o espírito do espaço

413
i - m l  --------------   ----------------------------------------- ^ - "4r . 0 ESPIRITO DO ESPAQO ZANELI RAMOS, F.R.C.

Upload: moonshine777

Post on 08-Jan-2016

154 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

Através de felizes apreciações de muitos aspectos místico-filosóficos, Zaneli Ramos consegue, por meio de diálogos envolvendo três pessoas, levar o leitor a questionar-se por um raciocínio silogístico e abrangente.

TRANSCRIPT

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 1/411

i - m l  --------------  —    -----------------------------------------^ -

"4r

.

0 ESPIRITO

DO ESPAQOZANELI RAMOS, F.R.C.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 2/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 3/411

O ESPIRITO DO

ESPAQO

Zaneli Ramos, F.R.C.

C O O R D E N A C A O E SU P E R V I S A O

Charles Vega Parucker, F.R.C.

Grande Mestre

B I B L IO T E C A R O S A C R U Z

O R D E M R O SA C R U Z , A M O R C

G R A N D E L O JA D O B R A S IL

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 4/411

2? E d i^ o em Lfngua Portuguesa

Janeiro. 1990

ISBN-85-3I7-0119-8

Todos os Direitos Reservados peia

O R D E M R O SA C R UZ , A M O R C

G R A N D E LO J A D O B R A S I L

Proibida a reprodugao e m parte ou no todo

Composto,revlsadoe  Impressona GrandeLojadoBrasil

RuaNicaragua,2620- BacacheriCaixaPostal307 -Tel.(041)256-6644

60001- Curitiba- Parand

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 5/411

Atraves de felizes apreciagoes de muitos aspectos mistico-filos6-ficos, Zaneli Ramos consegue, por meio de di&logos envolvendo tres

 pessoas, levar o leitor a questionar-se por um raciocmio silogfstico e

abrangente. Ao lermos o livro sentimo-nos identificados, ora com o

“tio” , ora com o jovem, ora com sua namorada e isto €   sobremodo

realgado pela fortaleza dos didlogos, gragas a uma linguagem atual e

 poderosa. Poucos autones conseguem de forma tao natural, como a

aqui expressa, trazer a mensagem mfstica com tanto conhecimento e

sabedoria de analise. Os Ne<5fitos mais sagazes desfrutarao de ex-

 pressivo deleite ao enfrentarem os conflitos apresentados &sua con-

sideragao.

O livro O Espi'rito do Espago  constitui-se assim em obra-prima da

literature de todo o estudioso das coisas do Esoterismo, que nos di-

zem muito de perto e que nos falam a Alma com profundidade.

Charles Vega Parucker

Grande Mestre

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 6/411

A Albert Einstein - figura humana por quem sempre senti como-

vida e profunda admiragao —e a todos aqueies que com ele possam

dizer:

 A mais bela e profunda emogao que podemos viver £ a  sensagao de misterio. E ela a fonte de toda verdadeira 

ciencia. Aquele que nao conhece essa emogao, que nao 

mais pode se maravilhar e sentir~se pasmo de admira- 

 gao, estd praticamente morto. O sabermos que aquilo 

que e impenetrdvel para n6s realmente existe, manifes- 

tando-se como a mais sublime sabedoria e a mais ra- 

diante beleza, que nossas debeis faculdades podem apre- ender somente em suas form as primitivas, este conheci

mento, este sentimento, e a essencia da verdadeira expe

rience.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 7/411

I N D I C E

INTRODUgAO.............................................................................. 7

PRIMEIRA PARTE

P reludio..........................................................................................9

SEGUNDA PARTEInterludio ....................................................................................... 25

Os Gafanhotos e a Ligdo da Esfinge ............................................27 

O Aprendiz de Feiticeiro e o Jogo dos Espelhos.........................39

 A Princesa de Ouro e a Chave-de-ladrao.....................................51

 Rosdrio no Carrossel dos Tontos...................................................65

 Lenha na Fogueira.........................................................................71

O Futuro Pretirito ..........................................................................73

 Mergulho no Buraco do Silogism o..............................................77O Cochilo do Guarda do Pendulo................................................81

 Flash Gordon no Planeta Terra ...................................................89

 Deuses no Planeta-Hospfcio..........................................................93

Terranautas e o Enredo do Sonho ................................................99

 Nu, no Deus sem Buracos..............................................................107 

0 Ouro dos Trouxas....................................................................... 113

 Ego, Amor, e Cafe com S a l ..........................................................121 Robos —A Natureza Tamb£m Faz? ..............................................129

 Robos Tontos na Roda do Destino................................................137 

0  "X” da Questao, no Bico do Passarinho................................145

 Homo Non-sapiens no Painel de Rdtulos.....................................155

Chaleira Seca, na Gldria do Universo.........................................169

 Autdmatos sem Virtude, no Fim do Tunel ...................................181

 Ping. . Pong  —  Deus TambSm Joga? .........................................201

O Buscador de Proniquios............................................................205

SiHncio! ..........................................................................................211

Graozinhos de Praia, no Nexo do Ser Cdsmico.........................219

 Respostas de Ninguem a Perguntas de A lguhn ............................233

0 Canto da Sereia Cdsmica..........................................................243Cangdo de Anseios man Piano Mudo............................................255

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 8/411

 A Parte Que Nao Pensa.................................................................267 

 A Busca da Orquestra Liliputiana................................................ 283

O Construtor de Labirintos............................................................ 299

O Piloto Automdtico e a Antena Misteriosa................................

321 Brecha na Circunferencia Mdgica!...............................................335

 Bebes, Poetas, Misticos, e Meninos-Reis.....................................353

 JJm Ser Infinite e V ivo ................................................................... 365

 Amanha.  . . a Ressurreigao!..........................................................369

TERCEIRA PARTE

Posludio.......................................................................................... 381

 Postcriptum ..................................................................................... 395

BIBLIOTECA ROSACRUZ..........................................................399

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 9/411

INTRODUCAO

Do Livro, pelo Autor:

E lenha. Jogue na  sua fogueira e deixe queimar. Voce joga lenha

na sua fogueira e ela queima e lhe da mais calor  e luz.

Que e calor? Vida. Experiencia que voce e eu estamos. .. sofren-

do?. . . gozando? Experiencia que cada um de nos esta. . . sofren-

do?. . . gozando?. . . na consciencia de ser. Qual e a sua consciencia

de ser? Qual €   a minha consciencia de ser? A mesma? Estamos em

acordo. Diferente? Estamos em desacordo. E os outros? Quantos

estamos em acordo? E em desacordo? E a realidade intrfnseca da

natureza? Em acordo? Com quem? Com voce? Comigo? Com ne-

nhum dos dois? Com outros?

E lenha. Jogue na fogueira. Na sua fogueira.

Que e luz? Discemimento. Apreensao intuitiva da realidade intrfnseca da natureza, na consciencia de ser que corresponda a verdade

do Ser. Qual 6  o seu discemimento? E o meu? E o dos outros? Es

tamos em consenso? Nao? Entao eu lhe oferego o meu discemimen

to, neste livro. Fruto da minha experiencia desse mesmo fenomeno -

vida - que voce esta. . . sofrendo?.. . gozando? Num esforgo para o

consenso em que nao estamos. S<5.

Entraremos em consenso? Voce, os outros e eu? Nao sei. Impor-

tante tentarmos. Necessario tentarmos. Voce, os outros e eu. E se

entrarmos em consenso? Sera com o seu discemimento? Com o dos

outros? Com o meu? Nao sei. Importante tentarmos. Necessario

tentarmos. Voce, os outros e eu. So.

E verdadeiro o meu discemimento? E falso? Nao sei. Mas e o

meu discemimento, fruto da minha vida. E o que tenho de mais va-

lioso, e veio a compulsao de lhe oferecer e escrevi este livro. E lhe

dou, isso que tenho de mais valioso: meu discemimento, fruto da

minha vida. So.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 10/411

Em todo caso, nao esquega: e lenha; jogue na sua fogueira!

Do Autor, pelo Livro:

Ora. . . leia-me! Ali&s, nao importa. Nao importa quem diz o que. Ou nao 6 quem  diz o que mais importa. Importa mais o que €  dito,

 por quem quer que o diga.

E verdadeiro o que e dito? Isto importa mais. E falso o que 6  di

to? Isto importa mais. Quem diz o que 6   verdadeiro ou falso? Isto

importa menos.

E quem vai decidir se 6  verdadeiro ou falso? Isto tambem importamais. E 6  vocS quem vai decidir. Nao eu. VOCE! Qual 6  a vida que

voce esta. . . sofrendo?. . . gozando? A  sua,  com o  seu discemi-

mento. De outro modo, nao seria verdadeira essa vida que voce esta

ria. . . sofrendo?.. . gozando?

S<5 uma coisa lhe recomendo: DEIXE SENTAR A POEIRA!

Voce. A sua vida: um panorama que voce construiu, com o seudiscemimento. Voce, ante o seu panorama. Eu. Um livro? Nao. Um

caminhao. Passo na sua frente e levanto poeira. Ai voce fica assusta-

do —e talvez inseguxo - porque nao ve o seu panorama. Ora, nao se

 preocupe. Deixe sentar a poeira (leia-me todo, devagar, um tftulo de

cada vez, e deixe passar algum tempo). Entao voce vai ver de novo

o seu panorama, o mesmo panorama de sempre, e vai soltar um sus-

 piro de alivio; ou vai ver outro panorama, ou o anterior modificado,

e vai dar um grito de gloria!

Quem soltara aquele suspiro ou daii esse grito? VOCE! E este

quem €  o que mais importa. Quem diz o que vai escrito nas minhas

 paginas? Este quem e o que menos importa. VOCE e O QUE e dito

sao o que mais importa.

Eu? Importo mais tambem, porque 6   em mim que 6   dito. Um li

vro? Um caminhao que passa e levanta poeira? Nao. LENHA. Joguena SUA fogueira e deixe queimar. So.

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 11/411

PR1MEIRA PARTE

PRELUDIO

. . Glorifica-me, 6 Pai,. . . 

com a gloria que eu tive junto de ti, 

antes que houvesse mundo. ’ ’ 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 12/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 13/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 14/411

P o r q ue e r a no E sp i r it o d o E sp ago ,

que em toda pa r te esta .

E nenh um a p a rte p od e ex i s t ir

s e m q ue ne la e s t e j a o E sp i ri t oq ue de tud o o q ue no E sp ag o ex i s t e

a E s s e n c i a e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 15/411

Se ren o e ra ,

na bem -aven tu rang a da v ida

na V ida do E sp i 'r ito do E spag o .

E luzia na Luz que, do Espi ' r i to,

no E s p ag o po r t oda pa rte re sp l andece .

Po rque nenhu m a pa r te pode s e r ilum inada

se m que ne la re sp l ande ga do E sp i'r it o a Lu z

que de t udo o que no E sp ag o e x i s t e

a E s s e n c i a e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 16/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 17/411

Po rque e ra no E sp i r it o do E sp ago ,

que em toda parte esta.

E nenhuma par te e ve rdade i ra

se ne la nao v i b ra do E sp i r it o a Ve rdade

que de t udo o que no E sp ag o e x i s t e

a E s s e n c i a e.

N e m p o d e a l g u m a p a rt e s e r p o d e r o s a

s e m q u e d o E s p i r it o n o E s p a g o se ja

o Pode r que ne la s e m an i fe s te .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 18/411

Se re no e ra ,

n a b e m - a v e n t u r a n g a d o P od e r

da Ve rdad e do E s p i'r it o do E s pa go .

E s e u p od e r m a n i fe s t a v a ,no Poder do Esp i ' r i to

que por t odo o E s p ag o s eu Pode r exe rce .

P o r q u e e m n e n h u m a p a rt e

pode o Pode r da Ve rda de s e m an i fe s t a r ,

s e n e la n a o s e m a n i f e s ta a V e rd a d e

do P od er do Esp i 'r it o do Esp ago .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 19/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 20/411

Porque e ra no E sp i r i to do E spago ,

que em toda pa r te e s ta .

E em nenhum a pa rte pode have r am or

se m que ne la haja do E sp i r it o o Am or

que de t udo o que no E sp ag o e x i st e

a E s s e n c i a e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 21/411

Se ren o e ra ,na b e m - a v e n tu r a n g a d o s e u a m o r ,

que e o Am or do E sp i r i t o do E spago .

Po rque o Am o r do E sp ir it o ,

do seu Se r a Le i e ,

e i s que E i e E po r t odo o E spago ;

nao m a i s aqu i do que a li,

n e m m a i s a g o ra d o qu e a n t e s

ou m a i s de po i s do que ago ra ;

porque nao ha aqui e a l i- a q u i . . . so;

poque nao ha antes , agora , e depo i s

- a g o r a . . . so .

E a m a v a n o A m o r d o E s p i r it o d o E s p a g o ,

que po r t oda pa rte se u A m or m an i f e s ta .

P o q u e n e n h u m a p a rt e po d e a m a rse m que nela , do Esp i r ito ,

o Am or v i b r ando e s te ja .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 22/411

E i s q ue o E sp i'r it o no E sp ag o e s t r em eceu !

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 23/411

E ntre m a i s e m e n o s e s t re m e c e u e o s c ilo u .

E no Po de r de sua Ve rdade ,

s u a E s s e n c i a c on d e nso u .

G u i a d o po r s u a Lu z e n a Le i d o s e u A m o r.

E c o i s a s s e fez;

v a r ie g a d a s c o i s a s s e f ez.E o im p u l s o do s e u A m o r

a s c o i s a s q u e e le s e fe z d e s e n v o lv e u

e ne l a s s u a Lu z in fundiu .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 24/411

M a s , a i l . . .que a Luz ,

n a s c o is a s S O M B R A S P RO JE TO U !

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 25/411

E n t a o . . . H O M E M s e fez!

E m f o rm a e no m e ,

n a s S O M B R A S ,

que a Luz do E sp i r it o

n a s c o i sa s que E le se f i z e ra p roje tou.

M a s o i m p u l s o d o A m o r do E s p ir it o

na s s o m br a s s u t i l s audade i n s t i l o u ,da be m - aven t u r an ga da vida

n a V i d a d o E s p i r it o d o E s p a g o

que por toda par te es ta.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 26/411

E n t a o . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 27/411

SEGUNDA PARTE

INTERLUDIO

" . . . e conhecereis a verdade 

e a verdade vos libertara.”

' ‘Quem fala por s i mesmo 

 Estd procurando a sua prdpria gldria; 

 Mas o que procura a gloria de quem o enviou, 

esse 4 verdadeiro e nele nao ha injustiga.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 28/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 29/411

OS GAFANHOTOS E A LI£AO DA ESFINGE

0 E s p fr i to , q u e n o E s p ag o s o m b r a s s e fe z,

n e la s m e s m a s a p r t ip r ia L u z q u e a s p r o je t o u d e s p e r ta .N f is ? N o E s p ag o p a ir a m o s e n o E s p f r i t o t e s t e m u n h a s s o m o s

d e s s e m ^ g i c o d e s p e r ta r q u e n o d iS l o g o d a s s o m b r a s

c o m e g a a s e r e v e i a r . . .

“Oi! E i.. . que cara e essa? Qual e o grilo?”“Grilo? Isto ja e uma nuvem de gafanhotos, daqueles bem gran-

des!”

“Corta essa! Comida de gafanhoto 6   lavoura, e voce nao parecenem um pouquinho com uma alface, sabia? Que livro e esse? A Bt-

 blia?! E. . . ja vi tudo: esse livro ai tem um caso duma praga de ga

fanhotos; voce tinha que estar com a cabega cheia de grilos!”

“Nao fala assim. Este livro 6  s£rio.”

“Ta bom. S6rio. E isso ai. Ai e que esta o grilo. O grilo, nao; a

PRAGA DE GAFANHOTOS! A mania da seriedade. Nao entendo.

Ai esta voce: jovem, sadio, com tudo pra gozar a vida de cuca areja-da e sem grilos. Em vez disso, que €  que voce faz? Podia manter a

cabega pura, natural, feliz, como um jardim bonito e alegre, com flo-

res de todas as cores e formas. Mas nao. . . voce tem que se dar ao

trabalho de plantar uma coisa que 6   AQUELE PRATO pra gafa

nhoto! Depois diz: to grilado. S<5 pode! Quem foi o masoquista que

 plantou e depois soltou gafanhotos na plantagao? Quer saber o que

eu acho?”“Nem precisa dizer. Ja saquei.”

“E isso ai. Esse livro foi escrito sei la quando, por sei la quem,

 pra sei la quem. Nao foi escrito hoje, por gente como nos, pra gente

como nos. Por que a gente nao fica na nossa, no nosso tempo? Os

caras que escreveram isso ai estavam na deles, no tempo deles. E se

 pensavam que o mundo ia ficar como estava, deram o maior fora!”

“Hoje. . . gente como n<5s. . . Voce acha mesmo que hoje e diferente de ontem? E que gente como nos e diferente de gente como

eles? Digo, no fundo, essencialmente?”

“Ah! Sei Id! S6 sei 6  que vou pegar um bom jantar num restau-

rante animado. Sem grilo! E se o gargom me oferecer gafanhoto, fa

go ele engolir o cardapio! Ta? Tchau!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 30/411

“Ei. . . sabe com quem voce podia curtir af o teu belo prato de

gafanhotos? Com aquele “tio” de quem voce sempre fala. Como e o

nome dele? Um nome esquisito.. . ah!.. .  Ldgus. Mas ve se mantem

a nuvem na tua cabega e na dele; nao e justo voces soltarem uma

 praga de gafanhotos no mundo.

“Tchau!”

“Tchau.”

(E. . . por que nao? O Tio pode me ajudar. Alias, faz tempo que

nao converso com ele. Vou la.)

N 6 s ? D o E s p i r it o o l h o c t is m ic o q u e t u d o v e .

a s o m b r a m e s m a n o s a s s i m i l a m o s

e n e l a v a m o s a o e n c o n t r o d a o u t r a ,

q u e s o m b r a \i q u a s e n a o § m a i s . . .

“Oi, Tio.”

“Oi, Victor. Tudo bom?”

“Tudo bom, nada! To. . . (melhor nao falar em grilo). .. encuca-

do; quero dizer, tenho um problema.”

“Otimo.”

“Como. . . otimo?!”Ldgus sorri.

“Esquega. Qual e o seu problema?”

“Eu nao entendo a Bfolia. Vou lendo muito bem, sacando uma

ideia aqui, outra ali, mas de repente fica tudo escuro; nao enxergo

mais nada! O que leio, ora parece loucura, ora estupidez, ora primi-

tivismo, ora ingenuidade ou simploriedade, ora pieguice, ora careti-

ce, ora. . . sei la mais o que. Depois, algo parece ficar claro de novo

e . . . ”

“Sim?!”“Quer dizer. . . claro, propriamente, nao. Mas sinto que algo que

leio e muito importante, valioso, profundo. . . como se uma sabedo

ria maior estivesse ali. . . uma sabedoria mais profunda do que o co-

nhecimento cientifico; ali, oculta por tras de uma linguagem alegori-

ca, de uma esp6cie de codigo simbolico, esperando para ser decifra-

do. Sabe em que 6  que eu penso?”“NaEsfinge.”

“E! Como adivinhou?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 31/411

“Eu tambem penso nela. Ali; impassfvel, imperturbavel. No olhar

fixo e inescrutavel, a sugestao de infinidade. Na persistencia atraves

dos seculos, a sugestao de etemidade. Como a verdade, que ela pa-

rece conhecer e ocultar: infinite e etema.

“Sim. . . infinita e etema. Como pode a verdade ser finita? Se

comega em algum ponto, entao, que existe antes desse ponto? AI-

guma “nao-verdade”? Algo que nao 6  verdadeiro? Absurdo! Se nao

e verdadeiro, nao existe. Se termina em aigum ponto, entao, que

existe para alem desse ponto? Alguma “nao-verdade” ? Algo que

nao 6  verdadeiro? Absurdo! Se nao 6  verdadeiro, nao existe.

“Como pode a verdade ser temporal? Se teve comedo, entao, que

existia antes dela? Se tiver fim, entao, que existira depois dela?EXISTENCIA 6  a lei da verdade. O nada e urn absurdo.”

“Puxa! Com essa eu vou sentarl Como foi que voce pensou nis-

so?”

“Nao pensei. Issoyfr/ pensado. Se eu tivesse pensado..

Logus sorri e acrescenta: “Deixa pra la. Voltemos a Esfinge. E

entao assim que voce a sente?”

“Nao sei bem. . . So sei que sinto. E o que sinto me inquieta.Como um mist£rio, um enigma.”

“Sim, mas nao lhe parece que ao mesmo tempo que a Esfinge

oculta. . . revela? A mim parece que ela diz:

“Othabem, queest5aqui; sempreesteveaqui; sempreestarSaqui.Olha

bem. . . mas p3ra de olhar. Procura bem. . .mas p&ra deprocurar.Pensabem...masp&radepensar.

“Queresver? Entao, p£radeolhar; fixateusolhoseosmant^mdesfoca-dos domundo. Queres ver averdade olhando paraoque6 finito?Es tolo!

Quantomaisolhas,menosv§s;maiscegoficas.

“Queres encontrar? EntSo, p^ra de procurar; senta-te aqui comigo, que

estS aqui; sempre estevee sempre estarS aqui; nao precisas iraparteal

guma.

"Queres entender?Entao,pSradepensar.Quandoo conseguires,senti-

rSseentenderfis;naoterfispensado;terSsidopensadoemti.

“Vem.Senta-teaquicomigo, fixaosolhos, desfocados domundo,epSra

de procurar e pensar. Ficaaqui, agora; sempre. Deixa que seja visto,en-

contradoepensadoemti.".

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 32/411

“Nossa! Mas isso 6.  . .”“Nao qualifique. Isso €; so. Sinta; so. Se voce comegar a qualifi-

car, vai come^ar a dar grilo.”

“Por falar em grilo. . . e o meu problema? Eu nao entendo a Bf- blia. Mas quero entende-la. Um livro que se mantem como um “su-

 per-best-seller” durante seculos tem que ser muito importante. Mi-

lhdes de pessoas foram decisivamente influenciadas por esse livro.

A ponto de terem vivido em fungao dele. Serf que toda essa gente

entendeu a Bfblia?“Eu sou inteligente. Mod6stia h  parte, sei que sou. Mas nao en

tendo a Biblia. Vejo pessoas evidentemente menos inteligentes e

cultas do que eu falando da Biblia; em pulpitos e pragas publicas;

 pautando sua vida na Biblia e tentando convencer os outros a faze-

rem o mesmo. Sera que estao entendendo? Muitas sao menos inteli

gentes e cultas do que eu; mas falam da Biblia com entusiasmo econvicsao. Sera que estao entendendo? E eu? Por que nao entendo?

Por isso penso na Esfinge. Enigmatica. Voce acha que todo mundo

 pode aprender a ligao da Esfinge, de que voce falou ha pouco?

“Voce chegou e disse: Eu nao entendo a Biblia. E penso na Esfinge: misterio; enigma. Agora voce pergunta: Todo mundo pode

aprender a ligao da Esfinge?”

“E . . . tem razao. Mas. .“Ja que estamos falando da Biblia, talvez Jesus tenha respondido

sua pergunta. Consta que ele disse:. .ao que tem se Ute dard, e tera em abundancici; 

mas ao que nao tem, a ti o que tem Ihe serd tirado.“Ai €   que esta! Ao que jd tem  se dara - parece injusto. Ao que

nao tem se tirara o que tem -  como e possivel? Eu. .“E consta que Jesus muitas vezes acrescentava: Quern tem ouvi- 

dos, ouga“Ah. . . sem essa, Tio! Voce quer ou nao quer me ajudar a procu

rer a solugao do meu problema?”“Ajudar? Quero. A procurer a solugao do seu problema? Nao.”

“Ih. . . Voce quer me ajudar. Tudo bem. Mas nao a procurer a

solu^ao do meu problema? Mas se o meu problema €   encontrar a

solu§ao do meu problema? Quero dizer. .. ih!. . .“Escute. Pare de falar e escute. Pare de pensar e escute. Quer ser 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 33/411

ajudado? Quer aprender? Entao escute. Nao fale; so escute. Nao

 pense; so escute.

“Sabe por que as pessoas nao aprendem? Porque nao escutam.

Porque nao param de falar nem de pensar. Estou falando; mas voce

nao est£ escutando.”

“Como? Essa nao! E claro que eu estou escutando!”

“Nao esta; e acaba de provar que nao esta. Se estivesse, nao teria

discordado; nem teria interrompido.”

“Entao eu tenho de concordar? Mas isso..

“Esta vendo? Outra vez! Quando 6  que voce vai se decidir a es-

cutar? Estou falando; mas voce nao esta escutando. Estou pensando

e tentando transmitir meu pensamento a voce nas palavras que voufalando. Voce ouve as palavras; nelas recebe o meu pensamento.

Mas, ao mesmo tempo, esta falando por dentro e ouvindo suas pro-

 prias palavras; esta pensando e falando (por dentro). Quando o que

eu digo combina com o que voce esta dizendo ai dentro, tudo bem.

Do contrario, voce discorda ou fica confuso. Quando e que voce vai

se decidir a escutar?”

O jovem murcha.

“Pois bem. ESCUTE, entao. Qual 6  o seu problema?,.

“Olhe ai! Ta vendo? E voce quer que eu escute! Mas s<5 diz in-

coerencias!. . . Desculpe. Nao quis ser grosseiro. E que voce sabe

qual e o meu problema, mas pergunta: qual 4 o seu problema? Issoirrita!”

“Esti bem. Nao o quero initado. Se voce se irritar, ai e que nao

vai poder escutar. Ouga, entao; mas, enquanto ouve, tente escutar.

 Nao se preocupe em concordar, nem em discordar. Nao reaja a suasconcordancias, nem a suas discordancias; simplesmente, deixe-as

 passar. Quando sentir uma concordancia, concentre-se nas minhas

 palavras e deixe a concordancia passar. Fa§a o mesmo quando sentir

uma discordancia. Se fizer assim, talvez consiga ouvir minhas pala

vras com a sua mente em silencio. Talvez consiga escutar. Se escu

tar, talvez ocorra transforma§ao; talvez ocorra aprendizagem. Na

medida em que tiver, recebera. Depois, fa§a o que quiser, conforme

a sua consciencia - ou sua natureza, sua personalidade, como queirachamar.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 34/411

“Nao quero transforma-lo. Mas e preciso que haja transforma-

qao.”

“L£ vem ele com incoerencias” —pensa o jovem. E depois: “E ca

estou eu discordando, ou me confundindo. O Tio tem razao; vou me

concentrar nas palavras dele” . E em voz alta:“Tio, recomece esse argumento ai da transformagao, que eu ouvi

mas nao estava escutando." 

L6gus sorri, faz uma ligeira pausa, e recomega:

“Nao quero transforma-lo. Mas e preciso que haja transformagao.

Veja: Voce tem um problema. Onde esta o seu. problema? No seu

 bolso? Pendurado ao seu pescogo? Colado a alguma parte do seu

corpo? Inserido em alguma parte do seu corpo? Em algum lugar do

mundo ao seu redor?

“O problema esta na sua mente. E voce 6  a mente que usa o cor

 po. O problema esta em voce. Mais: o problema  E  voce. Enquanto

voce for como e - uma mente com um problema - existira o proble

ma; na mente, que e voce. Quando a solugao tiver oconido, tera ha-

vido modificagao; na mente, que e voce. O problema nao mais exis

tira. Voce sera uma mente sem aquele problema. Tera havido uma

transformagao. Mas eu nao quero transformd-lo. Porque nao possotransforma-lo: nao e possivel. Posso me  transformar e ajuda-lo a  se 

transformar; mas nao posso transforma-lo.

“Por isso lhe disse: depois, faga o que quiser, conforme a sua

consciencia. Se houver concordancia, tudo bem; aceite. Se houver

discordancia, tudo bem; rejeite. Sobretudo, nao se preocupe e seja

voce mesmo. Lembre-se sempre: nao quero transforma-lo; nao posso

transforma-lo; nao tenho sequer a intengao de convence-lo. Voce

 perguntou; quero responder; escute. Voce pediu; quero dar; receba.“Escute e receba. So. Quanto ao resto, deixe acontecer. Isto

mesmo. Deixe que acontega. Se acontecer concordancia, entao tera

havido transformagao. Tudo bem. Prossiga com a sua vida e seja vo

ce mesmo, transformado; um novo voce, mas VOCE. Se acontecer

discordancia, entao nao tera havido transformagao. Tudo bem. Pros

siga com a sua vidae seja voce mesmo; como voce e agora: VOCE.”

“Essa e uma boa. Quero dizer, voce respeitar meu direito de ser

eu mesmo; voce nao pretender me convencer, persuadir, ou conver

ter. Mas, posso lhe fazer uma pergunta?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 35/411

“Claro.”

“Bem, como podera haver concordancia’ ou discordancia, se eu

estiver so escutando,  como voce pediu? Isto 6,  se eu nao estiver

alerta, participando criticamente do dialogo? Tambem nao entendo

 por que concordancia implica transformagao; penso mais em termos

de encontro, coincidencia de pensamento, de opinioes.”

“Nao pretendia entrar em detalhes a este respeito; nao pretendia

explicar. Porque e extremamente dificil; talvez impossivel. E como

tentar defmir o indefinivel; explicar o inexplicavel. Qualquer coisa

que eu diga, por mais inteligente e ldgica, sera metafora, analogia,

ou recurso didatico. So. Nao sera “a propria coisa” , a verdade, nun-

ca.“Um homem ama e vai contar o que foi o seu amor a um outro,

que nunca amou. Ocorre amor nesse outro? Nao. Eie fica mais ou

menos informado sobre o amor, conforme o discemimento, a inteli-

gencia, o talento e a eloqiiencia do primeiro. Podera depois dizen

“agora eu conhego o amor, ja me explicaram o que e”. Equivoco. Nao

conhece. Esta informado sobre o amor; talvez mesmo incentivado ou

motivado a amar e preparado para reconhecer. Isto e o maxiino - ex-

ceto talvez. . . mas nao vem ao caso agora. Ele esta informado; so.

 Nao conhece. Conhecera quando vivenciar, experienciar, sentir di-

retamente. Por isso e mais importante sentir do que pensar com pa-

lavras.”

Victor ']&.  nao interrompe. Assim, Logus pode relaxar, abstrair-se,

e deixar fluir o pensamento. Pode deixar que seja pensado nele e

atraves dele expresso. Espontaneamente; sem esforgo; sem dire^ao

consciente do processo de pensar. Nao pensa; €   pensado nele. Naoexpressa; €  expressado atraves dele.

“Todos deveriamos aprender a pensar sem palavras. Melhor: a

 pensar, nao pensando. Porque nesse pensar sem palavras, que €  nao

 pensar, e que pode ocorrer sentimento direto, pensamento puro, que

€  primeiro, intrinsecamente independente da palavra. E no sentimento

direto, no pensamento puro, sem palavras, 6  que se conhece. O resto

nao e conhecimento, ainda que receba este nome. E informa^ao. So.

 Na Biblia, por exemplo, no Novo Testamento, consta que as multi

does sentiam essa diferenga quando comparavam Jesus com os es-cribas:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 36/411

‘'Quando Jesus acabou de proferir estas palavras, 

estavam as multidoes maravilhadas da sua doutrina;

 Porque ele as ensinava como quem tem autoridade, 

e nao como os escribas.

“Neste mundo, muitos sao os escribas e raros os que tem autoridade. Muitos sao os que falam sobre as coisas, mas nao as conhe-

cem. Muitos os que falam sobre a verdade, mas nao a conhecem.

Quando sao inteligentes, cultos e talentosos, impressionam. Ainda

mais quando sao importantes na sociedade; como tantos eruditos:

cheios de diplomas e glorias academicas. Estes impressionam, por

que parecem conhecer; mas nao conhecem, e os que se impressio

nam erram com eles.“Por isso 6  importante nos empenharmos em nos tomarmos auto-

ridades. Quem nao 6   autoridade, nao sabe; porque nao conhece.

Quem conhece, sabe; e 6  autoridade.

“Assim, e importante aprendermos a pensar sem palavras; a pen-

sar, nao pensando; a deixar que seja pensado em n6s. Por quem?

Pelo Esprrito do Espago —ou o Pai, ou Deus, ou a Consciencia

C<5smica, ou o Ser, ou o que quer que voce prefira. Nomes? Nao re-

velam nem afetam a verdade. O importante 6 escutar.  “Quem” fala?Esta pergunta nunca sera respondida. Porque aquele que escutar,

conhecera, e nao mais fara a pergunta; saberd, porque conhecera; so.

Quando alguem pergunta, esta buscando. Mas nao encontra, porque

esta buscando; porque esta pensando e nao escuta. Quando alguem

responde, fala um escriba. Nao sabe, mas pensa que sabe. Nao co

nhece, mas pensa que conhece. E os que se impressionam erram com

ele.”

L<5gus solta um suspiro, faz uma pausa e recomesa:“ Voce quer que eu explique. Pois bem; vou lhe dizer umas tantas

coisas. Verdadeiras? Nao importa. Se voce pensar nisso, a decisao a

este respeito sera sua, e podera ser erronea. A verdade nunca estar£

no queeu lhe diga; nenvno que lhe diga quem quer que seja. Mas,

se minhas palavras o induzirem a escutar, entao, terao cumprido uma

importante e util fungao. Terao sido um caminho, e isso €  o maximo

que palavras podem ser: caminho.  Vamos, entao, a essa explicagao.

“Nosso di£logo’6 como um jogo de tres participantes: a verdade,voce* e eu; o Espjrito do Espago (o Pai, Deus, a Mente Universal, a

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 37/411

Consciencia Cosmica, o Ser, como voce preferir), sua mente, e a

minha mente. Se quiser, pense numa Fonte ou Estagao C6smica, ir-

radiando a verdade (ou na verdade como uma essencia difusa por

todo o cosmo). Pense em radiagoes eletromagneticas, se precisar dealgo que lhe seja mais compreensivel. Entao, voce 6  um receptor de

ondas eletromagneticas; um radio. Mas e um radio especial, porque

 pode produzir sua propria radiagao, arbitrariamente; e pode mesmo

emiti-la. Mais ainda: voce 6  um radio vivo! E vive conforme a radia

gao que em voce predomina: a sua, a de outros radios vivos, ou a da

Fonte Cosmica.

“Agora, voce esta entre a Fonte Cosmica e eu. Sua mente, por as-

sim dizer, esta entre a Mente Universal e a minha mente. Voce esti

entre a verdade e eu. Voce e um receptor com duas antenas: uma,

 para as radiagoes cosmicas; a outra, para as minhas radiagoes. Voce

esti no meio, entre estes dois tipos de radiagoes. E pode interferir,

se quiser (ou mesmo sem querer; alids, 6  muito dificil nao interferir).

“ Voce poderia sintonizar-se com a Fonte Cosmica. Isso acontece

mesmo, naturalmente, quando voce se abstrai do mundo e de si pro-

 prio. Ja ouviu falar em meditagao? E isso. Meditagao 6 abstragao. Meditar 6   abstrair-se do mundo e de si mesmo. Quando isso aconte

ce, voce entra em sintonia com a Fonte C6smica; naturalmente, au-

tomaticamente; necessariamente. Entao, a radiagao cdsmica se mani-

festa em voce. Entenda bem: voce se toma a radiagao cdsmica; ela 6  

em voce, e voce nela; voce e ela tomam-se um; nao dois, nem dois

em um; um so. Entao voce conhece; e sabe, porque conhece.

“Mas voce nao sabe sintonizar-se. Entao, vem a mim. Qual 6   a

sua expectativa? Que eu conhega; que eu saiba; que eu esteja sinto-

nizado com a Fonte Cosmica. Portanto, admita que eu conhega; que

eu saiba; que esteja sintonizado. Que pode entao acontecer de me-

lhor? Eu estou sintonizado. Eu recebo. A radiagao cosmica se mani-

festa em mim e nao interfiro. Ela mesma aciona meus circuitos e se

irradia para voce: eu falo. Estou sintonizado e deixo passar; nao in

terfiro. A radiagao c6smica se manifesta em mim. Eu penso? Nao; €  

 pensado em mim! E 6   a verdade, porque eu nao estou. Nao estou;entao, ela esta. A radiagao cosmica passa por mim e se dirige para

voce. Eu falo? Nao; 6   falado atraves de mim! E 6  a verdade, porque

eu nao estou. Nao estou; entao, ela esta.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 38/411

“A radiagao cosmica passou por mim e, agora, entra em voce.

Que pode acontecer de melhor? Voce escuta. Nao interfere. A radia-

9§o cosmica aciona os seus circuitos e voce e sintonizado. Preciso

dizer o resto? Voce sente; conhece; toma-se. VOCE sabe! Porque

tomou-se. VOCE e autoridade! Nenhum escriba podera sequerfaze-

lo hesitar. Voce SABE!

“Que pode acontecer de pior? Isso voce j£ pode construir por si

mesmo. Pergunte-se: e se eu nao escutar? Se estiver irradiando de

mim mesmo? E se eu escutar mas o Tio nao estiver de fato sintoni-

zado? Se ele nao conhecer? Se ele realmente nao souber?

“Que e que voce quer ser? Escriba ou autoridade? Se quer ser

autoridade, entao aprenda a nao pensar, a deixar que seja pensado

em voce. E nao fale, ate que sinta que esteja sendo falado atraves de

voce; se voce falar, ser£ um escriba.

“Pensa que e so? Tem mais; infinitamente mais! Por exemplo,

nao deixe passar despercebido o fato de que a verdade estara onde

voce nao estiver. Voce tera de tomar-se a verdade, ou nao a conhe-

cera. As autoridades poderao informa-lo acerca da verdade; mas vo

ce s<5 a conhecer^ quando fo r  a verdade!

“F£cil? Nao. Por isso a Esfinge la esta ha tanto tempo; ensinandoa ligao que pouquissimos aprenderam. Voce quer aprender? Entao,

fa$a como a Esfinge, ou nao aprender^.”

Logus faz uma longa pausa. Parece que nao vai mais falar. Victor

diz entao:

“E. . . vim aqui pra resolver um problema. Agora, ele nem me pa

rece tao importante. O grilo sumiu. A nuvem de gafanhotos se foi.

Deixou tudo arrasado; nao sobrou nem uma folhinha. . . mas ela se

foi!”“Otimo. Arrasaram tudo e foram embora? Otimo! Nao se preocu-

 pe com seus grilos e gafanhotos. Deixe que comam! Fique s<5 obser-

vando; como um espectador. Concentre-se na ligao da Esfinge e fi

que s6 observando; como um espectador. Quando eles se forem e✓ /

voce vir tudo arrasado, nao lamente. Otimo. Voce ficou vazio? Oti

mo! E nao plante mais! Concentre-se na ligao da Esfinge e fique so

observando; como um espectador.

Lembre-se: abstraia-se e deixe que seja pensado em voce. Aos

 poucos, suas valiosas e queridas plantagoes irao deixando de ser va-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 39/411

liosas e queridas. Voce ira plantando cada vez menos. Os gafanho-

tos virao mas terao de ir embora insatisfeitos. Voce ira plantando

cada vez menos e eles irao ficando cada vez mais insatisfeitos. Ate

nao haver mais planta§ao nem gafanhotos. Mas. . . sabe? Voce ira plantando cada vez menos e Colhendo cada vez mais! PENSE nis-

so!”

Victor, de si para si mesmo: “ Bonito. t . antes era pra nao pensar;

agora e pra pensar” . . . E a voz de L6gus o poe novamente “na es-

cuta” :

“O caso, aqui, e o seguinte: O que voce tiver lhe sera tirado. E,.

se voce'nao tiver outra coisa, que nao seja.comida de gafanhoto,

entao, que lhe restart? Mas, se voce tiver uma outra coisa, que naoseja-comida de gafanhoto. . . por exemplo, uma sementinha magica,

que produza uma planta que gafanhoto nem veja, entao, essa semen

tinha podera germinar e crescer em voce. Em voce? Nao. VOCE

estard crescendo nela! Voce terd e lhe sera dado; e tera em abundan-

cia.

“E isso mesmo. Quanto menos voce for plantando, mais ir£ co

lhendo; da m&gica sementinha, que gafanhoto nao come. Voce mesmo estara germinando, crescendo, florescendo, frutificando, morren-

do, germinando de novo.. . Sabe? No C£u nao tem gafanhoto!”

O jovem nao diz mais nada. Consulta o reldgio, levanta-se e se

despede. Mais tarde, em seu apartamento, chega o amigo:

“Ih! Voce parece uma esfinge! Boa noite.”Victor nem responde. Continua ali, impassive], imperturbavel, os

olhos fixos e desfocados do mundo; o olhar inescrutavel, mas, a jul-

gar pelo sorriso cristalizado em seus labios, muito feliz.Longe dali, em sua casa, Logus pensa nele. Abstrai-se por um

instante e exclama depois:

“Abengoados gafanhotos! Porque tudo comem, acabam ensinando

a li§ao da Esfinge! ”

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 40/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 41/411

O APRENDIZ DE FEITICEIRO

E

O JOG O DOS ESPELHOS

Dias depois, Victor volta a conversar com L<5gus, ou o Tio, comoele chama.

D o E s p f r i t o o u v i d o c 6 s m i c o q u e t u d o o u v e ,

e & s o m b r a a s s i m i l a d o s ,

n e la e s t a m o s n 6 s p re s e n t e s e o u v i m o s . . .

"Oi, Tio!”

“Oi. Tudo bom?”

“Tudo bom.”“Algum grilo?”

“Grilo, propriamente, nao. Mas queria que voce me ajudasse nu-

ma coisa.”

“Pois nao.”

“Sabe? Na ultima vez que eu vim aqui, voc£ me ensinou uma coi

sa muito boa. Varias vezes a minha antena funcionou e eu senti que

era pensado em mim. Mas. . . voce sabe. . . eu ainda estou apren-

dendo e interfiro muito. Por isso quero que voce me ajude. Da outravez, tive a impressao de que voce podia me dar umas dicas assim .. .

 praticas, pra essa questao de resolver problemas. Voce quer fazer is

so?”

“E. . . todo mundo quer dicas pr£ticas, mecanismos. Aplicou?*

Resolveu. E muito dificil as pessoas entenderem que nao i   isso que

devem buscar. Estao sempre com o dedo apontando para fora de si

mesmas. Nao percebem que sua vida nao deve ser um jogo de meca

nismos exteriores, impessoais, para a resolugao de problemas. Sen-tem que sua vida deveria mudar, porque os problemas. estao sempre

acontecendo. Mas continuam procurando mecanismos especrficos e

extemos.

“Aplicou? Resolveu. As pessoas nao percebem que o dedo deve

dar um giro de cento e oitenta graus e apontar para elas mesmas. Se

for§arem esse giro, e persistirem, acabarao descobrindo que, todo

o tempo, ali estava, NELAS MESMAS, uma perene fonte criadora

de mecanismos.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 42/411

“Entao, sua vida realmente mudara. Acontecera um problema (ou

sera por elas criado, consciente ou inconscientemente). Elas recorre-

rao a fonte, nelas mesmas, e esta criara o mecanismo necessario. O

 problema sera resolvido; ou havera ajuste; ou transcendencia. A

fonte criara o mecanismo necessario e as pessoas modificarao oueliminarao certo estado de coisas; ou se ajustarao a ele; ou o trans-

cenderao. De qualquer forma, elas permanecerao por tr£s; incolu-

mes; felizes.”

“Mas Tio, nao era a isso que eu me referia. Quero dizer, nao a

esse tipo de problema. Eu..

“Eu sei. Mas veio. . . e eu deixei passar. Hoje, estou com a tor-

neira aberta e nao quero represar; vou deixar fluir. Afinal, que sabevoce de suas necessidades? Voce nao sabe. Eu nao sei. Por isso dei-xo fluir. Escute. Lembra-se? ESCUTE.”

Ap6s uma pausa que o jovem nao ousa perturbar, Logus continua:

“Voce nao esta interessado, propriamente, nos problemas da vida.

So quer aprender a resolver problemas. Qual e a diferen§a? Alguma

coisa em que voce pense estara fora da vida? Tudo esta na vida, e a

vida esta em voce. A vida e o seu pensamento. Voce tem conscien-

cia de alguma coisa? Af esta a vida.  A t   esta voce. E tudo esta ai!

 Nao procure fora, porque esta tudo af.

“Voce quer um mecanismo? Eu lhe dou. E amanha? Outro meca

nismo? Eu lhe dou. E depois? Isso nunca vai acabar! Ja lhe indiquei

o caminho da fonte; nao posso fazer mais do que isso. Va, e beba.”'

Logus olha para o jovem e nele percebe um ar de frustra^ao. Sorri

e continua:

“ Umhomemprecisavaabrirumaporta,masnaotinhaachave.Depoisde

muitotrabalho,encontrouumoutroquetinhaachave.Pediuachave;ooutro

deu. Passadoalgumtempo,precisouabriroutraporta,masn§otinhaacha

ve. Depoisdemuitotrabalho,encontrouumoutroquetinhaachave.Pediua

chave: o outro deu. E isso se repetiu outra vez, eoutra vez e outra vez;

muitasvezes. Umdiaelecansoudeandark procuradepessoasquetives-

semcertaschaves. “Vouprocuraralgu6mquetenhaumachave-de-ladrao",

pensou. E assim fez. Depois demuito trabalho, encontrou.Pediu achave-de-ladrao.Ohomemdeu.

“ Nossoamigo ficoumuitofeliz,porquepensou:“ Nuncamaisvouprecisar

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 43/411

sair procurando algudm que me de uma chave. Agora tenho umachave-

de-ladr§o;possoabrirqualquerporta”.

“ Defato,assimfoicomaprimeiraporta.Deuumpoucodetrabalho,levou

algumtempo,maseleconseguiu.E ficoutodoanimado. E abriumuitaspor-

tas. Com mais ou menos trabalho,maiorou menordificuldade, mas abriu.

Semprequeprecisavaabrirumaporta,usavasuachave-de-!adr§o.

“Um dia, nao houve jeito. Ele tentou, tentou. . . mas nao houve jeito. A

princfpio, estava calmo; pddeusaraomSximosua inteligSnciae suahabili-

dade. Depois, impacientou-se, ficou nervoso, irritou-se. Respirou fundo,

tentando se controlar. Mas naoadiantou. Autocontengao nao6calma.Nao

estava calmoenaopddeusareficientementesua intelig&nciaesuahabilida-

de.Nemdescobriu como funcionava aquela fechadura. Nao houve jeito.A

fechaduranaocedeueelen§oconseguiuabriraporta."Vouprocurardenovoaquelehomem",pensou;“achavequeelemedeunao6umachave-de-

ladrSo”.Efoi.Eencontrouohomem.

“Sabeaquelachave queo senhormedeu?Nao§umachave-de-ladr§o.

Naoabretodasasportas.Osenhornaotemoutra?”

“Deixeverachave.”

Examinou,examinou...Porfim,disse:

"Essa6umachave-de-ladr5o.T3oboaquantoqualqueroutra.Abretodas

asportas.”“Nao podeser! Houveumaqueeianaoabriu.Tenteiat6cansar,masela

naoabriu.”

“Leve-meaessaporta.”

Eeles foram.Quandochegaram\&,ohomemquederaachave-de-ladr§o

ao outro meteu-a na fechadura. Tr§s leves e precisos movimentos e. . .

pronto)Afechaduracedeueeleabriuaporta.

“Viu?Eumachave-de-ladrao.Abrequalquerporta.”

‘ Incrfvel!Porqueeunaoconsegui?"“J5 lhedisse:6 umachave-de-ladrao. H3a chaveehSoladrao.N§oso-

menteachave;nemsomenteoladrao.HSachaveeoladrao.Eumachave-

de-ladr§o.Semo ladrSo,a chave n§oabreportaalguma.Semachave,ola

draonaoabrequalquerporta.Lembre-se:6uma chave-de-ladrao ."

Ldgus para de falar. Victor pensa um pouco e diz:

“E. . . eu sou um tolo, nao e?”

“Tolo? Porque nao sabe e est£ procurando aprender? Porque naotem e est£ procurando adquirir? Porque nao encontrou e esta bus

cando? Nao; voce nao 6   um tolo. Se pensasse: EU sei, EU tenho,

EU encontrei, entao voce seria um tolo. E o mundo esta cheio de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 44/411

tolos. Porque pensam: NOS sabemos, NOS temos, NOS encontra-

mos. Na verdade nao tem; e at6  o que tenham Ihes sera tirado. Lem-

 bra-se? Voce ainda nao tem; mas vai ter, porque est£ procurando

adquirir. E, quando tiver, mais lhe sera dado e tera em abundancia.

Lembra-se?”“Lembro, sim. Mas que devo fazer enquanto nao tenho? Que pos-

so fazer para adquirir mais depressa?”

Logus sorri, o olhar distante; balanga a cabega, como a confirmar

uma recordagao e abre a tomeira:

“Sabe? Certa vez eu me fiz estas mesmas perguntas. Provavel-

mente com outras palavras, mas a essencia era a mesma. Vivia entaouma fase como esta que voce esta atravessando. Sentia, intimamente,

que a realidade da vida era diferente do que me propunham em casa,na escola e na sociedade em geral. Talvez alguns detalhes lhe sejam

uteis. Vou tentar.”Pensa o jovem, aproveitando a pausa: “Puxa! O Tio hoje esta

mesmo tagarela. Paciencia. E como ele disse: talvez me seja util.

Afinal, que sei eu das minhas necessidades? Eu nao sei. Ele nao sa

 be. Por isso 6  melhor que ele deixe fluir. E. . . vai ver que ele esta

certo.”

Ldgus recomega:

“Freqiientemente eu sentia que nao era. . . pelo menos APE-

 NAS. . . aquele eu de que estava mais comumente consciente. Pare-

cia-me que eu era - note bem: nao que havia em mim, mas, que eu

ERA - um outro Eu; um Eu Maior e Mais Profundo! Sentia-o nos

momentos de crise, quando o eu menor era ameagado ou superado

 pelas circunstancias; e tamb£m nos instantes de grande tranquilida-

de, quando me abstraia. Como sentia esse Eu Maior? Sutil, sabio,imperturbavel, inatingivel, poderoso, compassivo, imortal! Quando

eu era nele, nunca tinha a menor sensagao de duvida, de perplexida-

de ou ignorancia, de inquietagao, de fraqueza, de egoismo, de 6dio,

de medo. . . enfim, sentia-me, eu mesmo, nele, verdadeira e absolu-

tamente IMORTAL! Sdbio e inatingivel; portanto, sereno.

“Quando voltava a ser no eu menor, era como se tivesse ouvido

uma sutil Voz do Espa$o. E ela parecia ter dito:

“ t  diferente.Arealidadedavida6diferente;decertomodo,ocontr&riodo

queteensinamemtuacasa,naescolaenasociedadeemgeral.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 45/411

“V£s? Es imortal! Por que te assustas? Por que temes?Que te pode

acometer? Es imortal, AGORA! Nao6que$er£s  imortal ap<5samorte.Es

imortal,AGORA! Esta6a tuaverdade;averdadedoteuser.Naoaverdade

do teu pensamento, do teu eu menor. Mesmoque penses o contrdrio, 6s

imortal,AGORA!

"Porque te preocupas tanto comatua ignor&nciaquanto&humanasa-

bedoria? Pergunta-te: 6mesmo sabedoria? Que sabedoria6essa quenao

produzfelicidade?

“ Umhomemvematiediz:sousSbio.Observa-o.Pergunta-te:6felizes

sehomem?Naoperguntesaele,pois,certamentedirS:claro!soumuitofeliz!

Perguntaatimesmoeobserva.H5ansiedadenessehomem?Entaoelenao

6 feliz. H&medo nesse homem? Entaoele nao § feliz. H5 neurose nesse

homem? Entao ele nao 6 feliz. H3 egofsmo, vaidade,6dio, rancor,tristeza,

nesse homem? Ent§oelenao6feliz. H6qualqueresp6ciedeapegonesse

homem?Ent§oelenao6feliz.

“Pergunta-te: que sabedoria6essa que produz infelicidade?Observao

homemquetediz:sousSbio.V§comoelevive,emseusmomentosdeag§o

erea?aorefiexas, eacabarfisdescobrindoseele6defatosSbio,ounao.

“ Porque teangustiascomoteudesajusteem relag§oh mentalidadeou

filosofiadatua famOia,daescolaedasociedade?Sabesdeondevemesse

desajuste?Soueu emti! Estousempreemtie,quandomeescutas,quando

teabstraisdomundoedetimesmoemeescutas,digo-tesempre:£ DIFE-

RENTE! Sabes oqueeu sou? Um disco viciado. Poes odiscoeouves:6

diferente. . .&  diferente. . . 6diferente. . . Queres sabercomo £diferente?

PoeodiscoedSumtoquenaagulha. DocontrSrio,ouvir&ssempreames-

ma coisa e ficarSs neur6tico. Se naoderesesse toque na agulha, ficarfis

neurdtico; angustiado com o teu desajuste. Desajustado, sofrerds e fards

sofrer. Por um lado, ficarSs preocupado por seres desajustado; edeseja-

r£s te ajustar. Poroutro lado,ouvir5saminhavoz: 6diferente.. . 6diferen

te...

“Quesentes naminhavoz?Quesentesquandoaouvestu?Eusei:con-

vic?ao,certeza.Ejubilo!Ent§oCONFIA! 1=diferente!Pronto!AdmitelAceita!

"Es desajustado?Naote lamentes por isso; naotepreocupescomisso.

Esdesajustado.Pronto!Admite!Aceita!

“A realidade da vida6diferentedo queos homens seesforgam parate

ensinar. Sentes isso em teuSmagoe por isso §sdesajustado. Admitiste?Aceitaste?Entaodesteotoquenaagulhaej£ouvirdsorestododisco.

“Convence-tedequeSdiferente e passaaviver, intimamente,nissoque

6 diferente.Masnaofa?asnenhumesforgoparaagirdemododiferente.Seo

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 46/411

fizeres, nisso serds tumesmo e cometerds muitos erros; sofrerAs e far£s

sofrer. Continua desajustado; aceita isso; naote tortures,naote recrimines

porisso.Masagecomoumajustado.Comooshomensesperamquesejas:

um ajustado.Erras?Seerrascomoumajustado,oshomensteperdoamete

acolhem. Porque 6s igual. Mas, se te poes diante deles como umespelho

crfticoedizes,SOU DIFERENTE, issoeles n§oteperdoam! Notabem: co

moumESPELHOcrftico!

“E se os homens nao te perdoarem e reagirem contrati,comovais su-

portar? Tens a sabedoria necess£ria? Tens o poder necesscirio? Tens a

compaix§o necess&ria? ts  imortal?Nao. N§otens anecessSriasabedoria,

e vais tomardecisoes erradas. N&o tens o necessSriopoder,evaissentir

medo. N§otensanecess£riacompaixSo,evais ferir.Nao6s imortalevais.

termedodemorrer;e,pormedodemorrer,vaisagircomegofsmoeviolSn-

cia.DetudoissotearrependerSsenovamenteestar&sangustiado.“Por issotedigo: £sdesajustado?Aceita.Masagecomoumajustado.£

diferentea realidadedavida?Aceita.Masnaotentesimporessadiferenga&

tua realidadee,muitomenos,&realidadedosteussemelhantes.Aceita!Nao

terecrimines;n§otetortures;naoteangustiesporteus“pecados\Sabeque§sdivinonosteus “pecados"!Algumacoisa nao6divina?Naoforceshada.Cada vez mais, procura seremmim. Porque, quanto mais fores em mim,

mais sereieu emti.Esemprequeeu foremti,naoserds tuquepensarfis,decidir£s eagir5s. Porque tu naoestards. EUestarei;etunaoestarSs.Per-

cebesisso?EUestarei;etunaoestarSs.“Equandoos homensnaomeperdoareme reagil'ejricontramim,euvou

suportar.EUposso!EUtenhoanecessciriasabedoria!EUtenhoonecess£-

rio poder! EU tenhoanecessSria compaixao! EU sou imortal! EU,vou su

portar! Sempre! EnuncahaverSerro.Mesmoquandopare?aterhavidoerro.

Como possoerrar?Naopossoerrar.€. impossfvel! Meuserros s<5existir§o

no julgamento errdneo doshomens.Eles terSoerrado;masdirSo:aquele \& errou.

“E nunca ferirei a ningu6m. Mesmo quando aJgu6m saia ferido. Como

possoferir?N§opossoferir. E impossfvel!Minhaviolencias6 existirSnojulgamento errdneo dos homens.Eles  terao ferido asimesmos; mas dir§o:

aquele14nosferiu.

• “E nunca sofrerei. Mesmo quando parega que eu tenha sofrido. Como

possosofrer?N3opossosofrer.£impossfvel!Meusofrimentosdexistiri Ino

 julgamentoerrfineo dos homens.Eles teraosofrido;masdirSo:aqueleISso-

freu.

“Porisso \& tedisseerepito:Cadavezmais,procuraseremmim.£s6o

que tens a fazer. Bastaque teabstraias domundoede timesmo, e sejas

em mim.S6. Foradisso,mant6m-tecalmo,aprender espera, NOMUNDO

MESMO,bemvivonomundo!”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 47/411

Um tom meio desanimado na voz, Victor interrompe:

“Mas Tio. . . tudo isso €   bonito. Nao sei se entendi tudo. . . tal

vez nao.. . mas senti que era bonito; bonito e muito importante. Nao

sei se o que senti vinha de voce ou estava nas suas palavras; mas

senti que era valioso e verdadeiro.

“Mas ai nesse finzinho voce disse: MANTEM-TE CALMO,

APRENDE, E ESPERA! O grilo e que nao e facil a gente SE

MANTER CALMO; nao 6   facil a gente APRENDER (sd decidir o

que aprender. . .); e nao 6  nada facil a gente ESPERAR (da uma im-

 paciencia!. . .). Entao eu pergunto. Como e que eu vou me manter

calmo? Como e o que aprender? Como e o que esperar?

“Voce mesmo! Voce se mantem sempre calmo? Voce sempre sa be como e o que aprender? Voce consegue sempre esperar com pa

ciencia? Puxa vida! Acho que o cara que consegue tudo isso ai 6  um

deus!”

Logus, fingindo bronquear:

“Como 6?  Voce quer escutar, ou prefere ficar dialogando e dis-

cutindo consigo mesmo?”

“ U£.. . qual e, Tio? Essa eu nao saquei!”Logus sorri e retoma a investida:

“F£cil? Eu nao disse que 6   facil. Voce pensou: nao e facil; e le-

vantou a questao. Se eu nao estivesse aqui, voce ficaria di'scutindo

com seus botoes.

“E simples. Mas nao e facil. Voce pensa que e f£cil aprender a

andar? Pergunte ao bebe que esta tentando. Ou ao homem que so-

freu um acidente grave e esta aprendendo novamente. Voce mesmo!

Agora sabe andar. Decide e anda; so. E singles e facil. Mas ja foisimples e nao foi fdcil. Por que se preocupa com isso? Nao 6  f£cil. E

dificil. Admita! Aceite! Nao 6   facil. E dificil. Pronto. E dai? Que

tem isso a ver com o que 6  preciso fazer para aprender? Voce pode

aprender sem fazer o que 6  preciso fazer para aprender? Alguem po

de? Faga o que e preciso fazer para aprender e pronto! Para que

 pensar, nao &facil, £ dificil? Para que servira isso? Em que ira aju-

da-lo? Faga o que e preciso fazer para aprender. S<5 assim se tomarafScil. Nao h i outro jeito!

“No fim, tudo se resume a aprender aprender a manter-se calmo,

aprender a aprender, e aprender a esperar. Depois fica facil. No fim,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 48/411

tudo fica facil. No fun! Como voce quer chegar ao fim sem comegar

e passar pelo meio? Alguem pode? Nao e possivel!”

O jovem esboga uma interrupgao, mas Logus corta:

“Nao interrompa. Escute. Lembra-se? ESCUTE. Alem disso, vo

ce veio aqui com um objetivo especifico e j£ nos desviamos bastan-

te. Quero voltar ao seu objetivo. Mas nao quero deixar estes outros

assuntos pela metade. Do contrario, eles ficariam como grilos na sua

cabega. Voce poderia at£ esquece-los. Mas eles estaiiam 16; incom-

 pletos; e causariam tensao. Voce sentiria a tensao; mas nao saberia

 por que. Portanto, escute.

“Voce me perguntou: Voce se mantem sempre calmo? Voce sem

 pre  sabe como e o que aprender? Voce consegue  sempre  esperarcom paciencia?

“Sempre? Eu nao disse isso. Voce pensou isso; e levantou as

questoes. Se eu nao estivesse aqui, voce ficaria discutindo com os

seus botoes.

“Por que se preocupa com isso? Que podera voce fazer com o

que EU tenha conseguido? Que podera fazer com o MEU exito -

 pessoal e mtimo? Como o afetara o que EU nao tenha conseguido?

Como o afetara o MEU fracasso - pessoal e intimo? Eu sou eu; voce

e voce. Melhor: eu nao existo; so voce existe. Voce precisa ter exito

EM MIM? Precisa ter O MEU exito? Voce precisa evitar fracasso

EM MIM? Precisa evitar O MEU FRACASSO?

“Esquega que eu existo. Estou falando com voce; mas esquega

que eu existo. O que eu digo existe. Voce existe. So. Esquega o

resto e trabalhe. Eu digo: 6  assim; faga assim, e persista, que um dia

os resultados comeg arao a acontecer. Voce esquece que eu existo evai e faz; e um dia os resultados comegam a acontecer. Bom para

voce! Ou voce se preocupa comigo e pergunta: sera que ele faz?

Entao voce nao faz; e os resultados jamais acontecem. Mau para vo

ce! PARA VOCE!

“Lembre-se: EU NAO EXISTO. O que eu digo existe. Voce

existe. Teste; experimente; persista. O exito sera seu. Nao teste; nao

experimente; nao persista. A impossibilidade de exito sera sua. Nin-

gu6m existe. O que se diz existe. Voce existe.”Victor nao se contem; interrompe:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 49/411

“Esta e a sua versao do ditado ,faga o que eu digo e nao o que eu  fago,  nao €1 Por que a gente reage assim?”

“Mais desvio.. . Bem, seja como voce quer.

“Sabe o que aconteceu ha pouco? Voce reagiu a uma frustragao

momentanea; a um momentaneo sentimento de deficiencia pessoal.

Eu disse: Mantenha-se calmo; aprenda; e espere. Mas voce sentiu af

dentro de si mesmo: nao e fificil; eu  nao consigo. Pronto! O sentimento de deficiencia pessoal! O EGO ferido!

“Sabe? O inferno da vida do homem 6  esse ego. Sabe o que 6  in

ferno? Inferno 6   o ego! Nao h£ outro inferno; o ego e o inferno;

o unico que existe. As vezes me ocorre que as pessoas deveriam ter

em casa, sobre o televisor, uma dessas estatuetas de Sao Jorge ma-tando o dragao. Quem e Sao Jorge? Quem €   o dragao? Onde esta

Sao Jorge? Onde esta o dragao?

“O ego luta para sobreviver e tamb£m para se valorizar. Quando

se sente desvalorizado, como luta? Pensa: Estou sendo desvaloriza-

do. Nao posso ficar assim. Se nao posso demonstrar valor nisso, vou

demonstrar naquilo. Mas. . . aquilo nao vem ao caso, agora; e disso

que se trata e nao posso demonstrar valor nisso. 3i sei! Vou desfazero valor dos outros nisso mesmo. Assim, seremos iguais; ninguem

estara acima de mim e, portanto, estara tudo bem. Em ultimo caso,

se nao conseguir desvalorizar os outros nisso, vou desvalorizar na

quilo. Contanto que os desvalorize e fiquemos todos nivelados. As

sim estar5 tudo bem. Vou fazer mais ainda - melhor prevenir do que

remediar. O negocio 6 estar sempre apontando defeitos nos outros.

Com isso estaremos todos relativamente nivelados; ninguem estara

tao acima de mim que nao tenha defeitos. Aquele homem esta muitoacima de mim? Vou procurar um defeito nele. Quando encontrar - e

tenho de encontrar! —vou rir, apontar com veemencia e propalar em

altos brados! Entao ele vai ficar relativamente desvalorizado. E tudoestara bem.

“Na parte mais terrivel e dolorosa do seu proprio inferno, pensa o

ego: E se eu encontrar um que seja realmente perfeito? Um que eu

nao consiga desvalorizar, por mais que tente? Ele h£ de ser como umespelho magico, e nele eu vou me ver homvel! Nao vou suportar vi-

ver com a minha propria fealdade. Que farei entao com aquele ser

 perfeito, que esteja tao acima de mim que eu nao o possa desvalori-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 50/411

zar? S6 havera um jeito: EU 0 DESTRUIREI! Quebrarei o maldito

espelho! E pronto! Quebrado o espelho que estiver incomodando,

nao me verei mais, e tudo estara bem.

“E como o ego pensa, assim ele age. E produz o dukkha da psi-

cologia budista, que e o seu inferno. Nao tem consciencia desse pensar, porque nao e um pensar volitivo. Mas e assim que ele pensa

e, conforme pensa, age. A humana hist<5ria o tem comprovado. Sabe

o que sao os homens? Espelhos! Sabe o que e a vida dos homens?

Um jogo de espelhos!

“Eu nao estava pensando em mim, nem falei em mim. Voce  pen-

sou em mim; voce me colocou no seu di^logo intimo. Voce  pensou:

Eu nao consigo. Mas. . . sera que ele consegue? E mesmo que con-

siga, sera que consegue  sempre?  Entao voce perguntou: Voce consegue sempre?”

L6gus para de falar. Victor fica pensativo e depois diz, num tom

acabrunhado:

“E. . . nao e mole, Tio. Se eu entendi, nao e mole. . . Porque a

gente vai ter que aprender a amar os espelhos que revelem a nossa

 propria fealdade! Nao 6   mole! E o espelho perfeito, entao? Esse a

gente vai ter que contemplar e amar, profunda e longamente. E ate a

noSsa imagem se transmutar. . . vai doer um bocado. E. ... essa eu

saquei. E doeu!”

Logus sente compaixao fluir no seu amago, enche-lo e transbor-

dar sobre o jovem. E ele. deixa, feliz. E acrescenta, assumindo gra-

dativamente um tom jocoso e alegre, para animar o rapaz:

“D(5i sim. Nao pode deixar de doer. E dukkha,  isso que o ego

 produz. E voce pensa que esse diabo desse ego vai se entregar fa-

cilmente? Ja lhe disse; esse demonio luta para sobreviver! Sabe o✓

que 6  o diabo? E ELE! Nao existe outro. Por isso e tao dificil. Por

que E ELE!

“Sabe por que doi? Porque voce se poe diante do espelho e pen

sa: sou feio. Note bem:  sou feio! Voce se identifica com ele. Entao,

nao pode ver beleza. Pior: como voce nao ve beleza no espelho, nao

ve beleza no mundo. E agride o mundo. E agride a si mesmo! Ele 6

feio. Como e que voce pode ver beleza? Mas quando voce aprender

a sair dele, diante do Grande Espelho, daquele espelho perfeito, entao. a imagem se transmutar^ e voce vera beleza. Gloriosa beleza!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 51/411

TRANSFIGURA^AO! E pensara: sou lindo! Nada pode ser mais Iin-

do! O outro? Nao existe; era ilusao.

“Dai em diante, sua vida se transformara num jogo fascinante.

Ate Sao Jorge matar o dragao. Defmitivamente! Porque o dragao e

mortal. Sao Jorge, nao; e imortal. Quem €   o dragao? Quem €   SaoJorge? Onde esta o dragao? Onde esta Sao Jorge?

“Portanto, por algum tempo voce nao conseguira transcender a

dor. Mas, a partir da primeira transmuta^ao da imagem, da primeira

transfiguragao, sua vida se transformara num jogo fascinante. Voce

sera cada vez mais espectador. Cada vez menos se identificara com

o ator. E ira deixando de sentir dor. Ate Sao Jorge matar o dragao. E

lembre-se sempre de que serS uma transmutagao DA IMAGEM, umatrans-FIGURAgAO.

“Ate la, voce sentira necessidade de companhia. Nao se preocu-

 pe. Tera muita companhia. Quantos habitantes tem a Terra? Pois

esta e a legiao dos que se poem diante do espelho e veem fealdade.

Excesses? Existem sim. Poucas, mas existem. Sao elas que nos di-

zem que vale a pena lutar. Elas sao o Grande Espelho que nos mos-

tra feios. E a Grande Bola de Cristal que revela a nossa gloriosa

 beleza. Ao mesmo tempo.“Sobretudo, nao se martirize. Sabe por que voce se martiriza?

Porque se identifica com ele. Ou pensa que ele existe fora de voce e

entra em voce e o tenta - e ate que o domina! Entao voce pensa: sai

de mim! Nao e ele que tem de sair de voce. Porque ele nao entra. E

voce que tem de sair dele! Entao voce pode pensar. sou divino ate

nos meus “ pecados” ! Alguma coisa nao e divina? Se nao e divina,

nao existe! Aconteceu? Lamente, se nao puder evitar (e nao podera, por algum tempo, porque estara identificado com ele). Mas deixe

 passar. Tao logo tenha acontecido, deixe passar. Lembre-se: Voce e

o espectador e o jogo e fascinante; nao doloroso; fascinante; ou do-

loroso mas necessario e fascinante.

“E voce nao estara sozinho. Quando afinal estiver sozinho, sera

 porque nao precisara daquela companhia. Nem podera estar naquela

companhia. Nao podera. Sera impossivel! Estara la com eles. Nao

 podera evita-lo. Mas nao estara em sua companhia.

“Nao tema a possibilidade de solidao. Estamos com voce. Olhe!

Estamos com voce! Eu tambem! Voce perguntou: “voce consegue

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 52/411

sempre”? E exclamou: “puxa vida! o caraque consegue tudo isso af

6  um deus” ! Sabe o que eu sou? Um Aprendiz de Feiticeiro. Quando

voce ouvir a musica de Paul Dukas (dukkha. . . ) , lembre-se de mim.

Porque 6   isso que eu sou: um  Aprendiz de Feiticeiro.  Um dia vou

aprender a Grande Feitigaria. E vou faze-la. O dragao que se cui-de!”

O jovem se despede, sorrindo. Nao sem fazer Logus prometer que

the daria depois uma chave-de-ladrao e o ajudaria a manter-se cal-

mo, aprender, e esperar.

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 53/411

A PRINCESA DE OURO

E

A CHAVE-DE-LADRAO

N o v a m e n t e k  s o m b r a a s s i m i l a d o s

- d o E s p f ri to m e n l e c d s m ic a q u e d e t u d o to m a c o n s c ie n c i a -

r e c o n h e c e m o s a p r e s e n g a d a o u t r a ( q u a s e - L u z )

q u a n d o n o s s a j o v e m s o m b r a c o m e l a c o m e g a a t a l a r . . .

“Hoje vim disposto a escutar, Tio. Estive pensando naquilo que

voce falou, da Fonte Cosmica e de minha possibilidade de sintonia

com ela. E acho que entendi tudo. Lembra-se? Voce me perguntou:que pode acontecer de pior?  E disse: isso voce jd pode construir  

 por si mesmo. Pois bem; acho que construi.”

“Vejamos isso” —diz Logus, sorrindo, deleitado com o entusias-

mo do jovem. E este, todo animado:

“Mole! ainda nao sei o que vai acontecer; mas acho que ja tenho

ideia de como vai acontecer.

“Bem. . . vamos partir do princfpio de que eu estou escutando.Isto e, escutando, no sentido que voce pediu naquele dia. Entao.. .”

“Primeiro me diga como entende esse escutar.  Isto e fundamen

tal. Se sua compreensao disto nao estiver conreta, todo o restante de

sua explica§ao estara prejudicado.”

“Ora, e como voce explicou. Mas vou dizer com outras palavras.

Foi assim que eu pensei:

“ Voce esta falando e eu estou ouvindo. Estou ouvindo, mas minha. . . meu cerebro esta em pleno funcionamento; como se fosse um

computador automatico, em plena opera^ao. E importante frisar que

esse computador e automatico; isto e, seu funcionamento nao esta

dependendo de minhas decisoes volitivas.

“Bem, nao entendo propriamente de computadores, nem da cien-

cia de computagao. Mas vou aniscar a analogia, em fungao do que

sa. . . do que pude compreender no ciclo basico da Universidade.

 Nao preciso mesmo de detalhes tecnicos especiais. E s6   uma analo

gia.

“ Voce diz umas tantas palavras. Elas sao dados com que e ali-

mentado o meu computador. Ele, entao, compara o que recebeu com

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 54/411

o que tem na sua memdria. Se h i correlagao perfeita, produz um si-

nal de CERTO, e eu concordo. Se ha correlagao imperfeita, ou in-

completa, produz dois sinais: um de CERTO, e eu concordo; o outro

de ERRADO, e eu discordo. Concordo e discordo. Claro: se nao ha

correlagao, o computador emite um sinal de ERRADO e eu discordo.

“No primeiro caso, eu fico quieto; ou manifesto minha concor

dancia balangando afirmativamente a cabega, ou fazendo uma ex-

clamagao como, claro! ou Idgico!, etc. No segundo, entro com o ha

 bitual,  sim, mas. .  ou ,em parte eu concordo, mas. .  .No terceiro,

saio com essa nao!, ou direto com o argumento discordante.

“Nos tres casos, naturalmente, tudo depende da memdria e dos

 programas do meu computador (pra nao falar de sua qualidade e suaeficiencia). E ai 6  que est£ o gri. . . o problema. Quero dizer: a pre-

cariedade de eu nao estar escutando. E como se o meu computador,

respondendo a todo instante aos dados recebidos, bloqueasse o cir-

cuito de alimentagao nos casos de discordancia e nao acumulasse

novos dados. Entao ele nao poderia corrigir, ampliar ou aperfeigoar

os dados j£  existentes; sua memoria nao se enriqueceria.

“ Agora, eu interfiro. E e curioso, porque minha interferencia e

uma especie de “nao-interferencia” . Simplesmente, nao reajo aos si

nais do computador; nem de CERTO, nem de ERRADO. Como vo

ce disse: deixe passar as concordancias e as discordancias. Esta e a

interferencia. Pois bem: isto e o seu  escutar, e equivale a manter

aberto o circuito de alimentagao do computador. Sua memoria e en-

riquecida. Depois, como ele e autom^tico, chama esses novos ele-

mentos da sua memdria e sai analisando os programas pertinentes e

corrigmdo-os, ampliando-os, ou aperfeigoando-os. Mais ainda: se

 possfvel, constroi novos programas (combinando os novos elementos

com outros que ja existiam na sua memdria).

“Portanto, se eu escutar, estarei aumentando minha chance de en-

riquecer e desenvolver a minha mente. Do contrario, estarei decre-

tando minha prdpria estagnagao mental. Certo?”

“Certo. Isto 6, pondo de lado a questao da validade tecnica da

sua analogia, esti  certo. Parab^ns! E parabens tambem pela lingua-

gem; sem saques  nem grilos. De fato voce morou no assunto e issovai ajuda-lo a resolver seus pepinos.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 55/411

Os dois riem. Depois, diz U5gus:

“Agora, vamos ao que voce ia me explicar, antes que eu o inter-

rompesse. Prometo escutar 

Os dois sorriem e Victor retoma sua explica§ao:“Bern; voce esta falando e eu estou escutando. Suponhamos que

o que voce me diz e verdadeiro. Isso liga o meu computador ao

Computador Cosmico. A radiagao cosmica se manifesta na minha

mente. Entao eu sinto isso. Bern. . . na verdade, nao sei o que e que

a gente sente, exatamente. Mas imagino que haja uma sensagao es

 pecial. Do contrario, como os Mestres ou Iluminados saberiam? Tem

de haver uma sensagao especial!

“ Admitamos, agoia, que o que voce me diz nao 6   verdadeiro.

Meu computador nao se liga ao Computador C<5smico. Nao sinto a

tal sensa^ao especial. Nesse caso, vejo duas hipoteses: Se o que vo

ce diz e logico para o meu computador, eu aceito. Voce estava erra-

do, mas, pensava que estava certo; eu fico errado, pensando estar

certo. Se o que voce diz 6  ildgico para o meu computador, eu rejei-

to. Voce estava errado, mas pensava que estava certo; eu fico. . .

ora.. . fico na minha!. .. nao caio no seu erro!”Logus sorri. O jovem conclui:

“E assim vamos nos iludindo com o jogo da logica, que, como

voce me disse uma vez, nao 6  prova suficiente da verdade.”

“Que corolarios importantes voce mesmo tira de sua explica^ao?”

“Primeiro, naturaimente, a importancia de escutar. Se eu estiver

escutando, estarei dando oportunidade a que minha mente seja, di-

gamos, iluminada pela radiagdo cosmica.“Segundo, que meu prdprio discemimento e precdrio. Se nao es

tou escutando, decido: isso 6  certo; aquilo 6  errado. E como minhas

decisoes dependem da memoria e dos pro gramas do meu computador

(al6m de sua qualidade e sua eficiencia), elas nao sao confiiveis, se-

nao precaria e relativamente.

“Terceiro, que a ningu£m devo entregar  minha mente; nem mes

mo a medalhoes. Todo mundo pode estar equivocado, por mais im- pressionantes que sejam seu conhecimento (digo, infoima§ao) e sua

l<5gica. Enfim, que nao devo estar aberto a declaragoes dogmiticas.

De nmguem! Talvez seja melhor que eu fique errado na minha, do

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 56/411

que errado na dos outros. Nem mesmo de voce devo aceitar declara-

goes dogmaticas!”

Logus da uma boa risada e exclama:

“Isso mesmo! Lembre-se: sou um Aprendiz de Feiticeiro. Meu

computador ainda nao €   o Computador Cdsmico. Talvez eu estejaconseguindo a ligagao, de vez em quando. Mas, dai a ligagao per-

manente, definitiva, sei la eu quanto falta. .

Logus faz uma pausa e parece abstrair-se. Victor aproveita e per-

gunta:“Que achou dos meus corolarios?”

“Bons. Muito bons. Tenha-os sempre em mente.

“Primeiro, a importancia de escutar. Procure sempre escutar;

 principalmente diante de pessoas que paregam dotadas de fino dis-

cemimento e perspicacia. Alias, estas sao boas palavras: discemi-

mento e perspicacia. Mas lembre-se de que seu objetivo maior- e

aprender a se colocar em escuta direta, atraves da ligagao com a

Fonte ou Estagao Cosmica.“Segundo, a precariedade do seu proprio discemimento. Voce

6   inteligente. Mas tenha cuidado para nao se envaidecer disso. Sua

inteligencia e importante e util na sua vida. Ha de ser valioso fatordo seu bem-estar, do seu progresso e do servigo que podera prestar

ao seu semelhante. Mas nao a tome por soberana. Ela nao 6 o maxi-

mo em voce. Ainda que voce fosse um “einstein” , sua inteligencia

nao seria o maximo em voce.“Sobretudo, repito, nao se envaidega de ser inteligente. A vaida-

de impede a ligagao com o Computador Cosmico. O homem que 6  

vivente na vaidade intelectual 6   apaixonado por si mesmo. E um

narcisista. Porque tem um excelente computador, pensa que isso e omaximo. Nem lhe passa pela mente a ideia de um Computador

Maior. E quanto mais sente a admiragao dos homens, mais se apai-

xona por si mesmo; mais se narcisa. Esta sempre em si mesmo. Lo

go, 6  so nisso que pode estar. E isso nao e o maximo.

“Portanto, admire a sua inteligencia e a utilize ao maximo^ Mas

nao se envaidega. Admire-a, como impressionante demonstragao da

Inteligencia Maior que a transcende; esta e o maximo. O maximo?

 Nao. O infinito tem maximo? Do mesmo modo admire a inteligenciados “einsteins” que encontre em seu caminho, e dela beba; e mel.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 57/411

Mas lembre-se sempre de que h£ uma Inteligencia Maior, de que pode rd beber se aprender a escutar; esta 6  o nectar dos deuses!

“Admire a inteligencia dos “einsteins” e a sua propria inteligen

cia. Mas nao lhes devote adoragao. Tenha sempre em mente o seuterceiro corolario. H bom.”

O jovem sorri, satisfeito. Depois pergunta:

“Bem, Tio, antes de entrarmos nos assuntos que me trouxeram

aqui hoje, gostaria que voce me respondesse a duas perguntinhas:

Como e aquela sensagao especial? E, se a inteligencia cerebral nao 6  

o m&ximo em nos, que faculdade, entao, e o maximo?”

Ldgus se abstrai por aiguns segundos e, assumindo atitude medi-

tativa, responde:“Sensagao. Voce fala em sensagao e pergunta: como 6? Sensagao

6  para sentir\ E coisa de  ser.  Como 6 . . . 6  explicagao. Explicagao e

 para dizer. E coisa de pensar. Como voce quer pensar o que 6  para

sentir? Como voce quer dizer o que 6  para ser? Voce pode pensar o

calor? Voce pode dizer o calor? O calor que voce sente? Quando

voce pensa, esta pensando sobre o calor; mas nao esta pensando o

calor. Quando voce diz, fala do calor; mas nao diz o calor. Voce nao pode pensar o calor; nem dizer o calor. Voce so pode sentir o calor;

so pode ser o calor. E o amor? Voce pode pensar o amor? Pode di

zer o amor? Voce s<5 pode  sentir  o amor; so pode ser o amor. Se nao

sente, se nao 6 , entao nao conhece. Como voce quer conhecer sem

sentir? Sem ser? Pode estar informado; mas nao pode conhecer.

“ Voce quer estar informado? Eu lhe dou a informs gao. Duas pa

lavras. E isto que lhe dou: duas palavras. E 6   istcgque elas .serao:

 palavras; s6. Af6 voce conhecer. Entao nao precisara mais delas. Eu

lhe dou duas palavras: jubilo  e certeza.  Outras foram dadas, como

extase t f i .  Mas fique com as duas que lhe dei: JUBILO e CERTEZA.

“Quanto a inteligencia cerebral, nao 6  o maximo. Entao, que fa

culdade 6 o maximo? Ora, que e faculdade? Fungao de que algutm £  

capaz? Entao nao se trata de faculdade. Porque nao e fungao de al- 

 guem.  Quando acontece, nao ha algu&n. Ningudm esti 15! Talvezseja fungao. A final, precisamos de alguma palavra, ou paramos de

falar. Mas €   fungao de ningu&n. Quando alguem se toma ninguem, 

ai ela acontece; so entao pode acontecer. Mas nao 6   o m£ximo. E

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 58/411

mais; infinitamente mais! Nao o maximo. Mais. Infinitamente mais!

Quer um nome? Chame-a de intuigao.  Muitos a tem chamado assim.

Parece que foi assim que o Buda Gautama a chamou. Ou chame-a de

Espmto Santo, se quiser. Ou invente um nome. Que importa? Que 6  

nome? Palavra. So. Quem so conhece o nome, nao conhece o que

ele designa. Quem conhece o que o nome designa, nao precisa dele.”

Pensa entao o jovem; “E. . . o Tio e seus enigmas. O curioso 6  

que sempre sinto que ele esta dizendo coisas importantes. Nao en

tendo bem; mas sinto. Um dia vou entende-las” . E em voz alta:

“T io .. . e os nossos assuntos?”“Nossos? Seus. Nao meus. Agora  )£   os tenho resolvidos; pelo

menos em alto grau. Mas ja foram meus; em alto grau. Como ia lhedizendo em nossa conversa passada, um dia me fiz aquelas mesmas

 peiguntas. Lembra-se? Voce perguntou: Que devo fazer enquanto 

espero? Que posso fazer para adquirir mais depressa? Sim. . . eram

meus assuntos. E como me perturbava com eles!

“Sabe onde encontrei a resposta? Melhor: sabe onde a resposta

me foi dada? Num romance. Pois 6. Num romance! Nao foi na Bf-

 blia; nem num livro de Psicologia ou de orienta^ao de qualquer es-

 pecie. Foi num romance: “The Golden Princess” . Sabe o que querdizer isso? “A Princesa de Ouro” . Era um romance da conquista do

Mexico por Hem&n Cortez. Nao me recordo do enredo. Logo o es-

queci. Alias, nunca valorizei enredos. Enredos sao fatos; coisas que

 passam. Sempre busquei valores permanentes; coisas que nao pas-

sassem. E continuo com a mente voltada para isso - coisas que nao

 passem.“Coisas? Nao. Que coisas nao passam? Se e coisa, passa. Valores

 permanentes? Nao. Que valores sao permanentes? Se e valor, passa.Minha mente esta voltada para um vazio! Mas. . . que e um vazio?

Voce pode dizer o que e um vazio? Nao. Voce s6 pode dizer o que

ele nao 6. Voce diz: isso aqui sao coisas; agora, aqui, h i um espa?o

onde nao h& coisas; isso €  um vazio. Voce aponta; mas nao pode di

zer o que 6. E quando afinal conhece um vazio, fica sabendo que ele

e cheio. Isso mesmo. Quando voce conhece o Grande Vazio, fica

sabendo que tudo est£ ali. Nunca esteve fora. Esta ali. Tudo! Nao ha

“esteve” nem havera “estara” . Nao h£ nem havera “fora” . Nao pode haver. Tudo est£ ali; agora; sempre. E “ali” 6  AQUI!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 59/411

“Por isso nao me interesso por enredos. Sao fatos? Mesmo assim,

so me interesso por eles na medida do necessario e suficiente para

sobreviver nesse mundo e nele dar a minha contribuigao. Nessa me

dida eles sao importantes; muito importantes. E nessa medida meinteresso por eles; somente nessa medida.

“Portanto, esqueci aquele enredo. Lembro-me apenas de que ha-

via uma princesa asteca: a Princesa de Ouro. Ela se apaixonara por

alguem (talvez o Heraan Cortez ou um seu capitao) e vivia um mo-

mento de angustia, p>orque seu amor nao se realizava. No auge de

sua angustia, lembrou-se de uma exortagao que tantas vezes fora re-

 petida durante sua formagao de princesa: mantenha-se calma, 

aprenda, e espere!“ Voce ja viu letras de fogo? Pois eu ja vi. Aquelas eram letras de

fogo! E saltaram do livro, entraram pelos meus olhos e foram direto

ao meu coragao. Direto ao coragao! MANTENHA-SE CALMO,

APRENDA, e ESPERE! Como poderia eu esquecer essas palavras?

Eram letras de fogo! E foram direto ao coragao!

“Mantenha-se calmo. . . Que 6 cahno? Alguem que esti em esta-

do de calma. Que e calma? Serenidade? Isso nao diz muito. Naoajuda. Esperemos outra palavra. . . ah! . . .imperturbabilidade. Pala-

vra grande; incomoda de pronunciar. Mas ja diz alguma coisa.

“Que e imperturbabilidade? Estado de imperturbavel. E que e im-

 perturbavel? Esperemos um pouco. . . sim! Duas ideias: que nao po

de ser perturbado,  e, que nao se deixa perturbar.  Ora, quem nao

 pode ser perturbado? Um Mestre? Um Iluminado? Mas, de quem

estamos falando? De voce e de mim. E nao somos Mestres; nao so-

mos Iluminados. Entao, a primeira definigao nao nos serve.

“Que e que nao se deixa perturbar? Este o nosso problema. En

tao, perguntemos: Que e que?  Que 6 perturbar?  Que 6 nao se dei

 xa?  Perguntemos, e esperemos. Nao produzamos respostas. Se as

 produzirmos, elas serao nossas. De que valerao nossas respostas?

Merecerao confianga? Temos um problema porque nao sabemos a

resposta. Entao nao produzamos respostas. Nao procuremos respos

tas. Se as procurarmos, nos  estaremos procurando. E se as produ-zirmos, serao respostas nossas. De que valerao nossas proprias res

 postas? Perguntemos; mas nao respondamos nos. Esperemos. So.Esperemos. . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 60/411

"Que,  nesse caso, e uma pessoa: voce.  Perturbar-se 6   inquietar-

se, agitar-se. E entrar numa condigao de mal-estar (preocupa?ao,

medo, ansiedade, angustia, impaciencia, odio, etc.)- So nessa acep-

gao perturba§ao faz sentido para voce: voce se sente mal. Entao, te-

mos voce  e  perturbaqdo.  Voce de um lado e perturbagao do outro?

Duas coisas? Esperemos. . . Nao. Nosso problema tem um outro

componente: nao se deixa.  Que e nao se deixa?  E a resposta, que

sinto num lampejo, leva a surpreendente constatagao: PERTURBA-

QAO E  VOCE! Nao se deixa diz isso. Senao, vejamos:“Perguntemos novamente: Que e perturbagao? Perguntemos. . . e

esperemos. . . Perturba§ao e estado intemo de inquieta^ao, de agita-

5§o, de mal-estar. O que vem de fora i  fator; nao a propria perturba-§ao; fator. Do contrario nao podenamos dizer: “nao  se deixa”. Co

mo poderia voce evitar perturba^ao no fator? Em todos os fatores?

Isolando-se perfeitamente do mundo? Admitindo que o conseguis-

s e .. . e voce mesmo? Se voce conseguisse isolar-se do mundo, seria

 perturbado por si mesmo e em si mesmo! Portanto, perturba§ao e

voce; e o seu estado de ser, num dado momento.”

O jovem interrompe:

“Sim, Tio. Mas, como posso nao me deixar perturbar, o queequivale a me manter calmo? Isso €  que eu quero saber.”

“ Ora, j£ vimos que perturba§ao 6 um seu estado de ser. E que vo

ce nao pode se isolar totalmente dos fatores de perturbagao. En

tao. . . vejamos.. .

“Bern, voce 6  freqiientemente atingido por fatores de perturba§ao.

Partamos desse ponto. Simplificando: voce e amea^ado por um fator

de perturba^ao. Que faz? Enrijece? Usa sua for§a de vontade e re-

siste? Isso gera tensao. E tensao e perturbagao. Por isso autoconten-gao nao e calma; e escolha entre tipos de mal-estar, de perturba§ao.

Portanto, voce nao enrijece. Entao €  atingido. Ocorre a perturbagao.

Que faz voce?”“Ei, Tio! Ai nao adianta mais! me deixei perturbar!”

