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O FÊNOMENO DA CULTURA SNEAKER NO BRASIL: UMA ABORDAGEM PELA TEORIA DA PRÁTICA MARIANA MEMRAVA ROMANINI SÃO PAULO | 2019

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O FÊNOMENO DA CULTURA SNEAKER NO BRASIL: UMA ABORDAGEM PELA TEORIA DA PRÁTICA

MARIANA MEMRAVA ROMANINI

SÃO PAULO | 2019

ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING

PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONAL EM

COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR (MPCC)

MARIANA MEMRAVA ROMANINI

O FÊNOMENO DA CULTURA SNEAKER NO BRASIL: UMA ABORDAGEM PELA TEORIA DA PRÁTICA

SÃO PAULO

2019

MARIANA MEMRAVA ROMANINI

O FÊNOMENO DA CULTURA SNEAKER NO BRASIL: UMA ABORDAGEM PELA TEORIA DA PRÁTICA

Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração, com ênfase em Comportamento do Consumidor, pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Zagallo Camargo

SÃO PAULO

2019

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha filha Lis, que está prestes a nascer e já

é a maior motivação para me tornar uma pessoa cada vez melhor.

AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, Prof. Dr. Ricardo Camargo Zagallo, por todo o apoio e

incentivo durante a realização da pesquisa proposta.

À Profa. Dra. Vivian Strehlau, pela compreensão com os contratempos ao longo

do curso e pelo carinho e acolhimento com os alunos, que fez toda a diferença.

Às Profa. Dra. Suzane Strehlau e Profa. Dra. Cláudia Pereira, pelos conselhos e

direcionamentos na banca de qualificação.

Aos meus pais, Pedro e Regina, por acreditarem no meu potencial e serem,

sempre, meus maiores fãs.

“Algumas coisas definem quem você é

sem que uma palavra seja dita,

o tênis é uma delas”

Rob Dyrdek, skatista profissional

RESUMO

Esta pesquisa aborda o fenômeno da cultura de consumo de sneakers no Brasil,

um item de vestuário que se tornou símbolo de uma cultura urbana no final dos

anos 80. Sneakerhead é o termo usado para se referir aos consumidores

regulares de tênis e suas práticas associadas, ainda que sua definição exata

seja um dos intuitos deste trabalho. Até os anos 2000, poucas pessoas no Brasil

se autodenominavam sneakerheads - em sua maioria pessoas com condições

de viajar para o exterior e acompanhar as tendências estrangeiras. Ainda

existem inúmeras incertezas sobre esse fenômeno, ainda pouco conhecido e

explorado pelo mercado nacional, por isso foi decidido por estudá-lo do ponto de

vista do praticante. O principal objetivo é entender a cultura do consumidor de

tênis no cenário nacional criando uma definição de sneakerhead que possa ser

usada em estudos futuros, além de identificar as práticas associadas a essa

cultura e as diferenças no mercado nacional e estrangeiro. Para a construção do

objeto, como ele pode ser percebido no contexto do consumo contemporâneo e

para apoiar os objetivos mencionados, foram utilizadas as lentes da Consumer

Culture Theory (CCT), em especial a Teoria da Prática. Os resultados mostraram

duas dimensões da cultura dos sneakers: o consumo de histórias (imaterial) e o

consumo dos próprios tênis (material), ligados a compromissos de prática com

ênfase material e simbólica, sendo que essas dimensões podem coexistir nos

mesmos indivíduos.

Palavras-chave: comportamento do consumidor, sneakers, teoria da cultura do

consumidor, teoria da prática

ABSTRACT

This research addresses the phenomenon of sneaker consumption culture in

Brazil, an item of clothing that became a symbol of urban culture in the late 1980s.

Sneakerhead is the term used to refer to regular consumers of sneakers and its

associated practices, although its exact definition is one of the purposes of this

research. Until the 2000s, just a few people in Brazil called themselves

sneakerheads - mostly people who were able to travel abroad and follow foreign

trends. There are still countless uncertainties about this phenomenon, still little

known and explored by the national market, so it was decided to study it from the

consumer's point of view. The main objective is to understand the culture of the

sneaker consumer in the national scenario creating a definition of sneakerhead

that can be used in future studies as well as identify the practices associated with

this culture and the main differences between national and foreign markets. To

understand the object, how it can be perceived in the context of contemporary

consumption and to support the objectives mentioned, concepts such as

Consumer Culture Theory (CCT) and the Theory of Practice were used. The

results showed two dimensions of the sneakers' culture: the consumption of

stories (immaterial) and the consumption of the sneakers themselves (material),

linked to practice commitments with material and symbolic emphasis, as these

dimensions can coexist in the same individuals.

Keywords: consumer behavior, sneakers, consumer culture theory, theory of

practice

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Anúncio da marca Converse em 1949...........................................16 Figura 2 – Remake de 2018 do Air Jordan 1 “Banned” ................................17 Figura 3 – ‘Yeezy 350 v2’, parceria valiosa entre Adidas e Kanye West .....19 Figura 4 – Balenciaga ‘Triple S’ a venda em site nacional .......................... 20 Figura 5 - Nike ‘What the Dunk’...................................................................... 21 Figura 6 – Evento Sold Out............................................................................. 51 Figura 7 – Tênis à venda por frequentadora do evento............................... 52 Figura 8 – Modelo de organização da prática na cultura sneaker ............. 60

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Perfil dos entrevistados ..............................................................55 Quadro 2 – Identidade Social ......................................................................... 56 Quadro 3 – O que é ser um sneakerhead? ....................................................56 Quadro 4 – Práticas ........................................................................................ 58 Quadro 5 – Mercado Nacional ........................................................................ 59 Quadro 6 – Valores ..........................................................................................60

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .......................................................................................... 13

1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OBJETO .................................................... 16

1.2 PROBLEMATIZAÇÃO ............................................................................ 23

1.3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................... 25

1.4 OBJETIVOS............................................................................................ 26

1.5 LEVANTAMENTO DA LITERATURA .................................................... 29

2. REFERENCIAL TEÓRICO ........................................................................ 32

2.1 IDENTIDADE SOCIAL NA MODA .......................................................... 32

2.2 TEORIA DA CULTURA DO CONSUMO ................................................ 37

2.3 TEORIA DA PRÁTICA ........................................................................... 39

3. METODOLOGIA ........................................................................................ 47

3.1 A PRÁTICA AO REDOR DOS SNEAKERS ........................................... 51

4. CONCLUSÃO ............................................................................................ 63

5. GLOSSÁRIO ............................................................................................. 65

REFERÊNCIAS ......................................................................................... 66

13

1. INTRODUÇÃO

Na sociedade contemporânea há uma oferta e consumo exacerbado de

bens, produtos e serviços e, apesar de anos de estudo sobre a cultura do

consumo, ainda existem muitas questões não respondidas a respeito de

produtos e serviços específicos. O consumo de produtos feitos para o mercado

e de símbolos de marketing que induzem desejo é central para a cultura do

consumidor, e ainda assim a perpetuação e reprodução desse sistema são em

grande parte dependente do exercício da livre escolha pessoal na esfera privada

da vida cotidiana.

Pelo viés antropológico, segundo Santos (1987), as várias maneiras de

entender o que é cultura derivam de um conjunto comum de preocupações que

podemos localizar em duas concepções básicas: a primeira preocupa-se com

todos os aspectos de uma realidade social. Assim, cultura diz respeito a tudo

aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação, ou então de

grupos no interior de uma sociedade, dando conta das características dos

agrupamentos a que se refere, preocupando-se com a totalidade dessas

características, digam elas respeito às maneiras de conceber e organizar a vida

social ou a seus aspectos materiais.

Já na segunda concepção, quando falamos em cultura estamos nos

referindo mais especificamente ao conhecimento, às ideias e crenças, assim

como às maneiras como eles existem na vida social. Entendemos neste caso

que a cultura diz respeito a uma esfera, a um domínio, da vida social (Santos,

1987, p.22). Seja qual for a perspectiva utilizada, é certo que a cultura é

fundamental para o entendimento dos processos de transformação pelos quais

passam as sociedades contemporâneas.

Da perspectiva mercadológica, ocorreu uma transição importante do

entendimento do consumo como escolha racional para uma percepção que

enfatiza os desejos e as emoções (Fontenelle, 2017). A sociedade burguesa,

que tinha muito forte o autocontrole das paixões, seguindo uma ética do trabalho

duro voltado para a acumulação de riqueza e postergação do prazer, começou

a viver sob a contradição da cultura do consumo, que instigava a satisfação

imediata, financiada pelo crédito farto.

14

Assim, o ethos do trabalho acabou sendo corroído pelo ethos da

satisfação imediata. Em uma linguagem psicanalítica, podemos chamá-lo de

ethos do gozo, ou seja, do prazer que não é contido. Hoje, diante da consciência

de um mundo de recursos materiais finitos, o consumo de experiências imateriais

vem representar a busca de uma fonte de prazer inesgotável. Na perspectiva de

Fontenelle em Cultura do Consumo – Fundamentos e Formas Contemporâneas

(2017), a experiência tornou-se a mais nova mercadoria. A busca constante pela

satisfação das paixões gerou um consumo exacerbado de bens materiais. A

autora busca evidenciar “como foi necessária toda uma construção cultural para

que o significado da palavra consumo se deslocasse de seu significado original

e negativo e assumisse um valor positivo” (p. 18). Além disso, observa que a

associação entre mercadorias e imagens - que remetessem à fantasia e

levassem ao desejo de compra – é usada desde os primórdios da cultura do

consumo, tendo se aperfeiçoado e se intensificado ao longo dos anos por meio

dos novos formatos publicitários carregados de dimensões simbólicas. Com a

consciência de que a experiência de consumo é constitutiva da cultura do

consumo, Fontenelle busca entender como a experiência entra no circuito dessa

cultura e se torna mercadoria.

Ainda nesse contexto, alguns estudiosos têm se concentrado no

fenômeno do consumo experimentando uma mudança paradigmática de uma

abordagem econômica ou cognitiva psicológica para uma mudança chamada

Consumer Culture Theory, conhecida como CCT (Askegaard; Linnet, 2011).

Para Arnould e Thompson (2005), o CCT refere-se a uma família de perspectivas

teóricas que orientam as relações dinâmicas entre as ações de consumo, o

mercado e os significados culturais partilhados coletivamente em situações e

relações sociais.

Esta dissertação alinha-se com essa perspectiva culturalista e, em

particular, com a perspectiva que compreende o consumo como inserido nas

práticas cotidianas (Warde, 2005), afastando-se tanto da ideia do consumidor

soberano, quanto da ênfase excessiva no que esse autor chama de

expressivismo culturalista.

O objeto do trabalho, a cultura sneaker constitui uma cultura de consumo

que se constitui a partir da confluência do mercado e das marcas comerciais com

a contracultura, que inicialmente questiona essas mesmas marcas, e consegue

15

abrigar essas perspectivas, de alguma forma contraditórias, por isso a

pertinência do enquadramento teórico.

O trabalho caracteriza-se, portanto, como um estudo exploratório

descritivo sobre o comportamento dos consumidores da cultura sneaker no

Brasil, os tênis que viraram um símbolo urbano que move gerações no mercado

internacional (Semmelhack, 2015) e na última década tem conquistado seu

espaço no Brasil. Derivado do verbo “to sneak”, que em tradução livre significa

esgueirar-se ou andar furtivamente, característica de ladrões, o termo sneaker

demorou alguns anos para perder o tom pejorativo e ser associado aos tênis.

Estes, por sua vez, precisaram de décadas e do nascimento das grandes marcas

para conquistar sua importância na indústria da moda.

Nos anos 1960, a primeira geração que de fato nasceu, cresceu e foi

educada dentro da lógica do consumo começou a questionar todo o sistema –

era a contracultura, que expressou seu protesto pelas artes, pela política e pelo

comportamento, inclusive na forma de se vestir. A saída dos EUA da Segunda

Guerra Mundial marcou o surgimento de uma nova geração que viveria todo o

conforto de um país que enriqueceu rapidamente. Contudo, essa geração

desempenhou o papel de apontar os limites e problemas gerados pela sociedade

capitalista, buscando um refúgio contra as instituições e valores que defendiam

o consumismo e o cumprimento das obrigações (Goffman; Joy, 2004).

Assim, a contracultura pode ser entendida como um fenómeno histórico

concreto, incluindo o movimento hippie, o rock, as drogas, o orientalismo, entre

outros elementos, mas também como um espírito de contestação, uma postura

de confronto radical e anárquico da ordem atual (Pereira, 1983, p.20). O termo

foi utilizado pela imprensa norte-americana para designar um conjunto de

manifestações culturais que surgiram nos anos 60, nos Estados Unidos e na

Europa, e com menor intensidade na América Latina (Pereira, 1983, p.13).

É neste segundo sentido que o conceito nos ajuda a refletir sobre uma

forma de questionar as regras do jogo dentro do jogo, que caracteriza o consumo

de sneakers, pois propõe uma forma alternativa de consumo, com regras

próprias, sem questionar o mercado e as marcas.

No Brasil, em fins da década de 60, desenvolveu-se uma nascente

contracultura, alcançando parte da juventude que tentava articular um discurso

de resistência frente à repressão ditatorial, diferente da propagada pelos

16

esquerdistas ortodoxos, a chamada “Tropicália” (Barros, 2014).

Entretanto, uma forma mais recente de contracultura como espírito de

contestação da ordem dominante é o movimento hip hop. As batidas e letras

eletrônicas com rimas ácidas permitiram aos jovens da periferia dos grandes

centros urbanos absorver um gênero musical estrangeiro para retratar a miséria

e a violência que se espalharam em várias cidades do país (Pires, 2007).

O encontro da contracultura com a cultura empresarial passou por um

processo de assimilação e trocas reciprocas até se tornar um sucesso. A

princípio, a visão do papel da empresa ficou muito negativa e os executivos

também eram vulneráveis às críticas ao sistema (Frank, 1997). Ainda segundo

Frank, em seu livro The Conquest of Cool (1997), as novas marcas funcionam

como uma espécie de parasitas culturais, sugando o que emerge como uma

tendência nas subculturas, espelhando-as para criar uma imagem e jogá-la no

sistema.

