais democrtico da histria do prprio, no entendimento que nele prevaleceu efetivamente as posies da base.

    22

    Em 2000, o PT de Cachoeiro, em seu II Encontro Municipal, realizado no

    dia 16 de junho de 2000, recebeu o professor Juracy Magalhes, ento

    presidente municipal do PPS (Partido Progressista Social), e o ex-deputado

    22 Partido dos Trabalhadores de Cachoeiro de Itapemirim- Um relato histrico (1981-2004) ROCHA JUNIOR, 2006, p.62.

  • 38

    estadual Nasser Yussef, candidato a prefeito. As foras polticas de oposio

    tentavam uma coligao para derrotar o ferracismo23, todavia, no houve

    entendimento, haja vista que PMDB e PPS ofereciam a vaga de vice da chapa

    para o PT, mas ningum abria mo da cabea de chapa, inclusive o PT. O

    resultado foi 04 candidatos a prefeito: Theodorico de Assis Ferrao (PTB),

    Roberto Almockadice Valado (PMDB), Nasser Yussef (PPS) e Carlos Roberto

    Casteglione Dias, com a vice Arlete Thomaz de Oliveira. Com a oposio

    dividida, Ferrao foi reeleito para o mandato 2000/2004. No entanto, para o PT,

    foi uma experincia animadora, j que saiu das urnas com mais de treze mil

    votos e um vereador eleito.

    Alm disso, a direo municipal do PT organizou militantes e

    simpatizantes por grupos temticos para elaborar um plano de governo ao qual

    deu o ttulo de A Cachoeiro que quer o PT e com o slogan Nossa cidade

    merece essa estrela, num jogo atrativo de marketing para conquistar a

    simpatia e confiana dos eleitores e convenc-los de que o partido teria a

    melhor proposta para o municpio. Esse plano foi divido em trs categorias: I

    Eixos Centrais (Desenvolvimento Econmico Sustentado com Gerao de

    Emprego e Renda; Qualidade, Eficincia e Modernizao Administrativa;

    Participao Popular; Educao e Cidade Agradvel). II Polticas Urbanas (

    Habitao; Meio Ambiente; Saneamento e transporte Pblico). III- Cidadania e

    Direitos Sociais (Sade; Criana e Adolescente; Gnero; Idosos; Juventude;

    Portadores de Deficincias; Segurana e Abastecimento). O documento foi

    elaborado ancorado no chamado MODO PETISTA DE GOVERNAR, que se

    baseia nas experincias exitosas de administraes petistas em cidades e

    estados do Brasil. Para cada tema foram apresentadas as diretrizes bsicas e

    propostas de ao. Nesse mesmo documento apresentado o compromisso

    do PT para com o povo de Cachoeiro, que afirma,

    cada partido e cada candidato representam uma proposta de atuao diante dos interesses contraditrios que se defrontam no cotidiano da poltica local, regional e nacional. Nosso programa expressa uma proposta para o Municpio e para a Regio fundamentada em nosso projeto de uma sociedade radicalmente democrtica. Uma sociedade

    23 Termo utilizado no meio poltico do municpio, principalmente pela oposio, para designar

    os adeptos e admiradores do Prefeito Theodorico de Assis Ferrao, poltico de muitos mandatos, incluindo de deputado estadual, deputado federal e quatro mandatos de prefeito do municpio de Cachoeiro de Itapemirim. Atualmente Presidente da Assemblia Legislativa do Estado.

  • 39

    em que todos tenham acesso aos bens sociais e aos servios pblicos e participem de sua gesto. Uma sociedade em que a amplitude, a eficincia e a qualidade dos servios pblicos garantam uma vida melhor para as mais amplas camadas da populao, para os trabalhadores, os excludos, as classes mdias empobrecidas. Uma sociedade em que o Estado no seja nem mnimo nem mximo, mas tenha capacidade adequada para devolver aos cidados, em servios eficientes e de boa qualidade, a contrapartida dos impostos e taxas pagos, por meio de polticas pblicas que incentivem a gerao de emprego e de renda.

    24

    O documento foi um instrumento importante para fortalecer as

    argumentaes do candidato a prefeito ao apresentar as propostas para a

    populao, principalmente no debate de televiso. O PT possua um plano de

    governo, elaborado em conjunto, com argumentos que falavam diretamente ao

    povo, numa linguagem poltica, mas ao mesmo tempo acessvel, e isso,

    certamente, contribuiu para seduzir os mais de treze mil eleitores. O PT no

    venceu as eleies, no entanto, ganhou um capital poltico que o fortaleceu. No

    decorrer do ano de 2001, o vereador eleito com 753 votos, Jos Maria Nunes,

    militante da Igreja Catlica, renunciou ao mandato e o suplente Sebastio

    Fonseca Leal, tambm ligado Igreja Catlica, assumiu a vaga no Legislativo.

    Foi um mandato turbulento pelas divergncias existentes entre os dirigentes e

    o mandatrio, j que os primeiros queriam uma posio mais agressiva do

    vereador com o Executivo, e Leal, por sua vez, no possua esse perfil e no

    era dono de uma boa oratria. Tal situao causou muitos debates e

    desentendimentos no ncleo dirigente do partido, mas isso ficou no plano

    interno e no chegou a desgastar a imagem do PT perante a populao.