“Certo. Mas tinhamos sido levados a conclusao:  perturbagao i  

um seu estado de ser.  E um seu estado de ser E voce. PERTURBA-

£AO E VOCE. Desta conclusao nao nos devemos afastar. Ela ex-

Inessauma verdade: a sua verdade. A verdade existe. Sobre elavoce

 pode construir. Nossa conclusao e realista e deve sero seu ponto de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 61/411

 partida. Sobre ele voce podera construir. A mentira (ou ilusao) nao

existe. Como pode voce construir sobre o que nao existe? Impossf-

vel! Por isso exortagoes tem pouco ou nenhum valor pratico. Delas

muitos livros estao cheios. Quem os leu e tentou por em pratica asexortagoes sabe o que e tentar construir sobre ilusoes. Melhor. boas

exortagoes sao validas e uteis; talvez mesmo necessarias. Mas so se

de fato influenciam o seu pensamento e geram o sentimento direto.

O sentimento direto tem poder; e magico. O pensamento com pala

vras s6 tem poder se acompanhado de sentimento direto. Do contra-

rio, e sd isso mesmo: palavras pensadas; sem poder; sem magia.”

“Mas, entao, o que 6  que eu fago? Voce concluiu que eu nao pos-

so me manter calmo; que esta 6  a minha verdade e que ela deve ser omeu ponto de partida. No entanto, voce mesmo disse: mantenha-secalmo. O que e que eu fago?”

“Fazer? Enquanto voce tiver de fazer, havera perturbagao. Por

que voce  estar£ fazendo. Quando voce nao mais tiver de fazer, entao

sera feito e nao havera perturbagao. Porque voce nao estar£ fazendo.

Voce nao estara. Entao sera feito. E nao havera perturbagao.”

“Nao entendo.”“Entao enrijega.”

“Nao posso. Voce ja disse que nao funciona.”

“Entao nao enrijega. No entanto, se voce nao enrijece, mas est£

 presente, no seu ego menor, que pode acontecer? Veja bem: voceesta presente, no seu ego menor; e nao enrijece. Entao, seu estado

de ser passa a perturbagao; voce e atingido. Leis naturais, ou rela-

goes naturais de causa e efeito, entram em operagao e voce age;melhor: reage. E confoime a causa, assim 6  o efeito. Voce exteriori-

za o seu estado de ser. Que pode voce exteriorizar, senao o que tem

no seu interior? Que pode voce manifestar fora, senao o que esta

dentro? Se nao ha dentro, como pode voce tirar e manifestar fora?

“Por isso, muitas vezes voce aponta, nos outros, defeitos que vo

ce e quem tem. Esta em voce; mas voce diz: est£ nele! Isso 6  para-

lelo aquela historia dos espelhos. Lembra-se? Um homem tem um

defeito e voce tambem o tem. Ele e um espelho. Vem a pertuibagao

e voce reage: “olhem, esse homem tem esse defeito” ! O tagarela

critica o tagarela; o feio critica o feio; o magro critica o magro, etc.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 62/411

Por isso a gente exclama de vez em quando: “vejam s6   quem esta

falando” ! . . .“Mas esse nao e o nosso tema. Nosso tema 6: voce esta presente,

no seu ego menor, e nao enrijece; vem a perturbagao e voce reage.

Um insulto? Voce insulta de volta. Um tapa? Voce da um tapa devolta. A gaveta nao quer fechar? Voce lhe d& um pontape. O objeto

cai da sua mao? Voce xinga.”

“Mas isso ai tambem nao d£ p6.  Nao posso. . . ou nao devo sair

 pelo mundo trocando insultos e tapas, chutando coisas e soltando

 palavroes!”“Entao voce enrijece e reprime.”

“Ora, essa nao! De novo? Ih, Tio, estamos andando em circulos!

Estamos rodando e eu j£ estou ficando tonto!”Logus sorri e retoma a palavra:“Isso mesmo. Onde e que voce pensa que estamos? Pois eu lhe

digo: num enorme parque de diversoes masoquistas! E voce est£

num cairossel; rodando. . . rodando.. . Esti tonto? Onde e que voce

 pensa que estamos? Num enorme carrossel, cheio de gente; rodan

d o .. . rodando.. . e todo mundo esta tonto!“Pois e. Voce vai continuar andando em cfrculo, por muito tempo

ainda. Tonto. Nao convem reagir? Entao voce enrijece. Nao 6  gravereagir? Entao voce reage. Nao convem reagir? Entao voce enrijece.

Em circulo. Rodando. Sempre manifestando fora o que voce 6  den

tro. Como pode voce manifestar fora o que nao €  dentro? Voce nao

 pode. Ninguem pode. Por isso e que esta todo mundo no carrossel.

Rodando. Tonto.”

“E nao tem safda?”“Tem. Homens extraordinarios disseram que tem.”

“ Equal e?”“Voce salta do carrossel.”

“Pra onde?”“Para o vazio. Para o Grande Vazio. Aquele Vazio que est£ ple-

no de tudo. E \ i  que tudo esta. . . no Grande Vazio.  L i, onde voce

nao pode falar em algum lugar;  pode falar em nenhum lugar  e em

todos os lugares; mas, nao, em algum lugar. E la que tudo esta. Me-

nos o carrossel. L&, voce descobre que o carrossel nao existe.”

“O que e que existe entao?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 63/411

“O que 6  que existe. . . num vazio? Que e um vazio? Como e que

voce pensa num vazio e pergunta: que £ que existe Id?  Que pode

existir num vazio? Pois eu lhe digo: tudo esti no vazio, no Grande

Vazio, mas voce nao vai encontrar nada nesse Vazio. Nada.”

“Mas voce mesmo disse que o nada €  um absurdo!”

“Disse. Mas 6  assim mesmo. O nada 6  um absurdo. Por isso, tudo

esta no Grande Vazio. Mas quando voce saltar do carrossel e estiver

no Grande Vazio, nao vai encontrar nada la. Nada!”

“Puxa! Que papo maluco! Pirado mesmo!”

“E. . . aqueles homens extraordinarios sao como malucos. Que e

um maluco? Algu6m que esta fora da realidade? Entao, dizem aque

les homens que nos outros 6  que somos malucos. Eles nao. Eles saocomo  malucos. Por isso dizem tantas incoerencias. Eles, que sao

como malucos, dizem e compreendem incoerencias; nos, que  somos 

malucos, nao dizemos nem compreendemos incoerencias.”

“Nossa! Esta cada vez pior!”

E Victor acompanha Logus numa boa risada; depois este retomao flo da meada:

“Bem, vamos retomar o nosso tema, dessa vez mais diretamente, porque j i 6  tarde.

“J3 dissemos: perturbagao e um seu estado de ser; perturbagao e

voce. Esse 6 o  nosso problems. E como vamos sair do nosso pro-

 blema? Sair? Nao. E exatamente isso que nao devemos fazer. Se

tentarmos sair, vamos ficar nele; mas, se ficarmos nele, entao, con-

seguiremos sair dele. Essa e a chave; a chave-de-ladrao que voce

queria.  Ficar com o problema sempre, para poder sair dele. Essa ea chave-de-ladrao. Sabe que forma ela tem? A forma de uma per

gunta: QUE E? Voce pergunta: que e? Mas nao responde. Se tentar

responder, estara tentando sair do problema; ai voce ficara nele. Se

nao tentar responder, ficara nele; ai voce saira dele. Voce pergunta:

que e? E espera. So. Nao responde. Deixa que seja respondido em

voce.

“Qual 6, agora, o seu problema? Ja dissemos: perturbagao 6 voce.

Pois bem; voce pergunta: que 6 voce?  E, como se trata de voce

mesmo, a pergunta passa a ser: que sou eu?  Nao “quem” e, sim,

QUE! Se voce perguntar “ quem” , vai responder com o seu nome,

ou com algum adjetivo que o qualifique ou identifique. E, se voce se

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 64/411

identificar, estara perdido! Voce tera de se perder; s6  entao podera

se identificar.

“ Portanto, voce pergunta: QUE SOU EU? Sabe o que e essa per-

gunta? Uma forga. Poderosissima! A forga centrifuga que podera ati-

ra-lo para fora do carrossel; para o Grande Vazio! No devido tempo.Quando voce nao estiver mais tonto. Antes, nao. So quando voce

nao estiver mais tonto. Entao voce conhecera a resposta aquela per

gunta. Mas nao a podera dar a ninguem. S6 podera dizer incoeren-

cias; como um maluco. Voce estara na realidade. Mas os outros, que

ainda estarao no carrossel, dirao: “olhem, aquele homem €  maluco;

esta fora da realidade; s6  diz incoerencias” !

“Mas isso so podera ocorrer no devido tempo. Quando voce tiver

aprendido a se manter calmo; a nao ficar tonto no carrossel. Antesdisso voce nao podera se manter calmo; so podera recuperar a cal

ma, depois de te-la perdido. Voce tera de ser como um lago. O vento

sopra forte? Ele se agita na superficie e, talvez, um pouco mais para

o fundo. O vento para de soprar? Ele para de se agitar. Note bem:quando o vento p&ra de soprar, ele para de se agitar; acalma-se.

“ Voce vai ter de ser um lago vivo. Um fator de perturbagao? Vo

ce se perturba. Cessa o fator de perturbagao? Voce se acalma. Co

mo? Com um forte e prolongado suspiro. Isso mesmo. Voce solta um

forte e longo suspiro e, no fim, pensa com PLENA CONVICC^AO:

 passou! Depois voce esquece. Como? Ocupando-se. Qualquer coisa

serve: seu trabalho, por exemplo; ou voce pensa num poema ou em

 boas exortagoes (para isso elas sao uteis), ou numa prece. Pesquise;

acabara encontrando o que lhe sirva melhor. Ate voce aprender ou

tra coisa.

“Sim. Voce tera de aprender outra coisa. E, quando a tiveraprendido, podera se manter calmo; nao estara tonto, e podera entao

ser atirado para fora do carrossel e para dentro do Grande Vazio!

“Sabe o que €  que voce tera de aprender? O que o lago aprendeu.

Era um lago fant£stico, aquele. Um dia ele cansou de se agitar com

o vento. Sabe o que ele descobriu? Que acima dele, e dentro dele, e

 por toda parte, havia um Espmto do Espago. Entao ele pensou: vou

me identificar com esse Espfrito do Espago; af eu nao vou mais me

agitar com o vento. Vird o vento e as aguas se agitarao. Mas eu nao; porque estarei nas aguas mas nao  serei as dguas. Estarei nas aguas;

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 65/411

mas elas estarao agitadas e, eu, tranqiiilo, calmo, imperturbavel.

Dito e feito. E €   isso que voce ter£ de aprender. Como o lago fan-

tastico.”

“ Sei Id se entendi direito esse seu mantenha-se calmo,  mas, em

todo caso, e quanto ao resto? Quero dizer: aprenda e espere. Comofazer isso?”

“Quanto ao que e como aprender, quase nao temos falado de ou

tra coisa. Quanto a esperar, seu problema i  impaciencia. Pois bem,

 ja lhe dei a chave-de-ladrao; use-a. Peigunte: QUE E impaciencia?

QUE E paciencia? Pergunte, e espere. Lembre-se: nao responda;

deixe que seja respondido em voce. Fique so atento.

“Em todo caso, vou lhe oferecer as minhas respostas. Sao sim

 ples. Mas nao as despreze por isso; considere-as profundamente.

Quando estiver de fato compenetrado do seu significado, descobrird

o que fazer para nao se impacientar, ou quando se flagrar impacien-

te. Agora, as respostas:  Impaciencia e concentragdo no futuro . Pa

ciencia e concentragdo no presente.

“Pronto. Ja lhe dei a chave-de-ladrao. Mas lembre-se: e uma cha

ve-de-ladrao. Ha a chave e ha o ladrao. Tome-se um bom ladrao, e

voce alcan§ar£ o Reino do Ceu!”Victor parte, enfim, empurrado pela sonora gargalhada de Logus.

E n o E s p a g o c o m o a g a r g a l h a r t a m b 6 m ,

e m s i n t o n i a c o m o h u m o r d a s o m b r a q u a s e - L u z ,

a o u t r a a c o m p a n h a m o s

e n e l a u m b o m a l e n t o i n l u n d i m o s ,

c o m o p o d e r d o n o s s o a m o r .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 66/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 67/411

 Na sombra que desperta,

mais uma vez a outra visitamos,e nossa perce pgao apuramosao diilogoqueseirrfcia...

“Oi, Tio... opa! Vai viajar?”

“Vou. E vou ficar muito tempo fora.”

Visivelmente desapontado, diz o jovem:

“Bem. . . entao eu vou embora. Vim aqui porque queria lhe per-

guntar uma coisa. Mas acho melhor deixar voce se arrumando..“Ora, nao seja por isso. Fique. Quer me perguntar uma coisa?

Pergunte.”

Logus poe um mago de folhas de papel em cima da mesa. Victor

 percebe que ha algo datilografado nos papeis e, mesmo de longe,

espicha o pescogo, tentando ler o que parece um titulo. Mas Logus

corta sua manifestagao de curiosidade:

“Muito bem. Voce veio me perguntar uma coisa. Pergunte.”“Bem. .. €  sobre a chave-de-ladrao que voce me deu ..

“Ora, que temos aqui? Uma reclamagao? Nao 6  uma chave-de-la-

drao? Nao abre to das as portas?” - Pergunta Ltfgus, com ar de riso.

“Nao, nao! Nao e isso!” - Apressa-seo jovem a responder. “Ape-

nas eu queria saber uma coisa: a gente nao pode perguntar  por  

que?”

“Poder? Pode. Quem vai proibir? Voce quer perguntar por que? 

Pergunte. Ninguem vai proibir. Mas. . . que € por que? Razao? Ra-zao 6   coisa de pensar; coisa do intelecto; mania dos homens —dos

que estao no carrossel; tontos. Voce quer pensar, ou resolver o seu

 problema? Se quer resolve-lo, ja lhe disse: pergunte que e? e espere.

 Nao pense; deixe que seja pensado em voce. Nao responda; deixe

que seja respondido em voce.

“Voce pensa que a natureza e humana? Que a verdade 6  humana?

Que a realidade do cosmo e humana? Quem e humano? Voce 6  hu-mano. Voce tem motivos, intengoes, razoes. E a natureza? E a ver

dade? E a realidade do cosmo?

“O fogo aquece. Por que? Nao tem por que. Aquece. So. A do

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 68/411

na-de-casa acende o gds. E o fogo aquece a came e ela faz um su-

culento bife. O mando come e fica feliz. E se a mulher pergunta por

que e nao faz o bife enquanto nao encontra a resposta? Entao o bife

nao sai. O marido fica infeliz e se divorcia. E diz: “aquela mulher 6  

maluca; vou procurar uma que nao pergunte por que” .

“Que 6 por que?  Razao, intengao, motivo? Entao nao pergunte

 por que. Se voce perguntar por que, vai se envolver num jogo muito

complicado; chama-se julgameruo. Os homens o adoram! E se ator-

mentam muito com ele. Por isso estao girando no carrossel. Tontos.

Voce pergunta: por que? Sabe o que acontece? Isso veste uma toga

em voce. Voce quer ser juiz? Voce  pode ser juiz? Da natureza, da

verdade, da realidade do cosmo?

“Voce quer ser juiz? Certa vez, um juiz me disse: “aposentei-me

 porque estava cansado do conflito entre a lei e a justiga” . Voce quer

se cansar desse conflito? Os homens sao imperfeitos. Como podem

ser perfeitas as suas leis? Como pode ser perfeita a sua justiga? Vo

ce pergunta: por que? Veste a toga e julga. Voce €  homem. Tem

motivos, intengoes, razoes; e desejos tambem. Como pode ser per

feito o seu critfrio de lei? Como pode ser perfeito o seu critSrio de

 justiga? Mas voce veste a toga e julga. E acaba cansado de conflitosentre a lei natural e a justiga natural. Cansado e perplexo - no me-

lhor. Cansado e angustiado —no pior. Voce quer ficar perplexo?

Quer ficar angustiado? Entao vista a toga e julgue; pergunte por

que. Quanto h  natureza, prosseguir4. . . como voce diz: “na dela” ;

“numa boa” ; sem conflitos. Onde estarao entao os conflitos? Per

gunte onde estar& voce. Af encontrar^ os conflitos; af encontrar^ a

 perturbagao.

“Que 6 por que? Causa? Entao pergunte por que. No carrossel,isso 6   importante. Se voce conhecer muitos porques, viver£ melhor;

ficar£ me nos tonto. No carrossel i  assim: hd causas e efeitos. A cada

causa o seu efeito. No carrossel h i muitas relagoes de causa e efeito;

muitas leis. Se voce conhecer muitas leis, poderi provocar os efeitos

que lhe interessem e evitar os que nao lhe interessem; nas causas.

Voce quer fogo? Produz a causa do fogo; e vem o efeito e voce tem

fogo. Voce nao quer fogo? Nao produz a causa do fogo; o efeito nao

vem e voce nao tem fogo. Ha fogo e voce nao quer? Voce produzuma outra causa; e vem o efeito e o fogo 6  apagado.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 69/411

“Talvez haja momentos em que voce precise perguntar por que

mesmo pensando em motivo, in tensao, razao; e desejo tamb£m. Vo

ce est4 no cairossel e, no carrossel, e assim: H6 as coisas naturais e

ha os homens. As coisas naturais sao regidas pelas leis naturais. Oshomens tambem, mas eles tem desejos, motivos, intengoes, razoes.

Entao, muitas vezes, voce tem de perguntar por que. E o jogo do

 julgamento, e voce tem de entrar nele, no carrossel; para ficar menos

tonto. Mas lembre-se: pergunte, mas nao responda; espere, e deixe

que seja respondido em voce.

“Mas so no carrossel. Se voce quiser transcender o carrossel, tera

de parar de perguntar por que. Sabe o que e por que?  Uma ancora.

Voce pergunta por que e fica ancorado; no carrossel, onde voce estatonto. Tonto e rodando; no jogo do julgamento, como todo mundo.

“ Se o seu problema disser respeito a sua vida aparente no carros

sel, voce ter£ de fazer varias outras perguntas: Que 4? nao vai bas-

tar. Voce ter£ de perguntar: por que? para que? como? quando? on

de? de onde? para onde? Mesmo assim, que 4? sera a pergunta fun

damental; nao esquega isso.

“E se voce quiser solu^oes mais pro fun das para os seus proble

m s, pergunte: que 4 primeiro?  Esta pergunta e muito importantee dtil; 6 um importante acessdrio da chave-de-ladrao. Se os homens

a fizessem e nao a respondessem, mas deixassem que ela fosse res-

 pondida neles, j£ teriam encontrado solugoes mais satisfat6rias para

os seus problemas —no carrossel, onde estao todos tontos. Mais:

iriam aos poucos sentindo e compreendendo a necessidade de trans-

cenderem o carrossel. Mais ainda: antes que o transcendessem, nele

mesmo seriam muito felizes. O amor, o verdadeiro amor os faria fe-

lizes; muito felizes. At6 que s6 perguntariam: QUE E? E, se nao

respondessem, seria respondido neles e sentiriam; e nao precisariam

mais perguntar. Quem iria perguntar? Ninguem estaria la para per

guntar. S<5 haveria a resposta. Resposta? Nao. Resposta pressupoe

 pergunta. E ninguem estaria la para perguntar. So haveria afirma^ao.

Aflrrna^ao? Nao. Quem estaria para afirmar? Ninguem! Entao, s6  

haveria vida! VIDA, no Grande Vazio; que esti pleno de tudo. Vi

da, em Amor, no Grande Vazio; sem perguntas nem respostas; semafirmasdes nem julgamentos. Vida; s<5. Amor, s6. No Grande Vazio,

que est£ pleno de tudo.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 70/411

O jovem, encantado e comovido, nao ousa perturbar a atitude

meditativa do Tio. Respeita aquele silencio cheio de. . .(“Que e isso? Musica? Vem do Tio? Ou eu ESCUTEI, e a radia-

gao cosmica esta se fazendo sentir em mim? Que sensagao maravi-

lhosa e esta? Meu Deus! Que felicidade!”)Passa-se algum tempo e Victor volte. A sua frente, Logus parece

ainda abstraido; os olhos fixos, desfocado do mundo, e oferecendo a

 paz de infinite mansidao; nos labios, um leve sorriso, como a abrir passagem para o fluxo de etema e doce felicidade. E aquela felici-

dade se derrama no mundo e vai tanger o coragao sensivel do jovem.

E ele se comove. Desvia o olhar, os olhos umidos. Fica assim por

algum tempo, no gozo daquela estranha e felicitante situagao. De-

 pois, enxuga os olhos e ve, em cima da mesa, os papeis datilografa-dos que antes haviam despertado sua curiosidade. Pensa em apa-

nha-los e ler; mas hesita. Percebe um movimento a sua frente. Olha:

Logus que suspira e volta.“Tio, que sao aqueles papeis?”

“Um livro.”“Nao sabia que voce estava escrevendo um livro. . .”

“Nao escrevi.  Foi escrito. Quer ler?”

“Quero. Mas voce nao vai publicar?”“Agora, vou viajar. Enquanto isso, leia o manuscrito.”

“Qual e o tema do seu livro?”

“ A vida. Existe outro?”“ Entao sao reflexoes suas.”“Sim. E memorias. Recordagoes maravilhosas de fatos importan-

tes desta minha longa aprendizagem, que ja esta produzindo os pri-

meiros resultados consideraveis. Sao os resultados que trazem as re

cordagoes. Entao eu tomo consciencia das ligoes antes aprendidas.Curioso, nao? Mas e assim a Escola da Vida. Primeiro voce aprende;depois toma consciencia do que aprendeu. Quando voce puder estar

sempre consciente, entao, pouco lhe restara a aprender. Voce estara

menos tonto no carrossel. Ira se enchendo de luz e amor e, um dia,tera de explodir, em luz e amor. Se voce gostar de fatos e for um

homem de agao, fara alguma coisa no mundo. Voce agira; e o mun

do ficara um pouco melhor, porque as pessoas ficarao menos tontas

no carrossel. Mas, se voce nao for um homem de agao, entao, tera defalar, ou escrever um livro.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 71/411

“Voce tera de fazer alguma coisa: agir, falar, ou escrever um li-

vro, por exemplo. Nao o podera evitar. Vira a explosao e voce tera

de fazer alguma coisa. Naturalmente, sem impor. Impor? Impossfvel!

Amar e impor? Impossfvel! Dar;  s6. Oferecer; s<5.

“Voce quer? Leve o manuscrito e leia. Nao quer? Entao deixe af.

Oferego a outro. Se levar e ler, aceite ou rejeite; como a sua nature

za decidir. E nao se preocupe em se justificar comigo. Sou e deixo

voce ser. Nao conhego maior justiga, nem mais amorosa lei:  ser e 

deixar ser; viver e deixar viver.

“Tentei ler no Livro da Vida e, depois, escrever um livro para os

homens. Nao sou homem de agao. Por isso escrevi um livro para os

homens: para os meus semelhantes, que estou aprendendo a amar.Escrevi um livro sobre o que j i  aprendi do Livro da Vida. Aprendi

que 6  muito mais importante e fecundo aprender do Livro da Vida,

do que dos livros dos homens. Por isso quis escrever um livro que

fosse um ptegio; um nobre plSgio, do Livro da Vida.

“E sabe onde e que voce pode ler do Livro da Vida? No seu co

ragao e no coragao dos seus semelhantes; dos homens, seus irmaos.

At6 nao sentir diferenga. Entao voce ter& aprendido a amar. At6   o

canossel, voce amard; porque ja nao estar£ tonto. Ter£ transcendido

o carrossel, mas ver£ que, todo o tempo, estava ali mesmo: no car*

rossel! Voce nao via, mas estava ali; ali mesmo: no carrossel! Tudo!

 No Grande Vazio, que est£ pleno de tudo.

“Sim, 6  no coragao que voce pode ler as paginas imensas do Li

vro da Vida. E quanto mais ler mais as palavras irao desaparecendo,

ate ficar uma s6: AMOR. Houve um que veio e disse: ESTA E A

LEI; NAO EXISTE OUTRA. E ele sabia, era autoridade.”Uma breve pausa, e Logus continua:

“Bem, vou deixar voce ir. Sou um tagarela. Desculpe se o prcndi.

J6 pegou o meu ros&io? Entao

“Rosfirio?!”

L<5gus, sorrindo:

“Sim. Esse livro af. Nao 6  um livro. E um rosario. As contas sao

diferentes; diferentes cores, diferentes tamanhos, diferentes formas.Mas por elas passa o mesmo fio. Sabe o que 6, esse fio de ouro? A

minha vida! Voce quer? Leve! E a minha vida, esse rosario. Voce

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 72/411

quer? Leve! E a minha vida e lhe dou. Que mais posso lhe dar? Nao

tenho mais do que isso, e lhe dou tudo o que tenho.“Coma! Beba! E a minha vida. Voce come, bebe, e vive. Pois

 bem: coma a minha vida; beba a minha vida. Houve um que veio e

disse isso. Eu acreditei. E comi e bebi e estou comegando a VIVER.A digestao foi lenta e dolorosa; mas, afinal, veio a assimila^ao, fez-

se o metabolismo alqutmico, no coragao, e eu comecei a VIVER.“Entao pegue o meu ros&io e coma; pegue o meu rosdrio e beba.

Coma, beba, e VTVA!”O jovem, entre confuso, comovido e encantado, mal consegue

soltar um desajeitado, “Boa viagem, Tio” . E Logus, com ar de riso.

“Pra voce tamb&n!”

Enquanto o jovem se afasta, L<5gus fica olhando para ele, da ja-nela. Brilho especial nos olhos, pensa:

(“V£, meu querido iimao, com o meu rosario. Estarei com voce.

Quando voce estiver comendo e bebendo do meu rosario estarei com

voce; nas asas do Espirito do Espa§o; sutil, invisivel; suave fragran-

cia, que voce vai sentir no coragao; o cora§ao e olfativo e nele voce

vai sentir a minha presenga; sutil. . . invisivel. . . suave fragran-

cia. .

N 6 s ? N o E s p a g o , d o E s p f r i t o c o r a g a o c d s m ic o

q u e t u d o p o d e s e n t i r ,

n o a m a g o d a s o m b r a q u a s e - L u z s e n l i m o s

o A m o r u n i v e r s a l q u e s e p r o j e t a

e a o u t r a s om b r a v a i e n v o l v e r

c o m o s u a v e m a s f o r t e m a n t o p r o t e t o r . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 73/411

LENHA NA FOGUEIRA

Algumas pancadinhas no travesseiro encostado k   cabeceira da

cama, e Victor nele ajeita as costas, disposto a comegar a ler o manuscrito do seu tao querido “tio”.

N o e s p a g o , d o E s p f r i t o m S g i c a p r e s e n g a ,

n o q u a r t o e n t r a m o s j u s t o n e s s e m o m e n t o

e m q u e n o s s a j o v e m s o m b r a s e p r e p a r a p a r a l e r . . .

Rosario. . . o ros£rio do Tio. . .** —pensa o jovem, leve soniso

desenhando em sua boca uma silente expressao do seu afeto por L6- gus.

“Excentrico, o Tio. . . um querido excentrico. Diferente no modo

de pensar. Nunca vi ninguem mais pensar assim como ele. Pensar?

Se ele estivesse aqui, perguntaria, com aquele jeito dele:

“ Pensar? Que 6 pensar? N3o penso; deixoque sejapensadoem mim.

Assimmeasseguroden§oestar,paraqueaverdadeesteja,nopensamento

quen§o6meu.N§oestou;entSoaverdadeestS,nopensamentoquen3o6meu. Eu?Ficode lado;apenas atento,registrandoopensamentoquen5o6

meu. De quem 6 esse pensamento que se processa emmimmas n3o 6meu?”

E ele deixaria a pergunta no ar. Ou entao perguntaria de novo:

"Que 6pensar?Juntarpalavras?Ent3o,querodesaprender.Fuilevadoa

aprender o equfvoco dos homens. Agora, quero desaprender. FScil? Nao;

muitodiffcil. Simples; mas muitodiffcil. estou conseguindoalgumacoisa.Pouco;mas quemuito§essepouco! vouconseguindosubstituirapala-

vrapelopensamentopuro,que6sentimentodireto. Pouco;mas\Avoucon

seguindoalgumacoisa.Sabeoque6queeusou?UmAprendizdeFeiticei-ro..

 Novo soniso, e o pensamento de Victor prossegue, espontaneo:

“Um Aprendiz de Feiticeiro. . . Um achado, aquele Tio! Se nao

fosse ele. . . acho que eu estaria vivendo mal neste mundo. As vezesacho que sou um pouco como ele: tambcm nao consigo me encaixar

nisso que ele chama de equfvoco dos homem; nesse modo de pensar

que tentam me incutir, em casa, na escola e na sociedade em geral.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 74/411

Dizem: 6  o certo; €  norma); todo mundo deve pensar assim. Mas, la

dentro de mim mesmo, sinto: 6   normal, sim; mas, sera certo? Ou,como disse uma vez o Tio:

“ 1= normal,m as.. . que6normal? Eque6natural?Quemsouberoque6

normaleoque 6natural,perguntarfioque6primeiroenSocairfinoequfvo-

codoshomens."

“E. . . um achado, aquele Tio! Um oasis, aquele Tio 6! E os es-

critos dele. . . o “rosario”, como os chamou? Devem ser uma parada

“indigesta” !. . . Talvez nao. Ontem, quando telefonei para uma Ul

tima paJavra de despedida, ele me disse que nao.” E o jovem relem-

 bra as palavras de Logus:

"Diffcil?NSo.Se voc&estSesperandoexageradasofisticagSointelectual,

vai sedesapontar.Pelomenoscomalgunsescrltos.Sabe?Eunemestava

pensandoemescreverumlivro.Nemtinhaumpiano!Porisso6umamix6r*

dia,esse meu rosSrio. Umamix6rdiade contas. Resolvi registraralgumas

reflexSes. Assim comegou. E saf escrevendo reflex6es. Umamixdrdia de

estilos; e sempiano.Mas nSose preocupecom isso. SSo idSias, que lhe

ofere^o como lenha para a sua fogueira. Nemmesmo sepreocupeem re-tfe-las.Isso.NSoseocupeemficar informadodoqueeuescrevi.1= lenhaque

lhedou.ParaquevocSquerlenha?EsperoquenSosejaumcolecionadorde

lenha. Atire S fogueira! E deixe queimar. EntSo,voch  terSos produtosda

transfo/mapSoda tenha: Iu2 ecalor- discernimentoe vida.Energiaparaos 

seusprocessosmentaise,nao,fichasparaumarquivomorto.

Entender?NSovaiserdiffcil.Pelomenosnocomepo,estStudoexplfcito;

convencionalmesmo.Paravocfi.Aceitar?Rejeitar?JSdisse: isso6proble

maseu.NSomeu; seu.QuemdeverSaceitarou rejeitar?Voc6.EntSo6pro

blemaseu; nSopossonemquerointerferir.Portanto,lembre-se:idSias; lenhaparaasuafogueira;isso6oqueinteressa."

“E. . . uma coisa a gente tem que dizer em favor do Tio; respeita

a autodeterminagao das pessoas.

“ Bern, vamos a primeira reflexao:

O Futuro Pretdrito? Como pode o futuro ser preterito? Ja come-?ou a encuca^ao.. . ”

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 75/411

M 3 g i c a k s i n a n o s s a p r e s e n t s n o E s p f r i t o .

P o r i s s o o p a s s a d o d o p e n s a m e n t o d a s o m b r a q u a s e - l u zl e s t e m u n h a m o s a g o r a ,

n o p r e s e n t e q u e 6 n o s s a e t e r n i d a d e . . .

Ajeito o corpo nas almofadas amimadas sobre o tapete da sala,

disposto a escrever. A minha frente, o anturio vermelho, contrastan-

do fortemente com a parede azul clara. Por algum tempo, a contem-

 plagao da flor. Depois, a mente vazia de consciencia. A harmoniza-

gao com a natureza e a mensagem de misterios mil, muda e podero-samente eloqiiente.

Um suspiro.. . volto,

Ponho o bloco no colo. Por alguns instantes, permane^o passivo;

a mente em branco, assim como o papel no colo. O anturio, a parede

azul, o fio do televisor passando por tras do vaso. Novamente o va

zio mental. Finalmente, num lampejo, a primeira ideia. Formulo a

frase: “O homem i  o unico ser da Terra capaz de estudar a si mes

mo, de investigar sua propria natureza, em busca do autoconheci-mento”.

Mas. . . “esqueci a caneta; tenho de ir busci-la no gabinete” . Le-

vanto e sigo para o gabinete de estudos. No trajeto, a mente assalta-

da por outras preocupa§oes. No gabinete: “U6! que foi que eu vim

 buscar? Deixe ver” . , . O desligamento da consciencia da exteriori-

dade, a mente vazia, passiva. De repente, a sensatjao clara, como luz

subita num quarto escuro: “Ah! A caneta”.

 No trajeto de volta para a sala, o pensamento de que estivera ob-

servando minha pr<5pria mente: “Que coisa maravilhosa e admira-

v e l. . . o ser consciente da consciencia” !

 Novamente o anturio, a parede azul e o fio por tras do vaso. O

 papel era branco: “Como era mesmo a primeira frase” ?

O homem £ o unico ser da Terra capaz de estudar a si mesmo, de 

investigar sua prdpria natureza, em busca do autoconhecimento.

Existimos. Existimos e somos. Aqui estamos, nesse plane ta, comoseres capazes, nao s6 de autoconsciencia, mas, tamb&n de autoco

nhecimento.  O fato mesmo de existirmos como seres desta especie

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 76/411

acaireta questoes fundamentals, cujas respostas interessa-nos tentar

encontrar. E a compulsao natural do ser que 6  capaz de estar cons-ciente de sua pr6pria consciencia.

 Numa primeira grande classificagao, essas questoes dizem res-

 peito ao que  e ao como  de nossa natureza. Isto e, cumpre-nos perguntar: “que somos?” e “como somos?” .

Atraves dos esforgos e sucessos das ciencias naturais,  j i  dispo-

mos de um vasto e minucioso conhecimento de COMO somos, de

COMO e a nossa natureza em seu aspecto ffsico. S i conhecemos,

tamb6m, algo sobre a nossa natureza mental (COMO funciona nossa

mente), ainda que, lamentavelmente, muito pouco. Pelo menos,  j i  

dispomos de dteis e eficazes modelos a esse respeito.Por enquanto, port an to, resta-nos o consolo de sabermos que j i  

acumulamos e estamos utilizando um avangado conhecimento de

COMO somos, fisicamente.

Extremamente lament&vel, por6m, o fato de que nos encontramos

em estado primario, ou mesmo primitivo, no que tange a um consen-

so universal quanto ao que  somos. Ora, vivemos conforme aquilo

que sentimos ou pensamos que somos. Mas a natureza nao tem com-

 promisso algum com o nosso sentimento de sua realidade. A verdadeda natureza, quanto ao nosso ser, E O QUE E. Nosso equivoco a

seu respeito em nada poderS modifica-la. Importa-nos, poitanto,

descobrir aquela verdade, acima de tudo, porque a natureza nao se

comoverd com o sofrimento decorrente do nosso equfvoco.

Ora, muitos de n<5s (a maioria esmagadora) estamos vivendo como

se soutessemos, com absoluta certeza e exaddao, O QUE somos; eisque nao fazemos do nosso ser e da vida o nosso mais important,

objeto de estudo. Como se reaimente soubdssemos, nao no&questio-

namos. Vivemos como se fossem os o  corpo e devessemos apenas

usar  a mente - esta, fungao daquele. M as.. . e se for o contr&io? Se

 form os a mente e devermos apenas usar o corpo —este, instrumento

daquela? Quanto tempo perdido! E que terrfvel ligao de humildade,

quando nos apercebermos, no fiituro, de que estivemos velando a

verdade da vida e do nosso ser com a nossa “verdade” cientffica!

Se somos a mente, entao nao nos conhecemos.  Homem, conhe- ce-te a ti mesmo! E o homem nao se conheceu, por muito tempo - e

ainda nao se conhece! - porque teimou em nao dirigir sua luz para o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 77/411

amago do seu prdprio ser.  L i fora, aparentemente, um mundo ilumi-

nado e cada vez mais conhecido. C i  dentro, um mundo em trevas,

quase totalmente desconhecido! (Dentro... fora...) No presente vivemos, em maioria, total e intensamente empenha-

dos no mero existir. Ou seja, aplicamos inteiramente nossa energia e

nossas funsoes ao objetivo de existir o melhor possivel, dentro das

condi^oes prdprias da conjuntura social, economica e polftica, da

regiao do planeta em que residimos. Atrav6s desse comportamento

transparece, ou a convic^ao de que ele efetivamente realiza a finali-

dade (?) da vida (o que pressupoe conhecimento do QUE somos), ou

um triste descaso, que redunda em desprezo da nossa superioridade

(?) no reino animal.Afinal, que 6  vida? Sabemos?Quanto ao futuro, muitos estamos nos dedicando a preparar-lhe

um bom passado. Isto 6, estamos fazendo do presente a oportunidade

de prepararmos um passado que gostaremos de lembrar, numa esp£-

cie de “futuro pret^rito” . Assim, quando o futuro se tomar presente,

diremos que estaremos vivendo felizes, no deleite de nossas boas re-

corda?oes. E consideraremos mesmo que se ter5 cumprido a finali-

dade da nossa vida. Dar-nos-emos tamWm por contentes pelo fatode nos termos projetado (ou ao nosso egocentrismo?) para o futuro,

em nossos descendentes. Mas, nao seremos nos mesmos projetados

 para o futuro, al£m da morte? E certo que devemos viver sempre no

 presente, empregando as li§oes do passado na preparagao do futuro.

Mas, ser5 que isso nao deverd tamb&n ser aplicado a um futuro que

ultrapasse a moite?

Afinal, que 6  morte? Sabemos?

E m6rbido pensar na morte? Pelo contrSrio: o recusarmo-nos sis-tematicamente a pensar na morte 6  que 6 m6rbido! Porque €  morbida

a pressuposigao imphcita nessa recusa. E tempo, enfim. . . que 6?

Passado, presente, futuro. Fluxo de alguma coisa? A realidade in-

trinseca da natureza tem histdria?Lembremo-nos sempre de que a natureza nao tem compromisso 

algum com as nossas idiias a seu respeito, nem se comove com os

nossos sentimentos. Nem nos ajudar& a resolver os problemas que

n6s mesmos criemos. Ela nao os tem nem tera; simplesmente E, con-

forme a sua verdade. Convic^oes cientificas e filosoficas, e cren^as

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 78/411

religiosas, ou estao em consonancia com a verdade, com a realidadeintrinseca da natureza, ou sao erroneas. Que €  primeiro? Cientista,

filosofo, religioso, ou HOMEM? A natureza tem rtftulos?

Somos o corpo e usamos a mente? Que poderd persistir? Somos amente e usamos o corpo? Que podera persistir? E coipo.. . que 6 ? E

mente. . . que €1 E a resposta? Estara no vivermos para o “futuro pretgrito” ?

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 79/411

Q u e 6 c o r p o ? Q u e 6 m e n t e ? Q u e p o d e r ^ p e r s i s t i r ?

P r o f u n d a s e f o r t e s q u e s t o e s e s t a s , q u e n o E s p a g o e m n o s s o s e r r e s s o a m ,

q u a n d o c o n t e m p l a m o s a j o v e m s o m b r a

e s u a r e a g a o t e s t e m u n h a m o s . . .

Victor descansa o papel ao seu lado, na cama, e se poe a pensar

no que acabou de ler:

“E. . . sutileza. . . pelo menos fimssima sutileza, nao senti. Sofis-

ticagao intelectual?. . . Nao. Pelo menos nao senti intengao de sofis-ticar. . . assim pelo deleite vaidoso de sofisticar. A lids, nao estou

mesmo interessado em sutileza e sofisticagao intelectual. Portanto,

desapontado nao estou. M as. . . surpreso, sim! Nao pensei que o Tio

escrevesse com qualquer preocupagao. . . literaria. . . de estilo. Es-

 perava uma coisa assim. . . como uma sala com paredes caiadas e

mdveis bem toscos; s6 o essencial, sem decoragao. Naquele jeito

dele de dizer as coisas: conciso, forte, com impacto, com alguma

sutileza, original no jogo das ideias, mas sem intengao de sofisticarnem de fazer arte literaria. Em vez disso. . . como ele mesmo disse,

6 at£ convencional. Bem, arido nao 6,  ja que ele se preocupou em

fazer alguma decoragao estilfstica —“ se preocupou” . . . o T io?.. .

“Decoragao? Sera s6  decoragao? Senti qualquer co isa.. . uma es~

 pdcie de  sugestao,  em algumas frases aparentemente superfluas.

Deixe ver.”

Levan ta o papel e passa a ler, comentando mentalmente, alguns

trechos do manuscrito.

Aqui, por exemplo:

"Por algum tempo, a contemplagSo da flor. Depois, a mente vazia de

consciSncia. A harmonizagSocom anatureza e amensagemde mist rtos

mil,mudaepoderosamenteetoquente.

“Umsuspiro...volto."

Aqui tem coisa. Nao 6 so decoragao. Contemplagao da flor. . . 

mente vazia de consciencia. . . mensagem de misterios. . .  e essa

de, um suspiro.  . . volto. Aqui tem coisa.. .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 80/411

E depois, aqui adiante:

. . . numlampejo,aprimeiraid£ia.Formuloafrase.. .

Aqui tambem tem coisa; nessa jogada entre IDE1A e FRASE.

Id6ia: o pensamento puro, o sentimento direto, a que o Tio sempre

se refere. Frase: expressao precaria daquele pensamento puro, em

 palavras. E isso! Bem que ele disse que eu nao lesse como quem le

um romance. Comer. Beber. Nao ler; comer e beber! Aqui tem coisa,

sim.

E as questoes que ele coloca, entao?

"Que6vida?Sabemos?

Que6morte?Sabemos?£m6rbidopensarnamorte?

Etempo.. . que6?Fluxodealgumacoisa?

Ecorpo...que6?Emente...que6?"

 Futuro Prettrito.  Como pode o futuro ser preterito? Perguntei

antes. Agora sei que pode. Porque i  a mente humana que decide. E

muita gente est£ de fato decidindo assim, na base do “futuro preterito” . E quase sempre. A todo instante estd viva no presente mas

 pensando no passado. E quando chega a velhice, vive como quem

esta no comego do fim: olhando pra trds, com nostalgia. A todo

instante, pensa:  passou;  mas foi bom enquanto durou; e fica lem-

 brando o que foi bom. Foi: pret6rito perfeito; 6.  . . um perfeito prete

rito, no futuro dessa gente.

E fago como o Tio: Fim? Que e fim? Uma coisa existe, existe,

existe. . . agora deixa de existir: fim. Que 6  fim? Passagem da exis-

tencia para a nao-existencia? Nao-existencia 6  nada, e nada €  absur

do.

Depois. . . como pode aquela gente ter certeza de que €   o fim?

Sim, porque vive e procede como quem tem certeza. Mas como pode 

ter certeza? Pode ter certeza, e tem, de que est£ vivendo esta vida.

Mas, que silogismo furado €  esse, que salta para a conclusao de que

esta vida 6  unica? “Estou vivendo es*a vida; logo, s<5 existe esta vida, s<5 vivo esta vida” . Est£ furado esse silogismo; nao 6   um silo

gismo. E o buraco esta cheio de misterios e perguntas importantes;

 principalmente a grande pergunta do Tio: QUE SOMOS?. . . Con-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 81/411

senso? Pois sim! Vai demorar. , . E o grilo 6  que a natureza nao ti

nem a t . . Como diz o Tio:

"AnaturezanSotemcompromissoalgumcomonossosentimentodesua

realidade. . .n§ose comoverficomosofrimentodecorrentedonossoequf-voco.”

E. . . aqui tem coisa. E melhor eu ler esse negdcio com calma...

numa de ruminar. . . isso: ruminar. Ou como disse o Tio: LENHA

 NA FOGUEIRA! E isso ai. E que lenha! Se eu nao esquentar com

essa . . . Que 4 vida? Que 4 morte? Que somos? Que 4 tempo?

Tempo. . . e espa$o. J3 li um artigo sobre esse tema, que me deu

aquela encucada! Fazia ver que ambos sao, afinal, fendmenos de consciencia.  Nao realidades absolutas do cosmo; relatividades nos

sas. No fim, deixava a questao no ar. E nao i  facil mesmo chegar a

uma conclusao a esse respeito!

 Nossa! Uma hora! E tenho de acordar &s seis! Nao d£ p6, ler os

escritos do Tio na hora de dorm ir.. .

E Victor se prepara para dormir. Primeiro, a perfeita relaxagao,

na posiqao de morto que aprendera num livro sobre Ioga; com a res-

 pira^ao controlada e a mente percorrendo o corpo todo. Depois, ele

se vira para o lado e afunda a cabe^a no travesseiro e a consciencia

no estado misterioso de sono sem sonho; verdadeiro e tnigico mer-

gulho no buraco do silogismo.

E enquanto ele dorm e.. . o presente? .. . tomando-se passado?.. .

 passando para o futuro?.. .

P a s s a d o ? P r e s e n t e ? F u t u r o ?

N a o p a r a n t f s , q u e s 6 p r e s e n t e t e m o s ,

n a V i d a d o E s p f r i t o

q u e n o E s p a g o t u d o s e fe z , fa z e f a r l . . £ !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 82/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 83/411

O CO CHILO DO GUARDA DO PENDULO

A campainha do telefone soa a uns dois metros de distancia, mas

Victor a sente como uma perturbagao vibratoria no amago do seu proprio ser. Seu corpo estremece. Assim abruptamente arrebatado de

seu estado de meditagao, ele demora alguns segundos para reagir.

Depois, encaminha-se para o telefone. Pensa: “Curioso, aquela

campainha estava em mim’'. . .

N o E s p a g o , t a m b l m n d s s e n t im o s a v ib r a g a o d a c a m p a i n h a ,

e m n < 5 s m e s m o s , q u e e m t u d o e s t a m o s ,

n o E s p f r i t o q u e t u d o s e f a z .E l a m b f i m e s t a m o s n a v o z d a j o v e m s o m b r a ,

q u e n o s s a p e r c e p g a o a f i n a l a t r a i . . .

“ A l o”

“Oi! Tudo bom?”

“Ah, e voce.. ”

“Como e? Vamos bater uma bolinha? E no campo da Associa-

gao.”

“Hum... nao! Hoje nao quero. Vou ler.”

“Ue. . . qual e a tua, cara? Voce anda esquisito! Vai que aquele

“tio” ta te deixando pirado!.. . Como e? Vem ou nao vem?”

“ Nao. Hoje nao quero. Nao vou.”

“Mas t i  um dia joia! E o jogo vai ser quente; a turma 6  da pesada

e precisamos de um goleiro seguro. Larga essa de ler e vem com a

gente. Ou s6   porque ja 6  engenheiro nao quer mais jogar bola? A

Faculdade ja passou, mas ainda somos jovens. Vamos aproveitar!Pra isso temos a Associagao.”

“Nao. Hoje nao da. Se fosse, nao estaria mesmo com a mente no

campo. Acabaria prejudicando o time.”

“Hum. . . se fosse, nao estaria mesmo com a mente no campo.  . .

Qual 67  Sabe o que voce e? Um chato! Vamos la, cara!”

“Nao. Desculpe, mas. . . hoje nao vou. Preciso realmente ler e

 pensar.”

“Ler e pensar.. . voce ta 6  chato mesmo! Bom.. . entao tchau!”“Tchau.”

O jovem afasta-se do telefone, pensando:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 84/411

“Por que as pessoas insistent tanto em que os outros fagam o que

nao querem fazer? Amizade? Egoismo? Ora um caso ora o outro?

Qual serf o maior egoista? O que nao faz o que os outros querem?

Ou o que insiste em que os outros fagam o que nao querem fazer?

Dificil decidir. Talvez. . . talvez o segundo, porque esta sempre to-

mando iniciativas egocentricas, desrespeitando os desejos dos ou

tros. Mesmo quando motivado por amizade, desejando sinceramente

que os outros tenham prazer, ou desejando sua companhia, talvez

esteja sendo egocentrico; talvez esteja falhando em se colocar, real-

mente, no lugar dos outros; talvez esteja projetando seu ego para os

outros e esperando que eles pensem e ajam como ele pnSprio. A

amizade pode ser sincera, mas o egocentrismo (sutil, inconsciente) 6  concomitante e forte. Se nao houvesse o egocentrismo, a amizade

o levaria a sentir-se feliz em que os outros fizessem o que realmente

quisessem fazer.

“Convidar? Sim. Insistir a ponto de constranger? Nunca! Um

convite? Amizade. Insistencia constrangedora? Egofsmo. Amizade?

Entao respeito a preirogativa dos outros de ser e viver a sua manei-

ra.”

Uma pausa. O jovem abre uma gaveta da escrivaninha e dela reti-ra a pasta com o “rosSrio” do “tio”. Depois o pensamento prosse-

gue, espontaneo e aprofundando-se:

“Preirogativa de ser e viver. . . Lembra o Tio:  Nao conhego 

maior justiga, nem mais amorosa lei: SER E DEIXAR SER; VIVER 

 E DEIXAR VIVER.  Verdadeiro lema a ser praticado por todos os

que de fato desejam um mundo em paz. Como poderia haver guer-

ras? Ou simples desavengas? RESPEITO! Eis a chave! Se puddsse-

mos todos. . . sonho; somos primitivos e vivemos ainda sob o domf-

nio do ego.

“E. . . a gente roda, roda, e cai sempre nesta mesma causa maior

dos problemas humanos: o EGO! E o curioso e estupido da situagao

6 que esse ego nao existe! Isto 6, nao 6  uma coisa, uma substantia,

ou um ente. E mero fen6meno de consciencia, sensagao psicol6gica

de individualidade. E pensar que nisso que nao existe, que 6  impres-

sao psicoldgica, criamos nos mesmos o monstro que nos devora!..Um suspiro... Nova pausa. Depois:

“Engragado, se eu falasse assim aos meus amigos, manifestando

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 85/411

essa circunspecgao, nessa linguagem seria, expressando esses pen-

samentos. . . talvez sutis, talvez profundos. . . pelo menos graves,

eles ceitamente me estranhariam. No entanto, isso refletiria a minha

verdadeira personalidade, a minha verdade!

“Por amizade, tolerancia, timidez, conveniencia, fraqueza, e

mesmo compaixao, raramente sou autentico. Quando sozinho, sinto

claramente minha verdadeira natureza interior e percebo que ela e

diferente da que manifesto diante das pessoas. Diante de uma outra

 pessoa (principalmente se conhecida, amiga ou parente.. . ou sera o

contrario?), parece que tudo em mim se artificializa; tomo-me inca-

 paz de autenticidade. Sinto perfeitamente o contraste entre o que

manifesto e o que realmente sou, seja qual for o motivo.“Bem. . . ha um consolo: na medida em que issoreflete meu res-

 peito pelos sentimentos alheios, e bom. Por outro lado, sinto que

VERDADE e VIDA sao conceitos indissociaveis. Como diz o Tio:

O que 4 verdadeiro existe; sobre isso podemos construir. O que nao 

4 verdadeiro, nao existe; 4 inutil.  Entao, deveriamos ser todos au-

tenticos, sempre. A verdade deveria ser o crit6rio supremo, absoluto,

decisivo, do pensamento e do comportamento do homem. Como na

crianga. Enquanto nao vos fizerdes como criancinhas.  . .

“Verdade. . . existencia. . . naturalidade. . . autenticidade. . . vi

da! Fora disto, inexistencia. . . artificialidade. . . hipocrisia.. . mor-

te! Nenhuma conotagao etica ou moral; pura e perfeita logica: se

verdadeiro, existe e 6  vida; se nao-verdadeiro, nao existe e 6  morte.

“ Serd que foi por isso que Jesus chamou de mortas pessoas bio-

logicamente vivas? Porque  sabia,  com sua visao ou seu discemi-

mento superior de autoridade, que a realidade que aquelas pessoasviviam e que tinham como verdadeira era falsa? Deixa aos mortos o 

 sepultar os seus prdprios mortos!

“Sempre esses paradoxos. Como no papo aparentemente pirado

do Tio. O Tio. . . Serd que ele ja alcangou algo daquele discemi-

mento superior? Que ve 16gica perfeita onde os outros s6 enxergam

incoerencias? Parece que ele estd completamente a vontade para er-

guer o v6u de aparente incoerencia, dos tais paradoxos, e contemplarsua cristalina logica.

“AMs, uma vez ele me disse algo sobre esse problema da auten-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 86/411

ticidade, quando eu propus a ideia da autenticidade absoluta. Seri

que eu consigo me lembrar daquele dialogo?”

O jovem relaxa, fixa os olhos numa manchinha na parede, e co-

me$a a evocar o sentimento da presen§a de L6gus (nao a pensar nele; a estimular, em seu amago, o  sentimento  de sua presen^a). A

manchinha desaparece; os olhos continuam fixos mas desfocados.

Victor perde a consciencia de si mesmo e do mundo. Em sua mente,

so a consciencia da presenga e da voz de Logus no dialogo que re-

lembra:

"Emnome da verdade, a autenticidade  deve sero criterioabsolutedo 

pensamentoedocomportamentodohomem, dizvoc§.“Verdade. . . critSrio absoluto. . . homem.Ohomem§absoluto?Voce 6

absoluto? O homem 6 uma relatividade, levando uma vida relativa, num

mundoderelatividades.VOCE6umarelatividade,levandoumavidarelativa,

nummundoderelatividades.

“Verdade. . . critSrio absoluto. . . pensamento e comportamento do ho

mem.Dohomem!Ohomempensa: isso6averdade.Ent§onao§averdade

absoluta; porqueohomempensou.Opensamentohumanoreflete,necessa-

riamente, inevitavelmente, a relatividadedo homem.Podeohomempensar

demodo absoluto? Podevoce  pensardemodo absoluto?Sem nogoesou

premissas de tempo e espago, de concreto e abstrato, de bom e mau?

Quando voc§pensa,seupensamento6fendmenorelativo; NAOPODEser

absoluto. Voc§ pensa; voc66 relativo;ent§o, oque voc§pensa6 relativo.

Quando voc§ (homem) pensa, h£ necessariamente rea?ao e relatividade.

Voc§estabelece um crit6rto?Ent§o§relativo.Voc§poderSconsider£-loab

soluto, sequiser.Mas6certoqueterSsurpresasquandoagirsegundooseu

crit6rioabsoluto.Umdiavaisentirnecessidadede introduziroutroscritSrios

noseuesquemadepensamentoecomportamento.“Porisso, quandoeu penso, nSomovimentoecombinoidSiassimplesna

minhamente; revolvoearrumocole?6esdemoedas.Quandofato,naoemito

palavras: atiromoedas paraoar.E quandoescrevo, naoestouapenasde-

senhando palavras: estou cunhando moedas. Voc§ jetobservoumoedas?

Sempret§mduasfaces.VocS viuumamoedacomumas6face?

"Lembre-se sempredisso:quandocaptaromeu pensamento,olheaou

tra face dasmoedasqueeu tiverpensado; quando eu lhe falar, pegue as

moedasqueeutiveratiradoparaoareasarrumeemcimadeumachapade

vidroe,depots, olheporbaixo;equandoleralgumacoisaqueeutenhaes-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 87/411

critovireasminhasmoedaseleiadenovo.SenSofizerassim,voc§s6verS

uma face dasmoedas,e somentequando viras duas faces terS visto as

moedasverdadeiras - ecompletas."

“ Entaon§o6corretaminhaI6gicasobreaautenticidade?"

“Ldgica?Que 6 I6gica?Quem souberoque 6 I6gican§oacolocarSno

trono. N§o6 a rainha; 6 uma princesa, quemuitos homens, porequfvoco,

colocamnotrono.”

“EntaonaodevoserautSntico?"

L6gus sorri,apertaum poucoos olhos fixos numpontoqualquere,ap6s

algunssegundosdesil§ncio,diz:

“Op&ndulo.Sempreopdndulo..“OpSndulo?Quep§ndulo?"

“Vocesabeoque6  um pfendulo.Entaosabequeagenteosoltadeuma

posigSoextremaeelesemoveparaooutroextremo.Isso6natural.Assim6

o pensamento dohomem,geralmente:um p£nduloqueeleestSsempreim-

pulsbnandodeumextremoparaooutro.

“Voc§ disse: a autenticidade deve ser o critdrio absolutodo comporta-

mentohumano.Euofizverarelatividadedohomemeofatodequeelen§o

deve ter crit6rios absolutos (porque n§o correspondem h  sua realidade).

Entao voc§ soltou o pfendulo: “Ent§o naodevoser autfentico"? Ponhaum

guardajuntoaoseu pSndulo. E diga-lhe: “Olhe,quandoeusoltaresse p§n-

dulodeum extremo, segure-onomeiodopercurso; naoodeixe passardo

meio. Euvou levarumsolavanco.N§ose preocupe. E issomesmoquede

veacontecer.Assimvousentirqueestavaprestesasaltarparaooutroex

treme".

“Sabeoque6esse guarda?ConsciSncia.N§omerefiroadiscemimento

moral, sensodoque6certo edoque6errado.Falodeumestadodealerta,

de ATENCAO. VocS ter£ de estar sempre consciente dos seus pr6prios

processosmentais;afenfoaoqueestiversepassandoemsuamente.

"Disse que vocSpusesseumguardajuntoaop§ndulo?Errado.VocSter5

deser esseguarda:OGUARDADOPENDULO.Essemovimentopendular

de um extremo para ooutro, nospensamentos, sentimentos eatoshuma-

nos,6causafrequentedeerro.Voc6quererrarmenos?EntSotome-semais

consciente,comoguardadopSndulo.Sabeporqueoshomenserramtanto?Porque sao inconscientes. Sabe o que 6 conscifencia? Vida! Se voc§se

mantiver consciente, estarS realmente vivendo e aprenderS Iig5es funda-

mentais sobre a vida. Por exemplo, anaotercritSriosabsolutosdepensa

mento e comportamento.£ importanceseraut&ntico?Tambfem6 importante

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 88/411

serbom;ejusto;etolerante; ecompassivo;ehumilde;eamigoeirmSo.Vo-

cfe quer serabsolutamenteaut&ntico? Entao vS viver numplanetaondes6

existavocfi!”

*Ei,Tio!CuidadocomopSndulo!"Osdoisriem.Depois,admiteL6gus:

“Pois6. O guarda ia dando um cochilo. E como tem guardacochilando

nessemundo..

Victor sente-se voltar a consciencia de si e do mundo.

“E. . . especial aquele Tio. E. . . curioso. . . conhe^o-o ha muito

tempo e sempre me senti pequeno, inexperiente, infantil, inepto

mesmo, diante dele. Mas aquele nosso ultimo encontro, sinto agora,

foi como. . . como uma iniciagao;  uma transmutagao: de repente,

mudei! Como se eu tivesse cruzado um portal magico: entrei um e

saf outro. Morte e ressurreigao. E isso, iniciagao: um portal m£gico;

e a vida est£ cheia deles. A gente entra um e sai outro.

Que mudou em mim? O corpo? O cerebro? Nao. CONSCIEN

CIA. O tio tem razao: eu sou consciencia e consciencia 6  vida!

Cresci de repente? Nao. Eu ja era  grande. Subito aprendi muita

coisa? Nao. Tudo isso ja podia ser produzido na minha mente. J6

estava la. Como imensa massa d’dgua por tras de uma represa. E o

Tio abriu a comporta. Agora esta fluindo e 6  bom. Sao as aguas da

vida, as que o Tio liberou em mim!

E. . . um abridor de comportas, aquele Tio. Muito especial. E

surpreendente. Esta sempre surpreendendo a gente. Quando se pensa

que ele cristalizou um assunto, ele come§a de novo; amplia, desvia,

ou at£ contradiz tudo. E quando a gente se queixa de confusao ou

franze a testa, ele diz:

“ Desorientado? Otimo. O que 6 que voc§ pensa que eu quero fazer?

OrientS-b? Er issoque voc§quer?Querserorientado?EntSobateunaporta

errada.HSmuitotempovoc§ vemsendoorientado.EafestSvoc§:perplexo

e rfgido. Que orientagao6  essa, que enrijece econfunde,quesolidifica?£ 

issoquevoc€querser?Ums6lido?Sabeoqueessaorientagaoestfifazen*

do devoc§? Um cristal: sfilido, rfgido. Beta? Depende dequem o aprecie.

Masrfgido.

"Porquevoc§ vemaqui?Paraser lapidado?Naovenha.Naosouumla-pidador; n§oquero lapidS-lo.Sabe oqueeu sou?FOGO! NSo posso lapi-

dS-lo;s6possofundi-lo.Sevoc§continuaraviraqui,euvoufundi-lo.Afvocd

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 89/411

vai ficarIfquido.J6observouum Ifquido?N§o6rfgido;nSotemformapr6pria;

flui; eadquire a formado recipienteque ocont6m. Isso6belonumIfquido:

eleflui.Afluidez6beta.

“H3muitovoc§vemsendoorientado,eestSconfuso.Agoravaiterdesedesorientar; vai ter de fundir. Depois da desorientagSo, vai fluir enaovai

mais ficarconfuso. Sabeo que voc£ vai terdese tornar?Umafonte;uma

fonteviva,deAguaspereneseIfmpidas,FLUIR!Fluir6beloe b vida!

“Portanto, n§oprocureffirmulas.Principalmenteseapenasracionais.Vo-

ch  pensaque vida6 raz§o? E emogSo?£ emogSo a vida?Que 6 raz§o?

Que6emo£§o?Eque& primeiro?VIDA6primeiro.EquandovocSconhecer

oque 6primeiro, vaiarrancaros r6tulos.EnSovaipregaroutros.Consci&n-

cia?Nemesse.Talvezfossebom,masestStodomanchado.Sabeoque6razao?E emog§o? SSomanchas.Arranqueos r6tulosen&oponhaoutros.

Vocfivaiterdefluirevivenciar,conhecerporexperiSnciadireta.Esequiser

pdralgumr6tulo, vaiterdeinventaroutralinguagem;adaspalavrasn§oser

ve. Nem raz§onememo?5o?Entaooqufi?N5otemnome.Naopodeter.E

causaprimeira esemnome.Quandovocfiaconhecervai rirechorar.De

pois,nemvairirnemchorar;vaiVIVER,verdadeiramentees6.

“Agora,v6,“belocristaf! Soufogoeestouesquentandodemais.Secon-

tinuar, voc& vai fundir antes do tempo. E preciso que aprendaa fluir; aos

poucos.Senaovoc§vaificaramorfo,rfgidoefeio.”

Victor continua absorto por alguns segundos, a mente em silen-

cio; depois nota a pasta com o manuscrito de L<5gus. Abre-a, tira a

reflexao seguinte &que j£  aprcciara e comega a ler.

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 90/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 91/411

D e n o v o o p a s s a d o s e f a z p r e s e n t e ,

n o E s p a g o d o E s p f r i t o , a g o r a a n t i g a s a l a d e a p a r t a m e n t o ,

q u a n d o m a i s u m a e x p e r i e n c i a e r e f l e x a od a s o m b r a q u a s e - L u z t e s t e m u n h a m o s ,

n a le i tu r a d a o u t r a s o m b r a , q u e c o n t e m p l a m o s . ..

A caixinha preta sobre a mesa. Do tamanho da minha mao. Na

sua face superior, inclinada, tres conjuntos de teclas. O primeiro, na

 parte mais alta dessa face da caixinha, compoe-se de tres grupos de

quatro teclas, numeradas de 1 a 12.

Uma rapida pressao sobre a tecla numero 4 e o piscar de uma lu-zinha vermelha na caixinha, logo acima da tecla. Quase instanta-neamente, numa caixa muito maior, situada a cerca de dois metros

da caixinha, aparece o numero 4, em luz vermelha. Durante alguns

segundos, nada mais acontece. Depois, comego a ouvir uma voz

masculina: A devastagao de nossas areas verdes e a poluigao de 

nossas aguas e da atmosfera deveriam nos assustar mais.  Estamos 

matando o planeta!

E a voz continua a propagar sua dramatica advertencia, enquantosurgem numa tela, na face posterior da caixa grande, imagens em co

res naturais. Mais eloquentes do que as palavras, as imagens mos-

tram aflitivas cenas de devastagao e poluigao. Seguem-se entrevistas

com agricultores de regioes situadas a milhares de quilometros do

meu televisor.

Penso na curiosa combinagao de eventos que testemunho. De um

lado, o homem expressando sua angustiada preocupagao com os

efeitos deleterios de sua propria atuagao insensata sobre a natureza;de outro lado, e ao mesmo tempo, o mesmo ser utilizando-se, para

expressar aquela preocupagao, de um recurso que 6  admiravel teste

munho de sua inteligencia, de sua espantosa capacidade para resol

ver problemas.

 Estamos matando o planeta! Estamos aniquilando a natureza! 

 Estamos artificializando nossa vida, com o risco de tom d-la impos- 

 sivel! Temos de voltar a vida natural, enquanto h i tempo —se jd  

nao e tarde demais!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 92/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 93/411

D e n o v o o p a s s a d o s e f a z p r e s e n t e ,

n o E s p a g o d o E s p ir it o , a g o r a a n t ig a s a la d e a p a r ta m e n t o ,q u a n d o m a i s u m a e x p e r i e n c i a e r e f l e x a o

d a s o m b r a q u a s e - L u z t e s t e m u n h a m o s ,

n a le i tu r a d a o u t ra s o m b r a , q u e c o n t e m p la m o s . . .

A caixinha preta sobre a mesa. Do tamanho da minha mao. Na

sua face superior, inclinada, tres conjuntos de teclas. O primeiro, na

 parte mais alta dessa face da caixinha, compoe-se de tres grupos de

quatro teclas, numeradas de 1 a 12.

Uma rapida pressao sobre a tecla numero 4 e o piscar de uma lu-

zinha vermelha na caixinha, logo acima da tecla. Quase instanta-neamente, numa caixa muito maior, situada a cerca de dois metros

da caixinha, aparece o numero 4, em Iuz vermelha. Durante alguns

segundos, nada mais acontece. Depois, comedo a ouvir uma voz

masculina:  A devastagao de nossas areas verdes e a poluigao de 

nossas dguas e da atmosfera deveriam nos assustar mais. Estamos matando o planeta!

E a voz continua a propagar sua dramatica advertencia, enquanto

surgem numa tela, na face posterior da caixa grande, imagens em co

res naturais. Mais eloqiientes do que as palavras. as imagens mos-

tram aflitivas cenas de devastagao e poluigao. Seguem-se entrevistas

com agricultores de regioes situadas a milhares de quildmetros do

meu televisor.Penso na curiosa combinagao de eventos que testemunho. De um

lado, o homem expressando sua angustiada preocupagao com os

efeitos deleterios de sua propria atuagao insensata sobre a natureza;

de outro lado, e ao mesmo tempo, o mesmo ser utilizando-se, para

expressar aquela preocupagao, de um recurso que e admiravel teste

munho de sua inteligencia, de sua espantosa capacidade para resol

ver problemas. Estamos matando o planeta! Estamos aniquilando a natureza! 

 Estamos artificialiiando nossa vida, com o risco de tomd-la impos- 

 sivel! Temos de voltar a vida natural, enquanto hd tempo —  se ja  

nao e tarde demais!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 94/411

Soirio. Voltar h  vida natural? Que seria necessario para restau-

rarmos a natureza, ja que isso e condigao para aquele retomo? Que

seria necessario para restabelecermos a pureza das areas verdes, das

dguas e da atmosfera deste planeta? Muitas pessoas (ecologistas enaturalistas, principalmente) teriam respostas ideais para estas per

guntas. (Ja disse; somos inteligentes.) Se nos decidfssemos a efetuar

aquela restauragao, sem duvida a conseguirfamos. Brilhantemente!

 Nosso problema, por&n, nao me parece sero de deterniinarmos como

agiremos para restaurar a natureza. Antes, temos de nos perguntar se

devemos seguir o caminho do retomo. AI6m disso, expressei acima

uma poderosa e fundamental condi?ao: “se nos decidfssemos. . Eacho que nao nos vamos decidir! E nem por isso vamos sucumbir !

Os animais sucumbem. Porque sao animais. Manifestam cons

ciencia (sao entes mentais) mas nao manifestam a faculdade de criar.

O HOMEM E CRIADOR! E sua criagao e transformagao - como

toda e qualquer criagao, porquanto o nada e um absurdo. Rigorosa-

mente, nada €   artificial. Tudo 6  natural! A natureza 6  apenas o con-

 junto das coisas naturais que nao foram introduzidas pelo homem.

 Nosso mundo artificial 6   o conjunto de expressoes, composigoes eformas que demos a coisas naturais.

 Nao precisamos temer a nossa “artificializagao” da vida. A vida €  

fato intrinsecamente independente da materia. Asseguradas as con-

digoes essenciais para sua manifestagao, respeitadas suas leis de ma-

nifestagao, podera se expressar e subsistir em mundos diversos; des-

de o nosso primitivo mundo “natural” , ao fantfstico mundo “artifi

cial” das antigas historias de Hash Gordon e das modemas ficgoessobre avangadissimas civilizagoes de outros planetas.

 Nosso mundo “natural” esta sofrendo evidente e rapido processo

de extingao. Sua restauragao, pelo menos em alguns aspectos (caso

das £reas verdes), talvez  j i   fosse fatalmente lenta; e cobraria um

 prego diffcil de pagar, eis que teriamos talvez de parar! Parar de

crescer e de progredir. Estaremos dispostos a pagar este prego? E, se

 parassemos, estanamos honrando nossa inteligencia, nossa condicao

ae criadores?

O homem €  criador. Se este fato fundamental da natureza humana

£ verdadeiro, h i de se impor a qualquer resolugao de retrocesso a

que tendamos por medo (!). E mesmo ao nosso desejo e eventual

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 95/411

empenho de progredir inteligentemente, sem ferir a natureza. E se-guiremos PARA A FRENTE! Ao inves de concentrarmos esforgos

na tentativa de restaurar completamente a natureza, talvez devamos

apenas conservi-la, sabiamente - o quanto possfvel e suficiente paranao nos determos em nossa marcha rumo a fascinante vida “artifi

cial” que j i estamos criando.

J i foi dada a largada! Ja estamos empenhados numa curiosa cor

rida em contra-corrente. Num sentido, a extingao da natureza; no

outro, nossa “artificializagao” da vida. Teremos de ser intrSpidos e

velozes para veneer esta corrida. E o seremos tao logo nos cons-

cientizemos de que ela j i comegou e talvez ja seja irreversivel.

Temos medo? Natural. O medo e emogao necessiria a desenca-dearmos nossos recursos de autodefesa. Ao mesmo tempo, €   fruto

logico de nossa ignorancia. Sofremos? Inevitavel, porque somos in-

teligentes mas ainda nao somos sabios. Vacilamos? Logico. Eis que

nao estamos entendendo o que esti ocorrendo, porque ainda nao nos

demos a coragem de revisar nossas conceptoes da vida e do nosso

 pr<5prio ser.

Ji foi dada a largada! A corrida 6   inexorivel e perdemos tempo

com a nossa nostalgia. H i beleza em nossas paisagens naturais? Ha-veri beleza de tirar o folego em nossas cidades “artificiais” , aqui na

Terra ou em algum outro minusculo ponto deste universo imenso

(infinito?)! Se sentimos falta de uma bela paisagem natural, para sa-

tisfazermos nossa sensibilidade a beleza e nossa necessidade de co

munhao com o Ser Total, isso se deve a nossa miopia mental. E nos

angustiamos porque nao estamos entendendo a vida e a confundimos

com a existencia efemera do nosso organismo perecfvel.

Olho novamente para o televisor. Agora, o jogo de futebol, quevejo no momento mesmo em que se realiza, a mais de duzentos qui-

lometros da minha casa. Imagem e som, instantaneamente transmiti-

dos a grande distancia. Grande distancia? E as imagens do homem

na Lua? Esse pensamento aciona uma tecla migica, e o meu compu-

tador organico produz de sua mem6ria cenas de historias em qua-

drinhos lidas na infancia. Hist6rias de Flash Gordon, her<5i interpla-

netirio. Nelas, impressionava-me a ideia da transmissao de som e

imagem a distancias intersiderais, na antevisao do futuro que j i che-gou.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 96/411

Conseguiremos amenizar, ou mesmo eliminar nossa angustia,

nesta transigao da vida “natural” para a vida “artificial”, se nos

dermos a sabedoria e a coragem de revisar nossas conceptoes da vi

da, na antevisao do futuro que, de qualquer forma, ja esta sendo preparado:  Flash Gordon no planeta Terra!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 97/411

" F l a s h G o r d o n n o p la n e t a T e rr a ” . . .

N o p l a n e t a T e r r a . . . V i d a !

0 p l a n e t a c o m e g a , e v o l u i e t e r m i n a . V i d a . . . N A O !

“ F l a s h " . . . l a m p e j o .

E 6 n u m l a m p e j o q u e a p r e e n d e m o s i s s o

e n o s s a e t e r n i d a d e v i v e m o s ,

n o E s p a g o d o E s p f r i t o

c u j a s o m b r a a g o r a o b s e r v a m o s . . .

“Puxa! Esta me surpreendeu! Literariamente, parece-me ate con

ventional; quero dizer, nada de muito especial ou particularmente

impressionante no estilo. Quanto ao conteudo.. . af a surpresa. Nao

esperava que o Tio se ocupasse em tratar desse tipo de tema: o pro

 blema do bem-estar ffsico ou da sobrevivencia ffsica do homem na

Terra. Ali£s, nisto nao Ihe estava fazendo justiga. Devia saber que o

Tio nao €  um “mfstico” no sentido de fanatismo religioso, ascetismo

maluco, messianismo doentio, ou profetismo paran6ico. Ele €   um

mfstico, sim; mas seu misticismo me parece um entendimento supe

rior da vida,  um alto grau de sanidade nesse “planeta-hospfcio” .

 Nele vejo rara inteligencia, discemimento superior, luz mais pura.

“Os p£s no chao? Que e isso? Materialismo? A idtia de que a vi

da 6   somente fenomeno dos pes? Entao o Tio nao tem os p£s no

chao; nem quer ter. Nem eu! Onde, entao? Nas nuvens? Num ceu

hipot6tico, cheio de rechonchudos anjinhos e lindas virgens tocando

harpa? Tambem nao. No chao mesmo. S<5 que reconhecidos como

tais: pes; que nao sao tudo; que, na verdade, sao bem pouco, o mf-

nimo, um quase nada!

“As pessoas tem a mania de atirar essa de “p6s no chao” na cara

da gente, quando a gente fala do sentimento de que a vida tem natu

reza mais sutil e maior do que o mero fenomeno biologico, organico,

material (por admir£vel que ele seja), e de que ela tem sentido supe

rior ao dos objetivos neurdticos deste “planeta-hospfcio” . Claro: 6  

mais f£cil considerar um misticismo inteligente, como o do Tio, um

sonho, uma alienagao, uma fantasia, uma especie de morbida levita-

gao mental, e essa histdria de “p6s no chao” uma grande virtude de

mentes razoaveis e “normais” , do que enfrentar o supremo desafio

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 98/411

de explorer e investigar a verdade do homem, do universo e da vida.

“Quem tem os p£s no chao? Os covardes e hipocritas. Quem en-

frenta o desafio? Os deuses! Porque sao deuses os homens que en-

frentam o desafio, esse que 6 , verdadeiramente, um desafio para

deuses. Os p6s no chao? Sim. Mas com o cora§ao sangrando o san-

gue do ego mortalmente ferido, e a consciencia aberta para o infini-

to, para a VIDA que inclui os p€s mas nao 6   dos p£s! Os p6s no

chao... hiptfcrita ou nescia anestesia!”

Todo o talento de Victor para se expressar brota espontaneo e vi-

goroso como o seu pensamento. E, absorto nesse pensamento, ele

 prossegue:“Hip<5critas! Jesus chamou os escribas e fariseus de hipocritas.

Somente os escribas e fariseus? Ou principalmente eles, porque ne

les era mais evidente e acintosa a hipocrisia? Nao estenderia o Mes-

tre esse vergonhoso titulo a quase todos os homens do seu tempo? E

hoje? E muito diferente? O passado acusa o presente e a acusa§ao e

merecida! E o futuro? Que hist<5ria lerd do presente? ESTAMOS

ESCREVENDO A NOSSA HISTORIA! E digna de orgulho, a his-t<5ria que estamos escrevendo para os nossos pdsteros? Se nao €, 

desgraqada humanidade, que nao tem consciencia de sua pn5pria

historia e a esti escrevendo com a lama da vergonha e o lodo podre

do cinismo e da hipocrisia!”

A palavra hipocrisia devolve o jovem ao seu tema basico e o tire

do arrebatamento a que se entregara. Ele suspire e, apos breve pau-

sa, continua:

“Os p€s no chao. . . Como se nao tivessem quase todos um inco-

modo ponto de interroga§ao nos bastidores da mente. Sempre ali. E

como incomoda, esse divino ponto de interrogagao, amorosa e ine-

xoravelmente posto ali, na consciencia humana - esse magico palco

onde se desenrola a vida. E que fazem os homens, em sua suicida

hipocrisia? Estd incomodando e nao pode ser extirpado, eliminado,

destruido. Entao eles fecham as cortinas e tentam encenar sua vida

fora do palco; na inconscieneia que €  morte. E que sao essas cortinas? Lemas gastos pelo uso cfnico e hipocrita, que jd nao anestesiam

mais. Pano podre e roto, que mal oculta aqueie inc6modo ponto de

interrogagao.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 99/411

“Os homens tentam salvar as aparencias, num vergonhoso e ticito

acordo. Mas vem um evento inusitado, inesperado, impressionante,

chocante! Poderoso e divino tufao, que arranca os restos podres das

cortinas e novamente expoe aquele ponto; ali; sempre ali. Que fazem

entao os homens? Anestesiam-sel E muitos sao os nomes dessa in-sensata anestesia: ilcool, drogas, neg<5cios, polftica, religiao, famf-

lia, ciencia, arte, filosofia, progresso. . . desculpas mil! O ponto?

Continua ali. SEMPRE ALI! Interrogando: Que €  voce? Que e vida?

Que €  morte? Por que voce agride o mundo e a si mesmo? Ah. . .

voce sabe as respostas e tem os  p6s no chao? E as pedras pontiagu-

das (e at6 brasas!) que estao espalhadas nesse chao que voce pisa?

Calcou uma delas aos p6s? Que sentiu? Dor? Perplexidade? Angus-

tia? Medo? Duvida? O divino ponto continua. Sempre ali. Interro

gando. .

A mente de Victor silencia por alguns segundos.

“Flash Gordon no planeta Terra. Sd o Tio mesmo. . . Em plenacrise ecoldgica, ele vem com essa de corrida em contra-corrente e

mundo artificial do futuro. Enfim. . . sei la. Pode ser ate que ele te

nha razao.

“Corrida em contra-corrente. . . € . . .   e o curioso 6  que as duas

correntes contririas estao no homem. Quem sao os corredores? Um €  

a insensatez do homem; o outro, sua inteligencia. Por isso o Tio

gosta de dizer: o homem 4 inteligente, mas ainda nao 4 sdbio.

"Artificializaqao da vida. .  .Que somos criadores, nao h i como

contestar; nossa histdria o comprova. Que nossa criagao €   transfor-

magao e composigao, parece-me tambem evidente. Nossa artificiali-

zagao consiste em darmos diferente expressao ao que 6   natural e

continua sendo essencialmente natural. Entao. . . somos inteligentes

e criadores por natureza, e nossa criagao e artificializagao. Se isso 6  verdadeiro, segue-se que vamos mesmo continuar artificializando, a

despeito das crises que por falta de sabedoria tenhamos de softer e

superar.”

Apos breve pausa, ocorre ao jovem:

“Espere. . . mas assim eu estou concordando sistematicamente

com o Tio. Construindo logicamente em cima das premissas dele. E

se essas premissas forem erradas? Ele mesmo sempre diz:  Nao con- 

 sidere necessariamente certo o que eu lhe diga, porque lhe parega

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 100/411

 Idgico; muito menos porque ED Ihe diga. Converse com outras pes

 soas; leia livros e artigos sobre o assunto; ouga e leia, sobretudo, 

opinides contrdrias; e jogue tudo na fogueira; medite e pense.

“Bem, essa de contrariar a preocupagao generaiizada com o pro

 blema ecol6gico nao 6   de estranhar tanto. A maioria das pessoastende a aceitar sem reagao critica a logica imediata de uma dada si-

tuagao; nao costuma virar a moeda e examinar o outro lado. Afinal,

houve epoca em que quase todos os homens acreditavam que a Terra

fosse chata. . . Mas a insinuagao de que a natureza nao 6 necessaria,

ou nao fara falta, essa merece exame.

“Ora, parece evidente que a vida se desenvolveu na Terra, e nao

nos demais planetas (ao que saibamos), porque aqui se estabelece-

ram perfeitas condigoes naturais para sua sustentagao. Interessante

 pensar nisso: aqui as condigoes perfeitas para que as leis naturaisque regem a vida levassem as energias do cosmo a se organizarem

numa estnitura-suporte adequada; e as mesmas condigoes (a nature

za) permitiram que essa estrutura se desenvolvesse, fosse tomando-

se cada vez mais complexa, ate atingir seu 3pice no homem, com ou

sem evolugao linear. Portanto, na Terra, as condigoes naturais per

feitas para a vida do homem." Perfeitas? E. . . pensar e dificil. . . A gente usa um adjetivo in-

conscientemente e acaba estabelecendo uma premissa falsa. E nao se

da conta disso porque se entrega a um processo de pensamento em

avalanche. E preciso parar a cada frase e questionar a veracidade de

cada palavra. Isto e verdadeiro? Isto € verdadeiro? Como a pergun-

ta-chave do Tio: que e isto?

“Perfeitas, as condigoes naturais de vida para o homem na Terra?

E as feras? E as serpentes? E os insetos transmissores de doengas? Eos microbios que faziam adoecer e causavam a morte? E as intemp£-ries? E os cataclismos naturais? E. . . sei la quantos outros fatoresnaturais que ameagaram a sobrevivencia do homem? Nao tivesse ele

artificializado gradativamente a sua vida, descobrindo e controlando justamente as caracterfsticas desfavordveis e destrutivas da natureza,e nao estaria eu agora aqui, vivo e sadio. Duvido que sejam muitosos rmsticos que fagam entustestica apologia da comunhao com a na

tureza sob o zumbido persistente e irritante de dezenas de mosquitosfamintos. Ou os poetas que se inspirem nas picadas de pulgas san-

guin^rias.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 101/411

“ Misticos? Poetas? Mas, de que 6   que eu estou falando? Estava

 pensando na questao ecol6gica, desafiada pelo Tio, e entrei com es

sa de misticos e poetas. Puxa! Nao €   mesmo facil manter o pensa

mento concentrado numa linha mestra de raciocinio!

“ Voltando, entao, perfeitas nao eram e nao sao as condigoes na-turais de vida para o homem, na Terra. Bdsicas, sim; fundamentals.

Mas nao perfeitas. Onde entao o erro de nossa artificial iza^ao da vi

da? Parece evidente: ferimos demais os aspectos positivos e necessa-

rios da natureza, em nossa luta contra seus aspectos negativos e

 prejudiciais a nossa existencia. Agora, nao podemos fazer da nature

za uma de nossas “maravilhas instantaneas”: um pouco de p<5, um

 pouco de dgua, uma boa mexida e . . . pronto!. . . ar puro, dgua pura,

vegetagao vigosa, minerais em abundancia, etc. Por isso o Tio supoe

que a restauragao da natureza talvez jd fosse fatalmente lenta.

“ Espere. . . Foi a nossa justa luta contra aqueles fatores desfavo-

raveis que feriu demais a natureza, ou nossa ganancia nesse estupido

 jogo de competi^ao egoistica?

“De novo. . . Como €  diffcil pensar com acerto e seguranga! Co

medo a perceber por que o Tio prefere substituir pensar por sentir,

raciocinar por meditar. Ou, talvez, primeiro sentir e depois pensar; primeiro meditar e depois raciocinar. Em suma e basicamente, trocar

vida racional  por vida intuitiva.

“Enfim. . . nao sei o que pensar desta reflexao do Tio. Talvez eu

tenha “alma de poeta” e relute em aceitar a ideia de vida sem a na

tureza, ou com essa “natureza artificial” do Tio. Sei la. . .  Havera 

beleza de tirar ofolego em nossas cidades  ' ‘artificials”!  Gostariade sentir isso com a mesma convic$ao dele.

“Enquanto isso, que fazer, entao? Continuar destruindo a natureza? Nao tomar nenhuma providencia para restabelecer o equilibrio

ecoldgico? Se conhego o Tio, nao 6   esta a sua posigao. Alfas, ele

mesmo deixa isso claro, na reflexao: talvez devamos apenas conser- 

vd-la, sabiamente - o quanto possfvel e suficiente para nao nos de- 

termos. . . E nao nos deteremos! Porque somos criadores, por natu

reza! Se necessario for, iremos ate habitar algum outro minusculo 

 ponto deste universo imenso! Mesmo que ainda nao tenhamos tido a 

coragem de revisar nossas concepgoes da vida e do nosso prdprio 

 ser; mesmo que ainda sejamos mfopes mentais.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 102/411

“Miopia mental..

A mente de Victor silencia mais uma vez. Esvazia-se de cons

ciencia. Subito, um lampejo! Ele sente! E seu discemimento vai de-

senhar na boca um suave sorriso. Quase ao mesmo tempo, ele se

lembra de que Ldgus lhe dissera:' 'Eu lhe dou duas palavras: JUBILO e CEKTEZA.' ’

Seu sorriso fica ainda mais iluminado e ele fecha os olhos, como

 para introverter a consciencia e sentir melhor o gozo do extase que

desabrocha intensamente em seu amago. Sua cabega inclina-se len

tamente para tris e ele sente o rosto como que iluminado pelos raios

de esplendoroso sol. Luz! Felicidade. . . imensa felicidade! E. . .✓

que alegria!. . . o Tio! Nao 6  lembranga. E presenga! Sorrindo como

ele, e aqueles olhos, tao conhecidos, brilhando como duas luzinhasde lantema! Nao; nao €   Iembranga... 6  PRESENGA!

Passam-se alguns minutos. Vem depois uma respiragao profunda,

e o jovem volta a consciencia normal. Olha ao seu redor, e tudo pa

rece. . . diferente... especial. .. bonito e puro! E ele pensa:

“Miopia mental. . . Quem 6  im'ope? Eu nao sou mais! Agora vejo

mais e nao preciso dos olhos. A natureza? E linda e inspiradora, mas

eu nao dependo mais dela para comungar com. . . com o ESPIRITO

DO ESPAQO! Ele esti em mim!”

E vem-lhe a mente palavras de Jesus: O Espirito da verdade ha- bita convosco e estara em vos.

“Sim. E esse  Espirito da verdade, que habita em mim, como em

todos os homens, que devo aprender a escutar,  no dizer do Tio.

Comego a compreender o que 6  meditagao: abstragao de sensagoes e

 pensamentos, para ficar escutando o Espirito da verdade que habita

em mim. Compreender? Nao. Comego a SENTIR, e SABER, e CO NHECER - ou conhe-SER.”

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 103/411

TERRANAUTAS E O ENREDO DO SONHO

D o i s d ia s d e p o is , n o p r e s e n t e e n o E s p a g o ,

v a m o s e n c o n l r a r n o s s a j o v e m s o m b r a

d e s p e d i n d o - s e d e u m a o u t r a , e s t a m a i s b o n i t a , g r a c i o s a . . .

Victor fora ao encontro de Alba, sua namorada, apos uma bronca

que o deixara atordoado, ao telefone. Indiscretos, apuramos o ouvi

do no momento exato em que ela da partida a um irritado desabafo:

“Olhe aqui, Victor: assim tambem j i 6   demais! Chega! Precisei

ser malcriada, no telefone, pra voce sair comigo hoje. E todo o tem

 po voce ficou falando desse estado maravilhoso de consciencia quediz que esta sentindo desde a tal experiencia, sabado passado, d e .. .

d e . .

“Meditagao e comunhao.”

“Seja la o que for! Pois eu, meu filho, estou mais interessada num

outro tipo de comunhao. Ti  sabendo? Nao sei por que, fiquei ouvin-

do o tempo todo, como uma boba, enquanto voce dissertava, todoentusiasmado, sobre a nova e extraordinaria visao da vida que des-

 perta em seu amago, o fluxo quase constante de inspiragao que estasentindo desde sabado, as ideias sutis, “ superinteligentes” , desse tal

“Tio” . . . ah!. . . e sobre o proprio “Tio” , essa personalidade ex

traordinaria, que, na certa, j i €  mais importante pra voce do que eu!

“Admito que senti algo diferente em voce. Sei la o que, mas o

fato 6 que fiquei assim.. . fascinada ou. .. enfeitigada, e ate esqueci

que estava bronqueada. Pode ser ate que a influencia desse “Tio”esteja mesmo sendo positiva e, como voce disse, esteja desenca-

deando em sua mente um maravilhoso processo de. . . como foi quevoce o chamou?. . . ah!... de jlorescimento. At6 me lembro de suas

exatas palavras: o desabrochar de uma consciencia adormecida, li- 

berando, do amago do meu ser, poder, discemimento e amor, como 

 jamais conheci e de que ndo me suspeitava capaz.

“Reconhego tambem que as coisas nunca andaram e nao andam

 bem no mundo. E nao sou nenhuma burra e posso muito bem com

 preender que, em parte, isso se deve a que a nossa visao da vida estaincorreta, levando a gente a um modo de viver gerador de crises,

neurose, miseria, infelicidade, e mesmo guerras. Concordo em que,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 104/411

 pelo menos por isso, devemos ter a coragem de revisar nossa con-

cepgao da vidae do universo, se possfvel sem compromisso com. .

Subito, ela percebe a deleitada atengao de Victor, os olhos bri-

lhando de satisfagao e interesse. Volta entao a carga:

“Espere! Por que 6   que eu estou falando disso? O que eu querodizer 6  que, ou voce  prova,  agora mesmo, que nao es ti numa de as-

cetismo, de virar santo; que 6  capaz de esquecer esse seu. . . menta-

lismo. . . misticismo. . . sei li!. . . e se interessar por mim como

MULHER, ou. . . o u .. . i  melhor a gente nao se ver mais! E isso af!