1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OBJETO

Os tênis de tecido e sola de borracha surgiram em 1839 quando Charles

Goodyear descobriu o método de vulcanização da borracha, tornando-a

maleável e apta para o solado dos calçados. Desde então eram usados,

principalmente, pela classe operária e para a prática amadora de esportes, como

o homônimo tênis (Allen, 1916).

Entretanto, o nascimento da cultura sneaker ocorreu nos Estados Unidos

somente no final da década de 1980, e pode ser atribuído a duas principais

fontes: o basquete e a música hip hop. A explosão de tênis especialmente

projetados para o basquete proporcionou uma variedade de produtos necessária

ao início dessa cultura, enquanto o movimento hip hop deu símbolos de status e

valor aos sneakerheads1 nas ruas (Semmelhack, 2015).

Autora de um dos principais trabalhos documentais2 sobre sneakers,

Elizabeth Semmelhack sintetiza os marcos para a indústria e as principais

marcas de tênis e sua história ao longo dos anos. No início do século XX

1 Sneakerheads é o termo utilizado para os adeptos da cultura sneaker e, portanto, seus consumidores. 2 O livro Out of the Box: The Rise of Sneaker Culture, lançado em 2015, é considerado a bíblia dos sneakerheads.

17

surgiram os primeiros nomes significativos para o mercado, como New Balance

e Converse. Em 1924 foi criada a empresa Gebrüder Dassler Schuhfabrik

comandada pelos irmãos Adolf e Rudolf Dassler que, mais tarde, se separariam

dando origem às gigantes Adidas e Puma, respectivamente.

Anos mais tarde, em 1972 foi fundada a Nike. Entretanto, já na década de

50, metade das casas americanas tinham, pelo menos, uma televisão preto e

branco em que a propaganda começava a ascender e os fabricantes de tênis

eram alguns dos early adopters dessa ideia.

Figura 1 - Anúncio da marca Converse em 1949

Fonte: Classic Kicks (2014)

Além disso, foi também o período em que se iniciou a transmissão de

esportes pela TV, nascendo assim a era dos esportes profissionais.

Em 1985, o consumo de sneakers tem um aumento considerável quando

a Nike anuncia a primeira versão do tênis Air Jordan, uma parceria com a estrela

em ascensão do basquete, Michael Jordan. Na época, pelas regras rígidas da

NBA3, todos os jogadores deveriam usar tênis predominantemente brancos,

criando assim uma enorme polêmica acerca do modelo exclusivo preto e

vermelho fruto da parceria com o atleta, com o mesmo esquema de cores do seu

time Chicago Bulls. Sob a ameaça de multas de USD 5 mil por jogo, o tênis foi

3 National Basketball Association é a principal liga de basquete profissional da América do Norte.

18

banido pela liga de basquete, o que gerou comoção entre os fãs do astro e do

esporte no geral, resultando em USD 100 milhões em vendas do tênis nos

primeiros 10 meses após seu lançamento. Com 33 modelos diferentes lançados

desde então, em 2017 a linha Air Jordan ocupava o terceiro lugar no faturamento

total da empresa, o equivalente a USD 3,1 bilhões ou 9%.

Figura 2 – Remake de 2018 do Air Jordan 1 “Banned”

Fonte: Nike (2018)

Fora das quadras, no ano seguinte, os membros do grupo de hip hop Run-

DMC já eram considerados ídolos por levarem o estilo musical para além das

ruas da periferia e, também, pelo modo como se vestiam. Os clássicos tênis

Adidas Superstar viraram um símbolo do vestuário do grupo e, por serem usados

sem os cadarços foram associados aos hábitos das prisões americanas da

época. Dr. Deas, um médico e poeta americano, considerou a prática uma

ameaça e escreveu uma música intitulada “Felon Sneakers”4 atacando o grupo,

que respondeu com a música de sucesso “My Adidas”5:

4 Em tradução livre “tênis de criminosos”. 5 “My Adidas” é o primeiro single do terceiro disco do Run-DMC, intitulado Raising in Hell, que rendeu

19

“(...) Now the Adidas I possess for one man is rare / Myself homeboy

got fifty pair / Got blue and black cause I like to chill / And yellow and

green when it's time to get ill / Got a pair that I wear when I'm playin'

ball / With the heal inside make me ten feet tall / My Adidas only bring

good News / And they are not used as selling shoes / They're black and

white, white with black stripe / The ones I like to wear when I rock the

mic / On the strength of our famous university / We took the beat from

the street and put it on TV / My Adidas are seen on the movie screen”

(RUN-DMC, 1986)

Como forma de protesto, durante a performance da faixa nos shows, os

músicos pediam que os fãs levantassem seus Adidas Superstar e esse gesto da

multidão rendeu um contrato milionário entre a marca e o grupo, tornando o Run-

DMC o primeiro grupo de hip hop patrocinado por uma empresa de moda e

abrindo o caminho para futuras parceiras da Adidas com nomes da indústria

musical como Snoop Dogg e Ciara e, mais recentemente, Kanye West e Pharrell

Williams, desde 2009 e 2017, respectivamente.

A partir dos anos 2000, a globalização acelerou o processo de

lançamentos e colaborações exclusivas, gerando maior demanda por parte dos

consumidores. A cultura urbana que antes era periférica passa a ser alvo de

ações mercadológicas – reforçando o encontro do mercado com a contracultura

como estratégia de mercado. Nos últimos anos, com uma enorme diversidade

de modelos assim como de pontos de venda, a cultura sneaker se tornou

também um mercado em constante ascensão. De acordo com uma pesquisa

realizada em 2015 pelo NPD Group, só naquele ano, a indústria de sneakers

cresceu 8% nos Estados Unidos, gerando USD 17,2 bilhões em vendas, com o

preço de venda médio 5% mais alto, USD 61,15. Já o relatório publicado pelo

Transparency Market Research (2018) afirma que o mercado mundial faturou

USD 215,7 bilhões em 2016 e a expectativa é que em 2025 esse número chegue

em USD 278,8 bilhões.

20

Figura 3 – ‘Yeezy 350 v2’, parceria valiosa entre a Adidas e Kanye West

Fonte: Sneaker News (2016)

No Brasil, nos anos 2000, a oferta de tênis ainda era pequena e eram

poucos os que se intitulavam sneakerheads, em sua maioria indivíduos que

tinham condições de viajar para o exterior e acompanhar a tendência em outros

países. Só em 2005 a cultura sneaker começou a ser popularizada, e o

responsável por isso foi o dentista Ricardo Nunes, que através de um blog,

decidiu compartilhar seu conhecimento sobre os modelos diferentes, as histórias

de cada tênis e o estilo de vida associado a eles. Em 2007, Ricardo viu a

oportunidade de profissionalizar seu hobby e o site virou o maior portal de

conteúdo sobre a cultura sneaker no país – o SneakersBR (Ferreira, 2017).

Desde sua criação, o tênis sofreu diversas modificações e, de um simples calçado de borracha e tecido, se transformou em um agregado de tecnologia e estilo, demasiadamente associado aos esportes e ao segmento de streetwear. Assim como qualquer outro acessório de moda, o tênis recebe influência das tendências das temporadas, ganhando as passarelas de grandes marcas como Nike, Adidas, Puma [...] entre outras, que disputam o mercado do calçado mais popular do universo. (Lucena, 2009)

Segundo Diniz (2018) o aumento da demanda no país rendeu um

crescimento de até 172% no segmento de tênis dos grandes e-commerce

brasileiros, como Amaro e Shop2gether. Já a Netshoes lançou uma nova loja

21

online chamada Free Lace, em setembro de 2018, que atua com um portfólio de

produtos e coleções premium de sneakers e vestuário da moda urbana das

principais marcas mundiais especializadas no assunto, como adidas, Champion,

Puma, New Balance, entre outras.

Apesar da melhora na questão do acesso aos produtos, o preço dos

sneakers ainda é muito limitador. O preço médio de um tênis comum no Brasil é

quase metade do salário mínimo, estabelecido em R$9986. Já os modelos raros,

trazidos de outros países, ainda sofrem com a carga tributária, tornando seu

consumo inacessível para a maior parte dos admiradores. O modelo Triple S, da

renomada grife Balenciaga, é vendido na Europa por EUR 725, equivalente a R$

3.100, enquanto no Brasil o preço de venda chega a R$ 6.250 – mais que o dobro

do valor original.

Figura 4 – Balenciaga ‘Triple S’ a venda em site nacional

Fonte: Farfetch (2019)

Por outro lado, o Brasil conta com uma particularidade, é o único país em

que as compras podem ser diluídas em parcelas. Segundo dados da Abecs7, em

6 Segundo o Decreto 9.661/2019. 7 Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços

22

2016, 62% dos consumidores usuários de cartões de crédito fizeram compras

parceladas sem juros todos os meses. A compra parcelada permite aumentar o

poder de compra do consumidor e produz menor impacto no seu orçamento

mensal que, por sua vez, faz com que os itens com valor mais alto sejam

consumidos de qualquer jeito, mesmo que o comprador fique comprometido por

algum tempo (Nunes, 2008).

Os consumidores estão dispostos a pagar um pouco mais por certas

marcas em função do que elas representam para eles, pelo seu valor simbólico

(Keller, 2005). Um sneakerhead pode ter uma relação mais forte com uma marca

e utilizar parte do seu orçamento mensal para investir em um calçado dessa

marca, mesmo que seja mais caro do que as concorrentes. Os tênis mais caros

são aqueles que carregam consigo um valor de exclusividade. Esses calçados

são feitos muitas vezes em parceria com artistas e esportistas e entregam, além

de uma história, a experiência de possuir um item raro, colecionável, que será

reconhecido e admirado por outro sneakerhead. Por exemplo, o modelo “What

the Dunk”, lançado pela Nike em 2007, é composto por diversos recortes e em

nenhum lugar, em ambos os pés, repete o padrão de estampa ou material. Hoje,

um par original vale USD 4 mil.

Figura 5 – Nike ‘What the Dunk”

Fonte: Sneaker Addict (2015)

Outro fator relevante que influencia o preço é a oferta e a demanda.

Quanto maior a procura por um determinado modelo, maior é seu valor simbólico

e, consequentemente, seu preço. Os tênis também podem ser lançados em

23

edição limitada, reduzindo ainda mais a chance de obtenção do item, tornando-

o objeto de desejo. Há modelos de sneakers que são considerados obras de arte

de design, marcos de uma geração, ou foram muito importantes na trajetória de

um atleta, e possuem um valor histórico enorme (Nunes, 2008). A exclusividade

e a história contada por um tênis são os principais valores buscados pelos

sneakerheads (Semmelhack, 2015). Cada tênis usado ou colecionado tem uma

história, seja porque ele é retrô e carrega uma bagagem de anos ou porque ele

conta uma história no design que faz ele ser exclusivo (Costa, 2008). A

embalagem, uma estampa diferenciada, um artista renomado assinando. Esses

elementos tornam um produto exclusivo e premium. João Braga (2008),

historiador de moda, afirma que um tênis exclusivo é como uma gravura. Todas

são originais, numeradas, assinadas pelo artista e muito valiosas.

O objeto a ser estudado nesta dissertação está, portanto, em constante

transformação. Pode passar a moda de um tipo de design ou material, mas os

tênis nunca vão sair do holofote e nunca deixaram de ser tendência,

principalmente nas grandes metrópoles, como São Paulo, onde o tênis une estilo

com praticidade e conforto (Braga, 2008). Portanto, a metodologia precisa

considerar que o objeto de estudo é a própria sociedade - uma característica em

comum de todos os objetos nas ciências sociais - e, sendo assim, está em

constante mudança. Não se trata de um objeto estático, mas dinâmico cheio de

nuances. É também um objeto construído, ou seja, ele é resultado de

treinamento e trabalho, fruto de uma construção científica e não é um objeto que

possa ser inventado (Demo, 2009). A cultura sneaker e seus desdobramentos

no Brasil possibilitam uma série de questionamentos, propostos a seguir.

1.2 PROBLEMATIZAÇÃO

Por que as pessoas gastam tanto dinheiro com um item de consumo que

pode ser encontrado por valores acessíveis para qualquer um? O sneakerhead

precisa, necessariamente, ter alto poder aquisitivo? O ato de comprar um tênis

caracteriza alguém como sneakerhead?

Fabricio Costa (2008), designer da Nike, defende que sneakerhead não

24

é, necessariamente, quem possui mais pares, e sim quem tem mais informações

sobre a cultura. Mas será que todos pensam assim?

Quem conhece, conhece o modelo pelo nome. Conhece o artista, conhece até o material que foi usado, os nomes diferentes das cores e os códigos de linguagem. Tem que ter um certo poder aquisitivo ou um certo nível cultural para consumir essas informações ou esses elementos simbólicos, por exemplo, precisa ter informação para reconhecer na rua um tênis que só foi lançado no Japão. (Costa, 2008)

Ainda, quais são as práticas relacionadas à essa cultura? Quem é

sneakerhead e gosta de usar tênis tem um cuidado especial, pensa no tênis que

vai usar para cada ocasião, então jamais vai usar um modelo de lona branco

para ir em uma festa porque já sabe que o tênis vai voltar todo estragado (Nunes,

2008). O consumo de sneakers está mais ligado com pertencimento à um grupo

ou raridade e exclusividade? Ou ambos?

O bacana é você andar com uma coisa que você se sinta exclusivo, porque reforça sua personalidade. As empresas foram se adequando a esse movimento do jovem de querer se diferenciar. Ser reconhecido como indivíduo e não como um a mais dentro de um contexto de iguais. (Braga, 2008).

Não há apenas um universo único em que os tênis estejam sempre

presentes, há múltiplos perfis de consumidores e praticantes, como atletas,

músicos, fashionistas. Então, quais são as características de um tênis brasileiro?

Os músicos as usam porque priorizam a praticidade de subir aos palcos, os

atletas precisam da performance, enquanto os grafiteiros contam com os tênis

para dar agilidade e os skatistas precisam de um calçado com aderência à lixa

do skate, ou até mesmo os fashionistas, que só querem desfilar com a última

moda europeia nos pés. Existem inúmeras incertezas quando falamos sobre

uma cultura de nicho ainda pouco conhecida pelo mercado nacional. Uma boa

forma de enfrentarmos essas questões é estudar o objeto, ou seja, a cultura

sneaker em si, com a ajuda de seus praticantes, os sneakerheads.