    Ainda que sem chances reais de eleio majoritria, os resultados

    eleitorais serviriam como uma injeo de nimo na militncia petista. O

    candidato a prefeito obteve, proporcionalmente, o melhor resultado desde que

    comeou a disputar eleies. O saldo eleitoral foi 16,5%, enquanto a ltima

    participao no pleito eleitoral, em 1996, foi de 2,8% . Alm disso, o partido

    retornou ao assento no Legislativo municipal com a eleio de Jos Maria

    Nunes. A reao da militncia foi animadora e o PT saa do ostracismo em que

    estava mergulhado em termos de representatividade poltica eleitoral. Essa

    ascenso do candidato petista dava sinais de que havia uma insatisfao do

    24 Documento do Partido dos Trabalhadores A Cachoeiro que quer o PT, 2000. Pg.7

  • 40

    eleitorado com a poltica ferracista, j que a reeleio de Theodorico Ferrao

    foi com uma expresso eleitoral menor. Sua campanha no apresentava nada

    de novo para a cidade, no havia programa de governo e o PT atacava isso

    logo de incio no documento A Cachoeiro que quer o PT,

    [...] ao longo destes anos de decadncia prevaleceram o carreirismo mais egosta e a tradio coronelista no mais verdadeiro estilo farinha pouco meu piro primeiro na conduo poltica do Municpio e da regio. A cidade, como principal plo regional no conseguiu superar vcios polticos tradicionalistas e retrgrados, elegendo pessoas sem viso, mais pelo barulho e pelo desperdcio de suas campanhas do que pelas propostas e compromissos efetivamente provados com as futuras geraes. (Partido dos Trabalhadores, 2000, p.6)

    O documento apresenta uma consistente proposta de ao, utilizando

    teorias e levando para o debate os argumentos de um governo de mudana,

    apontando de forma crtica as prticas do adversrio, que disputava a

    reeleio,

    [...] o bairrismo caracterstico da nossa Cachoeiro virou motivo de chacota at a nvel nacional

    25 . Ns que j demos ao Brasil grandes

    polticos como o saudoso Batistinha, temos que conviver com lideranas polticas que brilham apenas por seus arroubos e bravatas cujo ridculo s superado pelo servilismo provinciano de alguns, muitos por ingenuidade, outros por esperteza mesmo [...]

    26

    O documento elaborado sob a promessa de transformao poltica,

    econmica e social que o PT promoveria seduziu parte do eleitorado que

    pertencia velha oligarquia poltica que se revezava no poder e retirou fatia

    significante dos votos, migrando-a para o candidato que representava a

    mudana.

    O PT de Cachoeiro passou a viver uma nova expectativa do ponto de

    vista do projeto eleitoral, a partir dos resultados das eleies de 2000, e

    disputa interna que passava pelo PED (Processo de Eleies Diretas), em que

    os filiados aptos a votar27 escolhem presidentes nacional, estaduais e

    municipais e os diretrios, nos mesmos nveis. Alm disso, participao ativa

    25 Referncia construo da Torre de fazer chover, que era uma imensa estrutura de ferro

    construda no centro da cidade com o objetivo borrifar gua para refrescar o calor tpico do municpio. Este fato teve apario no Programa do Fantstico, exibido aos domingos pela Rede Globo de Televiso como obras esdrxulas, caras e que no funcionam. 26

    Documento do Partido dos Trabalhadores A Cachoeiro que quer o PT, 2000, p.6 27

    Filiados que estavam inscrito na lista oficial (Diretrio Nacional) e em dia com a contribuio financeira do partido.

  • 41

    em movimentos como Marcha Contra a Corrupo, contra a implantao da

    ALCA (Associao do Livre Comrcio das Amricas), contra o pagamento da

    Dvida Externa, a criao da Secretaria dos Movimentos Populares, com

    correntes que abraavam as teorias gramscianas, marxistas, e ainda, o desejo

    latente dos trabalhadores em um partido que atendesse aos seus

    anseios,credenciou o PT em Cachoeiro e elegeu o deputado estadual Carlos

    Roberto Casteglione Dias. O cenrio nacional estava favorvel. Havia uma

    euforia do povo brasileiro com a campanha eleitoral de Lula, depois de um

    segundo mandato conturbado de Fernando Henrique Cardoso, e o PT, com

    propostas de mudanas, ressurgia como uma esperana para um povo j

    cansado e desgastado por uma profunda crise econmica e social.

  • 42

    4 DESAFIOS DA GESTO PBLICA NO MUNICPIO DE CACHOEIRO DE

    ITAPEMIRIM -2009-2012

    A rea perifrica da cidade de Cachoeiro de Itapemirim, no ano de 2009,

    sofria a falta de investimentos em infraestrutura e assistncia social. Essas

    reas ficaram muito tempo fora da agenda das aes do Poder Executivo local.