Ou voce bota os p6s no chao, e bem juntinho de mim, e prestando

atengao A MIM, sem misticismos, nem platonismos, nem problemas

mundiais, ou. .. Tchau!”

Victor hesita, confundido por uma incontrolada sucessao de sen-timentos: atordoamento, ante a nervosa avalanche de palavras da

namorada; encanto, ante sua grande beleza, que parece acentuada

 por sua agressiva sensualidade; surpresa, por sua declaragao de que

ele havia sido importuno; e excitagao, ao sentir o calor daquele se-

dutor e vibrante corpo de mulher, tao prtfximo ao seu. Sente o cora-

gao bater mais ripido, as temporas latejarem e . . .

Bem, nao sejamos tao indiscretos assim.. .

Passam-se alguns. . . segundos?. . . minutos?. . . e ouvimos doissuspiros em unfssono. Depois, a voz feminina, agora suave, mansa,

refletindo alfvio:

“Assim esti melhor.. . seu bo bo .. . tchau.. .”Um beijo, este ripido, e Victor se encaminha para o seu carro.

N 6 s ? D i s s o l v i d o s n o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

a c o m p a n h a m o s o jo v e m ,

n a o s e m d a r u m a U l t i m a o l h a d a n a q u e l a b e l a m u l h e r ,

q u e a c e n a g r a c i o s a m e n t e a n t e s d e f e c h a r a p o r t a . . .

Momentos ap<5s, o jovem pisa no freio do carro, fazendo-o parar

na sua vaga da garagem do pr6dio. Solta um forte suspiro, como ul

tima fase de relaxamento da tensao e da excitagao que lhe causara a

despedida da namorada. Desliga a ignigao do carro, retira a chave e

a poe no bolso. Depois, relaxa e fica passivo. Altemadamente, sao

evocadas em sua consciencia as sensagoes e emogoes que vivera

com a namorada e as que vivera em sua recente experiencia de me-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 105/411

ditagao e comunhao. Sua mente passa a oscilar, entao, entre as pri-

meiras sensagoes e emogoes, que chama de mundanas, e as ultimas,

que chama de sublimes. E o pendulo da consciencia indisciplinada,

de Victor, oscilando entre posigoes que ele entende como extremosopostos: mundanismo. . . sublimidade. . . mundanismo. . . sublimi-

dade. . .

“Ela £  bonita. Muito bonita. Aqueles olhos, quando se fixam nos

meus, me enfeitigam, anulam minha forga de vontade. E aquele cor

 po, ta o .. . tao excitante.. . nao da pra resistir!

“Resistir? Por que resistir? Entao nao 6  natural? Que 6  ela? Mu-

lher. E eu? Homem. Entao 6  natural que ela sinta atragao por mim e

eu por ela. Mulher. . . homem. . . abrago, beijo, atividade sexual. Nada errado nisso. Simplesmente natural. Qual 6   a minha, entao?Estou virando puritano, agora?”

Uma pausa. Victor acende um cigarro e, com a primeira baforada,

de novo relaxa e se abandona ao fluxo espontaneo do seu pensa

mento.

“E. . . mas ndo se pode servir a dois senhores.  Alba 6   sedutora,

sim. Muito sedutora. E quantas mulheres assim existem no mundo?Milhares! E quantas outras sedugoes existem no mundo? Milhares!

Entao, a quantos senhores terei de servir? Milhares? Afinal, o que e

que eu quero da vida? Vive-la, como tanta gente, procurando evitar

ao m&ximo o softimento e gozar ao mdximo os prazeres? E isso o

m£ximo que a vida pode significar para mim? Nao. Certamente nao!

O maximo 6  transcender o mundo, nos prazeres e no softimento, su-

 perando sedugoes e dores, para alcangar o estado de maxima espiri-

tualidade. E preciso renunciar.  Nao tem outro jeito. Devo renunciar

a um senhor, para servir ao outro. Qual 6  o senhor mais poderoso? O

mundo? Nao; esse €   limitado e passa. Mais poderoso 6   o reino da

espiritualidade, que 6   ilimitado e nao passa. Entao, devo renunciar

ao mundo, para servir ao reino da espiritualidade.”

O jovem atira o cigarro pela janela do Cairo. Por alguns segun

dos, fica observando-o queimar-se no chao. Depois, prossegue:

“Renunciar. . . nao 6   f&il. Ela, por exemplo, quando me olhacom aquele olhar apaixonado, faiscando desejo, inspira tudo, menos

anseio de sublimidade. Mas a opgao tem de ser feita: ou o gozo efe-

mero do mundo ou o gozo etemo do reino espiritual. O problema 6 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 106/411

que o mundo 6   uma certeza e, o reino espiritual. . . uma hipdtese!

Ela, eu sei que existe; aqueie beijo nao foi um sonho. E o reino espi

ritual? Como posso saber  que existe? Por que alguns homens disse-

ram que sim? E se eles estavam enganados? Se foram vftimas de

uma fantasia? Se projetaram a realidade para um sonho? Sou jovem

e a vida esti passando. E se eu chegar a velhice e descobrir que fiz a

opgao errada? E . . . qual 6  a opgao errada?”Confuso, Victor sente-se amea^ado de angustia e decide cortar

 bruscamente aquela reflexao incontrolada. Sai do carro e dirige-se

 para o seu apartamento. A porta do apartamento se abre e ele entra.

Pisa num envelope que fora atirado por baixo da porta. Apanha-o

e . . .“Carta do Tio!”Senta-se, abre o envelope e come^a a ler a carta.

“j£ inicieiomeutrabaiho. Vimparaescreverumlivro.Voutentarexpres- 

sartudooquepudeintuirerefletirsobreavida.Demaneiradiretaehonesta.

"Honestidade.Boapalavra. Sabeoquesignifica? Identidade, amaxima 

possfvel, entreomeusentimentoda vidaesuaexpressaoatrav4sdaminha 

palavra.Simples, nao4?Fora,aexpressaomais fieIpossfveldoqueeuen- 

contrardentro.HONESTIDADE. Palavramelhordoque verdade.Estajiga- nhouconotagaoespecial,deconhecimentoabsoluto.Enaofaltariaquemme 

acusassedepresungao.“Porissoalinguagemdomeulivroser6diretaedescomprometida.Isto4,

nova, semprequepossfvel;evitandopalavrasquejStenhamadquiridoacep- 

goeseconotagoescomprometidas;esemsubservienciaaautoridadealgu 

ma.Naoj&escreviquedeverfamos teracoragemderevisarnossaconcep- 

gaodouniversoedavida?Entaodevoequerodaroexemplo.Somentepa 

rainovar?EmvSeambiciosatentativadeseroriginal?Nao. Issoseriatolo.

NSodesejofamanemreconhecimento, ealiteratura, comoobjetivo,naome 

interessa. Sabeoque4queeudesejo?Ofertar. S6.Comamoreporcom 

pulsaoautenticadehonestidade.Boapalavra,esta:HONESTIDADE.

"Linguagem po4tica?Linguagemdo coragao?Sim. Tamb4m. Porquea 

poesiadesfazo compromissodapalavra. Porque,ondenaoforpossiveldi 

zer, serAnecessSriosuscitar.Porissousareitamb4mpalavrasvelhas.Mas 

elasseraonovasemespfritoenaoestaraotentandodizer;apenassuscitar,

porquemaisnaopoderSserfeito.

“Queoferta4essa, quefagoaosmeuscompanheirosdesonho?Lenha.Lenhapara fogueira.Lembra-se?Elenhaqueoferego.Quemquiseraminha 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 107/411

lenha, ti-la-S;e, se tiverfogo,porpequenoqueseja,neleatira riaminhale- 

nhaeobterAmais luze calor. Luzecalor.Conscienciaevida.NSoposso 

darluzecalor. Sdlenha, e6issoqueoferego. Quemj6tiverfogoeluze 

calor,apreciarSaminhalenha,eajogarSnoseufogoeterSmaisluzecalor.

“Aoquetiver,serSdado;e,aoquenaotiver,ateoquetiverlhese ri tirado”.Lembra-se?Quemtiver fogo, hSdealimentS-lo comaminhalenha;e terS 

mais fogo. Quemnaotiverfogo,rejeitarSaminhalenha;qualqueroutracoisa 

quetenha, hSdelhesertirada,porquecertamenteserScoisadomundo,que 

perderSquandodeixaromundo.

"Eestaaofertaquefagoaosmeuscompanheirosdesonho;aosmeus 

companheirosdecosmonave. Sabeo quei anossa vida?Umsonho, Ss 

vezes bom, Ss vezesmau, de cosmonautas. Sabe o que £quesomos? 

Cosmonautas, fazendo uma longa viagem onfrica nessa cosmonave que chamamosde Terra. Somos "terranautas"eestamossonhando.Urgedes- 

pertarmos. Como?Jogando cada vezmais lenhana fogueira, semidiias 

condicionadasesemsubserviinciaaautoridadealguma.A tiaprendermosa 

vivernaluzenocalordoFogoMaior, ondenSosequeimalenha.EntSoes- 

taremos verdadeiramenteDESPERTOS, CONSCIENTES, VIVOS!Cosmo 

nautas?Nao. NSomais. Oque, entSo?Quemsabe?Quempodedizer?O 

queEtemnome?OqueEpodeserdito? 

“Profundasabstragdes, essas. NSo foipara issoquedecidiescrevera voci. Deixemospois nossos  "terranautas”e sua curiosa viagem ontrica.

Ponhamososp is nochaoe . . . ”  

*“Essa nao! E justo ele quem vem com .. . p is no chao! Ainda sa-

 bado passado. . . essa nao!”

Apds breve pausa, Victor sorri e retoma a leitura.

. . Ponhamososp is nochSoecuidemosdecoisasreais,comoanos saamizade.Foiissoquemelevouaescreverparavoci:amizade.NSosei 

quanto tempo vou ficar aqui; um ano, dois, talvezmais. SerS agradSvel 

mantercontatocomvoci,duranteessetempo.Nofinaldessacarta,indica- 

reiumacaixapostal.Escreva-me,sequiserequandoquiser.NSoofagapor 

deversocial. Issonaotemsignificadoparamim.Amizadeedeversocial?In- 

coerincia. NSo o fagaparame satisfazer. Isso nSo temsignificadopara 

mim. AmizadeedesejoegocintricodesatisfagSo?Incoerincia. NSoo faga 

parameagradecer. IssonSotemsignificadoparamim.Amizadeedesejode 

reconhecimento?Incoerincia. Mas se  voc§quisermeescreverparaestes 

fins,ouqualqueroutro, faga-o.EntaoterSsignificadoparamim.Seumotivo? 

NSo. Seu bem-estar, por amizade. Por isso repito: escreva, se quisere 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 108/411

quandoquiser;eacrescento:paraoquequiser.

“Notfciasminhas?JSasdei:estouaquiejSinicieiomeutrabalho;vimpa 

raescreverumlivro. isso4suficiente.Oresto?Fatoscomuns, compondoo 

enredomenordaminhavida.Naomerecemoseutempo, nemomeu.Voci 

sabe que situoesses fatos numpontobaixodaminhaescala de IMPOR 

TANCE e VALOR. Quefatossaoesses?Osfatoscorriqueiros,aindaque 

necessirios,deminhaexistinciaesobrevivincianestemundo:oquetenho 

comido,comometenhovestido,ondetenhoido,quecoisasepessoastenho 

visto, ondemoro, como temestadoociimaaqui,etc. Interessantes, esses 

fatos?Talvez.Masnaopodemiraiim decomporoenredomenordaminha 

vida. Prefiro concentrarminhasenergiasemeu temponoEnredoMaiorda 

minhavida. Qual6esseEnredoMaior?Quandovocitiverlidotodasasre- 

flexdesqueIhedeixei,quandotivercomidoebebidotodoomeuros&rio,sa- beri. A ti 14, v& vivendocomequiltbrioesensatezosseusdoisenredos, o 

menoreomaior;nSonegligencietotalmenteum,nemooutro ,Omenordeve 

serviraomaior?Comoo fioquesustentaas contasdorosirio?SeissOi 

verdadeiro,deveocorrernaturalmente,por compulsaointerior,decorrentede 

realegradativa  transformagao interior;naoporraciocfnio,nempor "empol- 

gagaonao podeserforgado.

“Elembre-se,sempre, dequeorosSrionao4s6o fio;nem$6ascontas; 

i ofioeascontas,combinadoseligadosdecertomodo.Sevocinaocuidar do fioeeleapodrecer, o rosSriosedesmanchari.Se vocinaocuidardas contaseelasapodrecerem, sdIherestarSo fio. Vocequeroros&rio?Entao 

cuidebemdo fioedascontas.A tiqueo tenharezadoateofim.Entao,nao 

precisarimaisdele. PoderSpassS-loaalguim,paraquevejacomose faz 

umrosirio;porquecadaqualtemdefazeroseu,ecuidarbemdascontase 

dofio.

"Sobretudo,naofagacomoamaioriadaspessoas,queseconcentrano 

enredomenordavida;que$6viveo enredodavida, enaopercebequese 

tratadoenredo davida.Paraelas, oenredo 6avida(eninguimpodecon- venci-fasdequeestaoequivocadas;dequeestaoesquecendoa vidaevi 

vendo o enredo). Porisso vivem  paraobtere realizar. Suasobtengoese 

realizagdes?Saofeitasdaquelesfatosmenores,quesdpodemenriquecere 

animaroenredoeenalteceroego, e,porissomesmo,empobrecereaviltar 

avida.

“Naofagacomoamaioria".Euescreviisto?Devoestarficandocansado 

evoltandoSminha inconsciencianormal.Ora,fagacomoquiser!Dequem4 

a vidaquevoceestS vivendo?Sua, 6claro. Vocenaopodeviveraminha,nem eu posso viver a sua. Portanto, voc i 4   livre e responsfivel.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 109/411

Fagaasuaprdpriaopgao,comaliberdadeearesponsabilidadequefazemo  jogodavida.

"Sei,noentanto, quevoce\& naopodefazeraopgaodamaioria.Queop 

gao4essa?J idisse:oenredo.Quemaioria4essa?J idisse:ade "terra- 

nautas"em viagemonfrica. Eissoquevoc4querser?Um“terranauta ", vi- 

vendooenredodeumsonho?Ora . . . "querser” ?VocSn io podemaisque- 

rer,porquej i comegouadespertar. Enaofuieuquemoacordou.Seudes- 

pertarj i comegara, quandooconheci. Porissonutrinossaamizadeeme 

dispusaservi-lo.Porissolhepasseiomeurosirio.J4comeceiafazerou 

tro, porqueaindanaopossonemseiviversemumrosirio .Esticomendoe 

bebendo, essequelhedeixei?See s ti... boadigestao.” 

Victor deixa tombarem as maos no colo, com a carta, e soni en-cantado. Depois, Ievanta a carta e diz aos seus botoes:

“Esse Tio. . . Isso 6  la jeito de se terminar uma carta? Ainda bemque se lembrou de indicar a tal caixa postal.

“Bem, agora, vamos dormir. Ih. . . e agora? O “teiranauta” vaisonhar no sonho?”

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 110/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 111/411

Victor apanha o manuscrito de Logus, disposto a ler a reflexao

seguinte.

S e m p r e i n v i s f v e i s n o E s p a g o

- d o E s p f r i to q u e e m t o d a p a r te e s ta -

m a i s u m a v e z o b s e r v a m o s n o s s a j o v e m s o m b r a

e s e g u i m o s s e u p e n s a m e n t o . . .

"O Ouro dos Trouxas. Bem.. . depois daquela historia do enredoda vida, esta 6  mole pra sacar, so pelo tftulo. Aqui, o Tio deve estar

levantando a questao do valor intrinseco da vida material. Sentimo-

nos como seres materials num mundo material. Por isso nos dedica-

mos a objetivos materials; as “obtengoes e realizagoes” a que o Tio

se referiu em sua carta. Mesmo pessoas que se julgam e dizem reli-

giosas, aplicam suas energias e dirigem sua consciencia, exclusiva

ou primordialmente, para fins materials.“Como e realmente uma pessoa? Como ela mesma diz que e?

 Nem sempre, pelo menos. Quem quiser saber como 6  realmente uma

 pessoa, nao lhe pergunte; antes, observe-a. Ela diz que 6   religiosa?

Observemo-la. Como e que ela vive? Como passa o seu dia de vida?

A que aplica suas energias? A sobrevivencia material? So? Tambem

a outros fms materials? S6? Para que dirige ela sua consciencia? Pa

ra a resolugao dos problemas da sobrevivencia material? So? Para

coisas, seres e fatos do mundo material? So? Observemo-la, atentos

a suas agoes e reagoes (principalmente inconscientes ou reflexas).

Porque "pelofruto se conhece a arvore” . . .

“Sim. Observemos a pessoa que se diga religiosa. Sua religiao 6  

sua vida? Ou ela “interrompe” sua vida, em certos momentos, para

dar um pouco de atengao h sua religiao? Religiao. .. e vida dedicada

a mat6ria? Religiao feita de oragoes que nao passam de egocentricas

suplicas por objetivos materiais, como saude, um bom casamento para a filha, felicidade no mundo, solugao de um problema financeiro,

vitoria numa competigao esportiva, etc.? Quem nao vive a sua reli

giao nao a tem.

“E .. . quem quiser conhecer um materialista, nao precisara procu-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 112/411

o enl^ os que assun “ declarem; e se quiser conhecer um reli-gioso, talvez procure em vao entre os que assim se declarem

‘Para que serve uma religiao, se nao €  vida? Para que serve qual

quer coisa, se nao €  vida? Se nao 6   vida, e ilusao, irrealidade  E seuma pessoa nao pode realmente se identificar, em seu viver, com al

guma religiao, entao ela nao pode ter uma religiao. Comeco a com

 preender por que o Tio nao faz a minima questao de ser afiliado aqualquer movimento religioso..

Ja abstrafdo do mundo, Victor aperta involuntariamente os olhos

f ixosnum vazio, e a memdria o leva a reviver, como em sonho, umdialogo que havia muito tivera com L<5gus:

“Tio,qualdasuareligiao?”

“ReligiSo?Quedreligido?

“Certamente, vocS jd ouviu ou leu a abordagem erudita destaquestao

que recorre d etimologia da palavra, remontando-a ao latim, religare. Reli-

g a r . o que a qu$? O homem a Deus?Religar pressupoedesligamento-

uma coisa foidesligadadeoutrae,agora,devesernovamenteligada.Que

Deus 6 esse, que alguma "coisa" foi Dele desligada?Que hd entreesse

Deusea coisa (ouoser)queDelesedesligou?Nada?Sehdalgumacoisa entreesse Deus eo homem, entdo nSohouvedesligamento.Sehouve

nad3?QUS6eSSeDeUS?AREAL'DADEULTIMA,A

r m f ™ ° ° QUE EXISTE MANIFESTO E POTEN-CIAL) ETERNAE INFINITAMENTE?EntSo,comopodehaverdesligamen-

. Como pode havernada? Como pode havercriagdo?Ou naohd esse

Deus ou ndohd desligamento. Se hdesse Deus, o nada dumabsurdoe

nao hd cnagao nempode haverdesligamento. Nada precisaserREIigado

porquenadafoinempodeserDESIigado,nempodeestarsimplesmente"li-

a ; L:fn d°*VMl que’   3qu®?Desligad0-■■0^ue>dequfi?Reiigado.. . oque,aqud . Dualidade, necessanamentepresentenostrdscasos.Duas“ coisas"Doisseres.Eentreeles?Nada?

Qued religiao?Sistemadepensamentoqueassentasobreessaduali

dade?Quevisa "re ligaro homemaDeus?QueconcebeumDeusquepra-

ticou uma cnagao ex6gena e absurda, “para fora"e“ donada"?Entaonaotenhonemqueroterreligido.

“Que 6 religiao?Sistema de pensamentoe vida baseado na fd, cegaedogmdtica,numDeusantrop6ide?

Um homem veme diz: “Soureligioso, porquecreioemDeus". Pergun-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 113/411

tamos:“Que6esseDeusemquevocScr§”?ElejSestranhaonosso que, e

corrige:"Que, nSo!Quem”! A preocupagSodequeseuDeusnSoseja"coi-

sa" e, sim, pessoa (antrop6ide). Deixamos isto de lado einsistimos: “EstS

bem.Quem6esse Deusemquevoc§cr§”?A respostavemfScilepronta:“Ora...oCriador"!

"OCriador...Que& criar?Fazerseroqueantesnaoera?Fazerexistiro

que antes nSo existia?Do nada?Teriade ser do nada, porque sealguma

coisaexistisseantes,nSoteriahavidocriagaoe,sim,transformagao.

“Perguntamos entao ao nosso amigo: "Que caracterfsticas tem esse

Criador?Ouquecaracterfsticasatribui voci  aoseuDeus?NaoIhepedimos

queodefma.Se definir6descreveranaturezadealgumacoisa,talveznada

possa realmente ser definido; nem mesmo coisas “materiais” , palpSveis,cujaexistencianSocontestants.Mas, certamente,vocS nSousaapalavra

Deus  paradesignarumvaziomental.Algumas id6iasdevemexistiremsua

mente, justificando o uso da palavra. Porexemplo, voc§jS nos deu uma:

Criador. D6-nos outras, seexistem” . E ele:“JSentendi. Deus,oCriador,6

umserinfinito,eternoetodo-poderoso".

“Agora, n6s6que n§oentendemos!Deus6infinito,mas6criador;ecria

gao pressupoeexistenciadonada  (expressSoem simesmaabsurdal). En

tSo,queDeus6esse,que6infinitomastem“buracos”?“Eouvimosonossoamigofalarda“vontade"de Deusede“prop6sitos

divinos.

“Vontade? Propdsitos? Quem tem vontade e prop6sitos?O homem. E

comoeleaindatendeparaoantropocentrismo, imaginaseu Deuscomoum

ser antropdide: com vontadeeprop6sitos.Tenta refinar (ou disfargar?)seu

antropocentrismo, com sua requintadaintelectualidadeatual,mas nSo6es-

sencialmentediferentedeseusancestraisprimitivos.

“Quek  religiSo? Sistema de pensamento e vida baseado na f6, cega edogmStica, nesse Deusantrop6ideecom“ buracos” ?EntSo,naotenhonem

queroterreligiao."

Ojoveminterrompe:

“Mas,Tio,quandoesse homemfaladoseuDeus, estSapenastentando

expressaroseusentimento aesterespeito.NSoestSabrindoumaquestaoa

discussSo racional. Voc§,noseudiSlogohipot6tico,6queestSracionalizan-

do.O sentimentode DeusnSo6paraserracionalizado.ESENTIMENTO!E

f§assentaemsentimento,enSonarazSo.”

L6gus nada respondeporalgumtempo,eficaolhandoparao jovemcom

ardequemnSopretendemesmoresponder.Depois,replica:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 114/411

“Quase cedi ao impulso de reagir S sua contestagao com um longo e

constrangedor silfencio. At6 vocS ficar encabulado e ir embora confuso.

Quantas vezesvou terde lhedizerqueSENTIMENTOECOISADE SEN

TIR?Voc§querdiscutirsentimentos?EntSonaovenhaaqui.“For outro lado, como posso conhecerum sentimento de algu6m?Por

apreensaodireta?NSosouum“sensitivo”ouum“psfquico"- oucomovoc§

prefira chamar. Que 6 sentimento? Um fato nao-racional e fntimoao indivf

duo?EntSo, s6possoconhec§-lo seesse indivfduo lhederalgumaexpres-

saoexterioraeleprdprio; por infergncia, na apreciagSodessaexpressao.E

verbalessa expressSo, e nSo §po6ticaou artfstica? EntSoeu aanalisoe

discuto.Que6primeiro?Sentimento6primeiroepalavrak segundo?Entao

6atrav6sdoque6 segundoquepossoconheceroque6primeiro;e6atra-

v£sdoque6segundoqueanalisoediscutooque6 primeiro.QueestSem jogo?A relagSoentreo sentimentodeumindivfduo, apreciado nasuapala

vra, eomeu sentimento, apreciadona minha palavra? EntSo eu analisoe

discuto- oque 6primeiro no que 6segundo. QueestSemjogo?0 senti

mentodeumindivfduo?EntSo,naoanalisonemdiscuto.

“Quejogoestamosjogandoagora?Ojogodepergunta-e-resposta.Estou

tentandorespondersuaperguntaatrav^sde umdiSlogohipotitico. €.hipot6-

tico o diSlogo? E 6 meu? Entao o homem do meudiSlogo hipot£ticoestS 

abrindoumaquest&oadiscussaoracional!”

‘TSbom.Melhorvocecontinuarcomoseu diSlogohipot^tico.”

"AgoranSoqueromaisodiSlogo.

“Sabe?...Achoqueestamoshojedandoaoamanha,emvSriasoumui

tasdenossas religioes,umsinaldonossoprimitivismo.Somosaindamuito

primitivos.Bemmenos,naturalmente,doquenossosancestraisquetemiam

odeusdotrovSo.Eporquesomosmenosprimitivosdoqueeles,iludimo-nos

empensarquenSosomosmaisprimitivos.

“Sempredigo queestamosescrevendoanossahistdria. E os queale-

rem nSo estarSocom seu egoenvolvido; nSoterSomotivoparasalvarapa-rfencias (vaidade ou vergonha), nem para defender posigSocom solismas

(vaidade intelectual, nesciedade, ou necessidade de sobrevivencia). DirSo

seforemhistoriadorescompetentes,s6riosefidedignos:

"Oestudode vSriasreligidesdohomemdosdculoXXjSseriasuficiente 

paraafirmarmosque,pelomenosemgrandepartedahumanidade,eleainda 

eramuitoprimitivo.Embora,paralhefazermosjustiga,devamosreconhecer 

quej&evoluframuitoemrelagSoaseusancestraisremotos,eisquejSsubs- 

titufraodeusdotrovaoporumdeusantropdide.Envaidecidodesuaraciona- 

lidade(que,aliSs,pecavaporghtantesfalhasdeIdgica),nSoseapercebiade 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 115/411

queaquelesqueconsideravafundadoresdesuasreligioeshaviammanifes- 

tado discernimentosuperiorprecisamenteporterem transcendidoa razao,

nousodafaculdadequehojechamamosde metacognigSo.Naoseaperce- 

bia, tambem, dequeaqueleshomensextraordin&rios(comoGautama,oque se tornara Buda, eJesus, oquese tornara Cristo), porestaremextrema- 

mente avangados em evolugao, relativamente aos seus contemporaneos,

haviamsido comos ibiosprovectos falandoa ingenuas criangas.Porisso 

(emboranaosomenteporisto) tinhamrecorridoametSforas, queohomem' 

criangados£culoXXaindaentendialiteralmente.

"N ao .. . desselivrodehist6rianSoqueroescrevernemumapSgina;nem

umalinha;nemumapalavra!"Nem umapalavra! Nema palavraDeus, porque \& adquiriu, talvez irre-

mediavelmente,conotagaoantropocftntrica.E . . . cu rioso .. . eumesmonSo

consigoevitS-la,porque fui condicionadoa usS-la, nainfSncia.Mas,sempre

queelame ocorre (como naexpressaoreflexaGragasaDeus!), sintocla

ramenteaquela conotag§oantropoc§ntrica.Deixo-aentaopassar,comofe*

ndmenoestranho ao meu verdadeiro ser,aomeuEureal.Observo-a, ape

nas,comoobservoumrelampagonoc6u:orapidfssimolampejoe,depois.. .

“nada”;empoucotempo,nemalembrangadet§-lovisto.

“Que palavra ent5o usar? Ora, nenhuma! Prefiro fazer como ensinou

Gautama,oBuda,etranscenderapalavra.Que6palavra?Ess§nciaprimei-

ra?Nao. Expressao segunda.Prefirotranscenderapalavra,que6segunda,

para vivernopensamentopuro, que6 primeiroporque6sentimentodireto,

experiencia, verdade.E lembrarametSforadeJesus,oCristo(semingenui-

dadedehomem-crianga):

“Deus,ovossoPai,

sabeodequetendesnecessidade,

antesqueIhopegais.

"Reltgioso.. .eu?N3io»Nao,emqualquersentidosectSrioe condiciona

do.Emalgumsentidouniversal?Tamb6mnSo,porqueent§on5oprecisoda

palavra.Prefiroser um homemnu,noDeussemburacos!Palavra?S6para

comunicag§o, conformea fndole, a inteligfencia,a instrug§o,aexperi6nci$e

aevolugaodointerlocutor.”

“Mas,Tio,etodaessagenteque6taosinceramentedevotadaeparece

taofelizcom suareligiSo,qualquerqueelaseja?Maisainda,queconsegue

refrear seusmausimpulsosgragasao influxopsicol6gicodospreceitos6ti-

cos emorais e das doutrinas que adotaram atrav£s de sua religi§o?VocS

n§orespeitasuareligiao?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 116/411

“Toda essa gente. . . Afinal,dequemestdvamos falando?VocSpergun

tou: qual easua  religiao?Minha resposta, coerentemente com a sua per

gunta, referia-seamim. Agora, vocepergunta:e todaessagente?.. . Ora,

quevidaestoueu vivendo?Que vidaestS todaessagentevivendo?Quale

a minha verdade"?Qual 6 a “verdadedetodaessagente”?QuesejaEUconforme a minha fndole,aminhainteligencia, aminha instrug§o, aminha

experienciaeaminhaevolugao.QuesejaTODA ESSAGENTE conformea

sua fndole, a sua inteligencia, a sua instrugSo, a sua experiencia ea suaevolugao.

"Respeitar a religiaode toda essagente?Que 6 respeitar? Concordar?

Entaonao respeito.Compreenderetolerar,poramor?Entaorespeito.Que£

que respeito? Odireitodecadaqual fazerasuaopgSoevivera "suaver

dade". Que 6 que respeito?Aprerrogativadeopgao  de todoindivfduo. De

que falei eu antes? De tais ou quais indivfduos, especificamente?Nao. Da

hist6ria dahumanidade, em sua longaedolorosaevolugaoparao realSA

BER,que transcendea raz§oe seuutillssimoprodutoeinstrumento,apala

vra.A umcerto indivfduo,nSosesurpreendasemevirensinar-lheaorarpa

rapedir, comoJesus,oCristo,ensinouaoshomens-criangasdoseutempo:"PainossoqueestisnoscSus . . . ”

"Que toda essa genteesteja vestida,cobertade nomeserdtulos, supli-

candoa seuDeusantrop6ide,queestSnooutroladodoburaco.Eu?J& disse:prefiroficarnu,noDeussemburacos.”

Victor respira fiindo, olha os objetos &sua frente, sorri, e retomao papel que apanhara para ler.

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 117/411

N a d im e n s a o e m q u e e s ta m o s n 6 s v iv e n d o ,

p e l o o u r o n 5 o p o d e m o s n o s i n t e r e s s a r

- n e m o v e r d a d e i r o n e m o d o s t r o u x a s .

E a s s o m b r a s q u e o E s p f r i t o n o E s p a g o s e ( e z ?

N a s o m b r a q u e p a r a a L u z \i d e s p e r t o u ,

l e m o s a r e f l e x a o d a o u t r a , d a q u e j d 6 q u a s e L u z . . .

O botao na parede. Aperto. Espero. Um minuto. . . dois. . . O

ruido e a sensagao da aproxima^ao de gente, atrds de mim. O perfume de mulher. A voz feminina. O belo timbre e o tom de ira contro-

lada.

' 'Nao posso me conformar com esta situagao. Voce nao tem mais 

tempo pra mim; nem pros criangas. Prafamdia , jd e quase um vi- 

 sitante! Por que trabalhar tanto? Jd nao ganha o suficiente pra 

 gente viver bem? Viver pra trabalhar. .  . que sentido tem isso? Vida 

e trabalho? Trabalhar cada vez mais, pra ganhar cada vez mais di- 

nheiro. Vida 4 dinheiro?”

O ruido caracteristico, e a porta do elevador se abre. Movendo-se

com vivacidade, as duas jovens saem. A encantadora irradiagao de

 juventude e as vozes animadas:

' 'O Artur, ele td paquerando a Laura!’'

‘ ‘Nao!’ ’ 

Sorrio. Entro no elevador. “Segundo” - pego.

Segue-me o casal. “Que linda!" -  penso. "Este homem ecego e insensfvel. Sd pode ser”! Pede ele: "Quinto” . Depois, voltando-se

 para ela:

"Voce nao entende. Nao pode entender. E mulher!”

("Por que entao ele nao se casou com um homem?”) —  penso,

rindo intimamente.

E ele continua:

"Pra voce, vida e conversa. E novela. Duas inutilidades. Seu ti-  po de conversa nao constrdi nada. Quando voce acaba de falar, f i

ca um vazio, no espago e na cabega da gente. E as novelas nao 

acrescentam nada a nossa vida; nem a vida das criangas. Sd di

nheiro ao bolso dos que vivem delas. Meu trabalho constrdi; pra

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 118/411

nossa famdia e pra sociedade. Quero farmar um grande e sdlido 

 patrimonio, pra nds e pros nossos filhos. Ve se entende isso! Um 

 patrimonio  fica; 4 vida real. Papo e novela passam e nao deixam 

nada. Alim disso, sou fe liz na dedicagao ao trabalho." 

“Segundo!”  - a voz do ascensorista, misturando-se ao rufdo da

 parada do elevador. A porta se abre. Saio, arrastando nos ouvidos a

voz da mulhen ‘'Voce devia ter se casado com um homem! Pra sa(- 

remosdo is "construindo” por a(!” . .  .

Seguro firme a risada que explode no mtimo e entro na fila do

guiche recebedor. Enquanto aguardo minha vez, entrego-me ao flu

xo das id£ias suscitadas pela discussao no elevador, sem comando

intencional. Nao dirijo o processo de pensamento. Deixo que eleaconte^a, como se estivesse escutando uma conferencia. (Curio-so.. .)

“Aquela discussao vai longe... E o pior 6  que nao vai acabar em

acordo e harmonia. Cada qual se entrincheirou num extremo oposto,

emocional e ideologicamente. Nao conseguirao ser razoaveis. Qual

quer que seja a causa, o fato €  que nao tendemos naturalmente para

a razoabilidade. Do contririo, aqueles dois perceberiam que ambos

tinham razao.“Se combinassem as verdades bisicas das duas posigoes extre-

mas, encontrariam o ponto m&lio razoivel, a id£ia razoivel. Entra-riam em acordo, no triunfo do amor.

“Amor? Seri que se amam? Provavelmente nao. Se verdadeira-

mente se amassem, cada qual estaria pensando no outro e nem have-

ria discussao. Amor e ego sao mutuamente exclusivos. Onde um es

ti, o outro nao esti. Por isso, quem de fato ama realiza sua felicida

de na felicidade do ser amado —  E  nele! Se duas pessoas em verdadese amam, a dial&ica da conctfrdia se realiza automaticamente. Uma

diz: vermelho;  a outra diz: branco;  mas logo as duas se abragam,

imersas na aura rdsea do amor. Ambas dao e, por isso, ambas rece

 bem. E o ego nao esti; nem de uma, nem da outra. S<5 o amor esti e

elas sao uma s<5 pessoa. Pessoa? Nao. S<5 amor.”"Pois nao, moqo; sua vez.”

(“Minha vez. A fila estava enorme, mas nao demorou nem um se

gundo pra chegar a minha vez. Tempo. . . E quem “me caminhou”ate o guiche? “Eu” nao fui!”)

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 119/411

 Novamente no elevador, assumo o tema do amor, antes esponta-

neamente abordado.“Espere. . . se discussao 6  desamor, entao, praticamente nenhum

casal se ama de fato! Isto 6  terrfvel! Nao pode ser. Deve haver algoerrado na sua tese, Sr. Conferencista.”

Detenho o processo de pensamento dirigido. A mente vazia por

uma fragao de segundo e. ..“Nao. A tese esti correta. Muitos casais se amam de fato. Mas,

onde estS o ego, nao estd o amor.”

“E; deve ser isto.”

A porta do elevador se abre.

‘‘Sobel ’ 'A voz do ascensorista 6  a ultima coisa que me tange a conscien

cia, enquanto saio do pr6dio do Banco.

 No resto do dia, o trabalho. Nada especial.

A noite, em casa. . . Pressiono a tecla do toca-fitas. Deito e rela-

xo.

Som: sensagao na humana consciencia. Musica: harmonia em

forma de som; sensagao harmoniosa na humana consciencia. A har

monia comove, sensibiliza e purifica; inspira e aperfeigoa; encanta efelicita. Musica: som em harmonia; som que comove, sensibiliza e

 purifica; inspira e aperfeigoa; encanta e felicita.

A harmonia da musica toma-se harmonia da consciencia, e o ser

vive no Ser e esquece que 6 o ser. Entao, ele E! O ego nao esta e ele

se toma AMOR, no Ser. Realiza sua felicidade na felicidade do Ser.

E bem-aventurado na bem-aventuranga do Ser.

Da harmonia na musica ao mergulho na inconsciencia, nao sinto a passagem. (Inconsciencia? Ou subconsciencia? Ou superconscien-

cia? Ou ultraconsciencia? Ou nao-consciencia? Ou, simplesmente,

CONSCIENCIA - a verdadeira, pura e absoluta CONSCIENCIA?).

Volto; como de um sono profundo e sem sonhos. Mas sinto que

nao dormi. Tento evocar a consciencia naquele interludio. Nada

al£m de uma sensagao de paz e revigoramento.

O airanjo das plantas omamentais, no suporte gracioso. No alto, a

samambaia, explodindo em todas as diregoes, como a medir as di-mensoes do espago. A musica? J i terminara.

O ruido do elevador do pr6dio, e. . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 120/411

‘‘Vida 4 trabalho? Vida 4 dinheiro?”A mulher nao disse o que 6 vida,  para ela. Infiro: vida 6  existir

agradavelmente; tudo o mais deve ser mantido a nivel do necess&rio

e suficiente para isto. Seu sentimento da vida talvez possa ser assim

expresso:“Sou um ser individual e senciente. Tenho sensagoes, provoca- 

das pelo mundo exterior a mim. Esse mundo 4 composto das outras 

 pessoas, dos demais seres vivos, da natureza e das coisas em geral. 

Tais sensagoes podem ser agraddveis, ou desagraddveis. Esforgo- 

me para evitar e suprimir as ultimas, e causar e nutrir as primei- 

ras. Na medida em que o consigo, vivo agradavelmente - sou feliz. 

Viver 4 isto. Simplesmente. E existir agradavelmente, no corpo e no 

mundo. Deles deve provir a minha felicidade. Neles realizo a minha 

vida. Vida 4 felicidade no corpo e no mundo; pelo corpo e pelo 

mundo; para o corpo e para o mundo. Felicidade 4 sensagao agra- 

ddvel na consciencia. Vida 4 existir agradavelmente, no corpo e no 

mundo.”A breve suspensao do pensamento dingido.. . e a crftica, concisa

e anal6gica: O OURO DOS TROUXAS!

Prossigo imaginando o sentimento da mulher quanto a vida.‘'Tenho, ainda, sensagoes interiores, isto 4, que nao parecem 

causadas pelo mundo. Tamb4m estas podem ser agraddveis, ou de

 sagraddveis. Quanto as ultimas, se posso, suprimo-as; do contra- 

rio, controlo-as, mediante fatores de sensagoes agraddveis, que 

 procuro ou crio no mundo. Na medida em que o consigo, vivo 

agradavelmente —sou feliz.“Tudo, portanto, depende da agao do mundo sobre a minha 

consciencia. Eu  sou, de um certo modo; tenho certa natureza. O mundo atua sobre a minha natureza. Se essa atuagdo resulta em 

 sensagao desagraddvel, rejeito-a e luto para modified-la. Se o que 

vem de fora se harmoniza com o que estd em mim, aprovo e cultivo, 

 porque me sinto feliz; se nao se harmoniza, reprovo e luto para 

modified-Id e, se isto nao 4 possfvel, fago tudo para repeli-lo dt4  

elimind-lo; em ultimo caso, bloqueio, ergo uma barreira, oufujo.

“De qualquer forma, viver, para mim, 4 existir em agraddvel  

consciencia, no mundo a isto ajustado.”O OURO DOS TROUXAS!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 121/411

O ego presente em todo o raciocmio. O ego separa e diferencia -

diz: eu sou um ser individual e diferente. E. . . mas h i os outros,

tamb6m individuals e diferentes. E esti desencadeada a guerra dos

“egos” . A16m disso, o mundo, o campo onde essa guerra se desen-

rola, nao tem compromisso com qualquer desses “egos”. E a guerrase complica e agrava, porque o mundo tamb6m dela participa - 6  fe-

rido, mas tamb£m fere; e 6 tem'vel adversario, porque 6   insensivel;nem a inocencia o comove.

Assim, o miximo que aquela senhora do elevador pode conseguir

6   ser feliz “em m6dia”. Ou, sejamos benevolentes, e digamos que

ela consiga ser preponderantemente feliz. Seu ego 6   contihuo - ou

assim lhe parece ser —mas ela nao pode ser continuamente feliz.Contenta-se com a pirita e nao busca o ouro puro. Talvez j i tenha

ouvido falar do ouro, mas nao entendeu o que ouviu; por isso, con-

tinua a crer que sua pirita 6  ouro. Ou nao acredita que o ouro exista,

 porque o ego s6  pode enxergar a pirita, que o deslumbra.

Uma pausa no pensamento. A samambaia, explodindo; como a

realizar sua felicidade na felicidade do Espfrito do Espago. Abaixo,

a “jib<5ia” , torcendo-se em diregao i janela, em busca de luz.

Em busca de luz. .. busca de luz. .. de luz... luz. ..

Volto. Na mente inicia-se um diilogo com a mulher do elevador.

 Nao interfiro. Sou espectador, como num teatro. Curioso.. . primei

ro o “conferencista” ; agora, um “teatrdlogo” . E eu? Seri que. . .

A “ voz da mulher” corta a reflexao:

“Ser continuamente feliz? Mas isso 4 fantasia, sonho inutil, uto

 pia! S6 uma pessoa imatura pode tomar essa idiia como premissa 

de avaliagao da vida. Independentemente dessa tal “guerra dos egos” , a vida no mundo 4 assim mesmo. Nao pode ser continua

mente feliz . Desenrola-se em altos e baixos. S6 o biorritmo. . . 

 Responda: como 4 possfvel ser continuamente fe liz no mundo?”

O “outro personagem”:

“Precisamente. Como 4 possfvel ser continuamente feliz no 

mundo? A senhora o perguntou. A vida no mundo 4 assim mesmo. 

 A senhora o disse. Pois bem, pense nisso. Muito. Constantemente. 

 A resposta vird de quem a pode dar. E nao sou eu. E lembre-se: 

onde o ego esti, o amor nao esti. . . o amor nao esti. .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 122/411

As ultimas palavras soam como um eco, enquanto “o pano bai-

xa”.E o marido? Seu sentimento da vida 6  essencialmente o mesmo da

mulher, e sua felicidade igualmente Ihe escapa, com frequence S6

que dirige seu ego num outro sentido, que Ihe parece gerar bensperm anen tes. M as seu ego es td ; e o am or nao es td .

De novo o didlogo na mente, desta feita com o mando."Vai me dizer que o patrimdnio ndo fica? E no mundo material  

que vivemos, e devemos botar os pis no chao. O mundo (  material,

como nds mesmos, e a matiria i o nosso tesouro. Se nao vamos vi

ver para o simples viver agradavelmente, como a minha mulher,  

nem para acumukir bens quejiquem, pra que vamos viver? Filoso-  fia? Religiao? Intelectualuiade? Poesia? Estas coisas nao enchem 

barriga'. . . Admito que sejam nobres, belas, agraddveis, e at(  

uteis para preencher o lazer, quando a genie jd tem mn bom pam- 

monio e estd vivendo bem. Do mundo nada se leva! Responda. que

6 que realmente fica?’ Antes que o “ outro personagem” responda, penso.“Sim, o patrimfinio fica. Mas. . . para quem? Para os filhos.

Bom. Um ato de amor - se o ego nao estd nele. De_ qualquer forma... e esse ego tao precioso, que valonza o patnm6mo. Fica.

Vai? Desaparece? ,“O mundo €   material, como nds mesmos. E? Que 6   mat^na.

Quem souber o que 6 matdria, saber* quanto vale o seu tesouro; ou o

tesouro que estard deixando para os filhos. _ , ,“Filosofia, religiao, intelectualidade, e poesia, nao enchem bam-

ga. E a barriga? Fica?

"Sou feliz na dedicagao ao trabalho” - dissera o homem, noelevador. Dedicagao? Ou paixao incontrolada? Ou neuiose. Se o

seu ego nao estd no tesouro, estd nessa paixao, mas estd; onde estd o

ego. .Calo-me, para escutar o “outro personagem :-Minha resposta 4, essencialmente, a mesma que del a sua mu-

“ Precisamente. Que i que realmente fica? O senhor o P^rgun- 

tou. Do mundo nada se leva. O senhor o disse. Pense msso. Muito.  Constantemente. A resposta vird de quem a pode da r.E nao sou eu.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 123/411

 E lembre-se:  onde esti o ego, o amor nao esti. . . o amor nao est i . . .”

Viro o “cassette”, no toca-fitas. “Play”. Aperto.

A begonia. A musica. A begonia - buquSs naturais de pequeninas

flores vermelhas manchadas de branco.

Flores, em conjunto harmonioso. Danga magnffica da energia, no

teatro da natureza. Sublime e perfeita coreografia, da esseneia doSer feita vida na materia.

Musica: harmonia de vibragoes sonoras, que inspira, motiva e

anima a danga migica da esseneia do Ser na consciencia humana.

Onde o ego esti, o amor nao esti. .. Pirita nao 6  ouro. . . O ouro

dos trouxas. ..Harmonia na musica. . . Harmonia na consciencia. . . Abstragao

do ser. No Ser? No Amor?

Harmonia.. . o Se r. . . am or.. . ou ro.. .

O n d e o e g o e s t i , o a m o r n 5 o e s t i

O r a , o n d e e s t a m o s n 6 s , n o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

o e g o n a o e s t i ;

e n t S o . . . p r o f u n d a p a z , n o a m o r q u e e s t i s e m p r e !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 124/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 125/411

EGO, AMOR, E CAFE COM SAL

‘‘Onde estd o ego, nao estd o amor. .

Victor fica mentalmente passivo por alguns segundos e . . .“Espere! Onde esti o amor, esti algu£m que ama. . . esti um

EGO que ama! Como pode estar o amor sem estar alguem que ame?

Como pode estar o amor sem estar um EGO que ame?

“Puxa! Custou, mas agora eu peguei o Tio! Vou escrever pra

ele.”

E escreve. E vem a resposta:

E c o m e s s a r e s p o s t a c h e g a m o s n t i s t a m b S m ,

c r u z a n d o e s s e e n o r m e e s p a g o q u e e s t a A Q U I S E M P R E ,

d e s e j o s o s d e a j u d a r a j o v e m s o m b r a

n a l i g a o q u e d e v e a g o r a a p r e n d e r , . ,

"OndeestSoego, naoe s tioamor, digoeu. OndeestSoamor,estSum 

egoqueama,dizvocS.

"Entao, estamosemdiscordSncia. Creioqueestamosusandoomesmo 

rdtuloparalatascomdiferentesconteudos.Eupegoumalata,abro-a,obser- voseuconteudo, fagoalgunstestessimplescomele(comoprovS-lonaIfn- gua)edecido:4agOcar.EntSorotuloalata:AQUCAR. VocSpegaumaoutra 

lata, abre-a, dSumaolhadinha ligeira edecideapressadamente:4agucar.

EntSorotulaalata:AQUCAR.

"Tudo bem. Qual4a vidaque vocSestS vivendo?A sua. Entao, vocS 

colaosrdtulosquequiser,ondequiser.Qual4avidaqueeuestouvivendo? 

 Aminha.EntSo, eucoloosrdtutosquequiser,ondequiser.Apenasnaocon- 

v4musarmosamesmacozinha. VocSjSpdssalnocaf4,porengano?EujS.

Ehorrfvel!" 

Victor, j i menos seguro de ter “pegado o Tio” :

“I h . . . l i vem o Tio com as gozagoes dele.”

Depois, continua a ler:

"Temos um problema?Muito bem. . . Qual4o nossoproblema? Duas

frasesemconflito?Ora, nessasfrases, quaissSoaspalavrasessenciais? Eulhedigo:EGOeAMOR.EntSo,perguntemos:Que4ego?Que4amor? 

Quandotivermosestabelecidooquesejaegoeoquesejaamor,poderemos 

decidirse, quandoumestiver,ooutrotamb4mestarS,ounSo. Nuncaantes 

disto.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 126/411

"Temos umproblema?Perguntamos entao:qual 4 o nossoproblema? Depoisperguntamos, "que4isto?"para cadacomponentedonossoproble 

ma. Nas respostas que formos obtendo, irA surgindoa solugiodonosso 

problema. -Aospoucos iremosdescobrindoo que4cadacomponenteeas 

relagoesentreoscomponentesiraoseevidenciando."Temosdedeterminaro conteOdodecada lata, antesdenospormosa 

misturarconteudos. Rdtulos?Estespodemosmisturararbitrariamente,sem problemas, Vociescreve numpapel:CAFl=;numoutro:SAL. Depoisjunta 

osdoispap4is.Nadaacontece. Vocipodea tiescreverosdoisrdtulosnum 

mesmopapelerelacionA-loscomumapreposigao:CAFIzCOMSAL.Nada 

acontece, alim depalavrasescritas numpapel. Comosconteudos4dife 

rente. Vocimisturac a ficomsale ...4horrfvel! 

"Porissoestousemprelamentandoqueaspessoasn io cultivamoque 

costumochamarde  consciencia de significado.Sabeoque4alinguagem,

faladaeescrita,damaioriadaspessoas?C aficomsailLinguagem, faladae 

escrita?PiorlO  pensamentodamaioriadaspessoasestia todoinstante 

resultandoemca ficomsal!Porquepensamento4, primeiro,jogodecon 

teudos, equandoos rdtutos, quesaosegundos, estaotrocados.. . Assim,

talvezn io seja de todo exageradopensarque a vidanestemundoseria 

muitomelhor, individualecoietivamente, seapenasaspessoascultivassem 

essaconsciinciadesignificado.

"Sabe o que sao as nossas escolas, desde que fundamos escolas? Centrosdeaprendizagemde "combinagdesderdtulos ” Porisso(pelome 

nos em parte, talvez fundamentalmente) delas n io resulta, generalizada- mente, SABER. Seriabomquealguimfundasseumaescolaquefosseum 

centro de estudo, pesquisa ediscussaode  significados.Distopoderia re- 

sultarSABER,quesdpodedecorrerdePLENAECORRETACONSCIEN 

CIADESIGNIFICADOS.

uPorisso4fundamentalperguntarmossempre:QUEEISTO?Ou:qual4 

oSIGNIFICADOdestapalavra?Paran io confundirmosfamiliaridadecoma palavraerealconsciinciadesignificado.

“E aqui surge um novo aspecto, emqualquerproblema. Napergunta,

“quei isto?", h i umegoquepergunta?Esuaslimitagdes?Eseuscondicio- 

namentos? 

"Quem4esseego?Oucomo4ele?Umlivrepensador,quesecoloca 

primeiroeacimadetudocomoHOMEMnoUNIVERSOenaVIDA?Como 

homemsemrdtulosarraigados,nouniversosemrdtulosarraigados, vivendo 

umavidasemrdtulosarraigados?Quebuscaa verdadeej i compreendeu 

queelanuncae starinosseusrdtutos?Entaoeletemmaiorpossibilidadede atinarcomrespostascorretas.Porquees ti "desrotulado"elivreparapensar 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 127/411

criadoramente,sempremissascondicionadas.

"Quem 4 esse ego? Ou como 4 ele? Umpensador condicionado is 

idiiasdealgumaescola,dequalqueresp4cie?Umindivfduoqueserotulade 

FILdSOFOepensacondicionadamentecomofildsofodecertaescola?Um 

indivfduo que se rotula deRELIGIOSOepensacondicionadamentecomo 

religiosodecertaseita?UmindivfduoqueserotuladeCIENTISTAepensa 

condicionadamentecomo “homemde ciincia"?Existe isto nanatureza. . .

"homemdeciencia”?Quemsouberoque4homemeoque4ci6ncia,sabe- 

r&oque4primeiroenaoserotularSde"homemdeciincia".

"Como 4, portanto, esseego? Como umcomputador  programadopara 

pensardecertomodo?Entao temmuitomenorpossibilidadedeatinarcom 

respostascorretas. Porqueest£  "rotulado "epensasempreapartirdepre 

missas condicionadasearraigadas, quenaoousapdremduvida (ounem lheocorrefaz4-lo).

"Houveumque veioedisse:  . . averdadevos libertard” .Poisbem,a 

voc4,meuqueridoamigo,proponhoagoraaconsideragaodarecfproca:SE 

FORDES LIVRE, CONHECEREIS A VERDADE. E SOMENTE SE E 

QUANDOFORDESLIVRE! 

“Porissoeu lhedisseantes:pergunte. . . masnaoresponda. Se  voc§

responder, suaslimitagoeseseuscondicionamentosestaraonarespostae 

ela ter£maiorprobabiiidadedeserfalsa. Porisso eu lhedisseantes:per -gunte.. . eespere.Ponhasuamenteemestadopassivoereceptivo,etireo 

seuegodocaminho.Seoconseguir, derepenteSENTIRAa verdade, num 

soprosutildoEspfritodoEspago.Equesentimento4essequesentirA?Eu 

lhe digo: CONSCIENCIA!NSo j& faleiemCONSCIENCIA designificado? 

"Cons-CIENCIA..

“Sabe o que 4 a evolugao da humanidade?Umprocesso de CONS- 

CIENTIZAQAO, de gradativa TOMADA DE CONSCIENCIA. Osque sao 

menos conscientessaomaisprimitivos;os que saomaisconscientessao 

menosprimitivos;eosquesSoplenamenteconscientes.. . bem, costuma- 

se cham4-losde “iluminados", aexemplodeGautamaeJesus,quese tor- 

naramBudae Cristo (respectivamente. . . ouidenticamente?). Tristecons- 

tatarquesomosaindainconscientese,porisso,primitivos.

"Mas voudeixareste temaassim, ounSo consigo voltaraonossopro 

blema.

“Dei-lheumachave-de-ladr&o. Que fezcomela?Atirounalataecobriu 

comsal?Esqueceu-a emsua caixade rdtulos?V&buscA-laetentaremos 

abrirasnossas. . . latas. (Naosabia?A chave-de-ladr§oquelhedeitanto abreportascomolatas.)Vejamosentao: 

“Que4ego? 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 128/411

"Ego . . . eu.. . sentimentodeindividualidade;sentimento,econsequente 

convicgao,deserumentesingulardecertaespdcie,distintodeoutrosentes 

singularesdamesmaespdcieedeintimerosoutrosentesdediferenteses- 

p6cies. Sabeoque6,entSo,esseego?Umpeculiarcentromagndtico, que atraiquando ihe convdmerepelequandonaoIheconvim. Atraiumoutro 

ente, queIheconvim, associa-oasi,erotula:"meu".E "eu"e “meu"pas- 

sampraticamenteaseconfundir, noegoque6ocentro. Perdeuesseoutro 

ente?Sofre. Recuperou-o?Fica feliz. Depreciaramesseoutroente?Sofre.

Valorizaram-no?Fica feliz. Eassimpordiante,nesseinterminiveleinsen -

satojogo deatrair vaiorizagao e repelirdesvalorizagao, EGOCENTRICA- 

MENTE. Algopode valorizi-lo?Eleatrai. Ocontr&rio?Elerepele. Feliz.. .

infeiiz:feliz...infeiiz;eagangorranSopira.

E .. . umcentro, esseego.Masescuro, semluz.Emvaoseesforga,no 

entanto,para luzir.NSo6luzeiro;6terrafoscaeemtrevas.Mastentaobsti- 

nadamentebriihar,semperceberqueseu“brilho"6falso,passageiroeiiusd- 

rio.

“Lembra-se?Houve6pocaem quedramosaindamaisprimitivoseacre- 

ditAvamosquea Terrafosseocentrodouniverso.EstSvamosentioemtre 

vas,porque4ramosocentroenao tfnhamosluz, ndsmesmos.Foiduroe 

doloroso,paraalgunsdends, trazerluz&consciinciahumana, situandoo 

Solnocentrodouniverso.Afinal,conseguimosimplantarateoriahelioc&ntri- 

ca. Fez-se entSo luzemnossa vida?Umpouco.Mastaopoucoque,prati 

camente, continuamosemtrevas.Porquecontinuamosacrerquesomoso 

centro;insistimosemnossandsciateoria egoc&ntrica.

“Teoria  geocfintrica:a Terranocentro. Trevas. Teoria egocfintrica: "eu" 

nocentro. Trevas. Teoria  heliocfintrica:oSolnocentro.Luz!Teoria onicSn-

trica:TUDOnocentro.LUZ! 

"Assim, asag6esdesseegosaoforgas: centrfpetas,quandoaquiloque 

movempara o centropode valorizi-b, engrandece-lo, faz i-loparecerim 

portanteegrandeanteoutrosegos; centrlTugas,quandoatendinciaprevisf- 

veldaquiloquepodeafet£-lo6oposta.Oempenho(inconsciente)desseego 

6,portanto,desersempreems imesmo, valorizadoeengrandecidoaom£- 

ximopossfvelporsuasagdescentrfpetasecentrffugas. Tudoque6 "bom" 

deveparaeleconvergir;tudoque4"mau”devedeledivergir.

"Quantos homens sSo assim egocintricos? Ora. . . quantos homens 

existemna Terra, voceeeuinclufdos?Somosindivfduos, vivendono“eu"e 

no "meu"amalgamadosnesseegoquese fazcentro.Excegdes?Existem; desgragadamentepoucas,masexistem.Esforgo-meportomar-meumade- 

laseseiqueumdiavouconsegui-lo.Diffcil?Extremamente;maspossfvele 

necess&rio. J i conseguiresultados importantesen io desanimoanteo4r- 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 129/411

duocaminhoqueaindafaitapercorrer. J isentiopulsodoEspfritodoEspa 

gono coragaodoloridocomahumanador. Iniciou-seentaoaexpansSodo 

coragdo.Umdiaeleestaritio expandidoqueosrdtulos"eu” e"meu"cairao 

porsi,porquen iohaverimaisdeum;haver&somenteUM,nocoragSoex 

pandidoaoinfinito! “Enamedidaemquenostornemos todosassimonicentricos,esomente 

namedidaemqueassimnos tornemos, poderemos implantar, verdadeira- 

mente,osistemasdcio-polfticoqueseja  frutodediscemimento,saude,paz,

felicidade . . .  AMOR! 

“H imilenioscometemosoequfvocodepensarocontririo:que, implan- 

tandoesseouaquelesistemasdcio-polltico, conseguirfamosdiscemimento,

saude ,paz, felicidadeeamor,paratodos.Oequfvocodoshomens!Opeca- 

dodoshomens!0 fruto?Adordoshomens! 

“Bemocontririo:somenteSEeQUANDOhouverdiscemimento,saOde,paz, felicidadeeamor, emtodososhomens, se riomelhorsistemasdcio- 

polltico naturalmenteimplantado. Esomentenamedidaemqueformosme 

nos egoc&ntricosemaisonic§ntricos, poderihaverdiscemimento, saude,

paz, felicidadeeamor,emtodososhomens.Porenquanto,omelhorsistema 

sdcio-pollticose riaquelequemaiseficazmenteleveoshomensasetorna- 

remmenos egocentricos emais onicintricos. Egocentrismo?Competigao 

egofstica edor. Onicentrismo?Colaboragio fratemae felicidade!Competi 

gao?Egocentrismoedor.Colaboragao?Onicentrismoefelicidade! 

"Diffcil?Extremamente!Mesmoemtodasas instituigoeseorganizagdes 

decariterhumanitirio (comoreligioesesociedades fraternais),percebem- 

seclaramenteapersistinciaeosefeitosnefastosdoegocentrismo.Perce- 

bem-se rivalidade, competigao , disputa,bemcomovaidade,aindaqueem 

nomedosnobres ideais da instituigao. O indivfduoquedesejeseassociar 

somenteaumgrupohumanoemcujoseion io hajamanifestagoesdeego 

centrismoficarisozinho.

"Eisentaooque£oego:sentimentodeindividualidade;vivercentralizado 

em"eu"e “meu";centromagndticopessoal;inconsci&ncia, trevas ;contra -gaopsicoldgicadoSer, infinitoereal,num“eu"finitoe irreal, ilusdrioetem 

poral.Pecado.Seufruto?Dor.

"Que6amor? 

“Ora.. . j i disse:ONICENTRICIDADE!Naopercebeu?Escrevamosen 

tSoo contririo doquedissemosparaoego:sentimentodeuniversalidade; 

eliminagaopsicoldgica de "eu”e “meu”, no viver transcentralizadoou  oni-

centralizado; identificagSo, num centromagndtico impessoal; consciincia,

luz;expansSopsicoldgicado "eu”, finitoe irreal, ilusdrioetemporal,parao 

Serinfinitoereal.Virtude.Seufruto?Felicidade.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 130/411

 AiiSs. . . 4istooamor?Nao .Oqueele4naopodeserdito. Isto4mera 

enunciagSodas circunstSncias necessirias£manifestagSodoamor,a v&- 

riosgrauseemvSriosnfveis.Amor,defato?S6porexperiincia.

"Umhomemsentiueconheceuamore, depois, tentouevocarseusenti mento?Entaopercebeuque, quandohouveamor,elenaoestavacentraiiza- 

doemseuego;ocorrerauma transcentralizagaoeeleforanoenteamado; 

ouuma  onicentralizagaoeeleforanumcentroimpessoai,noEspfritodo 5s-

pago,quesefaztudo! 

"Amor?Entao, transcentraiizagSoda consci4ncia, doegoparaumente 

amado, oudoegoparaoEnteUniversal,oEspfritodoEspago, quesefaz 

tudo!Amor?EntSo,perdadeconscienciadoegoevidanumenteamadoou 

noEnteUniversal,noEspfritodoEspago,quesefaztudo! "FScil?NSo;extremamentediffcil!Diffciiat4entendernosmaisveementes 

ecomoventesexempios.Querver? 

“Houveumqueveioedisse: 

''Amai os vossos inimigos” ; "nao resistais ao perverso, mas aqualquer

quevosferirnafacedireita,voltai-lheaoutra";“todoaqueiequeseirarcon

tra seu irmao estarS sujeito a julgamento"; “honrai a vosso paiea vossa

m§e,eamaivossopr6ximocomoav6smesmos”.

"Eculminousuamensagemaosseussemelhantesdizendo: 

“Assimcomoeuvosamei,quevosameisunsaosoutros"!

"Masessemesmo,quedisseestascoisas,certavez: 

. . tendo entrado no templo, expulsou a todos os queali vendiame

compravam; tamb6m derrubou asmesasdoscambistaseascadeirasdos

quevendiampombas".

"Deoutra feita, quandolhedisseramquesuamaeeseusirmSosqueriam 

falar-lhe,retrucou: 

"Quem£minham§eequems§omeusirmaos?E,estendendoam§opa

raosdiscfpulos,disse: EisminhamSeemeusirm§os.Porquequalquerque

fizeravontadedemeuPaiceleste,esse6meuirm§o,irmaemae” .

"Etamb4m: 

“Quemamaseupaiousuamaemaisdoqueamim,nao6dignodemim;

quemamaseufilhoousuafilhamaisdoqueamim,n§o6dignodemim.NSo

vimtrazerpaz,masespada”.

"Eaumquepediupara,antesdesegui-lo,sepultaropai,respondeu: 

"Deixaaosmortososepultarosseusprdpriosmortos”.

“Viu? Nao 4 fScil entender, mesmo no mais veemente e comovente 

exempio!Nomaisveementeexemplodeamor,aatitudeparecefriaeaagio parecedura.

"Entreparinteses, aiiSs, haveri talvezquemaponteaprecariedadede 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 131/411

seconfiarnastradugoesdosEvangelhosdeJesus.Amimistonaoimporta,

 j i queconsidero,antes, aprecariedadedeseconfiarabsolutamentenodis- 

cernimentodosprdpriosautoresdessesevangelhos.A lim disso,averdade 

da vida es ti presenteem todoserhumanoeem tudo. Hojecomoontem.

Quemaquiserconhecer, te rideexperiencii-ladiretamente,navidadoEs pfritodoEspagoquese faztudo. Teridedeixardesernoego,paraserna 

essinciasutil, infinitaeeterna, doSerquesefaztudo (“sealgu6mn§onas-

cerdenovo,naopoderiveroreinodeDeus"...). Asinformagoesdosquea 

conheceram(dosMestreselluminados), aindaquedelesdiretamenterece- 

bidas e fidedignas, nuncapoderio sermais do queistomesmo:informa- 

goes.

"Deixemos isto de lado, porim, e cuidemos do que estabelecipara o 

nossotema: 

"Oegosemanifestanaconsciinciada individualidade. Oamorsemani- 

festanaconsciinciaqueapreendee assumeavidadoenteamado. Oego 

serealizaemmotivagdeseagoesvoltadasparasimesmo.Oamorsereali- 

zaemmotivagdeseagoesconsonantescomanaturezaeavidadoprdprio 

enteamadoeassumido.

“Toma-seassimevidentequeaconsciinciadoamorrequerinconsciin- 

ciadoego.Ou, comoeudisseantes:ondeoegoesti,oamorn io esti.Por 

exemplo, h idesejodequalquerespicie?Entaooegoe s tieoamorn io po 

deestar.“Porissooamor4muitoraronomundo. Fosseeletio comumquantoo 

usodapalavra amore, certamente, estarfamosvivendoempazefelicidade.

Eoquei , issoquetantochamamdeamor?Querumapalavra?Eulhedou: 

paix&o.Se vociaceiti-la, podereidizercomvoci:“ondee s tiumapaixao,

estiumegoapaixonado".Evocipoderidizercomigo:"ondeoegoesti,o 

amor n io esti". Por fim, somente se isto acontecer, poderemos usara 

mesmacozinha,semnosarriscarmosatomarca ficomsal.Vocij i tomou? 

£ horrfvel!" 

Victor suspira e pensa:

“Ou eu ainda tenho muito o que aprender com o Tio, ou ele 6  um

mestre na arte de confundir a gente. Sei 16! Vou ter de ler esta carta

de novo. . . Por enquanto, melhor eu ficar na minha cozinha e ele na

dele. Caf6 com sal... deve ser mesmo horrfvel!”

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 132/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 133/411

R o b f i s n a n a t u r e z a ?

Q u e 6 i s s o q u e n o s s a j o v e m s o m b r a I S ?V e j a m o s . . .

"THE END” . Acaba o filme de ficgao cientifica, na TV.

Curiosa expressao: ficgao cientifica.  Duas palavras de significa-

dos mutuamente exclusivos —o que 6  ficgao nao 6  cientffico; o que €  

cientffico nao e ficgao. Sua combinagao deveria ser impossfvel, por

que absurda. No entanto, af est£, consagrada pela maioria. A maioria. . . Quem tem consciencia de significados?

E essa expressao absurda tem significado! Ficgao calcada em

 plausibilidades apoiadas em princfpios e fatos cientificos. Lembra o

“plausfvel impossfvel” que serve de base aos criadores de desenhos

animados. Bom que tenhamos consciencia do absurdo dessa expres

sao, para que possamos desligar o televisor sem resfduos incons-

cientes de preocupagao, medo, ou simples pessimismo quanto aos

destinos da humanidade. Esses resfduos inconscientes podem se in-

sinuar sorrateiramente em nossa visao da realidade e em nossa atitu

de para com a vida, distorcendo-as. E justamente naqueles que nao

acreditam nisto o efeito pode ser mais danoso.

“Ficgao cientifica.. . esse Tio. . . ”

Toca o telefone. Victor poe o escrito do Tio sobre a mesa e vai

atender, resmungando:

“Telefone. . . Valioso instrumento de comunicagao a distancia,

mas, hs vezes, bastante inoportuno.”

Poucos minutos depois, volta, comentando irritado:

“Ainda por cima era engano!”

Senta-se, respira fundo e exala forte para recobrar a serenidade e

se prepara para retomar a leitura. Antes, lembra-se: “Voce vai ter de

ser um lago vivo” . . . “Cessa o fator de perturbagao? Voce se acal-

ma. Como? Com um forte e prolongado suspiro” . Sorri. Depois:“Onde foi que eu parei? Ah, sim; na crftica a ficgao cientifica.

E . . . acho que o Tio tem razao. Ali£s, ele esti sempre criticando es

se defeito, que a maioria das pessoas infelizmente tem, de adotar

id6ias irrefletidamente. Se apenas aprendessemos a refletir. . . Bem,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 134/411

nao adianta pensar em que as pessoas deveriam ser diferentes. Melhor continuar a leitura:”

‘‘Perigo! Perigo! Perigo!’'

Do filme ficara o eco da “voz” do simpatico robo, advertindo

seus donos de uma ameaga iminente.

Fantdstico robo! Estrutura “corporal” como a do homem: cabega,

tronco e membros. Sensores conespondentes aos sentidos humanos.

Mais extraordindrio ainda: capaz de discemir e formar juizo! E que

 perspicaz humor! Por vezes manifestando at£ sabedoria, como fruto

de grande experiencia da vida!

Vem a curiosidade: que existe realmente, em materia de robos?

 Representagdo.  . . revolta. . . risco. . . rival. . . aqui estd: robo.  Palavra criada em 1921, pelo escritor tcheco Karel Capek. .  . Hi-

 p<5tese de revolta de robos deve ser considerada fantasista. . . Ver 4 

uma fungao transcendente de que nenhuma mdquina 4 ainda ca

 paz. . . Portanto, ao que parece, o robo de Capek 4 um mito.

E numa outra fonte:  Mdquinas que funcionam automaticamente,

 para substituir o esforgo humano; nao precisam se assemelhar a se

res humanos nem executor fungdes a maneira de homens e mulhe- 

res.Dependencia de componentes eletronicos para processar informa-

gao oriunda do ambiente; robos capazes de “tomar decisoes”; robds

industrials; robos cienttficos. . . leio muitas informagoes, inclusive

sobre um robd que foi denominado (nos Estados Unidos) o “primeiro humandide” .*

E. . . mas estamos ainda muito longe do simpdtico robo daquele

filme. Sinto-me certo, por£m, de que faremos coisas espantosas,

combinando nossos maravilhosos minicomputadores, minicamaras deTV, microcircuitos, e sei Id quantas mini e micromaravilhas que

 produzird nossa impressionante macrointeligencia!(Inteligencia. . . que 6? Habilidade no uso das fungoes cerebrais?

Se 6, nao a ponho no trono. Nao 6  a rainha. “Quem” €  a rainha?)

O rddio, em cima do mdvel. Rddio. . . que €1 Que faz? E instru-

mento. Transforma. Que recebe? Ondas eletromagn^ticas, ditas hert-zianas. Ah . . .

Imagino (com visao canhestra de leigo) um robo equipado comavangadfssimo sistema eletr6nico de comunicagao —“rddios”. Pode

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 135/411

receber de longas distancias; e, tambdm, emitir a longas distancias.

Solto completamente a imaginagao, na “construgao” do meu robo.

Maravilhosa minicamara de TV lhe permite captar imagens do

exterior. E ele as pode transmitir.(Imagens. . . que sao? Luz refletida por um objeto exterior ao ro-

 b6 €   captada por sua camara de TV. Produgao de cargas eldtricas

 pela incidencia da luz numa placa especial. Transforma aqui, trans

forma ali; el£trons que se movem rapidamente aqui, sao bloqueados

adiante, acumulados nao sei onde. . . e a coisa vai acabar numa

transmissao radielStrica da imagem. Da imagem? Imagem 6   fenome

no eletronico?)

Mudangas de temperatura, no ambiente, sao tambdm detectadas pelo meu robo. Nova produgao de fenomenos el6tricos, novas ope

ragoes com os mesmos, e um distante Centro de Comando pode re

ceber informagao sobre a temperatura do ambiente em que se en-

contra o meu robo. Viva o elytron! Viva a eletricidade!(Temperatura.. . que 6? Medida de intensidade de calor. Calor. . .

que 61 Forma de energia diretamente relacionada com movimento na

materia. E, mas. . .)

Meu robo “fala” comigo. Fago uma pergunta. As vibragoes que provoco no ar atingem um sensfvel microfone no robo. Nova produ

gao de fenomenos etetricos, novas operagoes com os mesmos, e um

extraordindrio microcomputador, na “cabega” do robo, 6  alimentado

com a minha pergunta. Admirfveis e complexas operagoes. eletro-

magneticas, e o computador emite impulsos eletricos para um alto-

falante situado na “boca” do robo. E assim ele fala, e me d A  uma

resposta perfeitamente 16gica!

(O robo “ fala” . Emite som. Som. . . que 61 Consulto minhas en-

ciclop6dias:

Variagao rdpida da pressao do ar, que provoca uma sensagao 

nos drgaos da audigao.

Gozado. . . Orgao tem sensagao? Enfim. . . a gente define o que

quer, como quer. De qualquer forma, variagao rSpida da pressao do

ar 6  som? O u . . . variagao rdpida da pressao do ar?

 Embora o som proporcione os estfmulos para a audigao, que 4 uma experiencia subjetiva, ele prdprio existe como fenomeno obje

tivo, mensurdvel, fi'sico.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 136/411

Gozado. . . A audigao €  experiencia subjetiva, mas o som 6  feno

meno ffsico. Este provocando aquela. E. . . a gente poe os rdtulos

onde quer. Mas. .. e a realidade? Sabe ler?)Voltando ao meu robo. Poderia ele deliberar  receber transmissoes

do Centro de Comando? E o que e quando emitir para esse Centro?Volitiva e arbitrariamente? Sem qualquer programagao ou estimulo

especial? E esse robo. . . veria as “imagens” captadas por sua cama-

ra? Sentiria  calor? Ouviria  som?  Deliberaria  o que dizer, ou res

 ponder? Teria consciencia  de estar vendo, sentindo, ouvindo, deli-

 berando?E quando ele fosse desligado? Nada alem de componentes eletro-

nicos e pegas mecanicas e otic as? E quando fosse destruido? Fim?

O r£dio, em cima do mdvel. Ondas eletromagn6ticas pairando no

ambiente. Ligo o r£dio. Um coral. Lindo. . . impressionante. . . ma-

 jestoso. . . arrebatador! Reconhego-o: “A Criagao” . Haydn. Um

orat6rio. Profunda seriedade. .. abstragao. .. lembranga:

Um jovem. O homem, no universo. Questionando-se, e ao univer

so. Constantemente. Angustiadamente, ks  vezes. Misticamente, tam-

 b£m. Certa noite, abstraido, subito a mente se esvazia! Entao. . . o

coral! Lindo. . . impressionante.. . majestoso.. . arrebatador!

Mas. . . coral? Som? Onde a Estagao Transmissora? Onde o Cen

tro de Comando? Ondas eletromagn6ticas pairando sempre no uni-

verso?

E . . . a Natureza tambem faz?

t .. N d s , q u e n o E s p f r i t o t e m o s e s t a d o s e m p r e ,

p o r t o d o o E s p a g o ,

c o n h e c e m o s b e m e ss e " c o r a l ” - a r re b a t a d o r!E c h e g a m o s a s e n t i r o i m p u l s o

d e g r i t a r p a r a n o s s a j o v e m s o m b r a :

" v e m , d e i x a - t e a r r e b a t a r . . .

t u q u e r o b o $ q u a s e n a o 6 s ! "

“Bem, esta reflexao com o caso dos robos ja 6  mais o Tio.” -

Pensa Victor.

“Mais o Tio? Por acaso ele 6  mais isso ou mais aquilo? Nao. Ele€  o que sente que conv6m ser a cada momento. J6 o vi ser de v&rios

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 137/411

modos. E, falando ou escrevendo, manipula ideias com desconcer-

tante flexibilidade. E nao raro se desdiz ou contradiz. E quando a

gente reclama, ele vem com aqueie jeito dele de usar paradoxos:

Ora.  . . eu me desdigo e contradigo porque sou coerente!

“E fogo! Mas tem o coragao mole, o Tio. Encuca a gente s6  pra

causar impacto; mas logo desencuca ou, pelo menos, tenta. Ele

mesmo diz que, teoricamente, poderia ser um bom instrutor, levando

as pessoas a refletir, pelo “m6todo da encucagao” . Mas logo sente

compaixao e se apressa em desencucar. E arremata, rindo: Sou um 

mau instrutor, porque, como dizem por ai, na prdtica a teoria 4 

outra.  Nesse caso de “ser coerente por se desdizer e contradizer”,

 por exemplo, ele esclarece:

“Estou cansadodedizerqueapalavra£segunda,eopensamentopuro,

que6sentimentodireto,6primeiro;queapalavra6condicionante,demodo

que, enquantoestivermoscondicionadosaquaisquerpalavras,ouqualquer

terminologia, nao seremos livrespara discernireapreenderopensamento

puro,que£ sentimentodireto;queapalavra§produtodonosso intelecto,da 

nossa razao,frutodenossas fungSescerebrais,e . . . filhodegato,gatinho6! 

“O intelecto6limitado?Entaoapalavra6limitada.0 intelectoestdsujeito

&s ilus&es dos sentidos? EntSo a palavra reflete as ilusSesdos sentidos.

0 intelecto comete equfvocos de pressuposigao? EntSo a palavra reflete

equfvocosdepressuposigSo.O intelectocometeerros deinferencia?Ent§o

a palavra refleteerros de inferencia. O intelecto podeestar condicionado?

EntSoa palavra pode refletir condicionamento.O intelectopode refletirfalta

de desenvolvimento cerebral? EntSoa palavra pode refletir falta dedesen-

volvimentocerebral.O intelectopodeerrarpor faltadeinformagSo?EntSoapalavrapodeexpressar ideiaserrfineas,porfaltade informagSo.0 intelecto

poderefletirfaltadeexperiftncia?EntSoapalavrapoderefletirfaltadeexpe-

ri&ncia.Echega!JSdSpraperceber.

“Por issomerecuso aaderirrfgidaedefinitivamenteaqualquerpalavrae

qualquer terminologia, pormaisatraentesquesejamoumelhoresquepare-

gam. Naome iludo. A palavra6utilfssimorecursodeexpressSoecomuni-

cagSo, e isto 6omSximo que ela pode ser, seusadacomproficifincia (la-

mentavelmente, por6m, emgera l...) . Masaquibemqueestouinteressado 

nSopodeserditonemcomunicado;nSoporpalavras."

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 138/411

“O Tio e suas ideias, aparentemente malucas, na carga que ele

faz contra a razao e a palavra. No entanto, ele pr6prio insiste na

CORRETA REFLEXAO e, reflexao, 6 fungao da razao!  A\6m disto,

como refletir sem usar palavras? Como pensar sem palavras? Impos-

sivel!“Impossivel, MESMO! Tudo tem nome; tudo esta associado a al

guma palavra. Este cinzeiro, por exemplo. Olho para ele e penso:

cinzeiro.  Impossfvel nao pensar na palavra; ela acontece na minha

mente, automStica e inexoravelmente.”

Sem deliberagao, naturalmente, Victor se poe a contemplar passi-

vamente o cinzeiro. Vivamos em sua mente, pelo poder do Espfrito

do Espago, os eventos que nela se passam:Cinzeiro. . . azul.  . . circular.  . .fundo. . . transparente.  . . vi- 

dro.  . . dxidos diversos, fundidos e resfriados. . . dxidos diver- 

 sos. . . dxidos.  . . ions.  . .  Atomos. .  . eletrons, prdtons, neu

trons. . . energia.  . .

A mente do Jovem, concentrada no cinzeiro atrav^s da visao, vai

se tomando mais e mais contemplativa, at6 que, de repente e por al

guns segundos, esvazia-se de palavras e vive uma sucessao de sen

sagoes puras e intensas. Usemos n6s as palavras necess&rias a ten-

tarmos expressar o que entao se passa nessa mente intensamente

consciente de sutis sensagoes:

Cor.  . . forma. .  . brilho.  . . transparencia. . . outras cores,

 formas. . . volumes no espago. . . o espago.  . . volumes diversos no 

espago. . . brilho. . . cor. . . volumes no espago.  . . no espago. . . 

energia. . . vibragdo.  . . essencia, sutiKssima.  . . nos volumes. . . 

no espago. . . essencia que se fa z volumes. . . essencia no espa

 go. . . cores, formas, volumes. . . espago. . . vibragdes.  . .  sensa

 gao: o corpo. .  . volume no espago.  . . no espago: o corpo. . . vo

lume. . . CONSCIENCIA!. .  . no corpo. . . no espago. . . no teste- 

munho silente da essencia do espago nos volumes e no corpo!

Um suspiro, e Victor volta ao estado comum de consciencia. Sor

ri, encantado, apaziguado e feliz. Safmos entao de sua mente, en

quanto ele volta a refletir:

“E. . . pensar sem palavras. . . no sentimento direto, que 6  pensamento puro! A palavra €   segunda. A esscncia do espago, que se

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 139/411

faz coisas e consciencia, 6  primeira. Estamos condicionados ao que

€   segundo e arbitrdrio. Por isso raramente sentimos, coisas e cons

ciencia, porque as pensamos na palavra, que nao estd   nas coisas

nem na consciencia, jd que 6   segunda e arbitrdria. Bem diz o Tio:

utih'ssimo recurso de expressao e comunicagao, mas isto e o mdxi- mo que ela pode ser, a palavra” .  Mas esse mdximo 6  muito impor

tante, especialmente se a palavra 6   inspirada pela metacognigao  aque o Tio se refere.

“Metacognigao. . . a cognigao que decorre daqueles instantes em

que o homem se abstrai do ego e vive na vida pura e suprema da Es

sentia do Espago que se faz tudo; em que ele se faz inconsciente e

vive a vida dessa esseneia pura e suprema que vibra no amago detudo; em que ele transcende a palavra e, quando volta, tornado de

doce bem-aventuranga, tem a palavra iluminada pelo influxo da vi-

 bragao pura da esseneia do espago em seu prdprio amago: DIS-

CERNIMENTO! “Dis-CERNE-mento” !

“Agora sinto porque o Tio diz que a inteligencia nao 6  a rainha.

A metacognigao 6  a rainha; e o discemimento 6  o prmcipe, seu filho

amado, que reina no coragao do homem que se abstrai do ego e vive

na vida da Esseneia do Espago. E a inteligencia que se dd em comunhao a esse Principe de Luz 6  bem-aventurada princesa. Feliz o ho

mem que tenta cultivar a metacognigao, porque somente ele pode

aspirar a se tomar um verdadeiro sdbio, porque metaconsciente e 

metassapiente.  E na luz dessa cognigao superior, que transcende a

 palavra, sao os atos desse homem inspirados pelo amor, que 6  a lei

da vida da Esseneia do Espago que se faz tudo! Luz e amor, na vida

da esseneia.. . do ESPIRITO DO ESPAGO que se faz tudo!”

Victor pausa um pouco, como a observar e desfrutar, encantado,

os sublimes efeitos de sua contempiagao. Depois, sente o coragao

tomar-se de compaixao pela humanidade. Expressa entao:

“Triste. . . Estamos todos “ robotizados” , na inconsciencia de

significados e sentimentos diretos, que sao pensamento puro.  Robos, 

6  o que somos! Agora imito o Tio: Sabe o que 6  a humana evolugao?

Um processo de desrobotizagdo! ’ ’ 

Victor gira entao subita e rapidamente a cabega e olha para certo ponto da sala, sob forte e estranha sensagao de uma presenga. Um

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 140/411

arrepio percorTe-lhe velozmente a espinha e vai se desfazer numavibra^ao dispersa pela nuca e a cabe^a. No entanto, ele nada ve.

Respira fundo, olha para o escrito do Tio e diz, afinal, enquanto

exala e guarda o papel:“E. .. boa pergunta, a do Tio: a natureza tambemfaz robos.

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 141/411

O r a , e x i s t e i s s o , . . d e s t i n o ?

E l i g a d o a u m a r o d a ?Q u e 6 d e s t i n o ? Q u e 6 r o d a ?

E n f i m , v e j a m o s a q u e n o g o e s c h e g a m

n o s s a s jo v e n s s o m b r a s . , ,

“Pensar sem palavras? Que maluquice 6  essa?” - admira-se Alba.

“Nao €  maluquice” - diz Victor; e prossegue:

“Agora sei que nao 6, porque ontem vivi um estado de conscien

cia que me levou a compreender, por experiencia direta, o que o Tioquer dizer com isso.”

“E 6  importante.. . tem algum valor pratico, isso?”

“ E, sim; extremamente importante e de grande valor prdtico.”

“Como?”

“Bem, creio que €  um caminho para a plena utiliza§ao do nosso

ser. Quero dizer, creio que isso faz um certo poder maior do nosso

ser, de que ordinariamente nao suspeitamos, intervir em nossos pen-

samentos e atos, ou mesmo dirigir o nosso viver de modo geral. E

dificil de expressar.”

“Tem de ser, nao e? Pensar sem palavras. . . para usar um podermaior do nosso ser. . . S6 pode ser dificil de expressar ou explicar.

Mas €  interessante. Continue.”

“Continue tentando,  voce quer dizer.”

Os dois sorriem, e Victor prossegue:

“Bem, parece que somos um ser mais poderoso, sob todos os as

 pectos, do que podemos perceber por nossas fun^oes sensoriais e ra-

cionais. Para fins. . . digamos “diditicos” , e somente para isto, pa

rece que estamos “divididos” em tres fases: a fase  sensorial,  a fase

racional , e uma Ultima fase, superior, que o Tio chama de metafase.

“Esta divisao, naturalmente, tem base meramente funcional. Nao

estamos de fato assim divididos. Na verdade, parece que somos, real

e finalmente, a tal metafase, cujos atributos e poderes manifestam-

se, em grau extremamente reduzido, atrav6s das outras duas fases.Isto 6,  a metafase (que 6   o nosso ser real, porque permanente) 6  

fantasticamente poderosa, por6m, nao pode manifestar senao uma

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 142/411

 parcela mfima do seu poder atravds do cfrebro e dos orgaos dos

sentidos fi'sicos. E assim como se o nosso organismo atuasse como

um transformador, reduzindo fantasticamente a “voltagem” da ener

gia da metafase.”

“E . .. isso €   ldgico.”“Sim, mas, cuidado com a 16gica. Esta eu j£ aprendi, com o Tio,

e acho que ele esti certo: a Idgica ndo 4 prova suficiente da verda-

de.”  ..“Ora. . . entao, de que adianta voce estar me dando essa explica-

gao 16gica?”“Bem, a outra metade da maxima do Tio 6: mas a verdade e sem

 pre Idgica.  Portanto, h* possibilidade de se chegar a uma verdadeatrav£s da Idgica. Eu vivi um FATO. Isto 6   verdade, o fato. Voce

quer uma explicagao para ele? O melhor que posso fazer 6   tentar

uma Idgica. SE a minha Idgica coincidir com a Idgica do fato que

vivi, entao a minha explicagao ser* verdadeira; isto 6, a verdade es

tar* nessa coincidencia entre a minha Idgica e a Idgica intrinseca do

fato. Mas h* esse SE, portanto, que devemos ter sempre em mente.

Do contrdrio, vamos incorrer no equivoco da maioria das pessoas,

de confundir Idgica, necessariamente, com verdade. Quase todomundo diz, “ldgico!”, entendendo, “verdadeiro”. E a esta confusao

se devem imlmeros problemas do ser humano neste mundo.

“Voc6 est* certo, sabia?”“Eu, nao. O Tio. Aprendi com ele.”“Como queira. O fato 6 que isso parece corresponder ao ceme da

filosofia da cifincia. Quero dizer, essa de que a Idgica nao 6  prova

suficiente da verdade. Por isso €   preciso, ou primeiro observar,

constatar e estudar sistematicamente, e depois teorizar, ou teonzar primeiro, mas depois procurar comprovar por meio de observagoes,

de constatagoes e estudos sistem*ticos.“Tudo bem. Sd que acho melhor a gente voltar k  tentativa de ex

 plicagao do valor pr*tico da tese do Tio, ou a gente vai acabar es-

quecendo do que estava falando.

“Certo. Continue, entao.”“Estivamos considerando o ser humano “dividido” em tres fases.

a sensorial, a racional, e a metafase. Poderfamos tambem chamar aterceira fase de transcendental,  mas vamos ficar com um nome sd,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 143/411

 pra nao dar confusao. Essas tres fases do homem sao mentais. Ou a

elas fazemos coiresponderem tres estados mentais ou estigios de

consciencia. Podemos chami-los, respectivamente, de consciencia 

 sensorial, consciencia racional,  e consciencia transcendental ou metaconsciencia.

“Creio que esta nossa classificagao diddtica abrange, para os nos-

sos fins, toda a escala da experiencia humana; desde as sensagoes ff-

sicas (consciencia sensorial), aos processos e fenomenos racionais

(consciencia racional), e a experiencias superiores, como a inspira-

gao e os fenomenos parapsicologicos em geral (metaconsciencia).”“E a emogao?”

Sinceramente, nao sei bem onde situa-la. Com mais freqiiencia, penso que se trata de uma experiencia ou fungao do nosso ser que

 pode ser provocada atraves de fenomenos prdprios de qualquer das

tres fases. Mas penso, tambdm com frequencia, que a metafase 6  

sempre a sede da emogao, seja por agao, seja por reagao. Quero di

zer, se a causa da emogao for sensorial (ou, tamb&n, fisioldgica), a

emogao serS uma reagao da metafase; idem, se a causa for racional;

mas a causa pode tamb£m ser transcendental, como agao da metafa

se, refletindo-se em reagoes das outras duas fases. Ou podemos pensar que a razao e a emogao sao manifestagoes de propriedades da

metafase, que 6  entao o nosso eu real, mais pro fundo e permanente.

Pelo menos foi isto que consegui deduzir da explicagao que o Tiome deu, se 6  que realmente faz sentido.”

Tudo isso 6   muito interessante e ldgico (sem dizermos nada

quanto a ser verdadeiro); mas, e o valor pr&ico dessa histdria de pensar sem palavras?”