25

1.3 JUSTIFICATIVA

A motivação para a realização deste trabalho se deu em vários níveis. A

princípio, a falta de conteúdo sobre o objeto de estudo me faz crer que os

resultados apresentados no final da pesquisa serão de extrema contribuição, nos

âmbitos acadêmico e mercadológico, para o entendimento da sociedade

contemporânea e, em especial, de uma cultura em ascensão que vem se

mostrando cada vez mais relevante no mercado nacional. O material acadêmico

disponível atualmente, como artigos e periódicos, trata, em sua maioria, da

cultura sneaker e suas práticas no mercado americano nos anos 90, conforme

será aprofundado no levantamento da literatura.

No âmbito pessoal, o estudo se justifica por ser um universo de meu

extremo interesse e estar inserida no mesmo. Antes mesmo de saber o que eram

sneakers, ainda quando pequena, já demonstrava um interesse muito maior por

calçados do que por roupas. Crescendo, sempre estive em contato com grandes

nomes da música nacional, do mainstream e do meio underground e, aos

poucos, cultivei grandes amizades. Atualmente, essas pessoas são

conhecedoras e admiradoras da cultura sneaker, visto que a mesma sempre

esteve relacionada com a música, e também são o principal público que as

marcas como Adidas, Nike e Puma querem atingir no contexto nacional. Alguns

deles são patrocinados pelas marcas citadas e podem ser considerados

influenciadores nesse meio. Meu antigo interesse se uniu com o convívio e o

círculo social, me tornando uma apaixonada pelos sneakers e pela cultura em si.

Do ponto de vista mercadológico, dentro do universo digital o marketing

evolui e se transforma em alta velocidade e as campanhas com fotos e vídeos

muito bem produzidos para a internet perderam o lugar para influencers, ou

blogueiras(os). De acordo com uma pesquisa publicada em março de 2016 pela

Digital Democracy Survey, 80% dos jovens tiveram suas decisões de compra

influenciadas por recomendações de amigos e familiares e 72% foram

influenciados por recomendações em redes sociais. As marcas e agências de

publicidade se viram obrigadas a redirecionar suas verbas de marketing e, diante

desse fenômeno, este mestrado tinha, a princípio, o objetivo de estudar as taxas

de conversão e percepção de marca que uma empresa de cosméticos conquista

ao trabalhar com uma influencer. Porém, há indícios de que o fenômeno já está

26

saturado, assim como os consumidores se preocupam com a veracidade da

recomendação já que, em sua maioria, são publicidades pagas e quem sai

ganhando sempre é o influenciador.

A dissertação tomou uma nova direção após uma viagem para a Itália, em

que surgiram alguns questionamentos pessoais em relação à diferença da oferta

de sneakers no exterior e no Brasil, o fácil acesso e disseminação dessa cultura

e seus praticantes em outros países, os preços incomparáveis, entre outros. Ao

entrar em uma loja de calçados encontrei o Adidas I-5923 Special Pride Edition,

uma edição limitada do meu modelo de tênis favorito e, claro, indisponível no

Brasil. Junto com ele havia uma miniatura do tênis que eu usava no momento, o

Adidas Pharrell Hu, no número 18 – compatível com uma criança de 1 ano. Eu

que, além de sneakerhead, sempre sonhei em ser mãe, não pensei duas vezes

em comprá-lo para um futuro bebê. Algumas semanas após o retorno para o

Brasil tive a notícia da minha gravidez, então considero que esta pesquisa

também tem uma pequena contribuição da minha filha que está chegando.

1.4 OBJETIVOS

O principal objetivo a ser alcançado nesta pesquisa é compreender a

cultura de consumo sneaker no cenário nacional. Já os objetivos específicos

envolvem:

a) Definir o que é um sneakerhead, do ponto de vista dos próprios consumidores;

b) Identificar as práticas associadas à cultura sneaker;

c) Elencar as principais diferenças entre o consumo de sneakers no Brasil e no

exterior.

A fim de entender a cultura sneaker, como ela pode ser percebida no

contexto do consumo contemporâneo e para dar suporte ao atingimento dos

objetivos citados, serão utilizados conceitos como Identidade Social na Moda,

assim como preceitos advindos da Consumer Culture Theory (CCT) e Teoria da

Prática, explicados brevemente aqui e aprofundados no Referencial Teórico.

A moda está totalmente inscrita nesse nexo que tem por base o dualismo da existência humana. Na medida em que ela é imitação, ela

27

responde à necessidade de inserção no grupo, incluindo o singular no âmbito coletivo. A imitação fornece um dispositivo que dilui o singular no todo; oferece uma modalidade de identidade coletiva. Mas, por outro lado, enquanto invenção e criação, a moda também opera a tendência à diferenciação, de elevação do singular face ao universal. A moda, portanto, tanto liga como separa, aproxima como afasta, torna distinto e indistinto. (Wiazbort, 2000).

A Identidade Social é formada pela necessidade da identificação com o

coletivo, mas também de distinguir-se como indivíduo. O conceito de distinção,

para Pierre Bourdieu (1983, p. 84-92) baseia-se na ideia de que os gostos são o

marcador privilegiado de cada classe social; estes refletem as necessidades

culturais, que são por sua vez o produto da educação de cada indivíduo. Para

ele, o gosto define-se como a aversão e a intolerância às preferências dos

outros. Assim dá-se o processo de distinção entre os grupos, classes sociais e

pessoas.

A Teoria da Cultura do Consumo se preocupa com uma construção de

experiências, significados e ações. Em outras palavras, a cultura do consumo

não determina a ação como uma força causal, mas sim como um intrincado

sistema de valores, sentimentos e pensamentos que são construídos e

negociados na interpretação da vida social (Thompson; Hirschman, 1995). Em

suma, o CCT é organizado a partir de uma série de questões teóricas relativas

à relação entre a identidade individual e coletiva dos consumidores: a cultura

criada e incorporada no mundo vivido dos consumidores; os processos e

estruturas das experiências; e a natureza e dinamismo das categorias

sociológicas, por meio das quais essa dinâmica da cultura de consumo é

influenciada.

O habitus é o conceito central de toda a sistematização teórica da prática

de Bourdieu (2007). Representa a incorporação, de forma sintética, das práticas

transmitidas por uma determinada classe, constituindo assim a unidade original

de todas as disposições para se comportar e agir de determinada forma, face a

cada situação.

Deve a sua eficácia ao fato de os seus esquemas de classificação da

realidade - e as práticas relativas que a acompanham - atuarem perante o plano

do discurso, da reflexão consciente. O "gosto" funciona como uma espécie de

sentido de orientação social, uma capacidade de discernimento imediato, pré-

reflexivo - e, portanto, considerado uma propriedade "naturalmente" possuída -

28

capaz, a partir do habitus, de orientar os indivíduos que ocupam determinada

posição no espaço social, para bens e práticas coerentes com tais posições.

A Teoria da Prática proposta por Bourdieu, adaptada e trazida para os

estudos do consumo por Warde, nos ajudará a entender que a ideia de que o

consumo ocorre nas práticas: o indivíduo é visto como um praticante, e não como

consumidor. Isso significa, portanto, que o entendimento de si mesmo e de sua

vida se dá, sobretudo, por meio das práticas – e não do consumo (Hargreaves,

2011; Warde, 2005).

Bens e serviços de consumo são utilizados durante o desempenho de

práticas específicas. Os itens utilizados e a maneira com que são empregados

são regidos pelas convenções de cada prática.

A utilização dos bens e serviços de consumo apropriados a determinada prática é que faz um praticante competente. Nesta visão, a satisfação de desejos está relacionada não ao consumo, mas às práticas e a seu bom desempenho. O consumo simplesmente contribui para a obtenção de uma variedade de recompensas associadas à prática. (Warde, 2005).

Ser sneakerhead é como ser um praticante de corrida. Assim como

existem diversos hábitos envolvidos no simples ato de correr - como acordar

cedo ou manter uma alimentação balanceada; consumir produtos como roupas

e tênis específicos para performance, fones de ouvido, entre outros - ser um

sneakerhead envolve práticas como acompanhar os lançamentos e novidades

das principais marcas, manter os cuidados necessários com os sneakers para

conservá-los ou frequentar lugares em comum com outros praticantes.

A importância das práticas para as pessoas – e, portanto, o porquê de

entender a cultura de consumo através delas – aparece até quando

questionamos sobre a vida diária e as pessoas geralmente descrevem-na em

termos das práticas em que estão envolvidas. E, apesar de muitas vezes o

desempenho de uma prática demandar o uso de artefatos materiais, indivíduos

normalmente não percebem suas atividades diárias como atividades de

consumo.

Da perspectiva ‘prático-teórica’, o consumo ocorre no interior das práticas

e por causa delas. Isto é, atividades e momentos de consumo originam-se no

desempenho de práticas – sua origem não está, portanto, relacionada a motivos

ou escolhas individuais, nem a estruturais culturais (Warde, 2005; Hargreaves,

29

2011). É a participação em uma prática que explica o consumo. Assim, o

consumo não é encarado como uma prática, mas como um momento em quase

todas as práticas (Warde, 2005). Como citado anteriormente, a cultura sneaker

permeia diversas práticas e, por isso, a pertinência de utilizarmos tal

entendimento de consumo para estudá-la.

1.5 LEVANTAMENTO DA LITERATURA

A busca de conteúdo acadêmico sobre o objeto de pesquisa foi realizada

nas principais bases do país e do mundo, a princípio, com o intuito de descobrir

quais estudos já haviam sido realizados sobre o tema no Brasil. Pela escassez

de resultados, as buscas foram expandidas para o contexto mundial. As

palavras-chave buscadas foram sneakers, cultura sneaker, tênis e tênis raros.

Buscando pela palavras-chave sneakers nos sites Spell, Capes e Ebsco,

que engloba resultados do Emerald e Scopus. No portal da Capes, foi

encontrado um artigo de Batista (2007) sobre quais são os elementos mais

importantes para o consumidor dentro de um PDV de streetwear, onde o

resultado apontava um vendedor com vasto conhecimento sobre o assunto como

ponto mais relevante. Além disso, foi encontrado um artigo que diz respeito à

reprodução de artigos de luxo na pirataria, publicado por Sales (2010). Já quando

a palavra buscada é tênis, os resultados são associados ao esporte homônimo

ou até o tênis de mesa, enquanto tênis raros e cultura sneaker não mostraram

nenhum resultado. Já no site Spell nenhuma das palavras-chave citadas trouxe

resultados.

Por ser uma base de dados maior, no Ebsco obtivemos os melhores

resultados. Quando buscado o termo sneakers os resultados foram mais

relevantes, como um livro online chamado “Sneakers invadem o Brasil”, da

autora Gabriela Fontes. Encontramos também dois trabalhos de conclusão de

curso da graduação da própria ESPM, um de design e um de administração. O

primeiro, de Anna Carolina Caldas (2014), tinha como objetivo a pesquisa de

tendências do ano vigente para desenvolvimento de uma coleção de estampas

exclusivas para uma marca de sneakers, já o segundo, de Mateus Azarini da

Costa (2017), é uma contextualização da cultura sneaker no Brasil – o que se

30

assemelha muito ao meu objetivo, porém, por ser um TCC é um trabalho apenas

documental que uniu diversas informações sobre o tema. Quando a palavra-

chave é cultura sneaker ou tênis raros a busca segue sem resultados.

Pela escassez de resultados, a pesquisa foi refeita buscando resultados

em inglês. Em todos os sites, os principais resultados são de caráter médico em

que o sneaker é associado como solução paliativa para problemas posturais.

Alguns outros resultados contém o termo sneakers em sua tradução exata,

“fugitivos”, e trata sobre comportamento de animais, entre outros.

Um artigo publicado no Journal of Consumer Research, em 2013, traz a

teoria do Red Sneaker Effect (“The Red Sneakers Effect: Inferring Status and

Competence from Signals of Nonconformity”) que trata da confiança e status que

uma pessoa transparece ao vestir roupas casuais, como os sneakers, em uma

situação formal, o que pode ser diretamente associado com a contracultura

citada anteriormente. O comportamento padrão e esperado em determinada

situação é confrontado, nesse caso, por um modo de se vestir informal. Os

resultados relevantes para a pesquisa são, em sua maioria, artigos publicados

em periódicos de marketing e administração. “Sneakers and street culture: A

postcolonial analysis of marginalized cultural consumption.” (2008) traz uma

contextualização da importância dos sneakers como símbolo da cultura de rua

nos Estados Unidos. Já o “Sneakerheads lace up the game” trata do

colecionismo dos modelos de Air Jordan, especificamente. Além disso, existem

outros trabalhos sobre o relacionamento de determinadas marcas com seus

consumidores, como Nike e Adidas.

Além disso, durante uma pesquisa no portal Sneaker Cult, encontramos o

documentário “Sneakers: Entrando de sola na cultura urbana”, realizado em

2008 pelo estudante Edson Soares, como trabalho de conclusão do curso de

Jornalismo da Universidade de São Paulo. O vídeo de aproximadamente 50

minutos é extremamente relevante para entendermos o movimento no Brasil e

conta com depoimentos de diversos influenciadores da cultura sneaker, como

Ricardo Nunes, criador do portal SneakersBR já citado anteriormente; Zegon, DJ

e colecionador; Fabricio Costa, designer da Nike; João Braga, historiador de

moda; entre outros. Apesar de a obra ter mais de uma década, traz questões

relevantes para esta dissertação como as limitações da prática da cultura no

Brasil, importância dos tênis raros e exclusivos para as marcas e a história por

31

trás dos calçados. Além desse, já foram produzidos mais dois documentários

informativos sobre o tema, “Just For Kicks” (2005) e “Sneakerheadz” (2015),

porém, contextualizados apenas nos EUA, Europa e Japão.

32

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Para maior compreensão do objeto de estudo foram utilizados alguns

conceitos principais como base para a análise proposta: a necessidade de

imitação e distinção do indivíduo dentro do universo da moda e, portanto, sua

relação com itens de vestuário, como o tênis; a Teoria da Cultura do Consumo;

e a Teoria da Prática aplicada ao consumo, para contextualizar as práticas

envolvidas na cultura sneaker, além da compra.

