o fim da ufologia com o nascimento das exociências sociais. uma breve crítica à concepção de...

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7/16/2019 O Fim da Ufologia com o Nascimento das Exociências Sociais. Uma breve crítica à concepção de Ademar José Gev… http://slidepdf.com/reader/full/o-fim-da-ufologia-com-o-nascimento-das-exociencias-sociais-uma-breve-critica 1/5 1 O Fim da Ufologia com o Nascimento das Exociências Sociais Uma breve crítica à concepção de Ademar José Gevaerd da Ufologia como ciência Por Diego dos Reis Bastos Rodrigues  – Maio de 2013, Rio de Janeiro. Graduado em História pela UFRJ, graduando em Filosofia pela UNIRIO. O ufólogo brasileiro Ademar José Gevaerd 1 afirmou, na sexta edição da Campus Party Brasil 2013 2 que a Ufologia é ciência pura, do começo ao fim, segundo o site de notícias Terra. A afirmação acerca da cientificidade da Ufologia visa a conferir caráter de verdade inquestionável a esse campo de investigação. Mas considero que há a impossibilidade de afirmá-la como ciência. Começo, portanto, afirmando que a Ufologia não é uma ciência, mas uma técnica de investigação que assemelha-se, em sua metodologia (ou metodologias), ao  jornalismo, e que parte do pressuposto acerca da realidade não só da existência de vida inteligente originária de outros planetas, mas também de que algumas dessas espécies estão investigando a nós, espécie humana e planeta Terra, talvez há milhares de anos. Todos os seus métodos visam confirmar essa hipótese.  Nota-se que a Ufologia dividiu-se, em sua história, em duas áreas bem distintas: em campo de investigação e em crença pura; respectivamente, ufologia científica e ufologia mística ou ufolatria 3 . Obviamente, a crença não necessita de metodologia nem de indícios para se constituir como tal, mas apenas de fé em algo que se postula verdadeiro. Fé não necessita de prova material nem de investigação. 4  Em relação à postura que se tem diante da crença, a ufologia científica e a ufolatria são diametralmente opostas, pois uma investiga, colhe vestígios, enquanto outra dá-se por satisfeita apenas com a fé. No entanto, ambas mantêm uma semelhança fundamental em relação à crença como tal: o pressuposto, não confirmado pelas ciências, de que vida fora da Terra existe de fato. Neste aspecto, a ufologia distancia-se das demais ciências  – sejam naturais ou sociais -, pois diverge das mesmas ao afirmar 1 Célebre pesquisador do chamado  Fênomeno UFO, conhecido internacionalmente, fundador da Revista UFO (a mais antiga do planeta no tema, criada em 1988) e do Centro Brasileiro de Pesquisas de Discos Voadores (CBPDV). 2 Feira internacional de inovação, tecnologia e cultura digital, realizada, no ano de 2013, em São Paulo. 3 Vertente mística, esotérica, religiosa da Ufologia. 4 Em relação à ufolatria, o ufólogo Claudeir Covo (1950-2012) afirmara que algumas pessoas querem tirar Jesus do altar e botar um disco voador no lugar.  

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A Ufologia não é uma ciência, mas uma técnica de investigação que assemelha-se, em sua metodologia (ou metodologias), ao jornalismo, e que parte do pressuposto acerca da realidade não só da existência de vida inteligente originária de outros planetas, mas também de que algumas dessas espécies estão investigando a nós, espécie humana e planeta Terra, talvez há milhares de anos. Todos os seus métodos visam confirmar essa hipótese.A Ufologia encontrará seu fim quando uma prova incontestável de que há vida alienígena inteligente for finalmente apresentada, ou se apresentar; quando um contato interespécies tornar-se conhecimento público e geral e quando os indícios se dissiparem como certeza inquestionável, tornando qualquer postura cética ou de negação impossível. Então, a Ufologia perderá seu sentido de existência, pois a crença tornar-se-á conhecimento, as pesquisas e coleta de provas visando à confirmação da existência de alienígenas não mais precisarão ser feitas e abrir-se-á caminho para, aí sim, a inauguração de novíssimas ciências sociais, que eu nomeio como Exociências Sociais.

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7/16/2019 O Fim da Ufologia com o Nascimento das Exociências Sociais. Uma breve crítica à concepção de Ademar José Gev…

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1

O Fim da Ufologia com o Nascimento das Exociências Sociais

Uma breve crítica à concepção de Ademar José Gevaerd da Ufologia como ciência

Por Diego dos Reis Bastos Rodrigues – Maio de 2013, Rio de Janeiro.