“Bem, a id£ia que acabei de expor pode ser muito desenvolvida edetalhada; por exemplo, considerando-se que a metafase nao esti

sujeita a nossas limitagoes racionais decorrentes da percepgao relati

va de tempo e espago, etc. Mas, por simplificagao, vamos nos res-

tringir a esses aspectos bdsicos. Digamos entao (repito; simplifican-

do) que a metafase 6  em tudo superior ks outras duas fases. Funda-

mentalmente, em percepgao (metapercepgao), em discemimento

(metacognigao), e em potencia (metapoder, na diregao e no controle

de energia). O Tio acrcscenta que, como essa metafase 6  a realidade

transcendental do nosso ser, nao est£ sujeita k   nossa relatividade

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 144/411

egocentrica de bem e mal e, portanto, o amor 6  um seu atributo natu

ral, uma sua fungao natural, necessariamente.

“Tomam-se assim evidentes a importancia e o valor pritico de

aprendermos a permitir   que a metafase interfira cada vez mais nas

agoes e reagoes das outras duas fases, no mundo e na vida. Com is

to, essas agoes e reagoes, que fazem o nosso viver, estarao menos

sujeitas a equfvocos sensoriais (gragas i metapercepgao); serao ins-

 piradas ou dirigidas por um discemimento maior (metacogrugao); e,

sempre que necessirio, poderao ser mais potentes (metapoder). Aci-

ma de tudo, serao cada vez mais motivadas pelo amor (atributo ou

fungao da natureza universal  da metafase).”

“Ainda nao vejo o que isso tem a ver com pensar sem palavras.”“Ora, isso €   um dos recursos que o Tio esti estudando, ou pes-

quisando em si mesmo, para aumentar gradativamente a sensibilida

de ou receptividade das fases inferiores, especiaimente a racional,

aos influxos da metafase. Parece que a idSia bisica 6  a seguinte:

“A despeito das crengas, teorias, filosofias e ideologias (inclusive

religiosas) que confessamos, nossa vida esti e sempre esteve con

centrada nas duas fases inferiores, com poucas excegoes na humani-

dade. Podemos assim qualifici-la —nossa vida —como predominan-temente sensorial-racional, com momentos em que adquire cariter

mais ou menos fortemente emocional. E claro que, se a metafase 6  

verdadeira, interv6m nas nossas experiencias (sem o percebermos),

nos momentos em que estamos menos concentrados na consciencia

sensorial e na consciencia racional. Creio mesmo, aliis, que de

qualquer maneira ela participa nos fenomenos sensoriais, racionais e

emocionais da nossa consciencia, porque 6,  por assim dizer, a raiz

do nosso ser. Mas isso acontece sem que saibamos chamar volitiva-mente essa metafase a intervir (se isto i  possfvel).

“Enfim, nossa vida esti concentrada nas fases sensorial e racional

(com os tais momentos de estado emocional mais ou menos intenso).

Isto £, estamos predominantemente em consciencia sensorial e racio

nal (dos sentidos ffsicos e dos pensamentos). Com isto bloqueamos

ou impedimos os influxos naturais mais sutis da metafase e nos pri-

vamos da possibilidade de CONHECER NOSSA NATUREZA

MAIS PROFUNDA E A VERDADE DO SER MAIOR DE QUEPARTICIPAMOS. Nosso problema, portanto, esti em que somos

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 145/411

ignorantes e, por nossa prdpria atitude (de nos reduzirmos ao Eu-

sensorial e ao Eu-racional, com manifesta§oes indisciplinadas do

Eu-emocional), persistimos nessa ignorancia e continuamos a softer

as conseqiiencias deletdrias dos erros que ela acarreta. Nds mesmosnos atamos a uma roda e ficamos girando, girando, girando. . . E o

 pior £  que a maioria de nds nao vislumbra, sequer, um meio de sair

da roda. Pior ainda! Muitos pensam mesmo que o que realmente

existe, e sd o que existe, €  isso af: a roda e eles girando amarrados aela. Alids, o Buda. .

Alba, impaciente:

“L* vem digressao. Quer voltar ao ponto?”

“Certo. Em parte, estamos girando na roda porque nossos racio-cfnios sao “viciados” , devido sobretudo a premissas condicionadas

 pela  palavra,  persistentes na fase racional. Esse condicionamento

 pode ter origem numa espdcie de acomodagao emotional a dogmas,

especulagoes excitantes, supersti oes, id6ias de “medalhoes” , pio-

vas cientfficas, etc. Mas o fato €  que existe e persiste na palavra e 

 pela palavra. Cre o Tio que a concentragao no  sentimento direto 

das id&as como “fenomeno energ6tico puro” pode ajudar a nos li-

 bertarmos desse condicionamento e da restrisao a que nos condena-mos, hs fases inferiores, no uso do nosso ser. Essa concentragao po

de nos levar a questionar as conotagoes das palavras e alcangar, gra-

dativamente, maior consciencia de significado.  E, o que 6  mais im

 portante, pode nos induzir a meditar, constituindo mesmo a fase ini

tial de um processo de meditagao.

“Uma vantagem desse processo 6   que ele 6   simples (ainda quenao seja f*cil de imediato) e pode ser praticado enquanto nos ocu-

 pamos com nossas atividades di&rias ou vivemos normalmente a nos

sa vida; sem rituais especiais e elaborados, preparagoes e posturas

complicadas, etc., e em qualquer lugar. O que temos a fazer €  estar

mentalmente atentos a prdpria mente. Ou seja, devemos estar com a

atengao dirigida para o pensamento como “fendmeno energdtico pu

ro , procurando assim SENTIR as idtias. As palavras ocorrerao,

inevitavelmente; mas, se estivermos atentos, poderemos sentir dire-

tamente as idtias e cortar as palavras com o impulso volitivo corres- pondente a “nao 6  necessdrio” . Isto levar* a uma gradativa sutiliza-

gao da consciencia racional, sensibilizando-a cada vez mais, por as-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 146/411

sim dizer, aos influxos da metafase; tomando-nos, portanto, mais e

mais lucidos. Ali£s, boa palavra esta: LUCIDOS!”

“E. . . parece que a id£ia merece consideragao. Naturalmente, su

 ponho que nao se deva fazer dessa pr&ica uma mania, sob pena de

se acabar no hospicio.”

“Claro.”

“Mesmo assim, ainda nao sinto a possibilidade de se fazer um ra

ciocmio corapleto (muitas id6ias) sem palavras.”

“Af €  que esti o engano, segundo o Tio. Precisamente na fase ra

cional, funcionando atravds da palavra, 6   que raciocmio €   uma se-

qiiencia mais ou menos longa de id£ias, no tempo. Mas, se por im

 pulso volitivo, como diz o Tio, a gente se concentra na atividademental como uma especie de sensagao direta de energia em mani

festagao (analogamente a sensagao de calor ou de um choque eI6tri-

co), entao a gente apreende um longo e completo raciocmio num

lampejo! A questao de seqiiencia no tempo surge quando a gente

formula frases para expressar verbalmente o raciocmio. Mais ainda,

naturalmente, quando a gente resolve escrever esse raciocmio.”

“Puxa! Essa d£ o que pensar!”“E voce SENTIU isto que disse, antes de dizer. Por isso disse.”

“Ih. . . chega!” - exclama Alba, levantando-se bruscamente. E

acrescenta:

“J6 to 6   tonta! Agora, quem Xi girando na roda sou eu. Voce aca

 bou me fazendo sentir como um “robo tonto” , amarrado na roda e

girando, girando.. .

“Escute, quando escrever para o tio, pega que ele lhe de mais

umas dicas sobre essa de meditagao. Estou ficando muito interessa-

da, mas ougo tanta coisa esquisita a este respeito, umas “histdrias

de ocultismo, orientalismo, e sei 16 quanto “ismo” mais. . . ”

“Vou pedir, sim. E ele vai dar. Seu empenho 6   justamente de

despertar nas pessoas o interesse pela meditagao como trabalho

mental natural, sem “ismo” nenhum, com o objetivo de aumentar a

 perspic£cia pessoal. Claro que interessa a todo mundo ser mais pers-

 picaz. Ao estudante, para entender melhor e mais facilmente suasmat&ias; ao professor, para aprimorar sua capacidade de expressao e

comunicagao, seus m6todos de ensino, etc.; ao religioso, para que

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 147/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 148/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 149/411

O “ X” DA QUESTAO, NO BICO DO PASSARINHO

Abre... fecha. .. abre.. . fecha. . . abre. .. fecha. ..A borboleta na vidraga da janela, do lado de fora.

(Na mente de L<5gus, a observagao:)

“Linda, essa borboleta, abrindo e fechando as asas..

Abre... fecha. .. abre. . . fecha. .. abre. .. fecha. ..

A borboleta, abrindo e fechando as asas; na tela da janela, do la

do de dentro.

(Na mente de L<5gus, a lembranga. Penetremos em sua consciencia e acompanhemos, no Espfrito do Espago, o desenrolar de sua re-

cordagao:)

A janela, vista do interior da casa rustica de madeira, pre-fabri'ca-

da. Fora, para al&n da tela e a pouca distancia da casa, drvores e ar-

 bustos prdprios da mata.

Um jovem, sentado numa poltrona de vime, le. Suspende a leitura

e ergue a cabega; ve: a borboleta, abrindo e fechando as asas; na telada janela, do lado de dentro. Ama; identifica-se. Sente o mal-estar

da linda borboleta e se compadece.

(Em sua mente:)

“Liberdade! Amo e defendo a minha liberdade. E aquele belo e

indefeso ser est£ tolhido em sua liberdade. Sofre e sofro com ele; so-

fro nele. Vou liberti-lo!”

N a m i g i c a a m p u lh e la d o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

a t e m p o c h e g a m o s a e s s e p a s s a d o d a s o m b r a q u a s e - L u z

{ q u a n d o q u a s e - s d - s o m b r a a i n d a e r a e l a )

e a t e n t o s t i c a m o s & s u a l i g a o n a E s c o l a d a V i d a . . .

Uma tentativa, duas, tres e os dedos pingam as asas da borboleta,

quando estas se fecham. Passos longos e apressados cobrem a dis

tancia ate a porta, que 6  brusca e ruidosamente aberta. O jovem sai,

afastando-se uns tres metros da casa.

O brago se move suavemente para o alto e os dedos se afastam

desfazendo a pinga.

Abre, fecha, abre, fecha, abre, fecha. . . o mais rapido bater de

asas e a borboleta esvoaga pra \£  e pra c£, em diregoes mil.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 150/411

(No coragao do jovem:)

“Ai, borboletinha! Voa, voa, voa. . . Em teu voo celebra o meu

amor, que te libertou! Celebra a tua liberdade, nesse v6o que 6  um

canto ao amor meu que te devolveu 6 vida feliz em teu espago. . .

em teu santu&rio! Se feliz na tua e na minha felicidade! Amo a ti e &natureza que 6  o teu santu&rio! Vai, borboletinha linda, lrma minha,

canta o meu amor no bater feliz de tuas asas! Voa, voa, voa!..

(De repente:)

O celere mergulho do passarinho, da 6rvore pr6xima, e . . . zas! O

 bico se fecha contra o corpo da borboleta!

(No coragao do jovem:)

Susto! Fortissimo susto!

(A mente do jovem:)

Subito vazia! Estupefagao.

(Depois:)

D or., . revolta. . . <5dio!

O passarinho, borboleta no bico, voa para a mata prdxima. O jo

vem corre em perseguigao a ele. Sua energia, a energia do <5dio que

lhe incendeia o coragao! Corre, corre, corre o jovem, cabega incli-

nada para trds e olho no passarinho. Entra no mato. Tropega e quasecai. Arqueja e transpira e se arranha no mato. E corre, cabega incli-

na para tr£s e olho no passarinho.

O passarinho pousa num galho. O jovem chega pouco depois ao

 p£ da arvore, arquejando e transpirando - suor e <5dio. Vocifera:

“P6ssaro assassino! Criminoso da mata! Se eu te pego, eu te ma

to, desgragado!”

O passarinho abre o bico e a borboleta cai. O jovem vai at6   a

 borboleta e a examina: morta! Levanta a cabega e olha para o passa

rinho, fuzilando 6dio!

Agora, olha &sua volta.

(Na sua mente:)“Um pedago de pau. . . qualquer coisa. . . pra acabar com a vida

daquele assassino desgragado! EU libertei a borboleta! EU a devolvi

h vida feliz na mata! E aqueie..

Procura. Afobado, nervoso, agitado. Olha para o galho onde estava o passarinho: vazio. Respira fundo e exala violentamente o seu

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 151/411

<5dio. Sente a transpiragao. Passa a mao na testa, depois na calga.Inicia a caminhada de volta.

(Em seu coragao:)

Tristeza.

(Em sua mente:)Confusao.

A noite, num quarto de dormir, o mesmo jovem.

(Reflete:)

“Incrfvel! Incrfvel como fui tao transtomado hoje a tarde, e tao

rapidamente, pelo caso da borboleta. Por que? Tanta meditagao pro

funda. . . mas, serenidade que 6   bom. . . Decepgao. Enorme decep-

gao! Imagina. . . odiar aquele passarinho! Entao ele nao 6   natural,tambem? Nao 6  um ser vivo da natureza, tambem? Acaso deliberou 

atacar e matar a borboleta? Sd por matar? Instinto e necessidade, por

natureza. Isto sim. Cruel? No meu julgamento, hoje a tarde. Mas,

quem sou eu pra me arvorar de juiz da natureza? Se ela 6  assim, en

tao estd certo. Nem bom, nem mau. Certo. Melhor: nem bom nemmau, nem certo nem errado; €  assim; s6.

“Quem 6   moral e precisa ter moralidade? Eu, ser humano. E a

natureza? Tambem 6   humana e precisa ter moralidade? O homem precisa ser moral; mas a sua moralidade sd faz sentido em suas rela-

goes com os outros humanos. Porque moralidade 6   coisa de huma

nos. Af estd: uma ligao de amoralidade, no bico do passarinho.

Aprendi: No jogo da vida entre os homens, vou sempre conside-

rar e respeitar a moral; e a 6tica. Mas, ao refletir sobre a minha vida

na Vida desse Ser que se manifesta na natureza. . . nao. Qualquer

qualificagao moral sd servird para suscitar mil perguntas irrespondf-veis. E assim.. . s<5! Nao tem por que.

Quero conhecer a verdade desse Ser em que sou e em que a

 borboleta 6   e o passarinho 6  e tudo 6? Entao devo assimilar sua li

gao; a ligao que me ensinou pelo bico do passarinho.”

Abre... fecha. .. abre... fecha... abre.. . fecha.. .

A borboleta; na vidraga da janela, do lado de fora.

L<5gus sorri.

(Depois, em sua mente:)

 EU libertei a borboleta! EU a devolvi a vida fe liz na mata!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 152/411

O ego! Este o “X” da questao! Fundamental, meditar esse ego

que parego e sinto ser, e que, em mim, tudo parece ser, finalmente. 

Porque,  Xi dentro, no amago do meu ser, h£ momentos em que sinto

e sei que nao sou, esse ego que parego e sinto ser, e que, em

mim,. . .Esse ego, entao. .. que 61.. .

 Aquele que pergunta, 

esse 4 o ego.

 Aquele que,

no silencio da mente racional e verbal, 

apercebe-se do corpo todo como um todo, 

e com ele nao se confunde, 

esse 4 o ego.

 Aquele que ve,qudndo o cirebro dos olhos recebe a energia de ver, 

esse 4 o ego.

 Aquele que ouve,quando o c4rebro dos ouvidos recebe a energia de ouvir,

esse 4 o ego.

 Aquele que sente ao tato,quando o c4rebro da pele recebe a energia de sentir ao tato, 

esse 4 o ego.

 Aquele que degusta,quando o c4rebro da Ungua recebe a energia de degustar, 

esse 4 o ego.

 Aquele que cheira,quando o c4rebro das narinas recebe a energia de cheirar,

esse 4 o ego. Aquele que se apercebe do pensamento da mente racional, 

quando o c4rebro estd ativo nesse pensamento, 

esse 4 o ego. Aquele que no c4rebro dirige o pensamento da mente racional, 

quando assim deseja, 

esse 4 o ego.

 Aquele que delibera e decide as agoes do corpo, 

atrav4s do c4rebro, esse 4 o ego.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 153/411

 Aqueie que estd por trds das agoes impulsivas do corpo, 

atravis do c4rebro, 

esse 4 o ego.

Sim. . . ESSE E O EGO:

 Aqueie que pergunta;que se apercebe do organismo que usa; 

que se apercebe do mundo; 

que se apercebe do pensamento; 

que dirige o pensamento racional; 

que delibera e decide as agoes do corpo; 

e que impele agoes do corpo sem deliberagao racional. 

Sim. . . Aqueie que move a mao no pintor, 

 para que a pintura sejafeita; que move a mao no criminoso,

 para que o crime seja cometido; 

que abre os dedos no homem caridoso, 

 para que a esmola passe ao mendigo; 

que contra o dinheiro aperta os dedos,

no homem egoista e ganancioso, 

 para que o dinheiro nao seja dado,nem perdido, nem roubado; 

que se revela na atitude do homem 

cdlido e benevolente; 

que se revela na atitude do homem 

 fr io e cruel; 

que se revela no homem que diz a verdade; 

que se revela no homem que mente; 

que sua fortaleza revela,nas agoes do homem corajoso e estdico; 

que sua fraqueza revela,

nas agoes do homem pusilanime; 

que luz revela,

nas palavras e agoes do homem sdbio; 

que trevas revela,

nas palavras e agoes do homem sem discemimento; 

que a vida entende e nao se ilude nem se confunde; que se ilude e confunde, na vida que nao entende;

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 154/411

que se concentra em suas bengaos 

e nelas 4 venturoso; 

que em seus males se concentra 

e neles insiste em sofrer, 

 porque suas bengaos nao ve, 

esse 4 o ego!

Sensagao, concepgao, e voligao, estas as fungoes b&sicas do ego.

E ele aquele que sente;

que concebe;

e que exerce voligao.

Que e, contudo, esse ego que sente, que concebe e exerce voli

gao? Que 6, aquele que pergunta? Fenomeno 4. Manifestagao 4.

 Porque sente, concebe, exerce voligao e pergunta.

 E enquanto sente, concebe, exerce voligao e pergunta.

Sim. . . o corpo 6  fenomeno, manifestagao,

no piano “grosseiro” de relatividade;

o ego e fenomeno, manifestagao,no piano “sutil” de relatividade;

manifestagao ou fenomeno sao, o corpo e o ego,

nos pianos de relatividade.

Entao, o ego nao 6   entidade imortal, substantia imperecfvel. Re

latividade 6, no piano “sutil” de relatividade. Porque muda; 6  agora

o que nao era antes, e serd depois o que agora nao 6.  Nao 6  perma-

nente; muda. Nao 6  sempre o que 6, aqui e agora.

S im .. . o corpo nao 6  entidade imortal, substantia imperecfvel;

o ego nao 6  entidade imortal, substantia imperecfvel;manifestagao ou fenomeno sao, o corpo e o ego,

nos pianos de relatividade!

O ego 6  aquele que sente, enquanto sente;

que concebe, enquanto concebe;

que exerce voligao, enquanto exerce voligao;

que pergunta, enquanto pergunta.

E fenomeno ou manifestagao, na substantia etema e infinita do

Ser. Mas fendmeno 6; manifestagao 6; passa, no Ser que nao passa.

O corpo passa.

O ego persiste:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 155/411

fenomeno, no Ser que nao passa;fenomeno de sentir,

de conceber,

de exercer voligao,

de perguntar,no Ser que nao passa.

E enquanto sente, concebe, exerce voligao e pergunta, corpo usa —corpo que passa, no Ser que nao passa.

Quando nao mais sentir, nem conceber, nem exercer voligao, nem

 perguntar, corpo nao mais usard, nem mais serd, nem passard, no Serque nao passa.

 Aquele que pergunta, esse i o ego.

Cessa tuas perguntas e vive na vida d’AQUELE,do que ndo pergunta, do que E,

 AQUI E AGORA, SEMPRE!

A vidraga da janela.

Ld longe e embaixo, a cidade: buligoso teatro da humana agita-

gao. E Id que egos mil se agitam e passam, no Ser que nao passa. E

sofrem e se ferem, na paixao que passa, porque a confundem com o

amor que nao passa. E sofrem e se ferem, porque imortal chamam o

que imortal nao 6. Nisso que assim chamam querem ser, sempre. Por

isso vao e vem, e vem e vao. Porque querem ir e querem vir; quando

vem querem ir e quando vao querem vir; e, tambem, quando vem

nao querem mais ir, e quando vao nao querem mais vir. Assim vao evem, vao e vem...

Mas. . . muda, isso que vai e vem. Porque fenomeno 6, no sentir,

no conceber, no exercer voligao, e no perguntar. Porque sente, no

que sente muda; porque concebe, no que concebe muda; porque

exerce voligao, na voligao que exerce muda; e, porque pergunta, nas perguntas e nas respostas muda.

E como muda, isso que vai e vem e nao e imortal? Sentindo cada

vez menos, concebendo cada vez menos, exercendo cada vez menos

voligao,.e cada vez menos perguntando. Aproximando-se d’AQUE-

LE que nao sente, nem concebe, nem exerce voligao, nem perguntaE “quem” 6  ESSE?

AQUELE QUE E. SO. AQUI E AGORA; SEMPRE! INFINI

TAMENTE AQUI E ETERNAMENTE AGORA!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 156/411

E enquanto mudam mas ainda sao, esses egos que sentem e con-

cebem e exercem voligao e perguntam, e passam no Ser que nao

 passa, que devem fazer? Como devem viver a sua vida que passa no

Ser que nao passa?

As leis do SER-QUE-NAO-PASSA os farao viver como devem.

S6.Mas podem deliberar, esses egos que passam. ..

 A s le is do SER-Q UE-NAO-PASSA estarao em suas deliberagoes

e os farao deliberar como devem.

S6.E os erros e males que cometam enquanto deliberem?

 Erros?! Males?!Cessa tuas perguntas e escuta a voz do que nao fala.

Queres ser no que pergunta? Isto 4 ser no que passa

 — e nao 4, porque passa.

Ves? Tua meta 4 nao ser para ser!

Silencio!O trem, que passa apitando forte. A funda inalagao, e o longo

suspiro. A carta do Jovem, sobre a mesa. O Tio a rele. Depois, poe-

se a escrever a resposta.Termina. Assina, poe a caita num envelope e o fecha. Endere^a o

envelope. Levanta-se e vai atd a janela. A cidade, 16 longe e embai-

xo.E. . . nos, que ainda somos nesse ego que esta mudando e ainda

nao passou, temos de continuar vivendo esta vida de dor e prazer,

neste piano “grosseiro” de relatividade. E nela devemos ter interes-

se, porque €  ela que estamos vivendo.

Que vida estamos vivendo? A do Ser que nao pergunta e naosente dor nem prazer? Nao. A do ego que pergunta e sente dor e

 prazer. Podemos viver a vida do Ser que nao pergunta e nao sente

dor nem prazer? Nao. S6  podemos viver a vida do ego que pergunta

e sente dor e prazer. E, afinal, esse ego deve ter uma fungao neces-

s6ria na vida desse Ser que nao pergunta e nao sente dor nem prazer.

Ou 6  justamente esse Ser que no ego pergunta e sente dor e prazer!

Continuemos pois a perguntar, na dor e no prazer, nesse ego que

somos. Nao poderemos evitar, por muito tempo ainda. Mas, medite-mos nossas perguntas, ao inv£s de apenas nos esfortjarmos por res

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 157/411

 ponder racionalmente, atrav6s de nossas palavras logicamente arru-madas.

Sim. Cultivemos a meditagao, como pr£tica habitual e natural  

neste nosso viver no piano “grosseiro” de relatividade. Muitos e

 bons serao os frutos que disso colheremos, ainda que relativamente —porque no piano de relatividade. Se o fizermos, enquanto manti-

vermos sadio, equilibrado e s£bio interesse pelas boas coisas do

mundo e por nossa vida no mundo, entao. .... .menos egocentricas serao

as sensagoes que esse nosso ego sinta;

as concepgoes que esse nosso ego conceba;

os exercfcios da vontade, que esse nosso ego exerga;

as perguntas que esse nosso ego pergunte.

Menos egocentrico sera esse nosso ego,

em seus sentimentos;

em seus pensamentos;

em suas palavras;

em suas agoes.

E menos egocentrico seja, esse nosso ego, mais rapidamente en-

contrard o caminho para a sinceridade, a bondade e a justiga doamor que pela meditagao se instil ard

em seus sentimentos;

em seus pensamentos;

em suas palavras;

em suas agoes.

Almejar e buscar transcender o ego? Sim. Mas, enquanto trans-

cender nao podemos, viver inteligente e amorosamente nesse ego

que passa, no Ser que nao passa. Mesmo porque transcender nao 6  contomar; 6  passar por dentro e ir al£m.

Mais prazer e menos dor? Sim. Para aqueles que menos egocen-

tricamente estejam vivendo, nesse ego que passa no Ser que nao

 passa.

E. . . precisamos educar para a meditagao sadia, simples, habitual

e natural. Natural. . . sim: recurso natural do nosso ser, como sentir, pensar, falar, agir.

Temos vivido por demais egocentricamente, nesse ego que passano Ser que nao passa. Por demais concentrados em sentir, pensar,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 158/411

falar e agir, egocentricamente. Por demais concentrados nas fases

sensorial e rational do nosso ser e em sua fungao emocional ego-

centrica.Queremos de fato o amor que cantamos no Natal? E que quase s6  

no Natal nos lembramos de cantar? Entao, comecemos a tentar viver

tamb£m na fase transcendental do nosso ser, pela meditagao —sadia,

simples, habitual e natural; sem as restrigoes e os condicionamentos

de qualquer sectarismo, e sem o tom fantistico de complicados e ilu-

sorios rituais ex6ticos. Meditagao nao precisa nem deve ser uma fu-

ga pela sedugao do fantistico. Antes, precisa e deve ser um processo

e recurso psiquico sadio, simples e natural.

E. . . a mente, ou o ego que passa, iluminado, atrav^s da meditagao, pela Luz do Ser-que-nao-passa. Este o caminho. Enquanto os

egos nao forem menos egocentricos, nao poderi haver verdadeira

 paz no mundo. Nenhum sistema s6cio-polftico poderi produzi-la, es

sa paz que teri de nascer no ego que se faga menos egocentrico, pa

ra entao se refletir no mundo,

em seus apaziguados sentimentos;

em seus apaziguados pensamentos;

em suas apaziguadas palavras;e em suas apaziguadas agoes.

O forte apito do trem, que passa perto da janela, arranca D5gus de

sua reflexao. Ele fica olhando a passagem do trem —do trem que

 passa no Ser que nao passa. Depois, volta-se para dentro do seu ga-

 binete de estudo e olha ao redor: O vaso grande com plantas. . . a

 pequena representagao de Jesus na parede.. . a mesa.. . o abaju r.. .

a agenda.. . a carta a Victor.

A L u z d o S e r - q u e - n a o - p a s s a . . .

D iz e rm a is o q u § ? . . . P a s s a r ? . . . Na L u z ? . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 159/411

HOMO NON-SAPIENS

 NO PAINEL DE ROTULOS

A carta de Ldgus, sobre a mesinha de centro.Victor, sentado no sof6. Olhos fixos no tapete, mente vazia de

consciencia.

O som da campainha; duas vezes. . . tres. O Jovem se levanta e

encaminha-se para a porta. Abre. O belo sorriso e os olhos lfmpidos

e brilhantes. O beijo; temo. Novamente o sorriso, mais belo ainda.

 Nos olhos, a luz do amor. Os dois jovens sentam-se.

E m n o s s a m S g i c a d i m e n s a o ,

c o m o q u e s e n t a m o s m 5 s l a m b f r n c o m e l e s ,

m a r a v i i h a d o s d e t e s t e m u n h a r

o c r e s c e n l e d e s p e r t a r d a L u z

n e s s a s s o m b r a s q u e j i t a o t e n u e s e n o b r e s s 5 o . . .

A carta de L<5gus sobre a mesinha de centro. A mao de Victor

apanha o envelope; abre-o, retira a carta e a desdobra.

“Come§amos?”

“Sou toda ouvidos.”

“Entao, vamos 16:”

"Acabodecontemplaremeditar.Aborboletarnorreunobicodopassari- 

nho.MasoegonSopassou.Oquepassoufoiotrem,emetrouxedevolta& suacarta.” 

Alba: “Nossa! Que maneira pirada de come^ar uma carta!”

“Espere s<5 ate conhecer o Tio. De repente diz alguma coisa apa-

rentemente maluca. E o seu jeito de interessar a gente, encucando; e

tambem de fazer humor. Na certa sua meditagao Ihe trouxe id£ias

sobre o ego, a partir de algum fato que envolveu uma borboleta e um

 passarinho. Quanto ao trem, ele mesmo explica.”

“E essa de que o ego ndo passou? Bem. . . deixa pra 16. J6 sei: €  

o jeito dele de dizer as coisas. Vamos em frente.”

O jovem prossegue com a leitura:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 160/411

“TesedametacognigSo?Que6tese?ProposigSodeteoriaparaexplicar? 

Paradizeroque6?Racionalmente?Quantasvezesvouterderepetir?NSo 

podeserdito. Naopodeserexplicado.NAOPODE!Entao,naotente.Lem- 

bre-se sempre disto. Quando Ihe ocorrerumaboatese, queparega final- 

menteexplicar,dizeroque4,lembre-sedisto:nSopode!£iiusSo.

"METAcognigSo, METAconsciSncia,METAfase. . . ComovocSquerex 

plicar?ComovocSquerdizeroque4?ComumaMETAIinguagem?1= "me- 

ta"?EntSo, transcendealinguagemverbal.Transcendequalquerrecursora 

cional, intelectual. NSopode serdito: nSopode serexplicado. VocSexpli- 

cou?Vocedisse?EntSonSoS.

“VocSficoucontentecomasuaexplicagao,comoquedisseque6?Isto 

pode.MasnSo6.£:sdesperar.Umdiavocevaiencontrarumdefeitonasua 

tese.EnaoserSum"metadefeito ",porquevoceoperceberSepoderSdizer oqueseja.

"Querexplicar?NSopode.Querdizeroque6?Naopode. Querrotular? 

Isto pode. Muitaspessoas estSo fazendo isto:arrumando rdtulos em bri- 

Ihantesesquemasfdgicos.Depois, ficamcontenteseenvaidecidasdesuas 

teses.SabeoquesSo,essasteses?ImpressionantespainSisderdtulos.

"VocSjSexaminouumdessespainSis?Einteressanteemuitoinstrutivo.

VocSarrancaumrdtube .. . h ioutroembaixo;arrancaeste.. . outro;arran- 

ca . . . outro, arranca . . . outro;arranca . . . surpresa:umburaco!OuvocSar ranca, arranca, arranca , edScomumapergunta;embaixodapergunta.. .

umburaco!NessatesedemetacognigSo,porexempto: 

"Meta-isso”, "meta-aquib", "fase-issou, "fase-aquilo’\  . . Vocivaiarran- 

candordtubsed i comumapergunta:"Eoego"?Pronto!Temdearrumar 

denovoopainel.

"Fase sensorial, fase racional, ego-fase,emetafase. Agora, sim. Ficou 

melhor.Agoravocipode formularumahipdteseparaasdiferengas.. .diga- 

mos, mais  profundasentreaspessoas,semserestringirSsdiferengasde -vidas a constituigSo orgSnica e hereditariedade. Isto4necess&rio, bgica- 

mente,porquevoceadmiteaexistdnciadeumaMETAfase, transcendentale 

perfeita.

“VocSadmite essametafase? Entao, nSopodeser "materiatista". Nao 

podeafirmarquesomos tSo-somenteorganismos ffsicos,demodoquenos- 

sasdiferengasorgSnicasexpliquembSsicaetotalmentenossasdiferengas 

depropensaoecomportamento.

"VocSnSoadmiteessametafase?EntSonSomeescrevamaisnemme 

procure.NSonospodemosharmonizar,vocSeeu,porquenossasvisOesda 

vidanaocombinam.Procureoutros;sSolegioes,eles." 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 161/411

Alba, sorrindo:

“T i boa, essa. M as. . . tem uma coisa que t i me grilando nisso af:

 Nao foi ele mesmo, o Tio, quem lhe propos essa de “meta-isso” ,

“meta-aquilo”, como ele chama agora? Entao, se ha defeito nessaideia, o painel de rdtulos 6  dele! Como €  que ele esti bombardeando

vocS?”

“E. . . esquisito..

Victor fixa instintivamente o olhar &sua frente e pira de pensar,

volitivamente, por alguns segundos. Depois:

“Ah! Acho que percebi: para o Tio, o importante, aqui, nao €   a

“tese” , propriamente, e sim o fato, que ele percebeu, de eu ter me

entusiasmado com ela e estar tendendo a Ievi-la demasiadamente as&io, como se estivesse alcangando uma explicagao final e completa

da verdade do meu ser e da vida. Neste sentido ela 6   “minha”. Por

isto ele insistiu nessa de “nao pode” . Se nao pode. . . nao pode

mesmo. Mas a gente, mesmo quando em princfpio admite que nao

 pode, tende a se entusiasmar com uma boa tese, em cuja Idgica nao

 percebe defeito, e acaba violando o princfpio de que “nao pode”.

Essas “teses” do Tio nao sao propriamente teses. Isto 6  que €  preci

so entender. Deixe eu tentar reproduzir as palavras dele; talvez sejamelhor.”

“Eudigo?Naose fixenoqueeudigo.Nao6fim;§meio.Naodigopara

dizer.Digoparasuscitar.

“Eudisse?Foiparasuscitarevaleparaomomentoemquefoidito.

“Foi suscitado? Entaoesquegao que foiditoe concentre-se noquefoi

suscitado.

“NSofoisuscitado?EntSoeuvoudizeroutracoisa,noutromomento.Talvezdesdigaou contradigaoquedisseantes.PorquenSo6fim;6meio.NSo

digoparadizer.Digoparasuscitar 

“ Assim, creio eu, o Tio se mant^m coerente com o princfpio de

que “ nao pode” . Ou seja, a verdade s6  pode ser de fato apreendida

 por experiencia direta e essa experiencia 6  transcendental.”

“E, mas a gente precisa. . . Melhor nao discutirmos agora. Tem

muita coisa me grilando af. Por exemplo, essa de experiencia transcendental.  Se 6 experiencia, sua, com voce presente nela, como po

de ser transcendental? E essa de suscitar? Suscitar o que?

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 162/411

Melhor continuar a leitura. Depois a gente discute.”

Victor pigarreia e prossegue:

"Seja como for,se vociquerrotular, pode. Eutil. £ necessirio. Como 

vocipoderiaexpressarecomunicarsemrotular?Talvezsejapossfvel,mas vociaindanSopode.Eh i viriascoisasquedeveconsiderar: 

"Primeiro, querdtuio6sdistomesmo:nome. Quandovocerotula,d ino 

rm ;sd. Sevociconhecede fatoaquiloquerotula, entao, nome6maisdo 

quemerordtuio; 6expressaoparaevocagaodeconhecimento.Mas6isto 

que 4:  expressio de conhecimento. NSo oprdprio conhecimento. Este 6 

umaexperienciasutiledireta,quenemprecisaria ternomeparavocimes 

mo. Sevocinao conhecede fatoaquiloquerotula, entao, seurdtubdsd 

istomesmo:nome.Muitaspessoas vivemcaindonessaesparrelapsicoldgi- 

caeconfundindofamiliaridadecomonomeerealconhecimentodaquibque eledesigna.Mais:chegamapensarque,porqueatinaramcomumnome su-

gestivo,conseguiramde fatoexpressar, isto6,dizeranaturezadaquiloque 

onomerotula.

“Segundo,que, quandovocirotula, aonomequed iassociaumconcei -

to. Nistovocisearriscaa fixarumaidiiasobreaquiloaquedeunome.Da(  

emdiante,essenomepassaaterumpoder sugestivoecondicionante.Tudo 

bem, seo seuconceitoestivercerto.Docontririo, vocetenderiapersistir 

emerro;devidoiquelepoderdonome, vocinemte ri impuisoderepensar seuconceitoousuaidiiadaquiloquerotulou.

"Terceiro, que, quando vocid i nome, eessenomesetornaarraigado,

sua relagaopara comaquiloaquedeunomepassaaserconceptual, inte- 

lectiva,e,portanto,artificializadae“fria".

"Mesmocomobjetos, comcoisas  "concretas", aconteceisto.Porexem 

plo, vociolhacertoobjetoepensa:MESA.Na  realidade,nioexisteMESA.

Isto6umconceitoquevociassociou,porexemplo, amadeiradispostade 

certomodo(comosobformadeumtampopregadoaquatrop is).Essecon 

ceito,porsuavez, 4associadoaumautilidade. Vocin io chamariadeME 

SAumapegademadeirasemtampo.

"Parafinsu tifitirios.. .dtimo.Oproblemai aquelarelagioartificializadae 

"fria ",queacabaseestendendoatudo:planta, fbr, irvore,nuvem,mar,ciu,

gente, bicho, etc. Voci deixaentio dese relacionarpura, diretaenatural •

mente, “vibratoriamente", essencialmente, "espiritualmente", comas "coi 

sas", epassa a vivernummundo conceptual, intelectivo, artificializado e 

"frb ",QUENAOEXISTE! 

"Talvezamaisdeletiriaconsequinciadenossacivilizagio, extremada- menteracional, tenhasidoessainsensibilizagSoparao"espfritodascoisas".

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 163/411

Porisso,is  ifezescontra-argumentodizendo:NAOSOURACIONAUEse entiomeacusamdeirracionalidade . . . nemligo.Prefirocontinuarmeempe- 

nhandoemrecuperarnohomem,querepresento,asensibilidadeao"espfrito 

dascoisas". Quandoeumorrer,sequiserem,podemempalharomeucorpo,

pregi-lo numpaineide rdtuloseescreverembaixo: "RAROESPECIMEN DEHOMONON-SAPIENS”.Nemvouligar." 

Os dois riem. Depois, Victor prossegue com a leitura:

"Veja, entao,oqueapalavrapodefazer:iludir, sugestionar, condicionar,

e insensibilizar. Vociquercontinuariludido?Sugestionado?Condicionado? 

Insensibilizado?Entao confie4palavraea tesesracionaiso seuentendi- mentoda vida. Poroutro lado.. . (h isempreesse “outrolado";e, sevoce 

naoquisererrarporextremismo,devericonsideri-lo;combineosaspectos positivos dos “dois lados”eatinaricomamelhorsolugao;lembre-sesem 

predisto, emTODOSOSSEUSPROBLEMAS!)... poroutrolado,entSo...que4tese? 

"Recurso racionalpara criar modelos relativos com finspriticos, utiliti- 

rios?Entao.. . isto4bom;4necessirio.Afinal,quevidavocees tivivendo,epodeviver?Estavidarelativa,nouniversoderelatividades.

"RELATIVIDADES:4distoque vocipode terconsciincia, como  homo

sapiens.Vocinaovaiquererserum“homonon-sapiens".Istoseriaterrfvel! Portanto,sejaracionalepensenoseguinte: 

"Todososconceitosque voci forma$Sorelatividades. TEMDESERre 

latividades!A consciincia que voci tem4relativa. Vocitemconsciincia? EntSo4relativo.

"Vocivi? 

"Avisaoquevocitem4umarelatividadedoquevociolha,narelagiodever; 

enistovocibaseiaumconceito.

“Vociouve? 

"AaudigaoqueIheocorre4umarelatividadedoquevoceescuta,narelagSodeouvir; 

enistovocibaseiaumconceito.

"Vocisenteaotato? 

"Oquevocisenteaotato4umarelatividadedoquevocitateia,narelagSodesentiraotato; 

enistovocibaseiaumconceito.

"Vocidegusta? “Opaladarquevocisente4umarelatividadedoquevocidegusta,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 164/411

narelagaodesentiraopaladar; 

enistovocibaseiaumconceito.

"Vocecheira? 

"Ocheiroquevocisente6umarelatividadedoquevocecheira,

narelagaodesentiraoolfato; enistovocibaseiaumconceito.

“Vocepensa? 

“Seupensamento6umarelatividadedaquiloemquevocipensa,

narelagaodepensar; 

enistovocibaseiaumconceito.

"Portanto, vociSumarelatividade, vivendouma vida relativa, numuni- 

versoderelatividades. Voci6isto;e,enquantoi isto,usetodososrecursos 

relativos ao seu dispor, para viveromais relativamentebempossfvel (e contribuirparaqueahumanidadeaoseualcancevivaamelhorvidarelativa 

possfvel). Vocipodefazeroutracoisa?PoristoIherecomendoqueseinte- 

ressepelousoproficientedapalavraeporinteligentestesesracionais.

“Espantado?Quei quevocipensaqueeusou?Algum irracional?”

Os dois explodem em gostosa gargalhada. Ela, ainda rindo:

“Um barato, o Tio. Continue.”

Ele, engolindo o restinho do riso, continua:

“Assim, usesuassensagoeseseuspensamentos, osrecursosdesuas 

fasessensorialeracional,paraviveromelhorpossfvel.ApenasnSoconfun- 

daos conceitosquederivedessesrecursos (dossentidosffsicosedara 

zao) coma verdade, coma  realidadedoSerquenosparecemanifestar-se 

nesteuniversoderelatividades(ouque,paramuitos, "criou "esteuniverso).

“Ecomo£que voci vaipodergradativamentedeixardeseiludir,dese 

sugestionar, de se condicionare dese insensibilizar?Aprendendoacon- tempiaremeditar. Ecultivando,razoavelmente,aartedacontemplagaoeda 

meditagSo . "

Alba, ajeitando-se na poltrona:

“Agora, 6  comigo. Na certa minha resposta vem por ai. S6  quero

ver a goza9a o . . . ”“Talvez nao venha com gozagao. E, se vier, procure lembrar-se

de que as “gozagoes” do Tio nao sao propriamente goza§oes; nelasest£ tambem a sua mensagem.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 165/411

Teses que nao sao propriamente teses, gozagoes que nao sao

 propriamente gozagoes.. . nao 6  ffcil entender o Tio!”Victor, sorrindo:

“A principio nao 6   fdcil mesmo. Nao foi, para mim. Depois eu

 percebi, ou Jui suscitado a perceber, que, se a gente nao se preocupatanto em entender, racionalmente, mas, entrega-se a ele, com

amor... isso!. . . se a gente ama o Tio, identifica-se com ele, entao,

comega a sentir  sua mensagem e fica facil entender.”“E . . . deve ser isso af. Continue.”

Victor, voltando a ler:

"Que 6 contemplagao?Melhor:que 6 contemplar? (Mais fScil, tratara 

formaverbal.) Contemplar,nousoquefagodapalavra6 observarouatentar,emcon-

centragaopassiva,natural,descontrarda, receptiva,sempensaroobjetode 

contemplagao, at4. . . at6amarlSim:atSocorreramor, identificagao, comu- nhSosilenciosa,sempalavras.

"Esseamorqueseproduz. . . comodiz§-lo?Sentimento4coisadedi 

zer?NSo.JSconversamossobreisto.Sentimento6coisadesentir.Sevoc§ 

sente, conhece; enquanto naosente, n§oconheceetemdesecontentar 

comumainformagSo: VociquerumainformagSo?Eudou:jubilosasensa gaode"mesmicidade"essencia!ouvibratdriae,nisso,amor!" 

Ela, comovida:

"E eu que pensei que vinha goza§ao. Bonito, isso af. O Tio temalma de poeta. E isto me surpreende.”

“Suipreende?! Voce j6 devia ter percebido. Ele tem sim. E 6  uma

caixa de surpresas, tamtem. Voce vai ver.. . Continuamos?”

“Claro!”

Na contemplagSo, o "milagre e m istirio" dessa jubilosa e amorosa 

mesmizagSo" ocorre, no que tange & consciencia de quem contempla,

apdso "milagreemisterio"daabstragao.Que6,essaabstragao? 

Voceperdeconscidnciadoego;dequevocS6eoobjetodecontempla 

gaonao6;dequeele6evocSnao4. NoestadodeabstragSo,nada6isso 

ouaquito. Impossfvelquallficar. Comoqualificarumacoisadequevoc&nio 

temconsciencia?NaohSpossibilidadededeflnirnemdeadjetivar;nada6 

issoouaquilo. E?SeiIS!Aabstragao4comooestadodesonoprofundoe semsonhos,Eagora?Diga! 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 166/411

"Enfim,paraquedizer?OimportanteAcompreenderqueaabstragaode 

veocorrer. EsdocorrerAseoprocessodecontempiagaoforpassivo,natu 

ral, descontrafdo, receptivo, sem pensaro objeto decontempiagao(exceto 

pelosmomentosiniciais, nocasodacontempiagaodeliberada,nao-esponti -

nea).Mais:sempreocupagSocomqualquerticnica emesmosemqueper- 

durea  intengaodecontemplar. HA intengao?EntSo,oegoestApresentee 

nSohAabstragao.

“MesmoquandoacontemplagSofordeliberada, volitivamentedecidida,o 

desenvolvimentodoprocessoterAdesetomarespontAneo. Navolta Aqueo 

indivfduo terA um sentimento especial de comunhao. (Boa palavra, esta: 

COMUNHAO.) Comonosdiasemqueagenteacordasentindoumafelici 

dadeespecial, apdsumanoitedesono realmenteprofundoesemsonhos.

 A lim disso, notequeeudissequecontempiar6observar ouatentar (ou fo-

calizaraconsciinciaem);naonecessariamenteolhar.Quantos.equaissen- tidos voci tem?Vocepode contemplarossonsdanatureza,porexemplo.

Ouumabelasinfonia.At6orufdodotrAfegonoasfaltoprdximoAsuacasa.

(ConTEMPLAR.. . serAquetemalgoavercomTEMPLO?) 

“Mais:suacontemplagSopoderApartirdeumatointelectivo.Ouseja,vo 

c i poderA escolher um conceito e contemplA-lo. A contempiagao, entao,

consistirAdeinfcioemconcentragSoefixagiomentalnoconceitoescolhido.

Mas voci terAdetranscendera  intelecgSonormaloucomum;deverAocor 

rerumaesp icie de “transintelecgSo".Como?Cadavezquesuamentepas 

seaanalisaroudesenvolverracionalmenteoconceito,vocedeverAexercer 

oatovolitivodevoltaraatentarpuramenteparaoconceitooriginal.SerAinu 

tilfazeresforgopararepelirounegaro trabalhomentalespontSneodeanAii- 

se oudesenvolvimento. Sevociseconcentrarem, “nSoqueropensarnis- 

so",estarApensando"nisso",adespeitodanegativa; "isso”, sejaoquefor,

serA conteudo ou elemento doseuesforgopara nSopensar "n-isso". Em 

suma, o que funciona A a  substituigSodopensamentonaodesejadopelo 

conceitodesejado,medianteatovolitivo.(Aoragao,paraoreligioso,podele- 

varacontempiagaoporesseprocessodesubstituigSo.) “A lim disso, paraquehaja transintelecgSo, sua concentragSoterAdeir 

alAmdarepetigSomondtonadaforma verbaIdoconceito. IstoA, numafase 

intermediAria, voci deverA pensar o conceito sempalavras, substituindo 

pensamento.verbalpor sentimentodireto. Provavelmente, sua consciincia 

sealternarAentremomentosdepensamentoverbal(mais longosefrequen- 

tes)einstantesdesentimentodireto.

"Quantomais frequenteseintensosforemosinstantesdesentimentodi 

reto,maiorserAasutilizagSodoseuestadomental,a tique,num"intervab "

dessaoscilagiooualtemagao,ocorrerAa transintelecgSo.ESPONTANEA- 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 167/411

MENTE,NATURALMENTE, "AUTOMATICAMENTE”! 

"Essapassagemda intelecgaoparaaabstragSo te ri deserassimes- 

pontinea, involuntSria, porque neia  vocd nao poderS estar. A mais sutil 

consciencia,omaisfracosentimentode ego,eelanaopoderSocorrer.

"(Vociafundaacabeganotravesseiroerelaxa. Pensamento.. . sensa- 

gaoffsica . . . pensamento...sensagSoffsica...bocejo...evociacordano 

dia seguinte. A passagemdo estado de vigiliapara o de sonoprofundo? 

"Milagreemistirio".) 

"Pessoalmente,naogostomuitodecontemplarconceitos.Emaisdiffcil.A

palavratendemuitofortementeapersistir,nafasedeintelecgSo.Eestafase 

naome i mesmo "simpStica";aprdpriaracionalidadedeconceituar6incoe- 

rente com o propdsito de contemplar. Prefiro contemplar uma paisagem ,

plantas, flores, objetos comuns, ouMUSICA. Em todo caso, estou traba- Ihandonacontemplagaodeconceitos,a travisdeexercfciosdepensamento' nao-verbal("pensarsempalavras”).

"Aproveitandoaidiiabisicade  intelecgSo,eadmitindooureconhecendo 

quea intelecgSo6faseinicialcomuma todasas formasdecontemplagao 

(decoisas, deseres vivosoudeconceitos), vocipodesintetizaroseues- quemadecontemplagaoassim: 

INTELECQAO   - TRANSINTELECQAO - ABSTRAQAO - PdS-INTELECQAO

“Querbrincardedefinir?Est6bem.Porestavez,brincamos." 

Alba sorri. Victor tambem, com um gesto de “essa nao” , e continua a leitura:

"INTELECQAO- Jogocompfexodesensagoesepensamentosiniciais.

"TRANSINTELECQAO- PassagemparaaabstragSo (viapensamento nao-verbaiconsciente,ounSo).

"ABSTRAQAO - (?)"Sonoprofundoesemsonhos". "Milagreemistirio".POS-INTELECQAO- Jogocomplexodesensagoesepensamentos, na 

retomada daintelecgSo, na voltaouapdsa voltadaabstragao. IntelecgSo 

superior,iluminadapelo"milagreem istirio"daabstragSo.

"Se vociquiser,poderScombinaresteesquemacom"sua"tesedame- 

tacognigSo." 

Alba:

“Sua? O Tio 6  gozado. Ele. .“Esti entre aspas, o sua.”

“A h .. . bom; eu nao ouvi as aspas. Continue, entao.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 168/411

"Assim: 

“A intelecg&o£fungaodiretada fase racional(comou semdadosime- 

diatosfomecidospelafasesensorial).

"A transintelecg&o£passagempara a metafase, pela eliminagioouo 

"desligamento"doego.

"Aabstragao£vivSncianametafase.(?) 

"Ea  p6s-intelecg§o £atividademental resultante dametacognigSo, no 

retornois fasesracionalesensorial.

"E talvez seja interessante voci considerar a transintelecgaopor via 

emocional(maiseficazparaamaioriadaspessoas). Euestouexperimen- 

tandoumaviadiferente,porquej i constateiqueaemogaopodeserilusdria 

nessa tentativa de transintelecgio. Umaesp£ciede "paradaameio-cami- 

nho", nogozodasensagaoemocional.Pensenum"Y”.Nasduaspeminhas decima  "escreva"RAZAOeEMOQAO, respectivamente.Noeixodebaixo 

°escreva" um "X". Creio que razio e emogao saomanifestagoes desse 

"estado-X", que6oestado(consciencia?)prdpriodametafase.Estouexpe- 

rimentandocolocar-mediretamentenele,paraevitarasarmadilhasdarazio 

edaemogio;principalmentedesta tiltima, quecomove (“e-mogio, co-mo- 

ve").Achomesmoquemuitagentee sti seequivocandonabuscadeemo- 

g&es sublimes. Istoprecisa tambim sertranscendido. Podesercaminho,

mas deve ser transcendido. Como eu licerta vez numaforismooriental: 

“Antesqueosolhospossamver, £precisoquetenhamperdidoacapacida- dedechorar". Emuitagentepensaque,aocomover-seoucomover,chorar 

oufazerchorar,esticonseguindoumagrandecoisaemtermosdeevolugao 

profunda oumfstica. Equfvoco, por sentimentalismo; e ummarcarpasso,

nesseequfvoco.

"Epreciso queocorra umaespicie de  "trans-sensagio”, numapassa 

gem para o "estado-X”. Neste estado £ que sinto que SOU, verdadeira,

profunda, infinitaeeternamente;aquieagora, sempre. E6nelequeparego 

encontraraimperturbabilidadedapazprofundaqueoutrosbuscamememo- gdesintensasesublimes. A “FUNQAO-X  ",do “estado-X” £anossamais 

profundaepermanenteFUNQAODESER.

"Sejacomofor, v icompietando"oseu"painelderdtulos.Quandoelees- 

tiverconclufdo,prontinho, toquefogonele!Sente-seconfortavelmente,rela- 

xe,econtempleofogo, depoisascinzas.SevocSo fizersorrindo,empaz,

semapegonemaversio,nioprecisarifazeroutrospainiisderdtutosepo- 

derivoltaracontemplar...asuamesa,porexempto.

“Para o homemquede fato contemplarumamesa, eladeixaride ser 

apenasMESA;passariaseralgomais,ououtracoisa.Comfrequincia,ele 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 169/411

oihariparaessamesaen£osomentever£MESA;sentirStambimaquele "algomais”ouaquela "outracoisa".

"Se voci encontrarumhomempassandosuavementeamSonumame 

sa, comoaacariciS-la, oua tentarsentira  vidadamesapelotato, naose 

admire. Epossfvelque ele a tenha contemplado e, portanto, quea tenha "visto"noqueela6;e tenhasentidoqueeletambim6noqueela6;queele 

eelas§oNOQUE!=l(Tambim6possfvelquetenhaapego£mesa, como 

objeto,porsentimentalismoouporqueelatenhacustadomuitodinheiro...).” 

“Essa nao!” - Exclama Alba, initada. E acrescenta:

“Ele tinha que estragar uma id6ia bonita, po£tica, com essa piadi-

nha de mau gosto! Afrnal, o que 6  que o Tio pretende?”

“Isto mesmo. O que ele  pretende 6   bem a questao. Tamb6m eu

me irritei com ele, por causa dessas piadinhas inoportunas. Depois

compreendi. Pelo menos, acho que compreendi. Com o Tio, a gentenunca sabe.”

“Que foi que voce compreendeu?”

“Bem, parece que 6   um recurso com dupla finalidade: Primeiro,

de refrear ou controlar o nosso entusiasmo pelo pensamento filosofi-

co profundo. Ele sabe que tendemos a exagerar, de modo que esse

entusiasmo (que, aliis, ele mesmo provoca) pode levar a preocupa-gao e ansiedade, fazendo a gente esquecer de viver a vida comum

com interesse, naturalidade, simplicidade e alegria. E isso nao 6  sd

uma questao de saiide e conveniSncia. Uma vez o Tio me sugeriu

que e, tambem, uma forma de contempiagao. Parece-me que ele pro-

cura evitar duplicidade na sua idealizagao do Ser e da vida. Voce

sabe: essa id6ia de um piano aqui e outro “sei-li-onde” ; de uma vi

da aqui e outra “sei-ld-onde”. Quando ele usa de duplicidade, 6  para

fins “diditicos” , como ele mesmo chama. Nao se admire se um dia ovir fazendo piada com a ideia de transcendencia, ou de abstragao!

“Em segundo lugar, creio eu, 6   um recurso com a finalidade de

chamar nossa atengao para uma esp6cie de cautela contra o Eu emo-

cional. Isto eu sinto vagamente; nao sei se vou conseguir definir. E

como se ele tivesse em mente a possibilidade de a gente se emocio-

nar, se comover, se impressionar, em certas situagoes, e acabar fi-

xando alguma iddia erronea (por nao parar para meditar ou mesmo

analisar racionalmente). Certa vez ele me alertou para essa possibili

dade. Lembrou-me, entao, de que muitas crengas infundadas se im-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 170/411

 plantam nas pessoas por esse processo, por essa “via emotional” .

“Talvez por isto, ele mesmo apela para o nosso Eu emotional,

usando uma linguagem po&ica e comovente, e depois joga dgua fria

na fervura com uma piadinha de mau gosto.”

“Bem. . . tomara que seja isso af. Senao, vou ficar desapontadacom o Tio. Detesto qualquer forma de cinismo! Continue com acarta.”

“Vejamos, entao:. . . ou porque ela tenha custado muito dinhei- 

ro. .  . esta pdgina acabou. . . verso. . . u6l”

“Que foi?”

“Acabou a carta! No verso so tem:  Por enquanto 4 sd. A ti a prd- 

 xima. Beijo para a sua namorada.”

“Essa nao! E meditagao? E A MINHA resposta?”Victor aperta involuntariamente os olhos e se abstrai por alguns

segundos. Depois, um leve sorriso, quase imperceptfvel, ameaga re

velar que compreendera a atitude de Ldgus. Disfargando, ele se

apressa em dizer:

“Nao sei... o Tio 6  assim mesmo.”

Alba, ap6s alguns segundos de silencio:

“Bem, pelo menos pude comprovar que a expressao experiencia 

transcendental,  que voce usou, 6  de fato impn5pria. Se o Tio a em- pregar, ela deverd ser entendida como referencia h experiencia de

 pos-intelecgao. Ou seja, na transcendencia, ou melhor, no estado de

abstragao,. nao poderd haver experiencia que possamos sentir oucompreender.”

Victor, animado com o interesse da namorada:

“E aquela de suscitar?”

“Hum. . . ah! acho que entendi: trata-se de induzir ou provocar

experiencia direta, vivencia pessoal, sentimento puro (como voce preflra chamar), que €  a unica maneira de verdadeiramente conhecer.

Creio que este i  o valor que o Tio reconhece na palavra, em teorias

e teses; e mais ainda, jd percebi, na linguagem podtica, porque a

 poesia, por “definigao” , destina-se muito mais a suscitar do que adizer.”

“Falou! Gostei da sua explicagao. Alids, isso af que voce falou

ajuda a entender porque o Tio insiste tanto em que a gente procure

SENTIR. Com frequencia, ele propoe ou sugere que a gente substi-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 171/411

tua pensar  por  sentir,  mesmo durante nossas atividades didrias co-

muns. Talvez o objetivo seja de suscitar a experiencia direta daquela

fase intermediaria que, diz o Tio, antecede a transintelecgao. E as

sim como se a gente se colocasse numa “fronteira porosa” ou “su-

 perfi'cie permedvel de contato” entre o ego e a metafase. Entao,

tanto pode acontecer a transintelecgao, como um influxo da metafase

nas fases inferiores, por uma esp6cie de “osmose de milagre e mist£-

rio . Isto 6   muito interessante, porque, se verdadeiro, implica que,

mesmo sem transcender, podemos ter a consciencia racional ilumi-nada pela metafase!”

Alba, em tom jocoso:

“E; talvez. Mas, quando voce completar esta id£ia, toque fogo no painel e sente pra contemplar as chamas.”

Os dois riem. Depois, Alba arremata:

“Bem, vou pra casa. Ah! Voce me empresta as reflexoes do Tioque jd leu?”

“Claro. Vou buscar.” -D ep ois, voltando:

“Escuta, nao quer que eu vd com voce? A gente podia comer um“hot dog” e tomar um chope.”

“Nao, obrigada. Quero ir sozinha, ruminando isso tudo que voceleu e que a gente conversou. Posso levar a carta, tambem9”

“Leve.”

Quando Alba jd vai se afastando, Victor acrescenta:

‘Olhe, diz o Tio que no budismo se pratica a contemplagao do  prdprio caminhar.  Por que voce nao tenta?”

Alba, saturada de tanta conversa sobre contemplagao:“Porque nao sou budista. Tchau!”

“Tchau.”

O jovem entra em casa, abanando a cabega e sorrindo. Intima-

mente satisfeito, com a namorada, o Tio, consigo mesmo, com a vida. ..

Abre e ergue instintivamente os bravos, inclina a cabe^a para trdse alarga o sorriso num quase-extase!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 172/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 173/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 174/411

abstragao. . . Se a Nizete chegasse, a gente podia bater um bom. . .

Milagre e mist6rio da. . . Hum! Que buzina estridente! Devia ser

 proi. . . Milagre e mist£rio da abstragao. . . milagre e misterio da

abstragao. . . milagre.. . Ah! Vou fazer um cafe.”

O leve pum do g£s que se inflama, e a chaleira que vem ocultar achama. O banquinho 6  arrastado com um leve nndo. A jovem senta.

Olha para a chaleira no fogo.

“Vai demorar. Enquanto esquenta, vou ligar a TV.”

Senta na beira da poltrona e liga a TV pelo controle remoto. Um

canal, dois, tres, quatro.

“Nada que preste.”Desliga. Poe o controle remoto na mesinha de centro e recua para

o fundo da poltrona. Sente cansago. Procura a posigao mais confor-

tdvel e repousante e olha para a janela.C6u; azul; lindo. Nuvens brancas, muito brilhantes e fofas; desli-

zando indolentemente. Nuvens cinzentas; umas mais escuras, outras

mais claras; deslizando indolentemente.

Indolentemente. . . deslizando. . . c£u azul. . . branco brilhan-

te . . . luz!. . . nuvem deslizando. . . cavalo cinzento. . . deslizan

do. . . silenciosamente. . . nuvem branca. . . indolente. . . testemu-

nhando.. . sem apego nem aversao.. . serenamente.. .

E as nuvens continuam passando, indolentes e serenas testemu-

nhas da jovem, agora abstrafda. . .

0 nndo; indefinido e nao localizado. A jovem se espreguiga, per-

nas e bragos estirados no ar. Boceja.

“T6 lindo, o c£u!”

O rufdo. . .

“Meu Deus! A chaleira no fogo!”A mao gira o botao do fogao e o fogo se apaga. O rufdo vai dimi-

nuindo, diminuindo.. . cessa.

A tampa da chaleira: preta (era azul). O botao de pegar a tampa:

 parcialmente derretido.

“Puxa vida! Essa de contemplagao jd me deu um prejuf. . .

ACONTECEU! Que legal! Aconteceu! Eu me abstraf! Que legal...”

E Alba volta para a sala, nos passos alegres de uma danga es-

 pontanea. A musica? Nela mesma; vibrando no amago do seu sere impelindo suas maos a descreverem graciosos gestos no ar.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 175/411

De novo na poltrona, sorrindo feliz. Pouco depois, o sorriso vaise desmanchando, se desmanchando.. . cessa.

“U6. . . ser£ mesmo isso? Mas isso deve ter me acontecido “um

 bilhao” de vezes na vida! Deve ter acontecido “um bilhao” de vezes

na vida de todo mundo! Entao eu estou iluminada? Por isso? Todomundo est£ iluminado? Por isso?

“Ih. . . meu caro Tio. . . deve haver alguma coisa errada na sua

teoria da contemplagao natural, espontanea. Imagina se ainda have-

ria guerras! Toda essa loucura de ganhar, acumular, cada qual pro-

curando ser e ter mais do que os outros. . . gente se envaidecendo de

ser bonita, ou forte, como se tivesse m6rito nisso. . . gente se orgu-

lhando de ter carro bonito e bom, como se tivesse criado, projetado

e construido o carro.. . gen te.. . Nao, meu caro Tio; tem algum erro

na sua teoria. . .”

“ A i a r  

“ Sou eu. Beijo.”

“Beijo. Tudo bom? Algum grilo?”

“Tem sim. A teoria da contemplagao natural, do Tio, deve estar

errada.”

Victor sorri e pergunta, torcendo o fio do telefone entre os dedosda mao direita:

“Qual e o erro?”

“Bem, h i pouco eu tive um momento de abstragao, contemplando

nuvens pela janela da minha sala. At6 deixei a chaleira secar no fo

go. Capaz de ter furado. Depois, senti a gloria do universo na mi-

nha alma!”

“Puxa!”

“Ah, s6 dizendo assim. Foi uma alegria, que voce precisava ver.

Vim DAN^ANDO pra sala! Fiquei curtindo um pouco a minha ale

gria, mas depois me dei conta de que ela nao tinha nada a ver com a

 jubilosa pds-intelecgao do Tio. Tinha sido pura reagao psicoldgica,

 por sugestao. Claro: o Tio tinha falado de jubilo e amor na pds-in-

telecgao, depois da abstragao; quando eu me dei conta de que tinha

me abstraido na contemplagao das nuvens, a sugestao funcionou; fi

quei jubilosa e radiante como quem ama.”“Pode ser, mas, neste caso, qual 6 o erro da teoria do Tio?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 176/411

“E que esse tipo de contemplagao e abstragao jd me aconteceu

“um bilhao” de vezes, e o mesmo deve ter ocorrido com todo mun

do!”

“Ah, jd vi. Entao, todo mundo jd devia ser iluminado e a humani-

dade deveria estar em paz, etc. Nao 6?”

“Claro!”

Victor “pensa” um pouco e pergunta:

“Olhe, voce quer que eu pense no assunto e Ihe de uma resposta,

ou prefere resolver o problema voce mesma?”

“Hum. . . melhor eu mesma resolver. Deve ser um bom exercicio.

Se eu nao conseguir, recorro a voce. Se voce tambem nao conseguir,

a gente recorre ao Tio. Td bom?”

“Td. Posso lhe sugerir uns recursos para voce tentar resolver o

 problema?”

“Pode.”

“Muito bem. Voce pode tentar a abordagem socrdtica do Tio.”

“Uai! E de Socrates ou 6  do Tio, essa abordagem?”

“Bom. . . 6   que o Tio me disse vdrias vezes que S6crates vivia

 perguntando, “que 6  isso?”, “que 6  isso?” , e que talvez pouca gentetenha percebido a profundeza da descoberta que o levara a essa

“mania” e da ligao que ele tentava ensinar insistindo nessa pergun

ta.”

“Nao sabia que o Tio tinha estudado Filosofia.”

“Nao estudou. Ele me disse que leu pouquissimo, num livro de

Histdria da Filosofia, al6m de pequenas referencias incidentais, aqui

e ali. Mas, no pouco que leu sobre S6crates, gamou.  Amo Sderates, diz o Tio, e acrescenta: embora nao o conhega, propriamente.”

“Eu vou acabar chamando o Tio de Sr. Nao-propriamente.”

O fio do telefone leva a risada de cada um dos jovens para o ou-

vido do outro. Victor reinicia o papo:

“Pois €. Pessoalmente, creio que o Tio redescobriu o que S6cra-

tes jd havia descoberto sei Id eu quando. Alids, o prdprio Tio jd me

falou, tambem, que a real aquisigao de um conhecimento de segunda

mao €  uma redescoberta; isto 6, o fenom eno psfquico da descoberta 

acontece de novo na mente da pessoa que de fa to   adquire, por in-

formagao, um conhecimento jd descoberto por outra pessoa.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 177/411

“Hum. . . nao sei.. . Eu aprendi, por exemplo, o Princfpio de Ar-

quimedes, da flutuagao dos corpos, e nao senti nenhuma redesco-

 berta.”

“Aprendeu?”

“Claro que aprendi! Foi no cotegio, faz tempo; mas ainda melembro. Quer ver? Todo corpo mergulhado num Kquido.  .

“Ta bom. Acredito que voce lembre. Mas se voce escrever o

Princfpio de Arquimedes e sair perguntando, “que 6  isto?” , para ca

da palavra ou idSia do Princfpio, vai ver que nao o CONHECE de

fato. Esti informada de sua expressao verbal, o que €   muito dife

rente e superficial. Por isso o Tio recomenda que a gente pergunte,

“que 6   isto?”, e saia aplicando esta pergunta a cada resposta que

obtenha. E diz naquele jeito dele:

"Sabe oque6,essapergunta?Umasonda.AsondadeS6crates.Sabe

quemeraSficrates?Um"sondador".

“Sabeoque6, essapergunta?Umaantena.Aminhaantena.Sabequem

soueu?Um“receptor”.

HS6crates sondava, coma suasonda.Eu, recebo,comaminhaantena.

S6crates, recebia, comaminhaantena.Eu,sondo,comasondadeSocra

tes.”

E isto que voce vai ter de fazer: sondar e receber, com a  sonda- 

antena socrdtica do T io ”

“Entendi. Eu pergunto, “que 6   isto?”, e, se nao souber, vou pes-

quisar em livros e enciclop6dias. Af a solugao vai aparecendo. ..

“Ei! Espere af! No caso do Princfpio de Arquimedes, eu poderia

consultar enciclop6dias, ou livros de Ffsica; mas, e quanto &teoria

do Tio? Onde vou pesquisar?”

“Triste, isso.”

“O que?!”

“E por causa dessa mentalidade que o Tio vive reprovando o nos

so extremado racionalismo:

“Sabeoque i  quesomos?Miquinasdexerox.Fomoseducadospara“ti-

rar.c6pias” . N§osabemos?Vamos procuraruma informagSo  {emlivros,en-

ciclopSdias,revistas,oudiretamentecompessoas).

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 178/411

“E com istoembotamosedesprezamosnossomaiorpoder. Ignoramoso

poderquenosdistinguedosmacacos.

“Nem nos ocorreapossibilidadedeoutramaneiradeaprenderedesco-

brir.Aprender(assim nosensinaramnasescolasquenos“educaram")6“ ti-

rarc6pias".

“O que§quevoc§querser?Ummacacooperandoumam&quinadexe

rox?"

“Tudo bem. Mas, qual 6  a sua? Criticando a minha mentalidade!”

“Nao 6 a sua  mentalidade que estou criticando. E a do sistema

em geral, principalmente em seu aspecto “educational” . Quase to

do mundo tem essa mentalidade. Porque todos (talvez com exce-

goes) fomos “educados” para ela. Felizmente eu a perdi, principal-

mente depois que conheci o Tio. J£ sentia aversao ao extremismo ra-

cionalista e a essa extrema dependencia de informagao. Mas foi o

Tio quem puxou essa aversao para o meu nivel de consciencia mais

aguda e a reforgou com seus ensinamentos. Alias, certa vez ele lem-

 brou S<5crates, que dizia ser uma “parteira” . O fato 6   que foi ele

quem me deu luz e coragem para aceitar aquela aversao e enfrentar a

tarefa de me reeducar.”

“Bom, mas voce e o Tio nao vao querer que, toda vez que al-

guem queira saber alguma coisa, tenha de descobrir!”

“Claro que nao. Nao somos  buiTos. Tambem nds percebemos is

to. Para fins prdticos, utilitdrios. . . viva a racionalidade!. . . viva

a informagao! Mas, nem tudo na vida pode ser resolvido por racio

nalidade e informagao; nem tudo na vida 6  pr£tico, utilitdrio. Bem ao

contr&rio: a vida, em seu aspecto real e profundo, nada tem de prati-

co ou utilitirio. Se fossemos razoavelmente utilitaristas, tudo bem. Oque se reprova 6  que nos tomamos utilitaristas extremados.

“Vale a pena meditar essa idtia de utilidade. Cada vez mais me

convengo de que vida 6   a nossa condigao fundamental de  ser  e €  

fato nao-utilit2rio. Nosso pecado 6  viver para utilidades, concentra-

damente; acabamos esquecendo viver. Creio que se nos concentrar-

mos cada vez mais em  ser,  pela constante contemplagao, pela cons-

tante atengao ao  sentimento de ser,  conseguiremos conhecer vida, 

 por experiencia direta, e poderemos orientar para maior felicidade anossa vida de utilidades.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 179/411

“Td bom; mas este papo pode ir ainda muito longe, e estou can-

sada. Amanha vou tentar usar a “sonda-antena socrdtica do Tio” pra

resolver o meu problema da contemplagao. Agora, acho que vou

descansar e esquecer tudo isso. E vou deitar cedo.”

“Af esti outro bom recurso. Antes de adormecer, contemple um pouco aCERTEZA, a CONFIANC^A ABSOLUTA de que serd ins-

 pirada, na abstragao do sono. Nao faga disto uma preocupagao, por

que assim prejudicard o sono e poderd provocar sonhos (bons, ou

 pesadelos). Apenas contemple, serenamente, como o Tio ensinou,

aquela CERTEZA ou CONFIANQA ABSOLUTA. O resto €   “au-

tomdtico” . Lembre-se bem: €  importante que nao se preocupe.

“O Tio uma vez me ensinou:

“Sentadonacama,jdprontoparadormir,relaxeeconcentre-seporalguns

segundos no quevoc§ quer.Mas n§opense nissocomsentimentodede 

sejo e,sim,comsentimentodequeoTERA!Quando?Nempensenisto;n§o

fixemomentoalgumnofuturo.Como?Tamb6mn§opensenisto.QueoTE-

RA;s<5.

“Depois, respire fundoe solteumforteelongosuspiro.Sabeoque6,es

sesuspiro? Um bot&o decomandoeletrftnico;vocfi apertae . . . PRONTO!

Aoexalar,mantenhaosentimentodequeliberouopoder queconcretizardoseudesejo.Completadaaexalagao, nessesuspirodeconfianga,deite-see

esquega tudo. NSo pensemaisnoassunto.Seelevierinvoluntariamenteh 

consciSncia,concentre-se nasua respiragaoounodeleitedeestardeitado,

nasensag§odacoberta,dotravesseiro,e...bomsono!

“Por que nao experimenta isto?”

“Certo. Mas antes que voce se lembre de outro recurso... tchau!

Preciso mesmo desligar, pra descansar. Em materia de filosofia e psicologia, tive uma dose forte, hoje.”

“E . . . acho que sim. Boa noite e bom so no.. . sem sonhos!”

“Pra voce tamb6m.”

O fone de Alba €  colocado pesadamente no gancho.

Victor, acomodando suavemente o seu fone no gancho:

“Se ela continuar contemplando nuvens, vai acabar sentindo

mesmo A GLORIA DO UNIVERSO NA ALMA!

“Muito bom, contemplar nuvens.. . ”A carta de Ldgus, na mesinha de centro.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 180/411

Agora, nas maos da jovem. Ela passa as paginas, sem intengao de

Ier.

De repente. .. LETRAS DE FOGO!

“E O EGO?”

O corpo da jovem 6  bruscamente sentado na poltrona.“E isso! Tem de ser isso! SENTI que 6  isso!”Excitagao. Um surto de energia lhe invade o corpo, num arrepio

que vai morrer em rapido e breve estremecimento do tronco e da ca

 bega. O cansago? O tremor sacudira fora.

“Mas, como vou comprovar que E isso?.. . J i sei!”

A caneta desliza sobre o papel, nervosamente:

 A abstragao leva, na pos-intelecgao, a iluminagao da conscien

cia racional;ora, todo homem tem consciencia racional e se abstrai 

naturalmente;

logo, todo homem tem, naturalmente, a consciencia racional  

iluminada pela abstragao, na pds-intelecgao.

“Abstragao. . . p<5s-intelecgao. . . consciencia racional. . .(?). . .

homem... HOMEM!.. . QUE E?

“Claro! EGO 6  o homem! A consciencia racional e manifestagao

do EGO, que E o homem! Quando o homem deixa de ser ego, deixade ser homem! E eg o .. . que 6 ?

“Exatamente aquilo que diversifica Homem e produz homens.

Exatamente aquilo que muda e evolui, em fungao de. . . quantos e

quais fatores?. . . sei la! Bem. . . constituigao organica, hereditarie-

dade, experiencia na vida. . . isso!. . . nao h i dois homens iguais;

estamos distribuidos numa escala de ego-evolugao!

“No comego da escala, egos primitivos, ainda que inteligentes,

supercivilizados e poderosos no mundo (tamb^m os obtusos, birba-ros e miseriveis no mundo). Nos altos niveis da escala, egos ilumi-

nados: grandes fildsofos, como Socrates; grandes cientistas, como

Einstein; grandes estadistas, como Gandhi; grandes religiosos, como

Chardin. . . Nos niveis supremos da escala, Jesus o Cristo, Gautama

o Buda. . . (outros?). . . (nao sei). Depois. .. depois.. . A GLORIA

DO UNTVERSO!”Como lampada que tivesse recebido uma sobretensao apenas su-

 portivel, a jovem sente quase-extrema excitagao; suas temporas la-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 181/411

tejam, seu coragao bate apressado, e forte calor se produz por todo o

seu corpo. Ao mesmo tempo assustada e maravilhada, sente medo

e indizivel encantamento. Respira fundo, varias vezes, e vai seacalmando.

“Meu Deus!”

Joga a cabega para tras, contra o encosto da poltrona. Fecha os

olhos e continua respirando fundo e procurando relax ar. Dois mi-nu tos.. . tres.

A respiragao ainda um pouco apressada, um sutil zumbido na

consciencia acompanhando o ritmo do leve mas persistente latejonas temporas, ela se precipita para o telefone.

“A16.”

“Eu de novo.”

“Ora!. . . que foi que houve? A sonda-antena j£ funcionou?”“Nao propriamente.”

Do outro lado do fio parte uma forte risada, que vai estourar noouvido de Alba!

“U6. . . que foi, agora?”

“NAO PROPRIAMENTE.

“Ah! Foi sem querer. Escuta:“Nao foi a sonda-antena que funcionou, pro. . . ih!. . . Mas foi

M A-RA-VI-LHO-SO! Foi assim:

“Quando eu desliguei o telefone, fui andando at<5 a mesinha de

centro, me sentindo cansada e meio zonza com aquele nosso papo.

Fiquei assim. . . desligada, parada em p6 junto da mesinha, sem pen

sar em nada. De repente, assim como um robo, quero dizer, mecani-

camente, sem intengao nem voligao, peguei a carta do Tio que tava

na mesa e comecei a olhar pra ela, sem ler pro. . . ah!. . . PROPRIAMENTE, vairendo as piginas a esmo.”

“Af aconteceu.”

Isso af! A mesma pergunta que o Tio fez pra ami mar o seu pai-

nel da metacogmgao saltou da carta e me atingiu com tanta forga queme derrubou sentada na poltrona!”

“Que pergunta?”

“Ora. . . E O EGO?" 

“Ah, sim; claro.”

“Claro, mesmo! Foi assim que tudo ficou, de repente: CLARO!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 182/411

“A sensagao que eu tive foi a coisa mais extraordindria que eu jd

senti na minha vida. S<5 que tive medo.”

“U e.. . por que?”

“Bem, 6   que fiquei tao alterada, fisiol<5gica, mental e emocional

mente, que PENSEI QUE IA MORRER!”

“Imagina!”

“Pois 6. Fiquei assustada, sim. Mas foi j6ia!”

“E. . . a resposta deve estar no ego mesmo. Mas 6  pena que voce

nao a tenha obtido usando a sonda-antena.”

“Ora, quem sabe? Na exposigao do Tio, ele diz que a real p6s-

mtelecgao pode ocorrer na volta ou apos a volta da abstragao. Quem

sabe se eu, cansada, com a vontade consciente muito enfraquecida,depois do nosso papo no telefone, nao estava em condigao dtima pa

ra a intuiqao  ou o impulso metacognitivo de pegar a carta do Tio e

sair passando os olhos por ela a esmo? Talvez, subconscientemente,

eu jd soubesse que a resposta estava ali e quisesse apenas botd-la na

cara do consciente. Sim, porque aquela pergunta, eu nao li; ela sal-

tou na minha cara!”

“E possfvel, sim.”“E verdade que eu tinha um problema e estava querendo encon-

trar a solugao, que estava ali, na carta, naquela pergunta, que voce

 jd tinha lido pra mim. Portanto, o chato €  que eu nao posso provar

que nao foi isso. Quero dizer, que eu nao encontrei simplesmente,

fora, na carta, a solugao do problema, e fiquei euf<5rica com isto. Foi

diferente. Tenho certeza de que FOI DIFERENTE! Pelo que eu

senti, aquela resposta JA ESTAVA EM MIM! A pergunta, na carta,

s<5 puxou ela pra fora ! Gozado.. . a pergunta respondeu.. . ”“E gozado, sim. E isto me lembra que o Tio sempre diz que a 

resposta estd na pergunta. Se a gente sonda a pergunta, encontra a

resposta.”

“Alids, por falar em sondar, depois que eu senti a solugao na

quela pergunta, resolvi sondd-la, e percebi que teria dado certo. De

 pois eu lhe mostro como foi.

“Puxa vida! E j<5ia! Eu AMO o Tio!”

“Eu tamb€m o amo, e fico contente em saber que voce jd o estd

amando. Sabe quem 6  que eu mais amo neste mundo?”

Alba, em tom desconfiado:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 183/411

“Quem?.. .”“Voce.”

Ela, aliviada e feliz:

“Ora. . . eu tamb€m. Quero dizer, 6  voce que eu mais amo neste

mundo. E €  melhor a gente desligar agora, com essas vibragoes deamor no ouvido e no coragao. T i? ”

“T i bom. Beijo.”

“Beijo. Tchau.”

O telefone pousa suavemente no gancho. Paz no coragao da jo

vem. E ela permanece ali, sentada e absorta, deleitando-se no gozode seu doce e jubiloso estado de ser.

Levanta-se, afinal, decidindo ir at6 a cozinha, fazer um caf6.

“Se 6  que a chaleira nao furou. .Subito, uma estranha sensagao de presenga, em frente a estante de

livros. O choque no plexo solar e o forte arrepio. A testa franzida eo olhar assustado para aquele ponto da sala.

A inalagao profunda e o suspiro.

“Que esquisito. . . Seri que eu estou comegando a imaginar coisas?”

Segue para a cozinha.

“A chaleira t i feia, mas ainda ti boa.”A campainha da porta. Nizete, que entra, cumprimentando ale-

gremente a amiga:

“Oi! Tudo super?”

“Na mais alta GLORIA DO UNIVERSO!”“O que?!”

C o m o q u e r i n d o , a f a s t a m o - n o s e n t a o ,

e m n o s s o S m a g o s e n t i n d o a g l d r i a q u e d o u n i v e r s o n a o 6  

ma s n e l e o p o d e r r e f l e t e ,

d o E s p f r i t o q u e n o E s p a g o

n o s s a c o n s c i i n c i a e x p a n d e ,

e m m S g i c a u b t q u i d a d e . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 184/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 185/411

AUTOMATOS SEM VIRTUDE, NO FIM DO TUNEL

E o s o p r o d o E s p f r i t o

n o E s p a g o n o s i m p e l e , a u t o m a t i c a m e n t e ,

p a r a u m n o v o e n c o n t r o

c o m n o s s a s j o v e n s e q u e r i d a s s o m b r a s . . .

“Aqui esti o meu silogismo, aquele que eu sondei pra ver se dava

certo.”

Victor le: A abstragao leva, na pds-intelecgao, a iluminagdo da 

consciencia racional;

ora, todo homem tem consciencia racional e se abstrai naturalmente;

logo, todo homem tem , naturalmente, a consciencia racional  

iluminada pela abstragao, na pds-intelecgao.

Alba, ansiosa:

“Entao?”

“E; parece que funciona; a resposta deve estar mesmo no ego.

 Nao discuto o seu silogismo, pro. . .” - olha para a namorada, sor-

rindo, e os dois exclamam em umssono:

“Propriamente!”

Victor, entao, ap<5s novo e breve exame do silogismo:

“Funciona, sim. E a resposta 6  mesmo o ego. Fora do silogismo,

 poderiamos completar a conclusao assim:"Todo homem tem, naturalmente, a consciencia racional  

iluminada pela abstragao, etc., NA PROPOR£AO DO 

 POTENCIAL DO SEU EGO.

“Talvez as palavras nao sejam as mais apropriadas, mas a id£ia

estd af. Por analogia: Um r£dio barato com circuito para ondas cur-

tas pega e reproduz precariamente irradiagoes, digamos, da Europa.

Um rfdio caro e aperfeigoado, com circuito para ondas curtas, pegae reproduz muito melhor as mesmas irradiagoes. Os principios de

eletromagnetismo e eletr6nica aplicados nos dois r&dios sao basica-

mente os mesmos. Essencialmente, os fen6menos e processos de

captagao, transformagao e reprodugao, nos dois casos, sao os mes-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 186/411

mos. E a irradiagao 6   a mesma. Mas o segundo ridio tem circuito

mais desenvolvido e aperfeigoado.

“O primeiro ridio representa um ego primitivo, pouco evoluido; o

segundo, um ego mais evolufdo. O fendmeno de iluminagao 6  essen-

cialmente o mesmo, para os dois egos (captagao, para os dois ri-dios). Mas o segundo ego €  mais desenvolvido e aperfeigoado; por

isto, transforma  (ou trans-FORMA) com maior eficiencia e se cons-

cientiza mais clara e fortemente dos efeitos da iluminagao, na p<5s-

intelecgao; e, por fim, 6  mais capaz de expressar significativamente

(“rePRODUZIR”) o seu sentimento da p6s-intelecgao.”

“Puxa! Brilhante, sua analogia!”

Victor, com naturalidade, quase frieza, indiferente ao elogio:

“Ajuda a entender.”“Hum.. . olha a modistia dele. . . ”

O jovem para um segundo de pensar. Depois, conige:

“Mod6stia? Ah. . . nao foi moddstia. Nao fago nenhum empenho

em ser modesto. Voce nao aprendeu ainda que moddstia €   vaidade

disfargada? Enfim, alguma forma de satisfagao egocentrica, disfar

gada?”

“Ah, essa nao! Sem essa de sofismar comigo! Voce foi modesto

sim. Eu lhe fiz um elogio e voce nao o reforgou, nem com palavras,nem com gestos, nem com qualquer atitude. Se voce se envaideceu

intimamente, nao revelou isto exteriormente. Nao parece ter fei-

to nenhum esforgo para disfargar qualquer grau de envaidecimen-

to.”

“Af €  que esti. Exatamente. Nao fiz mesmo nenhum esforgo nes

se sentido. Sabe por que? Porque nem sequer me passou pela cabega

a iddia de elogio.  Portanto, nao houve moddstia. H i modSstia quan

do o indivfduo se apercebe de que foi elogiado, de que seu ego foivalorizado; vem o sentimento ou gozo de prazer egocentrico (vaida

de), mas ele exerce a voligao para oculti-lo ou disfargi-lo. Na medi

da em que o consegue, manifesta mod6stia. E comum a gente nao

conseguir de todo e se trair num sorriso, is vezes tao leve que mal

d i pra perceber. Para mim, h i um elemento ou conteildo de voligao 

na modestia. Isto indica que o ego esti presente, no gozo (mesmo

que disfargado) de saber-se ou sentir-se apreciado ou valorizado.

“Quando o ego nao esti presente, nao ocorre percepgao de elo-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 187/411

gio, de modo que a reagao do indivfduo se prende ao significado das palavras que ele ouviu, e nao h relagao apreciativa, desse significa

do, para com o seu ego. Por isso sua reagao €  natural, espontanea,

neutra, e ele pode at£ reforgar o elogio com palavras de concordan-

cia. Mas 6   s6 isto mesmo que estd fazendo: concordando, logica-

mente.

“Alids, creio que, em caso de insulto, ocorre basicamente o mes

mo. Por isso, os verdadeiros Mestres ou Iluminados sao serenos; isto

6,  reagem do mesmo modo ao que n6s encaramos como elogio ou

como insulto: concordando ou discordando, logicamente; ou sim-

 plesmente deixando passar. Quando concordam, nao estao reforgan-

do o elogio, por exemplo, e nisto denunciando vaidade, embora possa nos parecer que sim. Quando discordam de um elogio, nao estao

sendo modestos, e nisto revelando virtude, embora parega que sim.

S<5 concordando ou discordando, ldgica e realmente.

“Sabe o que eu acho que 6   virtude? Coisa de nao-sdbios, como

n6s. Os sdbios nao tem virtudes; nao sao virtuosos; simplesmente

SAO. Sua nobreza de sentimento, pensamento, gesto, atitude, pala-

vra, 6   apenas natural, “automdtica” , manifestagao ou expressao

neutra de verdade. A id£ia de virtude 6  nossa, porque comparamos.“E. . . o ego nao estd e eles sao “automdticos” . Agora, compre-

endo melhor que os verdadeiros sdbios (Mestres ou Iluminados, sevoce preferir) sao “ autdmatos em Deus” ! Sao como a dgua, que

molha. . . porque molha; molhar 6   fungao da sua natureza; nada

mais. Como o perfume, que perfuma... porque perfuma; perfumar 6  

fungao da sua natureza; nada mais. Como a luz, que ilumina... por

que ilumina; iluminar 6   fungao da sua natureza; nada mais. NAO

TEM POR QUE!“Sabe? Comego a sentir o profundo e maravilhoso sentimento que

o Tio tem da vida. Deus 6  o Grande Aut6mato, e tudo (inclusive n<5s

e os demais seres “vivos” e “nao-vivos”) 6   manifestagao do seu

automatismo. Sabe o que 6 o  sorriso da crianga? O automatismo de

Deus no homem. Sabe o que 6  a iluminagao da luz? O automatismo

de Deus na luz. Sabe o que 6  a fragiincia do perfume? O automa

tismo de Deus no perfume. Sabe o que € o molhar da dgua? O auto

matismo de Deus na dgua.

“Sabe como 6   que teremos de nos tomar? Automdticos, divina-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 188/411

mente automaticos, como a crianga que olha e sorri. Se o Tio esti-

vesse aqui, talvez lembrasse:

‘'Quem ndo receber o reino de Deus como uma crianga, 

de maneira nenhuma entrard nele.

“Voce quer entrar nesse “reino de Deus”? Entao olhe e sorria,automaticamente e sem virtude.”

Victor faz uma pausa e se poe abstraido.

Alba, comovida pelo sentimento suscitado pelo jogo de idtias ex-

 presso por seu jovem namorado, levanta-se e o beija, temamente.

 Nela se manifesta amor, que 6  dgua e umedece os olhos.

Ele, tocado tambem pela manifestagao de amor que desencadeara,

sorri, encantado e feliz. Depois, reabre o didlogo:

“Bem, voltemos ao seu silogismo.”

Rele o silogismo e observa:

“De qualquer forma, ele me parece valido, embora eu nao tenha

conhecimento de Ldgica suficiente para discuti-Io. Sua duvida foi

 provocada por exageragao do conceito de iluminagdo; esta 6  a pala-

vra-chave. Se voce tivesse se perguntado, que &iluminagdo?,  teria

se dado conta do seu erro.”

“Mas. . . iluminagao nao i   o fenomeno pelo qual o homem fica

cheio do Espfrito Santo, como se diz na terminologia crista, e como

teria ocorrido com Jesus em seu batismo?”