2.1 IDENTIDADE SOCIAL NA MODA

Waizbort (2008) trata da simultaneidade dos estilos desenvolvida por

Simmel, de forma que a moda, como talvez nenhum outro fenômeno, concretiza

a dupla dimensão do processo de diferenciação que perpassa a sociedade

(Simmel, 1991).

Nesse contexto, o fenômeno da imitação desempenha um papel de

destaque. Ela opera uma espécie de “passagem da vida do grupo na vida

individual”, facultando ao indivíduo assimilar-se em meio ao grupo, como parte

dele, como um “recipiente de conteúdos sociais”. O princípio de imitação

representa assim um lado do dualismo, cuja outra face é dada pela diferenciação

individual, pela negação do imitar – o inventar. A imitação é “uma das direções

básicas de nossa essência” e possibilita a “fusão do singular na universalidade”,

ou seja, “enfatiza em meio à mudança aquilo que permanece” (Waizbort, 2008,

p.9). Mas se fizermos o contrário e, em meio ao que permanece, enfatizamos a

mudança, o que aflora são as tendências individualizantes, que procuram a

diferenciação do indivíduo ante o grupo, a emersão do singular em meio à

universalidade.

Uma das características desse movimento de distinção é que, para

Simmel (1987, p. 590-591), a moda é sempre uma moda de “classe”: as camadas

mais elevadas diferenciam-se das mais baixas e deixam uma determinada moda

no exato momento, em que esta passa a ser utilizada por aqueles que lhe são

inferiores. Essa utilização rompe uma marcação simbólica de limites, o que faz

com que as classes elevadas busquem uma nova moda, com a qual se

diferenciam novamente da massa, e assim por diante. Ademais, esse processo

33

repete-se no interior mesmo das classes, criando identidades e diferenças nas

diversas camadas da classe. Há, no dizer de Simmel (2008) um desejo de

imitação que vem das classes inferiores e uma “fuga rumo ao novo” que vem das

classes superiores. Esse movimento é ainda mais acentuado pela difusão da

economia monetária, que imprime uma aceleração a esse processo de dupla

face. Isso porque os objetos da moda são, na maioria das vezes, acessíveis por

meio da posse de dinheiro, o que permite que o objeto de distinção seja adquirido

mais facilmente por outros, exteriores ao círculo dos distintos.

Em síntese, a moda conjuga a “tendência à equiparação social” com a

“tendência à distinção individual”. Se considerada historicamente, a moda

permite vislumbrar as maneiras como essas tendências se desdobram e se

realizam.

A moda possui, portanto, um caráter duplo, uma “dupla função”: ela inclui

em um círculo de iguais e ao mesmo tempo aparta, aproxima e afasta, e essa

dualidade é a condição mesma de sua realização. Onde e quando essa dupla

função deixa de existir, a moda perde suas condições de existência: quando

deixa de responder à necessidade de integração e à necessidade de

segregação, o processo da moda paralisa. Simmel (1991) ilustra esse fenômeno

com dois exemplos históricos: quando em 1390, em Florença, a moda deixou de

existir porque não havia duas pessoas que se vestissem igualmente – e faltava,

portanto, o momento da integração – e quando, em Veneza, toda a nobreza

passou a se vestir, por razões políticas, indistintamente de preto –, faltando então

o momento da segregação e distinção.

A insignificância de qualquer um pode ser atenuada pela moda, na medida

em que oferece um mecanismo de individualização-socialização que cria

pertença a um grupo. Quando uma individualidade não tem forças suficientes

para firmar-se por si só, a pertença ao grupo funciona como mecanismo não

apenas de socialização, mas de individualização mesma. Ademais, a moda

oferece uma espécie de invólucro à preservação de uma maior liberdade interior

(Simmel, 1991).

Além disso, o autor ainda defende que a dinâmica da moda opera aqui

em correlação às dinâmicas dos grupos. A essência da moda consiste no fato

de que sempre apenas uma parte do grupo a utiliza, enquanto a totalidade está

apenas em vias de utilizá-la. Moda é processo. E nesse movimento a moda

34

configura uma relação dupla também no que diz respeito à inveja e à aprovação:

ao indivíduo, a moda propicia a inveja (ele quer se distinguir), mas ao coletivo

ela propicia a aprovação (somos todos similares). Por outras palavras, a moda

propicia tanto a obediência a uma norma social como a diferenciação individual.

Com essa mesma dinâmica fica também caracterizado o traço típico do

fenômeno que engendra um processo sem fim de imitação-aproximação e

divergência-afastamento. Aqui se revela a dimensão temporal da moda, que

enfatiza o hoje frente ao ontem e ao amanhã. Esse mesmo sentimento de

atualidade, como vimos, impregnava a gênese histórica do conceito do moderno

em Baudelaire, na integração de moda e moderno. Moda e moderno encontram-

se nas formas modernas de vida, no moderno estilo de vida: o homem moderno

necessita de impressões sempre novas, e a mudança da moda fornece uma

modalidade ótima para tanto. Quanto mais nervosa é uma época, mais

rapidamente mudam as suas modas (Simmel, 1991). Com isso, torna-se

depositária dos elementos mais efêmeros, fugazes e transitórios da vida: ela

evidencia a passagem rápida do presente para o passado, enfatizando o

presente e a mudança que o caracteriza. (Waizbort, 2008, p.9).

Sabemos que proximidade e distância não são algo absoluto e atemporal,

mas sim algo relativo e histórico (Simmel, 1991; Waizbort, 2000). Com o

desenvolvimento de meios que levam à diminuição das distâncias exteriores (tais

como os meios modernos de transporte), ocorre concomitantemente um

aumento das distâncias interiores. As relações do homem moderno parecem se

distanciar crescentemente dos círculos mais próximos e se aproximar dos mais

distantes. Mas a própria moda frequentemente é algo distante que está próximo:

a moda vem de fora, é importada e justamente isso a faz valiosa e desejada.

O fato de a moda vir de fora cria uma forma muito particular de

socialização, caracterizada pelo fato comum de que todos aqueles que a adotam

referem-se a um ponto comum que está situado fora - no caso dos sneakers, nos

Estados Unidos e Europa.

Como nenhum outro fenômeno social, ela é capaz de articular e sintetizar

essas duas tendências, o individualismo da igualdade no registro da imitação, o

individualismo da diferença no registro da invenção. Como elemento de síntese,

parece assumir uma posição de importância absolutamente central na

compreensão do moderno e de suas contradições e idiossincrasias. “Para a vida

35

moderna, com sua fragmentação individualista, esse momento de

homogeneidade da moda é especialmente significativo” (Simmel, 1991).

A moda expressa particularidade e universalidade, tendência psicológica

à imitação e à distinção, associação entre dimensões aristocráticas de tornar-se

distinto e a democracia da imitação, da horizontalidade. Desse modo, a mesma

carrega consigo diferenciações de classe, de honra, de distinção, de realização

de afinidades, de analogias, de aceleração (rápidas mudanças e mudanças

rápidas), de vaidade, de autonomia e dependência (Simmel acredita que

indivíduos privados de autonomia e de reconhecimento tendem a ser mais

susceptíveis à moda), por isso essa seria também uma expressão de

contraposição à dependência exterior na busca da liberdade interior (Waizbort,

2000).

Não podemos esquecer que a ênfase no presente como traço distintivo

da modernidade é expressa pela particular sensibilidade para aquilo que é

transitório, fugaz, efêmero, volátil, descontínuo. Por isso que a emergência da

aventura se caracteriza pelo rompimento do resto da vida e de sua continuidade.

Cada fato aparece independente daquele que o precede, não se sedimentam

eventos. Em Simmel e as ambiguidades da vida moderna (Tedesco, 2007) fica

claro que o estrangeiro vive na fronteira entre o antigo e o novo; nessa fronteira,

solidariedades, integrações, raízes, direitos, vínculos comunitários são

substituídos, alterados, redefinidos. Desse modo, o estrangeiro não possui uma

dimensão somente de fronteira física e, sim, simbólico-social.

Essa dimensão da fronteira não o excluí da dimensão mercantil do

capitalismo, pois o insere no horizonte do consumo do exótico, auxilia na

obtenção da mais-valia para o capital na medida em que também é um ator de

comércio e consumo de produtos, expande a economia monetária e faz circular

o dinheiro, bem como particulariza formas específicas de circulação de produtos

em correspondência com a intenção constitutiva da presença do dinheiro, que é

favorecer a emergência do individualismo moderno (Frisby, 1992).

O estrangeiro é expressão e produtor da crise da cultura na modernidade.

O espírito calculista, a substituição de valores em direção à dimensão

quantitativa, ao cálculo, à intelectualização, à precisão e ao reino do dinheiro,

favoreceram o surgimento e a expressão diferenciada do sentido da vida e seu

modo de expressão.

36

Vive-se um cotidiano invadido pelos códigos, emblemas e mitos da

comunicação de massa que contribuem a construir os argumentos de cada tribo,

seja enquanto negação ou afirmação de valores transnacionais seja pelo simples

prazer de estar junto (Freitas, 1996). Os sneakers e a paixão por eles independe

de raça, gênero ou credo e, são vistos hoje como um símbolo de liberdade de

expressão. Os jeans e as camisetas também são emblemas de uma noção de

liberdade que se confirma como uma das referências dentro da estética da moda.

Essa liberdade de gênero, ou “unissexualização” (Baudrillard, 1990), dos

modos de se vestir passa muito pelo ideal de vida e de saúde preconizado pelos

esportes em geral. Algumas décadas após as primeiras audácias de Coco

Chanel, uma estética esportiva começou a dominar o visual da publicidade

vendendo uma abordagem que não deveria necessariamente preocupar-se com

a determinação sexual das vestimentas, mas com novas noções de praticidade;

a imagem de alguém feliz e gozando de boa saúde valorizada pela publicidade

de massa do pós-guerra é muito associada com a figura do desportista.

Jovem e desportista. Pode parecer não haver muito espaço para quem

não se enquadra nestas características. A moda contemporânea valoriza estes

dois índices de exterioridade, mas sobretudo em nível de simulacro. O

importante não é a idade ou o peso, o importante é estar à vontade com seus

elementos naturais ou adquiridos - o jovem e o desportista são dois emblemas

de uma sociedade que quer sonhar com a liberdade do corpo, mesmo que para

isso, o silicone substitua a academia de ginástica (Tedesco, 2007).

A preocupação de pensar e estruturar as vestimentas de acordo com a

idade e tamanho está relegada a segundo plano em função de uma nova

maneira de pensar as relações - a “pessoa” no lugar do cidadão, a estética no

lugar da política. Ainda segundo Tedesco (2007), o jeans talvez não seja a

vestimenta mais confortável, mas ele é mundialmente um emblema de uma

sociedade que tem dificuldades em acreditar na via política; ao lado da

unissexualização, a moda contemporânea denuncia também um certo

sentimento de despolitização.

37

2.2 TEORIA DA CULTURA DO CONSUMO

Desde meados da década de 1980, percebeu-se na literatura

internacional relacionada à pesquisa do consumidor uma busca por uma

extensão da abordagem predominante, na qual o consumidor é simplesmente

um tomador de decisão racional (Addis; Holbrook, 2001). Até então

negligenciada pelos pesquisadores, a noção experiencial do consumo pode ser

caracterizada por um fluxo de fantasias (sonhos, imaginação, desejos

inconscientes), sentimentos (emoções tais como amor, ódio, raiva, inveja,

divertimento) e diversão (prazer hedônico derivado de atividades divertidas,

alegres e prazerosas) associado ao consumo (Holbrook; Hirschman, 1982).

Assim, é possível incorporar uma série de variáveis que até então não ocupava

um lugar de destaque na pesquisa do consumidor: o papel dos sentimentos e

das emoções no comportamento de compra, o significado do simbolismo no

consumo, a necessidade do consumidor de buscar divertimento e prazer, o papel

do consumo para além do ato da compra. E, ainda, levar em conta que os

consumidores utilizam bens e serviços para dizer alguma coisa sobre si mesmos,

reafirmar suas identidades, definir sua posição no espaço social, declarar seu

pertencimento a um ou outro grupo, afirmar ou negar sua relações com os outros

ou atribuir quaisquer outros significados (Addis; Holbrook, 2001; Douglas;

Isherwood, 2006; Slater, 2002; McCracken, 2003), e é nesse sentido que o

consumo dos sneakers deve ser entendido e estudado muito além do simples

ato de adquirir um tênis novo.

A premissa fundamental do consumo numa visão mais antropológica é a

de que, na esfera do consumo, homens e objetos adquirem sentido, produzem

significações e distinções sociais (Rocha, 1995). Em suma, são os objetos que

trazem a presença e/ou ausência de identidades, visões de mundo ou estilos de

vida. Tanto roupas e automóveis, quanto bebidas, cigarros, comidas, habitações

e enfeites dos mais diversos não são consumidos de forma neutra, pelo

contrário, são antropomorfizados para levarem aos seus consumidores

individualidades e universos simbólicos que a eles foram atribuídos (Rocha,

1995; Douglas; Isherwood, 2006).

Outro autor que discute antropologicamente o consumo é Jean

Baudrillard, optando por seguir uma linha do consumo como um elemento de

38

discriminação e diferenciação social. Para Baudrillard (2005), o consumo é uma

atividade sistemática de manipulação de significados, com uma ênfase maior na

expressividade e não em seus aspectos funcionais, isto é, a mercadoria é o

próprio significado. Nesse sentido, a circulação, a compra, a venda, a

apropriação de bens e de objetos/signos diferenciados constituem

hodiernamente a nossa linguagem e o nosso código, por cujo intermédio toda a

sociedade se comunica. Seria, dessa forma, a estrutura de consumo a sua língua

em relação à qual as necessidades e os prazeres individuais não passam de

efeitos de palavra (Baudrillard, 2005).

Cunhada por autores como Arnould e Thompson (2005) e McCracken

(2003), a teoria da cultura do consumo não é unificada, pois se refere a uma

família de perspectivas teóricas que direcionam às relações dinâmicas entre

ações de consumo, o mercado e significados culturais. Mais do que ver a cultura

como um sistema homogêneo de significados compartilhados coletivamente, a

teoria da cultura do consumo explora a distribuição heterogênea dos significados

e a multiplicidade de grupos e manifestações culturais que existem nas diversas

formações sócio-históricas atuais, ou seja, a linha de pesquisa também

conceitualiza um sistema interconectado de imagens, textos e objetos

produzidos comercialmente que grupos utilizam por meio da construção de

práticas, identidades e significados sobrepostos para a criação de sentidos em

seus ambientes e para orientar as experiências e vidas de seus membros

(Arnould; Thompson, 2005).