    Os investimentos foram aplicados em obras (algumas faranicas) no centro da

    cidade, como, praas, pontes, torre de fazer chover e prdios sem condies

    de funcionamento, em bairros considerados nobres e quando houve

    investimento em moradias para a populao excluda socialmente, causou a

    segregao espacial, pois eram casas populares construdas sem nenhum

    planejamento, com paredes de blocos de cimento e telhas de amianto, nos

    pontos mais altos e extremos da cidade, em terrenos sem valor no mercado

    imobilirio, onde famlias de baixa renda amontoavam-se entregues prpria

    sorte, sem nenhuma dignidade humana e direito cidadania ativa.

    Esse modelo no exclusividade do poder pblico da cidade de

    Cachoeiro de Itapemirim, uma vez que se apresenta nos mesmos moldes na

    maioria das cidades brasileiras, surgindo pela fora da necessidade de moradia

    dos trabalhadores, que foram se aglomerando no entorno, onde havia maior

    possibilidade de adquirir um terreno, comprado ou ocupado, o que acaba

    marcando a diferena entre a parte perifrica e central da maioria das cidades,

    como afirma Rolnik,

    uma caracterstica comum a todas as cidades brasileiras, independentemente de regio, histria, economia ou tamanho, o fato de cada uma delas apresentar um contraste muito claro entre uma parte da cidade que possui alguma condio de urbanidade, uma poro pavimentada, ajardinada, arborizada, com infra-estrutura completa[...] e outra parte, normalmente de duas a trs vezes maior do que a primeira, cuja a infra-estrutura incompleta, o urbanismo inexistente, que se aproxima muito mais da ideia de acampamento do que propriamente de uma cidade. (ROLNIK, 1999, p. 121:122)

    Em Cachoeiro de Itapemirim, essa rea pode ser identificada no mapa,

    nos bairros hachurados

  • 43

    Mapa 1 Bairros perifricos com ocupao irregular

    Fonte: Prefeitura Municipal de Cachoeiro de Itapemirim - ES Secretaria

    Municipal de Desenvolvimento Urbano

  • 44

    Essa ocupao pode ser observada nos bairros localizados nos

    extremos do municpio, com precria ou nenhuma infraestrutura, ocupados por

    trabalhadores que no possuam as condies econmicas para aquisio de

    terrenos com melhor localizao e com infraestrutural. Os bairros hachurados

    no mapa apontam locais que so de risco social e que foram beneficiados pelo

    PAC I e II e recursos prprios do municpio, na atualidade.

    Muitos desses aglomerados populares ganharam apelidos pejorativos

    como casinhas do Ferrao, pombal, invaso, casinhas do Z Tasso,

    sempre remetidos ao nome dos prefeitos que os construram, e ainda,

    conjunto habitacional de F e Raa, nomeado assim pelo prprio ex-prefeito

    Theodorico de Assis Ferrao, em aluso ao seu nome. Os amontoados de

    pessoas so fontes de votos, j que caracterizam os locais de risco social e de

    carncia dos moradores e para l que se dirigem os polticos que angariam

    votos atravs do clientelismo no perodo eleitoral.

    No passado, as obras indicadas por vereadores s eram atendidas

    quando estes faziam parte da base aliada do poder executivo. Somando-se

    carncia de polticas pblicas e ao desconhecimento de grande parcela do

    eleitorado sobre a verdadeira funo dos polticos com cargos eletivos, criou-se

    a falsa concepo de representao poltica28, uma verdadeira iluso, muito

    distante do que se entende por escolha consciente dos representantes de um

    povo. Sobre este assunto Jos Carlos Teixeira Gomes disserta,

    [...] uma irriso, contudo, falar-se em democracia representativa num pas como o Brasil, em que, alm da mo nica do poder econmico, os eleitores trocam seus votos por uma camisa ou um saco de feijo, ao lado da manipulao das pesquisas eleitorais e da permanente possibilidade de fraude e comprometimento da Justia. (GOMES, 2001, p.621)

    Nesse contexto, a escolha de um candidato acontece no pelo

    convencimento de suas propostas, mas pela barganha do voto por um

    benefcio individual. Percebe-se que os eleitores, ao participarem de um

    processo eleitoral municipal, na ausncia do Estado no cumprimento dos

    deveres com o cidado, se rendem ideia de eleger o vereador do bairro, na

    28 um fenmeno complexo cujo ncleo consiste num processo de escolha dos governantes e

    de controle sobre sua ao atravs de eleies competitivas. ( Norberto Bobbio, 1995, p. 1106)

  • 45

    esperana que a proximidade fsica ajude a solucionar problemas do cotidiano,

    de infraestrutura, locomoo, sade, segurana, entre outros. Muitas vezes os

    candidatos surgem dessas circunstncias, alguns se despontam como

    liderana por se destacarem na luta pela soluo dos problemas coletivos e

    logo so estimulados pela comunidade para se tornarem candidatos. Todavia,

    existem os que se inserem propositadamente na comunidade visando uma

    liderana que futuramente poder lhe render votos. Em Cachoeiro, foi

    comumente praticado os candidatos adotarem o nome do bairro e locais de

    trabalho no lugar do seu sobrenome de famlia, no intuito de fortalecer a sua

    ident