“Para quem,  iluminagao 6   somente isto? Quero dizer,  para 

quem,  iluminagao 6 fenomeno que s<5 ocorre nesse grau? Nao para o

Tio, e voce estava apreciando uma proposigao dele; portanto, o sig-

nificado da palavra iluminagdo, no seu silogismo, tem de ser o que

ele Ihe atribui.”

“E qual €  o significado que ele atribui a palavra? Isto €, responda

voce pelo Tio: que 6  iluminagao?”

“Aqui se impoe o problema do real conhecimento, que requer ex

 periencia direta. Em todo caso, para os nossos fins de tratamento 16-

gico da questao, vou tentar Ihe transmitir uma informagao, com base

na minha experiencia (ainda precdria e primdria) e na informagao

que tenho recebido do Tio.

“Considere o estado mental e emotional de um homem num am-

 biente totalmente escuro, que ele ndo conhece.  Nesse estado voce

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 189/411

 pode perceber componentes de inseguranga, perplexidade, medo,

etc., decorrentes de ignorancia.

“Considere, agora, o estado mental e emocional do mesmo ho

mem, no mesmo ambiente, este, por6m, totalmente iluminado. Nessenovo estado, voce pode perceber componentes opostos aos anterio-

res, decorrentes de conhecimento.  Agora, o homem conhece o

ambiente e sobre ele pode exercer o grau de domfnio de que £ ca- 

 paz.

“Esta analogia (calcada na pr<5pria experiencia humana) deve ter

inspirado o uso da palavra iluminagao para designar o fenomeno que

estamos tentando entender e caracterizar. Portanto, na acepgao suge-

rida por ela, iluminagao 6 fenomeno relativo e gradativo, estreita-mente ligado &sua escala de ego-evolugao. Sabe o que 6 a sua es

cala? Um tunel, muito, muito comprido. Ao longo desse tunel, inu-

meras camaras, a princfpio muito distanciadas e gradativamente me

nos distanciadas.

“Nosso homem da analogia 6   um ego primitivo, iniciando sua

existencia na primeira camara, totalmente ks  escuras; ignorante e,

 por isto, inseguro, perplexo, amedrontado, agressivo, etc. F£cil ima-ginar sua pequenfssima possibilidade de domfnio do ambiente e de

sua pn5pria vida.

“Um dia ele divisa, num m&gico lampejo, uma tenue luz que lhe

 permite encontrar a safda para o tunel. Segue-o e atinge a segunda

camara, menos escura. Depois, vem de novo aquele migico lampejo

e ele segue mais uma vez pelo tunel, at6 a camara seguinte, mais

iluminada. E assim sucessivamente, por siculos e siculos. A medida

que esse homem, esse ego, vai alcangando camaras mais iluminadas,ele prdprio vai se tornando mais iluminado, em decorrencia de evo-

lugao pela experiencia, no esforgo de veneer os desafios que lhe sao

impostos em cada camara. Na verdade. . . (e aqui esti um ponto

muito sutil da analogia do Tio). . . a luz que vai gradativamente ilu-

minando as sucessivas camaras nao vem “de fora” desse ego. E ele

 proprio que vai se tomando mais e mais translucido  a luz que bri-

lha no amago do seu pr6prio ser e que 6  do Ser que tudo 6. Portanto, lembre-se sempre: se voce quiser luzir, ter4 de se tomar

TRANSLUCIDA, porque de voce mesma nenhuma luz poderi se ir-

radiar.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 190/411

“De fato 6   sutil, pra dizer o minimo. Mas €  muito interessante.

Continue.”

“Bem, esse ego atinge o fim do tunel. Nao hd mais camaras a al-

cangar. A partir desse ponto, afirma o Tio, nao 6  possfvel dizer nada

que fag a sentido, racionalmente. S<5 6   possfvel dizer coisas estra-nhas, aparentes absurdos, como o de que o ego se toma a propria luz

que o norteara; ou seja, que ele se desvanece na luz do Ser que 6  tudo, aqui e agora, sempre.”

Alba pensa um pouco e comenta:

“Talvez isto ajude a compreender por que Jesus teria dito:

' 'Se algutm quer vir apds mim,

 A SI MESMO SENEGUE,

TOME A SUA CRUZ, e siga-me.“E tamb£m, na parabola do semeador:

‘‘O que fo i semeado em solo rochoso, esse 4 o que ouve a palavra 

e a recebe logo, com alegria; 

mas NAO TEM RAIZ EM SI MESMO. . .

“Parece, entao, que todo ego, sem excegao, tem de percorrer o

tunel, passando por todas as camaras. A id6ia de “salvagao” por in-

tervengao de um poder extemo deve ser subsdtuida pela de gradati-

va iluminagao por evolugao de um poder intemo.”

“E. Talvez.”

“Por outro lado. . . (ocorTeu-me agora). . . essa gradativa ilumi-

nagao, como na analogia do tunel, nao seria conseqiiencia de uma

evolugao puramente bioldgica?”

“Af 6   que o sdbio iluminado se ve num dilema. Nao de si para

consigo mesmo, que nele tudo 6 certeza de verdade intuitivamente

vivenciada, mas, no seu empenho de ajudar o semelhante. Ele nao

 pode provar ao prdximo a veracidade de suas id^ias, inspiradas por

sua superior iluminagao (experiencia metacognitiva). Para os outros,

menos iluminados, 6  extremamente diffcil acreditar na proposigao de

uma verdade que transcenda a cognigao por via sensorial e racional.

“Pior: o m£todo de cognigao do sdbio iluminado 6   “anticienttfi-

co”. Ele intui, num Iampejo de metacognigao, uma lei, uma expres

sao da realidade nao-perceptiva ou verdade. Para ele, seu conhecimento 6   uma certeza, independentemente de comprovagao experi

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 191/411

mental por via sensorial e racional. Ele constata a operagao dessa lei

no jogo de causa e efeito que observa ao seu redor. Mas, para os

outros, sua proposigao 6   uma hipdtese, cujo maior valor estard na

 perfeigao da logica com que seja apresentada. E isto nao 6  cientifi-

camente aceitdvel; nao basta.“O maximo que o sabio pode fazer 6  propor o esforgo de consta-

tagao pessoal da plausibilidade da sua lei, por observagao sistemdti-

ca num esquema do tipo “se. . . entao” . Mas prevalecera sempre a

relagao  se-entao,  de modo que sua proposigao, para os outros, pode

rd sempre ser uma hipdtese.

“Numa tentativa de simplificagao, talvez se possa dizer que o

“ver-para-crer” deve ser necessariamente substitufdo pelo “crer-pa-

ra-ver” . Crendo, verdadeiramente, e seguindo o caminho apontado

 pelo sdbio, o crente conseguira ver. Enquanto insistir na recfproca,

 prolongard sua permanencia nas camaras tenebrosas.”

“Entao, nunca se poderd provar  que essa gradativa iluminagao do

ego, como o Tio a entende, seja verdadeira? Serd sempre possfvel

afirmar, em oposigao, a verdade da evolugao biologica da esp6cie

humana, do homo sapiens,  alcangando em certos indivfduos, de

tempos a tempos, expressao cada vez mais avangada? Quero dizer,essas expressoes individuals mais e mais avangadas poderao ser

sempre atribufdas a evolugao bioldgica da esp£cie, em oposigao a

id£ia de evolugao, por iluminagao, de egos particulares?”

“Provar?. . . Que €   provar? Demonstrar ao nfvel da percepgao

sensorial? Impossfvel: De que estamos falando? Como escolher um

ego e acompanhar, por observagao cientificamente controlada e re-

gistrada, sua gradativa iluminagao? Impossfvel!

“Que 6   provar? Montar um esquema ldgico perfeito e assim demonstrar,  por mera argumentagao? A nfvel puramente racional? Se

esse esquema for dedutivo, pelo menos na primeira premissa estard

 presente aquele “SE” , e sempre serd possfvel aceiti-lo ou rejeitd-lo.

Se ele for indutivo, sempre serd possfvel construir um outro esquema

ldgico, sobre os dados de observagao inicialmente apontados.

“A experiencia pessoal, mtima e intransferfvel, €   indispensdvel.

E, quando ela ocorre, dispensa provas.

“Nao; nao 6 possfvel provar.”“O que 6  entao que a gente pode pensar quanto d minha objegao

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 192/411

de evolugao biol(5gica da esp^cie versus  gradativa iluminagao do

ego.

“Tire o versus. Os dois fatos sao reais e paralelos. Nao sao mu-

tuamente exclusivos; sao  paralelos.  Certo indivfduo podera ser

muito bem dotado, biologicamente, gragas a evolugao da esp6cie;mas nao seri tambem dotado, necessariamente, do discemimento su

 perior prdprio de um ego iluminado. A inteligencia nao &a rainha!

“Posso por exemplo supor que Einstein nao foi, necessariamente,

o ffsico mais bem dotado de c&rebro da sua 6poca. Neste particular,

talvez outros ffsicos fossem mais inteligentes do que ele. Mas Eins

tein era o ego mais iluminado de todos os egos que entao se mani-

festavam no mundo como ffsicos. Nao conhego bem a vida de Eins

tein, mas, pelo pouco que ouvi ou li, acho muito importante observar

que ele  se abstrafa com freqiiencia e por longos perfodos. Talvez os

outros ffsicos da 6poca, em maioria, trabalhassem a nfvel extrema-

mente racional, desenvolvendo suas teses exclusivamente atravSs de

seu conhecimento da Ffsica e da Ldgica Matem&tica. E isto limitava

suas descobertas e os resultados que obtinham. Mesmo entre aqueles

que se abstrafam espontaneamente, como Einstein, nenhum era um

ego tao iluminado quanto ele.

“Acreditar que um homem seja extraordindrio, em qualquer cam

 po, tao-somente por ser extraordinariamente dotado do ponto de

vista biol<5gico, €  como acreditar que a excelencia dos pinc£is faga a

excelencia do pintor. Sabe o que 6  que voce 6, biologicamente? Um

 bom pincel. Mas se voce, o ego, nao for uma boa pintora, nao fara

 boa obra com o seu bom pincel.

“Portanto, aqueles dois fatos da sua contestagao sao paralelos;

nao opostos; paralelos. Nao no sentido de que sempre coincidam o bom pintor e o bom pincel, e sim de que ambas as evolugoes estao

ocorrendo ao mesmo tempo: a da esp6cie e a dos egos. Por que uma

tem de excluir a outra? Af esti uma falha de ldgica frequente, mes

mo entre grandes inteligencias da humanidade. Algu€m descobre

que certo princfpio 6  verdadeiro. Dai em diante, qualquer princfpio

que esteja em oposigao, pelo fato mesmo de ser proposto em oposi-

gao, seri considerado falso. “ Isso” 6 verdadeiro? Entao “ aquilo” ,

que 6  oposto, €  nao-verdadeiro.“E sabe qual €   uma de nossas grandes “doengas”? Chama-se

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 193/411

“exclusivite” . A hereditariedade 6  verdadeira? Entao o talento como

luz do ego em evolugao €  falso. Exclusivite aguda!”

Alba, sorrindo:

“Exclusivite... boa, essa.”

“E; mas hd muito mais do que uma piada, nisso af. Foi assim, no

seu jeito de dizer coisas s6rias brincando, que o Tio despertou minha

atengao para um fato sumamente importante para a nossa vida. Vou

tentar expressar esse fato s£ria e concisamente, ainda que simplifi-

cando.”

Assumindo de fato ar muito serio, compenetrado, Victor pensa

um pouco e prossegue:

“Somos, essencialmente, seres mentals.  Nossa vida, complexo

 jogo de agao e reagao, depende decisivamente do nosso modo de 

 pensar,  dos nossos critirios de pensamento. E sao muitas as falhas

em que persistimos neste particular.

“Conv6m ainda ressaltar, como o Tio encareceu, que esta nao 6  

uma questao academica, de interesse exclusivo e ao alcance exclusi-

vo de portadores de diploma, como fildsofos, psicdlogos, etc. Talvez

 por isso ele apresente o fato brincando, para levd-lo, ou tentar le-

va-lo ao interesse e ao alcance de pessoas nao especializadas, comonds.

“Somos inconscientes das falhas que o Tio aponta, mesmo porque

somos inconscientes do nosso prdprio modo de pensar, dos nossos

critirios de pensamento. Despertados para aquelas falhas, talvez se-

 jamos levados a algum grau de atengao ao nosso pensamento. Com

isto iremos flagrando a ocorrencia daquelas falhas e tendendo a cor-

rigi-las. E, na medida em que consigamos corrigi-las, acertaremos

mais, no jogo de agao e reagao, e viveremos melhor.“Naturalmente, nao podemos reduzir a isso todos  os problemas

humanos, mas, ceitamente, este 6 um dos nossos problemas e PO

DEMOS RESOLVE-LO!”

“Falou. Estou convencida. Agora, quais sao as tais falhas?”

O jovem, assumindo agora um ar jocoso:

“Bem, o Tio as chama de “doengas” . Jd consideramos uma delas,

a “exclusivite” . Outra 6 a “extremicite” . Vem do seguinte:

“Em toda situagao de pensamento sao possfveis duas posigoesextremas. Provavelmente porque para toda id6ia existe a id€ia opos-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 194/411

ta. Voce pensa uma iddia (por exemplo, branco) e sua oposta 6  evo-

cada (preto).  No ato espontaneo de pensar, porSm, a gente nunca

 busca a posigao de equilibrio das duas id6ias opostas; pelo contr£rio,

tende a se situar numa das posigoes extremas. O resultado €   que aagao ou reagao decorrente desse ato de pensar, quando resolve um

 problema imediato, cria outro ou outros; ou, ao inv£s de resolver o

 problema imediato, agrava-o ainda mais.”

“Entao, o que a gente tem a fazer €   estar atenta ao impulso de

“extremicite” e opor-lhe a decisao racional de se colocar no meio,

entre as duas posigoes extremas.”

“Mais ou menos isso. Mas h£ um detalhe importante a considerar.

 Nao se trata simplesmente de que a gente se coloque no meio, sem

 pender nem para um lado nem para o outro. E sim de que a gente

misture branco  e preto e obtenha cinza. No cinza estard a id6ia ca

 paz de levar a agao ou reagao razoavel  e mais adequada. Cinza nao

 pode existir sem branco nem sem preto; branco e preto estao neces-

sSria e simultaneamente presentes em cinza. Os aspectos positivos

das duas id6ias opostas estao presentes na id6ia razoavel.”

“E e claro que isto so se aplica a situagoes de agao ou reagaoque permitam reflexao. Onde haja paixao ou emogao violenta. . .”

“Sim, mas, por outro lado, 6  tambem possfvel que o exercicio de

a gente sempre se posicionar em cinza, nas situagoes de decisao que

 permitam reflexao, leve a uma esp£cie de programagao do nosso

computador intemo, para que ele nos faga agir ou reagir automati-

camente em cinza. Talvez a prdpria compreensao e compenetragao

 profunda deste princfpio ja desencadeie aquela programagao.

“Seja como for, o conhecimento desse esquema de pensamento

ajuda o indivfduo a pesquisar ou buscar a melhor decisao, em mo-

mentos de perplexidade.”

“Sd que a gente nao pode reduzir a vida a frios esquemas logicos

de pensamento.”

“Nao; nao pode. Mas, como eu  j i  propus, o exercfcio desses es

quemas ldgicos de pensamento leva Aquela programagao do compu

tador intemo. Entao, tudo se toma autom&tico. Neste particular, para esta aplicagao, nossa racionalidade 6   extremamente util. E pos

sfvel que os s6bios iluminados, automates em Deus, tenham todos

 passado por essa fase de “programagao” por via racional, at6   te-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 195/411

rem conseguido se automatizar no automatismo do Grande Automa

ta.

“Mais: podemos ainda supor que esse processo seja necessario e

esteja no ceme do mecanismo de evolugao do ego atrav6s de seu

instrumento bio ldgico. De certo modo, isto justificaria a racionalida-de do homem: caminho para a automatizagao em niveis cada vez

mais elevados do sempre-evolutivo Ser, o Grande Automata. E justi

ficaria tamb£m o evidente desenvolvimento dessa racionalidade que

se pode observar na histdria do homem. Assim, a reintegragao do

homem no automatismo do Grande Autdmato nao seria uma regres-

sao e, sim, um retomo com elevagdo,  j i que ele, o Grande Automa

to, 6 sempre-evolutivo, no dinamismo de sua natureza, de sua VI

DA. Por isso o Tio, que se diz Aprendiz de Feiticeiro, na realidade 6  um APRENDIZ DE AUTOMATO.”

“Puxa! Estou meio tonta, mas percebo que isso ai 6. . . 6 espeta-

cular! Sinto que pode esclarecer um monte de aspectos e situagoes

da vida. Chego mesmo a pensar que es ti corroborado em palavras de

Jesus:

*'Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! 

entrard no reino dos cSus,

mas aquele que FAZ A VONTADE DE MEU PAI. . .“E tambem:

" . . . nao sois vds os que falais, 

mas O ESPIRITO DE VOSSO PAI  

 E QUEM FALA EM VOS 

“E possfvel. Mas lembre-se de que isto €  um construto meu, ins-

 pirado nos ensinamentos do Tio, e pode estar errado; nunca esquega

que a verdade do universo e da vida nao pode ser reduzida a nossas

concepgoes racionais.”

“Voce €  um chato, sabia? Tinha de jogar esse gelo no meu entu

siasmo! E que i construto?”

“Tinha mesmo. Exatamente esse entusiasmo €   outra “doenga”

que o Tio aponta.

“Quanto a construto, ouvi esta palavra uma porgao de vezes, na

universidade, e gostei dela. Passei entao a usi-la, com o seguinte

significado: uma concepgao, ou um conjunto de conceitos, que pode

nao ter correspondencia na realidade -   pode nao ser a verdade de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 196/411

certo aspecto do Ser - mas que €  muito util para organizar o pensa

mento e propor uma hip6tese plausivel.”

“Gostei. Vou adotar; a palavra e o seu construto de evolugao do

ego por programagao via racional. Melhor do que o extremo de ra-

cionalismo e o de transcendentalismo.”“Nao adote. Pelo menos, nao antes de submeter essas id£ias ao

fogo do cadinho do seu prtfprio ego. O produto da reagao alquimica

entre elas e suas caracteristicas pessoais de racionalidade e capaci-

dade de metacognigao sera o que lhe convird. Pautando sua vida por

esse produto, voce estard vivendo a sua verdade e, nisto, dando a si

mesma oportunidade de maxima evolugao relativa. Se basear sua vi

da nas id£ias de outra pessoa, seja quem for, estard tentando viver a

verdade dessa outra pessoa e, portanto, uma situagao falsa, de nao-verdade, em relagao a voce mesma. Evidentemente, esta situagao

nao podera persistir nem a levard aquela maxima evolugao relativa.

Voce nunca poderd burlar a sua verdade.

“Portanto, nao adote, simplesmente. Antes, faga como diria o

Tio:

“f=lenha.Joguenafogueira,

“Paraquevoc&querlenha?“Paraguardar?Joguenafogueira.

“S6assimelapoderSlhedarluzecalor.

“Uma id6ia lhe foi proposta. Na questao de racionalismo (preto)

versus  transcendentalismo (branco), tire o versus e procure o cami-

nho-do-meio (cinza) na sua vida. Se sentir nostalgia do seu raciona

lismo anterior, chame o seu caminho-do-meio de neo-racionalismo

(afinal, um transcendentalista nostdlgico chamaria o dele de neo-

transcendentalismo). Ou use uma terceira palavra, como. . . co

mo. .. medialismo  (de medial , que significa, que estd no meio).  Se

 preferir, escolha outra palavra, que lhe seja mais simpdtica. Brinque

h.  vontade com as palavras. Nao permita que elas se cristalizem na

sua mente, ou seu pensamento se tomara condicionado, e condicio

namento e evolugao nao combinam.

“A16m disso, cuidado com essa id6ia de “evolugao do ego por

 programagao  via racional”. Nao se trata de um frio mecanismo deautoprogramagao racional por sugestao dirigida. E certo que somos

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 197/411

racionais (“homo sapiens”). Mas nao e menos certo nem menos im-

 portante que somos emocionais.  Pelo contr£rio, se estou entendendo

corretamente a mensagem fundamental do Tio, essa fungao emotio

nal do nosso ser talvez seja mais  importante. Porque €   fungao natu

ral ou imanente da metafase, manifestando-se atrav6s do ego inde- pendentemente da palavra ou linguagem verbal.

“Mas €   importante compreender que o adjetivo emotional,  aqui,

tem um significado especial, muito diffcil de esclarecer. Deixe eutentar explicar.

“Nao podemos conhecer intelectualmente o Ser Cdsmico, em sua

natureza. Mas podemos admitir que, seja ele o que for, tudo o que

existe 6 fungao da sua natureza. Nossa racionalidade seria manifes-

tagao de algum aspecto dessa fungao, atrav6s do c6rebro. Nossa “e-

mocionalidade” seria manifestagao de algum aspecto da mesma fun

gao, talvez atrav6s dos tais centros psiquicos a que os iogues e ou

tros se referem. E o “Y” do Tio. A diferenga essential estaria em

que, na racionalidade, haveria interferencia da nossa voliqdo (mani

festagao autoconsciente do ego). Portanto, seria emotional nossa

agao ou reagao “mais autom&tica” , manifestando mais diretamente

(sem interferencia volitiva) algum aspecto daquela fungao da natureza do Ser. Poderiamos chamar essa fungao de Vida do Ser.  Assim,

emogao seria manifestagao “mais direta” ou “mais autom&ica” da

Vida do Ser, em n6s. Sd que essa “emogao” 6  a tal “fungao-X” do

Tio e nao essa coisa de ddio, amor, etc.

“O que vem tomar tudo isto ainda mais complicado e sutil - sejia

certo ou errado — 6  que, conforme sinto, essa “emogao” estaria pre

sente na propria racionalidade, como fator predeterminante. Nao de

ve portanto ser entendida, exclusivamente, como aqueles tipos decomportamento que chamamos mais comumente de emocionais

(ciume, ddio, amor, etc.). A meu ver, tem de ser assim, porque o

homem nao deve ser capaz de racionalidade (ou de qualquer outra

coisa) como processo totalmente independente da Vida do Ser. Em

outras palavras, nao acredito no livre-arbitrio absoluto.

“E aquela fungao do Ser Cdsmico, ora manifestando-se como a

nossa razao, ora como a nossa emogao, deve ser o “estado-X” a que

o Tio se referiu, presente na razao e na emogao como “emogao” no

sentido que estou tentando expressar.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 198/411

“Voce disse complicado e sutil? Bota complicado e sutil nisso af!

Mas talvez possamos encontrar apoio para o seu construto no exem-

 plo dos grandes iluminados, como Jesus e Gautama. Eles nao foram

frios racionalistas. Basta Iembrar que se demonstraram motivados

 por um profundo e universal amor.”

“Pode ser. De qualquer forma, persiste o fato de que EXISTI-

MOS COMO SOMOS. E somos racionais! E somos no Ser C6smico

e do Ser Cdsmico! Entao, a racionalidade do Ser, em n<5s, 6  fungao

necessdria de sua natureza (ou nao existiria). Mas nao €  fungao uni-

ca nem maior do Ser C6smico, porque somos, evidentemente, mani

festagao  parcial   do Ser, limitada pelas potencialidades restritas donosso organismo.

“E pelo menos admissivel, portanto, que uma outra fungao do Ser

envolva isso que conhecemos ou experienciamos como o aspecto

emocional  do nosso ego. Neste caso, a evolugao do ego, nesse pro-

cesso de gradativa iluminagao, deve incluir a nossa racionalidade

mas transcende-la, tendo como outro fator o jogo emocional  da ex

 periencia que chamamos de vida. Por conseguinte, devemos cultivar

e aperfeigoar nossa racionalidade e, paralelamente, buscar o conhe

cimento, a experiencia de nossa natureza primeira, no Ser, por viaemocional.  Mesmo que nao o fagamos deliberadamente (ou cons-

cientemente), estou convencido de que E ISTO QUE ESTA

ACONTECENDO com todo mundo (com todos os egos). Entao, o

que distingue o sdbio (ego iluminado) do nao-sdbio (ego primitivo) €  

que o primeiro jd alcangou um elevado grau de CONSCIENCIA

desse processo, de modo que o acelera por deliberagoes automatica-

mente dirigidas no sentido correto.”

Alba, intenompendo enfim a longa tirada de Victor:

“Se o que voce diz €  certo, entao a clausura, ou qualquer forma

de isolamento, 6  um erro. Ningu6m evoluird de fato sem se expor ds

experiencias da vida e ao jogo emocional que elas encerram.”

“Sim; mas nao esquega que o isolamento pode ser uma experien

cia necessdria a evolugao do ego. E certo que essa evolugao se faz

atrav6s das experiencias da vida. Contra qualquer argumento, per

siste o FATO de que EXISTIMOS COMO SOMOS, no mundo, ex- perienciando a vida por forga das leis naturais do Ser de que somos

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 199/411

manifestagao partial. Mas, por que o isolamento nao hi de ser uma

dessas experiencias?

“Afmal, que 6   esse isolamento? O indivfduo reduz ao mfnimo

 possfvel sua participagao no jogo de agao e reagao da vida no mun

do, no que tange a presenga de outras pessoas. Mas h i o jogo de

agao e reagao de sua prdpria vida no isolamento, com seus compo

nentes racionais e emocionais. Se a decisao de se isolar for tomada

 por via “pura e ftiamente racional” (por exemplo em fungao da ideia

de alcangar a chamada espiritualidade pela negagao ou rejeigao do

mundo, ou evitando as experiencias da vida), €  possfvel que as pn5-

 prias experiencias emocionais do isolamento levem o individuo a se

aperceber do seu erro.

“A16m disso, nao esquega sua escala de ego-evolugao. O sibio

iluminado conhece o papel e a necessidade das experiencias da vida

na evolugao. Mas ele j i evoluiu; j i est i no topo da escala. Por um

lado, j i nao labora no erro de dicotomizar o Ser C6smico em reino

divino ou espiritual e reino nao-divino ou material (o mundo), e a

vida em vida espiritual e vida terrena. Portanto, pode viver a vonta-

de no mundo e entre as pessoas, sem se sentir menos divino ou espi

ritual por isso. Por outro lado, j i nao precisa das experiencias de vida que n<5s outros estamos vivendo; por isso nao se interessa pela

vida como a vivemos nem valoriza as coisas e experiencias que n6s

valorizamos. Assim, 6 natural que se isole, para ser e deixar a gente

ser, viver e deixar a gente viver.

“Na verdade, creio que ele nao tem motivo para continuar pre

sente no nosso jogo de relatividades e aparencias, exceto o de nos

ajudar e servir, apontando algum caminho para nossa mais segura

ascensao na escala. Conforme a natureza desse caminho que decidaapontar, poderi conviver ou isolar-se. Conforme a missao que se

sinta compelido a cumprir, poderi ter de conviver para agir, ou iso

lar-se para meditar e. . . escrever livros, por exemplo. Sei li o que

mais poderi um sibio iluminado fazer de bom para a humanidade em

seu isolamento. Apenas me parece que, neste caso, o isolamento nao

6 um erro; porque nao €  uma decisao racional e, sim, parte do auto

matismo do sibio no Grande Automata.”

Victor pira entao de falar. Alba, entao, ap6s um prolongado si

lencio:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 200/411

“T£ bom. Vou pensar nisso tudo. Mas, e o entusiasmo? E a pr<5-xima “doenga” que voce vai explicar?”

“Nao 6  mais necess&rio explicar. A idtia bisica, voce j i compre-

endeu. Agora, basta que eu cite alguns dos termos gaiatos com que o

Tio se refere as tais falhas de crit£rio de pensamento em nossas

agoes e reagoes na vida. As explicagoes, voce as construiri, se achar

necessirio.”

“Por exemplo.. . . ”

‘ Impressionite. ''

“Hum. . . a gente se impressiona, com a inteligencia ou o titulo

de algu£m, a forga de sua ldgica, de seu magnetismo, o carter sen-

sacional de algum fenomeno, etc., e . . . assimila, toma por verdadeiro o que ouviu, leu, viu, conforme o caso, sem expor isso a luz do

discemimento superior do ego na contemplagao.”

“Isto mesmo. E impressionante como as pessoas assimilam idtiaserroneas devido a crises de “impressionite”. O pior €  que uma id6ia

err6nea assim assimilada toma-se um fato emotional profundamente

arraigado, com freqiiencia dificflimo de erradicar.”

“E. E o prejufzo que isso traz a vida das pessoas nao 6  pequeno.

A maioria das pessoas nao se d i conta de que certos tipos de pro

 blema se repetem na sua vida. Estao sempre atribuindo esses pro-

 blemas a causas extemas, porque nao percebem que a repetigao 6  

fato que aponta para elas mesmas. Pelo menos em parte, a causa de

ve estar nelas mesmas, e essa parte elas devem se esforgar para eli-

minar (ningu6m pode ser mais interessado do que elas). Agora vejo,

claramente, que falhas de 16gica e de crit£rio de pensamento sao fa-

tores determinantes de certos problemas que a gente tem na vida.Importante pensar nisto.”

“Se €\  Felizmente jd me compenetrei disto. Agora estou traba-

lhando para corrigir minha programagao, e os bons e uteis resultados

 j i estao comegando a se fazer sentir.”

“Voc6 se lembra de outros desses termos gaiatos do Tio?”

“Nao sei. . . ele usou tantos!. . . Ah! Tem a “precipitite” , a

“fantasticite”, a . .

“Gozado. . . esses termos sao tao sugestivos que quase dispensam

explicagao.”

“Pois 6. Se bem que nao se enquadram todos nessa categoria de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 201/411

falhas de logica e de criterio de pensamento. O Tio acabou esten-

dendo a id6ia b&sica a tendencias em geral. Talvez seja este o caso

da “precipitite” , que deve ser a tendencia a tirar conclusoes apres-

sadas (provavelmente atrav6s de “exclusivite” , “extremicite” , etc.).

Mas, se a pessoa estiver atenta as falhas de logica e de crit6rio de pensamento, €  possfvel que um reI6 intemo passe a dar um sinal de

alerta, evitando a precipitagao e dando ensejo a que a pessoa refor-

mule o seu pensamento.”

Alba interrompe, apos ter ficado pensativa por alguns segundos:

“Sabe? Apesar da sua explicagao incluindo nossas emogoes, de

repente estou achando tudo isso tao. .. sei li . .  . tao mecanico! Seri

que 6  este mesmo o caminho para a nossa evolugao pela iluminagao

do ego? Ou que essa evolugao esti mesmo acontecendo? Ou, de um ponto de vista mais restrito e pritico, seri que realmente podemos

alcangar um comportamento perfeito ante as situagoes da vida atra-

v£s desse trabalho de autoprogramagao por via racional e emotional,deliberadamente?”

“Mecanico?..

“Pronto. L i vem ele: que 4 mecanico?**

Victor, sorrindo:

“Se voce prefere, eu nao fago a pergunta. Mas ataco o seu pro blema a partir do significado da palavra principal que voce usou:

mecanico.  Portanto, di na mesma.✓

“E exatamente “mecanicos” que somos, natural e inevitavelmen-

te. S6 que eu prefiro dizer, automdticos. Talvez outros prefiram di

zer, ciberneticos.

“Somos automiticos em nossos hibitos. Que 6   hibito? Voce re-

 pete, repete, repete certa relagao especffica de causa e efeito, num

esquema do tipo “se. . . entao” , que acaba programando o computa-dor intemo do seu sistema de comando de agoes e reagoes. E fica

automitico. A causa? Entao o efeito. Ora, que porcentagem de nos

sas agoes e reagoes 6   habitual? Nao lhe posso dar o mimero, mas

nao 6  pequena.

“Voce escorrega de repente e vai levar uma queda temvel, de

trigicas conseqiiencias. Faz um malabarismo espetacular, com incrf-

veis movimentos de bragos e pemas, torgoes e giros do corpo, e cai

 protegendo a cabega. Se a cabega batesse. - . tchau pra voce! Se a

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 202/411

cena 6   filmada e depois projetada em camara lenta, voce fica bobade ver o que “ fez” , principalmente porque tem consciencia de que

“nao fez” . A prccisao dos movimentos 6  perfeita e espantosa. Difi-

cilmente um atleta bem treinado conseguiria reproduzir sua acroba-

cia. E tudo automatico. Somos automaticos em nossas agoes refle-xas. Quantas agoes e reagoes da nossa vida sao desse tipo, basica-

mente? Nao lhe posso dar o numero, mas nao sao poucas.

" “Voce estd sentada. De repente decide levantar-se e andar. E vo

ce se levanta e anda. Automaticamente. Somos automaticos em nos

sas agoes volunt£rias. Quantas coisas assim fazemos por dia?”

“J6 sei: nao lhe posso dar o numero, mas nao sao poucas.”

“Certo. Em que voc6  poderia achar que nao 4  automatica? No

exercicio de sua vontade? Em suas decisoes? Ilusao. Voce decidiu?Voce  escolheu? Entao fo i  automatico. Voce  nao podia ter decidido

de outro modo. Voce  nao podia ter feito outra escolha. A ideia de

decisao e a de escolha, no exercicio da vontade, lhe sugerem agao

ou reagao independente, nao-autom3tica. Mas 6   s6  sugestao mesmo.

Impressao sua. Ilusao. Sua decisao 6  segunda. Sua escolha 6  segun-

da. E o que 6  primeiro 6  automatico. Somos automaticos no exerci

cio de nossa vontade.

“Em que mais voce poderia achar que nao 4 automatica? Em seu

raciocmio? Em seu pensamento dirigido? Que 6  esse raciocfnio, esse

 pensamento dirigido? VocS decide pensar. Seu pensamento comega

automaticamente. E vem associagoes mil e seu pensamento fica feito

macaco doido, saltando de galho em galho. Ai voce decide racioci-

nar. E pega o trem de ideias e o coloca num trilho; e por sucessivos

atos volitivos o mant6m nesse trilho.“Sabe o que voce 6? Um operador de trem semi-automatico. O

trem, propriamente, 6  automatico. Voce s<5 aperta o botao de partida

e o botao do freio. Voce decidiu apertar?  Foi  automatico. Voce nao

 podia ter decidido nao apertar. Voce  escolheu os vagoes para a sua

composigao?  Foi  automatico. Voce  nao podia ter escolhido outros

vagoes. Somos automaticos no processo de nossos raciocmios.

“Portanto, nao se trata de tentar tomar o processo da vida meca-

nico. Ele jd 4 mecanico! S6 que eu prefiro cham6-lo de automdtico e

o que proponho 6   que voce procure conhecer cada vez mais e melhor esse automatismo, para faze-lo funcionar a sua conveniencia.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 203/411

“Do contrdrio, esse automatismo, em voce, serd como nos maca

cos. E isso que voce quer ser? Uma macaca? E verdade que seria

uma linda macaca; m as.. . macaca.”

Ambos soniem e Victor prossegue, aproveitando entusiasmado o

embalo autom&tico:

Um homem viu um macaco saltar de um galho para outro. Perguntou:

“macaco, porquevoc§ saltou daquelegalhoparaaqueleoutro”?Afomaca

coatirouumafrutanacabegadele. Eele,quen&oentendeunada,foiembo-

ra resmungando: “macaco burroegrosseiro;eu pergunteiporque  eletinha

saltadodeumgalhoparaoutro,eelemeatirouaquelafrutanacabega;oque

6quetemumacoisaavercomaoutra”?

“Muito interessante esse seu construto af, mas tem dois grilos.

Primeiro: se tudo 6  assim tao automatico, onde fica essa de Traba 

lhar   para evoluir? Segundo: e a minha dignidade humana?”

O jovem sorri, meio cinicamente, e contra-ataca:

“Vou comegar pelo segundo grilo. Depois eu mato o outro.

“Sabe o que vale a sua dignidade humana? Uma “frutada” na ca-

 bega! E como €   na cabega, quem sabe mata o grilo e acaba com a tal

dignidade; af voce fica humana; s<5 humana e humanamente automS-

tica. O macaco €  “macacamente” automatico. Voce 6  mais: 6  huma

namente automdtica.”

Victor para de falar e fica olhando com ar de esperteza para a

namorada. Ela, entao:

“Que 6? Pensa que s<5 voce 6  perspicaz? Nao vou Ihe perguntar,

“e o primeiro grilo?” , nao senhor!”

Victor sorri, levanta-se e se espreguiga. Alba se espreguiga tam-

 b6m, na poltrona. Ele nao resiste:

“Viu? Foi automdtico!”

“Ah! V i. . .  pentear macacos! E olhe, esta “macaca” estd com

fome. Vamos sair pra jantar.”

Ele, alegremente:

“Td bom. Vou ME pentear e j& volto.”

Sai para o banheiro, rindo e empurrado pelo riso da namorada.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 204/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 205/411

E i s e n t a o q u e , n o a u t o m a t i s m o d o E s p f r i t o ,

v o l t a m o s a n o s a s s i m i l a r b j o v e m s o m b r a

e s e u m e c a n i s m o i n t e r n o d e f u n c i o n a m e n t o - s u a m e n t e . . .

Victor, sorrindo:

“O Tio e seus tftulos. Qual seri a dele, desta vez? Melhor ler pra

ver.”

Contempiagao. Reflexao. Contempiagao. . . reflexao. . . contem

 piagao. . . reflexao.. . o tema, na cena visualizada num lampejo:

C6u enfarruscado, Fascinantes e assustadoras descargas elStricas na

atmosfera convulsa.OestrfipitoapavorantedotrovSoviolento.Maisdescar

gaselStricas. Asutilearrepiantesensagaodeumidadenoareoventoforte.

RedobradosestrSpitos.Descargas.. . estrondos.. . maisdescargas... no-

vosestrondos...eoc6udesabaemfortissimoaguaceiro!

Encharcado, o homem consegue enfim alcangaroterragodesuacasa.

Esfreganervosamenteosp£snocapacho,ofeganteeagitado.Entraemcasa.

"Nossa! Meu bem, vocdes ti encharcado! VS logo se enxugaretrocaressaroupa!"

"Maldita chuva! Logo hoje queeu queria irao jogo. . . decisSodocam-

peonato!"

Enquantoomaridoseafasta,aborrecido,amulherolhaatrav^sdajanela

envidragada e contempla a chuva que cai IS fora. "Abengoada chuva” -

pensa. “Essa faltad’Sgua queparecia nSo termais fim. . . Minhasplantas

devemestaradorando!"

Voltaomarido."AindaestSchovendomuito?"

“Bemmaisfraco,masparecequevaidurarorestodanoite.”

“Porcariadechuva!”

Amulher, pensando: "Pois euestoumuitofelizcomesta benditachuva,

pelasminhasplantas.Eelastamb6mdevemestarcontentes.. . eusintoque

estao.”

Bom. . . mau. Bem. . . mal. Um conceito na mente do homem.

Gerado por sua atitude e influenciado por sua experiencia. Suscitado

 pela vida que ele tenta compreender e a ela aplicado. Certo? Vida

humana felicitante, na Vida do Ser Total. Errado? Vida humana in-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 206/411

felicitante, na Vida do Ser Total. Certo? A verdade do homem coin-

cidindo com a verdade do Ser Total; o homem a caminho da bem-

aventuranga, na felicidade de ser conscientemente no Ser Total. Er-

rado? A verdade do homem conflitando com a verdade do Ser Total;

o homem perdido no labirinto por ele mesmo constnudo; sofrendoinfelicidade temporaria, na inconsciencia do seu erro.

 Abengoada chuva maldita.. .Homem. O ente mental que usa o organismo. Estrutura psicofisica

que age e reage. Aqui uma agao que tenta penetrar? Aqui mesmo

uma reagao que cede e se deixa penetrar, ou que se opoe, se fecha e

gera tensao. Ali uma agao que tenta acrescentar? Ali mesmo uma

reagao que aceita e assimila, ou que rejeita e gera tensao. A forga

que tende a movimentar? A sujeigao e o movimento, ou a resistencia

e a tensao. O influxo harmonizador? A reestruturagao no jubilo da

harmonia, ou a permanencia na frieza da insensibilidade. A agao in

terna que tende a expandir? O extase na expansao, ou a reagao que

 procura contrair ou resiste h expansao, por medo de existir num es

tado desconhecido. A luz que pode aclarar? A reestruturagao que

deixa transluzir, na sdbia coragem de ver para entender, ou que im-

 poe um anteparo grosseiro, na insensatez de temer e na loucura de

escolher a escravizadora obscuridade.

Favoravel? Bom. Desfavordvel? Mau. Construtivo? Bom. Destni-

tivo? Mau. Prazeroso? Bom. Doloroso? Mau. Bom.. . mau. Bem. ..

mal.

Deus, um conceito na mente do homem. O Ser Supremo. Todo-

 poderoso, onisciente e onipresente. Perfeito. O Pai. Amoroso, bom,

 justo, misericordioso. Criador e dirigente. O Princfpio do Bem. Ge-

rador das boas coisas e dos bons eventos. Mas. . . e as mds coisas eos maus eventos? Pobre homem! Confuso, necessita agora de um

outro conceito, que nao anule o primeiro —tao caro e psicologica-

mente necessdrio - mas venha complement3-lo, na anestesia da 16gi-

ca. O Princfpio do Mal! Gerador das m&s coisas e dos maus eventos.

Logico, pois. O que 6   bom 6   causado pelo Princfpio supremo do

Bem; o que 6 mau 6  causado por um poderoso Princfpio do Mal.

Ping. . . pong. E a bola €  o homem, no jogo que ele mesmo in-

ventou. Ping. . . pong. . . ping. . . pong. . . ping. . . pong. . . bolafora. Um ganhou: bom. O outro perdeu: mau. Na mente dos jogado-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 207/411

res, uma conotagao de bem e mal. Na realidade do Ser Total, um jo

go de leis naturais. P in g.. . pong.. . p in g .. . pong.. . bola fora. S<5.

E assim nas realidades sutis da Vida do Ser Total. E nos fatos maio-

res da pr<Spria vida humana.

Se a verdade 6   sempre logica, nem sempre a 16gica 6  verdadeira.Boas coisas. . . mds coisas; bons eventos. . . maus eventos - a hu

mana perspectiva; a logica. Coisas, eventos: fenomenos; realidades

determinadas pelas leis da natureza do Ser Total - a perspectiva do

Ser Total; a verdade, na manifestagao pura da natureza do Ser Total;

sem adjetivos. O conflito na concepgao ontoldgica deve ser resolvi-

do pela modificagao ou substituigao dos conceitos —por mais cora-

gem que isto requeira. O conceito humano determinou um ponto de

vista. L<5gico, talvez. M as.. . verdadeiro? A realidade do Ser Total €  

o ponto de vista verdadeiro - e logico. Nosso empenho deve ser o

de nos colocarmos no ponto de vista do Ser Total e Natural e Primeiro e Unico e Puro. Antes que o consigamos, haverd “choro e

ranger de dentes” , porque persistiremos em nossa visao de vesgos,

enxergando dois onde existe somente um.Eis a perspectiva que devemos tentar alcangar: o ser partial no

Ser “Total” ; nossa vida na vida do Ser “Total” . Tudo o mais €  complicagao e dor. Fora desta perspectiva, a escravidao na insub-

missao ks leis da natureza do Ser “Total” ; nela, a gloriosa liberdade

na submissao a essas leis. Que preferir? A escravidao na insubmis-

sao? Ou a liberdade na submissao?

Ping.. . pong. Deus tamb6m joga?

Ping. . . pong. . . ping. . . pong. . . e a bola vai cair Id fora, na

chuva forte.

 Abengoada chuva maldita!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 208/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 209/411

E c o n t i n u a m o s a s s i m i l a d o s d j o v e m s o m b r a ,

q u e n o a u t o m a t i s m o d o s e u f u n c i o n a m e n t o c o m e g a a p e n s a r a r e f l e x a o d a o u t r a ,

d a q u e q u a s e L u z j 5 6 .

“Bem e mal. E. . . esta o Tio escreveu explicitando mais o seu

 pensamento. Seri uma questao de estado de humor? Ou seri que, em

certos momentos, ele prefere dizer mais e deixar menos a interpreta-

gao? As duas coisas, talvez? Eu, prefiro ser explfcito. Pelo menosninguem pode por na minha boca alguma coisa que eu nao disse.

“Aliis, o que 6   que eu estou estranhando? Afinal, o Tio quase

sempre acaba explicitando mesmo, embora naquele seu jeito de ten-

tar tambem  suscitar,  como ele proprio diz. Neste caso, parece ter

 predominado a intengao de dizer, sobre a de suscitar. Sei la . . .

“Bem e mal. H i quantos seculos, milenios, temos estado. . . jo-

gando esse ping-pong? Durante todo esse tempo, de quantos modos

temos cultivado este tema? Livros? Quantos j i escrevemos? Dra

mas? Quantos j i encenamos? Religioes? Quantas j i fundamos? Filo

sofias? Quantas j i desenvolvemos? Tudo baseado no conflito entre o

“princfpio do bem” e o “princfpio do mal” ; na luta das “formas da

luz” contra as “forgas das trevas” .

“Metiforas, alegorias, analogias. Quando vamos entende-las tao-

somente no que sao? Quando vamos parar de viver  nossas proprias

metiforas, alegorias e analogias? Vida 6  metifora? Vida 6  alegoria?Vida €   analogia? Quando vamos parar de. . .  procurar “prone- 

quios”?! E isto!”

Victor se lerabra de que um dia, numa conversa, o Tio ficara pen-

sativo e depois dissera:

“Um homemestava procurando. Outro homem seaproximou e pergun

tou: o que 6queosenhore s ti procurando?Oprimeirohomem respondeu:

pronSquios; tenhodedicadominhavidaaprocurarprondquios;sacrifiqueitu

do;sacrifiqueiminhafelicidadeparatentarencontri-los;agora,j i estouvelho

edoente,mascontinuoprocurando.”

Neste ponto L6gus interromperabruscamenteahistdriaese recusaraa

atenderopedidodeVictorparaqueacompletasse.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 210/411

“Mas,quesdoproniquios?"-  Perguntaraentdoojovem.

“Esquega.” - Respondera L6gus, demodo tao decisivo que Victor ndo

ousarainsistir.

“E isto, sim. E como fiquei intrigado e procurei a palavra prone- quio  em tudo quanto foi diciondrio. . . Ela nao existe. E af estd a

mensagem: NAO EXISTE!

“Aquele homem inventara um nao-sei-que e o chamara de “pro-

nequio”; depois inventara outros, como as iddias de absoluto  e de

 perfeigao.  Tao importantes Ihe haviam parecido os tais “pron6-

quios” , que decidira dedicar sua vida a procura-Ios. E tao intensa

mente se devotara a sua busca que ate esquecera o que seriam esses

“pronequios” . Mas nao sabia fazer outra; nunca aprendera outracoisa; tomara-se uma obsessao, viver para procurar “pronequios”;a tal ponto que ele se esquecera de viver;  tao-somente viver e ser

feliz em viver. Vivera para procurar e nao procurara viver.

“Hd quantos seculos inventamos os nossos “pronequios”? Ha

quantos milenios? Jd nem nos questionamos quanto ao que possam

eles ser, porque tomou-se uma obsessao procurd-los. Vivemos para

 procurar e esquecemos de procurar viver. Sacrificamos nossa felici

dade aos tais “pronequios” , que nem sequer existem!“Bem e mal. . . Que 6  bem? Tudo aquilo que 6  favordvel, cons-

trutivo, prazeroso? Mas. . . Favordvel a quem? Ao homem. Constru-

tivo para quem? Para o homem. Prazeroso a quem? Ao homem. Af

esta: AO HOMEM! PARA O HOMEM!”

Victor susta o processo de reflexao. Sua mente se esvazia por um

 breve instante; depois, nela comega a se desenrolar uma cena no es-

tilo freqiientemente usado por L6gus:

Um sdbio,absortoemreflexao.Ummogoaproxima-seeinsisteemrece-

beratengdo.Osdbioafinaldisp6e-seaouvi-lo.

“Bem, hdmuitos anos vivo preocupado com umaquestdo fundamental.

Ultimamente, tenho at6 sofrido insdnia emeu trabalho jd ndo rende; estou

mesmo amea?adode perderoemprego, Precisoobter uma resposta para

essaquestao,ouminhavidaficardcadavezmaisinfeliz.

“Aquestdo6:existemrealmenteobemeomal?”

0 sdbio:“Quemperguntaisso?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 211/411

Omogo,espantado:

“Hum?!Ora,eu,seu discfpulo fazumm§semeio!Etodoestetempove-

nhotentando falarcomosenhor.Masosenhors6olhapramim,sorriefaz

umgestoautoritdrioquemeimpededefalar.Porisso,hojeeudecidifalarde

qualquer jeito, e insisto na minha questao: existem realmente o bem e omal?”

Osdbio:

“Quemperguntaisso?"

Omogo quase se exaspera; massoltaumforte suspiroecontdmaex-

plosdo.Pensaumpouco.Depois,numtomquerefleteclaramenteseuesfor-

50deautocontengdo,voltadcarga:

“Estdbem.Sejacomo0senhorprefere.Voutentarjogar0seujogo.Pos

sondotersabedoria,massou inteligente.Vejamosentao:“Sua pergunta, como reagao dminha, em lugarde uma resposta, pode

significarousugerirquendoexistemrealmente0bemeomal.Porque,quem

pergunta60homem (naoeu,0indivfduo,0 discfpulo),eanaturezanaotem

nadaavercomasquestoesqueeu,0homem,possainventaremfungdodo

meuegoc§ntricoouantropocSntricorelacionamentocomela.

“ Poroutrolado,pordm (eaf6queeu ficoconfuso),entdoadornaodum

mal?Responda:adordumbem?”

O sdbio, num gesto rdpido e inopinado como um reldmpago, aplicaum

violento pontapd bemno meio dacaneladomogo. Este, solta um gritode

dor,curva-se esep6eaesfregarapernaatingida.Quando levantaacabe-

ga,osolhosarregaladosdeespanto,vdque0sdbiosefora.

 Nosso jovem retoma entao ao estado objetivo normal de cons

ciencia. Percebe que estd com a pema direita encolhida, passando a

mao na canela. Sorri. Depois, volta a refletir:

“E. . . bem que eu mereci aquela “bicuda” . . . Se bem  e tudo

aquilo que pode ser favordvel, construtivo e prazeroso, entao a dor pode ser considerada um bem. Afinal, que 6   dor? Sensagao. Certo

tipo de sensagao. Que tipo de sensagao? O que nos leva a uma rea

gao de autodefesa, de autoprotegao. Portanto, dor 6  sensagao favo-

rdvel, construtiva e . . . opa!. . . entrou areia: prazerosa?”

Victor para um instante de pensar e se poe mentalmente passivo e

receptivo. Logo retoma sua reflexao, apds sentir, num lampejo, a

safda do impasse:

“Nao tem problema. Quem propos os adjetivos? O Tio; nao a

natureza. Do ponto de vista da natureza, na perspectiva natural, dor 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 212/411

e sensagao; s6 . Do ponto de vista humano, na humana perspectiva, pode e deve ser considerada favor&vel e construtiva: um sinal de

aJerta, sem o qual nao podenamos subsistir. Prazerosa? Nao poderia

ser. Se causasse prazer, nao cumpriria a fungao para a qual eviden-

temente existe. E justamente isto 6  maravilhoso: dor e prazer, em es-sencia, sao semelhantemente sensagdes; mas prazer e incentivo e dor

€   advertencia. “Previsao” da natureza? “Plano” da natureza? Con-

cretizagao de “propdsito” construtivo da natureza? Nao.  Natureza 

da natureza! Lei de persistencia da natureza, no mecanismo automa-

tico de dor e reagao de autodefesa; assim como no mecanismo auto-

m£tico de prazer e agao de procure ou reagao de reforgo.

“Prazerosa, a dor? Nao; necessariamente nao. Estranho que o Tio

tenha usado este adjetivo para o bem, j A que isto exclui a possibili-

dade de ser a dor considerada um bem.

“Espere. . . o que 6  que eu estou dizendo? O Tio justamente con-

trastou  prazeroso,  como bem, com doloroso,  como mal, na concep-

gao geral dos homens (na humana perspectiva). Nenhuma insinuagao

de que a dor devesse ser tida como prazerosa e, o prazer, como do

loroso. Ele gosta de falar por paradoxos, mas isso nao seria um pa-

radoxo; seria doidice mesmo. Qual €  a dele, entao?. ..“A dele? Nao; a minha. Fui eu que embrulhei tudo. Comecei pen

sando nos adjetivos do Tio, favoravel   e construtiva,  para mostrar

que a dor pode ser considerada um bem, embora a tenhamos sempre,

 psicologicamente, como mal. Depois me dei conta do terceiro adjeti

vo, prazerosa, e af armei a confusao. E claro que a dor €  dolorosa eo prazer e prazeroso.

“O problema, portanto, est£ justamente nos adjetivos. Precisamos

deles em nossa vida de relatividades. Nao podemos deixar de classi-ficar e qualificar nossas sensagoes. O importante, por 6m, 6  nao con-

fundirmos as coisas, transferindo nossa classificagao e nossa qualifi-

cagao, antropocentricamente, para a natureza; isto 6, fazendo corres-

 ponder a nossas sensagoes, adjetivadas como boas e mis, princfpios 

naturais de bem e mal.

“A dor pode ser considerada m i,  pelo fato mesmo de que doi; a

ela associamos, psicologicamente, a iddia de  sojrimento.  Por outro

lado, pode ser considerada boa, no papel indispens£vel que desem- penha em nossa sobrevivencia. Entao, deve ser mesmo possfvel, co

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 213/411

mo o Tio me falou uma vez, dissociar psicologicamente  a sensagao

de dor da id£ia de sofrimento.”Victor para de pensar e evoca de sua memdria a ligao do Tio:

“Enquanto dor for dor, para voc§, haverS sofrimento. Quando n§o formaisdor,haverSsensagSomaisoumenossuportdvel,naconsci&nciailumi-

nadapelacompreensao.

“E voc§ poderSmesmo aprendera transcenderadoren§osentirasen-

sag&o.Como?Eulhedigo:

“Vemadore voc§ relaxa. Istomesmo: relaxa.OcontrSriodoquevoc§

tendeafazer: ficartensoeagarrarfortementealgumacoisa.Nao.VocfeRE

LAXA...Depois,dissolvesuaconscifincianoespago&suavolta.Eficapai-

rando no espago, forado seu centro de sensagoes.Relaxadoedissolvido

noespago."

“E. . . deve ter sido assim que aqueie monge. . . (onde foi mes

mo? nao me lembro). . . ateou fogo ao seu prdprio corpo e nem pis-

cou os olhos enquanto as chamas o consumiam. O mundo recebeu a

notfcia estarrecido. Um homem, semelhante a todos os outros ho

mens, nem piscou os olhos enquanto as chamas consumiam o seu

corpo!“Enfim, mesmo que nao cheguemos a tanto, a tao alto dominio da

sensagao de dor, certamente poderemos todos nos beneficiar da mu-

danga na psicologia da dor que o Tio recomenda. Na medida em que

dissociemos a sensagao de dor da id£ia de sofrimento, nessa medida

seremos fortes para a dor.“Quanto ao controle da prdpria sensagao, 6  claro que nao vamos

 provocar dor em nds mesmos, deliberadamente, s<5 pra treinar. Mas

 poderemos treinar, sim, em momentos de lazer e mesmo sem dor, oque o Tio recomenda: relaxar e dissolver a consciSncia no espago,

fora do centro organico de sensagoes. Ou podemos treinar pra valer

na cadeira do dentista.”Victor interrompe sua reflexao. Levanta-se, espreguiga-se, e vai

at£ a janela.A cidade, \£  em baixo e distante. Pr^dios; muitos prddios. Inume-

ros apartamentos. Gente; muita gente. O drama da vida humana.

Bem. . . mal. Prazer.. . dor. A reflexao recomega:“Dor. . . H6 a dor ffsica e a dor psicoldgica. Em essencia, por 6m,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 214/411

a mesma questao, o mesmo problema, e a mesma solugao. A mesma

depend£ncia de COMPREENSAO e ATITUDE MENTAL. O mes

mo caminho para a paz: prazer. . . branco; dor. . . preto; sensagao

(controlada). . . cinza. O mesmo treinamento: relaxagao e dissolugao

da consciencia no espago.“E a conotagao de bem e mal nos atos humanos? Moral.. . que €1 

 Necessidade e conveniSncia nossa, da humana sociedade, no jogo

adequado de motivagao, circunstancia e conseqiiincia.  E qual 6   o

crit&io bdsico? Respeito. Lembra Jesus:

‘‘Tudo quanto, pois,

quereis que os homens vos fagam, 

assim fazei-o vds a eles; 

 porque esta 4 a le i,.  . .*‘E. . . um programa, essa lei; o programa de ouro que devemos

implantar em nosso computador intemo. Uma palavra de ouro, nessa

Regra de Ouro: RESPEITO! No respeito, a reta motivagao, na reta

circunstancia e para a reta consequencia.”

Victor volta a sentar-se e faz uma breve pausa. Depois, retoma

sua reflexao, agora mais intelectualmente dirigida.

“Bem, creio que consegui captar o pensamento do Tio.

"Bom. .  . mau. Bem. .  . mal. Um conceito na mente do homem. 

“Homem. O ente mental que usa o organismo. Estrutura psicoft-  sica que age e reage. .  .

“Af est£! O automatismo do homem no Grande Automato! Meu

construto na essencia do construto do Tio!”

O jovem se levanta bruscamente, excitado com a constatagao da

coincidencia fundamental de sua id£ia com a de L<5gus. Estende os

 bragos em diregao h janela e exclama dramaticamente.

' ‘Estrutura psicoflsica que age e reage. .  .

“O mundo acaba de perder mais um buscador de pronequios!”

B e m . . . e s t a n d o , c o m o e s ta m o s , n o E s p f ri t o d o E s p a g o,

" p r c m f i q u i o s ” n 5 o p o d e m o s b u s c a r ;

n e m " p r o n e q u i o s ” n e m c o i s a a i g u m a .

B u s c a r o q u 6 ? O n d e ? Q u a n d o ? P a r a q u S ?

N o E s p f r i t o d o E s p a g o ? !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 215/411

SILENCIO!

£ . . . s i l 8 n c i o !

E n e s s e s i l g n c i o . . . q u a n t a c o i s a . . . t u d o !

“Surpresa!..

O jovem exibe um envelope de carta a namorada, que lhe abrira a

 porta do apartamento.

“Carta do Tio!”

“Certo.”

“E entao? Ele d£ as dicas sobre meditagao?”

“D£, sim. Muito boas. Mas veja por si mesma.” - passa a carta a

namorada e acrescenta:

“Leia em voz alta.”

“TiS bom.”

Os dois sentam-se e logo a voz de Alba se faz ouvir, limpida e

agradSvel, na leitura expressiva da carta do Tio:

"Voci querumainformagSomais especfficasobremeditagao?Euciou.InformagSo£importante. VocisabequenSoficadefato conhecendo,porse 

tornarinformado.Mas£utilestarinformado.

“Sabeoque4, essa informagao?Umdedoqueapontaumcaminhopara 

dentrodacaixam igica;eessacaixamigica£vocimesmo.Masodedosd 

aponta.Quemtemdetrilharocaminho£voci.EnSo£fic il, trilharesseca 

minho.£ simples;masnao£fic il.

"Ediffcil. Edaf?J i conversamossobreisto. Lembra-se?Esquegaque£ 

diffcile TRABALHE. Vociqueralcangaroseuobjetivo?EntSo trabalhe;e esquegaque£diffcil. Vociquerquese tomefic il? Entaotrabalhenoque£ 

diffcil. NSo h i outrojeito. Nenhuma de suas tentativasse ri intitil. A cada 

tentativa  aprenderSpelomenos uma ligSo importantee  desenvolverSpeb 

menosumahabilidadeimportante.

“VocitentouenSoalcangouoseuobjetivo?Eassimmesmo.Eistoque 

£ trilharocaminho,poralgumtempo;oupormuitotempo.EnecessSrioten 

tar;mas voci tenta enSoalcangaoobjetivo. £ assimmesmo.Noentanto,

nao£inutil;nunca£inutil. Vaificandomenosdiffcil,at£tomar-seficil.EntSo passaaserumgozo, trilharocaminho;porquevociaprendequenaodeve 

trabalhar." 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 216/411

Alba suspende a leitura e exclama:

“Essa nao! Jd come§ou a enrolar!”

Victor, sonindo:

“E uma carta do Tio que voce esta lendo. Portanto, nao estranhe* 

que enrole. E o jeito dele. O Tio 6   um “bicho-da-seda feiticeiro” .Voce quer aprender alguma coisa com ele? Entao ele entra em voce;

ele  se fa z  voce. Depois come§a a tecer um casulo de seda em volta

de si mesmo. E fica com voce, em voce, at£ que voce se tome crisd-

lida e possa deixar o casulo. Entao ele sai de voce e vai embora.

 Nem espera que voce agrade§a.”

“Crisdlida. Bonita palavra.”

“E sim. E voce vai ser uma linda crisdlida, quando sair do casulo

em que o Tio a estd enrolando. O desenvolvimento at£ o estigio de

mariposa serd por sua conta. Mas voce estard preparada para esse

amadurecimento, porque sao mdgicos os fios de seda do casulo do

Tio. De seda? Nao. De luz! Sao fulgurantes fios de luz, os que fa-

zem o casulo do Tio.”

"Mdgicos. Voce e o Tio parecem gostar muito desta palavra.”

“Gostamos, sim. Porque 6  mdgica a vida. Tudo 6  mdgico. Nada 6  

nao-mdgico. E mdgico estarmos aqui, voce e eu. E mdgico  sermos, 

voce e eu. E mdgico sentirmos, pensarmos, falarmos, voce e eu. E

mdgico todas estas coisas que aqui estao existirem. E mdgico o cin-

zeiro e a avenca 6   mdgica; como 6  mdgica a carta do Tio que voce

tem nas maos.

“Quem nao 6  mago nao percebe a magia da vida. E morto. A vida

que nele 6  magia 6  viva; mas ele €  morto, nessa vida que nele 6  md

gica.”

“Agora sim, que eu t6  roubada. Sao dois ”bichos-da-seda feiti-ceiros” me enrolando!”

E Alba, sorrindo, retoma a leitura da carta:

. . vocS aprendequen§odeve trabalhar. Istomesmo. Emais: voc& 

aprendeque 6 saindodocaminhoquepode trilharocaminho. Voc§saido 

caminhoe,entSo,podetrilharocaminho;emgozo.

"Sabeoque6 , essa informagSo?Umprojeto;umdesenhodoquevocS 

deverdalcangar. Vocdestudaoprojetoecomegaatrabalhar.Naod 6 certo.

 A fvo civoltaaoprojetoeoexaminadenovo;comparaasobservagdesque 

fezdurantea sua tentativa comasindicagdesdoprojeto.EmfungSodisto,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 217/411

corrige ou modifies os preparativos, sua atitude, sua reagao a fatos que 

ocorramduranteatentativa,etc.Etentanovamente.NSodScerto. Vocitor- 

na a examinaro projeto. Efaznovas corregoesoumodificagoes. E tenta 

outravez.Muitas vezes.Acadatentativavociaprendeesedesenvolveum 

poucomais. Oobjetivo?Longe, ainda.Masvoci vaiaprendendoesede- senvoivendo.Ecolhendoimportantesproveitos.

"Oprojetooajudaa  compreenderosseuserroseacertosparciais,para 

quevocipossacorrigiroumodificaradequadamenteoseu modusfaciendi.

Este4 opapeidoprojeto:ajudS-loacompreender.Ele4oseuinstrumento 

racionaldetrabalho. Voci6 racionaleisto4importante.Procureusarcoma 

mSxima eficiinciaasuaracionalidade. UmsaponSopode fazeristo. Mas 

voc§pode. Voci6 maisdoqueosapo. Porissopodeusarasuaracionali 

dadee, alim disto, aprendera fazeroqueosapofaz:pularparaofundodo pogo.Paraofundodopogo?Nao.Paraopogosemfundo.

“£ istoqueoprojetoolevaafazer:pularparaopogosemfundo.Porisso 

4migicaatintadoprojeto.” 

A jovem levanta os olhos da carta t  fita o namorado. Os dois sor-

riem e ela prossegue:

“. . . 4 mSgicaatintadoprojeto.AmedidaquevocivoltaaexaminS-io,ela  vai esmaecendo. Um dia vocipercebe quenSo temmaisprojeto. A tinta 

sumiu!Dafemdiante, voci temde trilharocaminhopors isd;comoque 

nelemesmoaprendeuecomashabilidadesquenelemesmodesenvolveu.

 At 4 sumir;comoa tintanoprojeto;ouosaponopogo.MasnSoprocureo 

fundodopogo. NSo tem fundo, essepogoparaondevocidevesaltar. Se 

vociestiverpreocupadocomo fundodopogo, vaiterderecomegartudo; 

vaiterdearranjaroutroprojetoe comegartudooutra vez. Vaipensar:ua- 

queleprojetonSoerabom;vouprocuraroutro,quemeleveaofundodopo 

go" NSopenseassim.Salte, comoosapo;masnSoprocureofundodopo 

go." 

Alba exclama entao, suspendendo impaciente a leitura:

“Pogo sem fundo 6  esta instrugao dele! O que 6  que eu vou fazer

com isto? Sair feito sapa, saltando pra dentro de um pogo atr&s do

outro, at£ achar um que nao tenha fundo?”

“Calma. . . continue lendo.JA

Ihe disse: o Tio encuca mas depoisdesencuca. Tenta suscitar e tenta dizer. E razofivel.”

“T6 bom. Vamos ver . . —diz a jovem. E continua a leitura:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 218/411

"Assim, comovoci v i, informagao£importante.Agora,porexemplo,vo 

c ij i sabequevaiterdetrilharumcaminhoparadentrodacaixam igicae 

saltarparaopogosemfundo.f:importantesaberisto.£:informagSo;ajudaa 

compreendereaplanejar;esclarece.”

Alba, outra vez:

“Ah. . . esclarece MUITO!” - olha para Victor, torce a boca num

gesto de ironia, e volta a ler:

"Umsibio.Cuidandodoseujardim,nogozodemerecidaaposentadoria.

Podaaqui, arranca ali, ajeitamaisadiante, ep ira econtemplaa flor. Sorri,

encantadoe feliz. E caminha, naplenaebem-aventurada consciinciada 

magiadoseucaminhar. Ep ira econtemplaa flor. Ecaminhadenovo.. . nio;DANQA!. . . porque6 dangaaquelecaminharnaplenaconsciinciada 

magiadavida.” 

Alba, suspendendo novamente a leitura:

“Puxa, que coincid&ncia! Voc& acabou de falar nisso!” - e volta

a ler:

Osibio senteuma vibragiodiferentenojardimese volta. Umhomem 

quechega.

“Bomdia,senhor . "

“Bomdia.” - respondeosibio, comumamivelsorhso.

"Fuiinformadodequeo senhor£ umsibioepraticameditagio.Quero 

aprenderameditareporissovimprocuri-to.” 

“Muitobem.Entiosente-see tente.Aqui£bom;h iquietudeepaz;een- 

cantadosmurmuriosnaharmoniadanatureza.Sim . . . aqui£bom.Sente-se 

etente.” 

“Maseun io seidireitooquedevofazer!” “Entaon io faganada. Vaiverqueassim£qued icerto . "

“Maseunemseibemoque£meditagio?!... Osenhorn io vaimeensi- 

nar?” 

“Curioso. . . Osenhorchegouaqui, dizendo:“fuiinformadodequeose 

nhorpratica meditagio e quero aprendera meditar". Agora o senhordiz: 

“nioseioque£meditagio".Curioso...muitocurioso...

“Sabe?Um “fendmeno", isto £oqueosenhor£.E s tiprocurando;mas 

n iosabeoque£quees tiprocurando.Usaumapalavra;masn io sabeo 

queelasignifica. Esaiporafprocurando... n io sabeoque,edizendouma 

palavraquen io sabeoquesignifica.Muitocurioso.. . ” 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 219/411

“Bern, eu fagoumaid iia doquesejameditagSo.J ilialgumacoisaaeste 

respeito. Mas queria queosenhormeexplicassemelhoremecorrigisse.

EntSoeu..

“Sente-seetente!" 

£: tao imperativaa vozdo sibio, taodecisivoseugestodeapontarum 

cantodojardim, etSopoderosoedominanteoseuolhar, queohomemnSo 

ousa falarmais. Senta-senolocalindicado. Cruzaaspemas,porqueesta 

posigiolhepareceafinalamelhorparasentarnochSo.

O sibio volta a cuidardoseujardim. Esaicaminhando, noencantado 

gozodamagiadoseucaminhar.

 Algunsminutosapds,perguntaohomem: 

"Senhor,oque4queeufagocomasmSos?" 

"QuemSos?" 

"As minhasmSos,ora!" 

"OsenhortemmSos?" 

"Claroque..." 

"Sil&ncio!" 

Ohomem,pensando: 

(“Estehomem4maluco!Pergunteiporumsibioemeindicaramumdot- 

do.Quem&os...QUEIDEIA,istosim!") 

Experimenta e acaba descansando naturalmente os bragos sobre as pemasecruzandodescontraidamenteasm ios.Fixaoolharnojardimi sua 

frente,dispostoaabstrair-seemsilentecomunhiocomanatureza.Maslogo 

seapercebedequei suaesquerda, nocantodoseuingulodevisio,os i 

bio "danga"a suameditagSodehomembem-aventuradoe liberto. Pensa,

entSo: 

("Como4queeuvoumeditar,comestehomemdangandoporaqui?Ele4 

doido,mesmo.Mandaqueeutentemeditare ficamedistraindo.Ah!Voufe- 

charosolhos.”) Passadosalgunsminutos,abreosolhosegritaparaosibio: 

“Senhor!Aquitem formiga!Queroficarquieto,masas formigasnSodei- 

xaml" 

"Osenhorquerficarquietoaf,masa fh i formigasquen io deixamose 

nhorficarquieto.Isto4problemaT '- e voltaacuidardasplantas.

Pensaohomem: 

(“Eagora?Devomemudardaqui, oun io?n) - moveumpoucoop 4 e 

umaformigaqueestiembaixodi-lheumamordida.

("Ah!Vousairdaqui. Vouparaaqueiebanco.Assimasformigasn io v io meincomodarevoupodermeditar.")- evaiparaobanco.

Osib iosevoltaeolhaparaele.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 220/411

("Pronto.L ivembronca.") 

Osibion io diznadaeretomaoseutrabalho. (Trabalho?Nao. Suaora- 

gio,que£comunhioemeditagio.) 

E o homem continua tentando meditar. Olhos fechados e sentadona 

mesmaposigioanterior;m ioscruzadascomoantes. Derepente,umaco- ceiranonariz.

"Senhor!Estousentindococeiranonariz!Devocogar?” 

"Osenhortemnariz?" 

“Claroqueeutenhonariz!" 

"Muitobem. Osenhortemnarizeoseunarizes ticogando. Isto€pro- 

blema?" 

("Denovo?!Ah!Voucogar.”)- ecoga.

("Pronto.Agorapossosossegarnovamente.") Passa-sealgumtempoeohomemsenteimpaciencia. Tentaconcentrar- 

se nocoragSo, comoleranumlivro. Porafgunssegundos, consegue. De 

pois,vemopensamento,espontineo: 

("Puxa vida!Tire!firia s sdparaprocurarumsibioquemeensinassea 

meditar.Masesseafn io ensinanada.S 6 mandaeutentar.Ora,seerapara 

eutentarsozinho,euteriaficadoemcasa.Naoteriagastodinheironemteria 

feitoessaviagema tiaqui.A lim disso,l i emcasan io temformiga.Nemum 

doido...") 

P li!Com forte impacto, ap i atingeobanco, bemjuntodohomem,que 

estremece como susto e abre osolhos. Veo sibio, semblanteaustero,

olharpenetrante.

("Nossa!Essecara £DOIDO, mesmo. Quandoelese distrair, voume 

mandar!") 

"SILENCIO!"~retumbaavozdosibio.

Ohomemsezanga esedispoeadiscutir. Masoolharqueseusolhos 

deparam4raiopoderosoqueopenetraesubjuga.Intimidado,engolearaiva 

quesesentiraimpelidoadescarregar.A respiragaoalgoofeganteeast&m- poraslatejandoumpouco,fechaosolhos,nointuitodefingirmeditar.

("Voufingirqueestoumeditando.Quandoelesedistrair...") 

“SILENCIO!"~novamenteavozdosibio,imperativaeseca.

Poralgunssegundos,ohomempira depensar; n§oousapensar.Ouve 

entaoavozdosibio,agorafirmeporim suave: 

“Respire fundo, lenta e ritmadamente. Concentrado nessa respiragio.

Depois, v irespirandocada vezmenosfundo,massemprelentaeritmada 

mente. Quandosua respiragioestivercurtae ritmada,monotonamenterit- mada,paredepensarnelacomo asuarespiragao;concentre-seemseu rit-

mocomoopulsardavidanocentrodocosmo;semqualquerid iia deforma,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 221/411

nemsuanemdocosmo.Consciincia;sd.Ritmo;sd.Semforma.NSoestari entaoemmeditagao. O senhoremmeditagio? Algu6memmeditagao?Im- 

possfvel!Maste riseacalmado.Comoosenhorquermeditar,ofeganteeen- 

raivecido?” 

("Essanao!Foielemesmoque...") 

“SILENCiOr 

Silincio, enfim, nohomemconcentradoemrespirarfundoeritmadamen- 

te...fundoeritmadamente...ritmadamente...

("E. . . pareceque funcionou. J i mesinto calmo, tranqiiilo. Agora, vou 

comegarameconcentrarnoritmo,semforma. Nocentrodocosmo.Opul 

sardavida...") 

Osil&nciodojardim6 interrompidopelavozdosibio,quesepoeacanta- rolar.

Ohomemnaoaguenta.Abreosolhoseveosibio,decostas,debrugado 

sobreumaroseira;cantarolando.Levanta-sedobancoevai$eafastandode 

mansinho,natentativadesairdojardimantesqueosibioperceba.

"J i vai?Espere.Tenhoumacoisaparaosenhor." 

Ohomempira esevolta,surpresoedesanimado.

Osibio, aindadecostasedebrugadosobrearoseira. Ergue-se,afinal,

volta-separa o homeme se encaminhapara ele, botioderosanam§o.Chegandojuntoaohomem, diz: 

"E;porhojebasta. Osenhorj& recebeuaprimeiraemaisimportante //-

gao. Mais tardese conscientizariimelhordela. TerientSoaprendidooque 

h idefundamental,essencial,paraapriticadameditagao.

"Volte, sequiserequandoquiser. Leveesta rosa eobserveseudesa- 

brochar.Ebeloesilencioso,odesabrochardarosa.E4assimqueosenhor 

vai terdedesabrochar:combelezaeno silSncio. Desabrochar.Sd.Pura,

naturale simplesmentedesabrochar:nabelezadosil&ncioenamusicada beleza. Comoa rosa. Contemple-a comamoreaprenda comela;aprenda 

nela.Ningu 4mpoderiIheensinarmais.

“Para queosenhorqueraprenderameditar?NaoSparadesabrochar? 

EntSoseumotivo6 pequeno;epequenosei4ofrutodesuameditagSo .

“Destaveztireiosespinhosdarosa.Masfois 6 destavez.Deagoraem 

diante,osenhorte ridefazeristo.Elembre-se: SILENCIO!”

Osibiopira defalarefitaohomemnosolhos.Estesente-sepenetrado 

porumraiodeluzeinvadidoporcilidaondadeamor.Osibiosorri,suave-  mente;inclinaacabega,volta-seeseencaminhaparaasuacasa.. . naple 

naebem-aventuradaconscienciadamagiadoseucaminhar.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 222/411

Alba, descansando a carta no colo:

“Bonito, isso af. E poeta sim, o Tio. Se o exemplo dele nao ser-

visse para mais nada, j£ seria muito valioso por isso. Neste mundo

tao cheio de mis6rias, de repente ele faz a gente viver um momento bonito. Se esse caminho que ele aponta nao produzisse mais nada,

al6m dessa inspiragao k  paz do silencio e S beleza do amor univer

sal, j£  Valeria a pena trilM-lo.

“Desabrochar. . . na beleza do silencio e na musica da bele

 za. . . como a rosa ..

A jovem p3ra de falar e se poe contemplativa.

Victor, em amor, respeita o seu silencio. Passados alguns minu

tos, levanta-se, aproxima-se da namorada e a beija levemente nos 16- bios. Ela volta. Sorri, feliz, e propoe:

“Vamos ler o resto da carta?”

O jovem, retomando ao seu lugar

“Vamos, sim.”

“Deixe ver, entao. Esta p&gina acabou, mas ele indicou que con-

tinua no verso. . —vira a carta, 16, e se poe a rir gostosamente.

Victor, j i  comegando tamb^m a rir

“SILENCIO!’*

Ela balan$a afirmativamente a cabega e os dois continuam a rir.

Depois seu riso vai diminuindo at6 cessar completamente.Subito, ela pergunta:

“Voce esUi sentindo? Que 6  isso? Que cheiro €  esse?”

Victor, brilho especial nos olhos e leve sorriso nos ldbios:

“Incenso. FragrSncia de rosa.”

“Mas nao estamos queimando incenso! Entao. . - olha parao jovem e o v6 levar o dedo aos l£bios:

SILENCIO...

E e m s i l§ n c i o - n o S i ll n c i o d o E s p f r i t o -

n o E s p a g o n o s p r o j e t a m o s n 6 s t a m b f e m ,

c o m o a q u e l e i n c e n s o que incenso nao era 

m a s q u e e m m S g i c o o l f a t o

n o c o r a g § o d a s jo v e n s s o m b r a s s e f e z s e n t ir .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 223/411

GRAOZINHOS DE PRATA

 NO NEXO DO SER COSMICO

E s o m o s p r o j e t a d o s . . . e p r o j e t a d o s . . . a ( 6 q u e n o s a s s i m i l a m o s d e n o v o

& m e n t e d a s o m b r a q u a s e - L u z ,

n o m o m e n t o e m q u e e l a ,

c o n t e m p l a n d o a n a t u r e z a ,

a c a b a s e n t i n d o s u a p a r t i c i p a g S o i m a n e n t e

n o E s p f r i t o d o E s p a c o .

Olho, e vejo o objeto complexo. A parte como que ciluidrica, mas

muito irregular, de superffcie ispera, estendendo-se do solo para oalto, varando o espago aparentemente vazio. Cor diffcil de definir:

um que de marrom, um quS de terra escura, aqui cinza, ali preta. A

 partir de certa altura, muitas projegoes dessa parte do objeto, em to-

das as diregoes; quase encobertas, por 6m, por miriades de pequeni-

nas partes achatadas e finas, de cor verde e com forma aproximada

do contomo de uma pera.

Olho e vejo a irvore. E vejo incontiveis outras coisas, diferen-

ciadas em minha percepgao. Separadas por um espago que parece

vazio. Olho, e vejo muitas coisas. E afirmo que elas existem; sao

realidades, que percebo distintas e separadas.

Lembro, por 6m, a ligao elementar da ciencia. E a vasta multipli-

cidade percebida se reduz h  pequena multiplicidade, inferida, das

 partfculas fundamentals: el6trons, pr 6tons e neutrons, constituindo e

formando tudo. O espeticulo fascinante do bate das partfculas ele-

mentares, na composigao do mundo! Fascinante e intrigante. Intrigante pensar que tudo tem natureza comum.

 Nao me ensinaram, por 6m, de que 6  feito o elytron. Ficou a nogao

de que, em certos experimentos, ele se compoita como onda e 6  con-

siderado como energia; em outros, comporta-se como partfcula ou

corpilsculo e como tal 6  tratado. A mente incauta de leigo me leva a

inferir  partfcula £ energia concentrada! E o espeticulo do mundo

se toma ainda mais fascinante e intrigante. Porque a multiplicidade

agora se reduz k   unidade. O mtiltiplo em manifestagao 6   UM emnatureza! Uma s<5 essSncia energ6tica, manifestando-se de modo

muito diversificado &minha percepgao. O simples que se faz com-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 224/411

 plexo, em dinamica manifestagao. O UM que se toma “MUITO” ,

mas continua a ser essencialmente UM.

Embaragosas questoes agoitam a minha consciencia, desenfreada

no processo (vao?) de pensar Partfcula de que? Onda de que? Qual

€   a natureza ou a “substancia” dessa energia? Tem ela, afinal, al-

guma substancia? Ou 6  manifestagao de alguma substancia? Se mi

nha percepgao das “coisas” se reduz, em ultima an&lise, a misteriosa

consciencia de energia, entao, que sao as “coisas”? E eu?

Afasto estas questoes, guiado por um profundo e sutil sentimento

de que a verdade do Ser, sua realidade, 6   inacessfvel ao meu inte-

lecto. A mente, por 6m, sempre voltada para as questoes fundamen

tals do Ser e obstinada em lhe atribuir substancia, nao vacila emsaltar do planeta para o universo galdctico e dai para o “Todo” —o

conjunto (infinito?) de todas as realidades, a Realidade “Total” . E

numa extrapolagao fant£stica, indaga: se h i uma unidade de nature

za, subjacente a multiplicidade observada, no planeta e no universo,

ser£ isto indfcio de um atributo do “Todo” ? Ser£ o “Todo” uno em

natureza, ainda que nos parega multiplo em manifestagao? Sera o

“Todo” um unico Ser, e nao uma multiplicidade de seres? (O “To

do”. ..)A mente volta-se para si mesma, na consciencia do ego. E o ho

mem se pergunta: serei eu uma realidade independente entre inume-

ras outras, ou uma realidade parcial integrante da Realidade “To

tal”, guardando para com esta alguma esp6cie de relagao imanente? 

Serei um ser entre seres? Ou um ser no Ser?

A mesa, a vidraga da janela, o isqueiro, a forragao do sofd, minha

mao. El^trons, prdtons e neutrons; Atomos e mol6culas. Energia.

Madeira, vidro, metal, pldstico, tecido humano. El^trons, prtftons e

neutrons; Atomos e mol6culas. Energia.

A fotografia sobre a mesa. Pequena e perfeitamente nitida; apa-

rentemente contmua. Um todo significativo, que posso compreender.

Imagino-a progressivamente ampliada. A nitidez diminui muito e se

desfaz a aparencia de condnuidade. Um conjunto de pontos de prata,

formando um todo ainda compreensivel. Prossegue a ampliagao, ad  

infinitum. Os pontos se distanciam cada vez mais, mantendo sempreas relagdes que tinham na foto pequena e perfeitamente nitida. Po-

r£m, } i nao consigo visualizar a fotografia como um todo; a mente € 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 225/411

incapaz de abrange-la e nao mais compreendo. Na fantastica propor-

gao imaginada, os pontos parecem independentes, sem qualquer ne-

xo. No entanto, cada ponto 6  parte integrante de um todo coerente;

elemento intnnseco de uma estrutura global; Nenhum deles e inci

dental e sem nexo.

Terei analoga relagao para com a Realidade “Total”, para com o

Ser “Total”? Uma relagdo imanente de parte integrante?  Certa-

mente nao posso compreender o “Todo” , assim como nao pude vi-

sualizar e abranger a fotografia extremamente ampliada. Mas, se

aquela relagao 6   verdadeira no nfvel mental, como no “ fisico” , tal

vez se manifeste no meu ser como sutil e ineftivel  sentimento de 

 participagao imanente.  O sussurro do Ser, no meu ser. O impulsovital do “Todo” , vibrando na parte fnfima.

Um graozinho de prata, de uma fotografia imensa (infmita?).

 Numa RELACAO IMANENTE DE PARTE INTEGRANTE!

* * *

Os bragos descem e vao repousar no colo, as maos segurando os

 papdis. Victor contempla um pouco, pela janela, os prddios altos docentro da cidade, distantes do seu apartamento. E logo se inicia sua

reflexao, induzida pelo escrito do Tio:

“Prddios. . . a cidade. . . o pais... o continente... a Terra: mas-

sa enorme, girando e se deslocando no espago! Um graozinho de

 prata, de uma fotografia imensa! Gente, nos prddios. . . na cidade.. .

no pais. . . no continente. . . na Terra; graozinhos de prata de uma

fotografia imensa!“Fotografia imensa. . . cdsmica!  Nada isolado, independente,

desligado, sem nexo. Tudo relacionado, no cdsmico nexo do Serf  

Esta a visao do Tio. Abstrata. Transcendente. Sentimento sutil da

realidade do Ser, subjacente 6 nossa percepgao do cosmo. O nexo do

Ser C6smico, na ubiqiiidade da sua essencia; nos prddios, na cidade,

no pais, no continente, na Terra... no homem!”

Victor olha a primeira p£gina do escrito do Tio e le:

Uma sd essencia energitica, manifestando-se de modo muito di- versificado a minha percepgao. Depois, retoma sua reflexao:

“Essencia energdtica.  Energia.  . . que 6? Um conceito da Fisica:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 226/411

“o equivalente do trabalho, ou a capacidade para realizar trabalho".

E trabalho.  . . que 61  Um conceito da Ffsica: “medida da transfe-

rencia de energia  que ocorre quando um corpo 6   movido a certa

distancia por uma forga externa” . Um conceito dentro do outro. . . E forga. . .  que 61 Um conceito da Fisica: “causa de modificagao no

estado de movimento ou de repouso de um corpo” , ou, “qualquer

agao que tenda a manter ou alterar a posigao de um corpo, ou a de-

formi-lo”. Causa.. . agio. ..

“E  aquela esp&ie de energia denominada radiante. . .  que 61 Um

conceito da Ffsica: “energia transferida por radiagao eletromagnetica

(luz, raios X, ondas de ridio, etc.)”. E radiagao eletromagntti- 

ca. .  . que 61 Um conceito da Ffsica: “propagagao de energia peloespago, atrav6s de campos el6tricos e magn6ticos variiveis” .

E campo.  . . que 6? Um conceito da Ffsica: “regiao do espago em

que todos os pontos sao caracterizados por certa grandeza ffsica — 

uma carga el6trica em repouso produz um campo eletrostdtico;  um

ima em repouso produz um campo magnitico estdtico;  uma carga

eietrica ou um ima, em movimento, produzem um campo eletromag- 

n£tico. Sim, mas espago. . .

“Hi. . . chega! Um conceito dentro de outro, e mais outro, e mais

outro. . . onde eu vou parar? At6 parece aquele trote de presente de

aniversirio ou de Natal entre amigos: uma segunda caixa dentro da

 primeira, uma terceira dentro da segunda, e assim por diante, at6  

uma ultima caixinha, vazia ou com uma piada.

“Afmal, que 6   o Ser Cdsmico? Um conceito? Um esquema de

conceitos? Um construto do homem?

“Construto. . .  Sim; esta palavra serve. E isto a Ffsica, no meuentender (de leigo, devo admitir). Um construto do homem, em sua

tentativa de compreender, descrever e controlar em seu beneficio, a

manifestagao “material” do Ser C(5smico, ao seu alcance. Manifes-

tagao “material” do  Ser Cdsmico? Ou nossa percepgao,  parcial e

relativa, de sua manifestagao? A realidade que conhecemos 6 per- 

ceptiva.  Nela vivemos e sobre ela e para ela elaboramos os nossos

construtos (ou modelos). A Ffsica 6   um bom construto; admiravel-

mente inteligente e extremamente dtil em nossa vida na realidade

 perceptiva. Muito inteligente e util. M as.. . um construto do homem 

concentrado no tratamento racional da realidade perceptiva.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 227/411

“Talvez eu deva redefinir, neste caso, minha idiia de construto.

Em lugar de “conjunto ou esquema de conceitos que pode nao ter

correspondencia na  realidade, etc.” , talvez fique mais claro, “con

 junto ou esquema de conceitos que pode nao  ser descrigao da natu

reza  da realidade absoluta, etc.” . Assim fa§o justiga mais evidente

mente k   inteligencia e h utilidade do trabalho dos ffsicos. Seu cons

truto deve corresponder  £1  realidade absoluta (nao-perceptiva), em-

 bora nao seja nem possa ser descrigao da natureza da mesma. Deve

corresponder, sim, porque baseado no estudo sistemitico de eventos

da manifestagao daquela realidade, ao nfvel ou &luz da humana per

cepgao. E porque corresponde, funciona, €   eficaz, com admir£vel

 precisao (matemitica!), em nossa vida na realidade perceptiva. Corresponde,  sim; mas nao 6 descrigao da natureza de.  Nao pode ser

essa descrigao porque assenta, necessariamente, na humana percep

gao, direta ou indireta (atrav6s de instrumentos, nas condigoes con-

troladas de laborat<5rio).

“Talvez.. . certo estava Newton, quando frisava: TUDO SE PAS-

SA COMO SE. . . Assim, quando descobrimos (ou cremos ter des-

coberto) algum aspecto da realidade do cosmo, na verdade verifica-

mos como se manifesta essa realidade a nossa consciencia,  na ob-servagao direta da natureza ou na observagao indireta da mesma em

nossas condigoes controladas de laboratdrio. Ou seja, entre a reali

dade ou natureza do Ser e a humana concepgao da mesma, h i a re

latividade da prdpria condigao humana (a limitagao e a restrigao im-

 postas pelos sentidos e a razao do homem e por suas condigoes con

troladas de experimentagao).

“Por isso, todo aqueie que diga, E, querendo de fato dizer isto,

estarS se denunciando equivocado. Melhor ser£ que diga, TUDO SEPASS A COMO SE. . . Todo aqueie que diga, “ nosso mundo 6  com-

 posto de materia e energia, e todos os fendmenos que nele ocorrem

resultam de interagoes destes dois componentes” , estard se denun

ciando equivocado. Melhor ser 6  que diga, TUDO SE PASSA CO

MO SE. . . E todo aqueie que diga, “sou um organismo material

(feito de etetrons, prdtons, neutrons, Atomos e mol6culas), num

mundo material (feito de el£trons, pn5tons, neutrons, Atomos e mol£-culas)” , estard se denunciando equivocado. Melhor ser# que diga,

TUDO SE PASSA COMO S E .. .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 228/411

“Por simplificagao de linguagem? Sim. Por simplificagao, pode

mos dizer, H. Mas s<5 por simplificagao. Devemos estar sempre cons-

cientes, por tras das palavras, de que TUDO SE PASSA COMO SE.