Dessa forma, pode-se constatar que cultura e consumo encontraram uma

forte ligação, pois o consumo é moldado em todos os seus sentidos por

considerações culturais. Os consumidores usam o significado dos bens de

consumo para expressar categorias e princípios culturais, cultivar ideias, criar e

manter estilos de vida, reconstruir noções de si e sobreviver a mudanças sociais

(McCracken, 2003). O consumo deve ser visto não como consumo de valores de

uso, de utilidades materiais, mas como o consumo de signos (Baudrillard, 2005;

Featherstone, 1995). Nesse ponto, é importante enfatizar a visão de Belk (1988),

o autor defende a ideia de que os consumidores consideram seus pertences

como parte deles. Ele também propõe que os objetos constituem uma extensão

do self de cada pessoa. Assim, é necessário destacar a dimensão social e

coletiva dos produtos e das atividades de consumo, podendo-se estabelecer a

39

ligação entre os significados assumidos na relação do indivíduo com os objetos

e a inserção desses objetos em diferentes grupos sociais.

Consumir é algo inerente ao ser humano, e o desejo por ter acesso a

bens, serviços e experiências, e usufruir deles, não está somente relacionado à

quantidade de recursos disponíveis, nem a aspectos utilitaristas, mas, sim,

diretamente influenciado pela interação com o sistema cultural e simbólico

envolvido no fluxo da vida social cotidiana. Como defende Rocha (2006), para

entender o consumo, é preciso conhecer como a cultura constrói a experiência

na vida cotidiana, como atuam os códigos culturais que dão coerência às práticas

e como, por meio do consumo, classificamos objetos e pessoas, elaboramos

semelhanças e diferenças. No mesmo sentido, todo o processo de consumo,

incluindo as experiências, serve para moldar comportamentos, preferências,

relações sociais, estilos de vida, padrões de consumo além da própria identidade

e autoconceito do indivíduo.

2.3 TEORIA DA PRÁTICA

As Ciências Sociais – e, consequentemente, os campos que se apoiam

nelas, como Marketing e Comportamento do Consumidor – têm sido marcadas

por uma oposição persistente entre estrutura e agência individual. De um lado,

há uma perspectiva estruturalista em que a estrutura social determina as ações

dos indivíduos e que falha ao explicar a agência do indivíduo. Nesta perspectiva,

o “lugar do social” (Reckwitz, 2002, p. 246) é a estrutura social. Do outro lado,

estão as teorias que partem da ideia de indivíduos autossuficientes e reduzem a

sociedade à soma das ações dos indivíduos (Kaspersen, 2000; Ropke, 2009). A

Teoria da Prática surge como um dos resultados dos esforços para dissolver

esse dualismo há muito estabelecido (Hargreaves, 2011; Ropke, 2009).

Pierre Bourdieu (2007) sustenta a ideia de que os gostos são o marcador

privilegiado de cada classe social; estes refletem as necessidades culturais, que

são por sua vez o produto da educação de cada indivíduo. A definição de uma

cultura mais nobre sempre esteve em causa, devido à forma singular como cada

grupo vê a cultura e define-a. O olhar é um produto da nossa cultura reproduzido

pela educação: as obras de arte, por exemplo, e a sua apreciação dependem da

educação de cada um, da cultura de cada indivíduo. As práticas culturais,

40

juntamente com as preferências nos diversos assuntos estão ligados à educação

e à herança familiar. São elas que distinguem o gosto legitimo burguês, as

classes médias e as populares. Os gostos são fruto do exercício pedagógico do

indivíduo – através da escola ou da família - e definem a visão de cada um sobre

o que é esteticamente admirável; por outras palavras, fornecem os códigos para

admirar, compreender e classificar algo. Para Bourdieu (1983, p.84-92), o gosto

define-se como a aversão e a intolerância às preferências dos outros. Enquanto

os gostos de um determinado indivíduo lhe são naturais, os gostos dos outros -

que são diferentes – lhe são contra natura. Assim dá-se o processo de distinção

entre os grupos, classes sociais e pessoas.

O autor apresenta-nos o conceito de espaço social que nos explica como

é que os nossos gostos nos aproximam de um grupo e formam um padrão entre

os mesmos, mesmo que a capacidade subjetiva e diferença entre todos nós, faz

com que tenhamos gostos que “fujam” ao padrão. O espaço social é uma

representação abstrata, generalizada que pode ser apresentada sob a forma de

um mapa. Deste modo, surge o conceito habitus, que define-se como o princípio

gerador de práticas objetivamente classificáveis e um sistema de classificação

dessas práticas; portanto é na relação entre estas duas capacidades que se

explica o habitus: na capacidade de produzir práticas e obras classificáveis (a

ação em si) e na capacidade de diferenciar e apreciar essas práticas (os gostos).

Anteriormente, encontramos as condições de vida, ou seja, todo o

processo educativo, familiar, profissional pelo qual o indivíduo cresceu. Assim,

condições de vida diferentes produzem habitus diferentes, que simbolizam o

mundo de cada um e a forma como cada um simboliza o dos outros. À medida

que subimos hierarquicamente, o estilo de vida ganha mais importância, contudo

somos menos competentes na classificação de algo do que alguém que nasceu

nesse meio cultural ao qual subimos. Bourdieu destaca ainda o poder simbólico

que a cultura atribui aquilo que nos distingue, como por exemplo um diploma

universitário.

Alan Warde (2005), a partir da Teoria da Prática, oferece um caminho

diferente das tradicionais abordagens em relação à cultura de consumo. As

abordagens tradicionais normalmente privilegiam ou as escolhas de consumo

individuais ou as estruturas culturais, fazendo com que as análises de consumo

tendam, por um lado, para o voluntarismo excessivo e, de outro, para o

41

estruturalismo extremo. A Teoria da Prática permite a análise das imbricações

do consumo e o entendimento de como o consumo se situa na multiplicidade de

práticas da vida cotidiana e como ele está enredado na reprodução e na

mudança social (Halkier & Jensen, 2011). Esta perspectiva transfere a atenção

para “o desenvolvimento coletivo de modos de conduta apropriados à vida

cotidiana”. O consumidor deixa de ser o foco central, que é deslocado para “a

organização da prática” e “os momentos de consumo” que estas práticas

implicam. (Warde, 2005, p.146).

De acordo com Borelli (2012) a Teoria da Prática coloca, então, o foco das

ciências sociais não nas experiências de um ator individual ou na existência de

alguma forma de totalidade societal, mas nas interações entre indivíduos e as

estruturas sociais (Hargreaves, 2008).

Segundo esta abordagem, os indivíduos entendem o mundo e a si

mesmos através do envolvimento com práticas (Reckwitz, 2002; Warde, 2005;

Hargreaves, 2011). Ao invés de considerar os indivíduos como “escolhedores

soberanos” (Warde, 2005) ou como “ingênuos passivos subjugados pela prática”

(Hargreaves, 2011), a Teoria da Prática entende-os como hábeis praticantes que

realizam, reproduzem, resistem e negociam uma série de práticas diferentes em

sua vida cotidiana (Hargreaves, 2011).

Da ideia de que o consumo se origina das práticas surge um ponto

fundamental para os pesquisadores de consumo: o indivíduo é visto como um

praticante, e não como consumidor. Isso significa, portanto, que seu

entendimento de si mesmo e de sua vida se dá através das práticas – e não do

consumo (Hargreaves, 2011; Warde, 2005). Bens e serviços de consumo são

utilizados durante o desempenho de práticas específicas. Os itens utilizados e a

maneira com que são empregados são regidos pelas convenções de cada

prática. A utilização dos bens e serviços de consumo apropriados a determinada

prática é que faz um praticante competente (Warde, 2005). Nesta visão, a

satisfação de desejos está relacionada não ao consumo, mas às práticas e a seu

bom desempenho. O consumo simplesmente contribui para a obtenção de uma

variedade de recompensas associadas à prática (Warde, 2005).

“A prática (...) é um tipo de comportamento rotinizado que consiste de vários elementos, interligados uns aos outros: formas de atividades corporais, formas de atividades mentais, ‘coisas’ e seu uso,

42

conhecimento prévio na forma de entendimento, know-how, estados de emoção e conhecimento motivacional. Uma prática – uma maneira de cozinhar, de consumir, de trabalhar, de investigar, de cuidar de si ou dos outros, etc. – constitui, por assim dizer um ‘bloco’, cuja existência depende necessariamente da existência e interconectividade específica destes elementos, e que não pode ser reduzido a qualquer um destes elementos individuais.” (Reckwitz, 2002).

A citação de Reckwitz (2002) sugere que as práticas são compostas de

rotinas corporais e mentais, coisas e conhecimento – o que inclui entendimentos,

know-how, “formas de querer e de sentir” e formas de “compreender o mundo”

(p. 253).

Evoluindo a partir de Reckwitz (2002), Shove e Pantzar (2005)

consideram que as práticas envolvem a “integração de materiais, significados e

formas de competência” (p. 45). Os autores parecem destacar o papel dos

produtos na constituição de práticas (Gram-Hanssen, 2011). A partir deles,

Ropke (2009) concebe competência como incluindo conhecimento, habilidades,

know-how, regras, instruções, princípios e preceitos; significado, como ideias

sobre a finalidade da atividade, emoções relacionadas a ela, crenças e

entendimentos; já os materiais seriam objetos, equipamentos e até mesmo

partes do corpo envolvidas na atividade. Truninger (2011) relaciona três

componentes básicos das práticas: coisas materiais (tanto objetos quando

natureza), imagens (símbolos e significados), e habilidades (competências,

know-how, técnicas).

Warde (2005) parece elucidar suas ideias ao colocar as práticas como um

nexo de “atividade prática e suas representações” que estão ligados por

entendimentos, procedimentos e engajamentos (p.134). Como Halkier e Jensen

(2011) ajudam a esclarecer, “entendimentos são as interpretações práticas do

que e de como fazer, conhecimento e know-how em um sentido amplo";

procedimentos são “instruções, princípios e regras de como fazer”; e

engajamentos são “orientações emocionais e normativas relacionadas com o

que e como fazer” (p.105). Adicionalmente, Warde menciona “os modos e

conteúdo de apropriação de bens e serviços” como elementos de práticas

(p.140).

A reprodução das “práticas como entidades” requer “encenação”

constante (Warde, 2005). Tais entidades coordenadas só existem quando as

atividades envolvidas são realizadas por pessoas. Práticas devem ser

43

encenadas e cada ‘encenação’ pode diferir levemente, levando à transformação

de uma entidade ao longo do tempo. Através de sua própria ‘prática como

performance’, o indivíduo é capaz de reproduzir e transformar entidades ao longo

do tempo (Ropke, 2009).

Embora a Teoria da Prática pareça enfatizar a reprodução das práticas,

esta abordagem não as entende como estáticas. De fato, dá conta da mudança

ou da inovação ao destacar que os desempenhos em uma mesma prática não

são sempre os mesmos – podem variar entre indivíduos e grupos de indivíduos

– e que os praticantes muitas vezes adaptam, improvisam e experimentam.

Nestas variações estão as origens das mudanças de uma prática. Além disso,

como o indivíduo é o ponto de interseção de diversas práticas, abre-se a

possibilidade de mudanças em uma prática serem transferidas ou copiadas para

outras (Warde, 2005; Hargreaves, 2011; Gram-Hanssen, 2011).

Uma vez que bens e serviços – e o modo como devem ser utilizados –

fazem parte das práticas, o consumo também influencia na trajetória das

práticas. Como explica Warde (2005), a demanda por bens muitas vezes pode

ser gerada de forma indireta, como quando novas ferramentas ou técnicas

requerem produtos complementares para sua adoção efetiva, ou quando

produtos já estabelecidos passam a ser adotados no desempenho de práticas

que antes não os utilizavam.

Ainda, o autor argumenta que, como as práticas têm suas próprias

convenções, institucionalizadas e coletivamente reguladas, de certa forma elas

protegem os indivíduos da influência de produtores e propagandistas. Isso não

significa que produtores sejam meros coadjuvantes no processo de inovação,

mas, sugere o autor, que sua ação bem-sucedida está direcionada à adaptação

das práticas a seus interesses. Em grande medida, o efeito da produção no

consumo é mediado pelas práticas. Por outro lado, ao contrário do que afirma

Warde, os profissionais de marketing já possuem inúmeros artifícios para

despertar novos interesses nos consumidores e, portanto, pode-se dizer que é

uma via dupla e que podemos também adaptar os interesses às práticas.

Os elementos de uma perspectiva filosófica das práticas não podem ser

simplesmente transpostos para a análise empírica já que tendem a ser

idealizados, abstratos e insuficientemente atentos aos processos sociais

envolvidos na criação e reprodução das práticas. Portanto, ainda é preciso

44

desenvolvimento para traduzir os conceitos da Teoria da Prática em

procedimentos metodológicos que permitam sua operacionalização. Os avanços

teóricos carecem ainda de princípios processuais para definir as fronteiras de

uma prática (Warde, 2005) e as fronteiras entre seus componentes, e para tratar

de práticas que não são facilmente limitadas, mas altamente integradas umas às

outras (Gram-Hanssen, 2011).

Hargreaves (2011) aponta ainda para a necessidade de um maior

entendimento sobre o papel das interações sociais e relações de poder no

desempenho das práticas. Estas relações sociais e de poder produzem as

práticas e são sustentadas por ela, de forma que iniciativas de alterações nestas

práticas podem gerar conflitos de poder.