Graduado em História pela UFRJ, graduando em Filosofia pela UNIRIO.

O ufólogo brasileiro Ademar José Gevaerd1 afirmou, na sexta edição da Campus

Party Brasil 20132 que a Ufologia é ciência pura, do começo ao fim, segundo o site de

notícias Terra. A afirmação acerca da cientificidade da Ufologia visa a conferir caráter 

de verdade inquestionável a esse campo de investigação. Mas considero que há a

impossibilidade de afirmá-la como ciência.Começo, portanto, afirmando que a Ufologia não é uma ciência, mas uma

técnica de investigação que assemelha-se, em sua metodologia (ou metodologias), ao

 jornalismo, e que parte do pressuposto acerca da realidade não só da existência de vida

inteligente originária de outros planetas, mas também de que algumas dessas espécies

estão investigando a nós, espécie humana e planeta Terra, talvez há milhares de anos.

Todos os seus métodos visam confirmar essa hipótese.

 Nota-se que a Ufologia dividiu-se, em sua história, em duas áreas bem distintas:em campo de investigação e em crença pura; respectivamente, ufologia científica e

ufologia mística ou ufolatria3. Obviamente, a crença não necessita de metodologia nem

de indícios para se constituir como tal, mas apenas de fé em algo que se postula

verdadeiro. Fé não necessita de prova material nem de investigação.4 

Em relação à postura que se tem diante da crença, a ufologia científica e a

ufolatria são diametralmente opostas, pois uma investiga, colhe vestígios, enquanto

outra dá-se por satisfeita apenas com a fé. No entanto, ambas mantêm uma semelhançafundamental em relação à crença como tal: o pressuposto, não confirmado pelas

ciências, de que vida fora da Terra existe de fato. Neste aspecto, a ufologia distancia-se

das demais ciências  – sejam naturais ou sociais -, pois diverge das mesmas ao afirmar 

1 Célebre pesquisador do chamado  Fênomeno UFO, conhecido internacionalmente, fundador da RevistaUFO (a mais antiga do planeta no tema, criada em 1988) e do Centro Brasileiro de Pesquisas de DiscosVoadores (CBPDV).2 Feira internacional de inovação, tecnologia e cultura digital, realizada, no ano de 2013, em São Paulo.3

Vertente mística, esotérica, religiosa da Ufologia.4 Em relação à ufolatria, o ufólogo Claudeir Covo (1950-2012) afirmara que algumas pessoas querem

tirar Jesus do altar e botar um disco voador no lugar.  

7/16/2019 O Fim da Ufologia com o Nascimento das Exociências Sociais. Uma breve crítica à concepção de Ademar José Gev…

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algo que ainda não foi confirmado a ponto de derrubar qualquer postura cética. Toda

ação do ufólogo visa a confirmar um pressuposto encarado como certeza, este não

mantém o ceticismo  –  postura fundamental de um cientista. E um pressuposto como

certeza inquestionável é crença.

 No que diz respeito aos indícios que coleta em suas investigações  – sejam eles

materiais ou o relato de um entrevistado -, alguns são interpretados como prova

indiscutível de que vida extraterrestre está, de diversas formas, investigando a nós

humanos. A hipótese é, nesses casos, confirmada pela crença de que o vestígio é

inconteste, mas nunca torna-se teoria. A Ufologia baseia-se num eterno coletar de dados

e de pesquisas que nunca apresentam-se como definitivos. A hipótese ainda não tornou-

se teoria, tampouco a Ufologia ciência. Há o pressuposto-crença que demanda a

investigação, que por sua vez confirma-o. O indício não contribui para a confirmação

definitiva da hipótese de que há vida lá fora. A Ufologia acaba por tornar-se um círculo

vicioso.

Ora, mesmo a conclusão, mediante investigação, e apesar da(s) metodologia(s)

empregada(s), de que determinado indício ou vestígio o é de algo ou alguém vindo de

fora da Terra  –  ou seja, concebido e construído por outra espécie não-humana  –  

necessita de uma boa dose de crença ou fé, pelo simples fato de nunca, na história

humana, qualquer sociedade alienígena ter entrado em contato com qualquer sociedade

terrestre abertamente. Até que isto ocorra, a existência de vida inteligente fora da Terra

continuará sendo apenas um desejo, uma possibilidade ou uma hipótese.