E porque tudo se passa como se, podemos dizer que €,  na pr£tica.

Afinal, nossas inferencias ldgicas sao baseadas em nossas constata-

goes de fatos da realidade perceptiva e sao validas para o nosso vi

ver nessa realidade. Pelo menos enquanto nao saibamos viver sendo 

nela e para ela. A realidade subjacente, a “realidade verdadeira” . . .quem a conhece? Quem pode viver na “realidade verdadeira” e para

ela? Ali&s, nessa realidade subjacente, que 6   “quem”? Por isso o

Tio, para evitar que a gente sofra as dores da “idealite” aguda, sem

 pre diz:”

“Qual6avidaquevoch estdvivendo?

“Qual6avidaquevoc§conhece?

“Qual£avidaquevocSpodeesabeviver?

“EnquantonSoconheceoutravida,vivaestaquevoc§conhece,

omelhorquepossaesaibaviv$-la.

“Qual§avidaqueIhepareceser?

“VivaessavidaqueIhepareceser.

“At6queconhegadefatoavidaque6.

“EntSovocepassard,naturalmente,aviveravidaque6,

navidaquepareceser,

“Antesqueconhegaavidaque6,nSotente,nSoforce.

“PorquenSoserS;apenasparecerSser.

“Esevoc§tentar,sevocfeforgar,

haverS“choroerangerdedentes” ,

nessavidaqueparecerdsermasnSoser£."

“Ai parece estar a resposta do Tio para o problema da renuncia.

“Afinal, que 6   renunciar? Abster-se ou privar-se o indivfduo de

algo que de fato muito deseja? Se h i renuncia, h£ desejo reprimido.

Se nao h i desejo reprimido, nao hd renuncia. E, reprimir desejos, se

rf caminho universalmente v^lido? Se a repressao for apenas inicial

e resultar na inexistencia do desejo, talvez seja um caminho v£lido.

Do contrfrio, nao; porque, se a tensao da repressao persistir, mesmo

sutil, inconsciente, “ haverf choro e ranger de dentes” , numa vida

que parecerf ser mas nao serf. Pode algudm burlar a verdade e vi

ver de fato uma “ nao-verdade”? Sem choro nem ranger de dentes?

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 229/411

“Talvez por isso Jesus teria dito:

“Ouvistes que fo i dito: nao adulterards.

 Eu, porhn, vos digo:

Qualquer que olhar para uma mulher  com intengdo impura, 

no coraqao jd adulterou com ela.

Quer dizer, nao basta renunciar a prdtica de um desejo improprio

(isto 6  falso e futil); 6 preciso extirpar o.prdprio desejo,  intimamente

- modificar-se de modo que ele nao ocorra. Do contririo, havera

“choro e ranger de denies”, na falsidade, na vida que pareceri ser

mas nao seri.

“E talvez por isso teria Jesus dito ao jovem que afirmara observar

todos os mandamentos e desejava saber o que lhe faJtava ainda:

4'Se queres ser perfeito, vai, 

vende os teus bens, dd aos pobres, 

e terds um tesouro no ciu; 

depois vem, e segue-me.

“E aquele jovem “retirou-se triste, por ser dono de muitas pro-

 priedades” . Sentiu que nao podia burlar a sua verdade e fazer defato a reta renuncia.

“E, mas. . . desejo imprdprio. . . extirpar o desejo. . . a id£ia de

renuncia implica certa classificagao de valores, na dicotomizagao do

Ser em reino “ material’*e reino “espiritual” ; aquele a ser objeto de

renuncia e, este, de ardorosa busca. Equivoco. Emx O PECADO

ORIGINAL! Pode algu£m cortar o nexo do Ser em alguma fase de

sua ubfqua manifestagao? O “reino material” €  menos divino porque6  “material’*? E ruim porque 6  feito de “materia” ?”

Mas o jovem sente-se confuso e inseguro.

“Hum. . . nao estou gostando do rumo que esta reflexao esti to-

mando. Incomoda-me a id6ia de repressao (re-pressao); seja no caso

 particular do sexo, seja na remincia ao mundo em geral; mas tamb£m

me incomoda a de licenciosidade  (pr&tica indisciplinada, em nome

da naturalidade de qualquer desejo). £ verdade que Jesus teria se re-

ferido ao adult^rio e nao ao sexo em geral. Mas, de qualquer forma,sempre que penso neste tema da rentincia, acabo confuso.”

Uma pausa e, depois:

“Pensar. . . €   isto! Porque  penso,  acabo confuso. Quando 6*que

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 230/411

eu vou aprender? Afinal, pra que serve meditagao, se eu estou sem

 pre com o ego no caminho, tentando resolver tudo por via racional?

E. . . nao €   mole praticar, mesmo algo que a gente ja compreende

teoricamente, intelectualmente..

Victor suspende entao sua reflexao. Respira fundo, suspira, e fixa

os olhos, passiva e naturalmente, na samambaia a sua frente. Como a

querer esvaziar a mente e tomi-la receptiva. Depois seus olhos se

fecham e ele “solta a consciencia, que vai subindo. . . subindo. . .

subindo e se expandindo. . . se expandindo. . . Luz, azul; suaves

lampejos violiceos. . . Som, ritmico; como finfssimo e oscilantezumbido.. . Inconsciencia.

Um suspiro. . . ele volta. Traz a cabega, que se mclinara para aesquerda e um pouco para tris, de volta &posigao normal. A samambaia.

“Preciso cortar as folhas velhas desta samambaia.”

Levanta-se e vai buscar a tesoura. E enquanto poda a samam baia. . .

“Que 6  renunciar? Abster-se ou privar-se o individuo. .. claro! O

indivfduo!  O ego, situado em algum ponto da escala de evolugao.

Em que era que eu estava pensando? Em renuncia. Mas, renuncia de quem? Quem  tem o problema de renunciar ou nao renunciar? OEGO!

“Puxa. . . como fui cair nessa? Renuncia 6   questao relativa  ao

ego em evolugao, vivente na realidade perceptiva. Logo, 6   eiTado

 buscar uma solugao absoluta,  gendrica, universal. Dai a confusao.

Este problema j i nao existe no sibio iluminado. Porque nele o ego

nao esti. Ao nivel de sua automatizagao no Grande Automata, no

Supremo Ser “Cibem£tico” , como pode o sibio iluminado ter dese- jos? Desejo €  coisa do ego. Mesmo do ego algo iluminado e j i cons-

cientizado da sua evolugao, no Ser, para o estado supremo de nao-ser.

“Curioso. . . a “evolugao” do ego implica uma espdcie de auto-

aniquilamento. Nao 6   um vir-a-ser e, sim, um “vir-a-nao-ser” , para

SER! Nao 6  a toa que os sibios iluminados nao encontram palavras

 para dizer. E quando dizem alguma coisa, para tentar satisfazer a

humana necessidade de que seja dito, contradizem e falam por para-doxos.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 231/411

“Sim, mas o problema da renuncia, como fica? Bem, renuncia

implica desejo, e desejo €  coisa do ego em evolu§ao na escala c<5s-

mica. Isto esti bem dentro da tese do Buda. Talvez por este motivo

ele fundou uma Ordem; para aqueles que, na escala, jd estivessemnuma posigao em que pudessem praticar a reta renuncia.  Os que

 podem praticar essa reta renuncia sentem-se a isto impelidos, inti-

mamente, por seu prdprio automatismo no Grande Autfimato. Estao

 preparados. Quando muito precisam de um despertar, um 'Chama-

mento, um estunulo “de fora”, a que respondem ansiosos e jubilo-

sos. Ainda hd desejo neles; o ego ainda estd. Mas hd tamb6m um

certo “enjoo do mundo” , que propicia e mesmo caracteriza e justifi-

ca a reta renuncia.“A16m disso, a que cabe renunciar, no mundo? Ora, jd pensei: o

reino “material” €   menos divino porque €   “material”? O mundo 6  

de Deus e em Deus. Deus 6  vivo no mundo e 6  Nele que o mundo

tem vida e significado. Portanto, nao se trata de renunciar ao mundo

de um modo absoluto e, sim, relativo. Devo renunciar ao mundo

como fun, mas servir-me entusidstica e corajosamente dele como

meio. Devo renunciar ao mundo em si mesmo, mas amd-lo em Deus.

 Nao se trata entao de algum ascetismo maluco nem covarde, e sim

de um raio X mfstico e mdgico, que ve Deus no mundo e o mundo

em Deus. E a gI6ria de Deus no mundo e a gl<5ria do mundo em

Deus. Renunciar ao mundo? Nao. Comungar nele e com ele a Vida

de Deus!“E os outros, que ainda nao sentem esse “enjoo do mundo”?

Bem, neles o ego estd, fortissimamente; neles hd desejo, fortissima-

mente. E nao hd o “enjoo do mundo”. Nao podem praticar a reta renuncia. Sobre eles pesa, entao, o problema itico, a responsabilidade

social.“Preto. . . branco. . . cinza. Entre a repressao e a iicenciosidade,

optar pela autodisciplina, que implica repressao razodvel e exercfcio

responsdvel da liberdade de satisfazer desejos (quaisquer; sexo nao 6  

o meu tema central, aqui). Numa palavra, RESPEITO - na &plica§ao

da Regra de Ouro. Por puritanismo ou falsa sublimidade? Nao. Por

opsao inteligente de comportamento, para o bem-estar social e pr 6-

 prio.“E quanto aos que nem sao capazes dessa autodisciplina, ou.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 232/411

mesmo de reconhecer e aceitar sua necessidade, e insistem num

comportamento egofstico, agressivo, irresponsivel porque desres-

 peitoso? Bem, agora o problema €   da sociedade. Se nao h i polfcia

interna, que haja polfcia externa. Para o justo bem-estar da sociedade.

“S6   a polfcia externa? Nao. Esforgo de educa§ao, tambdm.

Mas. ., EDUCA^AO; nao condicionamento. Qual a diferen§a? Ora,

o condicionamento consiste na implanta^ao de hibitos (comporta-

mentos reflexos, como no cao de Pavlov) no indivfduo, h semelhan-

5a da programa$ao de um robo. E isto que queremos que os homens

sejam? Robos?  Este  automatismo nao serve; 6   criminoso. E af que

Caim agride e mata Abel. Na educa^ao, pordm, deve-se tentar levaro individuo a  se  modificar intimamente, em sua pn5pria estrutura psiquica, pela compreensdo resultante de experiencia. Deve ser isto

que o Tio chama de desabrochar: a gradual modificagao da estrutura

 psiquica do individuo (0  ego), a qual vai  se expandindo e abrindo 

 para uma visao cdsmica do seu prdprio ser e da vida, com a corres-

 pondente “elimina^ao” do ego e do comportamento egofstico.

“E onde essa tentativa de educa^ao falhe? Ora. . . polfcia exter

na! Para 0 bem-estar social. As experiencias que 0 ego viva no con-fronto com essa polfcia externa e em sua vida em geral acabarao

 provocando abalos na estrutura psfquica do individuo, choques no

ego. At6  essa estrutura come9ar a “rachar”. Mesmo que isto leve s6- 

culos e sdculos. Entao 0  indivfduo vai conhecer angustia. Bendita e

necessiria angustia! Que ocorre, aliis, em todos os nfveis da escala

de ego-evolugao, em todos os nfveis de automatismo no Grande

Automata, at£ nao haver mais o ego. Bendita e louvada seja essa

angustia, porque €  sinal do silencioso e migico desabrochar que seinicia, no primeiro surto de compreensdo  (profunda, sutil e podero-

sa), pelo impacto do tfenue mas potente raio de luz que penetra pela

 brecha aberta na estrutura psiquica do ego primitive.

“Nao se constrdi uma casa nova no local ainda ocupado pela casa

velha. E a destruigao da casa velha equivale a relativo aniquilamento

do ego, produzindo angustia, medo (de causa inconsciente) de dei

xar de ser, no individuo apegado a ser no ego (entao em processo de

se DESfazer para se REfazer, mais aberto e lucido).

“Muito bem, mas. . . s<5 polfcia externa para o indivfduo? S6 po-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 233/411

lfcia externa para o ego primitivo? Em nome do bem-estar da socie-

dade? E a prdpria sociedade? Tem polfcia interna? Nao tem? En

tao. , . polfcia externa para ela? Qual? Que pode ser polfcia extema

 para a sociedade?”Victor faz uma pausa, cortando sua avalanche de perguntas, por

sentir a dificuldade e complexidade do tema a que se deixara levar

 pela espontaneidade de sua reflexao.

“Esti ficando diffcil e complexo, isso af. . . Diffcil e complexo?

Ora. .

Sorri e se poe meditativo. Sribito, num lampejo.:

“O automatismo do Grande Aut6mato €  essa polfcia!

“Sim, “Extema” e “interna”. “Extema”, nas leis “gerais” da

natureza do Ser C6smico. “Interna” , nas leis “especfficas” da natu

reza do Ser Cdsmico, na natureza dos egos que compoem a socieda

de. E tanto as leis “ gerais” como as “especfficas” , automaticamente

aplica, porque automitica 6, essa polfcia, no automatismo do Grande

Automato.”

O jovem faz nova pausa e, depois, decide testar seu lampejo:

“Que 6 sociedade? Um ente? Algum ser singular? Nao. Conjuntode homens, €  sociedade. E homens, que sao? Egos. Entao, sociedade

€   conjunto de egos. Conjunto de egos. . . que 6? “X” egos? Como

cinco lipis sao o plural quintuplicado de um lipis? Nao. Forgas, sao

esses egos; e diferentes forgas sao. Entao, sociedade €  a resultante 

dessas forgas. E conforme as forgas €   a resultante. Como se com

 poem as forgas para gerar a resultante? Pois assim geram os egos a

sua sociedade, que nao pode ser diferente do que eles, por suas ca

racterfsticas, possam gerar.“Um vetor 6,  isso que chamamos de sociedade. Tem magnitude

ou intensidade, diregao e sentido. Com que magnitude e em que di

regao e sentido esti o nosso vetor sociedade nos conduzindo? Sabe-

mos? Com que magnitude e em que diregao e sentido pode o nosso

vetor sociedade nos conduzir, senao conforme sua condigao de re

 sultante.  dos nossos “ego-vetores”? Conforme desejamos que seja o

nosso vetor sociedade, assim devemos nos esforgar para ser, como“ego-vetores” componentes.“Mas, curiosa resultante 6 esse vetor sociedade, porque tem uma

dimensao migica: ao mesmo tempo que conduz os vetores compo-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 234/411

nentes em certa dire^ao, em certo sentido e com certa magnitude, re-

flete-se sobre os prdprios vetores componentes e os afeta na geragao

de si mesma! Limita ou restringe aqui, estimula ou intensifica ali; e

afeta dire^oes e sentidos. E 6  nessa dimensao mdgica que pesa sobrea resultante a responsabilidade de se policiar, na responsabilidade

maior dos “ego-vetores” que a estejam dirigindo. Ajuste-se ou mo-

difique-se a sociedade, nesse mdgico mecanismo intemo de retroali-

menta$ao. Para que os “ego-vetores” sejam conduzidos para onde

devem ir e com a for§a que conv6m.

“Agora sim. . . vem as questoes: Para onde devemos ir? Com que

forga? Sabemos? Para onde queremos ir? Com que for§a? Sabemos?

Temos um consenso? E se o tivdssemos, coincidiria ele com o rumoque deverfamos estar seguindo e a for§a com que o deverfamos estar

seguindo?

“Ora, devemos, queremos. .  .isto €   maior? Que 6  maior? O que

devemos? O que queremos? Ou O QUE E? O que 4, 6  maior. E 6  a

 polfcia c6smica, isso que 6  e que 6  maior. “Externa” e “interna”.

“Polfcia? Nao. Arqueiro! Vetores somos e vetor 6  a nossa resul

tante. Flechas somos e flecha 6  a nossa resultante. Disparados esta

mos, pelo impulso vital da natureza do Supremo Arqueiro. E mdgi-cas flechas somos, porque somos no prtfprio Supremo Arqueiro que

nos disparou. E nossa resultante? Flecha 6. E mdgica flecha 6, por

que 6  no Supremo Arqueiro que nos disparou e nisso a gerou.

“Qual 6   a nossa magnitude individual? E a magnitude da nossa

resultante? E para onde devemos nos dirigir? Para onde deve ser di-

rigida a nossa resultante?

“E. . . magicas flechas somos. Porque maior 6  a nossa magnitude

quanto mais diminufmos. E estamos nos dirigindo no rumo certoquando nao nos dirigimos em rumo algum. Porque €  mdgico o Su

 premo Arqueiro que nos disparou. E esti no arco e estd nas flechas;

e 6   no arco e €   nas flechas; e nao 6 o arqueiro, nem o arco nem as

flechas. Magnitude? Nao tem, esse todo-poderoso arqueiro; porque 6  

mdgico! Dire^ao e sentido? Tamb6m nao tem, esse ubiquo arqueiro;

 porque 6 mdgico!”

Cessa o fluxo de pensamento no Jovem. Ele perde consciencia de

si e do mundo, magicamente disparado pelo impulso vital do Supre

mo Arqueiro. Aonde vai? Nao vai, porque magia 6 , sua abstra§ao.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 235/411

Volta, enfim, no sorvo de vida que inala forte. Sorri.

“Puxa! H i um mago ou um doido dentro de mim, hoje. Na incer-

teza, melhor eu voltar &reflexao disciplinada. Aftnal, nao era este o

meu problema. J i me desviei muito na minha reflexao.. .“Meu problema? Que problema? Puxa. . . que bacana! Percorri o

ciclo completo da tese do. . . do meu painel de r<5tulos! Intelecgao,

transintelecgao, abstragao, e pds-intelecgao. E, na pds-intelecgao, o

 problema resolvido. Maravilhoso!

“Mas, qual era mesmo o tema da reflexao? Onde foi que eu me

desviei?”

Victor faz nova pausa e esvazia a mente de consciencia, por um

segundo. Silbito:“Ah! Ji sei. Aquela jogada do Tio, de confrontar a vida que 

£  com a vida que parece ser.  Pois bem, parece que o passo decisivo

 para a gente conhecer essa vida que E consiste em sentir aquele ubi-

quo nexo do Ser - no  sentimento de participagdo imanente de que

fala o Tio. E 6   interessante lembrar que a Ffsica tamb£m esti bus-

cando esse nexo, a seu modo. Conseguiri? Quem sabe? Nao eu, que

nem um ffsico sou. Talvez ela tenha de se transmutar em METAfisi-ca. Mas isto seria a negagao dela mesma! E dai? Afinal, que 6  Ffsi

ca? Nao existe Ffsica. Existem homens que fazem Ffsica. Homem 6  

 primeiro; Ffsica, segundo.

“Assim, a questao volta ao seu foco: O HOMEM. Enquanto o

homem for EGOcentrico e insistir exclusivamente na cognigao por

via sensorial-racional, sua Ffsica, sua ciencia, seri sc5 isto mesmo:

um inteligente e titil construto, em sua vida na realidade perceptiva.

Somente quando ele se tomar “ONIcentrico” , e conseguir conhecero nexo do Ser, na METAcognigao, sua ciencia seri METAffsica, se-

ri METAciencia, e ele poderi transcender a realidade perceptiva e

viver na “realidade verdadeira” , sem choro nem ranger de dentes.

Ele? Viver na “realidade verdadeira” ? E le .. . quem?”

O jovem pira, enfim, de refletir. Levanta-se, vai at6 a janela e

contempla um pouco a cidade. Depois, fecha os olhos e evoca a

imagem do Tio. Vem aquela sensagao deleitosa, a um sd tempo en-volvente e penetrante, feita de jubilo, paz, convicgao e amor. E ele

se abandona por alguns minutos, imerso naquele oceano infinito de

Luz!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 236/411

Volta, afinal. Abie os olhos e suspira. Olha a rua 16 embaixo; as

 pessoas e os carros que passam. Dirige-se depois para o banheiro,sorrindo e pensando:

“E. . . vamos atender is necessidades da vida na realidade per-

ceptiva..E, enquanto lava as maos e se olha no espelho:

“E isso que o Tio vive buscando, se 6  que j i nao alcan§ou: a vi-

vencia naquele sentimento inefivel de participa^ao imanente no ubf-

quo nexo do Ser! Com ou sem rentincia. Quem sabe?”

D i s s o l v i d o s n o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

s e n t i m o s n c 5 s e s s a p a r t i c i p a g i o . . .

im a n e n t e , s i m - p r d p r ia d a n a t u r e z a d o S e r C ( 5 s m ic o :u b f q u a , s im - p r e s e n t e e m to d a p a r t e .

E 6 i n e f i v e l , s i m , e s s e s e n t i m e n t o ,

e is q u e s 6 p o d e s e rv i v id o - n a o p o d e s e r d e s c r i to .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 237/411

RESPOSTAS DE NINGUEM 

A

PERGUNTAS DE ALGUEM

“Alo.”

“Oi! Como vao suas incursoes no silSncio da mente?”

“Puxa! Essa 6  nova, em materia de saudagao! - Exclama Victor,

ao telefone, sorrindo gostosamente.”

“Pois 6. Estive relendo a carta do Tio e pensando naquela histo-

rinha da medita^ao. Voce sabe; nao me contento com essa de  susci- 

tar; tenho de tentar dizer”“Muito bem, e o que foi que voc£ conseguiu dizer?”

“Ora, o que entendi da historinha do Tio: MEDITA£AO E O SI

LENCIO DA MENTE. Isto 6, o estado de medita^ao 6  isto.”

“Certo. Muito bom. Equivale ao dizer do Tio: meditagao 4 abs- 

tragao. O estado de meditagao €  isto. Sem querer corrigir ou melho-

rar sua defini^ao, mas, considerando ou admitindo que  somos  isso

que denominamos mente,  eu diria: MEDITAR E SER NO SILEN

CIO DA MENTE.”

C o m a c o n s c ie n c ia e x p a n d i d a e m c f r c u lo d e g r a n d e ra io ,

p e l o p o d e r d o E s p f r i t o , n o E s p a g o ,

a c o m p a n h a m o s o d i & o g o d a s j o v e n s s o m b r a s a o t e l e f o n e ,

q u e p a re c e m a g i c a m e n t e e lim in a r o e s p a g o e o te m p o . . .

“E; tamb6m; - concorda Alba. Alias, nessa de defrnir €  freqiienteocorrer isso. A gente vai encontrando vdrias defmigoes, e cada uma

contribui um pouco para a id6ia ou o sentimento que a gente tem do

que estd tentando defmir.”

“Isso. Agora, gostaria que voce me dissesse como entende a ex

 pressao silencio da mente, que resume a ligao do Tio.”

“Bem, eu pensei assim:

“Simplificando, mente 6  aqueie aspecto do nosso ser que consiste

em  sensagoes e pensamento,  quanto a nossa consciencia comum;

conespondendo, no seu construto, as fases sensorial e racional. Pois

 bem; o objetivo da meditagao 6   “desligar” estas duas fases. Elimi-

nadas as sensagoes e suspenso o pensamento (na acepgao comum do

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 238/411

termo), entra-se no estado de meditagao, porque a mente passa aexistir ou  ser   somente no seu estado transcendental, isto 6, que ul-

trapassa as fases sensorial e racional. E como o pensamento comum

tem uma espdcie de qualidade auditiva  —isto 6,  a gente em geral pensa como que ouvindo palavras na cabega — €  apropriado chamar

essa suspensao do pensamento de silencio." 

Victor sorri e “ataca”:

“Tudo bem. Mas como €  que se faz esse “desligamento”? Afinal,

voce senta, relaxa, respira ritmadamente at6   serenar, mas seus ouvi

dos continuam 16, abertos e com sua ligagao neural a certa 6rea do

cdrebro; e h6 muita vibragao no ar, k  sua volta, causada por muitos

movimentos diferentes que voc£ nao pode evitar. Entao, como €  quevoc£ elimina sensagoes auditivas? Tapa os ouvidos?”

“Olhe, at6 que nao 6 mi. id£ia. .. Mas creio que nao 6  necessdrio;

quero dizer, indispens6vel. Creio que, num m6gico ato volitivo..

Alba 6  interrompida por leve risada de Victor. Depois, pergunta:

“Foi o meu mdgico, nao foi?”

“Pois <S.”

“Bem, e que quando a gente comega a pensar nesses assuntos, ve

que tem de usar palavras que talvez suscitem, j6 que nao d6 pra dizer.”

“Isso mesmo. Mas continue sua explica§ao.”

Alba, entao, ap6s uma pausa para encontrar o fio da meada:

“Ah, sim: nesse tal mdgico ato volitivo, creio que a gente pode

simplesmente passar para a metafase, ou, entrar num estado de sub-

consciencia, ou ultraconscidncia. . . sei 16 eu. O fato €  que a sensa-

?ao auditiva comum nao €   fendmeno puramente ffsico. Os ouvidosestao 16; os nervos estao 16; o cdrebro est6 16; tudo direitinho, fisi-

camente. Mas a mente nao est6! E como se a gente safsse da cabe^a;

 pura e simplesmente. E a gente que nao est6; sai.”

“E voce chamou esse ato de mdgico sd por causa da dificuldadede definir?”

“Nao; tambem porque nao gosto de voligao metida nisso ai. D6 a

impressao de que 6  sd a gente fazer um esforgo comum de vontade,

como decide andar ou mover o brago, e pronto; sai.”

“Uai! Quem foi que meteu a voligao nisso?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 239/411

“Eu mesma; eu sei. Mas porque sinto que certa voligao antecedea safda da cabega. A safda, propriamente. . . €   migica! Eu pensei

numa analogia assim, com base naquela ligao do Tio sobre contem-

 plagao:“A gente esti subindo uma escada. Na primeira fase, a gente esti

 prestando atengao aos movimentos de bragos e pemas, a colocagao

dos p£s nos degraus, etc. Portanto, esti consciente  disso tudo, que

representa sensagdes.

“Af a gente comega a pensar numa coisa que interessa ou preocu-

 pa, e  perde a consciencia das sensagdes. Como se a gente saisse da

 periferia da mente e se fechasse numa camara interna e herm£tica.

Quer dizer, a gente nao tem mais consciencia dos degraus, dos movimentos, etc., ou mesmo de que e sti subindo uma escada. S<5 do

 pensamento. S6 ele existe. A gente E ele. Esta 6  a segunda fase. E

isto acontece naturalmente, em muitas situagoes da vida.

“Na terceira fase, a gente perde a consciencia desse pensamento.

Af €  que 6  migico. Porque a escada acaba e a gente continua subin

do, sem consciencia de coisa alguma; nem da gente mesma!

“Bem, pode ser que a gente tenha algumas esp&ies sutis de

consciencia, como audigao de sons sem realidade ffsica, visao de lu

zes sem fontes ffsicas, sensagoes olfativas ou titeis. . . Outro dia eu

senti frio. Aliis, nao foi bem frio; foi um frescor agradivel, como se

eu estivesse imersa numa leve neblina. Numa outra tentativa, senti

felicidade, jubilo. .. extase! Mas isto deve ser transigao. Se o estado

de meditagao €  o siiencio da mente, entao nao deve haver conscien

cia de esp6cie alguma. Por isso 6   impossfvel dizer. Como exprimir

na linguagem verbal um estado de “nao-consciencia”? E migico. Nao se pode descrever. E justamente por que eu percebi que 6  migi

co, j i que a voligao sd interv6m preliminarmente, entendo agora

 porque certos instrutores dizem que meditagao 6   um “nao-fazer” .

Talvez uma boa palavra seja abandono;  a gente se abandona a esse

migico sair da cuca.”“A analogia €  interessante. Ajuda a compreender. Mas voce pode

tamb£m pensar em paralelo com nossos reais estados ou comporta-

mentos mentais.

“A primeira fase €   o nosso estado normal na vigflia. H i sensa

goes e pensamento. A segunda, nosso estado quando concentrados

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 240/411

em reflexao. S<5 pensamento, como voce disse. A fase de transigao

 pode ser como o nosso estado num sonho. Sensagoes fora da reali-

dade ffsica. E a terceira fase 6  como o sono profundo e sem sonho.

Magia.“Imagens, voce pode criar muitas. T6cnicas, para as fases preli-

minares, voce pode inventar inumeras. Terminologias, tamtem. Re-

cursos psicoldgicos atrav^s de simbologia (inclusive mfstica ou reli-

giosa), voce pode criar um montao. Mas s6 a real tentativa prStica, o

trabalho, com a maior naturalidade possfvel e espfrito de observa-

gao, pode levar a experiencia e, portanto, a conhecimento da medi

tagao, seu “mecanismo*’ e seus frutos. Este 6   um outro importante

aspecto da historinha do Tio.’*

“Tem razao. Aqueie homem tinha alguma id&a sobre meditagao e

desejava sinceramente meditar. E o sdbio procurou ensinar-lhe uma

ligao fazendo-o sentar e tentar; sem mais explicagoes nem especula-

goes tedricas. E isso af. Ningu6m aprende nada teoricamente; s6 fica

informado. Aprender mesmo, sd na prdtica. A teoria pode ajudar a

aprender, orientando a maneira de proceder, as corregoes a introdu-

zir em cada tentativa, etc. Mas a prdtica 6  que 6  mesmo o fator deci-sivo. Acredito at6 que muita gente nao sabe nada de teoria de medi

tagao, mas medita; e muitas vezes nem sabe que medita! Vai ver que

isto acontece com pessoas como Einstein, Schweitzer, Newton, Sao

Francisco de Assis, etc. E que muita gente que vive lendo sobre o

assunto e discutindo mil teorias nao consegue resultados porque nao pratica.”

“ De fato, hd certo grau de fascfnio na informagao sobre medita

gao, principalmente quando o assunto 6   cercado de mist&io e exo-tismo (provavelmente, em certos casos, para vendagem de livros).

Alids, hd pouco tempo o Tio me alertou contra a “exoticite” . Tenho

sua advertencia numa carta. Quer que eu leia pra voce?”

“Quero.”

“Td. Espere um pouco. Vou buscar.”

Alguns minutos depois, Victor, voltando ao telefone:

“Posso comegar?”

“Mande brasa.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 241/411

"Cuidadocomovfrusda “exoticite"ea febrequeelecausa. Sabeoque 

4, essa febre?O fascfniopor id 4iasepriticasexdticas. A febre, propria- 

menfe,4umaatitudeemocionai;como4 emocionalareagioqueelaprovoca 

ante o exdtico;mas sua causa envolve umcrit 4rio defeituosodepensa 

mento.

"Eexdtico?Entaofascinaeinteressa. £ verdadeiro, issoque4exdtico? 

Ou4fatso?NSoimporta.£ fascinanteeinteressa.

"£ familiar?EntSonSo fascinaneminteressa. £ verdadeiro, issoque4 

familiar?Ou4 falso?NSoimporta.Antes,4suspeitoporque4familiar.NSo 

fascinaneminteressa.Ohomemsemluz, vftimadesuaprdpriaatitudeante 

oque4exdticoeoque4familiar.

“Eoriental?EntSo4exdtico;fascinaeinteressa;merecef  4.£ ocidentai? 

EntSo4familiar;nSofascinaneminteressa;4suspeito.Que4oriental?Que 

4 ocidentai?Quemsabeoque4orientaleoque4ocidentaisabeoque4 

primeiro enSo4 vliimade  "exoticite "nemde "familiarite”. Antes,aproveita 

sabiamentedoque4exdticoedoque4familiar.NSoperguntadeondevem,

porquenSo4oquemaisimporta. Importamais oque6,issoquevemdeal- 

gumlugar. NSoperguntaquemdisseouescreveu,porquenSo4oquemais 

importa. Importa mais  o que 6, issoque foidito ouescrito. Pergunta se4 

verdadeiroou4 falso, issoqueveiodealgumlugarefoiditoouescritopor 

algu 4m.ReverinciaepreconceitonSosSocrit 4riosseus.“£ exdticaameditagSodooriental?NSoinporta. SSoexdticososrecur- 

sosdoorientalquemedita?NSoimporta.£ exdticaavestequeeleusapara 

meditar?NSoimporta. £ exdticaa teoriadoorientalsobreasuameditagao? 

NSoimporta. Que importa?£eficazameditagSodooriental?Isto importa.SSonecessiriosevSlidosos recursosdoorientalquemedita?Istoimporta.

EnecessSria a vestequeeleusaparameditar?Istoimporta.Ecorretaou 

plausfvela teoriadoorientalsobreasuameditagSo?Istoimporta.Quemsa 

beoque4umorientalquemeditanSoseimpressionacomexotismos.Per -guntaoque4primeiroeoque4verdadeiro;esentaemedita . "

“Af est£.” - arremata Victor.

“E €   isso af. O Tio est£ certo. E aquela da veste me lembrou Je

sus:

‘‘Ndo £ a vida mais do que o alimento, 

e o corpo mais do que as vestes?

“Nao 6  especificamente relevante, mas creio que af esti presente

o mesmo espfrito da pergunta do Tio: QUE E PRIMEIRO?”

“Parece que sim. Especificamente, o Tio teria dito:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 242/411

“Que 6   primeiro? Oriental, ou homem? Ocidental, ou homem?

Homem 6  primeiro; no oriental e no ocidental. E nisso que 6  primei

ro, oriental e ocidental sao ambos regidos pelas mesmas leis natu

rals. E 6 nessas leis naturais que importa perguntar o que 6  verdadei-ro e o que €  necessirio na meditagao do oriental.

“Perguntar, sim. E quem vai responder? Ningu&n. Mas a resposta

seri dada, a reta pergunta daquele que pergunte meditando. E sera

dada por esse NINGUEM que responde a todo alguim  que pergunta

meditando.

“O Grande Ningu6m 6   o que responde. O reto algu£m e o que

 pergunta. E o Grande Ningu6m s<5 responde se 6  reto o algu6m que

 pergunta. E reta a atitude desse algu^m que pergunta? E reta sua

motivagao? E reto seu procedimento? E reta a aplicagao que ele se

 predispoe a fazer, dos frutos de sua meditagao? Sim? Entao o Gran

de Ningu6m responde.

“E se enche de Luz o que perguntou. E sua Luz inradia; com a

Luz com que foi iluminado, a seu semelhante ilumina; porque esta

era sua reta predisposigao. E se enche de Poder, o que perguntou. E

seu Poder irradia; com o Poder com que recebeu a vida, a seu semelhante vivifica; porque esta era sua reta predisposigao. E se enche

de Amor, o que perguntou. E seu Amor nao  irradia, porque nesse

Amor que recebeu, o seu semelhante mesmo se faz; entra nele e

dentro dele faz sentir o poder migico do Amor que recebeu. E como

recebeu, d£. At£ nao ser mais algu£m e tomar-se ningu6m; ningu&n,no Grande Ningu6m.”

Alguns segundos escoam. Depois Victor 6  despertado de sua profunda contemplagao, pela namorada, enfim refeita do encantamento

que aquelas palavras nela haviam induzido:

“Puxa! E isso nao foi o Tio quem disse. Foi voce! Impressionan-

te! E maravilhoso!”

“Isso nao importa. Acabei de ler na carta do Tio: Quem disse?

 Nao importa. Aliis, ningu6m disse. Porque eu nao tinha intengao de

dizer; e sd fiquei sabendo que ia ser dito quando comecei a dizer.

Foi dito; veio e eu deixei passar.”“Novamente lembra Jesus:

. . nao cuideis em como, 

ou o que haveis de falar,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 243/411

 porque naquela hora vos serd concedido 

o que haveis de dizer.

“E tambem me lembrei de Jesus quando voce disse: “e como re-

cebeu, dS” . Jesus disse:

“. . . de graga recebestes, 

de graga dai

“Eu sei. E parece que hd muita gente por af que nao estd dando

de graga. Com certeza porque nao recebeu. E €  falso aquilo que fin-

ge dar, porque nao recebeu o que €  verdadeiro. Como pode algu6m

dar o que nao tem? E so encenagao, o que essa gente finge dar.

Portanto, nao dd. Antes, ganha muito com o que finge dar. Mas que

grande perda 6, o muito que essa gente ganha!

“E por isso o Tio dd de graga. Porque de fato recebeu. E 6  verda

deiro o que ele recebeu. E graga, e por isso 6  de graga que ele tem

compulsao de dar.”

“E isso af. Mas, voltando ao tema da meditagao, voce acabou in-

troduzindo novos elementos, novos requisitos para o que talvez eu

deva agora chamar de reta meditagao.  Foi quando voce falou em

reta atitude, reta rrtotivagao. .  . e o que mais?”

“Reto procedimento e reta aplicagao.”“Isso. Mas eu nao estava encarando a meditagao sob este aspecto,

que introduz elementos £ticos, morais e talvez mfsticos. Estava en-

tendendo-a como recurso psfquico ou mental, digamos “t6cnico” ,

 para fins de esclarecimento e resolugao de problemas pessoais. Ou

seja, para objetivos prdticos na vida comum. Agora percebo que de

fato o Tio introduziu esse elemento moral ou 6tico, ou mfstico,

quando fez o sdbio dizer dquele homem que queria aprender a me-

ditar:

“Paraqueosenhorquermeditar?

“NSo6paradesabrochar?

“EntSoseumotivo6pequeno;

epequenoserdofrutodesuameditagSo.”

“Certo. Eu tambem pensei assim, no infcio. Tinha em mente esses

“objetivos prdticos na vida comum” . Nao sabia, mas eram pequenosesses objetivos. Havia em mim a semente de algo muito maior; infi-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 244/411

nitamente maior. Por isso, aqueles “objetivos prdticos” foram se

tomando cada vez menores e o objetivo da minha meditagao foi se

tomando cada vez maior. Hoje, estou plena e poderosamente imbui-

do daquela reta motivagao. Por causa da sementinha m£gica de que

eu mal e vagamente me apercebia.”

“Jesus, outra vez:

4'O reino dos ciu s 6 semelhante a 

um grao de mostrarda, 

que um homem tomou e plantou no 

 seu campo; 

o qual 6, na verdade, a menor de 

todas as sementes, e, crescida, . . . se fa z drvore, 

de modo que as aves do ciu  

vem aninhar-se nos seus ramos.

“A sementinha que o homem plantou no seu campo. .  . se fa z dr

vore.  . . e as aves do ciu vem aninhar-se nos seus ramos.

“Quem poderia ter dito mais e melhor? E bem dizia ele: Quem 

tem ouvidos, ou$a.”

“Pois 6.  Se para nada mais servisse a influencia do Tio, paramuito j A  serviria a luz que desperta no amago da gente. Isto: NO

AMAGO DA GENTE. Ele nao tenta iluminar de fora, para a gente

ver. Antes, leva a gente a ligar um interruptor mdgico na gente

mesmo, para iluminar, de dentro, o que a gente pode iluminar, e ver

o que a gente pode ver. Mas se a gente persiste em meditar, cresce

na gente a reta motivagao, e a gente ilumina cada vez mais e ve

cada vez mais. E o desabrochar que prossegue.  E as aves do 

ciu.  .Alba sente um subito e forte anepio e, arrebatada por indizfvel

encantamento, exclama:

“Puxa! Ta lindo o nosso papo!”

“T6, sim. Mas, pra encerrar, que ji estou com o brago dormente

de segurar o telefone, ocorreu-me uma iddia interessante.”

“Eu tambdm j i  estou cansada. Vamos encerrar, sim. Qual foi essa

id&a?”

“Bem, vimos que a meditagao, tanto pode servir a “objetivos prdticos na vida comum” , como ao objetivo maior daquele “desa-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 245/411

 brochar” . Ora, os “objetivos priticos” sao bem prdprios da nossaindole e da nossa  formaqao no Ocidente; e o objetivo de “desabro

char” 6  bem pr6prio da indole e da formagao dos orientais. Em am-

 bos os casos, por6m, parece que n6s, seres humanos, estivemos pors6culos doentes de “extremicite”. No Ocidente, por “racionalite” ;

no Oriente, por “transcendentalite” ou “ascetite” . Agora, parece

que o v£rus do Ocidente contaminou o Oriente, e vice-versa. Quem

sabe este sinal traz uma mensagem de esperanga, ou mesmo de con-

fianga, quanto a um futuro melhor?

“Talvez, por algum tempo, o virus estrangeiro se imponha ao

dom£stico (por “exoticite”); l i e c l Mas viri o tempo em que os

dois virus produzirao um “virus hibrido” , e 6  facil perceber ou ima-

ginar o que isto representari para a humanidade: a meditagao ser-

vindo a “objetivos priticos na vida comum” e ao “desabrochar” , la

e ci. Em ultima anilise, desabrochar, \i  e c l E s<5 esse desabrochar

de cada ego, oriental e ocidental, poderS trazer de fato a paz, a feli

cidade geral que muitos j i almejam, no amor universal de que tao

 poucos j i sao capazes.”

Segue-se uma pausa, interrompida afinal por Alba:“E. . . um casal bem diferente, n6s dois. Se este papo tivesse sido

gravado e depois fosse irradiado..

“Nao se iluda. Haveria quem o considerasse ingenuo, ou chato, e

mesmo ridfculo e pirado. Mas isto nao importa, para n6s. Aliis, por

falar em nds, e casal, estamos nos aproximando do nosso grande dial

A todo instante estou me lembrando disto.”* 

“E, sim. Eu tamb£m. Pena que o Tio nao esteja aqui. Puxa vida,eu nem o conheci ainda! Mas Deus sabe o quanto eu gostaria que ele

estivesse aqui para o casamento e, depois, fosse o padrinho do nosso

 primeiro filho. Quanto tempo faz que ele foi embora?”

“Mais de um ano.”

“Nossa! Como o tempo passou! Ainda bem que decidimos casar;

senao acabarfamos ficando velhos e desistindo. Seri que o Tio nao

volta mais? Eu queria tanto conhece-lo. .“Nao sei. Ultimamente tenho tido uma esp^cie de pressentimento

de que ele nao vai mesmo voltar. Pelo contririo, de que vai  sumir, 

simplesmente.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 246/411

“Nao acredito. Sem pelo menos uma carta de despedida? Nao

acredito. E voce nao vai sentir, se for assim?”

“Sentir? Vou, sim. Amo o Tio. Nunca vou esquece-lo. Mas a

saudade que vou sentir (e sinto, desde que ele foi embora) serd sem pre jubilosa. A compreensao que ele me ajudou a alcan^ar 6  que tor-na minha saudade feliz. Nao triste; feliz.

“Seja como for, senti em suas ultimas cartas que ele jd estd se

 preparando para cortar o “cordao umbilical” . E compreendo que isto

6  necessdrio.”

“Espere! A gente corta o cordao umbilical mas nao ABANDONA

o bebe, afastando-se para sempre! Pelo menos A MAE nao faz is

so.”Victor sorri. Alba tamb£m e, depois, pergunta:

“O que 6  que voce vai fazer agora?”

“Hum. . . E hora do noticidrio na TV; vou assistir. Depois, vou

ler mais um daqueles escritos do Tio.”

“Alids, quero pegar mais alguns. Jd digeri bastante os que estao

comigo.

“Nossa! Jd faz mais de um ano que ele foi embora e ainda naolemos todas aquelas reflexoes! Nao sao tantas assim..

“Pois €.  Sao os tais “objetivos prdticos da vida comum” , que es

tao sempre na frente. Mas, agora que voce falou, vou aproveitar o

 prdximo feriadao e ler o resto.”

“Tive uma id6ia: eu leio o que falta pra chegar onde voce estd e,

no feriadao, a gente vai acampar e 16 junto o resto. Td bom?”

“Falou. Vamos fazer assim.”

“Combinado, entao. Agora Tchau. Beijo. Vd assistir ao seu noticidrio.”

“E voce h sua novela. Tchau. Beijo.”

N o s s a s q u e r id a s s o m b r a s . . .

N o t i c i d r i o , u m a ; n o v e l a , a o u t r a .

N 6 s ? A m o r , n a v i b r a g a o d e s s e b e i j o ,

n o e s p a ? o d o m u n d o ,

t a o n e c e s s i t a d o d e b o a s v i b r a p o e s . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 247/411

“Boa noite.” —Diz o locutor, encerrando o noticidrio.

Victor, pensando, enquanto desliga o televisor:(“Assaltos, seqiiestros, violencia de toda espdcie, nesse noticid-

rio. Serd que s6 acontece coisa ruim no mundo? Vou ler uma refle

xao do Tio. Pelo menos nisto, tenho certeza de que vou encontrar

coisa boa. E nisto pelo menos eu vou ser uma parte do mundo feliz e

em paz; pelo menos eu vou estar com a consciencia elevada, porque

voltada para nobres ideais.”)Alguns minutos apds, as maos ajeitam o papel e o jovem comega

ler:

E a l e r c o m e g a m o s n i 5 s t a m b f i m ,

p e l a l u z d o s o l h o s d a j o v e m s o m b r a

e l i g a d o s n a L u z M a i o r d e s u a e l e v a d a c o n s c i e n c i a .

O Canto da Sereia C<5smica

Os p6s, na areia molhada. Desaparecem sob a dgua espumosa.Vai-se a dgua e eles reaparecem; molhados e frios; brilhando a luz

amena do sol matutino.

Os p£s. . . meus p£s. Minhas pemas... meu abdomen... meu to-

rax. . . minhas maos. . . meus bragos. . . meu corpo. Meu corpo. . .

E u?.. . Nao! Meu corpo.

 Na mente, a consciencia - sutil, segura, serena - de ser numa

condigao intrinsecamente independente do corpo. . . Vaga e miste

riosa sensagao de ser transcendente. . . Profunda serenidade. . . Silencio, prenhe de gloriosa mensagem!

Meu corpo. Maravilho-me dele. Quanta coisa posso fazer no

mundo, gragas a ele! Que instrumento maravilhoso! Basicamente

 perfeito! Tudo perfeitamente concebido e previsto! Concebido. . .

 previsto. . . Por “quem” ? Ou, por “que” ? Concebido. . . previsto. .

. inteligencia!

Mas. .. que inteligencia?

Concebido e previsto? Ou terd simplesmente acontecido? Nao 6 possfvel! Fatos fisioldgicos e bioqufmicos relativos a formagao, sub-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 248/411

sistencia e defesa do corpo, que me espantam as raias do deslum-

 bramento, gritam bem alto que houve concep§ao e previsao!

Concep^ao e previsao? Ou evolugao, num lento e gradativo pro-

cesso de corregao, ajuste e adapta^ao? —Corre^ao. . . ajuste. . .adapta^ao.. . inteligencia!

M as .. . que inteligencia? De “quem”?

Corre§ao, ajuste, adapta§ao, sao possfveis se h i relagoes sistemd-

ticas de causa e efeito; se h i  leis. Leis. . . inteligencia? Nao necessa-

riamente, talvez. Mas, necessariamente, tendencia imanente. Ten

dencia imanente. . . a que? De “quem”? De “que” ? Acaso? NAO!

Tao absurdo como o nada! Se nossos cilculos de probabilidade saovdlidos, duvido que possam dar a esta hip<5tese forga de convic-

$ao.. .

Silencio, prenhe de gloriosa mensagem!

O vento passa, brincando no meu cabelo e como a sussurrar nos

meus ouvidos a gloriosa mensagem do silencio que vem interromper.

E o mar vem beijar meus p£s, como em amorosa reverencia ao pe

queno que parece refletir o infmitamente grande.

A £gua espumosa, estendendo-se a perder de vista, em graciosa

curva. Acompanho-a, os passos marcando a areia molhada. Um

quil6metro. . . dois. .. paro. As pemas cansadas. Afasto-me da areia

molhada e sento.

A areia. O solo. A superffcie da Terra. . . estendendo-se ate o

mar; prolongando-se depois por baixo do Oceano Atlantico, at£ o

litoral africano; cruzando a Africa e mergulhando no Oceano Indico;

emergindo, ora aqui, ora ali, em grandes pequenas ilhas, e estendendo-se depois no leito do Oceano Pacffico, para aflorar de novo no

continente sul-americano; cruzando o continente e terminando sua

viagem embaixo da minha mao; no punhado de areia que ergo e

solto em cascata por entre os dedos.

A superffcie da Terra. A Terra. . . o globo terrestre. . . massa

enorme de substancias diversas. . . solta no espago! Girando em tor-

no do seu eixo e dando longas voltas ao redor do Sol. Massa enormede mat&ia. . . SOLTA NO ESPAQO! No espago. . . silencioso. . .

escuro. . . aparentemente vazio. Visualizo-a: Enorme bola de terras,

dguas e gelo, parcialmente encoberta, em muitas dreas, por brancas

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 249/411

nuvens, como se decorada por flutuantes flocos de algodacr, em ca-

 prichosos desenhos.

Enorme!... Solta no espago... silencioso. .. escuro... vazio.

Perplexidade.. . espanto... medo!Medo? De que? Da realidade? Ridiculo! Seja o que for a realida

de, eu sou parte dela! E a realidade €.  . . sempre! Nao pode deixar

de ser! O nada 6   um absurdo. A realidade 6   tudo. Nada existe fora

dela. Eu sou nela! O corpo? O ego perplexo, que se espanta e sente

medo? Nao. Eu! Eu sou nela. . . sempre! O nada 6  um absurdo.

 Novamente o globo enorme.. . solto no espago. Lindo! Iluminado

 pelo Sol. Luz sobre a Terra! E o espago? Silencioso? Nao. Nele vi-

 bra um canto sedutor de cdsmica sereia! Escuro? Nao! Inundado deinvisivel e maravilhosa luz. . . que brilha ao se refletir no meu ser!

Vazio? Nao! Pleno da Presenga! Da Realidade, vibrante e sutil: o

Espirito do Espago!

Meu ser paira no espago, a grande distancia da Terra. A Terra. ..

tao pequena. . . E meu corpo, entao, que li esti. . . inimaginavel-

mente pequeno!

Meu corpo.. . minhas pem as.. . meus p£s. . . e a igua espumosa efria, que vem lavi-los, na mar£ que subira. O c6u carregado. . . o

mar agitado. . . e a chuva que cai de repente sobre o corpo arrepia-

do. Cai? Ou sobe? Afinal. . . uma questao de relatividade de obser-

vagao. Seja como for, molha e arrepia. Melhor cair n’ig u a .. .

O sol brilha de novo. A caminhada de volta e. . . novamente no

 ponto inicial.

Uma ultima olhada no mar. Mar. . . sereia. . . na consciencia, o

eco do canto da sereia cdsmica!

* * *

Victor fecha os olhos e se abandona i sublime sugestao da refle

xao do Tio. Logo sente-se tornado de jubilo, como embalado por

aquele misterioso canto de sereia cdsmica.

Volta, enfim, ouvindo vagamente um som, como de campainha.

Abre os olhos e agora ouve claramente: a campainha do telefone.Levanta-se e vai atender.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 250/411

“A16”

“Puxa! Demorou, hein! J i estava dormindo?”

“Nao. Estava fora da cuca, embalado pelo canto da sereia cdsmi-

ca.”“Embalado pelo que?!”

“Pelo canto da sereia c<5smica. E o tftulo da reflexao do Tio queli h i pouco.

“Algum motivo especial pra telefonar?”✓

“E que eu estive pensando no nosso papo sobre meditagao, e per-

cebi que o que dissemos foi praticamente a mesma coisa que para

contemplagao. Qual 6  a diferenga, entao? Ou nao h i diferenga?”“Diferenga? Que diferenga  isto faz? Em ultima andlise, nao im

 porta. No objetivo, di   na mesma: ser em abstragao,  ser no silencio 

da mente.  Mas a gente pode estabelecer uma diferenga no procedi-

mento. Contemplagao, entao, seria o procedimento gradativo; o subir

da escada, na sua analogia; o desligamento sucessivo das sensagoes

e do pensamento, nesta ordem. Meditagao seria o procedimento di

reto; o mdgico ato volitivo e, logo. . . feito! Quase um fia t  instanta-neo; um formiddvel “salto bionico para fora do campo gravitacional

da cuca” ! Em poucos segundos, a inconsciencia de sensagoes e de

 pensamento. Isto foi sugerido na historinha do Tio pela atitude do

sdbio e suas reagoes aos problemas do homem que tentava meditar:

“O senhor tem maos? O senhor tem nariz” ? E quando o homem

 pensava: “Silencio” ! Entao: meditagao, o caminho direto; contem-

 piagao, o caminho indireto.

“Talvez a gente nao deva se preocupar com este problema de di-

ferenciagao dos dois procedimentos. E possfvel que essa preocupa-

gao prejudique nossas tentativas, provocando uma atitude analftica,

forte e persistentemente racional, no ato de tentarmos. Melhor, en

tao, esquecermos at£ estes termos, contemplagao e meditagao, e nos

concentrarmos na iddia essencial de abstragao.  E €   claro que nem

nesta iddia devemos pensar, no ato de tentar; qualquer pensamento

ou intengao consciente deve ser preliminar. No momento de tentar,abandono;  sd; como voce mesma propos. Nem a iddia de tentativa 

deve persistir, porque contdm a iddia de incapacidade, um germe de

incerteza. Abandono e confianga, numa espdcie de fia t.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 251/411

“Mas n6s ainda nao temos condigao de fazer isto. Pelo menos EU

nao tenho.”

"Exercfcio 6  a sua resposta. Exercicio leva a habilidade. Lembra-

se do que o Tio disse? A cada tentativa aprenderd pelo menos uma 

ligao importante e desenvolverd pelo menos uma HABILIDADE im- 

 portante.

“Para mim, voce tem a escolher um entre dois caminhos. Ou tal

vez possa seguir os dois, paralelamente; ora um, ora o outro. O pri

meiro 6  o da contemplagao (a escada). O segundo 6  o da meditagao

(o “salto bi6nico”). No primeiro, voce se concentre passivamente

em alguma sensagao ou algum pensamento, at£ transcender, at6  

alhear-se do ego. No segundo, voce nao se concentre em coisa al

guma. Relaxa, fecha os olhos e solta um suspiro, com a id6ia de nes

se suspiro se desligar, alhear-se do ego, transcender. Nao vai conse-

guir, por muito tempo. E assim mesmo e voce nao deve forgar; uns

 poucos minutos por tentativa e duas tentativas por dia.

“Repito: nao vai conseguir, por muito tempo. Depois que voce

soltar o suspiro, virao sensagoes e pensamentos. Nao faga nada para

tentar impedir que venham, nem para reprimi-los quando vierem.

Simplesmente, deixe vir e deixe passar; como um espectador passi-vo e nao-envolvido. Esta a atitude que voce deve assumir, de ES

PECTADOR PASSIVO. Como a contemplar nuvens no c£u; sem

analisd-las; sem mesmo pensar que sao nuvens. E isto que voce vai

ter de se tomar: o espectador ou a espectadora das nuvens que pas-

sem no c£u da sua mente. Voce vai ter de  ser  esse espectador, ate

nao haver mais nuvens passando no c£u da sua mente; e at6  nao ha

ver o c£u da sua mente. Entao voce deixari de ser o prdprio espec

tador. Quando nao houver o que observar, nao podera haver o es pectador, que sd existiri, como tal, enquanto houver o que observar

e ele estiver observando; porque fail distingao e ter £  consciencia de

si mesmo como sujeito da observagao.  £ daf que vem a consciencia

de si mesmo: de sentir-se como sujeito de observagao.

“Sabe o que 6,  esse espectador? O ego. Por isso voce perde a

consciencia do ego (que, como sujeito de observagao, entende-se

distinto de tudo o mais, porque observa tudo o mais). E o “ego co-

mum” , esse de que voce perde consciencia. E quando isto acontecevoce vive uma indescritivel sensagao de ser  ou esp^cie de conscien-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 252/411

cia: a sensagao de ser parte imanente do Ser C6smico, parte inte

g ra te de um inexprimfvel Espfrito do Espago, como diz o Tio.

“Voce se sente como uma esp^cie de “metaego”, ou ego trans

cendental, numa indizfvel e extraordinaria sensagao  potencial   deconsciencia - ou de consciencia potencial. Nao faz muito tempo, o

Tio me escreveu sobre uma reflexao que fizera a este respeito. Usou

a expressao, “ AQUELE que ve” , para designar o ego, escrevendo

“AQUELE” com todas as letras maiiisculas. Disse que esse ego,

que eu estou chamando agora de “metaego” , 6  ainda uma relativida

de. Fez entao um curioso jogo de palavras. Disse que eu contem-

 plasse a expressao “AQUELE que ve” e tirasse, mentalmente, “que

v6” ; e que nada mais podia dizer.”“Espere af. Eu jd estou €  ficando confusa, com essa sua especula-

gao. O chao estd comegando a sumir debaixo dos meus  p is. E nao

me sinto nada bem com isto. E melhor a gente voltar dquelas consi-

deragoes mais razodveis e compreensfveis sobre meditagao. Jd sei

que posso tentar seguir o caminho direto, na meditagao propriamente

dita, ou um caminho indireto, na contemplagao. Isto me sadsfaz

quanto d diferenga bdsica entre os dois procedimentos. Se voce temalguma coisa a acrescentar, que seja nesse nfvel de ideagao. Essa

 psicologia. . . sei Id. . . digamos, profunda (pra nao dizer lundtica,

 por respeito ao Tio), me deixa tonta e at6 assustada. Jd me sinto

meio esquisita nessa de contemplar e meditar, porque as pessoas que

conhego e com as quais convivo nem sequer falam ou mesmo pen-

sam nisso. Se ainda por cima associar a minhas prdticas essas ideias

estratosf6ricas do Tio, entao.. . ”

“Estd bem. Talvez eu tenha sido mesmo inoportuno, em meu en-tusiasmo por essa psicologia profunda que o Tio despertou em mim

(mais do que ensinou), e que me proporciona um novo e melhor en-

tendimento da vida.

“0 Tio nao €  um lundtico. E diferente; e nisso em que €  diferen

te, as vezes parece lundtico; porque 6  diferente. Tem experiencia di

ferente disso que chamamos de vida; vive um estado diferente, disso

que chamamos de consciencia ou sensagao de ser. E nisso em que 6  diferente, 6 superior, porque mais liicido, sutil, profundo e abran-

gente, eu diria mesmo, cdsmico,  em seu psiquismo. Nele nao per

siste o sentimento nem a id6ia de ser uma psique individual e, sim,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 253/411

uma especie de “psique cdsmica” . E eu disse  sentimento  porque,

nele, isso 6   muito mais do que filosofia; 6 estado de ser.  Alids, se

voce atentar para a vida e os ensinamentos dos grandes iluminados

(Jesus, por exemplo), vai ter a mesma sensagao, ou seja, de que eles

eram como lunaticos - porque sentiam, pensavam e eram diferentes.

Por isso €  vdlido dizer que, no dia em que este mundo for habitado

 por “ lunaticos” como eles, deixara de ser o hospicio que 6.”

Alba ri, no que 6   acompanhada por Victor. Este prossegue de

 pois:

“Pois 6. O Tio me disse, certa vez, que era um Aprendiz de Fei-

ticeiro. Mas eu acho que de aprendiz ele nao tem mais nada. Se era,

quando me disse que era, nao 6  mais; faltava pouco e ele jd se di-

 plomou. Penso isto e tenho um estranho e sutil sentimento de que 6  

verdadeiro.

“Voce tem a desvantagem de nao te-lo conhecido pessoalmente,

ainda. Nao sentiu, como eu senti, o poderoso influxo da sua presen-

ga, do seu amor e da sua luz. Impossivel descrever. E sentimento;

6 coisa de sentir, como ele mesmo diz quando fala de sentimentos.

O fato 6  que voce sente um poder sutil que parece irradiar-se dele,

ou que, por causa dele, vibra no ambiente, e penetra e domina etransforma voce. Seu olhar 6  diferente - at£ seus olhos parecem ter

um brilho diferente; seu sorriso €  diferente - automatico, como o de

uma criancinha; seus gestos sao diferentes - tambdm automdticos e

 perfeitamente harmonizados com sua fala; nem de mais nem de me

nos; na medida certa e necessdria; sua fala 6  diferente —diffcil dizer

como (certa vez me ocorreu que 6  como a “magia inversa” da musi-

ca; voce ouve a musica, que nao 6  palavra nem imagem, mas ouve e

entende a palavra que ela diz a voce, e ve e entende a imagem queela mostra a voce ou evoca em voce; a fala do Tio 6 a magia inversa:

6   palavra e 6   imagem, mas voce ouve e sente “musica” ; certa vez

isto me aconteceu a tal ponto que eu perdi consciencia dele, do am

 biente e de mim mesmo como forma; eu era, e tudo era, e s6 existia,

aquela “feiticeira fala-mdsica” , sem forma; confesso que at£ me as-

sustei, passado o primeiro momento de “feitigo”).

“At6 a bronca do Tio 6  diferente: caia fundo, mas vem carregada

de amor; e voce sente esse amor e agradece intimamente a bronca.“Tudo isso parece exagerado; emotiva e fantdstica reagao pes-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 254/411

soal. Nao posso provar o contririo. O fato 6   que virias vezes eu

senti esse poderoso e iluminado amor que se manifestou quando es-

tivamos juntos (e que s<5 entao se manifestou na minha vida). Senti

me igual, como se eu fosse nele porque ele se tivesse centralizado

em mim e ambos estiv^ssemos centralizados no amago de tudo.Identificagao? Comunhao? Chame como quiser. E amor; puro, pode

roso, luminoso e universal amor! Como o que Jesus manifestou nomundo.”

Victor faz uma pausa e se apercebe entao de que esti naquele es-

tranho estado de leveza e expansao, que sente quando deixa que seja

 falado nele, automaticamente. Respira fundo, solta um forte suspiro

e resolve dar por encerrado aqueie tema que tanto o empolga.

Alba, com voz suave e comovida, tomada do amor de que falara o jovem:

“Eu amo voce. S<5 Deus sabe o quanto eu amo voce. E amo o Tioem voce. Por isso vejo agora que fui boba, sugerindo que o Tio fos

se lunitico. Desculpe.”

“Boba? VocS nao foi boba.

“Primeiro: voce acha que eu amaria uma boba? E eu amo voce.

Segundo: voce foi racional, l<5gica. Vou condeni-la por isso?

Quanta gente vou ter de condenar, entao? Eu, condenar? Com que

autoridade? Aos defeitos dos outros, se defeitos sao quando os per-

cebo, respondo com os meus prdprios defeitos. O mundo nao pode

ser perfeito porque EU estou nele! E, pasme voce, foi o Tio quem

me disse isto, certa vez, quando eu critiquei algu£m em tom conde-nat6rio:

"Omundo naopode serperfeitoporque euestounele. Foi a profunda

compenetragSodeste fatoqueme compeliu, cedo navida,adiscordardosquemediziam: “Dequeadiantavocfiserum idealista?Voc§nSopodemu-

daromundo” !

“VocinSopodemudaromundo! Estafrasemefaziacalar,comopoder

desuaI6gica. Eeu ficavaconfuso,porquesentiaqueintimamentediscorda-

va.At6odiagloriosoemqueosentimentosutildediscordSnciasefezres-

posta,iijcidaepoderosa:possoedevomudaromundo,EMMIM! 

“Que6 omundo?Montanhas,drvores, riosemaresebichosdetodaes-

p6cie?E ascoisasfeitaspelohomem?N5o.EU souomundo!Enumerosa

legidosou.EU! Em&gicalegiSosou;porquesoutamb6mUM na legiaoquesou.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 255/411

“Rebanho, sou. E muito lentamente posso evoluir, com o rebanhoque

sou. No entanto, migico rebanho sou;porquesouUM,nesserebanhoque

sou.E imperfeitosou,eu que souumnesserebanho.Comopodeorebanho

serperfeito?E6precisoqueorebanhosetomeperfeito,paraquenSosofra

as dores da sua imperfeigSo; nem eu sofraas dores da sua imperfeigSo;

nemorebanhosofraasdoresdaminhaimperfeigSo.

“Masevoluimuitolentamente,esserebanhoondeeusouum.PorquenSo

sabeoque6 ele prfiprio. EnSosabequedeveevoluir,essaevolugSoquenele£tSolenta.Porissosofre;asdoresdasuaimperfeigSo.Porquenaosa

bedaqueiaevolugSo;equandoouvefalarnela,nSoentendeoqueouve;nSo

acredita; nSo aceita e naoquermudar. E eu, que souumno rebanho, nSo

possomudi-lo. Mas posso mudi-lo EM MIM, que sou um nele! EntSo,ele

se ri melhor; EM MIM, que sou um nele. Perfeito?TSo cedo; vaidemorarmuito.Masserimelhor, e istoj i se rimuitobom.ComopoderiamanhSser

perfeito,semcomegarasetornarmelhorhoje?A l i is . . . perfeigSo?“Pron6-

quio"!

“Porissomedesgarreido rebanho,euqueeraumnele.Porqueacreditei

naquelaevolugSo;eaaceitei;equismudar.Paraevoluirmenos lentamente

doqueo rebanho. Eaprender,omais ripido possfvel,atocaraflautamigi-

ca. EntSo, quando tivesseaprendido, voltarparao rebanho e nele tocar a

flautam igica. E comamOsicaquenelatocasse (que6 feitigo),seduzirein-quietar outro, pelo menosum  outro, para queele tambim sedesgarrasse

efosseaprenderatocaraflautamigica.

“Nuncate r i umaorquestradeflautasmigicas,orebanho. Porque^migi

caaflauta.E feitigo6,suamigica.Enfeitigaoquesedesgarraeenfeitigao

quetoca.Oquesedesgarravaiaprenderatocar,essaflautaque£migica;

oquetoca,encanta-seenSovoltamaisparaorebanho; 6neleeforadele,e

portodaparteeemtudo;mas nSovoltaparaele.Voitaooutro,quesedes-

garrou,depoisqueaprendeuatocaramusicafeiticeiradaflautamigica."Sabeoque6,esserebanho?Umbuqufidebot6esderosa,numvaso.E

seudesabrochars66 coletivo  porqueacontece nomesmovaso;eporque

os botSes recebemamesma igua, omesmoareamesmaluz.Mascada

qualtemdedesabrochar;esenSoforperfeitooseudesabrochar,nSoseri

perfeitoo buquSdesabrochado. NSose poderi dizer; "aquelebuqufedesa-

brochou perfeitamente", E se um botSoestiverdoentee nSo desabrochar,

nSo se poder i dizer, “aquele buqu§ desabrochou"; porque um, no buqu§,

nSote ridesabrochado.“E sea igua for ruim?E seoarforruim?E senSohouverluz?Cuide-

mosquesejaboaaigua,esejabomoar,ehajaluz,esejamsadiososbo-

toes, ParaqueamagiadavidasemanifesteemcadabotSoeelepossade-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 256/411

sabrocharperfeitamente.E comocadabotaod umnobuquS,perfeitohden-

tSodeserobuqu6desabrochado.

“Mas como ndod pura adgua, nemd puro o ar,nem hd luzsuficiente,

nem s5o sadios os botSes, e atdo vasoestdcontaminado,quempuder,esouber como,equiser,saiadovasoevdbeberdedguapura,einalarvida

emarpuro,e iluminar-seem luzabundante.Depoisvolte,sadioedotadode

mdgico poder. E entre de novo no vasocontaminadoeo descontamine;e

purifiqueadguaea torne vinhomdgicoenutritivo;eexaleo seuperfumee

enriquegaoar; edeixe irradiar-sea poderosa luzemquesebanhou.Entao,

pelomenosmaisumbotdohddedesabrochar,naquelevasodescontamina-

dopelobotdoquesaiudorebanhoevoltoutocandoaflautamdgica.”

Victor para de falar. Alguns segundos se passam e Alba, que va-

rias vezes se arrepiara, enquanto o jovem falava, quebra afinal o si

lencio:

“Sabe? As vezes eu tenho a impressao de que estd acontecendo

alguma coisa estranha ou fantdstica com voce; ou EM voce. Fico en-

cantada e assustada, ao mesmo tempo. Voce vem com essas longas

tiradas do Tio, com perfeita fluencia, e parece estar repetindo exa- 

tamente  as palavras dele. Fico encantada porque €  sempre bonito oque voce lembra e repete; e caia fundo na gente. Mas fico tambdm

espantada, porque €   estranho, 6   esquisito! Eu atd me airepiei, en

quanto voce falava; vdrias vezes. O que 6  que estd acontecendo?”

Victor, jd refeito do “estado de automatismo” em que se coloca-

ra:

“O que e que estd acontecendo? O feitigo. O feitigo do Tio, esta

acontecendo. Tambdm eu me maravilho disto. E fico ainda um pou

co espantado. Mas nao me assusto mais. Jd me assustei, no inicio;

agora nao me assusto mais, Porque sei que €  natural e €  bom. Nao 6  

fantdstico; 6   natural. Nada 6  fantdstico; tudo 6  natural. Pode ser in-

comum, espantoso, admirdvel, e ate assustador; mas nao 6  fantdstico;

6 natural, como tudo.

“Alids, o prdprio Tio alerta a gente contra a “fantasticite”. Diz

ele:

“Por exemplo, um homem desabrocha comptetamente. E vem e causa

comoventee poderosamanifestagSodeamoruniversal.Ecausaoutrascoi-

sas raras, queespantam, despertam admiragdo eat6 assustam. Entdodi-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 257/411

zem:"6 fantSstico”. Equando falamdohomem,dizem:“nSoShomem;6 um

ser fantSstico e faz coisas fantSsticas". Erro. NSoS um ser fantSstico. £

homem. E nissode sernaturaleser homem,6espantoso,admirSvel,eat6

assustador. PorqueestSdesabrochadoe6mSgico.MasnSoh fantSstico.E

mSgicomas6natural,nissoqueespantaecausaadmiragSoeatSassusta.“OqueparecefantSsticofascina;porqueespanta,causaadmiragSoeat 6

assusta.Entaooquese deixafascinarseprejudica,porquesegueissoque

chamadefantSsticoequenSoexiste.SeeleseguisseoqueSnaturaleas

sim o entendesse,muitose beneficiaria, aindaqueespantado, cheiodead-

miragSoe at£assustado.”

+ “O que esta me acontecendo 6   magico; mas nao 6   fantastico. E

espantoso, admirSvel e at6 assustador; mas nao €  fantistico. E natu

ral. A16m disso, eu nao repito exatamente as palavras do Tio. As es-

senciais, sim; mas nao todas. As ideias sao todas lembradas, e isto e

extraordmSrio. As imagens sao todas lembradas, e isto £  extraordi-

n&io. A fluencia com que as iddias e as imagens sao todas lembra

das, e expressas no estilo do Tio, tamb6m €  extraodin£ria. O estado

em que me sinto, quando pego o embalo dessa fluencia, tambem €  

extraordin^rio. Sinto~me como que automitico no automatismo do

Tio, que, por sua vez, creio eu, jS estS automatizado em alto nfvelno Grande Automata.

“Tudo isso 6  extraordindrio; nao 6  comum. Mas nao 6  fantSstico.

E espantoso, admirSvel e at6 assusta; porque nao €  comum. Mas nao

6 fantistico. E natural.

“Por isso o Tio, como ele mesmo diz, procura “desfantasticar” o

que os outros “fantasticaram”. E inocular todo mundo que cai no

feitigo dele com uma poderosa vacina contra a “fantasticite” . E se

eu sirvo de exemplo, funciona e 6  bom.”Alba, rindo levemente:

“Falou. E isso af. E eu j£ cai no feitigo do Tio e no seu. O seu 6  

 pior, porque €  duplo: tem a magia do feitigo do Tio e a desse amor

especial que sinto por voce.”

“Pois eu lhe garanto que nao 6   feitigo nenhum, que Ihe fago no

meu amor. E amor mesmo. Enfeitiga porque 6  amor; mas nao 6  feitd-99 

9&’ 

“TS bom. Fico feliz com 0 seu amor que nao 6  feitigo mas enfeitiga. E antes que 0 feitigo se quebre..

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 258/411

Victor percebe que Alba vai encerrar a conversa e se apressa em

acrescentar:

“Escuta! Quanto aquela que voce falou de se sentir esquisita pra-

ticando meditagao, porque as pessoas que conhece nem falam nisso, pense nessa met&fora do Tio, do rebanho e . .

“Certo. Vou pensar. Mas agora vou contar cameiros na cama, e

duvido que passe do segundo.

“Beijo.”

“Beijo, e b i pra voc£.”" B i  pra voce tamb&n.”

Os fones sao afinal recolocados nos respectivos ganchos, enquanto os dois jovens se sentem gostosamente bem, felizes consigo

mesmos, com o seu amor, com o Tio, e com a vida que tao genero-

samente os abengoa com a mrisica da flauta m&gica, que 6  feiticeira

e desabrocha botoes de rosa.

F l a u t a m S g i c a o u v i m o s n t i s ,

n o E s p a g o d o E s p f r i t o ,

q u e 6 m a i s m S g i c o d o q u e f l a u t a e a n 6 s t a m b & m d e s a b r o c h a . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 259/411

CANGAO DE ANSEIOS NUM PIANO MUDO

S e G m u d o o p i a n o ,

t e m d e s e r d e a n s e i o s a c a n g a o ,

p o r q u e n S o v i b r a a i n d a n o E s p a g o ,

d o E s p f r i t o e m q u e e s t a m o s n f i s d i s s o l v i d o s

e a t e n t o s a n o s s a s jo v e n s s o m b r a s . . .

Alba abre a porta do apartamento. Victor que chega, semblante

cairegado de preocupagao. Em seu olhar se reflete, em amor, a dor

da namorada, que Ihe telefonara, angustiada e muito nervosa:

“Venha logo e, por favor, sem aquela disposigao gaiata que at6  

hoje nao sei se 6   sua ou se voce assimilou do Tio. A situagao €  muito grave, a ponto de estar em jogo o nosso casamento.”

O jovem beija a namorada e tenta segurar-lhe carinhosamente o

rosto e fit^-la nos olhos; na esperanga de que a magia do seu amor

sopre para longe aquelas sombrias nuvens. . .

Mas ela se afasta, abre mais a porta e manda que ele entre, sente-

se e se prepare para ouvir. Ele obedece, disposto a receber em amor

toda a carga daquele desabafo que se prenuncia tempestuoso. Ela,

 por^m, est£ disposta a se conter, assumindo atitude rackmal; sufo-

cando seu eu emocional, mesmo que depois desmorone. E comega:

“Olhe, agora eu quero uma definigao OBJETIVA da sua posigao

diante da vida. E esquega o Tio. NAO E COM ELE que eu estou* 

 pra casar. E com vocS; e 6  com voce que eu tenho um problema a

resolver. O problema 6:  eu, voce, e a vida que tfnhamos decidido

compartilhar.  H i  uns quinze dias, comecei a me sentir indmamente

inquieta. Nao sabia por que motivo, mas o fato 6  que essa inquieta-

gao, que parecia estar acontecendo tao fundo no meu ser que eu nao

 podia percebe-la claramente e compreende-la, acabou aflorando co

mo angiistia; uma angustia tao forte que, ontem h noite, praticamente

nao dormi.

“Ja li todas as reflexoes do Tio que voce tinha lido, conforme ha-

vjfamos comb in ado. Ali&s, vou busc5-las, porque, de qualquer ma-

neira, quero que voc6 leve.” - E se levanta e sai da sala, visivel-

mente nervosa, tensa, mas decidida.Victor sente uma pungente contragao no coragao. Viera esperan-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 260/411

goso de que o amor desse o seu poderoso toque e os atirasse nos

 bragos um do outro. Entao eles se fundiriam emocionalmente, na

agitagao nervosa de um complexo estado de dor e esperanga e anseio

de felicidade. Ocoirera-lhe mesmo que o fogo da paixao sensual

acabaria reduzindo a cinzas aquela torturante afli^ao; e que os ven-

tos ben6volos do amor, depois, soprariam para bem longe as cinzas

nefastas. Paixao sensual!. . . Isto! Assim se dissiparia a energia re-

 presada por aquela tensao, tao angustiante. Mas a decidida atitude

da namorada fora poderosa resistencia ao livre e amoroso fluir da-

quela energia.

E agora ele se sente mais tenso e preocupado. Respira fundo; uma

vez, duas, trSs e solta um longo suspiro. Relaxa. Fecha os olhos e se

abandona aquela expansao da consciencia, que parece sair pelo topo

da cabega, qual rosa mdgica, abrindo em segundos suas p6talas e

oferecendo-as aos raios do Sol. Luz, deseja. Inspira§ao busca, na-

quela breve comunhao com o Espfrito do Espago.(“A verdade! Senti-la em meu amago e expressd-la com fidelida-

de. Como pode haver amor fora da verdade? Amor e mentira? Ab-

surdo!”) —Ouve passos. Alba que volta. Percebe que ela estivera

chorando, mas nao comenta; respeita e aguarda em silencio. Ela re-comega o seu desabafo:

“Af estao as reflexoes do Tio. Quando voce for embora, nao es-

que^a de levar.” - Respira fundo, exala forte, e prossegue:

“Bem, como eu ia dizendo, quero uma definigao CLARA, DI

RETA E OBJETIVA, da sua posi§ao diante da vida. Todo esse tem

 po em que temos sido namorados, tenho me sentido encantada com

voce, como acontece em todo namoro sincero. Varias vezes me as-

sustei com a sua visao. . . nem sei como dizer. . . diferente, inco-mum, ds vezes parecendo mesmo esdruxula e - por que nao dizer? — 

fantdstica, da vida. Mas acabei sempre. . . me aninhando nos seus

 bragos. Seu calor e seu carinho me davam uma ilusdria sensagao de

 prote§ao, e eu botava uma pedra em cima daquela preocupagao.

Acabava aliviada e esquecida.

“Pois bem, agora nao quero fazer isso. Seu carinho e a nossa sen-sualidade eram essa pedra com que eu reprimia aquela ddvida, que,

no entanto, voltava sempre a me inquietar. Afinal, se nos casdsse-mos, nao iriamos viver entre carinhosos abra§os e a excitagao e o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 261/411

gozo do sexo. Terfamos momentos disso. Mas seriam isto mesmo:momentos. A MAIOR parte do tempo, serfamos voce e eu, cada qual

com sua visao da vida, e a compulsao de vive-Ia conforme essa vi-

sao. E €  af que eu estou sentindo que nao combina.”A jovem faz uma pausa. Victor nada fala, disposto a deixa-la de-

sabafar; por sentir que 6 disto que ela precisa, e por esperar que as

sim ela se acalme e haja possibilidade de ser evitado o rompimentoque os ameaga. Ela continua:

“Voce parece encarar a vida como  passagem para algo que voce

mesmo considera mais importante, mais valioso, maior em todos os

sentidos. Por isso parece indiferente aos valores que todo mundo re-

conhece e procure, na prdpria vida.

“Ja eu nao sinto assim. Prefiro encarar a vida como a tenho de

viver aqui e agora, no mundo como ele 6, e me sentindo, eu mesma,

gente como toda gente; pisando aqui e sendo pisada ali; ferindo aqui

e sendo ferida ali; ora gozando, ora sofrendo; e tentando me equili-

 brar e subsistir, e mesmo veneer , neste mundo maluco, ou neuroti-

co, como ele €,  sabendo que nao posso mudd-lo nele prdprio nem

quero mudd-lo em mim mesma,  como voce propds outro dia. Naosinto a menor compulsao neste sentido e nem sei se concordo real-

mente com isto.

“Pra mim, portanto, a vida nao 6  passagem; 6  isso af que eu tenho

de viver, como todo mundo: curtindo o miximo de bons momentos,

lutando pra veneer, entusiasmada com o meu pnSprio esforgo de au

to-afirmagao, e fazendo tudo pra nao softer; inclusive me aneste-

siando, se e quando necessirio, com uma BOA NOITADA, um bom

 papo furado, cheio de bobagens que me fagam rir. . . e, enfim, qual-

quer coisa que me ajude a . . .”

“A botar uma pedra em cima.” - Interrompe Victor, com ar muito

grave, levado por um impulso autom^tico que nao tem tempo de re-

 primir.

Alba, surpreendida por essa interrupgao, sente um hiato na cor-

rente do seu desabafo. Ouve e entende a observagao de Victor, num

sutilfssimo lampejo; ao mesmo tempo que percebe o tom contestat<S-rio, sente que cala fundo, aquela inesperada observagao. Pergunta:

“O que?”

“Nada. Desculpe. Eu nao pretendia interromper. Continue.” -

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 262/411

Diz o jovem, na mesma atitude grave e de impressionante seguranga.

E enquanto Alba hesita entre o sutil impacto daquela observagao e o

Irabalho mental de retomar o fio do seu desabafo, ele pensa:

(“Veio e passou. E €  verdade. E calou fundo, eu sei, porque ela 6  

inteligente e sensfvel. E me ama, como eu a amo. Esse amor hd de

triunfar, na verdade que venha e passe e cale fundo nela, que 6  inte

ligente e sensfvel.”)

Alba, recompondo-se, decidida ainda a resolver o seu problema

“racionalmente” , finge ignorar a observagao de Victor, e recomega:

“Entao i  isso: vejo a vida como todo mundo vS. Por que nao pos-

so ou nao devo viver como todo mundo? Sendo como sou, na vida

como ela 6, no mundo como ele 6? Pelo menos uma garantia eu sei

que tenho: de que nao estarei sozinha. Agora digo no seu estilo. .

- Hesita. Mas nao quer cottar o fluxo do desabafo e teme nova inter-

rupgao que a fizesse vacilar ainda mais. Prossegue entao:

“. . . ou do Tio: “legiao sou, nisso de preferir viver como todo

mundo” . Nao estou sozinha e nunca vou estar sozinha. Mas com vo

ce e a sua visao da vida, nao sei; nao me sinto segura. Tenho medo

de ficar sozinha, COM VOCE! Voce e eu. Excegoes. S6s num mun

do cheio de gente; por reprovarmos esse mundo e essa gente, numa

visao incomum - e o que €  pior, talvez pretenciosa - da vida.

“Que vamos fazer, voce e eu, sozinhos e alienados do mundo?

Sentar e meditar o tempo todo? Ou ler e discutir reflexoes do Tio e

ensinamentos de Jesus e Gautama e de sei-16-mais-quem?”

“Vamos sentar e meditar. Vamos ler e discutir reflexoes do Tio e

ensinamentos de Jesus e de Gautama e de sei-16-mais-quem.”

“O tempo todo?! Talvez voce.. .”

“O tempo todo? Quem disse isso?”

“Hein?!”

Alba hesita novamente.

Victor, agora confiante em que a crise vai ser superada, concen-

tra-se em seu amor e o visualiza como nuvem mdgica de sutil vibra-

S§o, que envolve a namorada e nela penetra e vai alimentar uma

chamazinha maravilhosa que arde ainda em seu pungido coragao.  J i 

usara este recurso, diante de pessoas angustiadas, nervosas, aflitas,

ou muito preocupadas; e constatara sempre, maravilhado, sua efici- 

cia. Repete portanto sua visualizagao; como se num sutil e poderoso

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 263/411

comando mental fizesse a prdpria esseneia do Espfrito do Espago in-

fundir-se na namorada, inundando-a de luz e amor. Sabe que, ha-

vendo nela, em sua psique, a minima condigao de receptividade a is

so, o maravilhoso efeito logo haveria de se fazer sentir. Finalmente,num leve suspiro, libera o fia t  supremo e definitivo. Volta, enfim, a

atentar mais concentradamente para o desabafo da namorada, que j&

se reinicia.* 

“Por favor, nao tente me confundir. E vital que eu diga tudo o

que me venha h mente agora. O fato 6  que, enquanto estivamos len-

do e discutindo as primeiras reflexoes do Tio, senti-me atrafda. Voce

sabe que eu gosto de filosofia e psicologia. Por isso achei interes-sante considerar a filosofia e a psicologia de um leigo, livremente;

isto 6, sem a confrontar com filosofia e psicologia como construtos

academicos, devida e precisamente formalizados.

“Mas a partir daquela exposigao sobre contemplagao, fui automa-

ticamente induzida a tentar na prdtica. Nao pude evitar; foi como se

eu tivesse passado por uma “iniciagao feiticeira”. E comegaram a

me acontecer coisas estranhas, incomuns, sensagoes esquisitas. A

 principio fiquei maravilhada, porque parecia que eu. . . sei 1£. . .

estava ficando mais viva!  Isto: parecia que o fen6meno vida,  em

mim, estava ficando mais intenso. E foi duplamente maravilhoso,

 porque eu sentia isso em mim e fora de mim,  nas coisas, nas pes

soas, nas plantas.. . em tudo, enfim.”

Sem o perceber, Alba mudara o tom de sua voz, como a reviver,

naquela recordagao, a sensagao maravilhosa de VIDA que entao co-

nhecera. Victor nota este auspicioso sinal e d£ mais um toque no processo de recomposigao j£ desencadeado na jovem:

“A magia da vida.”

“Hein?! Isso af. S<5 que nao ficou assim. Passou a fase de euforia

e comecei a softer uma aguda sensibilidade para com os problemas

do mundo; quero dizer, das pessoas. Comecei a sentir a afligao dos

outros como se fosse minha. E a notar o egocentrismo de todos, in

clusive o meu pn5prio egocentrismo. Comecei a notar nos meus amigos e parentes atitudes egofsticas que, antes, me passavam desperce-

 bidas.

“Foi horrivel! Comecei a me ver feia; a ver os outros feios; a ver

o mundo feio. Parecia que todo o peso dos pecados dos homens era

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 264/411

colocado sobre a minha estrutura psiquica e ela nao aguentava e co-

me^ava a desmoronar. Nao €  mole voce comegar a perceber, mesmo

nos entes mais queridos, uma mentalidade pequena, estreita, porque

egocentrica, e sentir que ai esti o ceme do problema da humanidade

no mundo.’*

“Nao lembra Jesus?”

“Hum? A h .. . sim:

‘‘Pois vim causar divisdo entre o homem e seu pai; 

entre a filha e sua mde 

e entre a nora e sua sogra.

‘ 'Quem ama seu pai e sua mde mais do que a mim, 

nao 4 digno de mim;. . .“Mas isso 6  tem'vel!”

“E, sim. Quem disse que nao 6?”

“Mas, entao.. .”

“Escute: h i pouco voce falou, a prop<5sito da euforia do seu des-

 pertar para a magia da vida, que “nao ficou assim”. Pois bem, agora

eu lhe digo que NAO VAI ficar assim.

“Muitas pessoas desejam alcangar o fmo discemimento dos  si- 

 bios, que tanto admiram e chamam de luz.  Desejam tomar-se ilumi- 

nadas. Mas nao se apercebem de que estao falando de discemimen

to. E de que esse discemimento envolve perspicicia extraordiniria,

entendimento superior, e essa aguda sensibilidade i  psique humana

que voc6 ]£  conheceu num primeiro despertar.”

Alba escuta atentamente, sem perceber que  ) i   se predisp6s ao

diilogo, esquecida do seu desabafo. Victor continua:

“Demonstraram os grandes iluminados perspic&cia extraordiniria,

entendimento superior? Pois tamb^m havia neles agudfssima sensi

 bilidade k  humana afligao e incomum capacidade de penetragao no

 psiquismo do semelhante. Ao mesmo tempo, foram eles pn5prios os

mais veementes exemplos de amor e compaixao, como em Jesus e

Gautama.

“Por isso repito: NAO VAI FICAR ASSIM. Virao sim, sucessi-

vas feses dessa maravilhosa empatia; mas elas serao cada vez menos

 perturbadoras, porque viri tamb6m o desenvolvimento daquele outro

aspecto da ilumina^ao: o entendimento. Voce mesma iri encontran-

do seus pontos de equilfbrio, na tolerancia, no perdao, na presta^ao

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 265/411

de servigos, etc., e na confianga nas leis que regem a natureza do

Ser C6smico de que voce €  parte integrante.

“Quem almejar a luz dos sabios, lembre-se de que eles foram ou

sao homens.  E homens eram, quando ainda nao podiam ser exem-  plos.  Que sentido tem, exemplo,  se aquele a quem 6  exemplificado

nao e essencialmente igual   ao que exemplifica? De que serve,

exemplo,  se aquele a quem 6  exemplificado nao pode  se tomar co

mo o que exemplifica?”

“Puxa! Nunca pensei nisto. Mas lembra Jesus, novamente:

" . . . aquele que ere em mim, 

 fard tambem as obras que eu /ago, 

e outras maiores fard. .

“E; lembra sim. De qualquer forma. . . voc£ pensa que ainda po

de evitar? Que ainda pode optar entre viver como todo mundo e co-

megar a ser excegao? Voce pensa que funcionou com voce porque

funcionaria com todo mundo, agora? Nao. Voce jd nao pode evitar;

nao pode mais optar. Chegou seu momento de despertar, em seu

automatismo no Grande Automato.

“Alegre-se! Bendiga a sua angustia, porque ela 6   aquele grandesinal de que jd Ihe falei. Os que desejam ser iluminados esperam

 prodigios como sinais. E 6 sd isto mesmo que fazem: esperar. Nao

 procuram se modificar, enquanto esperam os tais prodigios que con-

sideram sinais. E os sinais que esperam nao vem, porque nao acon-

tecem os prodfgios. Pois eu Ihe digo que 6   o maior prodigio, essa

angustia que 6  um grande sinal.”

“Entao, voce ja passou por ela?”“Passei? Sim. E ela veio de novo. Nao sei quantas vezes, mas

veio de novo. Cada vez me senti mais preparado para ela, principal-

mente depois que aprendi a bendize-la. Cada vez pude suportd-la

melhor, enquanto se modificava minha estrutura psiquica, ao sabor

do automatismo do Grande Aut6mato e atrav6s de minhas experien-

cias na vida e minhas prdticas de meditagao.

“Passei, sim. Sou exemplo, na escala. Voce 6  exemplo, na escala.

Os que vamos adiante somos exemplos para os que v&m atrds, na es

cala. E todos vamos chegar ao topo. Porque 6  automdtico, no Gran

de Automato.”

“E voce acha que ainda vird pra voce, essa angustia?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 266/411

“Certamente. Quem 6   que voce pensa que eu sou? Estou longe.Mas, que venha! Estou preparado. E 6   assim que vem: quando se

est£ preparado. Porque 6  autom£tico, no Grande Automata.”

“Mas6   tao aflitivo, esse sinal. . . A gente fica nervosa sem saber

a causa, ansiosa sem saber por que, fica. . . sei \£. . .  como tonta;

confusa e tonta; perde aquela sensagao normal dequem 6 , ou mesmo

de que 6 ! . . . Parece uma maluquice e apavora a gente.”