A importância das práticas para as pessoas e, portanto, por que entender

a cultura do consumo através delas, aparece mesmo quando questionamos a

vida cotidiana e as pessoas, em geral, a descrevem em termos das práticas em

que estão envolvidas. E, embora o desempenho de uma prática muitas vezes

exija o uso de artefatos materiais, os indivíduos geralmente não percebem que

suas atividades diárias envolvem consumo. Do ponto de vista 'teórico-prático', o

consumo ocorre dentro e por causa das práticas. Ou seja, atividades e

momentos de consumo se originam na realização de práticas - sua origem não

está, portanto, relacionada a motivos ou escolhas individuais, nem a estruturas

culturais (Warde, 2005; Hargreaves, 2011). É a participação em uma prática que

explica o consumo. Assim, o consumo não é visto como uma prática, mas como

um momento em quase todas as práticas (Warde, 2005). A cultura do sneaker

permeia diversas práticas e constitui uma prática nova específica e, portanto, a

relevância de utilizar essa perspectiva de consumo para estudá-la.

As teorias da prática são bem adequadas para estudos de grupos de pessoas, auto organizados em torno de atividades que tenham dimensão prática e estética, envolvendo tanto a organização social quanto a valorização [...] onde padrões compartilhados de desempenho, onde o que é bom, é uma razão primária para a adesão ao grupo e, na verdade, para a própria existência do grupo. (Warde, 2014, p. 288)

A teoria da prática é uma escola de pensamento conectada dentro das

ciências sociais que se concentra nas práticas - matrizes de atividades corporais

e mentais interconectadas - como unidade central de análise, argumentando que

45

fenômenos sociais como poder, ética, gênero e organizações podem e devem

ser compreendidos examinando práticas sociais em vez de discursos,

interações, atitudes ou valores (Schatzki et al., 2001; Reckwitz, 2002). Como tal,

oferece um quadro teórico para a abordagem de eventos sociais. Em vez de

explicar por que esses eventos existem, ele conceitua como eles são

constituídos e como as entidades constituintes se relacionam entre si.

Na última década, aproximadamente, a teoria da prática tornou-se um

recurso bem utilizado nas ciências sociais em geral (Orlikowski, 2007; Corradi et

al., 2010; Corvellec, 2010; Gherardi, 2009; Whittington, 2006). Dentro do campo

do marketing, a teoria da prática tem sido usada para abordar uma ampla gama

de questões, tais como a criação de marcas (Järventie -Thesleff et al., 2011). A

investigação sobre o consumo tem utilizado a teoria da prática para abordar

questões como o consumo de bricolagem (Watson e Shove, 2008), blogues de

beleza (Gannon e Prothero, 2016), consumo infantil (Nairn e Spotswood,2015),

consumo de música digital (Magaudda, 2011), práticas recreativas (Shove e

Pantzar, 2005; Shove e Pantzar, 2007), entre outros.

Sob estas lentes, a pesquisa do consumidor volta-se para como as

práticas surgem, são reproduzidas, mantidas, desafiadas ou abandonadas e

extintas; para as trajetórias dos indivíduos dentro de uma prática – isto é, como

são recrutados, se desenvolvem enquanto praticantes, resistem e abandonam

práticas (Hargreaves, 2011). Esta trajetória, e a consequente alteração de

posições, do indivíduo no interior das práticas pode ser narrada em termos de

alteração de formas de consumo. A Teoria da Prática levanta ainda questões

sobre como, para um indivíduo, os momentos de consumo relacionados a

diferentes práticas se relacionam e quão consistente é o padrão resultante

destas relações (Warde, 2005).

É importante ainda referir que as práticas dependem da interligação ativa

de elementos: coisas - a que chamamos material; conhecimento corporal,

competência ou habilidade; e atividades mentais - significado e imagem

especificamente simbólicos. Materiais, imagens e competências existem antes e

depois da "vida" das práticas em que foram integradas e das quais são, de certa

forma, o resultado. Os elementos têm histórias e futuros próprios e que são

rotineiramente transformados por e através de integrações específicas na prática

(Shove e Pantzar, 2010)

46

Os objetos, as competências e os aspectos simbólicos que caracterizam

as práticas existem, portanto, muito antes de serem integrados para formar uma

prática específica e também são modificados por ela. No cenário dos sneakers,

tanto os tênis em si quanto as manifestações e competências culturais

envolvidas já existiam separadamente, mas esses elementos juntos criam a

prática e tornam-se também o resultado dela.

Por implicação, as práticas vêm à existência, persistem e desaparecem

quando são feitas, sustentadas ou quebradas conexões entre elementos

fundacionais como os do material, imagem e habilidade. Consistente com esta

visão, sugere-se que as práticas e sistemas de práticas não devem ser vistos

como fenómenos estáveis ou fixos, sem história ou futuro. Ao fazer coisas como

dançar, caminhar, fotografar, entre outros, as pessoas reproduzem e ligam

ativamente os ingredientes de que estas entidades reconhecíveis, mas

inerentemente provisórias, são feitas (Shove e Pantzar, 2008). Em outras

palavras, práticas e elementos são mantidos e fraturados através de 'circuitos de

reprodução' identificáveis, um termo usado para descrever processos de

representação que simultaneamente limitam ou facilitam a transformação da

prática em questão, a sua integração com outras práticas e a reprodução de

elementos. Esse mesmo enquadramento permite-nos pensar como os

elementos (material, imagem, habilidade) são integrados para formar "uma

prática", e como as práticas se integram para formar sistemas de práticas mais

complexos.

Quando falamos sobre a cultura dos sneakers, podemos facilmente

identificar os três elementos que compõe uma prática. A ‘imagem’ é

representada pelas histórias contadas através do universo no qual o

sneakerhead está inserido, sendo ele o universo da música, do esporte, da

moda, ou qualquer outro. O próprio tênis é a materialização dessas histórias e,

portanto, é o 'material'. Já as 'habilidades' envolvem as competências e

procedimentos relacionados ao consumo, manutenção e cuidados com os

sneakers.

47

3. METODOLOGIA

As características atribuídas ao fenômeno da cultura sneaker foram

decisivas para a opção de seguir a pesquisa com uma abordagem qualitativa.

De acordo com Lima e Chueke (2012) vale observar que algumas características

diferenciam a pesquisa qualitativa da abordagem quantitativa. A abordagem

qualitativa entende que a realidade é subjetiva e múltipla, que ela é construída

de modo diferente por cada pessoa. Assim, o pesquisador deve interagir com o

objeto e sujeito pesquisado, a fim de dar vozes a eles para construir uma teia de

significados. Para isso, os valores pessoais do pesquisador, ou seja, sua visão

de mundo fará parte do processo investigativo, sendo impossível desvincular-se

dela. Esse processo dialético é indutivo, dessa forma a generalização perde

força para a descoberta e a linguagem padronizada liberta-se e evolui para novas

possibilidades narrativas, que buscam integrar um esquema de múltiplas vozes

(Gergen; Gergen, 2006). O pesquisador busca situar e recontextualizar o projeto

de pesquisa no âmbito das experiências compartilhadas (Godoi, 2006).

A intenção dessa pesquisa é enfrentar os questionamentos levantados

anteriormente adquirindo novas informações sobre a cultura sneaker com três

técnicas de coletas de dados de pesquisa qualitativa. O primeiro utilizado foi a

pesquisa documental, uma vez que a maior parte do conteúdo sobre o objeto de

estudo é apresentada por meio de fotos e vídeos disponíveis em sites amadores

ou grandes portais de informações sobre tênis; o segundo foi a observação

participante em um dos maiores eventos de sneakers do Brasil, o Sold Out; e o

último foram entrevistas semiestruturadas.

Segundo Gil (2002, p.62-3), a pesquisa documental tem algumas

vantagens por ser uma fonte de dados rica e estável. Não implica em altos

custos, não requer contato com os sujeitos da pesquisa e permite uma leitura

aprofundada das fontes. É semelhante à pesquisa bibliográfica, segundo o autor,

e o que as diferencia é a natureza das fontes, sendo um material que ainda não

recebeu tratamento analítico, ou que ainda pode ser retrabalhado de acordo com

os objetivos da pesquisa.

No entanto, a pesquisa documental é realizada com base em

documentos, de todas as idades, considerados cientificamente genuínos. Tem

sido amplamente utilizada nas ciências sociais, na pesquisa histórica, para

48

descrever ou comparar fatos sociais, estabelecendo suas características ou

tendências [...] (Pádua, 1997, p.62).

Um dos métodos originados na antropologia – a etnografia – também é de

grande valia para os pesquisadores que buscam estabelecer uma interlocução

entre experiência de consumo e a teoria da cultura do consumo. Em termos

práticos, segundo a visão de Atkinson e Hammersley (1994), a etnografia se

refere a uma forma de pesquisa social com as seguintes características: (1) uma

forte ênfase na exploração da natureza de um fenômeno social particular, mais

do que estabelecer ou testar hipóteses; (2) uma tendência de trabalhar com

dados desestruturados, isto é, dados que não foram codificados em termos de

uma série de categorias analíticas; (3) investigação detalhada de um pequeno

número de casos; (4) análise de dados envolvendo interpretação explícita de

significados e funções das ações humanas. Dessa forma, para Godoy (1995), a

pesquisa etnográfica abrange a descrição dos eventos que ocorrem na vida de

um grupo e a interpretação do significado desses eventos para a cultura do

grupo. Para essa autora, o trabalho de campo é o coração da pesquisa

etnográfica, pois sem um contato intenso e prolongado com a cultura ou com o

grupo em estudo será impossível ao pesquisador descobrir como seu sistema

de significados culturais está organizado, como se desenvolveu e como

influencia o comportamento grupal. Assim, de acordo com Rocha e Rocha

(2007), por meio do estudo etnográfico também é possível acessar as formas

pelas quais os grupos sociais atribuem significado aos produtos e serviços, ou

seja, como experimentam o consumo e, dessa forma, traduzem afeto, desejo e

relações sociais, construindo uma visão de mundo.

Quanto à pesquisa de observação, Evertson e Green (1986) afirmam que

toda a observação permite, por parte dos que observam, a identificação de

problemas, a compreensão de conceitos, bem como a análise de relações e

aplicações de esquemas de diferenciação deles. Segundo Schwartz e Schwartz

(1955), o observador é inserido no contexto a ser estudado. Haguette (2005)

afirma que essa definição de Schwartz e Schwartz é a mais completa, pois além

de conter os pré-requisitos de outras definições, incorpora quatro novos

aspectos, sendo: a) a coleta de dados; b) a forma de atuação do observador; c)

referências quanto ao tempo necessário para a avaliação, que pode ser longo

ou curto; d) "chamar a atenção para o papel ativo do observador como

49

modificador do contexto e, ao mesmo tempo, como receptáculo de influências

do mesmo contexto observado” (Haguette, 2005, p. 73).

A autora também discute a interferência do observador, quando ele

assume um papel passivo (interação mínima possível com os observadores) ou

ativo (atua intensamente até o ponto de fazer parte da situação social). Ela

conclui afirmando que essa escolha é definida de acordo com a necessidade do

pesquisador, a natureza e a qualidade dos dados a serem obtidos.

Para a proposta deste trabalho, o papel escolhido foi o ativo, uma vez que

a autora é considerada participante do fenômeno estudado. Vogt (1999), por sua

vez, define a observação participante como um tipo de investigação em que o

pesquisador participa ativamente como membro do grupo estudado.

Finalmente, para Triviños (1987, p. 146), a entrevista semiestruturada tem

como principal característica algumas questões básicas que são suportados em

teorias e hipóteses que estão relacionados com o objeto de pesquisa. As

perguntas dariam frutos a novas descobertas decorrentes das respostas dos

informantes. O foco principal das entrevistas é colocado pelo entrevistador-

investigador. Ele complementa ainda afirmando que a entrevista semiestruturada

"[...] favorece não apenas a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua

explicação e compreensão da sua totalidade [...]" além de manter a presença

consciente e ativa do pesquisador no processo de coleta de informações

(Triviños, 1987, p. 152).

Para melhores resultados, é importante que o corpus tenha uniformidade

e também diversidade, por isso foram selecionados somente indivíduos que se

identificam como sneakerheads, porém, com características diversas. Foi

realizada uma pré-entrevista com um praticante da cultura sneaker para

entender a relevância das questões abordadas neste trabalho para os próprios

sneakerheads e o mercado nacional, além de servir de guia para a elaboração

das entrevistas semiestruturadas realizadas posteriormente. As dez pessoas

que participaram dessa segunda etapa da pesquisa variam entre as classes A e

B, 21 e 31 anos, ambos os sexos e diferentes ocupações.

As descobertas feitas nas entrevistas serão analisadas com base nos

preceitos de Bardin (2011) para análise de conteúdo. Segundo a autora, o termo

análise de conteúdo designa um conjunto de técnicas de análise das

comunicações visando a obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de

50

descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que

permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de

produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (Bardin, 2011, p. 47).

Godoy (1995), afirma que a análise de conteúdo, segundo a perspectiva

de Bardin, consiste em uma técnica metodológica que se pode aplicar em

discursos diversos e a todas as formas de comunicação, seja qual for à natureza

do seu suporte. Na análise, o pesquisador busca compreender as

características, estruturas ou modelos que estão por trás dos fragmentos de

mensagens tornados em consideração. O esforço do analista é, então, duplo:

entender o sentido da comunicação, como se fosse o receptor normal, e,

principalmente, desviar o olhar, buscando outra significação, outra mensagem,

passível de se enxergar por meio ou ao lado da primeira.

Bardin (2011) indica que a utilização da análise de conteúdo prevê três

fases fundamentais: pré-análise, exploração do material e tratamento dos

resultados - a inferência e a interpretação. A primeira fase, a pré-análise, pode

ser identificada como uma fase de organização. Nela estabelece-se um

esquema de trabalho que deve ser preciso, com procedimentos bem definidos,

embora flexíveis. Normalmente, segundo Bardin (2011), envolve um primeiro

contato com os documentos que serão submetidos à análise, a escolha deles, a

formulação das hipóteses e objetivos, a elaboração dos indicadores que

orientarão a interpretação e a preparação formal do material. Inicia-se o trabalho

escolhendo os documentos a serem analisados.

No caso das entrevistas, sua reunião constituirá o corpus da pesquisa.

Para tanto, é preciso obedecer às regras de exaustividade (deve-se esgotar a

totalidade da comunicação, não omitir nada); representatividade (a amostra deve

representar o universo); homogeneidade (os dados devem referir-se ao mesmo

tema, serem obtidos por técnicas iguais e colhidos por indivíduos semelhantes);

pertinência (os documentos precisam adaptar-se ao conteúdo e objetivo da

pesquisa) e exclusividade (um elemento não deve ser classificado em mais de

uma categoria). Os temas que se repetem com muita frequência são recortados

“do texto em unidades comparáveis de categorização para análise temática e de

modalidades de codificação para o registro dos dados” (Bardin, 2011, p.100).