Portanto, o que de fato diferencia, em relação ao Fenômeno UFO5, uma postura

científica de uma não-científica é a suspensão do juízo à respeito da afirmação

categórica de que vida inteligente fora da Terra é uma realidade inquestionável. Ora, tal

realidade é ainda questionável, passível de dúvida, ceticismo ou mesmo negação. A

 posição cética  – verdadeiramente científica  – ou mesmo de negação absoluta daquelesque não creem na existência de vida inteligente fora do planeta Terra, ou mesmo da

existência de qualquer vida, no momento ainda é legítima e justificável, pois um contato

aberto e público simplesmente ainda não ocorreu; e apesar dos ufólogos disporem até

mesmo de provas materiais que sugerem possíveis contatos, uma vez que tais provas

são interpretadas por eles desse modo.

5 UFO é uma sigla que, em inglês, significa Unidentified Flying Object. Seu correspondente em portuguêsé OVNI: Objeto Voador Não Identificado.

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 Não realizo aqui, em absoluto, uma condenação à Ufologia por manter suas

investigações e por interpretar determinados indícios ou vestígios a partir de

 pressupostos que não questiona. Mas me contraponho à visão, como a do aclamado

ufólogo brasileiro, de que esse campo de investigação é ciência, natural ou social; uma

vez que não é possível fazer tal afirmação a partir do entendimento de ciência como

área de conhecimento que possui metodologia, epistemologia e quadro teórico.

Há algum ufólogo que mantenha suas atividades sem adotar a crença na

realidade de alienígenas como pressuposto? É possível ser ufólogo cético quanto a esta

 possível realidade? A Ufologia, para existir como tal, não é cética, mas aproxima-se da

crença, embora de maneira alguma seja apenas isso, pois realiza um diálogo com muitas

ciências da natureza e humanas; tem caráter interdisciplinar.

* * *

A Ufologia encontrará seu fim quando uma prova incontestável de que há vida

alienígena inteligente for finalmente apresentada, ou se apresentar; quando um contato

interespécies tornar-se conhecimento público e geral e quando os indícios se dissiparem

como certeza inquestionável, tornando qualquer postura cética ou de negação

impossível. Então, a Ufologia perderá seu sentido de existência, pois a crença tornar-se-

á conhecimento, as pesquisas e coleta de provas visando à confirmação da existência de

alienígenas não mais precisarão ser feitas e abrir-se-á caminho para, aí sim, a

inauguração de novíssimas ciências sociais, que eu nomeio como  Exociências Sociais.

Ora, todo ufólogo deve torcer para que a Ufologia termine o quanto antes, para dar vez

às exociências – de caráter  social , e não da natureza ou naturais, pois não faria sentido

em se falar de Exofísica ou Exoquímica, nem mesmo de Exobiologia (que, por ora,

desconhece qualquer forma de desenvolvimento da vida fora da Terra e ainda é umaciência em formação6) ou de Exogeologia.7 

A Ufologia jamais será ciência, enquanto as Exociências nascerão já como

ciências sociais, dialogando com áreas como História, Filosofia, Sociologia, Ciência

6 No devido tempo, a Exobiologia, quando melhor compreendidos os diferentes processos de formação edesenvolvimento da vida no Cosmo, tornar-se-á apenas Biologia, com novos parâmetros.7 Pode-se argumentar que a investigação acerca do envolvimento de governos e/ou militares com oFenômeno UFO ainda será imprescindível para uma melhor compreensão de nossa história com outras

espécies inteligentes; e muitos órgãos políticos ainda manterão guardados seus segredos. No entanto, umavez confirmada a existência de vida inteligente extraterrestre, tal questionamento não mais pertencerá àUfologia e aos ufólogos, mas sim à História e aos historiadores.

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Política, Antropologia, Linguística dentre outras ciências sociais, assim como com

algumas ciências da natureza. Estas novas áreas continuarão mantendo a

interdisciplinaridade, mas manterão tal relação como ciências reconhecidas, e não como

técnica investigativa, como a Ufologia.