“E assim mesmo e voce j& nao pode evitar; nao pode mais optar.

Voce pensa que eu casaria com voce se nao fosse assim? Af 6  que

nao combinaria! Voce disse bem: carinho e sexo teriam seus mo-

mentos; mas, a maior parte do tempo, seriamos voce e eu, cada qual

com sua visao da vida e sua compulsao de vivS-la conforme essa visao pessoal. E se voce pudesse optar por “viver como todo mundo” ,

 perseguindo objetivos materiais egocentricos (talvez ftiteis) acima de

tudo, como disse h i pouco?”

Alba, agora cdnscia de que falara irrefletidamente, protesta, comsincera humildade:

“Nao lembre; eu acho que nem sabia direito o que estava dizen-d o . .

“Eu sei. Mas o fato 6  que, se voce ainda pudesse fazer aquela op-

gao, eu nao poderia acompanhci-Ia. Se tentasse, seria infeliz nisso, e

essa infelicidade acabaria ferindo nossa vida conjugal, porque traria

desarmonia. O mesmo aconteceria se eu nao tentasse. Eu seria infe

liz e nao poderia acompanh£-la. Para que casarmos, entao, perce-

 bendo que nao poderia haver comparikeirismo feliz?  Casar confian-

do na anestesia do sexo? J£ comentamos: seriam momentos. Que se

casern aqueles que combinem, fundamentalmente, em sua visao davida e na correspondente compulsao. Voce pensa que nao combina-

mos? Engana-se. Voce nao se conhece; ou agora est£ comegando a

se conhecer.”

“LA vem voce de novo. Jd lhe pedi: nao lembre.”

“Esti bem. Paramos aqui, entao? Nao 6 m i id£ia.” —E acrescen-

ta, sorrindo com ar maroto: “Assim podemos passar ao final feliz,

num abrago bem apertado e AQUELE beijo!. . . ”

Ela, soirindo tamb^m, aquele sorriso lindo que o jovem adora:

“ Ainda nao. Continuo querendo umas respostas objetivas, se possfvel.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 267/411

“Concordo com a sua tese do companheirismo feliz. E entendi

que esse companheirismo, na sua tese, inclui e preve momentos diff-

ceis como o que acabamos de viver. Fora disto, sua tese seria uma

visao imatura do casamento e da prdpria vida. E sei que posso con-

fiar no seu discemimento. Percebo claramente a diferenga entre mo

mentos diffceis no companheirismo de pessoas maduras e compul-

soes de vida divergentes.”“Quais sao entao as respostas objetivas que voce quer?”

“Deixe ver. . . Bem, primeiro - e nao pense que esta pergunta 6  

uma recafda da angustia. .. por que, objetivamente (insisto), a gente

nao pode ou nao deve viver como todo mundo?”

“Eu poderia come^ar perguntando: que 6  “viver como todo mundo”? E: como estd vivendo  todo mundo? E voce mesma, se pergun-

tasse isso e nao respondesse, mas deixasse que fosse respondido em

voc£, como diria o Tio, encontraria a resposta. O fato, por£m, 6  que

voce j£ respondeu, quando disse:

. e mesmo veneer, neste mundo MALUCO, ou NEUROTI- 

CO, etcr 

“E realmente meio maluco ou neurtftico, este mundo dos homens

(por primitivismo e ignorancia). VocS nao quer que ele continue assim. Nenhuma pessoa inteligente e sensfvel, sensata, o quer assim. E

como poder# ele mudar para melhor? Tao-somente atrav6s de algum

sistema coletivo perfeito? S<5 a discussao desse hipotetico sistema

 perfeito j£ demonstraria sua impossibilidade. Lembra-se da metifora

do vaso com botoes de rosa?”

“Lembro. E me pareceu muito boa. E bonita.”

“Pois 6. E preciso melhorar o sistema. Mas isto nunca serd solu-

§ao final. A menos que se aceite a “felicidade” de uma sociedade dehomens “robotizados”. Estou certo de que nao 6  isso que voc£ e eu

idealizamos.

“O coletivo 6   segundo. O individual 6  primeiro. Como pode ha

ver dois, dez, cem, mil, sem haver duas, dez, cem, mil vezes UM?

Portanto, quem quiser ver o mundo modificado para melhor, modifi-

que-se a si mesmo para melhor - porque o primitivismo 6   de cada

um de n6s e de todos n<5s. E, se tiver compulsao e qualidades para

tanto. adote uma profissao em que possa trabalhar por um sistema

melhor; segundo suas caracterfsticas e aptidoes pessoais, €  claro.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 268/411

“Falou. Estou satisfeita. Seu argumento 6  objetivo e razoavel.”

“Segundo..

“Bem, segundo.. .duas questoes:”

Alba se levanta e passa a caminhar de um lado para outro, enquanto fala:

“Sempre objetivamente, qual 6   o papel dessas praticas de con

templagao e meditagao? E, quando a gente entra nessas fases de an

gustia, o que 6  que pode fazer?”

“Af nao pode ser tao objetivamente assim. E se nao for tao obje

tivamente assim, a primeira pergunta responder^ a segunda.

“Objetivamente, que Ihe posso dizer? Que nao utilizamos senao

uma.parcela pequena do nosso potencial psfquico? E que, atrav£s dacontemplagao e da meditagao “desfantasticadas” , inteligentemente

 praticadas como fungoes naturals da mente, o recurso a esse poten

cial psfquico natural  ser£ muito maior? E que, deste modo, do poeta

ao cientista, todos serao mais inspirados em seu trabalho? Ponha isto

nos termos da psicologia “devida e precisamente formalizada” , se

voce preferir. Em essencia, duvido que haja diferenga. Se houver,

fico com o meu construto.”

Victor tambem se levanta e, encostando-se na estante de livros,

arremata:

“De qualquer maneira, essas artes da abstragao, para recurso aos

nfveis mais profundos da psique humana, ou da psique universal,

nao sao varinhas de condao. As experiencias da vida, com seu jogo

emocional, tem papel decisivo a desempenhar.

“Certa vez o Tio me ensinou uma arte que chamou de “chave-de

-ladrao” . E frisou: “hd a chave e h6 o ladrao; sem a chave, o ladraonao abre todas as portas; sem o ladrao, a chave nao abre porta algu

ma” . E preciso sempre lembrar isto. Contemplagao e meditagao, co

mo o Tio as entende, sao recursos psfquicos naturais que podem fa

zer grandes coisas por quem esteja preparado para empregi-Ios.

Mas, redundante como isto possa parecer, nao estanS preparado

quem nao  se preparar.  E nao se preparara quem nao contemplar emeditar.”

Alba aproxima-se de Victor e, encostando seu corpo ao dele, ra-diante de amor e paixao, diz:

“S6 mais uma pergunta..

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 269/411

O beijo, mais ardoroso porque h i  muito contido, interrompe-a.

Depois, ela se afasta, os dois suspiram, e ela recomega, os olhos

faiscando de contentamento:“O que era mesmo que eu ia dizendo?. . . Sim. S<5 mais uma per

gunta: como voce p6de estar tao seguro de que eu nao faria a opgao

errada?”“Ora, porque eu me conhego muito bem.”

“Como?! Porque voce SE conhece muito bem?”

“Isto mesmo. VocS estranha que isto seja possfvel entre nos, que

nos amamos muito especialmente? Que empatia pode ser maior do

que a desse amor? No entanto, certa vez um poeta, que nao podia

me atnar o quanto voce me ama, olhou de repente pra mim, sentiu, edisse: “vou fazer um soneto pra voce” . Sentou &m^quina e s<5 le-

vantou pra me passar um papel, exclamando cheio de contentamen

to: “veja que raio X” ! E foi “raio X” mesmo. Ora, muito mais po-

deroso €   o “raio X” que esta automaticamente funcionando entre

vocS e eu.”

“Como era o soneto?”

O Jovem:

“Deixe ver. . . —Victor poe a mente passiva e, depois, comega arecitar:

* ' ‘AtS que enfim achei na luz dum sonho,

Toda a gldria que fulge em teu destino;

Vejo-te calmo e sempre mais risonho,

 Preparando o ideal quase divino.

“Vejo em teu semblante leves tragos, Duma saudade que te fe z outrora,

 Imaginar alguSm presa em teus bragos,

Que passou como a nuvem c£u em fora . . .

"O, arquiteto da bondade alheia,

Quanto feres a tua prdpria vida,

 Imaginando a paz que o mundo anseia!!!

* SonetodeIvanFernandesLima{Sergipe,1960)

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 270/411

‘‘Levas nesta alma que se fa z de tudo,

Uma cangao de anseios, escondida,

Como se fosses um piano mudo!" 

“Puxa! Impressionante!”“Tarab6m eu fiquei impressionado. Nunca esqueci, nem o poeta,

nem o fato, nem o soneto. E gramas ao Tio o piano mudo come^ou a

aprender a tocar. E continua aprendendo. Quem sabe, um dia dard

concertos e muitos se maravilharao da sua cangao de anseios.”

“Olhe, se depende do meu testemunho,  j i  come^ou o concerto;

 pra mim. Sabe? Eu me maravilhei, hoje, como em outros momentos,

da sua cangao de anseios. Por mais “diffcil” que fosse a perguntaque eu Ihe fizesse, voce nao se detinha um segundo sequer, pra pen

sar, e a resposta vin ha.. . excelente, magnffica!”

‘J£ Ihe disse: 6  autom£tico.”

“Convencido!..“Do meu amor por voce? Sim. Imagine a cangao (que nao serd de

anseios) que o piano tocarii quando for motivado pelo amor univer

sal. Quando o ego nao estiver!”

“Tudo bem. Mas por enquanto ele est£ e eu gosto muito disso.” -E se oferece voluptuosamente a novo e ainda mais ardoroso beijo.

Afastam-se afinal. Propoe entao Victor, com ar maroto:

“Ei! Que tal uma noitada?”

Ela, simulando zanga:

“Vocfe €  um chato, sabia?”

E d e i x a m o s o s d o i s r i n d o , o r i s o s o l t o e p u r o d e g e n t e f e l i z ,

q u e e c o a e s e p r o p a g a n o E s p a g o ,

o n d e o E s p f r i t o n S o e c o a n e m s e p r o p a g a ,

m a s e s t d e 6  s e m p r e . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 271/411

A PARTE QUE NAO PENSA

D o E s p f r i t o 6 , e s s a p a r t e - q u e - n a o - p e n s a ,

n a L u z q u e a s s o m b r a s p r o j e t a

e q u e n a s s o m b r a s m e s m a s b r i l h a ,

e v i v a s e f a z . . .

Alba volta a si. Sentada, encostada numa arvore, toma conscien

cia de si mesma, da sensagao do tronco em suas costas, da folhagem

vi§osa e abundante ao seu redor, levemente soprada pelo vento ame-

no, e da £gua do agude, que ve em por§oes de diferentes extensoes,

 por entre as irvores e a folhagem £ sua frente.

Suspira. Sente-se profundamente em paz. Olha aqui e ali, o am- biente, que lhe parece particularmente belo. Vem o pensamento, es

 pontaneo:

(“Paz. Se para nada mais servisse essa contempla§ao, a paz que

sinto ao voltar k  consciencia comum }£   a justificaria. Neste mundo

neurdtico em que vivemos. . . uma bengao, eu poder e saber entrar

nesse estado contemplativo e dele emergir em paz. Aqui, neste am-

 biente tao propfcio a isto, ou no meu apartamento, em pleno burbu-

rinho da cidade.

“Tinha razao o meu jovem amado.. . Jovem? As vezes ele parece

ter a idade dos s6cuIos!”)

Olha para o local onde Victor se sentara. Vazio.

(“Aonde ter# ele ido?. . . Bem, nao importa; daqui a pouco eleaparece.”)

Caminha at6  a beira do agude. P£ra a pouco mais de um metro da

£gua. Acocora-se. Cone lentamente os olhos pela margem oposta,imaginando que ela encerre mistirios e segredos, em detalhes mil de

manifesta$6es de vida.

(“VIDA. . . esta palavra jd ganhou sentido migico, pra mim .. . A

outra margem. . . da vida. Manifestagao sutil em mist€rios e segre

dos. .. Talvez nao seja m£  imagem. . . ”)

Enquanto pensa, passa a mao direita pelo chao, como a querer

sentir, nesse contato com o solo, amorosa comunhao com a Mae Ter

ra. Paz. . . comunhao. . . sereno contentamento, na ausencia total de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 272/411

desejos, expectativas, preocupagoes. A mao continua a deslizar porsobre o chao. Uma pedrinha.

Ploft! A pedrinha mergulha na agua do agude, provocando uma propagagao ondulatdria em cfrculos.

“Sugestiva, essa propagagao circular de onda” . - A voz de Victor, que vem se aproximando a passos lentos.

Alba, olhando para o jovem e sorrindo, feliz em reve-lo:

“E, sim. Expansao da consciencia, para a outra margem da vida.”

“A outra margem da vid a.. . Vida tem margem?”

“Pronto. Chegou o destruidor de imagens po€ticas. Faga o favor

de respeitar minha imagem. Onde esti o RESPEITO de que voc£

mesmo tanto fala?”_

  * “T i bom. E bonita sua imagem.” - Senta-se ao lado da namora

da. Beija-a. Fita-a depois, nos olhos, sorrindo o seu carinho de ho

mem apaixonado, enquanto encosta a mao, suavemente, no rosto da

 bela jovem. Ela inclina a cabega e ap6ia o rosto naquela mao amiga

que lhe oferece o calor da vida. Fecha os olhos e deixa-se ficar as

sim por alguns segundos, como a querer desfrutar em sagrada inti-

midade o afeto que parece fluir da mao do jovem e penetrar-lhe o

rosto. Depois, abre os olhos e, enquanto sorri, feliz, abaixa a mao deVictor, cruzando-a com a sua.

E assim ficam os dois, em doce abandono, fitando-se nos olhos

aquele olhar migico que s6  os que j i amaram conhecem.

Algum tempo depois, ela rompe o silencio:

“Sabe? Ainda h i uma coisa que eu queria que vocS me esclare-

cesse sobre meditagao, ou contemplagao; enfim, aquela abstragao

que voc€ me ensinou a tentar.”

“Umas coisas? Sd umas coisas? Quase nao dissemos nada, ainda.

Voce pensa que podemos esgotar o assunto, vocS e eu? Ou que al-

gu6m pode esgoti-lo? Quantos anos voce ainda tem de vida? Pois

esse 6  o numero de anos em que voce vai ter coisas a dizer ou a que

rer saber, sobre meditagao.”

“Acredito, mas, na MINHA faixa de evolugao, sinto necessidade

de mais informagao, AGORA. Aliis, se entendi o que o Tio disse,

isto €  util; ajuda a compreender e a planejar; ajusta a estrutura psf-quica da gente, predispondo-a Aquele desabrochar de que voces fa-

lam.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 273/411

“Certo. Ganhou.”

“Puxa!  At€  que enfim!”Os dois sorriem. Victor pergunta:

“O que €  que voce quer saber?”“Estive pensando ontem: Voce estabeleceu um paralelismo entre

o estado de meditagao e o de sono profundo e sem sonhos. Entao,

qual 6  a diferenga entre dormir e meditar?”

O jovem deixa escapar um leve e curto riso. Ela:

“U 6.. . qual foi a graga?”

“Primeiro voce deu a resposta. Depois fez a pergunta.”

“Como assim?”

"Ajusta a estrutura psiquica da gente, predispondo-a aquele de sabrochar.  .

“E isso, entao?” —Pergunta Alba, enquanto se poe reflexiva.

“Pelo menos assim entendo. Como um pr€-ajuste da estrutura psf-

quica, para algum objetivo que se tem em mente. Quando voce se

deita e se entrega ao sono sem alguma id£ia, ou algum desejo espe-

cffico - como o de que sua mente seja iluminada para a resolugao de

um problema particular, ou para a compreensao do sentido geral da

vida, etc.; ou o de que sua psique seja instrumento do automatismo

do Grande Aut6mato em beneficio de algum ente querido ou do seu

semelhante em geral - entao, voce €  como um barco a deriva. O au

tomatismo do Grande Automato regerd a sua deriva, mas voce estard

como jogada pra Id e pra cA, ao sabor de sei 1£ eu quantos e quais

fatores fisioldgicos e psicoldgicos.

“Mas se voce, antes de se entregar ao sono, se concentrar por al-

guns segundos numa id6ia, num desejo, ou numa intengao (e so-mente em uma  intengao, um desejo, ou uma iddia), e liberar isso de

sua consciencia num suspiro, como num fia t  supremo, ou num todo-

 poderoso amem,  entao, nao estar£ a deriva. Tera estabelecido um

rumo, por assim dizer, para o automatismo do Grande Automato em

voce.”

“E. . . muito interessante. Vale a pena fazer experiencia com isto.

Melhor do que recitar mecanicamente alguma prece habitual. Mas

como 6  que eu vou saber que deu certo?”“Que deu  certo? Depois, 6   claro. E nem sempre voce teri com-

 provagao. Mas €  preciso CONFIAR e liberar aquele fiat,  sem a me-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 274/411

nor id6ia de ter alguma sensagao especial durante o sono, e sem

qualquer preocupagao de comprovagao posterior. Principalmente es

sa preocupagao 6  um toque de drivida na CONFIANQA ABSOLU

TA que deve prevalecer no instante do fia t ” .

“Entao €  como a FE a que Jesus tao freqiientemente se referia.”“Suponho que sim.”

“Me diga um coisa: voc£ j£ teve comprovagoes?”“J£; muitas vezes. Uma, recente, foi particularmente impressio-

nante. Eu vinha lutando com um  s6ho  problema profissional havia

uns trSs dias; e noites! Nao conseguia encontrar a solugao. Na ter-

ceira noite, cansado, preocupado e desanimado, tive de me deitar

cedo. Foi a pausa de que eu precisava para me lembrar de aplicar es

ses recursos especiais. Aliis, 6  curioso como a gente nao se lembrade aplici-los e fica lutando de modo exclusivamente racional para

resolver os problemas. Se desde o inicio lembrasse de combinar ou

altemar a racionalidade com uma esp£cie de atitude contemplativa

ou meditativa, com certeza resolveria mais rapidamente, melhor e

com menos esforgo, os mesmos problemas. Creio realmente nisto e

estou praticando.”

“Sim, mas como foi aquela comprovagao?”

“Bem, primeiro pensei em sentar, relaxar e buscar na abstragao ainspiragao de que necessitava. Mas estava tao cansado e com tanto

sono, que desisti. Sentei na cama, relaxei, fechei os olhos, e me

concentrei na id6ia de que seria inspirado durante o sono. Essa con-

centragao nao durou mais de cinco ou dez segundos, suponho. De

 pois, num suspiro, liberei o fia t,  como num comando supremo, e

deixei o corpo tombar na cama feito pedra.

“De repente acordei. Tudo escuro, ainda. Acendi a luz e me es-

 preguicei um pouco. Senti-me estranhamente “aceso”, alerta. Levantei-me e vi, ao lado da cama, um livro em que estivera procuran-

do, em vao, a solugao para o meu problema. Apanhei o livro e o abri

ao acaso. Na pdgina certa! Os olhos deram exatamente com o pard-

grafo que continha a indicagao para o raciocfnio correto a fazer.

Yinte minutos de cdlculos simples, e o problema estava teoricamente

resolvido. Ainda nao eram quatro horas! E eu que raramente acordo

no meio do sono normal e, naquela noite, estava extremamente can

sado. . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 275/411

“Nao dormi mais. Nao precisava; nao sentia cansago nem sono.

Mais tarde, apliquei na pr&tica aquela solugao tedrica e fiincionou perfeitamente.”

“Puxa! Impressionante, mesmo.”“Pois 6. Tive muitas outras comprovagoes menos impressionantes

e algumas tao impressionantes como esta. Nos casos em que h i um

 problema objetivo especffico, a comprovagao 6  mais evidente; e im

 pressionante.

“Ha casos mais sutis, quanto k  iluminagao da mente pela aplica-

gao dessa. . . dessa “sonomagia” . A pessoa pode adormecer com um

 fia t  para iluminagao geral da sua mente e, no outro dia, sentir-se es- pecialmente lucida e perspicaz para lidar com os problemas normais

de sua profissao ou ocupagao. Ou, mesmo dias depois, ter um “insi

ght” (como se diz em Psicologia, creio) quanto a alguma questao

que h£ muito a intrigava. Sao inumeras as aplicagoes imagin£veis

 para essa “sonomagia” , inclusive no campo da saude.

“O fato 6   que, para mim, o sono adquiriu especial importancia.

Creio que muitas pessoas sofrem de insdnia porque a provocam psi-cologicamente, numa esp^cie de auto-sugestao inconsciente, nao de-

Iiberada. Para elas, o perfodo de sono 6   tempo perdido, quanto ao

seu empenho de fazer coisas, realizar mil trabalhos, ganhar dinheiro,

etc. Por isso, acabam soltando um fia t  inconsciente para nao dormir.

Essas pessoas precisariam modificar sua visao da vida e, na nova vi

sao, incluir o sono como perfodo muito importante. E 6   claro que

isto implicaria que elas aprendessem a desfrutar o fenomeno vida em

si mesmas, independentemente do esforgo e mesmo do desejo deconquistar e fazer coisas. Isto 6, aprendessem a sentir essa indescri-

tfvel magia de ser,  como entes vivos num universo vivo e vibrante,

a que o Tio tanto se refere. E isto requer o que eu chamei h£ pouco

de atitude contemplativo ou meditativa.

“Em suma, sinto-me encantado, maravilhado, com o sono. Quan

do nao tenho algum problema especffico a resolver, ao me deitar me

concentro no sentimento da magia do prdprio sono, desse migicoautomatismo no Grande Ant6mato, necessariamente bom, constniti-

vo, positivo e ben6fico. E libero aquele amoroso fia t  para ser util,

magicamente litil, a algu£m, durante o meu sono. Ou simplesmente

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 276/411

me entrego, feliz e confiante, contente com a minha vida encantada

no automatismo do Grande Ant6mato.”“Tudo bem. Mas, nesse caso, pra que meditagao? Se eu posso

usar o sono natural e profimdo como voce falou, entao.. . 6  s<5 fazer

isto mesmo. Quando acordada, cuidar da vida comum, e confxar ailuminagao da minha psique (e mesmo alguma cura de que eu neces-

site), ao sono. J<5ia! E al6  parece fdcil.“Sabe? Jd tenho conseguido me abstrair, atravfis da contempla

gao; e acho mesmo que jd fago uma id£ia da meditagao como aquele

“salto bi6nico para fora do campo gravitacional da cuca” . Agora,

desconfio que voce ainda nao me revelou algum outro aspecto im-

 portante da meditagao, como se o estivesse reservando para uma se-

gunda etapa de minha prdtica.”Victor, sorrindo e faiscando satisfagao:

“Viva! Bom, a gente lidar com pessoas perspicazes!”

Alba soni tamb6m, contente consigo mesma. Victor aperta invo-

luntariamente os olhos, um pouco, e fixa um olhar vago na dgua do

agude. Por alguns segundos, parece despercebido de tudo. Depois

comega a falar:“Sabe o que voce 6? Um termdmetro.”

“E nao duvido que seja mdgico, esse term6metro que eu sou.”“Isto mesmo. Voc6 6   um term6metro mdgico. Num termometro

comum, voce fomece calor ao bulbo e o mercurio sobe na escala.

Mas voce 6  um termometro mdgico; vai deixando de fomecer ener

gia —a sua energia de ser —a suas fungoes sensoriais e de pensa

mento e sua consciencia vai subindo na escala c6smica. Sua luz vai

aumentando; seu poder vai aumentando; seu amor vai aumentando, d

medida que sua consciencia normal ou comum vai diminuindo e vo

ce vai transcendendo as limitagoes de tempo, espago e concepgaoracional.

“Por isso voce 6   um termometro, ainda que mdgico; porque es

cala 6   a palavra-chave de sua nova fase de prdtica. Na medida em

que voce se toma menos consciente sensorial e racionalmente, nessa

medida voce estd “consciente em meditagao” , ou em “meditagao

consciente” , ou seja, em relativa  abstragao. E sao importantes, os

estados de abstragao relativa que voce pode alcangar. Primeiro, por

que pode alcangd-los mais facilmente; segundo, porque, a partir de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 277/411

certo grau de abstragao relativa, voce propicia sua mente ao que eu

chamei certa vez de osmose de milagre e m istirio.  Lembra-se?”

“Lembro. E se eu tivesse pensado nisso, voce nao precisaria estar

me dando esta explicagao.”

“Certo. Agora voce amplia seu conceito de meditagao, nele intro-

duzindo esta idtia de abstragao relativa ou parcial. Mesmo sem al-

cangar o estado de plena meditagao, na abstragao total, voce pode

obter, de um estado de relativa abstragao, os resultados que temos

comentado: tranqiiilizagao, inspiragao, melhoria da saude, etc.

“E, o que €  mais importante, atentando para essa migica ascensao

de sua consciencia na escala, como aqueie espectador passivo de

que j# lhe falei, voce ir# conhecendo mais intimamente o seu prdprioser como ente mental. E ir# se tomando cada vez mais apta a se co-

locar (a voce que 6  mente) instantaneamente em estado de abstragao

relativa tomando-se receptiva a inspiragao de que entao necessite.

Voce se tomar# apta a fazer isto atrav£s daquele migico ato volitivo

de que voce mesma j# falou. O Tio is vezes chama isso de “esvaziar

a mente de consciencia” , referindo-se, €   claro, k   consciencia co

mum, sensorial e racional. Voc6 “esvazia a mente de consciencia” efica mental e fisicamente passiva; de repente, como num lampejo,

 sente em seu amago a resposta a uma pergunta que tenha formulado,

uma intuigao,  ou um impulso de agir de certo modo que a leva, afi-nal, a resolver o seu problema. O essential 6   compreender a idtia

 basica de abstragao relativa de consciencia sensorial e racional. Os

exercfcios de contemplagao e meditagao, mais prolongados e em cir-

cunstancias e ambientes especiais, tem essa finalidade de tom#-la

apta a se colocar imediatamente em estado de relativa abstragao,

quando e onde  necessario. Afrnal, o halterofilista nao pratica seu

halterofilismo, no ginisio, para isto mesmo; ou seja, para erguer

halteres no ginisio.”

“Entendi perfeitamente. E cada vez me convengo mais da impor-

tancia de praticar essa arte de abstragao, como fungao natural da mi

nha mente. Gosto da concepgao do Tio a este respeito; “desfantasti-

cada” , como ele prdprio diria. Fungao natural da mente, no ser humano normal, para fins objetivos normais, e tamb^m para o fim

maior de promover a paz no mundo pela gradativa cessagao dessa

estdpida “guerra dos egos” . Deverfamos realmente nos desenvolver 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 278/411

(razoavelmente, €   claro, sem exagero) nessa arte maravilhosa, sem

exotismos; com a mesma naturalidade com que muitos procuramos

aprimorar nossos m^todos de pensamento e nossas habilidades psi-

comotoras.”

“Certo. E voce mencionou dois aspectos muito importantes: ra-  zoabilidade  e naturalidade.  Nao devemos praticar essa arte com

exagero, por perfodos muito longos e pretendendo prescindir total-

mente da nossa racionalidade. Apenas devemos pratic3-la tambem, 

incluindo-a inteligentemente em nosso viver didrio. Quanto k  natu

ralidade, acho que a devemos praticar assim como uma pessoa

aprende a datilografar, ou uma crianga aprende a andar; sem nos

questionarmos muito quanto a mecanismos (psicomotores, nos

exemplos que dei); aprendendo por observagao e vivencia, no automatismo de nossas fungoes naturais; por tentativa, no uso da capaci-

dade natural da nossa mente para aprender.”

Algo se move em certo ponto do agude e atrai a atengao dos dois

 jovens. Eles veem entao uma onda circular, que vai se propagando

ou expandindo at6 desaparecer. Permanecem contemplativos, os

dois, por algum tempo. Depois, Alba volta a falar:

“Que tal lermos a prdxima reflexao do Tio?”

“Boa id£ia. Vamos.”Encaminham-se para a pequena casa de madeira da chfcara que

um primo de Alba lhes emprestara. Entram. A jovem comenta:

“Foi melhor assim do que se a gente tivesse acampado, nao?”

“Foi, sim. A comunhao com a natureza 6  muito iltil e inspiradora,

mas quando mosquitos, moscas e outros bichos, deixam a gente ficar

quieto.”Os dois se acomodam, cada qual a seu gosto, e Victor inicia a

leitura:

"A PARTE QUE NAO PENSA.”

Alba, intenompendo:

“O Tio e seus tftulos. . . ”

“E, mas nao sao todos assim. Espere s6  pelos tiltimos.”

“Ei! Voce j£ leu todas as reflexoes?” —Pergunta a namorada,

sentindo-se traida no que os dois haviam combinado.

“Nao. S6  dei uma olhadinha.”

Ela, numa guinada de pensamento bem feminina:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 279/411

“S<5 voce mesmo. Eu j i  teria lido e relido todas elas.”“Ah, 6?!”

Ela, de novo, percebendo “o fora” e tentando conigir:

“Quero dizer, voce passou MAIS DE UM ANO com elas e naoleu. Eu nao teria aguentado.”

Ele, desconfiado:

“Pois sim. . .”

“Sdrio! Foi isso que eu quis dizer. Voce nem teve vontade de lertudo?”

“Tive, sim. Mas, por um lado, estive concentrado na luta do inf-

cio de exercfcio da profissao; por outro lado, nao, sei se por alguma

influencia feiticeira do Tio (desconfio que sim),- decidi mesmo ler

aos poucos, “digerindo” bem a mensagem de cada reflexao e como

que observando seu efeito na minha experiencia cotidiana da vida.

Hoje sei que fiz bem. Um sutil e valioso desenvolvimento acompa-

nhou essa “digestao” . E percebo claramente os fatores que se com-

 binaram para esse desenvolvimento: as pr6prias reflexoes do Tio,

minhas reflexoes sobre as dele, os exercfcios no uso intelectual da

“chave-de-ladrao” , os exercfcios de contemplagao e meditagao, eminhas experiencias na vida, estas iluminadas por tudo isso.”

“Ser£ que ele planejou?”

“Acho que nao. Se h i alguma didatica no Tio, 6.  . . autom&ica.

 Nao creio que ele tenha algum piano de instrugao.”

“T£. Agora, comece a ler a reflexao.”

Com voz clara, expressividade e boa dicgao, Victor comega a ler:

A Parte Que Nao Pensa

“Ih! Esqueci de rezar!”

E o jovem, que j i  se deitara, levanta-se pressurosamente, ajoelha-

se ao lado da cama e, de maos postas, murmureja mecanicamente um

Pai-Nosso, inteirompido em certo ponto por um amplo e prolongado bocejo.

“ . . . livrai-nos-de todo o mal. . . Am&n!”Apenas se extingue o som do “am6m” , aquele jovem dos idos do

Pai-Nosso antigo volta a se deitar, psicologicamente aliviado.  J i nao

dormiria em pecado por nao ter rezado. Em sua mente, portsm, a

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 280/411

consciencia da prece feita mecanicamente, sem a menor compene- 

tragdo.

“Nem prestei atengao direito as palavras do Pai-Nosso. . . As

 palavras. . . nunca pensei de fato no que elas significam! Ser£ que

adianta rezar assim? Quantos termos j£ rezei? Quantas Ave-Marias?Quantos Pai-Nossos? Tudo assim: mecanicamente; repetindo as pa

lavras sem consciencia de significado. Pior ainda: sem estar sequerconcentrado na ora?ao, ou no ato de orar! Por tr&s das palavras, me

canicamente repetidas, os mais variados pensamentos, estranhos k  

 prece e h circunstancia de orar. De que vale rezar assim? E . . . pare

ce que orar, de fato, significativamente e de modo eficaz, €  dificil.

Requer disciplina mental, na atengao concentrada no significado das

 palavras.“Disciplina mental. . . atengao concentrada. . . significado das

 palavras.. . significado. . . palavras. . .

“O sono vence, apagando da mente do jovem a inquieta^ao que

amea$ava sua paz. E ele adormece, compelido pela natureza a mer-

gulhar num estado sem som nem palavras, sem luz nem imagens;

sem qualquer sensagao que pudesse ser lembrada e expressa em pa

lavras.

“Estaria ele entao vivendo numa realidade transcendental, ou,simplesmente, na Realidade? E, quando acordasse, estaria essa rea

lidade oculta por tr&s do espesso v£u de sons, imagens e outras sen-

sa^oes, que invadiriam a sua mente? Ou, adormecido, estaria viven

do exclusivamente no corpo, com a mente desligada, exceto pelo

comando e controle de algumas fungoes vitais muito diminufdas?

Estas perguntas assaltam a mente do jovem, quando ele desperta na

manha seguinte. Havia j£ algum tempo que o fen6meno do sono feri-

ra sua mente e o intrigara.“Que 6 o  sono, afinal? Se me alimento bem e repouso bastante,

 por que ainda tenho de dormir? Por que me compele a natureza a es

se misterioso desligamento? Que fase ou parte do meu ser comanda

e controla essa fant&stica diminuigao da sensibilidade ftsica? O sub-

consciente? Um r6tulo; nao explica. Por que nao posso fazer voliti-

vamente o mesmo? Isto 6, quando desperto, se um barulho me inco-

moda, nao posso diminuir volitivamente a sensibilidade auditiva!”

Alba, interrompendo:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 281/411

“Que coincidencia! O sono foi um dos nossos temas, pouco.”

“E, sim.” - Concorda o jovem, e continua a ler:

A toalha desce e o rosto aparece no espelho. O cabelo desalinha-do e os olhos Ifmpidos e brilhantes.

“Que sou, por tris da aparencia que o espelho me revela? A parte

que pensa? Ou a parte que nao pensa, quando estou dormindo?”

A “parte que pensa”. Esta expressao viera &mente do jovem em

fungao do caso que lhe contara a senhora conhecida. Passava ela em

frente ao cemiterio, com seu filho, um garotinho, muito crianga ain

da. O menino pediu para entrar e ver como era. Ela consentiu. Ca-

minharam um pouco por entre os tfimulos e mausol&is. Depois, o

menino parou e ficou absorto, contemplando um tumulo. A mae permaneceu ao seu lado, calada. De repente, o garotinho perguntou:

“Mae, a parte que pensa nao esti ali nao, nao 6”?

A “parte que pensa”. . . Que misteriosa intuigao teri levado

aquele menino a dividir o homem em corpo e “parte que pensa”? E

a supor que a “parte que pensa” deveria ser imaterial e sobreviverao corpo?

 Nosso jovem ficara encantado com o caso do menino, emborasentindo-se mais inclinado a encarar a “parte que pensa” justamente

como a “parte que nao  pensa” . Acreditava, em concordancia com

filosofias orientais, que, se conseguisse parar de pensar, desperto

mas absorto do mundo, conheceria, por experiencia direta, o seu Eu

real. Ainda nao se decidira a trabalhar intensamente nisto, nem sabia

como deveria faze-lo. Lera um pouco sobre aquelas filosofias

orientais, e a jubilosa concordancia que sentira em seu amago pare-

cera extrair das profiindezas do seu prdprio ser uma nova concepgaoda vida.

Olhando-se no espelho, o jovem d i os ultimos retoques no cabe

lo. Depois, sai do banheiro.

Vamos encontri-lo, mais tarde, passeando na orla do mar, como

costumava fazer nas fifirias. E enquanto passeia, reflete. Vem a lem-

 branga da oragao mal feita, na noite anterior.

“Oragao mal feita; mecanicamente, sem consciencia de significa-do. Mas... qual 6  o significado?”

Alba, interrompendo de novo:

“Ei! Eu tamb6m falei em recitar mecanicamente alguma prece

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 282/411

habitual! Se aparecer mais uma coincidencia destas, eu vou comeg ara pensar que nao foi coincidencia.”

“Quem sabe? Mas nao conv6m fantasiar. Pode haver uma duzia

de coincidencias e serem isto mesmo: coincidencias.”

“T6 bom. Tem razao. Continue com o pensamento do tal jovem.”Victor, retomando a leitura:

“ Pai-Nosso que estais no C6u. . .

“Pai; Deus 6   pai? Que 6  pai? Homem que gerou um ou mais fi-

lhos. Deus 6  homem? Ou como o homem? A16m disso, o homem ge-

ra para fora de si mesmo. E Deus-Pai? Tambem? Nao podemos defi-

nir Deus. Nao, se definir € descrever a natureza de —Deus, no caso..

Mas formamos certos conceitos a respeito de Deus, que entendemos

como Seus atributos. Afirmamos, por exemplo, que Deus 6 onipre-sente; vale dizer, infinito. Se isto 6   verdade, entao, Deus 6   tudo.

 Nada pode ser senao Nele. E o nada 6  um absurdo. Isto 6, se a oni-

 presenga ou infinidade de Deus 6  premissa de que estamos convic-

tos, entao, tudo o mais tem de ser coerente com ela, sob pena de nao

estarmos sequer sendo capazes de logica.

“Por que entao oro a um “Pai”? Ainda que isto seja entendido

como linguagem do coragao, metifora sentimental ou po£tica, per

siste a id6ia de um Ser que esti fora do meu ser. Mas como posso euestar fora Dele? Entao nao 6  Ele infinito?

" . . . que estais do C£u.  . . C6u 6   lugar? Onde? Como pode

Deus estar em algum lugar? Entao nao 6  Ele infinito?”

O jovem senta-se na areia da praia e se abandona a contemplagao

do mar.A mare baixa. Ampla faixa de areia molhada, brilhando h luz do

Sol. E o mar, calmo como um imenso lago, salvo por suaves ondula-

goes. Aqui e ali, lampejo da luz do Sol, que se reflete nas 6guas.O m ar .. . a brisa fresca e lev e.. . lampejos de lu z .. .

A mente do jovem se esvazia. Parece-lhe sentir em seu amago o

sussurro do Espfrito do Espago, que vibra nele mesmo e por toda

 parte. Como a Ihe dizer 

“Busca-meem ti mesmo! Caiateu pensamento, tuas v5s palavras. Es

cutaminha voz no silSncio datua mente. Conhegoteu coragSo,melhordo

que tumesmooconheces.Teussentidoste iludem; tua raz5ote ilude.So-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 283/411

mente no coragSo podes chegar amim e me conhecer. E conhecer a ti

mesmo, em mim. Eu sou. E tu n§o6ssenSoemmim.Minha ieiprevalece,

sempre. Renuncia a ti mesmo e vive em mim. E, para estares em mim,

abandona tuas v§s palavras e concentra-te no anseio do teucoragSo! S6.

Deseja, ardentemente, e concentra-te no sentimento direto doteu desejo.S6.Minhaleifar£oresto.PorqueEusou,eminhaleiprevalece,sempre.”

Lampejos de luz. . . a brisa muito suave. . . o mar. . . a mar6,mais baixa ainda.

O jovem se Ievanta e inicia a caminhada de volta para casa. Sen-

tindo-se leve, algo et£reo, como se ainda nao se tivesse integrado

completamente ao corpo. No amago, o eco da sutil e felicitante vi-

 bragao do Espfrito do Espago:

"Escutaminhavoz nosilSncioda tuamente.. Teussentidos te iludem;

tua raz3o teilude.. . Deseja,ardentemente,econcentra-tenosentimentodi

retodoteudesejo.S6.Minhaleifardoresto.”

A noite, observamos esse jovem, quando ele se prepara para dor-

mir. Vemo-lo sentar-se na cama, cruzar as pemas, fechar os olhos e,segundos apos, vemos seu rosto iluminar-se num amplo soiriso. Um

longo suspiro e ele se deita, parecendo comunicar sua felicidade no

sorriso que persiste.

" E m c o m u n h a o c o m e l e , n o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

c a p t a m o s o s e n t i m e n t o q u e v i b r a e m s e u a m a g o :

a fe l ic id a d e n o p e n s a m e n t o p u r o ,

i n t r i n s e c a m e n t e i n d e p e n d e n t e d a p a l a v r a :

b e m - a v e n t u r a n g a n o s e n t im e n t o d ir e t o d e s e r , n o S e r.

" . . . abandona tuas v§s palavraseconcentra-tenoanseiodoteu cora

gSo!”

A “parte que pensa” se apaga e a “parte que nao pensa” submer

ge no sublime gozo da bem-aventuranga do Ser. No dia seguinte, ao despertar, feliz, muito feliz, sente o jovem

que fizera a mais profunda e eficaz de suas preces. Sem palavras.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 284/411

Afinal, Deus tem ouvidos? Que 6  primeiro: o sentimento direto, ou a palavra?

* * *

“E. . . praticamente o seu fiat,  nesse sentimento direto do Tio.” -

Diz AlbaVem atitude reflexiva. E arremata:

“Pra que comentar mais? Melhor ficarmos com o sentimento di

reto.” - Pensa um pouco e acrescenta:

“Exceto. . . exceto para observar que isso, quero dizer, aquela

 prece do tal jovem, talvez corresponds ao que Jesus teria dito a pro-

 p<5sito de como se deveria oran

“ . . . nao useis de vas repetigoes.  . .

. . . Deus, o vosso Pai,

 sabe o de que tendes necessidade,

antes que Iho pegais.

“E tamb^m que ele, Jesus, falava no Pai. Pelo menos ao que

consta nos Evangelhos.”

“Os Evangelhos. . . Quem os escreveu? Jesus? Quem os traduziu

 para n<5s? Jesus? De qualquer forma, aposto como isso de “Pai” , para Jesus, era met£fora. Sua imagem para  suscitar,  assim como o Tio

tamb6m usa linguagem metaforica; para suscitar,  j i   que nao 6  pos-

si'vel dizer. A16m disso, falando a pessoas ingenuas, ou “de pouca

luz” , que mais podia Jesus fazer? Suscitar, ao nivel em que era pos-

sfvel suscitar naquelas pessoas, isto era o que ele podia fazer.

“Assim, estou convicto de que essa id6ia de Pai, no discurso de

Jesus, era metafdrica. Nele, nao era ingenuidade nem equivoco. Era

metifora. Como um v6u: ocultando e, como todo v6u, ao mesmotempo despertando curiosidade e suscitando desejo de conhecer o

que haveria por tr£s dele. Mais: v6u migico, porque, ao inv6s de

ocultar, revelava, aos que “tinham ouvidos” . M6gicos eram tambdm

esses “ouvidos” , porque aqueles que os tinham “viam” atravds de

les; erguiam o v6u, com seus ouvidos mdgicos, e viam a luz que ha-

via por tr&s. E percebiam que era profunda verdade, aquela luz que

transparecia por tris do v6u de ingenuidade.

“Era met^fora, para Jesus. E para os outros de sua 6poca? E para

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 285/411

os outros de hoje? E em metafora teria Jesus dito ainda: “Eu e o Pai 

 somos um. E, orando pelos apdstolos:

.a fim de que todos sejam um; 

e como 4s tu, 6 Pai, em mim, e eu em ti, 

tambem sejam eles em nds. . .“E tambem:

. . o reino de Deus estd dentro em vds.

“E. . . quem tem ouvidos, ouga. Mas que sejam magicos, esses

ouvidos, e ougam e vejam e sintam.”

O jeito de falar do jovem, e sua linguagem. . . Algo em seu sem-

 blante fazendo-o parecer velho, muito velh o.. . e aquele olhar de in-

fmidade e etemidade. . . como a Esfinge . . . Alba sente um arrepio percorrer-lhe a espinha e decide p6r termo &s contemplagoes e refle-

xoes do dia:

“E. . . melhor mesmo ficarmos com o sentimento direto. Cada

qual com o seu, confonne os ouvidos que tenha.”

Alguns segundos, e Victor reage:

“Hum?!”

“Nada. Estou com fome. Vamos comer?”

“ Boa id£ia. E chega de papo s6rio por hoje. T6?”“Outra boa id6ia.”

E passam a falar de trivialidades, e r i r e brincar, enquanto prepa-

ram o jantar.

M0 s e n t im e n t o d i r e t o " . . . " c a d a q u a l c o m o s e u " . . ,

F ic e im o s n G s c o m o n o ss o ,

Q u a l 6 o s e u ? Q u a l 6 o m e u ?

I m p o r t a m a i s o E s p f r i t o ,

n e s s e s e n t im e n t o q u e o r a 6 s e u , o ra 6 m e u . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 286/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 287/411

L i l l i p u t , p a f s i m a g i n S r i o ,

c u j o s h a b i la n te s lin h a m a p e n a s

s e i s p o l e g a d a s d e a l t u r a . . .

M u i to p e q u e n o s e ra m .

E m u i t o p e q u e n o s s o m o s n t f s ,

n o E s p a g o d o E s p f r i t o

q u e e m n t is p e q u e n o s e v §

n a s u a p r 6 p r i a i m e n s i d a o . . .

“Agora 6  a sua vez.”“Minha vez? De que?”

“De ler a prtfxima reflexao do tio.”

“Ah, bom. Tudo bem. Gosto de ler pra vocS e gosto quando voce

le pra mim.”

“Otimo. Porque eu tamb6m gosto; de ler pra voce e ouvir voce ler

 pra mim. E assim, al€m do nosso amor, contamos com isto pra nao

softer t6dio. Livro 6  que nao falta neste mundo. Sempre poderemosler, estudar e discutir alguma coisa.”

“Certo.” - Responde AJba e, depois de pensar um pouco, acres-

centa:

“Sabe? Somos namorados bem diferentes, n<5s dois. E temos maischance de ser felizes - aI6m do nosso amor, como voce lembrou bem

- justamente porque temos. . . vida prdpria. Isto: vida prdpria.  Nao

dependemos de ter coisas; de lutar neuroticamente por conquistassociais e materials associadas a coisas exteriores a n6s. Estamos

aqui? Entao, aqui mesmo temos o que precisamos para ocupar cons-

trutivamente o nosso tempo, ou simplesmente curtir a magia da vida,

aquele migico, sutil, ultimo e felicitante sentimento de ser  ou aquela

consciencia de ser no Ser  de que o Tio tanto fala.”

“Concordo, mas alguma conquista social e material, como voce

chamou, vamos ter de fazer. Afmal, virao os filhos. . . E mesmo n<5snao teremos condigao de sentir essa magia da vida se estivermos so-

ftendo graves carencias ou lutando com s^rias dificuldades.”

“Sim, Sr. Extremicftico; eu sei disso. Mas, em primeiro lugar,

queira notar que eu disse, “lutar neuroticamente por conquistas so-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 288/411

ciais, etc.” Em segundo lugar, quem foi que jogou minha id6ia para

esse extremo todo? De quem foi o exagero, Sr. Extremicftico?”

“Boa; 6  isso af. Aliis, hoje, al6m da “ extremicite” , estou atacado

de “popularite”, mas esta 6  uma esp€cie de doen§a benigna. Ela me

faz lembrar ditados como, “nem tanto ao mar nem tanto a terra” , e“nem oito nem oitenta” . Talvez muitos desses ditados provenham de

afirmaQoes sabias de profundos pensadores. O fato 6 que ja percebi

que hs vezes eles encerram sabedoria pra muito conserto neste mun

do engui§ado. Se as pessoas vivessem realmente os ditados que di-

zem..

“Essa nao! E a tal estrutura psiquica e seu gradativo desabrochar?

F£cil dizer, “se as pessoas vivessem realmente” . . . como se bastas-

se elas entenderem a sabedoria de um ditado e. . . abracadabra!. . .equilfbrio perfeito.”

“Puxa! Voce hoje esta impossfvel, e eu nao estou me sentindo

nem um pouco filos<5fico.”

Alba, olhando para o lado como se estivesse falando com uma

terceira pessoa:

“Eu sabia que ele TINHA de acrescentar essa de “nao estou me

sentindo nem um pouco filosdfico” . . . Tinha gra^a que nao fizesse

essa ressalva.”“Nao disse? Voce est6 mesmo IMPOSSIVEL!”

“Pois meu querido, voce ainda nao viu nada. Espere s6 eu me de-

senvolver mais na arte da abstra§ao. Af voce vai ver eu desligar de

repente a cuca e tomar possfvel o impossfvel!”

“E, mas, nao esque^a de ligar a cuca de novo.. . ” - Acrescenta o

 jovem, com ar de triunfo. Ela, por6m:

“Pois saiba que eu nao preciso me preocupar com isso, porque

vai ser AUTOMATICO. E em alto nfvel! Gostou?”

“Gostei, sim; e hoje est£ alto mesmo, o seu nfvel. Nao h i quem

 possa com vocS. Pelo menos EU nao posso.”

Ela, triunfante e fmgindo ar de superioridade:

“E. V£ se acostumando.”

Os dois se olham e desatam a rir, entre abragos, beijos e pancadi-

nhas de amor.

Acomodam-se afinal, e, expressao ainda gaiata, Alba come§a a

leitura:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 289/411

A Busca da Orquestra Liliputiana

O corpo, estendido no asfalto. Palido. Hirto.

“Est£ morto!”

“Talvez esteja s<5 desacordado..“Nao. Aquele mogo ali 6   estudante de medicina. examinou.

Disse que nao tem mais jeito.”

“Tambem. . . o cara vinha a mil! E nem parou pra socorrer; se

mandou!”

“Coitado. . . era casado. Serf que tinha filhos?”

“E . . . esta vida nao vale mesmo nada. . . ”

“Mas todo mundo quer viver. Numa boa ou na pior, ningu^mquer morrer.”“E isso ai. Falou. O grilo e que a gente nao saca nem o que a

gente 6. Ningu6m t i  sabendo.”“E. . . o lance 6  a gente curtir o melhor da vida enquanto 6. Por

que se a gente €  sd o corpo, aquele bicho ali, por exemplo, jS era. Se

nao curtiu a vida numa boa, perdeu a vez.”

“E daf? Se a gente €  s6 o corpo, ele nem ficou sabendo que per

deu a vez. E se ele vivia na pior? Entao, o lance de perder a figurafoi uma boa.”

Sigo as duas senhoras, enquanto se afastarn da pequena multidao

que se formara no local do acidente.

“Vamos embora, Clara. Esses jovens nao tem mesmo respeito por

nada. Chega dar raiva!”

“Nem tanto. A linguagem deles 6  diferente da nossa, cheia de gi-

ria, mas tem \ i  sua expressividade e seu humor. As vezes me parece

at6 mais eficaz do que a nossa: compacta e incisiva; com uma esp£-cie de forga de imagem. Alfas, n<5s mesmos j i  estamos assimilando

algo dessa linguagem dos jovens; provavelmente porque ela nos

 permite dizer ou comunicar  eficientemente e de forma concisa, com* 

aquela forga de imagem. E claro que o desprezo da nossa nqueza

linguistica 6   lamentivel. Mas nao vejo trag£dia nisso. As coisas que

aqueles jovens disseram sao mais ou menos as mesmas que nds di-

zemos num caso desses. E as perguntas que se fizerain, tambdm. S6  que nds falamos com mais propriedade.”

“E. . . talvez voce tenha razao. AfinaJ, que 6   mais importante:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 290/411

falar ou dizer? Mas quando a gente pensa no esforgo de desenvol-

vimento cultural consolidado na nossa linguagem, nao pode aprovar

o descaso extremo de certos jovens. Mas 6  uma fase. Passa.”

Afasto-me das duas senhoras, para entrar no meu carro e seguir

 para casa.A agua quente do chuveiro, escorrendo pelo meu corpo. As maos

alisando o peito, o abd6men, os bragos. . . A agrad&vel sensagao de

calor e relaxagao. Prazer. Sentimento intenso de bem-estar.

Subito, por£m, o “flash’*do corpo do homem estendido no asfal-

to. Morto. E o eco dos comentirios:

" . . . todo mundo quer viver. Numa boa ou na pior, ninguim  

quer m orrer." 

“O grilo i que a gente nao saca nem o que a gente i . Ningudm 

td sabendo.”

O corpo. Pilido e hirto. Talvez frio.

O corpo. . . que €7   Estrutura 6ssea, sustentando um complexo

conjunto de sistemas —o sistema circulat6rio, o digestivo, o respi-

rat6rio, o reprodutor, os sistemas nervosos, etc. Ossos, 6rgaos, glan-

dulas, fluidos diversos, membranas, mrisculos, nervos, etc. Mas, es-

tas coisas. . . que sao? De que sao feitas? Substancias quimicas di

versas, admiravelmente associadas de modo a formarem um nao me

nos admir&vel complexo funcional: o corpo!

O corpo. Instrumento de manifestagao da vida - esta intrinseca-

mente independente daquele? Ou complexo fisico que produz  os fe-

noroenos da vida —esta, portanto, fungao daquele?

E vida. . . que 6? Movimento? Interagao de energias e substancias

quimicas? Jogo de agoes e reagoes quimicas e ffsicas?

E Consciencia? E fenomeno material? Ocupa lugar no espago?Tem'massa? E formada de etetrons, prdtons e neutrons, dtomos e

moieciilas? E se nao 6   material. . . que 6? Nossa sensagao daquele

 jogo deTagoes e reagoes quimicas e ffsicas?

Mas,"sensagao. . . que 6? “Quem” ou “que” a tem? N<5s? N 6s.. .

o que? O c£rebro? Se somos o c6rebro, sustentado mecanica e fun-

cionalmente pelo corpo, entao, consciencia 6   fungao do cSrebro e,

quando este 6  destrufdo ou nao tem condigoes qufmicas e ffsicas de

funcionamento. . . Caso contrSrio, “quem” ou “que” tem sensa-goes? Que sao sensagoes? E quando o sistema corpo-c£rebro 6  des-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 291/411

truido ou nao tem condigoes qufmicas e ffsicas de funcionamento...

O rosto no espelho. O cabelo, j i penteado. A gota de igua na so-

 brancelha. Enxugo. Os olhos. Vejo. Aquele homem do acidente nao

ve mais. Morreu. Mas eu ainda vejo. Estou vivo.

Vejo. Mas, em mim. . . que ve? Os olhos? Claro que nao. Eles

sao instrumentos que possibilitam ver. Possibilitam. . . a que, ver?

Ao cdrebro? Consciencia 6  fungao perceptiva do c£rebro? Ou 6  o c6~ 

rebro, tamb6m, instrumento que possibilita ver? Possibilita... a que,

ver? Seri transcendental a realidade Ultima do meu ser? Serei eu um

ser transcendente, utilizando-se do c6rebro como seu instrumento de

 percep^ao no piano “ffsico” da existencia?

Sorrio. Num lampejo, ocorrera-me a id£ia de que, se esta Ultimahip<5tese fosse verdadeira, entao, estudar anatomica e fisiologica-

mente o c^rebro, na expectativa de desvendar o misterio da cons

ciencia, equivaleria a abrir e examinar um ridio, na expectativa de

encontrar, em seu interior, uma orquestra liliputiana. A imagem: o

homem, envergando orgulhoso sua bata - simbolo de sua tao preza-

da autoridade - procurando homenzinhos dentro do rid io .. .

Ajeito a toalha no cabide e saio do banheiro.

A sopa, muito quente. Vapor d’&gua se desprendendo e serpen-teando para o alto. Sinuoso movimento de uma substancia sutil. . .

 para o alto. A igua estava na sopa e tinha a forma do prato. O vapor

saiu da sopa e nao tem forma definida. Serpenteia para o alto. De

 pois desaparece. . . no alto. Sutil como a consciencia, que os olhos

nao veem.

Consciencia... Vida?

A samambaia “crespinha” . Lindo verde; bordando o espa$o com

delicada filigrana.

Planta tem vida? Metabolismo. . . crescimento end6geno.. . respi-

ragao. . . reprodugao. . . reagao ao meio ambiente. . . Planta tem vi

da.

E consciencia? Planta tem sensagoes? V i?  Ouve? Sente cheiros?

Sente gostos? Tem sensagdes titeis? Tem sistemas nervosos? Planta

nao tem consciencia.

Entao, onde hi consciencia, hi vida. Mas, onde hi vida nao hi,necessariamente, consciencia. H i vida consciente, e vida incons-

ciente.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 292/411

O corpo estendido no asfalto. Sem consciencia. Sem vida. “Ma-

quina quebrada” , incapaz de  produzir   sensagoes? Ou consciencia

impossibilitada de sentir, porque “ a mdquina se quebrara” ? O rddio

quebrado esti impossibilitado de produzir  o programa?

Meu corpo, recostado nas almofadas, sobre o tapete da sala. Afumaga do cigarro, evolando-se. Como o vapor d’&gua se evolava da

sopa. O teto, branco e liso.

Branco. .. liso... teto.. . liso... azul claro. ..

Volto. O teto, branco e liso. A fumaga do cigarro. O cigarro, con-

sumindo-se no cinzeiro. Meu corpo, recostado nas almofadas, sobre

o tapete da sala.

Por algum tempo, entao. . . inconsciencia? Vida inconsciente?

Que, esteve inconsciente? Esteve o c6rebro inativo? Desligado? Por

isso nao percebeu? Ou o meu ser esteve, por alguns instantes, vi-

vendo em seu estado puro e transcendente?

Inconsciencia do mundo. Entao. . . consciencia de alguma “coi

sa” ? Ou, alguma consciencia? Consciencia pressupoe sujeito e ob-

 jeto. Quem 6  o sujeito transcendente e qual e o objeto transcendente,

nessa transcendental relagao de consciencia?

As plantas, ao lado do televisor. Encanto, na contemplagao das

 pequeninas flores.

Planta tem consciencia? Nao. Apenas reatividade fisico-quiraica.

Sutil, mas ffsico-quimica. Confundir isto com sensagao 6  equfvoco;

ou poesia. A begonia nao esti consciente de que 6   planta; nem de

que 6  beg6nia. Nem ve o mundo “1&fora” . Nao tem sistemas nervo-

sos para tanto.

Reatividade ffsico-qufmica. Ffsico-quimica. ..

A natureza 6   ffsica? E qufmica? E ffsico-qufmica? Que 6  primei-ro? A realidade da natureza, ou os humanos r6tulos? A Realidade do

S er.. . E. Os r6tulos sao nossa equivocada interpretagao.

A planta 6.  . . na Realidade do Ser. Moldculas, 6tomos, partfculas

elementares? Ffsico-quunica? R6tuIos. Meu corpo 6 . . . na Realidade

do Ser. Olhos, nervos, c£rebro. . . moldculas, dtomos, partfculas

elementares? Ffsico-quunica? R6tulos.

Vejo a planta. Mol^culas veem mol^culas? Atomos veem dtomos?

Partfculas elementares. . .? Ffsico-qufmica. . .? Vejo a planta. Quemve? Eu? E u .. . o que? Mol6culas.. .?

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 293/411

A Realidade do Ser. . . E. Tudo 6.  . . na Realidade do Ser. Onde

a relagao de ver nao existe. Onde os r6tulos nao existem. Havera

consciencia? “Quem” ou “que” ter£ consciencia? De que?

A planta 6. .  . na Realidade do Ser. Onde nao 6   planta. Tem

consciencia? A consciencia prdpria da Realidade do Ser - se existe.Quando eu V1R, a relagao de ver desaparecerd! Eu tamb&n. E

tambem a planta. E tambem o cinzeiro. A Realidade do Ser existira.

S6. Aqui e agora, sempre. Aqui: infinitamente; agora: etemamente.

Sou no mundo? Entao h£ relagao de ver. Sou no corpo? Entao

vejo.✓

V ejo .. . E isto um evento ou fenomeno na Realidade do Ser?

O homem estendido no asfalto nao mais era no mundo. Entao nao

havia relagao de ver. Ele nao mais era no corpo. Entao nao via. Nao

via. . . Entao o que? Nada? Registro de eventos ou fen6menos na

Realidade do Ser? Sutilmente? Transcendentemente? Imperceptivel-

mente para n<5s?

A fita magn£tica. Beethoven: “Trio em sol bemol” . Coloco-a no

gravador. Aperto a tecla. A musica, na relagao de ouvir. E se o gra-

vador se quebrar? Outro? Novamente a relagao de ouvir?

Seja como for, em Ultima an£lise, a Realidade do Ser.. . E. Tudo6.  . . na Realidade do Ser. O nada 6  um absurdo. Eu sou na Realida

de do Ser. Sempre. Aqui e agora; infinita e etemamente. Morte?

 Nao. Vida, na Realidade do Ser! Sempre! Aqui: infinitamente; agora: etemamente!

Orquestra liliputiana no radio? Ondas eietromagneticas transfor-

madas pelo r£dio? A Realidade do Ser. S<5. Sempre. Aqui e agora;

infinita e etemamente.

Fecho os olhos. Relaxo. A consciencia do corpo como um todovibrante. A respiragao. O batimento cardfaco. A consciencia do cor

 po como um todo vibrante; do corpo.. . sutil. . . astral.

A respiragao. . . o batimento cardfaco. . . a consciencia do corpo

sutil. . . a consciencia sutil. . . e, nessa consciencia, a sensagao do

Eu... na Realidade do Ser... aqui e agora; infinita e etemamente...

* * *

Concluida a leitura, Alba, que estivera recostada a um almofadao,

faz deslizar o seu corpo totalmente para o chao; mant£m apenas a ca-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 294/411

 be$a encostada no almofadao. Fica pensativa, por alguns minutos,

olhar cravado no teto rustico. Depois suspira e diz:

“E. . . mas esse tema da morte sempre tende a deixar a gente de-

 primida. Apesar de o Tio ter suavizado o fen6meno da morte da

quele homem, com o diilogo entre os dois jovens e as duas senhoras; de nao estarmos afetiva e emocionalmente envolvidos na morte

do homem; e dessa maravilhosa convic$ao do Tio, de sentir que a

vida persiste para sempre ou, como ele gosta de dizer: “aqui e ago

ra, infinita e etemamente” , nao posso deixar de sentir um arrepio ao

 pensar que um dia vou morrer. Com toda certeza!”

"Voce  vai morrer? Que 6  voce? E que vai morrer? Quando voce

sentir e souber o que voce 6, saberi o que vai morrer e fari como o

Tio: eliminara a id£ia da morte como dado do seu computador; pen-sari em mudanga de estado de uma parcial manifestagao da vida do

Ser; nao na sua propria morte. A16m disso, vale a pena pensar na

questao que o Tio levanta na primeira das reflexoes que nos deixou:

“E mtirbidopensarnamorte?Pelocontririo: o recusarmo-nossistemati-

camenteapensarnamorte6que6mfirbido!Porque6 mfirbidaapressupo-

sigSoimplfcitanessarecusa.

“Fiquei muito impressionado e encucado com esta id6ia. Quando

meu pai morreu, hi. . . seis meses, eu me senti confuso. Em vao

tentei refletir e meditar como o Tio tinha ensinado, e acabei pertur-

 bado. Estava muito envolvido, emocionalmente —aliis, aprendi en

tao que h i uma grande diferen^a entre ser de fato e pensar, entre vi

da ou experiencia e teoria. Escrevi ao Tio e pedi que me ajudasse.

Ai junto com as reflexoes dele h i um envelope com a carta que me

enviou. Leia pra n<5s.”

A jovem, enquanto procura o envelope:

“ Voce nao me falou dessa carta, na 6poca. Notei que estava per-

turbado, mas, apesar de saber que voce vai firme no caminho da sa

 bedoria, achei que isso era simplesmente humano e natural, e s<5 me

 preocupei-em lhe dar o apoio do meu carinho. Por que nao me con-

tou sobre a carta?”

“Nao sei. Foi impulsivo. Talvez eu quisesse primeiro assimilar

 bem a experiencia e a Iiqao do Tio. Talvez eu tenha sido magica-mente inspirado a aguardar sei li que momento oportuno. Tamb£m

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 295/411

foi impulsiva a decisao de trazer a carta junto com as reflexoes. Vai

ver que o momento oportuno 6  este que estamos vivendo agora, de pois da leitura desta ultima reflexao do Tio.”

“Esti bem. Posso comegar a ler a carta?”

“Pode.”

“Respeitoseusentimento. Que6essesentimento?Saudade?Respeito 

isto, emvoce.Apresengacausavaaiegria?Ldgicoenaturalqueaausincia 

cause tristeza. Afinal, nao somosmiquinas bidnicas incapazes de senti 

mento. SeuamorporseupaieraidentificagSo, comunhSo?Vocisesentia 

feiizcoma vidaqueneiesemanifestavaemagicamenteosunia?Ldgicoe 

naturalque vocetenha "morridoumpouco"nele.Comvocinaopodiatersi- dodiferente;e£nobre, issoqueemvocinSopddeserdiferente.Porisso,

naoseenvergonhepor terchoradoeseperturbado. Repito:comvocinao 

podiatersidodiferente;efoinobre,issoqueolevouachorareseperturbar.

"Quem£voci, enfim?Homem. Ehomemquen io alcangouaindaacon- 

digSo suprema de ser humanoperfeitamente iluminado. Ldgico e natural,

pois,quesetenhaperturbado.

"Emuitas vezesainda, h ideseperturbar. Ldgicoenatural.Nadaa es-

tranhar.Naoestranhe,pois. EncarecomoIdgicaenatural,essaperturbagSo queveb,edeixe-apassar.Estaaprimeiraatitudequedeveassumir.

"DeixeaperturbagSopassar,comosefosseum observadorn§o-envolvi-

dodesuaprdpriaexperiencia. Isto:faga objetodeobservagaoeestudo,de 

simesmoesuaexperiencia. Issoquevocisentecomo'*§u<equeoraesti 

perturbado, agora6"ele”.E "eu",emvoci,agora£umobservadornSo-en- 

volvido desse “ele”esuaperturbagSo. Observe, contempleaperturbagSo "dele", serenae atentamente. ElapassarS, e voci, nesse "eu"queestarS 

observandosemseenvolver,aprenderS.FagaistoagoraILargueestacarta, relaxe, fecheosolhoseconcentre-seno sentimentodeseresseobservador 

nSo-envolvido. Vocipode!SenSopudesse,eunSoIheestariadizendoisto.

Portanto, vamos!AGORA!" 

Alba, interrompendo a leitura:

“ Voce fez isso?”

“Fiz.”

“E o que foi que aconteeeu? Que foi que voce sentiu?”“Que aconteceu? A perturbagao “dele” passou e “eu” aprendi.

Que senti? Nao pode ser dito. Foi sentimento. Mas fui “eu” , e “ne-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 296/411

le” vi equivoco, ignorancia, condicionamento cultural, egocentrismo

sob forma de autocomiseragao, e imaturidade espiritual. E vi tambem

aquilo que “nele” era nobre e ndo podia ter sido diferente. E nisso

que “ nele” era nobre, pude entrar em comunhao com “ele” ; pude

assumir seu coragao, com a paz que “eu” sentia, e iluminar suamente com a luz que “eu” tinha. “Eu” me fiz “ele” , fundi-me “ne

le” , e a perturbagao “dele” passou, porque havia paz em “nosso”

coragao e luz em “nossa” mente.”

E quando voltei a ser “nele” . . . - Victor hesita. Alba, intensa-

mente ansiosa e interessada:

“Sim?!”

“Bem, senti novamente aquela fragrancia de incenso que vocesentiu uma vez, quando estivamos juntos, creio que discutindo uma

das reflexoes do Tio. Conhego aquele incenso. E o que o Tio usa.

Vem da India.

“Mais importante do que ter sentido o incenso foi que me senti

calmo e lucido;  profundamente calmo e intensamente lucido. E in-

tensamente feliz, em amor. Glorioso jubilo foi aquele que senti; tao

GLORIOSO que, por absurdo ou ridfculo que parega, chegou a me

 passar pelo ser um unpeto maravilhoso de DAN£AR. Por pouco naofiz isto, mesmo.

“Tudo isso pode parecer exagero, ou maluquice, mas foi o que

aconteceu. Senti o incenso e uma espdcie de magica e amorosa pre-

senga; senti-me calmo, lucido, jubiloso, e tive impeto de dangar.

Quando tudo passou, eu me senti como se nem precisasse mais ler o

resto da carta. Depois veio a sensagao de estar (ou ter sido?) prepa-

rado para o restante da leitura.

“Continue, entao.”

Alba, enquanto suspira e faz um esforgo mental para reprimir a

avalanche de perguntas que ameaga desabar em seu ultimo:

“Bem, como voce sabe, o resto da pdgina estd em branco. Natu-

ralmente, com isto, o Tio quis lhe dar chance de fazer a tal expe-

riencia, e sabemos o que aconteceu. Vamos entao a outra pagina.

Pronto?”

“Pronto.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 297/411

“Perdimeupaieestouconfuso.

"A segundaoragaoeradesnecessiria. Aprimeiraj i indicavaquevoc§ 

estava confuso.Ondee sti achave-de-iadrSoqueeuthedei?Perdeu,como 

disseque perdeuseupai?"

Os dois sorriem. Alba prossegue:

"Que4 perder?Que4 seupai?Que4 perderseupai?

"Umhomemestimuitotristeevaifalarcomumsibio: 

- Senhor,estoumuitotristeequeromelivrardaminhatristeza.

- Que4asuatristeza? 

"Ohomemficaconfuso. EsperavaqueosibioIheperguntasse porque

estavatristee,nao,oqueeraasuatristeza.- Naoentendi,senhor.Comopossodizer oque4aminhatristeza? 

- Osenhornaoprecisadizer.NSo6necessiriodizer.

- Masosenhorperguntou...

- Euseioqueperguntei.

- Entao . ..

- EntSo, sente-sea(. Sotteumlongosuspiroereiaxe.Fecheosolhose 

contemple asua tristeza. Quandoosenhorfecharosolhos, poderi vS-la.

Observe-a,pois, tranquilamente.£ sua,a tristeza?EntSoelaestinosenhor; 

ela£ osenhor.Observe-se,pois,nessatristezaque4sua;tranquilamente.

"Permanegapassivo ereceptivo, contemplandotranquilamente. NSose 

envolva.Que4asuatristeza?Ondees tiela?Que4osenhor,nessatriste 

za que4 sua?Deixequeestasperguntaspairemnasuamente, enquanto 

contempla, receptivamente.NSotenterespond4-las.Nemtente dizerasres- 

postas, sevierem.Esedisserespontaneamente,deixepassaroquefoidito pelosenhor;nempresteatengSo.

"Paraquedizer?Sabeoque4essedizer?Oinferno. OSenhorquervi 

vernesseinferno?NSo?EntSonSosepreocupeemdizer.Sinta;$6.Sintaa  tristezaque4suae e s ti nosenhore4osenhor. MasnSoseenvolva. E 

sintaas respostasqueserSosuas eestaraonosenhoreserSoosenhor.

MasnSoseenvolva.

"Portanto, fiquepairandoemtornodoseuser,epordentrodele, comoum 

espfritodoespagoque tudopodepercebereobservaresentireentender,

semseenvolver.

“O homemassim faz. $enta-se. Solta um suspiro e relaxa. Fechaos 

olhose . . .-  Acabodefazercaf4.E stibemquentinho.Eescolhoop6;estequeuso 

4damelhorqualidade.Querumaxfcara? 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 298/411

"Ohomemprovaocafe, degusta-obem, comevidenteprazer, viriasve- 

zes,eexclama: 

- Hum...estiexcelenteoseucafe! 

- E stisim. E6bomtomarumcafegostosoassim.Agentesenteprazer 

edizalgumacoisacomo“es tiexcelenteestecafe”.Eoqueagentedizin- 

dicaqueagentesentiuprazer.Massdindica.Oprazeragentesentiu.

“Ohomembalangaa cabegaafirmativamente,olharvago,sorrindodele- 

ve.Notaoequipamentodesomdosibio.

- Bomequipamentodesom,osenhortemaf.

- Ebom,sim.Muitobom.Osenhorgostademtisicaclissica? 

- Adoro.

- Eu,gostomuitodeBeethoven.Osenhortamb6m? 

- Muito.

- Entao,quetalouvirmosaNonaSinfonia?Egloriosaelinda! “Eosdoisescutamasinfonia,profundamenteconcentrados;alheiosum 

aooutroeambosaoambiente.

“O visitantequebraosifenciodedoisou tresminutosqueseseguiraao 

finaldamOsica: 

- E .. . comoosenhordisse:gloriosaelinda! 

- £,sim.Edbomescutarumamdsicaassim.Agentesenteprazerediz 

algumacoisacomo“estamilsica6gloriosaelinda ” Eoqueagentediz...

"Denovoohomembalangaacabegaafirmativamente;sorrisomaisam- 

pb,destafeita.

"Osibioacrescenta: 

- Naturalmente, nem tudo6 "gostoso”ou "gloriosoeUndo"navidados 

homens.Mascreioqueamaioriadaspessoaspodedesfrutaralgumacoisa 

"gostosa"eseemocionarcomalgumacoisa‘‘gloriosaelinda".

"Outrodia, nacasadeumdosmeusvizinhos, tr&scasaispassaramtoda 

anoitetomandocervejaecantandosambacomritmoqueelesmesmospro- 

duziam.Certamente,acervejaera“gostosa"e,osamba, "gloriosoeUndo"; 

paraeles.Eu,prefirocafeeBeethoven.Eosenhor? “Ohomem,sorrindoefaiscandoumolhardegratidaoparaosibio: 

- Cafe, Beethoven, umbanhoquenteprolongado . . . tantacoisa!- Le- 

vanta-se, entio,parair embora.Antesdesedespedir,por6m,perguntacu- 

riosoaosibio: 

- Osenhorteriafeitoamesmacoisacomqualquerpessoa? 

- Qualquerpessoa?"Quem"i? NSoconhego.Osenhorveioeeufizo 

quefiz. Quando "QualquerPessoa"vieraqui, fareicomelaoquefizer,edi -

ficilmentese riomesmo. Emtodocaso,mande-aaqui. Vaiserinteressante 

conheceralguim chamado"QualquerPessoa”. ..

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 299/411

"Ohomemdeixaexplodirumagostosagargalhada.OsAbiosorricomar maroto,olhoscintilandocontentamento.

“Finalmente,osdoissedespedemeohomemvaiembora.Suatristeza? 

Que tristeza?ElejS sabeo queera,aquelatristezadequen io precisava.

DelongeosSbioovepararebrincarumpoucocomumacrianga.Eouveri  -sos, daquelasduascriangasmaravilhosas;gloriosos elindosrisos,propa- 

gando-seacontaminharomundonatardegostosadeveraoameno . "

Alba:

“Puxa. . . eu adoro essas historinhas do Tio. Sao simples, quero

dizer, sem sofisticagao, mas parecem dizer tanta coisa importante.. .

Dizer? Nao. Se ele estivesse aqui, corrigiria: SUSCITAR. E ele

sempre d£ um jeito de suscitar beleza, no final.” - E retoma a leiturada carta, ap<5s breve pausa:

“Evoci,meuqueridoamigo,meubomirmao-eu?CateeBeethoven?Ba 

nhoquenteprolongado?Cervejaesamba?Tantacoisa?Comigo,ontem,fo- 

ram as  "lieder" (cangoes)deSchubert. Lindas?Sim.Mais linda, pordm, a 

CangSodoEspfritodoEspago,queohomemouviucomocoragSoecom- 

pdscomabelezaeopoderdasuamente. Lindas,as vozesdoscantores? 

DeDietrich DieskaueChristaLudwig?Maislindaa VozdoEspfritodoEs 

pagoquenelescantaas "lieder "deSchubert Lindaeprofunda, amagiada sensibilidadedocoragaodohomemqueescutaas “lieder"deSchubertnas 

vozesdeDieskaueLudwig?Maislindaeprofundaamagiadasensibilidade 

do Espfrito do Espago, que, nocoragSodohomem, cantaeescutaasua prdpriaCangSo.

“Que4seupai, irmSo-eu?ACangSo,a VozeaSensibilidadedoEspfrito 

doEspago!A comoventebelezaeaprofundamagia, naCangSo,naVoze 

naSensibilidadedoEspfrito, noEspagoenoseucoragao. NSo6istoque 

vocSamanoseupai?NSo?EntaovocinSo amaseupai.Amava,talvez.E,seamava,oqueamavanaoeraseupai.

"HSpessoasqueamamoequipamentodesomquereproduzas “lieder" 

deSchubert. £ oequipamentoqueamam;nSoas “lieder". TrSgicoeinfelici- 

tanteequfvoco.Quandooequipamentoseestraga,elasenthstecemeat£se 

desesperam. Porquepensam: “perdemosas  nossas "lieder"deSchubert; semelas,queserdde n6s?Estaoconfusas.NSosabemoquesaoas "lie- der"deSchubert;enSoeraaelasqueamavam;amavamoequipamentoeo 

som e, porisso, dizem: perdemos.EstSoconfusas. Sesoubessemoque sSoas "lieder", saberiamqueouvi-lascomosouvidos6incidentale neces-

sariamentepassageiro.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 300/411

"Naosabiamentaoquehaveriamdepassar,as "lieder"queouviamcom 

osouvidos?Mesmoquandooequipamentoestavabom,quantotempodura -

vamas "lieder"queouviamcomosouvidos?Tris minutos.., quatro?Eram 

as "lieder”queelasescutavam;nSoaCangiodoEspfritodoEspago.Eram 

as vozesdoscantoresqueelasescutavam;n ioaVozdoEspfritodoEspa *

go.Eracomasensibilidadedocoragioquesecomoviam;naocomaSensi- 

bilidadedoEspfritodoEspagoemseucoragio.Porisso,quandoas "lieder' 

terminavam, apds tr is ou quatrominutosapenas, pensavam: "acabou;  foi

Undo,masacabou".

"Docontririo, pensariam;"acabou;masEUndo;etemamenteUndo"!Por 

quenaoestariampensandonas "lieder",nemnoequipamento,nemnosom; 

nememSchubert. Ouviriamas "lieder''naCangiodoEspfrito doEspago,

comosolhos,quandoospousassemnosolhosdeumacriancinha;comos 

ouvidos, quandoos tivessemtangidospeloriso felizepurodeumvelhos i- bio;comosolhos,quandoospousassemnosolhosdeumvelhosib io;com 

osouvidos, quandoostivessemtangidospebrisofelizepurodeumacrian 

cinha. Easouviriamcomosolhoseasm ios,quandoolhassemetocassem 

ogatinhocheiodevidaeapedrasemvida;eogatinhosemvidaeapedra 

cheiadevida.

"Epensariamtambim: “foiUndo,maspassou;passouoquefoiUndo,mas 

como6Undo, issoque naopassounoquepassou"!As “lieder"terminaram.

Mas a Cangao que elas refletiam n io terminou;  nao pode terminar; fica,

sempre. As "lieder"foramlindas, antesde terminarem, porque refletirama 

CangSo.

“E voce, querido irmao-eu?Queama?As "lieder"?Oequipamentode 

som?Osom?Ouesti confuso, tomandoporamoroque4paixao?Neste 

caso, porquee  porquemes ti voc4apa/xonado?Quesentevoci porseu

pai? Amor?Entao vaise dar conta dequenao fazsentidodizer: "perdi".

 Antes, d iri: "perdi;mas ficou;porqueficasempre, issoquenuncaseperde 

noque4perdido;e4issoqueeuamo".

“Houveumqueveioedisse: “nanatureza,nadasecria,nadaseperde; tudo se transforma". Emque nfvel estavaele vivendoquandodisseisto? 

Naosei.Naoquerosaber;naoimporta.Nonfvelemqueeuestouvivendo- 

eistoimporta- eu canto: "noEspfritodoEspago,nadasecria,nadaseper 

de;tudose transforma". Vem,masn io 4criado;vai,masn io seperde.FI 

CA, sempre, oquevemmasn io 4criadoevaimasn io seperde.Naopode 

sercriadooquevem, nempodeserperdidooquevai.N iopodesercriado 

nemperdido,oquevemevaieFICA- sempre.

"Poristohouveoutroqueveioedisse: 

“0 que6nascidodacarne,6came;

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 301/411

eoque6nascidodoEspfrito,6espfrito.Oventosopraondequer,masn§osabeisdondevem,nemparaondevai;

assim6todooque6nascidodoEspfrito.Aningu6msobreaterrachameisvossopai;

Porques6um6vossopai;aquelequeestinoc§u.

"Que6o vento?Quem6oPai?Onde6oc&u?Quemsabenaorespon- de;porquenSo fazasperguntas.Nemprocura;porquen io vainemvem.Fi- ca, sempre, vivendo; sd; inalando e exalando, serenamente, na cdsmica respiragiodoEspfritodoEspago.

"Portanto,meuqueridoirmao-eu,sevoceamaoseupai,aiegre-senesse amorenaopenseque "foiperdido",porquenadaseperdeu.Docontririo,

se riumnestaciviiizagaocoitada, quetantoseorguihadesuainteligenciae suasci&ncias,mastemeamorteporquen io conheceavida.E,emsuaig- norancia (que entende comosapiencia), 6 incoerente, porque viola o seu prdpriomitodoeafirma: "Sfim”.Eprimitiva,estaciviiizagaoqueseconside- raavangada;porquenaosabequenaoh i fim;nemcomego. Naosabeque naovemnemcomega, oquefica, sempre;nemquenaovainemtemfim,o que fica, sempre. FICA, SEMPRE. SO. Sim:primitiva, estacivilizagSo. Um atestado?Suaatitudediantedofendmenoda “morte” Porquenaosabeque sdh i VIDA - avidadoSer, doEspfritodoEspago, emmigica sinfoniade 

transigoesmil."Voceama?ACangao?Entao,AMEeexultenoseuamor!'' 

Alba, que ja mal continha as lagrimas, larga a carta e vai se abra-

gar com Victor. E desaba, aquele “choro-lied” que passa mas reflete

a Cangao que fica. Depois diz o jovem, enxugando a Cangao que

tambem Ihe brotara dos olhos:

“Curioso, o choro. Paradoxal como a verdade da vida. A gente

chora quando esti triste e chora quando esti feliz. De que voce estachorando agora?”

“De felicidade!” - Exclama a namorada, rindo. E puxa o jovem e

os dois poem-se a dangar e rir. E 6  glorioso e lindo, o seu riso que

contamina o mundo na tarde gostosa de verao ameno.

G lo r io s a e lin d a 6 A N O S S A f e lic id a d e ,n o s s a b e m - a v e n l u r a n g a

n a V i d a d o E s p f r i t o , n o E s p a g o ,o n d e e m j t ib i lo d a n g a o r i s o d a s s o m b r a s . . .

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 302/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 303/411

O CONSTRUTOR DE LABIRINTOS

Olho o rel6gio. Sete horas.

Tempo. . . que 6 ? Passado, presente, e future. Tempo 6   fluxo?Fluxo de que?

T e m p o . . . f l u x o . . . d e q u e ?

F l u f m o s n f is , n e s s e te m p o q u e n a o f lu i ,

e S m e n t e d a s o m b r a n o s a s s i m i l a m o s ,

n e s s a d i f f c i l e s u t i l r e f l e x S o

q u e t e m p o n a o c o n s o m e . . .

O relogio. Miquina. Duas hastes, com diferentes comprimentos;

 percorrendo, em movimento regular, um mostrador circular dividido

em doze partes iguais. Cada haste com sua velocidade. Enquanto a

mais longa d i uma volta compieta no mostrador, a outra avanga um

doze avos do mesmo. Embaixo do mostrador, o mecanismo, bri-

lhantemente concebido. Quem o concebeu? O homem. Admiravel

inteligSncia!

O tempo e o homem.  . .

O tempo do homem: segundos, minutos, horas, dias, semanas,

meses, anos, s6culos, milenios. . . eras! Segundos, minutos e horas.

Destruo todos os reldgios do homem! Ele faz ampulhetas. Destruo

todas elas! Ele passa a regular sua vida pela natureza, pelo movi

mento do Sol na abobada celeste. Destruo o homem!

O tempo sem o homem.  . .O tempo da natureza: relatividade de movimento entre os corpos

celestes? Destruo os corpos celestes! Destruo a natureza!

Que resta? A Realidade do Ser, intrinsecamente independente da

humana apreciagao? O Ser, subjacente ao homem e &natureza?

O tempo sem o homem e sem a natureza. . .

O tempo da Realidade do Ser. . . qual e? Antes. . . que €  o Ser?

Bem, o Ser 6.  . . Impossfvel completar! Destruf o homem e a natureza! O resto, entao, deveria ser pagina em branco. Ou s6   branco.

 Nem branco! Entao.. . nada?

O Ser E. S6. Seja o que for. . . E. S<S.

O nada (aboluto) 6 um absurdo. Aquilo que €  - e em que parece

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 304/411

manifestar-se nosso mundo de relatividades - s6 pode ser.  . . sem

 pre! E . . . sempre! Nao pode deixar de ser!

Mas . . . o tempo do Ser.  . . qual 6?

Vejamos. Melhor: fagamos hip<5teses. Primeiro, restauro a nature

za e o homem. Nosso mundo de relatividades manifesta ciclos.Eventos que ocorrem periodicamente. Essa ocorrencia sistematica de

eventos se da gragas a regularidades em manifestagoes da natureza.

Ritmos.

Ora, o Ser 6   tudo. Infinito, eterao, tudo €  Nele e Dele. Porque so

ele existe.

A natureza 6 no Ser e do Ser. E manifestagao do Ser. Porque so o

Ser existe. E ela apresenta ciclos, eventos peritfdicos, ritmos, que

servem de base ao nosso tempo.Entao, ha um tempo do Ser, correspondente ao nosso tempo! Por

que as regularidades nas manifestagoes da natureza ocorrem segundo

as leis do Ser. Se algo 6  cfclico na natureza, entao, algo 6  cfclico no

Ser. O Ser teve passado, estd vivendo o presente e evoluindo para o

futuro!

Excitagao. Espanto! Alegria, na sensacional descoberta! O tempo

do Ser! Nao sei qual €;  que medida tem. Mas existe e corresponde

ao nosso.

 No entanto, a natureza €   transitoria. O Ser 6.  . . sempre. A natu

reza, nao. Entao. . . o tempo do Ser 6   finito? Manifesta-se com a

natureza e para quando ela se acaba?

(Droga! O in telecto .. . esse construtor de labirintos!)

O bloco tomba no chao. E a caneta sobre ele. Desapontamento.

Impaciencia. Irritagao.

Espere. . . a proposigao era apenas de correspondence. A natureza 6 no Ser  e do Ser; nao o Ser.  Enquanto ela existe - como mani-

festagao do Ser —seus ciclos refletem algo cfclico na dinamica do

Ser. Quando ela deixa de existir, persiste o atributo cfclico do Ser

(nao manifesto na natureza). O tempo da natureza €  fungao do tempo

do Ser; nao o contrdrio.

Entao a tese ainda 6  valida!

Sim, mas. . . o Ser 6   etemo; 6. . . sempre. Seus atributos sao. . .

sempre. Se hd um tempo como atributo do Ser, esse tempo tem de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 305/411

ser. .. sempre. Entao, qual €  o tempo do Ser, quando Ele nao esta se

manifestando. .. na natureza?.. . como natureza?

(E “ele” continua a fazer labirintos. . . Que gosto besta de se

 perder!)

Posso acaso afirmar que o Ser passa umas tantas eras sem se ma-nifestar... na natureza?... como natureza?

Ora. . . e como natureza! Pois ja nao estabeleci a premissa de que

o Ser 6   tudo? Qualquer coisa de que eu me aperceba tem existencia

no Ser e 6   do Ser - a natureza, por exemplo. Ali&s, j£ me referi a

natureza como manifestagao do Ser.

Por analogia: a natureza esti para o Ser assim como o relampago

 para a atmosfera, como a nuvem para a atmosfera. A atmosfera 6  

uma imensa massa de ar, com suas caracterfsticas ffsico-quunicas.

Em certas condigoes ffsico-qutmicas, ocorre o relampago, que tem

duragao extremamente curta em relagao &atmosfera. Analogamente

 para a nuvem, embora ela dure muito mais do que o relampago. O

relampago 6 na  atmosfera e da  atmosfera; mas nao 6 a  atmosfera.

Idem para a nuvem.

Assim, a natureza 6  no Ser e do Ser; mas nao €  o Ser. O relampa

go da atmosfera, na atmosfera. A natureza: o relampago do Ser, noSer.

Voltando, entao, qual 6   o tempo do Ser quando ele nao esta se

manifestando como natureza?

Ih! Tenho de destruir novamente a natureza e, nela, o homem!

(Esta condigao 6   imposta na pergunta.) E agora? A natureza nao

existe. . . eu nao existo. . . entao, “quem” vai apreciar o tempo do

Ser?

(E os labirintos aumentam. . . Labirintos? Agora, o construtor de

labirintos caiu num buraco sem fundo!)

E . . . “quem” vai apreciar o tempo do Ser?

Para que eu possa conhecer o tempo do Ser (se existe) preciso

deixar de ser homem na natureza, e passar a ser o Ser no Ser. Fora

disto, posso conjeturar, inferir, imaginar, atribuir, mas nao CO

 NHECER!

Para CONHECER, tenho de SER! Preciso “conhe-SER” ! AConhego o calor porque SOU calor! E em mim que se realiza o

calor; na minha percepgao. Calor nao 6  “fenomeno fisico exterior” a

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 306/411

raim; €   minha sensagao de mim mesmo, como calor. Conhego o

mundo porque SOU o mundo! E em mim que se realiza o mundo; na

minha percepgao. O mundo nao 6   “complexo fenomeno ffsico exte

rior” a mim; 6   minha sensagao de mim mesmo, como mundo. Co-

nhego o meu corpo porque SOU o meu corpo! E em mim que serealiza o meu corpo; na minha percepgao. Meu corpo nao 6   “com

 plexo organismo fisico exterior” a mim; 6  minha sensagao de mim

mesmo, como corpo,

Quando eu nao estou, o calor nao existe. Entao. . . que 6   ele?

“Fenomeno fisico nao apreciado pela mente humana” ? Incoerencia

intrinseca. Absurdo! Quem criou a expressao “fenomeno fisico”?

Quem teve a percepgao ou impressao de “fenomeno fisico”?

Quando eu nao estou, o mundo nao existe. Entao. . . que 6  ele?

“Complexo fenomeno ffsico nao apreciado pela mente humana”?

Incoerencia intrfnseca. Absurdo! Quem criou a expressao “comple

xo fenomeno fisico” ? Quem teve a percepgao ou impressao de

“complexo fen6meno ffsico” ?

Quando eu nao estou, meu corpo nao existe. Entao.. . que 6  ele?

“Complexo organismo ffsico nao apreciado pela mente humana” ?

Incoerencia intrmseca. Absurdo! Quem criou a expressao “Complexo organismo ffsico”? Quem teve a percepgao ou impressao de

“complexo organismo ffsico”?