Na segunda fase, ou fase de exploração do material, são escolhidas as

unidades de codificação, adotando-se os seguintes procedimentos de

51

codificação (recortes, enumeração, etc.), classificação (semântico, sintático,

léxico – agrupar pelo sentido das palavras; expressivo - agrupar as perturbações

da linguagem tais como perplexidade, hesitação, embaraço, outras, da escrita,

etc.) e categorização (que permite reunir maior número de informações à custa

de uma esquematização e assim correlacionar classes de acontecimentos para

ordená-los). Ainda de acordo com Bardin (2011), as categorias podem ser

criadas a priori ou a posteriori, isto é, a partir apenas da teoria ou após a coleta

de dados. Os dados podem ser apresentados em formato de quadros.

A terceira fase do processo de análise do conteúdo é denominada

tratamento dos resultados – a inferência e interpretação. Calcado nos resultados

brutos, o pesquisador procurara torná-los significativos e válidos. Esta

interpretação deverá ir além do conteúdo manifesto dos documentos, pois,

interessa ao pesquisador o conteúdo latente, o sentido que se encontra por trás

do imediatamente apreendido.

3.1 A PRÁTICA AO REDOR DOS SNEAKERS

O evento Sold Out, que teve sua 5ª edição realizada dia 14 de abril de

2019, é considerado o maior evento da cultura sneaker no Brasil. Possui formato

de arena, pensando sempre em comunicação da forma mais ampla e, ao mesmo

tempo, pertinente ao público de interesse.

Em seu livro As novas arenas da comunicação com o mercado, o autor

Francisco Gracioso (2008) aborda o tema das novas arenas da comunicação

com o mercado, mas o fenômeno da multiplicação dessas arenas já é conhecido

das grandes empresas que devem manter contato permanente com os seus

mercados. Até há dez ou quinze anos, essa comunicação dependia quase

exclusivamente da propaganda que era com toda razão chamada de rainha das

batalhas do marketing. Hoje, a propaganda continua forte e imbatível, quando se

trata da competição entre as marcas, pois nada iguala a propaganda como força

criadora ou transformadora de atitudes mentais. No entanto, para introduzir

novos conceitos de vida em novos produtos e serviços, as empresas contam

hoje com o poder comunicador do espetáculo, em todas as suas formas -

megashows, espetáculos esportivos, desfiles de moda, grandes feiras e eventos

52

e o novo universo digital, para não falarmos das grandes catedrais do consumo

em que se transformou o varejo moderno. Até mesmo a propaganda tradicional

ganhou mais conteúdo lúdico, para participar desta nova sociedade do

espetáculo.

No caso da Sold Out, os organizadores do evento promovem um dia para

compra, venda e trocas de produtos como roupas, tênis e acessórios de marcas

renomadas como Nike, Adidas, Supreme, Bape, Off-White e outros. São mais de

50 lojas e vendedores oferecendo produtos exclusivos e limitados, além da

presença de customizadores e restauradores de tênis. Conta ainda com DJs de

hip hop e apresentações de street dance, dois elementos relacionados à cultura,

além de bar e área de alimentação.

O público é composto em sua grande maioria por homens, entre 15 e 40

anos, de todas as classes sociais. Muitas vezes acompanhados da família,

mesmo aqueles que não possuem poder aquisitivo para comprar os produtos

oferecidos, fazem questão de se fazer presentes no evento, ainda que somente

para olhar e trocar informações sobre o universo com outras pessoas do meio.

Figura 6 – Evento Sold Out

Fonte: Instagram/Sold Out (2019)

Com ingressos vendidos a partir de 30 reais, a feira se mostrou

razoavelmente democrática em relação ao acesso. Por outro lado, os produtos

escolhidos a dedo para causar comoção e desejo não são os mesmos

53

encontrados nas lojas. Os sneakers e outras peças de roupas, com preços que

chegam a R$10 mil, são, contudo, secundários durante o evento - o público

parece mais preocupado em desfilar seus figurinos para outras pessoas que

reconhecem seu valor, monetário e simbólico, ou ainda aproveitar os shows e

outras atrações como sorteios, concursos, entre outros.

Os frequentadores também têm permissão para levar suas próprias peças

para venda e/ou troca, desde que não ocupem os espaços reservados para as

marcas convidadas – o que torna imenso galpão escolhido para a realização do

evento um grande formigueiro de pessoas anunciando seus produtos com placas

e chamarizes.

Figura 7 – Tênis à venda por frequentadora do evento

Fonte: Autora (2019)

Aproximadamente sete mil pessoas circularam no galpão durante as 9

horas de evento. A feira é uma adaptação de evento cultural que surgiu nos EUA

e aos poucos vem crescendo no Brasil. A organizadora, a empresa Pineapple

Co., pensa em todos os detalhes a fim de aperfeiçoar o evento a cada edição e

tornar o mercado de sneakers mais profissional. Por isso, sempre conta com

atrações novas. Nesta edição, o espaço contou com uma quadra de basquete

para interação da galera, quem conseguisse “enterrar” a bola ganhava uma

sacola com alguns presentes da loja Kings, uma das patrocinadoras do evento

54

e responsável por montar a estrutura para o público ter a experiência de um

jogador de basquete. Quem representou o universo musical, foram os DJs

Gustavo Treze e Nizz que cuidaram da trilha sonora durante o dia e, para finalizar

a noite, o rapper em ascensão Luccas Carlos fez um show que agradou todos

os presentes.

A pesquisa de campo foi imprescindível para entendermos melhor o

comportamento dos praticantes da cultura dentro do universo no qual estão

inseridos, assim como um melhor direcionamento para as entrevistas. Para a

elaboração do roteiro semiestruturado das entrevistas, alguns meses antes foi

realizada uma pré-entrevista com um membro relevante da cultura sneaker no

Brasil.

Eu comecei a me interessar por tênis por causa do rap. O rap, a moda e o streetwear têm uma relação muito próxima e isso foi o que me aproximou desse meio que eu faço parte hoje. Isso foi por volta de 2009 ou 2010.

Quando questionado sobre a definição de um sneakerhead, na sua

percepção, defendeu que

Sneakerhead pra mim é quem entende o tênis, a história dele, a

importância, valor, é ter um carinho especial com o tênis, cuidar

mesmo. Eu, por exemplo, não tinha condições de ter os tênis que eu

sempre quis, mas sempre acompanhei e sabia a história por trás de

cada um deles. Pra mim isso que é valido, quantidade de pares não

significa nada se você não sabe o que você possui. Mas geralmente os

sneakerheads acabam tendo muitos pares pois sempre adquirem um

novo quando têm a oportunidade, tenho diversos amigos que

colecionam.

Ainda, falou sobre as diferentes motivações para o consumo dos

sneakers.

Hoje em dia eu vejo motivações diferentes para a compra de um sneaker, sob duas perspectivas: um lado que simplesmente compra por estar na moda e para ostentar, que acham que quanto mais caro, melhor, sem ligar pra marca, sem saber história ou conhecer o que realmente está comprando, simplesmente para se sentir inserido em algum movimento. E o outro lado que gosta, entende, coleciona, já está nesse meio há algum tempo, que compra pela história que o tênis passa.

O entrevistado destaca a importância do comportamento de consumo,

defendendo que ser um sneakerhead envolve mais do que apenas o ato da

55

compra do produto em si. Quando questionado sobre as práticas associadas

com a cultura sneaker, citou alguns comportamentos em comum entre os

consumidores e/ou praticantes

Existem práticas em comum que nós [sneakerheads] acabamos compartilhando como, por exemplo, ficar em filas para lançamentos de tênis, acompanhar sites, blogs do mundo sneaker, acompanhar colecionadores, canais no Youtube, frequentar eventos. Além dos cuidados que temos com nossos tênis, de limpeza e higienização, e claro, as gírias e o vocabulário. Acho importante estudar essas práticas, pois além de ser o que nos define como sneakerheads, existe um comportamento e linguagem específicos como em qualquer outro fenômeno, mas por ser relativamente novo no Brasil, ainda estão sendo descobertos pelos sneakerheads.

Considerado um fenômeno mercadológico, sua prática e consumo varia

também de acordo com as condições econômicas de cada país. Nas capitais

brasileiras, por exemplo, é comum que os lançamentos de sneakers ocorram em

etapas, sendo a primeira online, onde o consumidor participa de um sorteio e,

caso seja sorteado, ganha uma garantia de conseguir realizar a compra em uma

loja física. Nem por isso os sneakerheads deixam de formar filas imensas na

porta das lojas – os sorteados que não forem comprar os tênis abrem

possibilidade para os que estão na fila há horas ou até dias esperando. As filas,

apesar de cansativas, se tornaram praticamente um evento onde os

sneakerheads se encontram, trocam experiências e conversam sobre suas

últimas aquisições. Em relação às diferenças entre a cultura sneaker no Brasil e

no exterior, critica:

Existem muitas diferenças entre a cultura sneaker aqui no Brasil e no exterior, mas a principal diferença que eu vejo é a acessibilidade e, para mim, é o que faz a principal diferença. Por exemplo, lá fora um par do Yeezy Boost 350 custa U$ 220 dólares, aqui sai a R$ 1.200 no varejo, onde chega um número limitado de peças. Em um país como o nosso, com todas as dificuldades existentes, pouquíssimas pessoas tem a condição de pagar mais de mil reais num par de tênis, o que limita completamente e torna a cultura elitista aqui no Brasil. Fora o preço, outro ponto é a facilidade de conseguir um par. Aqui no Brasil, somente o eixo Rio de Janeiro/São Paulo recebe os principais lançamentos, lá fora já é diferente, tem muito mais pontos de vendas.

As informações obtidas na pré-entrevista conversam com os objetivos

propostos por esta pesquisa e, por isso, serviram como base para a elaboração

56

das entrevistas semiestruturadas apresentadas a seguir.

Os entrevistados serão identificados por números, visto que suas

identidades não têm relevância para a análise final dos dados – a diferenciação

foi feita através de outras variáveis como gênero, idade e ocupação -, e

desejamos manter a integridade e segurança dos participantes da pesquisa.

Ainda, de acordo com a Resolução 510/2016 de Ética na Pesquisa

garantimos assentimento ou consentimento dos participantes da mesma,

esclarecidos sobre seu sentido e implicações; confidencialidade das informações

de privacidade e proteção de sua identidade, inclusive o uso de imagem e voz;

e a não utilização das informações obtidas em pesquisa para prejuízo de algum

participante.

Quadro 1 – Perfil dos entrevistados

Fonte: Autora (2019)

Seguindo a técnica de análise de conteúdo apresentada por Bardin

(2011), os dados correlacionados foram separados em categorias e serão

apresentados em formato de quadros, com uma breve explicação posterior.

Ao realizar a pesquisa de observação durante o evento, ficou clara a

necessidade de pertencimento ao grupo de amantes e admiradores dos

produtos.

Entrevistado Gênero Idade Ocupação

1 Homem 25 Jornalista

2 Homem 28 Produtor

3 Mulher 31 Vendedora de varejo

4 Mulher 24 Designer de moda

5 Mulher 21 Gerente de marketing

6 Homem 23 Empresário (Alimentação)

7 Homem 30 Músico/Guitarrista

8 Homem 26 Publicitário

9 Mulher 24 Empresária (Moda)

10 Homem 30 Roteirista de TV

57

Quadro 2 – Identidade Social

Fonte: Autora (2019)

Como foi defendido por Simmel (1987), a moda é um processo em

constante movimento que só funciona com a existência da necessidade de

distinção (onde a pessoa busca seu individualismo e usa peças de vestuário para

expressar traços de personalidade) e de imitação (onde se faz necessária a

sensação de pertencer à um grupo que tem gostos similares aos seus).

Quadro 3 – O que é ser um sneakerhead?

Fonte: Autora (2019)

Quando perguntados sobre a definição do termo sneakerhead a resposta

foi unânime. São pessoas que seguem a tendência, estão sempre em busca de

novas informações sobre o assunto, se engajam em práticas relacionadas à

cultura do tênis e podem ou não ter uma coleção.

Fabricio Costa (2008), designer de tênis da Nike, durante o documentário

Categoria Dados

E8: Se identificar como parte de um grupo é um requisito

desde os primeiros modelos de sociedade.

E5: Estar perto de outros sneakerheads é estar com quem dá

a mesma importância e possui o mesmo cuidado com os

tênis que você (...)

E9: Inspiração. Eu realmente gosto de estar ao lado de

pessoas que me inspiram.

E7: Trocar informações e conhecimento faz parte da cultura

dos sneakers.

E10: A troca de experiências e de informações fica mais

rápida e mais fácil quando existem pessoas que entendem

do mesmo assunto.

Identidade Social

Categoria Dados

E1: Não necessariamente tem todos os tênis, mas está sempre

pesquisando a história dos modelos das novas silhuetas dos

novos lançamentos.

E6: Não necessariamente é um colecionador e sim um

entendedor (...) tem colecionadores que não entendem nada

de tênis e tem sneakerhead com poucos pares.

E4: (...) a pessoa que gosta da marca, gosta da história que tem

por trás de cada tênis.

E2: Alguém que dedique boa parte do seu tempo para comprar,

vender ou aprender sobre tênis.

E9: Não ter todos os pares não impede a pessoa de ser uma

admiradora, acompanhar o mercado, entender o fenômeno..

E5: É ter um estilo de vida dedicado à esse universo.

E7: Um snekerhead aprecia a cultura dos tênis. Conhece a

historia e a importância do que representa na moda e costume

das pessoas.

O que é ser um sneakerhead?

58

“Sneakers - Entrando de Sola na Cultura Urbana”, também argumenta que o

sneakerhead não é necessariamente o que tem mais pares, mas o que tem mais

informações sobre a cultura.