E do que trataria exatamente essas ciências? Com um vastíssimo campo de

investigação, estudariam as relações sociais, políticas, culturais, filosóficas,

 psicológicas, religiosas, linguísticas, afetivas (econômicas, quem sabe?) de nossa

espécie com outras consideradas inteligentes, de suas implicações e impactos em nossa

história, assim como estudaria as relações sociais, políticas, culturais, filosóficas,

históricas, psicológicas, religiosas, linguísticas, afetivas (econômicas, quem sabe?) das

mesmas espécies entre elas mesmas, em seu próprio contexto, se é que poderemos

aplicar essas categorias de pensamento a sociedades alienígenas.

As Exociências Sociais visariam, sobretudo, à compreensão do(s) outro(s)

alienígena(s) e à da espécie humana, agora inserida em um contexto totalmente

diferente do qual estava habituada, mais amplo e múltiplo, mais complexo; numa

importante quebra de parâmetro através da terceira e última confirmação cabal de que

os seres humanos não encontram-se no centro do Universo e tampouco são o sentido da

existência do mesmo – a primeira confirmação foi realizada por Aristarco de Samos8 e

 Nicolau Copérnico9, e a segunda por Charles Darwin.10 

 No Brasil, a tendência imposta pelos órgãos que financiam pesquisas científicas

é a de dividir os campos de saber do homem em dois grandes grupos: 1- Ciências

Humanas: Antropologia, Arqueologia, Ciência Política, Educação, Filosofia, Geografia,

História, Psicologia, Sociologia, Linguística, Teologia; 2- Ciências Sociais Aplicadas:

Administração, Ciência da Informação, Comunicação, Demografia, Desenho Industrial,

Direito, Economia, Museologia, Serviço Social, Turismo, Urbanismo.11 No presente

trabalho, utilizo para todas essas áreas do conhecimento a designação única de Ciências

8 Aristarco de Samos (c. 320-250 a. C.) condenou o sistema geocêntrico.9 Foi com Nicolau Copérnico (1473-1543) que começou a chamada revolução científica moderna, emboranos séculos seguintes muitos pontos de sua astronomia tivessem de ser abandonados. De qualquer forma,o sistema de Copérnico é heliocêntrico, o que contribuiu para retirar o ser humano do centro da criação.10 Charles Darwin (1809-1882) mostrou que entre o ser humano e os demais seres vivos não há umadiferença qualitativa ou hierárquica: uma minhoca, uma bactéria, uma árvore, girafa ou ser humano estãoigualmente adaptados para as atuais condições ambientais do planeta Terra, com cada espécie em seumeio. O fim último da evolução não é a racionalidade, mas a adaptação. O homem, pela segunda vez na

história, é descentralizado.11 BARROS, José D’Assunção. Teoria da História. A Escola dos “Annales” e a “Nova História” (V.V).Petrópolis: Vozes, 2013, p. 60-61. 

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Sociais, uma vez que denominá-las como Humanas em um contexto de muitas espécies

inteligentes perde seu sentido.

Com o passar das décadas ou dos séculos, talvez o prefixo exo não mais

necessitará ser utilizado para designar essas ciências, uma vez que toda compreensão

acerca da espécie humana apenas se efetuará se compreendida em um contexto cósmico,

mais amplo e múltiplo, e não mais como isolada em seu planeta de origem. Assim, por 

exemplo,  Exo-história será apenas História;  Exossociologia será Sociologia;

 Exopolítica, apenas Ciência Política; Relações Internacionais também poderá manter 

sua atual designação, mas com novos parâmetros… 

De qualquer forma, uma vez comprovada a existência de vida inteligente fora da

Terra - quer essa descoberta seja realizada ou provada, definitivamente, pela Ufologia e

 pelos ufólogos, quer não -, as chamadas Ciências Humanas não mais poderão ser 

denominadas como tal, pois não seriam, a partir da quebra de parâmetro, apenas

humanas. Mas continuarão a ser sociais, pois basear-se-iam na ideia de que as relações e

interações pacíficas entre espécies inteligentes, com vistas ao enriquecimento cultural e

científico das sociedades envolvidas, são possíveis e desejáveis.12 

12 E mesmo uma postura cética em relação a tal contato é legítimo, como já demonstrou o escritor polonêsde ficção-científica Stanislaw Lem (1921-2006). Sua obra Solaris conta a história da descoberta einvestigação científica de um planeta-oceano, vivo e senciente, por parte dos seres humanos: na trama, a

comunicação acaba por se mostrar impossível, por mais que ambas as espécies tentem entender-sereciprocamente, devido à total ausência de qualquer ponto de partida em comum que permita algumatroca de experiências entre espécies tão distintas.