Quem pratica a cultura, conhece o modelo pelo nome. Você conhece

o artista, conhece até o material que foi usado, os diferentes nomes

das formas de cores e os códigos de linguagem. Mas você deve ter

algum poder de compra ou um certo nível cultural para consumir essa

informação ou esses elementos simbólicos, por exemplo, você precisa

de informações para reconhecer na rua um tênis que só foi lançado no

Japão. (Costa, 2008)

Como foi observado na pré-entrevista, no Brasil existem algumas práticas

locais, devido a características específicas do fenômeno, como a dificuldade do

varejo em suprir a demanda do consumidor e, portanto, fazer com que as filas

de lançamento sejam grandes eventos esperados com ansiedade pelos tênis.

Além disso, embora os produtos estejam superfaturados por conta dos impostos

de importação, o Brasil conta com a facilidade de pagamento em parcelas.

Como dito anteriormente, há duas dimensões de consumidores, aqueles

que entram na loja e compram o tênis apenas por sua funcionalidade ou por seu

estilo e aqueles que compram o valor simbólico atribuído a ele e estão

diretamente envolvidos em outras práticas de cultura do sneaker além do próprio

consumo. Essa diferenciação nos leva a acreditar que há pessoas que

consomem o sneaker apenas pelo status e, portanto, não podem ser

consideradas praticantes.

A satisfação dos desejos não está relacionada ao consumo, mas às

práticas e seu bom desempenho. O consumo simplesmente contribui para

alcançar uma variedade de recompensas associadas à prática (Warde, 2005).

Ser um sneakerhead envolve práticas materiais como manter os cuidados

necessários com os tênis para preservá-los ou imateriais como frequentar

lugares comuns a outros praticantes, acompanhar os lançamentos das marcas

mais relevantes, etc.

Há práticas comuns que os sneakerheads acabam compartilhando,

como ficar na fila para novos lançamentos, acompanhar sites e blogs

do mundo dos tênis, canais no YouTube, participar de eventos. Além

dos cuidados com os tênis, limpeza e higienização e, é claro, a gíria e

59

o vocabulário. Acho que é importante estudar essas práticas, porque

além de ser o que nos define como tênis, há um comportamento e

linguagem específicos como em qualquer outro movimento, mas

porque é relativamente novo no Brasil, eles ainda estão sendo

descobertos pelos tênis. (Zegon, no documentário “Sneakers –

Entrando de Sola na Cultura Urbana”, 2008)

A partir das respostas apresentadas pelos próprios praticantes podemos

concluir que o sneakerhead é a pessoa que participa das práticas envolvidas na

cultura além do ato de comprar o próprio tênis.

Quadro 4 – Práticas

Fonte: Autora (2019)

Conforme apresentado por Shove e Pantzar, 2010, sua interpretação

também implica que imagens, materiais e habilidades persistem além da vida

das práticas em que foram integradas e das quais são, de certa forma, o

resultado. Podemos identificar pelo menos dois tipos de imaginário consumido:

as histórias do universo da música e do universo do esporte, como sendo a

Categoria Dados

E10: Um sneakerhead costuma ver sites, blogs e canais sobre

o tema. Existem grupos de conversa e troca de informações.

Ele costuma ir em filas, em drops (lançamentos), desfiles de

moda, shows de artistas ligados a esse universo como shows

de RAP.

E8: A maioria dos sneakerheads tem uma forte ligação com

música e moda e, por isso, estão sempre envolvidos nesses

meios também.

E4: Filas de lançamentos dos modelos novos, ser ativa nos

grupos de Facebook ou Whatsapp.

E7: Eventos de troca/venda de tênis, filas em lançamentos

exclusivos e colaborações com grandes marcas.

E2: Gosto de estar nos eventos pois vivo isso todos os dias na

internet sozinho e acho legal encontrar pessoas com gostos

em comum, trocar informações (...)

E9: (...) um exemplo são os lançamentos do modelo Yeezy

Boost da Adidas, onde fazem uma ação de um cadastro

virtual para a realização de um sorteio que possibilita você ir

até a loja para comprar e garantir o produto do seu tamanho.

E1: Hoje em dia as filas dos lançamentos são cada vez mais

raras mas já fui em muitas (...) e sempre tento ir em todos

eventos ligados à cultura sneaker .

Práticas

60

"imagem". O próprio tênis seria a materialização dessas histórias, representando

o “material” e a “habilidade” envolveriam competências e procedimentos

relacionados ao consumo e manutenção (cuidado) dos tênis e/ou relacionadas

às histórias contadas pelos produtos.

Considerado um fenômeno de alto poder aquisitivo, sua prática e

consumo variam de acordo com as condições econômicas de cada país. Há

muitas diferenças entre a cultura do sneaker no Brasil e no exterior, mas a

principal diferença é a acessibilidade. Poucas pessoas têm condições de gastar

mais de mil reais em um par de sapatos, o que limita o consumo e o torna uma

cultura elitista no Brasil. Além dos preços, outro ponto é a facilidade de conseguir

um par. No Brasil, só o eixo Rio de Janeiro/São Paulo recebe os principais

lançamentos.

Quadro 5 – Mercado nacional

Fonte: Autora (2019)

Quando estão na loja para comprar um par de tênis, as características

que os sneakerheads mais valorizam são a história por trás deles e a

exclusividade. Os modelos mais caros são aqueles que têm um valor exclusivo,

muitas vezes feitos em parceria com artistas e atletas e entregam, além de uma

história, a experiência de possuir um item raro, colecionável, que será

reconhecido e admirado por outro sneakerhead. É importante estar com algo que

você se sinta exclusivo, pois reforça sua personalidade. As empresas vêm se

adaptando a esse movimento de jovens que querem se diferenciar, ser

Categoria Dados

E5: Ser sneakerhead no Brasil demanda muito mais

esforço e dinheiro (...)

E1: A maior diferença são os valores. Aqui um tênis

custa em média 800 reais enquanto nos EUA custa 100

dólares...

E4: Lá fora [exterior] da pra notar que é algo mais

cultural, você vê grupos de pessoas na rua todos com

tênis legais, aqui a gente vê mais nos eventos.

E7: O preço e o acesso aos lançamentos é muito

diferente no Brasil.

E9: É um mercado de nicho e peca muito na

acessibilidade, tanto dos preços quando da oferta.E4: (...) só agora que uma quantidade maior de

modelos exclusivos têm chegado aqui no Brasil, antes

demorava muito pra chegar tudo, até a informação.

Mercado nacional

61

reconhecidos como um indivíduo e não como mais um dentro de um contexto de

iguais (Braga, 2008).

Quadro 6 – Valores

Fonte: Autora (2019)

Como podemos ver, a história por trás do tênis aparece também como um

valor importante na hora do consumo. É o elemento não tangível da prática. Com

base nas descobertas feitas por Shove e Pantzar (2010), que relaciona três

componentes básicos das práticas: coisas materiais (tanto objetos quando

natureza), imagens (símbolos e significados), e habilidades (competências,

know-how, técnicas), foi possível criar um modelo de organização da prática

dentro da cultura sneaker, identificando os três elementos necessários para sua

existência.

Figura 8 – Modelo de organização da prática na cultura sneaker.

Fonte: Autora (2019)

Categoria Dados

E10: Conforto e a história por trás do tênis.

E7: Silhueta/design do tênis e valores da marca.

E2: Tem mais valor agregado quando possui

exclusividade (...) aquele sneaker que só foram

produzidas mil unidades em todo mundo ou quando é

alguma collab legal.

E9: (...) o ser humano, principalmente da faixa etária

mais jovem, é seduzido pela sensação e realização da

exclusividade.

Valores

62

Como visto, a Teoria da Prática oferece um caminho diferente das

tradicionais abordagens em relação à cultura de consumo. As abordagens

tradicionais normalmente privilegiam ou as escolhas de consumo individuais ou

as estruturas culturais, fazendo com que as análises de consumo tendam, por

um lado, para o voluntarismo excessivo e, de outro, para o estruturalismo

extremo. A Teoria da Prática permite a análise das imbricações do consumo e o

entendimento de como o consumo se situa na multiplicidade de práticas da vida

cotidiana e como ele está enredado na reprodução e na mudança social (Halkier

& Jensen, 2011). Esta perspectiva transfere a atenção para “o desenvolvimento

coletivo de modos de conduta apropriados à vida cotidiana”. O consumidor deixa

de ser o foco central, que é deslocado para “a organização da prática” e “os

momentos de consumo” que estas práticas implicam (Warde, 2005, p. 146).

Da ideia de que o consumo se origina das práticas surge um ponto

fundamental para os pesquisadores: o indivíduo é visto como um praticante, e

não como consumidor (Hargreaves, 2011; Warde, 2005). O sneakerhead é,

portanto, um praticante. Como foi observado na análise dos dados obtidos,

aqueles que consomem sem participar das práticas não são considerados parte

do fenômeno e, sim, apenas consumidores comuns. A utilização dos bens e

serviços de consumo apropriados a determinada prática é que faz um praticante

competente (Warde, 2005).

Bens e serviços de consumo são utilizados durante o desempenho de

práticas específicas. Os itens utilizados e a maneira com que são empregados

são regidos pelas convenções de cada prática. Foi unanime o reconhecimento

de que existem práticas pontuais, tais como frequentar os eventos, as filas de

lançamento, participar do universo da música ou esporte, entre outros, que

formam uma prática nova – que poderíamos chamar de “sneakering”.

Apesar de ainda apresentar desafios metodológicos, esta abordagem pela

teoria da prática apresenta-se como uma alternativa para aqueles pesquisadores

que questionam a divisão do campo entre estrutura e agência e que há tempos

buscam um ‘meio do caminho’. Ao transferir o foco das ciências sociais para as

interações entre indivíduos e as estruturas sociais – mais especificamente para

as práticas geradas por estas interações –, a Teoria da Prática oferece uma nova

forma de entender o mundo e, portanto, o consumo e os consumidores.

63

4. CONCLUSÃO

Como vimos, a cultura do sneaker pode ser entendida como um fenômeno

cultural, que nada mais é do que uma forma de expressão da sociedade. O

calçado, tal como o vestuário em geral, é um cartão de visita - diz muito sobre o

indivíduo mesmo antes de ele se apresentar. São símbolos de pertencimento e,

ao mesmo tempo, de identidade pessoal, posicionamento e liberdade.

O entendimento comum é que ser um sneakerhead é gostar de tênis e

suas histórias desdobram-se em dois vieses: o consumo de histórias (imateriais)

e consumo dos próprios sneakers (materiais), ligados a compromissos de prática

com ênfase material (que podem levar ao colecionador, ao indivíduo que tem

mais produtos) e com ênfase simbólica (que pode levar a compras pontuais e

especiais mas principalmente à experiência, conhecimento das histórias de cada

produto). No entanto, como visto nas entrevistas, essas ênfases ou dimensões

coexistem nos mesmos indivíduos. Não há, portanto, tipos puros, mas sempre

híbridos.

Por ser um fenômeno relativamente novo, acredito que esta pesquisa seja

de grande contribuição, tanto para entendermos a cultura sneaker do ponto de

vista antropológico, como também para reforçar seu potencial de crescimento

mercadológico. Ainda que seja um mercado já conhecido e explorado nos EUA

e Europa desde os anos 80, o Brasil ainda é visto como incipiente. Outra grande

contribuição desta pesquisa é o modelo de representação da abordagem prática

dentro do universo dos sneakers, dividida em três elementos: material,

representando o próprio produto; imagem, que diz respeito às histórias e

símbolos por trás do tênis ou da marca; e habilidades, que são as competências

associadas aos dois tipos de consumo, tangível e intangível.

Portanto, o principal objetivo desta pesquisa, compreender a cultura do

consumo sneaker no Brasil, foi cumprido, ainda que de forma superficial. As

limitações para a realização do trabalho dizem respeito, principalmente, ao

corpus utilizado para as entrevistas, que poderia ser mais diversificado, assim

como a localização geográfica (todos os participantes são residentes de São

Paulo).

Apesar disso, foi encontrada uma definição mais precisa de sneakerhead,

sendo aquele que consome o tênis assim como as histórias por trás do modelo

64

ou da marca. Identificamos as principais práticas associadas à cultura sneaker,

tais como participar dos eventos que reúnem seus praticantes, assim como

acompanhar as tendências e lançamentos pela internet, entre outros. Ainda,

percebemos que a principal diferença entre o mercado nacional e estrangeiro é

a oferta de produtos, que acaba sendo insuficiente para a demanda cada vez

maior e, consequentemente, acaba tornando o sneaker um produto elitizado.

Ao longo do desenvolvimento deste estudo identificaram-se questões

correlatas que permitiriam o desenvolvimento de outras pesquisas para ampliar

o entendimento do fenômeno estudado, ou para buscar confirmação dos

resultados obtidos. Este estudo poderia ser aplicado em um maior número de

participantes e/ou fora de São Paulo, pois acredito que os resultados se

mostrariam diferentes em outras regiões do país.

65

5. GLOSSÁRIO

“CW” Colorway – cor ou combinações de cores de determinado tênis. (Ex:

CW Black & Red)

“DS” Deadstock – tênis que se encontra exatamente no estado em que saiu da

fábrica (possui etiquetas, nunca foram calçados e, em sua maioria, estão nas

caixas originais).

“OG” Original – a primeira versão que foi lançada de um modelo de tênis. (Ex:

durante os anos, a Nike lançou muitas versões do Air Max 1, mas o OG é de

1987)

Beater – tênis com a função de ser usado em qualquer ocasião, inclusive nas

quais o tênis pode ficar sujo. Tênis para “bater”.

Fake – cópias do tênis originais

Grail ou Holy Grail – tênis mais desejado por um sneakerhead, sonho de

consumo. Opinião pessoal.

Premium – tênis produzidos em pequena quantidade e materiais exclusivos

Release – data de lançamento de um tênis nas lojas oficiais

Resell – tênis revendido por um terceiro, geralmente por preços muito elevados.

Os resellers movimentam um mercado secundário de compra e venda.

Retail – tênis comprado no dia de lançamento nas lojas oficiais da marca

Sneaker – tênis. Termo criado pelo publicitário americano Henry Nelson

McKinney, que deriva de “sneak” (em tradução livre, “esquivar-se” ou “escapar”).

Graças à sola feita de borracha dos tênis, as pessoas podiam andar, esquivar e

escapar sem fazer barulho. O tênis deu essa característica ao andar e, assim, o

nome sneaker foi associado à função.

UN-DS – estrear um tênis que era “DS”

66

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