Destruo o homem.. . Que resta?

Quando eu nao estou, o calor, o mundo e o meu corpo, nao exis-

tem. Entao. . .

(E. . . pobre construtor de labirintos. . . la vai ele. . . no buraco

sem fundo.)

 Nossa! Meia-noite! Tenho de levantar cedo para o trabalho! Nem percebi o tempo. . . Essa nao! E agora? Qual 6  o tempo do Ser? O

rel<5gio nao parou. E o Ser?... Parou?

Vou para a janela. Acendo o ultimo cigarro. Chove. Forte. O re-

lampago! Fugaz.

O relampago. . . Algo da atmosfera se consumiu? Nao. H i a lei

da conservagao da massa e a lei da conservagao da energia. E quan

do o homem e a natureza nao existirem mais? Algo no Ser tera seconsumido? Nao? Haveri a lei da conservagao da essencia do Ser?

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 307/411

Sorrio. O pensamento: “cuidado. . . voce cai no buraco sem fun-

do” ..

A fumaga do cigarro, evolando-se; e desvanecendo-se... no alto.

Vou com ela e desvanego.. . no alto.

Volto. O suspiro. A fumaga do cigarro. O cigarro. A ultima tra-gada.

Deito-me. “Desculpe, mundo; vou destrui-lo por algumas horas.

Mas, as seis, o despertador vai tocar e. . . Como? Se vou destruir o

mundo, entao o despertador.. . Bolas!”

* * *

“Sabe? O Tio 6   uma especie de “ sabio jovial” . Trata os temas

mais profundos com humor. As vezes tenho a impressao de que ele

nao est£ se levando a serio, nem ao tema que esta considerando.

Alids, neste caso, 6 evidente a intengao (pelo menos paralelamente a

seriedade) de fazer gozagao com o esforgo do homem para alcangar

a verdade na fase racional do seu ser, ou atrav6s da razao, como se

costuma dizer. . - Diz Alba, quando Victor acaba de ler a refle

xao do Tio.' ‘Na fase racional do seu ser, ou atraves da razdo, como se 

costuma dizer.  . .” —Repete o jovem, inteirompendo o comentario

da namorada. E acrescenta:

“E. . . voce esta mesmo contaminada; o virus do Tio j£ se insta-

lou em voce, que est& ficando cada vez mais sutil e tendente a uma

visao transcendental do universo e da vida. Nao vou me surpreender

se logo a vir interessada em estudar o pensamento e a vida do Buda;

e a repensar seu entendimento do pensamento e da vida do Cristo.”

“Ora, quer saber de uma coisa? J£  nao estou nem um pouco preo-

cupada em deliberar a este respeito. Primeiro, porque sinto que es

tou mesmo “contaminada” , como voce disse. E, por enquanto, estou

me sentindo entusiasticamente inclinada a bendizer essa contamina-

gao e ceder a ela. Segundo, porque a minha vida, antes do Tio, po

dia ser definida como impasse -  tudo parecia certo, definido e deci-

dido; mas, no fundo, havia uma inquietagao interna, que eu sentianuma esp£cie de insatisfagao sutil, e que causava uma inquietagao

externa que, as vezes, eu mal conseguia disfargar. Agora, depois do

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 308/411

Tio, ela pode ser defxnida como esperanga - nada esti propriamente

certo, nem defmido, nem decidido; mas houve um rebuligo la dentro,

como que uma reestruturagao psfquica, e a inquietagao esta come-

gando a ceder lugar a relativa calma e a alegria de vislumbrar um✓

caminho, uma SAIDA.“Isso: nao 6  cega essa esperanga; nao e devaneio, nem fuga neu-

r6tica pela imaginagao; 6  como se, antes, eu estivesse caminhando is

tontas numa floresta densa e escura, e, agora, estivesse vislumbran-

do uma clareira, real, iluminada pelo luar. Pode ser refletida, a luz

do Tio, mas E LUZ e esti me mostrando a clareira. Esperanga. Saj-

da, do impasse. Nao posso aspirar a muito mais do que isto, por en-

quanto. Compreendo agora que aquela reestruturagao apenas come-

gou, mas ao mesmo tempo me dou conta de que ela JA COME£OU!A safda, do impasse. E isto me acalma e anima.”

“E; acho que voce definiu muito bem a situagao. E sua vida fica

dividida em duas grandes fases: antes e depois do Tio. Fico contente

com isto, porque sei que £ mesmo luz,  essa radiagao do Tio que a

esti influenciando, ainda que voce a suponha refletida. Alias, talvez

tenha de ser refletida, enquanto ele seja homem no mundo, manifes-

tando os atributos do Ser atrav^s de um organismo ffsico.”

“Nossa! Voc^ esti voando um bocado alto em seu conceito sobreo Tio! Isto me assusta e at6   gera desconfianga. Cuidado. . . olhe a

“extremicite” . .

“Eu sei. Mas 6   inevitivel. Vem. Eu  sinto 0 Tio assim. Confesso

que tamb£m eu, is vezes, hesito e ate me assusto, quando encaro is

so racionalmente; mas, emocionalmente, sinto-me exultante e confio

que €   verdade. Enfim, creio que, neste ponto, a histdria esti se re-

 petindo. Isto mesmo deve ter ocorrido nos outros casos em que o Ser

alcangou a manifestagao mixima possfvel de seus atributos, comoser humano na Terra. Entao, o Ser-no-Homem (manifestagao mixi

ma do Ser como homo sapiens) tomou-se tao maravilhoso que os

homens comuns (manifestagoes menores do Ser como homo sapiens)

se dividiram em dois grandes grupos: o dos que nao acreditaram,

 porque isso violentava sua idolatrada racionalidade ou transcendia

sua ignorancia, e o dos que acreditaram mas “fantasticaram” , talvez

 por deficiencia de racionalidade e por ignorancia. Os primeiros,

desprezaram ou atacaram o homo sapiens excelsus de sua 6poca; os

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 309/411

outros o mitificaram e endeusaram. Como em tudo, foi diffcil para os

homens colocarem-se no meio-termo mais inteligente e razodvel - e

sibio.

“Hoje, vejo que h i um terceiro grupo (desgra$adamente, muito

rarefeito na humanidade): o grupo dos que acreditam no homo sa piens excelsus  e dele se maravilham, mas nao o mitificam nem en-

deusam; antes, consideram-no EXEMPLO do seu proprio destino -

o destino natural do homo sapiens vulgaris — e o tomam por Mestre.

“Diffcil, realmente, acreditar sem mitificar nem endeusar. Mas 6  

necessirio que o fa^amos, se quisermos transcender nosso atual e

triste estado de primitivismo.”

Alba, visivelmente impressionada e intrigada:“Bem. . . vou ter muito que pensar, com esta sua observa^ao.

Aliis, ela me pareceu importante e lucida. Talvez esteja af o cami

nho para a clareira. Mas s6 o tempo diri.”

“Por falar em tempo, e a reflexao do Tio?”

“Sei 1i . Uma vez li alguma coisa sobre a relatividade do tempo e

do espago. O que 6  que voce pensa a este respeito?”

“O que eu penso? O que h i para se pensar, voce j i  disse.”

“Eu?!”“Sim; agora mesmo. Se j i   se tivesse automatizado em voce

a consciencia de significado  em que o Tio insiste, ou, em outras

 palavras, se o seu computador mental j i  estivesse programado para

reagir concentrada e profundamente ao QUE E, entao voce teria

 percebido que estava dizendo o que h i para se dizer. Numa palavra:

RELATIVIDADE.

“Sabe o que 6,  essa palavra? Uma chave. Uma chave, para umtratado migico da correta perspectiva ou compreensao (melhor: do

correto sentimento) da vida, do seu ser e do universo.”

“Como assim?”

“Bem, como  sentimento isso €   simples, quando. . . ora, quando a

gente sente! Mas nao 6   ficil expressi-lo, comunici-lo, porque isto

acaba envolvendo ou requerendo argumenta^ao. E argumenta^ao €  

atividade ou procedimento mental ao nfvel racional. Ora, neste nf

vel, servimo-nos da linguagem verbal, e esta, por sua vez, esti vin-culada a nossas percep^oes sensoriais, ou 6  por elas inspirada, ou

nelas es ti enraizada - nem sei direito como devo dizer.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 310/411

“O fato e que percebo que, atraves da linguagem verbal, so po-

demos expressar   relatividades. Dizemos, atravds da linguagem ver

 bal “abstrata” , conceitos “absolutos”? O que “dizemos” entao sao

os tais “ prondquios” do Tio. O que chamo de “dizer” , aqui, €  defi-

nir, descrever, dizer O QUE E. E s6  podemos definir, descrever, dizer O QUE E, quanto a relatividades, expressando-as. No mais, o

que fazemos i  apontar, sugerir, tentar suscitar.

“Em parte, €  por isso que cada vez mais confio em que o Tio esta

certo em me fazer ver que a inteligencia, entendida como grau de

 proficiencia no uso das fun§oes cerebrais, racionais, nao 6  o maior

ou mais poderoso dos nossos atributos mentais. Longe disto, €   IN

FINITAMENTE superada por um atributo muito mais sutil e inex-

 primfvel. A melhor palavra que conhe§o para rotular esse atributomental superior 6  LUZ. Nao diz o que 6, porque nao pode ser dito;

mas 6   sugestiva e, aos poucos, em combina^ao com muitas outras

 palavras, adequadas, pode suscitar  

“Sim, mas, e o problema do tempo?”“Bem, eu estava dizendo que 6  diffcil argumentar a este respeito,

 porque nossa pr6pria linguagem verbal 6   relativa e s6 pode expres

sar relatividades. Dificil? Talvez mais do que isto: inutil. Porque, se

a linguagem verbal €   intrinsecamente relativa, nao serve como ins-trumento para se apreciar se alguma coisa 6   relativa, ou ndo. Se ha

alguma coisa nao-relativa, por isto mesmo transcende a possibilidade

de expressao ou aprecia§ao pela linguagem verbal.”

“Hum. . . nao sei dizer por que, ou como, mas o fato €  que nao

estou me sentindo segura de que 6  certo o que voce est£ dizendo.”

“Nao importa. Esquesa. Na verdade, esse comentSrio inicial so

 bre a relatividade da palavra nao era necess&rio.”

Victor para um pouco de falar, poe sua mente num estado passivoe receptivo, e depois recome§a:

“Perguntemos, como o Tio ensina: Que 6  primeiro? Linguagem

verbal (palavra)? Ou percepgao? Creio podermos responder que per-

cepgao 6  primeiro. Entao, podemos tentar analisar ou examinar nos

sa percepgao e a rela^ao que tempo e espago guardam para com ela.

“Que 6, nossa percep^ao? Atravds de um <5rgao receptor adequa-

do (os olhos, por exemplo), recebemos um estfmulo extemo (luz, no

caso); esse estfmulo, apropriadamente transmutado, incide sobre o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 311/411

que vou chamar, aqui, de centra nervoso (certa irea do c^rebro);

entao, di-se o fenomeno de percep^ao (visao, no caso).

“Para mim, mesmo sem uma anilise mais detalhada, €   evidente

que nossa percepgao (visual, por exemplo) 6 intrinsecamente relate va.  E fenomeno, resultante da intera?ao de dois fatores essenciais: oestunulo e o centro nervoso (sua fungao).

“Ora, se nossa percepgao 6   intrinsecamente relativa, entao, tudo

aquilo de que nos apercebemos (que dizemos conhecer por percep-?ao) e necessariamente relativo.”

Bem, isto ja incluina o tempo e o espago. Esta me parecendosimples demais.”

Entao, vamos continuar a analisar. Assim, ijossa reflexao vai fi

car mais detalhada e complicada. Nao gabo o gostb;jnas se 6   isto

que voce quer. . . Aliis, nao sei por que um argumento simples nao

 pode ser verdadeiro e suficiente; ou por que um argumento Verdadei-

ro deva ser necessariamente complicado. Em nossa cultura, de;ba$e

 predominantemente racional, parece haver uma tendencia a preven-

9§o contra a simplicidade e um gosto todo especial pela complexida-

de. De minha parte, cada vez mais amo e busco a primeira, e detestoe rejeito a segunda.”

“Talvez voce tenha razao, mas, mesmo assim, sua argumenta§ao6  insuficiente para mim.”

“Esti bem. Ji pensei muito neste assunto. Talve^consiga fazer

um labirinto sem me perder dentro dele. De qualquer forma, vou

 permanecer pairando acima desse labirinto, inabatavel na convic^ao

intuitiva ou “transintelectiva” de que tempo e espago sao. . . Bem,melhor nao adiantar nada.

“Que 6   tempo? Ou, que chamamos de tempo?. . . Talvez possa-

mos definir assim:  Intervalo que parece transcorrer entre dois ekta- dos ou momentos de consciencia.

“Vejamos se 6  assim. Do nascer do Sol (primeiro estado ou mo

menta de consciencia) at6 o instante em que percebo que o Sol esti

a pino (segundo estado ou momento de consciencia), afirmo que

transcorreu  o tempo de meio dia. Aqui me parece interessante res-

saltar o cariter abstrato de tempo, como fun^ao do fenomeno con

crete espago  percorrido. Talvez caiba entao registrar a observa^ao,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 312/411

ou a inferencia: TEMPO i FUNQAO abstrata do fenomeno concreto

 e sp  A g o .   .“Agora olho o meu rel6gio: ponteiro menor na posigao 1U, pon-

teiro maior em zero (ou 12). Afinno que sao dez horas. Quer dizer

que transcorreram dez horas desde que os ponteiros estavam super- postos em zero (primeiro momento de consciencia) at£ o instante em

que percebo a situagao: ponteiro menor em 10 e ponteiro maior em

zero (segundo momento de consciencia). Aqui, tamb6m, temos

TEMPO como FUNGAO abstrata do fenomeno concreto ESPAGO

(o espago percorrido pelos ponteiros do rel6gio, no intervalo entre

os dois momentos de consciencia).”“Espere. E no caso desses reltfgios modemos, eletronicos? Eles

nao t£m ponteiros.”Victor pensa um pouco e volta a falar:“Bem, isso nao afeta a essencia da argumentagao; nao invalida a

definigao proposta de irncio.“Olho o reldgio eletrdnico. Vejo: 10:00. Olho de novo. Vejo:

10:15. Afinno que se passaram 15 minutos de tempo, no intervalo

entre os dois momentos de consciencia, os dois momentos em que

olhei o reI6gio. De qualquer forma, embora eu nao saiba como fun-cionam esses rel6gios eletronicos, o tempo que eles “medem” 6  re-

ferido a eventos astrondmicos que envolvem a posigao relativa de

corpos celestes, no espago.“Portanto, mesmo que eu nao tenha conseguido argumentar com

 perfeigao, continuo a sentir que 6  vfilida a afirmagao de que TEMPO

€  FUNQAO abstrata do fenomeno concreto ESPAGO.”

Alba, em tom jocoso:

“V& 16 que seja. Continue.”“Entao pelo menos no momento, consideremos estabelecida a

relatividade do tempo. Quanto &relatividade do espago, i  um pro-

 blema muito mais diffcil, porque o tempo 6 evidentemente abstrato,

enquanto o espago parece ser evidentemente concreto.

“I h . . . agora voce vai se perder no labirinto.”

“Nao duvido. Em todo caso, vamos ver.“Que 6  espago? Ou, que chamamos de espago? Bem.. . Digamos:

 Extensao, referida a uma descontinuidade de percepgao."Alba, com ironia e rindo:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 313/411

“ A h .. . Muito claro. Clanssimo!”

“Para mim, est£.”

“Logico! Sei \ i   que maluquice voce tem ai na cuca. Mas, seja

qual for, est£ na sua cuca e, por isso, pra voce parece claro.”

“Esta bem. Mas deixe eu continuar; nao interrompa, que o as-sunto requer muita concentragao.”

O jovem retoma sua argumentagao, depois de refletir um pouco:

“Pois bem, admita que voce 6 mente.  Isto i  f&cil de admitir. Creio

que estamos de acordo em que voce nao pensa de si mesma: “sou o

corpo” . Antes, voce pensa:  sou mente; manifesto meus atributos 

mentais atraves do ctrebro e uso o corpo. Certo?”

“Certo. Considere admitido.”

“Ora, em seu estado dito “normal”, voce se sente como se esti-

vesse situada na cabega, no cdrebro. Entao, faga abstragao do corpo.

Considere agora que, em relagao ao universe, voce 6  um “ponto” — 

um “ponto mental” (por assim dizer situado na cabega), capaz de

consciencia, de percepgao. Agora, faga abstragao de tudo o que

existe nesta sala, e mesmo do ar, que, de qualquer maneira, se €  lfm- pido, voce nao percebe visualmente. S6 existem, voce (o “ponto

mental”) e as quatro paredes. Entao, voce tem uma nogao (ou consciencia) de espago, devido h  percepgao das paredes. Ou seja, essa

nogao de espago 6   uma consciencia de extensao, causada por uma

descontinuidade de percepgao - ou, especificamente, pelo fato de

que a continuidade do vazio (nao-percepgao) 6   interrompida pela

 percepgao das paredes. Esti acompanhando?”

“Estou. E estou gostando. Continue.”

“Agora, faga abstragao das paredes. S6 existem, voce (o “ponto

mental”) e as copas das 6rvores distantes de voc&, k  volta da casa.

Voce tem nova nogao de espago, que €   consciencia de extensao,

causada pelo fato de que a continuidade do vazio (nao-percepgao) €  

interrompida pela percepgao das copas das drvores.

“Agora, faga abstragao das copas das drvores. S<5 existem, voce

(o “ponto mental”) e o c£u (que voce percebe como se fosse uma

cupula azul). VocS tem nova nogao de espago, etc.

“Agora, faga abstragao do c6u. S6  existem, voce (o “ponto mental”) e . . . e o Sol. Voc6 tem nova nogao de espago, etc.

“Finalmente, faga abstragao de TUDO! S<5 existe voce, o “ponto

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 314/411

mental” ! Nenhuma percepgao (nada a perceber); logo, nenhuma

descontinuidade de percepgao, nenhuma quebra ou interrupt ao na

continuidade do vazio. Nenhuma nogao de extensao ou espago! Vo

ce percebe.. .  sente isso?”

“Percebo. Sinto. E isto parece confirmar a validade, ou pelo menos a razoabilidade, da definigao que voce propos.”

“Otimo. Segue-se, entao, que fica estabelecido que  ESPAQO i  

 FUN£AO abstrata do fenomeno CONSCIENCIA de descontinuida

de.  Ou, mais simplesmente,  ESPAGO 4 consciencia de extensao, 

relative a condigao de percepgao.

“Assim, TEMPO e ESPAGO sao FENOMENOS DE CONS

CIENCIA. Sao nogoes RELATTVAS A NOS (como seres mentais).

“E muito dificil pensar   isto. E, mais diffcil ainda,  sentir  isto. As“coisas” parecem ter realidade (existencia) absoluta, no tempo e no

espago. As distancias parecem ter realidade absoluta, no tempo e no

espago.”“Exatamente o que eu estava pensando, ou sentindo. Mesmo

quando sua argumentagao parecia boa, eu continuava sentindo a

existencia absoluta de tempo e espago. E continuo sentindo que o

tempo existe e passa a despeito da minha percepgao, e que o espago

existe independentemente da minha presenga.”“Hum. . . h i alguma coisa errada nisso af que voce disse. Como

voce pode afirmar que uma coisa existe, ou algo se passa, a despeito

da  sua  percepgao? Como voce pode afirmar que uma coisa existe in

dependentemente da sua presenga?”“Essa nao! Esta objegao absolutamente nao honra a sua inteligen-

cia. Pelo contrario, 6. ., 6  uma besteira, isso af que voce disse!”

“E? Vejamos isto.”

“O que?! Voce ainda quer que eu argumente? Deve estar cansa-do. Nao ve que 6  evidente?”

“Nao. Quero que voce demonstre.”“Puxa. . . vai ser at6 doloroso, demonstrar que voce disse uma

 besteira. Nao o considero um supercerebro, mas. . . Esti bem. J i que

vocB quer assim .. .

“Eu acordo as onze horas da manha. No que depende de minha

 percepgao, s6 existe esse instante em que eu acordo, j i que eu nao

tive consciencia das onze horas que se passaram at6 entao. Mas ou-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 315/411

tras pessoas tiveram! Inumeras coisas aconteceram enquanto eu

dormia e outras pessoas as viveram e testemunharam. Do contrdrio,

o que 6  que voce quer que eu pense? Que o mundo nao existia en

quanto eu estava dormindo? Absurdo! Maluquice!”

“Persiste a objegao. Voce teve de recorrer a outras pessoas.  Co

mo voce mesma disse, no que depende da sua percepgao. . . ”

“Ora, nao seja por isso.

“Estou aqui, nesta sala, tal como ela 6  e com todas as coisas que

cont6m, as duas horas da tarde. Esta claro e vejo tudo o que hd na

sala. Adormego. Acordo as. . . digamos, sete horas da noite. Esta

escuro. Acendo a luz e vejo a mesma sala, com as mesmas coisas de

antes; tudo como eu deixei quando adormeci. S6 que escureceu, porque o tempo passou.”

E Alba arremata, com ar de triunfo:

“Pronto. Como ve, agora nao recorri a outras pessoas.”

Victor, sorrindo:

“Persiste a objegao.”

“O que?! Agora, EU quero que voce demonstre!”

“Muito bem. . . Voce acorda, na sala, as sete horas. Sua afirma-gao de que a sala existe entao, nesse momento, 6  vdlida, porque vo

ce a percebe. Nesse instante, a existencia da sala €  um fa to para vo

ce, em fungao de sua experiencia perceptiva da mesma. Mas a exis

tencia da sala as duas horas da tarde €  apenas memdria. E o inter

valo que voce afuma ter transcorrido entre os dois momentos de

consciencia (as duas e as sete horas) 6   apenas inferencia ldgica, ja

que voce nao tem nem percepgao nem memdria desse intervalo. Logo, tudo que voce  pode afirmar 6   que a sala  parece existir   as sete

horas; que se produz em sua mente (ou voce evoca) uma imagem ou

visualizagao da “sala” as duas horas; e que voce infere que a “sala”

existia no intervalo, enquanto voce dormia, isto 6,  enquanto trans-

corria o tempo em que voce dormia.

“Em suma, a sala —e, alids, voce mesma tambem - 6   um fato

(perceptivo) NUM DADO MOMENTO; fora disto, £ fenomeno

mental (evocagao e visualizagao de um registro na mem<5ria), ou su- posigao por inferencia ldgica.”

Pergunta entao o jovem, sorrindo, agora consciente de que nao se

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 316/411

 perdera no labirinto, de que conseguira pairar acima dele, enquanto

o constnna:

“Ainda nao percebeu o que eu estou tentando fazer voce compre-

ender?”

“Sinceramente, nao. E duvido que voce consiga sustentar sua argumentagao quanto a espago, que, como voce mesmo disse, 6  evi-

dentemente concreto.”

“Corregao: eu disse parece ser.”

“Mesmo assim.”

“Entao, qual 6  o problema?”

“Bem, digamos que eu estou a 60km da minha casa. Afirmo que

esta distlncia €   espago absoluto, ou seja, que existe a despeito da

minha percepgao. Com efeito, a qualquer momento em que eu queira

ir pra casa, terei de percorrer esses 60km; se for num carro a 120km

 por hora, levarei meia hora pra chegar Id. E, como ve, nao precisei

recorrer ao fato de que outras pessoas  estao percorrendo essa dis-

tancia AGORA, apesar de eu nao ter percepgao direta da mesma.

“Saia desta, se puder; se nao, caia no buraco sem fundo.”

“Persiste. . . Bem, nao vou repetir essa expressao; voce pode

acabar se irritando. Mas o fato 6   que. . . ora! PERSISTE A OBJE-gAO!”Os dois riem. Victor explica depois:

"Voce nao pode afirmar que os 60km de estrada existem, agora,

senao recorrendo a outras pessoas, &sua mem<5ria, ou a uma afirma-

gao baseada na projegao de sua mem6ria para o futuro.”

Alba, decidida:

“Esti bem. Este papo j£ esti se alongando demais, e, antes que

eu fique tonta, ou tambdm caia no buraco sem fundo, vou lhe dar ogolpe de misericdrdia, em dois lances:

“Primeiro - Voce esti confuso. Esti tomando minha possibilida- 

de de afirmar  que algo existe, como critdrio decisivo para a veraci- 

dade de sua existencia.  Isto 6   falso. Tudo o que voce esti conse-

guindo demonstrar e que pode haver uma situagao em que EU nao

 possa afirmar que a estrada exista; mas ela contin ual existindo, no

seu lugar, com todos os seus 60km (mesmo que todas as outras pes

soas do mundo tenham deixado de existir e minha memdria esteja

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 317/411

 bloqueada). Um cego nao ve uma coisa distante e, por isso, nao po

de afirmar que ela existe; mas ELA EXISTE!

“Segundo —Um helicoptero sobrevoa a estrada e a fotografa.

Pronto.  L£   estao, NA FOTOGRAFIA, os 60km de estrada, apenas

em escala reduzida; o resto 6  sd questao de calculo simples de pro- porgao.

“Pronto. Falei, e disse; tudo.”

“Ponto final?”

“Ponto final.”

“Nao. Reticencias; tempo, para eu pensar.”

“A vontade. Enquanto isso, vou fazer umas pipocas.” - Depois,

voltando com as pipocas:“Entao? Entrega os pontos? Melhor comer as pipocas enquanto

estao quentinhas, e esquecer essa confusao da relatividade do tempo

e do espago.” —E acrescenta, levando as primeiras pipocas k  boca:

“E se voce disser que persiste a objegao. . . bem, nao ganha pi- poca!”

Victor, sorrindo, apos breve reflexao:

“Esti bem. As pipocas existem agora e eu existo agora. Entao,melhor come-las agora, porque nao posso afirmar que elas existiraodepois.”

“Claro que pode! E s<5 nao come-las agora. Daqui a quinze mi

nutos, elas estarao aqui e voce poder# come-las.”

“Entao, “seri” agora.  E eu “comerei” , nesse agora,  as pipocas

que nele ainda “existirao” . Tudo nesse outro agora. Percebe?”

“Nao. E voce esti mudando de assunto. Nao quero saber desse

seu “outro agora” . Quero saber da estrada e do meu golpe de mise-

ric<5rdia. E lembre-se: nada de persiste a objegao.”

“Como queira.”

Victor fixa um olhar vago na panela com pipocas, e depois come-

Sa:“Primeiro, vamos ao problema de AFIRMAGAO DE EXISTEN-

CIA versus EXISTENCIA.

“Realmente, sua afirmagao da existencia da estrada €  secundaria.Que €  primeiro? Seu conteddo mental, correspondente h afirmagao, €  

 primeiro. Mas sua afirmagao, como expressao do seu conteudo

mental, 6  a unica maneira objetiva de eu conhecer esse conteudo; e

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 318/411

um modo mais pratico e comodo de eu me referir a ele. Seria com-

 plicado dizer: voce nao pode ter o conteudo mental “estrada de

60km” , senao no instante em que esteja percebendo “estrada de

60km” . E falar o tempo todo com referenda direta ao seu conteudo

mental. Portanto, nao faga cavalo de batalha do meu recurso praticoh. sua afirmagao da existencia das coisas. Em todo caso, vou misturar

tudo: afirmagao e conteudo mental. Por miseric<5rdia. . . ”

“Voce €  um chato, sabia?”

“Ora, ate que a misericdrdia 6   uma virtude. . . Bem; vamos II

Voce pode afirmar, “a estrada de 60km existe” , no instante em que,

 por percepgao direta ou imediata, lhe ocorre o conteudo mental,

“estrada de 60km”. Fora disto, s6  podem existir o conteudo mental

MEMORIA e o conteudo mental PROJE£AO.

“No primeiro caso, no instante em que voce lembra, s<5 existe o

seu conteudo mental MEMORIA. A pr<5pria estrada NAO EXISTE

 NO PASSADO! Nada existe no passado; dizer que existiu 6   dizer

que nao existe. Se voce recorre a uma fotografia, no instante em que

o faz, o que existe €  isto mesmo: uma fotografia (e o seu reconheci-

mento do que esta na fotografia, no conteddo mental MEMORIA).

“No segundo caso, no instante em que voce preve ou prediz que

vai percorrer a estrada, s6 existe o seu conteddo mental PROJE-

£AO, baseado no seu conteudo mental MEMORIA. A propria estra

da NAO EXISTE NO FUTURO! Nada existe no futuro; dizer existi- 

rd 6  dizer que nao existe.

“No instante em que voc6 “estiver” percorrendo a estrada, “e-

xistiri” a estrada nesse AGORA em que voce a “estiver” percor

rendo. E se voc£ disser, “Viu? Eu disse que ela existia!”, isto “se

ra” apenas expressao de um conteudo mental MEMORIA, nesse

AGORA em que a estrada “estara” existindo segundo o seu conted

do mental PERCEPGAO IMEDIATA e voce a “estara” percorren-

do. Em suma. . . ”

“Espere. Agora digo como voce: h i alguma coisa errada nisso af

que voce falou. Eu NAO afirmo que a estrada existe no passado nem

no futuro. Digo que ela existia no passado e continuard existindo no

futuro, e isto 6   coerente. A16m disto, digo que ela existe NO PRE

SENTE, embora eu nao esteja la olhando pra ela!”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 319/411

“Existiu no passado; continuara existindo no futuro; existe no

 presente, embora, etc. Coerente, sim. Mas, nos tres casos, so con-

teudo mental: memoria, projegao, inferencia. Voce nao pode afirmar

a existencia absoluta da estrada.”

“Essa nao! Ja estou ficando irritada com a sua insistencia nessa

id6ia.. . maluca!”

“Dizer que a minha iddia €  maluca nao €  argumento. Nao aceito

isto; de voce, nao.”

“Esta bem.” —Diz Alba. Depois, respira fundo, exala forte,

acalma-se, e rebate:

“Estou percebendo sua insistencia nesse “VOCE nao pode afir

mar” , etc. Mas nao concordo com isto. Que h i de errado em que euinfira a existencia absoluta de alguma coisa em fungao do testemu-

nho de um outro  ser hwnano ou do registro de sua existencia numa

fotografia? Creio mesmo que o nosso conhecimento 6   muito mais

composto de informagao do que de experiencia direta.

“Quer um exemplo? Pessoas me disseram que existe a torre Eif

fel, em Paris; j i li a respeito dessa torre, em revistas e livros; ja a vi

em filmes e fotografias; portanto, sei e afirmo que ela existe! O fato

de eu nao ter tido a experiencia direta de ter visto pessoalmente a

torre em nada afeta sua real existencia. Ela esti 16, em Paris; estava

la antes que eu nascesse; e talvez esteja la depois que eu morrer.

“Sinceramente, qualquer pessoa que esteja realmente convicta da

sua ideia, ou nao e capaz de discemir e aceitar fatos (e neste caso 6  

maluca), ou esta pensando errado, raciocinando incorretamente.

Como acho que voce nao 6  maluco, concluo que esti pensando erra

do; seu argumento e um sofisma.”Victor sente o peso da argumentagao da namorada. Levanta-se,

vai at£ a janela e se demora um pouco em profunda contemplagao,

olhos fixos na escuridao que reina fora da casa. Volta, afinal, com ar

de quem encontrou luz naquelas trevas.

. “Esta impenetravelmente escuro, 16 fora. Nao consegui ver as 6r-

vores. Mas sei que elas estao 16, tais como as vi durante o dia. Se eu

tivesse acendido uma lantema forte, certamente as teria visto. Perce- bo estes fatos e os aceito. Como voce disse, nao sou maluco. Mas

tenho duas consideragoes a fazer:

“Primeiro, creio que a mesma observagao anterior se aplica neste

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 320/411

caso: Esti escuro e nao vejo as arvores; mas afirmo que elas exis-

tem. Aqui, fago uma inferencia, com base na mem<5ria (porque vi as

arvores durante o dia). “Arvores” 6 um conteudo mental meu (me-

m6ria, inferencia). Acendo a lantema e vejo as drvores; afirmo que

elas existem. “ Arvores” , agora, €  um conteudo mental de percepgaoimediata. Mas - e aqui e muito diffcil explicar o que sinto, porque 6

nisto que estou pairando acima do labirinto —estou entao vivendo

um “novo momento” . O unico momento, alias, que de fato existe: o

PRESENTE! A continuidade da “passagem do tempo”, esse fluxo

continuo de momentos do “passado” (escuridao: nao vejo as arvo

res) para o “presente” (luz da lanterna: vejo as drvores), 6   apenas

fendmeno mental, ilusao da minha mente, causada pela MEMORIA.

“Segundo, quanto a real existencia das drvores, fora da minha

mente e a despeito dela, acho que estamos modificando o nosso te-

ma. Estavamos discutindo a relatividade do tempo e do espago (par-

ticularmente do espago, com o caso da estrada de 60km). Sua ultima

argumentagao levantou a questao da existencia real (absoluta) das

coisas (como a torre Eiffel). E possfvel que uma coisa implique a

outra, ou que uma esteja ligada a outra, mas devemos considera-las

em separado —pelo menos numa primeira fase de discussao —se naoqueremos complicar irremediavelmente o labirinto.

“Alids, este 6   um defeito comum, de todo mundo, na arte da re

flexao. A gente modifica o tema, ou mesmo muda de assunto, sem se

aperceber disto. E o labirinto vai se complicando, at£ que a gente se

 perde por completo. Atengao concentrada NO TEMA e disciplina

mental (controle do processo de pensamento) sao absolutamente ne-

cessdrias a que a gente faga uma boa reflexao. Somente se a gente

conseguir se manter no tema enquanto o desenvolver (enquanto esti-

ver construindo o labirinto), conseguird sair dele; a conclusao (a

safda) nunca poderd estar fora do tema, nem numa ramificagao do

mesmo; terd de estar NELE. Chegar a essa conclusao 6 penetrar  o

tema; sondd-lo profundamente, ao mdximo possfvel.

“Fiquemos, pois, com a relatividade do tempo e do espago.”

“E; parece razodvel. Mas, e a minha defesa do conhecimento da

existencia de alguma coisa por informagao?”“Bem, isto me parece uma generalizagao do caso particular da

torre Eiffel. Quer dizer, estamos modificando o tema e nos aniscan-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 321/411

do a complicar demais o labirinto. Vamos acabar confusos.”

“Tem razao. Ja estou ficando cansada e quero ter um sono tran-

qiiilo, sem pesadelos. Melhor voce dizer simplesmente o que pensa a

respeito do tema; isso que voce diz que sente quando estd pairando

acima do labirinto.”“Muito bem. Posso tentar. Antes, poidm, quero lhe explicar por

que insisto em que voce nao recorra a informagao, ou melhor, a ou

tras pessoas, em sua reflexao sobre a relatividade do tempo e do es

 pago ou da existencia do mundo. Sinto que justamente isto —recor-

rer a outras pessoas —e que 6  soffstico.

“Quando voce se dispoe a essa reflexao, que 6 voce? Melhor que

tem de ser  voce? Irrdividuo, ou ser humano? Creio que ser humano,

neste caso, 6  primeiro em voce. Quer dizer, €  como se os outros in-divfduos nao existissem. Tem de ser assim! Parece-me que isto 6  

uma exigencia 16gica. S<5 existem voce (O SER HUMANO) e o uni-

verso. Se voce considerar outros indivfduos, estard cometendo um

erro de l<5gica e seu labirinto serd intermindvel.”

“Parece que voce tem razao. De qualquer forma, como eu jd dis

se, estou cansada. Melhor voce dizer o que sente, independente-

mente de argumentagao e sem discussao.”

“Otimo.” - Diz o jovem. Depois, solta um forte suspiro, desvia

os olhos da namorada, e desfoca o olhar do mundo. Comega entao a

falar. Mas - percebe Alba —nao estd dirigindo o processo de pensa

mento como normalmente se faz, pelo exercfcio da vontade na sele-gao do “trem de iddias” . Nem estd expressando impulsivamente um

fluxo de ideias geradas pelos esquemas condicionados de sua pr6-

 pria estrutura psiquica. Parece estar mergulhado em sua mente, para

al6m de sua estrutura psiquica individual, para aldm do seu ego. Eali, naquelas quase insonddveis profundezas, apenas aguardar os

 primeiros e sutilfssimos “movimentos de consciencia” , as primeiras

reagoes ao influxo da Luz do Espfrito do Espago, antes que elas se

 jam distorcidas pelos condicionamentos do seu ego. O resto, at£ oseu falar, 6  automdtico.

 No breve silencio que antecede a fala de Victor, Alba 6  acometi-

da de subito arrepio. Depois parece “envolvida” e “penetrada” por

algo muito sutil. Mas nao se assusta; sente que 6   bom e. . . VTTA-LIZA! E VIDA, o que sente, numa extraordindria acuidade sensiti-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 322/411

va. E lhe parece que aquele algo muito sutil se irradia do jovem.

Que 6  ele? Canal? Fonte? As primeiras palavras do jovem impedem

que o pensamento da namorada dispare na consideragao desta ultima

e assustadora hip<5tese:

"H iOQUE EXISTE e n5opodemossaberoque6. E ISSOETUDO.E

n’ISSO tudo6. Somos n’ISSOque6 tudo. E noquesomos, n'ISSOque6

TUDO,somosAQUI, SEMPRE- INFINITAMENTEAQUI;somosAGORA,

SEMPRE- ETERNAMENTEAGORA.

“Tudoo mais 6 RELATIVIDADE. Fenfimenos de consciencia. Reagoes

causadas pelas relagoes internas  da natureza d’ISSOque6TUDO.Fen6-menos da VIDA DO ESPIRITO DO ESPAQO,que n6s, vivos nessa vida

maior,sentimoscomoconsciencia- umr6tulo.

'Tudoomais6impressao.Fen&menosdepercepgao.Tudooqueparecetercomego,pareceque te ri depassar.Eparecenecessir ioquetudotenha

tido comego e esteja passando. HusSo. O “fluxo" 6 mental, fen6meno de

consci&ncia - percepgSo, memfiria, projegSo. Tudo 6 contetido mental

PRESENTE- mem6ria,percepgSo,projegao."S6existe PRESENTE,noquesomos- n’ISSOque6TUDO.Nadateve

comego,nemestipassando,nemterSfim.Tudo6FENOMENO.Nadavem

do passado, nem \r&  para ofuturo.NadaseestendeuatSaqui, nemsees-

tenderiat6 ali. TudoexisteAGORA, ETERNAMENTE,eAQUI, INFINITA

MENTE. O “fluxo” 6 impressiomental.Em n6s, reiatividades que somos.Ilusao,causadapelas relagoesquesomosevivemos,nos"movimentos"da

vidafntimadoSer.

“Mas tudo PARECE tertido comegoeestarpassando.MuitacoisaPA

RECEtervindodopassadoeestarseguindoparaofuturo.MuitacoisaPA

RECE estender-se at6 aqui e at6 ali. PARECE-nos que tivemos comego,

estamos passando, eteremosfim.PARECE-nosqueSOMOS, n 6 s,“aqui

dentro”,epercebemosomundo“ISfora”.

“PARECE. E porque PARECE, vivemos isso que PARECE - n’ISSO

que E. E fazemos PARECER, repetidamente. Como setivessecomego,e

passasse,etivessefim.Comoseviessedaliat6aquiefossedaquiat6ali.Econtinuamosaviverissoque PARECE,at§apreendermos,profunda,direta

e inabalavelmente,que PARECE. EntSo, oque PARECEdesaPARECEri,

porquenaoera.Nemmais seremos nds, nissoque parecia.S6 ISSOseri,

porquet \ ISSOque6TUDOenSopodemossaberoque6.”

Victor para de falar, mas permanece contemplativo.

Alba se poe tamb6m contemplativa, como a se abandonar iquele

 purificador banho de luz.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 323/411

Silencio, por algum tempo. Depois, um suspiro, e Victor volta.

Poucos segundos, e Alba tambem volta. Os dois se olham e sorriem.

Mais alguns segundos, e a jovem quebra o silencio:“E . . . tem'vel.”

“O que, 6   temvel?”Por alguns instantes, tive uma sensagao maravilhosa. Como se

voce estivesse apreendendo a verdade e a estivesse suscitando em

mim. Mas foi s<5 “voltar” e logo me veio a certeza de que j£ fui

crianga, sou agora adulta, e serei velha no futuro. Tem'vel.”

E. Tem'vel, sim. Por isso, agora, creio que tenho pelo menos

uma vaga compreensao da experiencia que o Buda Gautama viveu

quando de sua Iluminagao. Creio que ele apreendeu justamente essaHUMANA VICISSITUDE. E a sua causa. E o caminho a seguir para eliminar a causa e a VICISSITUDE. E nele a causa foi eliminada

e a VICISSITUDE cessou. E deixou de ser temvel. Nele, a causadesaPARECEu. Ficou, ISSO que €  TUDO.

E creio, tambcm, que nao foi diferente a experiencia do Cristo

Jesus. Sua missao pode ter sido diferente; mas a experiencia foi amesma, e a mensagem 6  essencialmente a mesma.”

Victor faz uma ligeira pausa e arremata:

“Bern, chega de reflexao por hoje! Vamos a essas pi. . - Amao 6£  com o fundo da panela.

Alba explode em gostosa gargalhada. Depois, ainda iindo, diz:

“As pipocas? Ora, tiveram comego, passaram e encontraram fimna minha barriga!”

Agora 6   o jovem que explode em sonora risada. E os dois se

abragam e riem e se beijam. Muito felizes.

1 . . S 6 e x is te P R E S E N T E n o q u e s o m o s ,

n ' f S S O q u e 6 t u d o .

n o E s p f r i t o d o E s p a g o !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 324/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 325/411

O PILOTO AUTOMATICO

E

A ANTENA MISTERIOSA

" A u t o m $ t i c o " . . . " m i s t e r i o s a " . ,.

J S a p r e n d e m o s n f i s a g o s t a r d e t e r m o s c o m o e s s e s ,

e m n o s s a m   A G IC A a v e n t u r a n o E s p f r i t o d o E s p a g o ,

o n d e n o s s a s j o v e n s s o m b r a s a g u a r d a m o s

p a r a a c o m u n h a o n o A m o r d o E s p f r i t o ,

n o E s p a g o q u e n a o s e e s t e n d e ,

n o T e m p o q u e na o f lu i . . .

“Puxa vida. . . passei a manha inteirinha SEM FAZER NADA!

Estou sentindo o maior remorso. . - Diz Alba, quebrando o silen-

cio que se seguira k  musica que os dois haviam estado escutando.

“A neurose de agao, do “que-fazer”, caracteristica da nossa cul-

tura.” —Diz Victor, como a provocar e abrir um tema.

“VocS acha?”* 

“Acho. Nossa cultura €  geradora dessa neurose. E uma culture deartificialidades. Isto 6, nela vivemos uma vida artificial; bem pouco

resta de natural em n<5s e na vida que levamos. Vivemos  para  inu-

meras coxsas. Principalmente, para “ganhar dinfi&iro”, seja com ofim de satisfazer necessidades (a vdrios nfveis de sobrevivencia),

seja com o fim de satisfazer desejos (a v&rios m'veis de ambi?ao e

ganancia). Isto requer agao, constante, denodada (ou desesperada) e

competitiva.“E a lei do habito funciona, porque 6  natural e, por isso, necessa

riamente eficiente e impessoal. No jogo autom&ico de causa e efei-

to, das leis naturais, nao h i  lugar para adjetivagoes nem classiflca-

§oes conceptuais (bom e mau, construtivo e destrutivo, agradivel e

desagradavel, etc.); e intengoes e prop<5sitos nada significam, nesse

 jogo.“O hibito se forma, e se toma arraigado e vem a neurose. A neu-

* rose do “que-fazer” . E preciso ter sempre o que fazer.  Ser, simples

e naturalmente  ser,  nunca 6   suficiente. Alids, quem pode ser, sim

 ples e naturalmente, e nisto sentir-se bem? E nisto sentir prazer, de-

leite, contentamento? Quantas pessoas estao em perfeita paz com a

sua Consciencia, o mundo e a vida?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 326/411

Victor faz uma pausa para avaliar intiimmente o novo rumo que

seu discurso estd tomando. Depois, prossegue:

“Considere a palavra vida. Com que significado 6  predominante-

mente usada? Ou seja, QUE E vida, mais comumente, para a maioria

das pessoas? Qual e o conteudo mental dessas pessoas, quando di-zem coisas como, “a vida 6  dura” e “a vida €  assim mesmo”? Basi-

camente, creio, as pessoas chamam de vida essa sucessao diaria de

a$oes destinadas a suprir necessidades (sobrevivencia) e satisfazer

desejos (ambigao, ganancia). E precisamente isto €  artificial, porque

mais fortemente determinado pelas caracterfsticas e injungoes do

sistema sdcio-polftico vigente, qualquer que ele seja. Isto pode ser

muito detalhado, aprofundado e alongado. E discutido. Mas acho

que as iddias fundamentals estao af.“As injungoes do sistema s<5cio-polftico prevalecem sobre as con

cept oes e inclinagoes pessoais. Talvez se possa mesmo dizer que o

sistema “educa” para a aceitagao de suas injungoes (ou a angustiada

resignagao ds mesmas). Segue-se que vida, em ultima andlise, ou

“na pratica” (como se costuma dizer), resume-se aquela sucessao de

agoes dirigidas para objetivos e prop6sitos artificiais. Finalmente,

 por vdrios motivos (caracterfsticas do sistema e o nosso arraigado

egocentrismo, principalmente), essas agoes se tom am neurotica- mente habituais.

“As pessoas nao se perguntam o que 6   primeiro. Se o fizessem,

acabariam descobrindo que VIDA €  primeiro.”

“Uai!”

"Agora, a palavra tem todas as letras maiusculas.”

“Ah, bom. Desculpe. Eu nao as tinha “ouvido” maidsculas.”

Os dois riem. Depois, Victor continua:

“E, sim. VIDA €   primeiro. Mas essa VIDA que €   primeiro 6  maidscula. Assim, hd a VIDA maiuscula e a vida minuscula. Esta,

todo mundo conhece e €  ela que quase todo mundo estd vivendo. A

outra, a maiuscula, raras pessoas conhecem e podem Viver. O Tio,

sem ddvida, 6  uma dessas raras pessoas. Alids, nao conhego outras,

mas prefiro crer que haja outras; raras, mas existam.

“A vida miniiscula 6  fdcil de conhecer. Na verdade, 6  impossfvel

nao conhece-la, visto que ela 6   justamente a nossa experiencia rela

tiva neste mundo de realidades perceptivas. A16m disto, o problema

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 327/411

da sobrevivencia 6  dominante em nossa estrutura psfquica, e as pres-

soes e injundoes do sistema sdcio-polftico nos obrigam a dar-Ihe

aten§ao mais do que devida, praticamente constante. E hd tambem os

 prazeres que essa realidade perceptiva nos oferece, gerando desejos

e paixoes. E, provavelmente, muitos outros fatores, que seria longodemais analisar.

“Jd a VIDA maiuscula nao €  assim imediata. Nao estd a tona, ao

contrdrio dos componentes relativos da vida minuscula. Para conhe-

ce-la, para experiencia-la, 6  preciso que o homem se puriflque, e isto

6  um processo lento, gradativo e drduo,”“ Ih . .

“Que foi?”“Essa historia de “purificagao” . . . Assim de cara, estd me chei-

rando a uma espScie de puritanismo ou moralidade mistica.,

“Bem, em primeiro lugar, a moralidade - como quer que voce

 prefira adjetivd-Ia - 6, nao apenas desejdvel em nossa vida de relati-

vidades (socialmente, £   claro), mas, necessdria. A boa moralidade,

ou RETA MORALIDADE, €  construtiva, e isto a justifica; a mora

lidade equivocada (como no puritanismo), a amoraiidade equivocada

(como no erotismo), e a imoralidade, sao destmtivas, e por isso de-

vem ser combatidas e riscadas do nosso modo de viver. Indepen-

dentemente disto, por6m, voce estard dando um passo para trds, em

sua evolugao pessoal, ou pelo menos “marcando passo” , cada vez.

que ceder a esse impulso de apreciar ou julgar qualquer coisa “de

cara” . Voce  presumiu  que eu estava pensandb em purificagao do

 ponto de vista moral; ou dessa “moralidade mistica” a que voce

mesma se referiu.”“Ora, e de que outro ponto de vista se pode falar em purifica-

§ao?”

“De um ponto de vista que eu vou chamar, aqui, de  psicoldgi- co .**

“E como 6  isso, sabichao?”

“Sabichao... Voce quer discutir filosofia, ou brigar?”

“Td bom. Explique seu ponto de vista psicoldgico.”“Bem, essa id6ia de purificagao 6   apenas uma imagem. E reco-

nhego que 6   infeliz, justamente por sugerir ou induzir essa conota-

gao de moralidade —ou “moralidade mistica” , como voce chamou.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 328/411

Vamos substitui-la, entao, por.. . pela id£iade descondicionamento. 

Palavra longa e incdmoda, mas talvez sirva para exprimir o que eu

 penso. Portanto, cabe agora dizer que, para o homem conhecer a

VIDA maiuscula, £  preciso que ele se descondicione.”

“Melhorou. Agora, tente dar um exemplo.”“Isto €  que nao €  ficil. Porque a experiencia da VIDA maiuscula

envolve isso que o Tio chama de sentimento direto. E, como ele

mesmo gosta de lembrar, sentimento 6  coisa de sentir; impossfvel di

zer; se voce sente, conhece, e nao h i outro jeito de conhecer.”

“Entao eu j i sei como 6. E como nessas experiencias de contem-

 plagao que voce e o Tio me levaram a viver. Quero dizer, se voce,

 por exemplo, olha para uma planta, a id£ia de “planta” esti presente

em sua mente. A situagao que voce esti vivendo 6  de relatividade.H i voce, a planta, e as outras coisas que nao sao voce nem a planta.Mas se voce se demora na contemplagao da planta, e mergulha fun-

do na mente, para al£m da sua estrutura psfquica - que 6  condicio-

nada —entao, de repente voce. . . E; nao d i pra dizer. Voce sente!

Tem um sentimento maravilhoso dessa VIDA maiuscula, presente na

“planta” , em “voce” , e em todas as “coisas” que nao sao a “plan

ta” nem “voce”.

“Portanto, essa purificagao de que voce fala consiste em trans-cendermos o nfvel de condicionamento da nossa estrutura psfquica.

 Nao poderemos conhecer e viver a VIDA maiiiscula, enquanto for-

mos condicionados.”

Alba passa a falar com excitagao, sentindo que esti se aproxi-

mando de uma conclusao muito importante e maravilhosa.

“Precisamos realmente nos purificar. Isto 6,  precisamos nos li-

 bertar de nossa condicionada concepgao do nosso ser, do universo e

da vida. S6 com a MENTE INCONDICIONADA poderemos conhecer e viver a VIDA maiiiscula. E isto i  fundamental, porque, como

voce lembrou, ate os prazeres da vida minuscula sao geradores de

desejos e paixoes - que acabam transformando essa vida minuscula

num verdadeiro inferno.

“E isto vem responder uma pergunta que eu estava pra lhe fazer:

 por que a gente tem de ficar fundindo a cuca com essas questoes

complicadas, como a da relatividade do tempo e do espago? Creio

que agora eu sei a resposta.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 329/411

“E qual € T 

“Bem, vamos ver se eu consigo dizer. . . Ora, para DESCONDI-

CIONAR! Agora, esta palavra diz tudo. Usamos a nossa racionali-

dade para minar nossas certezas condicionadas; para solapar nossa prdpria estrutura psiquica e nela abrir uma brecha; s6  entao podere-

mos transcende-la e. . . e SENTIR A VIDA MAIUSCULA. . . NA

VIDA DO SER. . . UBiQUA E ETERNA!

“Enquanto pensarmos condicionadamente, sd poderemos conhe-

cer e GOZAR e SOFRER a vida mintfscula. Quando tivermos a

mente incondicionada, poderemos conhecer e DESFRUTAR a VI

DA maiuscula —inclusive na prdpria vida minuscula!

“Ei! Estou ficando rmstica!”Victor, sonindo:

“E sabichona, tambdm.”

Os dois se abragam. Depois, o jovem afasta a namorada de si e ve

que ela chora. Enxuga amorosamente suas ldgrimas com os dedos e

a beija com temura. Os dois se olham longamente, sentindo-se unifi-

cados naquele sentimento profundo e m^gico da VIDA do Espfrito

do Espago, que os envolve e penetra e vai tanger-lhes no coragaouma sinfonia maravilhosa de LUZ e AMOR.

Finalmente, o encantamento passa e Victor convida Alba para ler

a prdxima reflexao de L<5gus. Pouco depois, os ouvidos do jovem

sao tangidos pela voz agradivel de Alba:

O Piloto Autom&ico e a Antena Misteriosa

O carro, deslocando-se para tr&s. O desvio, em curva fechada pa

ra a esquerda. A parada no galpao de estacionamento.A mao gira a chave. Cessa o ruido do motor. O homem permane-

ce sentado e quieto; olhando sem ver, os olhos parados e desfocados

do mundo.

O suspiro. A parede em frente do carro: amarela; suja. O p6ra-

 brisa. O homem se apercebe de que nao dirigira conscientemente.

“Quem” dirigira? Estranho piloto autom£tico.. .

O sorriso. Na conscidncia do homem, a grata lembranga. Pene-

tramos em sua mente, no Espfrito do Espago, enquanto ele se enca-

minha, automaticamente e absorto, para o seu apartamento.

A vertiginosa viagem para titfs, nas asas de m£gica ampulheta:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 330/411

1963, agosto, cinco horas da tarde de um dia normal de semana. Os

carros parados sobre o cimento ispero do p&io de estacionamento.

O jovem, aproximando-se do Pontiac azul. Entramos no jovem; e no

Pontiac. O comando mental, e a mao d i partida no motor. Novoscomandos mentais e, finalmente, a marcha k  r6 e o desvio em curva

fechada para a esquerda; a parada, a mudanga de marcha e nova saf-

da, para a firente; o portao da fibrica, que logo fica para trds.

O pensamento; espontaneo. Sutil onda de energia, como que

captada por misteriosa antena. “Quem” a ligara? E “quem” ligara o

 piloto automitico? Nosso jovem continua dirigindo, mas involunta-

riamente.

O pensamento, espontaneo:“O caminho para a suprema realizagao humana, tendo a verdade

 por meta final, que possibilitari a perfeita integragao do he mem no

Esquema C6smico de Vida, parece cheio de dor. E nao pode ser de

outro modo, eis que a dor 6 conseqiiencia direta e natural da humana

incompetencia no julgamento da Vida. Pois, a despeito de sua atual

condigao de imperfegao (limitagao), ousa o homem crer que conhece

e desfnita completamente a Vida. Assim, a dor 6  o meio natural de

alcangar aquela suprema realizagao —como a dolorosa extragao deum espinho. E filha da ignorancia, mas, compreendida, transmuta-se

em benqao, filha do amor.”

Vermelho. O carro 6  parado."Hd momentos, no tempo etemo, em que o caminho parece macio

e. perfumado, colorido em lindos tons e cheio de alegria. At6 que

vem a hora em que, stfbita e inexplicavelmente, toma-se extrema-

mente diffcil de palmilhar. O perfume nauseia, as cores esmaecem, e

a alegria se transforma em tristeza, abrindo caminho a quase insu-

 portivel dor. Daf em diante, a maciez, o perfume, as belas cores e a

alegria, nao mais podem ser caracterfsticas constantes do inevitivel

caminho. Porque vem a dor, embora seguida de pausa em que o ca

minho novamente parece macio, o perfume deleita, as cores encan-

tam, e a alegria alivia o coragao fortemente oprimido.”

Verde. O carro 6  impelido para a frente, na conente do transito.

“No entanto, a Vida prossegue, em sua verdade, a despeito do

humano julgamento. Prossegue conforme a sua Lei, indiferente a

humana ignorancia - como a nuvem que passa e segue c£u afora.

[3261

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 331/411

 Nao obstante quais e quantos nomes possa o homem imaginar para

qualifici-la - boa ou mi, leve ou pesada, bela ou feia, alegre ou

triste, nobre ou indigna, amivel ou odiosa - ela simplesmente E, se

gundo a sua Lei, e nada h i que o homem possa fazer para modifi-ci-la. H i a dor e o medo, a lembri-Io de sua humana condigao. E ele

nao teri sossego at€   que aprenda a nao abominar esse sofrimento;

at£ que se aperceba de sua prdpria ignorancia e entenda que a dor,

advertindo-o, libeita porque ensina, e purifica porque redime. Por

tanto, antes que ele esteja preparado para tomar seus males pelo que

realmente sao —frutos de sua prdpria interpretagao, de seu prdprio

equivoco no julgamento da Vida - continuari a lhes dar os nomes de

dor e medo, em que se transformarao a maciez, o perfume, as cores e

a alegria do caminho, de tempos a tempos, no tempo etemo.”

O volante do carro 6  girado para a esquerda e ele entra na aveni-

da ampla e muito movimentada. E a reflexao do jovem continua, es-

 pontanea.

“Como nao se apercebe do verdadeiro significado da Vida, o ho

mem estabelece uma escala de valores ilusdrios e efSmeros, para

 justifici-la. Nao compreende que ele prdprio existe por Divina Virtude e, nao, por sua virtude. E assim, encontra motivos para orgulho

e vaidade, sem perceber que estas atitudes nascem de sua ignoran

cia; de sua cega persistencia em se opor, intelectualmente, ao subli

me e sutil sentimento da verdade, que continua ecoando no amago

do seu ser, qual insistente memdria de sua origem primeira, de sua

real e divina natureza. E embora seja potencialmente capaz de reco-

nhecer essa verdade, no sussurro de sua pr6pria voz interior, insen-

satamente recusa-se a escuti-la, preferindo abandonar-se i compul-sao de tentar preencher sua vida com aqueles valores falsos e efeme-

ros. Mesmo pressentindo que s6 na verdade teri paz, e que sd a ver

dade o capacitari a amar, protela a agao consonante com a divina e

 persistente memdria.

“Em sua descoberta da magnificSncia da Vida que vibra em si

mesmo e ao seu redor, da suprema inteligencia de seus inumeros e

extraordinirios detalhes (Vida que se manifestava a despeito de suaignorancia), o homem falha em reconhecer a Divina Presenga. Sua

descoberta deveria ser lembranga, mas, em vez disso, €   motivo de

vaidade e embotamento; deveria iluminar a sua consciencia e, no

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 332/411

entanto, mais espessa o vdu que a obscurece. Por isso ele se toma

arrogante, demasiadamente orgulhoso de suas faculdades intelec-

tuais. Em sua presungao, nao compreende que, sabendo que nao de-

ve ao seu intelecto a vida que ignorava (e que a ele sobre vive), fica

sem razao para descrer que ele prdprio seja real numa condigao su perior e diferente da que pode detectar atravds daquelas faculdades

(a menos que prefira ater-se a concepgao primitiva e incoerente de

um Criador onipotente, onisciente e onipresente, mas que esteja si-

tuado em algum lugar fora do mundo e do homem). Sua certeza nem

sequer honra a inteligencia de que ele tanto se envaidece.”

Vermelho, outra vez. O carro 6  novamente parado.

“Assim, continua o homem sem entender que as incoerencias da

sua vida, seus aparentes antagonismos, nao podem ser a Verdade daVida, mas, o produto de sua pr6pria interpretagao, insensata e erro-

nea. Por nao se aperceber da precariedade do seu discemimento in-

telectual, quer ele primeiro saber por que e para que, de onde e pa

ra onde,  na tentativa de conhecer antecipadamente o objetivo (o que6   possfvel em suas consecugoes terrenas) para que possa decidir se

esse objetivo “justifica a Criagao”, concordando, em caso positivo,

em se empenhar na perseguigao desse objetivo conhecido e aprova-

do.”Verde. E \£  se vai o cairo, mais uma vez, sob o h&bil controle do

 piloto autom&ico. E prossegue a reflexao, na captagao da misteriosa

antena.

“No insucesso em achar respostas satisfatorias para essas diffceis

questoes, que ele prdprio inventa (!), encontra o homem escusa

 plausivel para desprezar as persistentes afirmagoes de verdade que

sua voz interior lhe sussurra. Insensatamente, refrata-se a essa divina

manifestagao, com a nlscia obstnigao de sua arrogancia.”

O carro €  afinal estacionado, numa rua estreita e de pouco movi-

mento. Sob o controle do piloto autom^tico, a mao desliga o motor.

O jovem permanece sentado, quieto; olhando sem ver, os olhos pa

rados e desfocados do mundo. A antena continua ligada.

“Com esta atitude, continual o homem a percorrer o caminho

acometido de dor e medo, at£ que tenha coragem e sabedoria para

escutar aquela voz interior, revisar os seus conceitos, e procurar vi-ver em correspondencia exata com a verdade, com aquilo que apenas

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 333/411

E, sem adjetivos, sem explicagoes, sem motivos, sem prop<5sitos.

Compreendera entao, encantado, que nao teri de formular defini-

?oes, de dar nomes e qualificar, porque “Aquilo-que-E” transcende

a razao. Nao o chamarS de Bem, porque nao precisari desta palavra

 para distingui-lo antagonicamente de Mai. Teri, maravilhado e em

extase, a vivencia do que E, no sentimento supremo a que jd dera onome de AMOR!

“S<5 entao compreendera que teri m£rito na medida em que admi-

tir sua prdpria ignorancia e suportar, em Amor, a dor de extirpi-la.

Far-se-i puro e nao sentiri vergonha nisto, porque sua pureza nao

seri a da moral dos equivocados e hip<5critas; e porque os falsos

valores dos homens j£ nao o seduzirao. Finalmente, far-se-d HOMEM, e s<5 entao poderi percorrer o caminho em Amor, condigao

em que ele  s6 pode ser   Divinamente Perfumado, Magnificamente

Colorido e Verdadeiramente Jubiloso, no Tempo Etemo!”

Saimos do jovem. A vertiginosa viagem para a frente, nas asas da

ampulheta migica: 1979, abril, seis e quinze da tarde de um dianormal de semana.

O sorriso. O homem, em seu apartamento. O papel, amarelado,

desliza para dentro da velha pasta. Ainda conseguimos ler um tftulo: No Tempo Etemo. . .

 No tempo etem o.. . no tempo etem o.. . no tempo etem o.. .

A cabega tomba para tr&s e o pescogo €  oferecido d dgua quente,

que desce em chuveiro e vai banhar o pontudo pomo-de-adao; e se

gue, depois, deslizando pelo corpo todo, doando calor e sujando-se

 para limpar. Entramos no homem, nesse Adao que se banha.

Calor... relaxagao... prazer. .. intenso prazer!

A dgua, escorrendo pelo corpo todo, deleitosa; doando calor e

sujando-se para limpar. Amorosa didiva, do ser que d£ sua energia ese macula para purificar!

Limpeza do corpo. . . purificagao do ser. . . o clic .. . a antena li-gada!

. a perfeita integragao do homem no Esquema Cdsmico deVida.”

Do homem? Que homem? Adao superior, que  j£  nao 6  mais homem? Nem homem nem Adao superior. O SER! No Esquema C6s-

mico de Vida? Que esquema? Vida. S<5. VIDA!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 334/411

Dor? Nao! Bengao. . . filha do Amor! Bengao que liberta porque

ensina! BSngao que purifica porque redime!

“De tempos a tempos, no tempo etem o.. . ”

Sim. Como a nuvem que passa e segue c6u afora. At6  um dia pre-

cipitar-se em chuva sobre o Oceano e nele se dissolver! Nao mais a

nuvem. Agua em £gua. OCEANO!

. . que ele prdprio existe por Divina Virtude..

Ele prdprio? Homem? Nao! Divina esponja, que se deixa impreg-

nar do divino perfume e amorosamente o exala! M£gica esponja, que

absorve para exalar, que deixa passar! Porque tambdm ela 6  perfu

me; divino perfume, concentrado em forma de Adao!

“. . . a divina e persistente memdria..Antena misteriosa, na migica esponja! Divinas narinas, que aspi-

ram o perfume. E a esponja se dissolve, inebriada, e se dispersa em

 perfume. Conhece o perfume o extase do seu prdprio aroma?

“ . . .o objetivo que justifique a Criagao.. .”

Criagao? Nao! MANIFESTA^AO (ou mani-FESTA-gao)! Per

fume cdsmico, que aqui parece concentrar-se e ali parece dissolver-

se e se dispersar! Criagao? A humana perspectiva; a ilusao, no pen

samento erroneo. Manifestagao: a perspectiva do Espfrito do Espago!

.. nao teri de dar nomes e qualificar. .

Bem? Mai? Um Criador que esti fora? Ou dentro? Nao! O SER!

 Nem fora, nem dentro; aqui, sempre; agora, sempre; infinitamente

aqui, no tempo etemo. Que ESTA, sempre, infinita e etemamente; e

que transcende o perfume!

Frio. O corpo nu, sentado no banquinho do banheiro. O banheiro

 —banheiro? nao; um santu&io! O mundo—mundo? nao; um santu&io!A inalagao profunda e um longo suspiro. Onde o divino perfume?

Seri ele que me inunda com esta sutil felicidade?

Calor. . . das l&grimas, que saem dos olhos (dos olhos? nao! do

coragao! do &mago do Ser!) e vem beijar-me amorosamente o rosto.

Gotas do perfume cdsmico, que deslizam pela minha face, numa ca-

ricia de infinito Amor!Obrigado, “ piloto automitico” ! Um dia nao mais poder£s desligar

essa “misteriosa antena” ! . . .* * *

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 335/411

Alba deixa tombarem no colo as maos com o papel e, olhos fixos

mas desfocados do mundo, abandona-se em migico suspiro ao influ-

xo da. . . reflexao?. . . nao!. . . do luminoso extase do Tio! E nela €  

suscitado e ela VIVE esse Sxtase e sua consciencia se enche deLUZ!

E ela fica assim, embriagada com o Perfume, irradiando a mara-

vilhosa Cor e exultando na sublime Alegria do Espfrito do Espago -

que vai tamb£m desenhar, na boca do corpo de Victor, um sorriso

encantado, efeito reflexo da bem-aventuranga que vive aquele velho

ser, No Tempo Etem o.. .

Alba, depois:

“E eu que estava com aquele sentimento neurtftico de culpa por

ter passado a manha inteira sem fazer nada. . . Naturalmente, tam-

 b6m aqui €  preciso a gente nao saltar para o extremo.”

“E qual €  a solugao, entao?”

“Ora. . . fazer, mas. . .  ser,  nesse fazer; e ser, m as.. .fazer,  nes

se ser. Parece que o fundamental 6   desenvolver uma aguda cons

ciencia de ser,  ao fazer. Do contririo, o fazer, propriamente, toma-

se todo-importante, toma-se. . . razao de ser. Na verdade, ser, pro priamente, continua entao como um espago vazio, apenas aparente e

ilusoriamente preenchido por esse fazer, que nao passa de anestesia.

Em suma, parece que a “ fdnnula”. . . Ouviu as aspas?”

Victor, sorrindo:

“Ouvi.”

“Entao, a “formula” 6: SER FAZENDO E FAZER SENDO. Se a

gente faz, ao ser, esse fazer participa do ser, que €  vida - 6 um fa

 zer-em-ser; e, se a gente 6, ao fazer, esse ser participa do fazer e lhe

d i significado - 6   um  ser-em-fazer;  h i vida, neste fazer. Esti cla-ro?”

“Para mim, ou entre n6s, esti. Mas como vamos conseguir isto?”

Alba, fecha os olhos, apdia o queixo nas maos cruzadas, e assim

fica por cerca de um minuto. Depois, volta a falar 

"Exercfcios 6  a resposta. Sem contrairmos “extremicite”, ou seja,

razoavelmente, devemos fazer exercfcios de introspecgao, concen-tragao, contemplagao e meditagao.”

“Puxaf A resposta veio segura. Mas introduziu dois elementos

novos na nossa teiminologia. Voce vai ter de defini-los.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 336/411

“Eu sei. E aquele papo sobre a consciencia de significado e oacordo verbal. A gente pode e deve, quando necessdrio, atribuir sig

nificado especial a qualquer palavra, desde que tenha clara cons

ciencia desse significado, na reflexao pessoal, e o defma claramente

na comunicagao do nosso pensamento a outra pessoa.”

“Isto mesmo.”“Vejamos, entao. Senti necessidade destes dois novos termos, pa

ra acentuar ou enfatizar a importancia e o valor ou proveito de dois

estados de consciencia especiais. Quando eu penso em contemplagao

e meditagao, tendo a pensar em abstragao como objetivo; principal-

mente no caso da meditagao. Os dois novos termos vieram designar

aqueles estados especiais* nos quais deve ocorrer abstragao parcial,

mas isto nao 6  objetivo; o objetivo 6  um estado de consciencia aguda

ou intensa, por meio de ATEN£AO FOCALIZADA.

“No primeiro caso, de introspecgao,  a gente se abstrai do am-

 biente - isto 6, fecha os olhos, isola-se de rufdos, sons, vozes, prin-

cipalmente vozes, etc. —e FOCALIZA A ATENQAO (consciencia)

no. . . nas sertsagoes intemas de ser. Passivamente. Acontega o que

acontecer, a gente nao interfere, nao reforga, nao aceita nem rejeita,

nao analisa. . . enfim, nao se envolve; apenas sente e observa, com aatengao focalizada nos movimentos intemos da mente, mas deixando

tudo acontecer e passar. E assim como se a luz de um farol de auto-

m<5vel fosse a sua consciencia e ele a voltasse para dentro de si

mesmo. E ficasse algum tempo observando o movimento dos eli-  

trons em seu filamento, as ondas de calor, etc. Assim, a gente deve

ficar acesa, mas com a nossa “luz” voltada para dentro.“No segundo caso, de concentragao,  a gente FOCALIZA A

ATENQAO (consciencia) fora da gente, ou seja, em algum objeto de percepgao em particular, mas, tamb£m passivamente, sem se envol-

ver. Por exemplo, se a gente esti lavando uma panela, focaliza a

atengao na pn5pria panela, nas maos da gente, na igua. . . enfim, nos

elementos perceptivos que compoem o ato de lavar a panela. Ou, ao

caminhar, a gente focaliza toda a atengao no ato de caminhar; ao

comer, no ato de comer; ao fumar, no ato de fumar, etc.

“Tenho achado este segundo exercfcio mais diffcil, porque a

gente tem a tendencia arraigada de pensar noutras coisas, enquantolava panelas, caminha, fuma, etc. E, neste caso, 6 preciso parar de

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 337/411

 pensar. Quero dizer, 6  preciso fazer cessar esse pensamento “auditi-

vo”, com palavras, que a gente mantdm constantemente. Esse pen

samento 6  um bloqueio ao sentimento direto da fungao perceptiva,  e

6  neste sentimento que a gente pode comegarater aquela consciencia

de ser. Mas a vantagem 6  que a gente pode praticar enquanto faz oque tem de fazer na vida diSria (miniiscula). Alias, isto vem trazer

um novo interesse pelas nossas ocupagoes e obrigagoes de rotina.

Chego at6  a pensar que a prftica da concentragao, assim definida, 6  

ACHAVE DA VIDA!

“O fato 6  que estes dois exercfcios levam a gente a uma espdcie

de aguda consciencia de ser;  a gente se sente mais intensamente

VIVA! Forte acuidade de consciencia, €   o resultado ou efeito. Eusei que, hoje, minha consciencia de ser 6   diferente de antes desses

exercfcios. Diferente? Nao. Acho que 6  mais correto dizer que, antes, eu NAO TINHA consciencia de ser!

“Hoje eu SOU diferente, como se estivesse passando por uma

intensa transigao da vida minuscula para a VIDA maiuscula. E isto

esti afetando ou modificando toda a minha visao da vida. Estou me

sentindo MAIS VIVA, mais intensamente viva, mais interessada na

vida, mais fortemente compelida a pensar e estudar e meditar, no es-

forgo de tomar cada vez mais manifesto o meu imenso potencial in-

temo de ser. E isto esti resultando naquela histdria de SER FA-

ZENDO E FAZER SENDO, de que eu falei antes. Nao 6  maravilho-so?”

“E, sim. E maravilhoso observar e acompanhar a transformagao

 por que voce est£ passando. Nao consigo imagin£-la fazendo um

discurso como este antes de voce ter sido iniciada pelo Tio.”“Mais por voce do que pelo Tio.”

“Ai voce se engana. Eu fui canal, mas a iniciagao veio do Tio.

Um dia voce vai se aperceber disto. Em todo caso, 6  interessante sa-

lientar que essa iniciagao foi possfvel, digamos, cinqiienta por cento,

 porque voce estava preparada; reunia, em sua estrutura psfquica, as

condigdes necessirias. E como aquela parabola de Jesus, sobre o

semeador; a semente tem de ser boa e o solo tem de ser bom.”

“E. Eu sei. Afinal, j£ li os Evangelhos de Jesus mil e uma vezes.Ele disse:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 338/411

' ‘Mas o que fo i semeado em boa terra 

&o que ouve a palavra e a compreende; 

este frutifica, e produz a cem, a sessenta 

e a trinta por um.

“Alias tenho sentido impulso de ler mais uma vez os Evangelhosde Jesus. Acho que, agora que sou INICIADA” - pronuncia a pala

vra iniciada  com enfase, assumindo jocosamente a atitude de quem

se envaidece de sua nova e maior importancia - “vou produzir A

MIL!”Os dois riem, felizes. Depois, saem a passear, ora contemplando o

 por-do-sol, ora concentrando-se no seu caminhar, num SER FA-

ZENDO que os faz SER. Vivos, intensamente vivos, naquele FA

ZER SENDO em que SAO fazer.

E n 6 s , q u e n a d a f a z e m o s n o E s p a g o ,

s o m o s n e s s e n a o - f a z e r

q u e S o g l o r i o s o s e r

d a q u e l e q u e o u v e a p a l a v r a

e a c o m p r e e n d e !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 339/411

BRECHA NA CIRCUNFERENCIA MAGICA

M c i g i c a . , ,

O u t r o t e r m o d e q u e a p r e n d e m o s a g o s t a r ,

n o E s p a g o d o E s p f r i t o ,

o n d e a c i r c u n f e r i n c i a d a n o s s a c o n s c i e n c i a

a o m S x i m o s e e x p a n d e e a o m f n i m o s e c o n t r a i ,

a q u i , s e m p r e ; a g o r a , s e m p r e .

M S g i c o 6 !

Antes, o espago aparentemente vazio. Agora, a folha nova do p€  

de anturio, desenrolando-se para a luz!

A folha n ova.. . conforme a natureza do anturio. Nao a fiz assim.

Cuidei da planta. Sd. Reguei, adubei, limpei, defendi de insetos da-

ninhos. S6. E veio o caule e cresceu. . . cresceu. . . at£ que a folha

comegou a se abrir e o caule entortou em diregao k  luz.

O anturio. Vivendo, crescendo, manifestando-se conforme a sua

natureza. Puramente. Plenamente. Divinamente?

De qualquer forma, o antiirio se desenvolve e floresce conforme a

sua natureza. Parece ser. . . e deixar ser; viver. . . e deixar viver;

crescer. . . e deixar crescer. Manifestando ao mdximo possfvel o seu

 potencial de ser, viver e crescer. Puramente. Plenamente. E anturio.

Profunda e intensamente anturio!

Assim deveria ser com as pessoas. Como seres humanos e comoindividuos.

Ser humano e individuo. . . Sim. Cada pessoa 6, simultaneamente,

ser humano e indivfduo. Somos todos iguais. Somos todos diferen-tes. Simultaneamente. Dois em um. Sempre. Semelhantes.

A felicidade de cada pessoa depende de que ela realize o seu po

tencial de ser.  Duplamente: como ser humano e como individuo.

Cada pessoa tem de ser um ser humano feliz. Cada pessoa tem de ser

um individuo feliz. Sempre e simultaneamente. Nao €   possfvel ser

feliz como ser humano sem ser feliz como indivfduo. Nao 6  possfvel

ser feliz como indivfduo sem ser feliz como ser humano.Mas, felicidade. . . que 6? Antes e necessariamente: felicidade de

quS? Do homem? E homem. . . que 61  Ser. Que 6  primeiro no ho

mem? Ser. Entao, a felicidade do homem consiste em ser. Ao mixi-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 340/411

rao possfvel do humano potencial de ser. Ao m£ximo possfvel do

 potencial individual de ser. Simultaneamente. Cada pessoa 6   tao fe-

liz quanto consegue  ser.  Como ser humano e como indivfduo. Si

multaneamente.

O anturio. Planta e anturio. Simultaneamente. Dois em um. Reali-zando sua natureza de planta. Realizando sua natureza de anturio.

Ao m£ximo possfvel do seu potencial de ser.

E. . . mas anttirio 6  vegetal. E homem? Animal? S<5? Mais do que

animal?

O homem pensa. E ai comega a sua tragddia. Nao consegue sim-

 plesmente ser. Puramente. Plenamente. Divinamente?

De qualquer forma, nao consegue simplesmente ser, conforme a

sua natureza. Nao sabe ser. . . e deixar ser; viver. .. e deixar viver;crescer. . . e deixar ere seer. Nao consegue manifestar ao m&ximo

 possfvel o seu potencial de se r .. . puramente humano.. . plenamente

humano. .. profunda e intensamente humano! Porque pensa.

Porque pensa. . . Pensar 6  ruim? Nao pensar 6  melhor? Se o ho

mem nao pensa, €  animal; s6. Se pensa, €  mais do que animal; €  ho

mem. O homem €  animal racional. Mas, na racionalidade, sua tragd-

dia. Como raciocina o homem? Certo? Feliz. Errado? Infeliz. Cer

to. .. como? No sentido que o leve a ser.. . e deixar ser; viver... edeixar viver; crescer. . . e deixar crescer; ao m£ximo do seu poten

cial de ser, de viver, de crescer; de deixar ser, viver e crescer; pro

funda e intensamente.

S er.. . que 6? Simplesmente existir? A caneta existe. E? Sim, mas

s<5 porque existe; nao tem opgao. O anturio existe. E? Sim, mas sd

 porque existe; nao tem opgao. E o homem? O homem 6   porque

existe. S<5? Nao. Tem a prerrogativa e a responsabilidade da opgao.

 A i a sua bengao. Af a sua tragddia.

Ser 6  existir conforme a natureza. Cada ser 6 , na medida em que

existe conforme a sua natureza. Se isto nao Ihe 6  permitido, definha,

sofre; em caso extremo, deixa de existir, morre!

Ser, para o homem, 6  existir conforme a sua natureza, na jubilosa

e intensa consciencia de ser. Em verdade. Porque a verdade existe;

6   SIM. Sobre ela €  possfvel construir. Nela i  possfvel ser e viver e

crescer. A felicidade 6  filha da verdade, na humana consciencia de

ser - profunda e intensa, jubilosa e sem limite. Nessa felicidade, o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 341/411

homem 6   superior, magico projetil disparado para o infinito. A ilu-

sao nao existe; 6  NAO. Sobre ela nao 6  possfvel construir. Nela nao

€   possfvel ser nem viver nem crescer. A infelicidade 6  filha da ilu-

sao, na entorpecente inconsciencia de ser, ou na neurotizante cons

ciencia de nao ser - profunda e intensa, entristecedora e restritiva. Nessa infelicidade, o homem 6   ser inferior, animal neurdtico deba-

tendo-se no frnito.

Aperto a tecla: 2. No televisor, o som, surdo e breve. Depois, a

voz masculina, a luz, a imagem. Som e imagem: o noticidrio. Assal-

to, acidente, revolta, violencia, catistrofe, mislria, <5dio; responsa-

 bilidade, beleza, candura, compreensao, riqueza, amor.

Por que? Por que nao consegue o homem ser defmitivamente feliz? Muitos motivos. Qual o motivo primeiro? O sistema politico? O

sistema economico? O sistema educational? A organizagao social?

Falta de conhecimento cientffico? Falta de cultura filosdfica? Falta

de devogao religiosa segundo essa ou aquela igreja? Ou que outros

motivos?

Que 6  primeiro? Homem ou polftica? Homem ou economia? Ho

mem ou educagao? Homem ou sociedade? Homem ou ciSncia? Ho

mem ou filosofia? Homem ou religiao? Homem ou. . . seja l i  o que

for, que nao seja homem?

Quem criou, modifica e aplica polftica? E economia? E educagao?

E organizagao social? E ciencia? E filosofia? E religiao? A nature

za? A realidade que sobrevive ao homem e a natureza?

O homem 6  o motivo primeiro. Porque 6  inteligente mas nao 6  s i

 bio. Nao sabe. Mas pensa que sabe. O erro. O comego da dor. A in-

felicidade, na tentativa insensata e cega de construir sobre a ilusao.Complicagao e dor. Incessantes modificagoes. Mais complicagao e

dor. O homem nao se conhece. Mas pensa que se conhece. O er

ro. . .

O homem nao sabe o que 6. Como pode ser?

 Nao sabe o que 6. Como pode  ser?  Penso. .. penso... penso...

Penso; logo.. . existo?.. . sou?

Existir 6   somente isto: ter existencia. Quando penso em dizer oque €   existir, sinto a mente vazia. Existir. S<5. Quando penso em di

zer o que €   ser, algo acontece na mente; ela se faz fecunda e nela

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 342/411

floresce a id6ia de que ser 6  mais do que existir, porque €  existir em

intensa e jubilosa consciencia.

Consciencia. . . de que? De ser? Entao. . . um circulo fechado?

Ser 6  existir consciente de ser? Num cfrculo fechado?

O papel em branco. Contemplo-o, longamente. O sentimento: Umtodo. Indiviso. Nenhuma discriminagao. Branco. S6. Aqui, sempre.

Agora, sempre.

Visualizo uma circunferencia no papel. Agora existe o circulo.

Fechado. Outro sentimento: Um todo, dividido. Discriminagao: aqui,

a parte de dentro do crrculo; ali, a parte de fora do circulo. Agora,

aqui, depois ali. Agora e depois. Aqui e ali.

Visualizo letras no cfrculo:  M,  como em mat&ria; H,  como em

homem.  Mais discriminagao. Um todo, mais dividido. Complexida-de.

Modifico a circunferencia. Visualizo-a interrompida. Novo senti

mento: Um todo, ainda dividido. Por6m, discriminagao menor. Inter-

 penetragao: aqui como ali, agora como depois.Dissolvo as letras e a circunferencia. De novo o todo indiviso.

 Nenhuma discriminagao. Branco. Sd. Aqui, sempre. Agora, sempre.

Circulo fechado? Nao. Infinito: aqui, sempre. E etemo: agora,

sempre.Ser €   existir consciente de ser infinito e etemo. Como? Por que?

Para que? Vas perguntas. Ser. Sd. Infinita e etemamente. Aqui e

agora, sempre. Puramente. Intensamente. Jubilosamente.

Ser humano? Indivfduo? Ser humano e indivfduo? Nao. Somente

Ser. No gozo de ser; infinita e etemamente.

Penso; logo, existo? Nao. SINTO; LOGO, SOU!

E, m as.. . e enquanto nao se consegue isto?

A letra no cfrculo. Confinada pela circunferencia.O homem que discrimina e tenta ser no nao-ser, na ilusao, no

 NAO. Ser humano e indivfduo; simultaneamente. Perguntando-se

como, por que e para quS. Confundindo-se. Pensando com palavras;

no tempo e no espago. Na sua linguagem verbal, o trago forte e con-

tfnuo da circunferencia. E ele continua sendo no circulo, porque as

sim pensa; porque esta 6  a sua consciencia de ser.

Ora aqui ora ali, por6m, decepgao, frustragao, drivida, inquieta-

gao. Perplexidade e dor, no pensamento verbal, que 6   segundo -

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 343/411

com palavras; no tempo e no espago. Mas vem o subito lampejo de pensamento puro, que €  primeiro - intrinsecamente independente da

 palavra; etemo e infinito. No pensamento puro, o sentimento direto- de ser; s6.

Vem a lembranga:

(Um jovem, escrevendo. A sua frente, a porta. Na metade supe

rior da porta, a janela aberta. O jovem, concentrado em sua ocupa-

gao. Stibito a compulsao e ele ergue a cabega e olha para fora, pela

 janela aberta. Pasmo ext&ico! Por quanto tempo? Onde? Fora do

tempo e do espago; infinita e etemamente! No pensamento puro; que

€   primeiro; que 6   sentimento direto. Pasmo ext^tico, na subita con-

templagao atravds da janela aberta.)A brecha na circunferencia!

 No homem, mais e mais lampejos de pensamento puro, de sentimento direto. E a circunferencia vai se tomando cada vez mais inter

rompida. Discriminagao menor; interpenetragao; aqui como ali; agora como depois.

Mas nao sempre.

(O jovem volta k  consciencia objetiva. A janela, emoldurando acena natural: o galho com folhas verdes, o c6u azul, a nuvem bran-

ca, a mata ao fundo, luz intensa. Pasmo extitico? Nao. Admiragao

estdtica; sentimento de harmonia, na consciencia confinada ao finito.

Depois, nada especial: galho, folhas, cdu, nuvem, mata, luz.)

Frustragao. . . duvida. . . inquietagao. . . lampejos de pensamento

 puro. . . frustragao.. . lampejos de sentimento direto.. .

A circunferencia, agora feita de pontos, diffcil de discern,

E o processo continua. Mais e mais fortes lampejos. Cada vezmais forte e claramente, aqui como ali. Nao aqui e ali; aqui como

ali. Cada vez mais forte e claramente, agora como depois. Nao agora

e depois; agora como depois.

Finalmente, a circunferencia se dissolve!

O homem nao mais 6, porque deixa de ser no nao-ser. Passa a ser

na verdade, que existe, que 6  SIM - onde ele sempre fora! Palavras?

Impossfvel! S6 o sentimento direto que transcende o extase! Sentimento? Consciencia? Palavra.

O papel em branco; sem cfrculo nem letras!

Enquanto exista o cfoculo, pordm, que seja dado ao homem  ser,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 344/411

autenticamente, verdadeiramente, como ser humano e como indivf-

duo. Nao seja o indivfduo moldado, ajustado, artificial e racional-

mente, a um ser humano “ideal” . Nao seja o ser humano moldado,

ajustado, artificial e racionalmente, a um indivfduo “ideal” . Nao se

generalize o indivfduo nem se particularize o ser humano. A cada pessoa seja dado  ser,  ao miximo do seu potencial de ser; como ser

humano e como indivfduo.

Polftica? Economia? Educagao? Organizagao social? Ciencia?

Filosofia? Religiao? Mis instituigdes, se, desintegradas, reforgam

0 trago da circunferencia e confmam o homem no cfrculo. No crr-

culo? Nao; na jaula - animal neurdtico, debatendo-se no finito. Boas

instituigoes, se, integradas, num humano SABER, abrem uma brechana circunferencia e disparam o projetil para o infinito!

E o anturio? Precisa ser disparado? J i foi disparado? Pode ser

disparado? Que 6  o anturio, no infinito?

O anturio. . . a folha nova. . . o caule, torcendo-se em diregao

1 luz.. . h luz. . .

* * *

“E isso af.” - Diz Victor, ao terminar a leitura da reflexao do

Tio.

E Alba, em atitude pensativa:

“Pois 6.  E agora eu acredito que fui iniciada pelo prdprio Tio.

 Nao compreendo o mecanismo dessa iniciagao por controle remoto.

E migico. Mas agora acredito.”

“Nao foi tao remoto assim, o controle. Eu fui a subestagao.”“Mesmo assim. Em todo caso, nao importa. Nao vamos mesmo

 poder compreender esse mecanismo, nem isto €  necessirio.”

Ainda mais profundamente pensativa, Alba prossegue:

“Compreender e explicar. Af o nosso equfvoco; af o nosso infer

no. Compreender e explicar sao coisas do intelecto, e ele nao 6  o rei.

E necessirio compreender e explicar, na vida minuscula. E valioso,

Util, importante, na vida mindscula. Mas, na VIDA maiiiscula, 6 im- 

 possfvel! O que se compreende e explica nao 6  da VIDA maiiiscula;nao pode ser, justamente por ser compreendido e explicado. Quando

se compreende e explica nao se esti na VIDA maiuscula; nao se po-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 345/411

de estar, justamente por se estar compreendendo e explicando.

“E como Jesus apontou. Como nas criancinhas. A gente pergunta:

“por que voce fez isso”? A criancinha fica perplexa. Por uma fragao

de segundo, d i  um branco na sua cuca. Finalmente, ela responde:

“porque fiz” . E isso af: NAO TEM POR QUE! Na VIDA maiUscula€  assim: nao tem por qu6. E? Sim. Como? Nao 6  possfvel dizer. Por

qud? Nao tem.”

Victor, em tom de entusiasmo e admiragao:

“Nao h i dtivida de que voce foi iniciada! E exatamente assim que

o Tio pensa: NA VIDA MAIUSCULA, NAO TEM POR QUE!”

“Nao tem mesmo. E ser, viver, sentir. SO - como o Tio sempre

diz.”* 

“E, mas nao se surpreenda se, um dia.. .”“Ele disser que na VIDA maiuscula nao h i  ser, nem viver, nem

sentir? Ou que esse ser 6   um nao-ser, esse Viver 6  um nao-viver, e

esse sentir 6  um nao-sentir? Ou nem ser nem nao-ser, nem viver nem

nao-viver, nem sentir nem nao-sentir?

“Nao. Nao vou me surpreender. Pelo contr&io, eu ficaria surpre-sa se, um dia, ele me propusesse um construto, dizendo: £ final, de

 fin itive, perfeito; at esta a verdade, e fu i eu quem a disse; tome; £  

 seu este Undo cristal; guarde-o bem, porque e unico; sua busca ter- minou; voce nao precisa mais procurar cristais; porque agora tem 

este, que e perfeito e Undo e unico. Ai sim, eu me surpreenderia.”

Victor, em tom de desafio:

“E se ele fizesse isso, o que €  que voce faria?”

“Ora. . . eu acho. . . eu acho que estiraria a lingua pra ele e . . . e

 jogaria o tal cristal no chao, bem na frente dele!”

Victor sorri e Alba, sem perder o prumo, comenta:

“E 6   exatamente isso af que eu acho que o Tio faria.” - E unesua gargalhada &do jovem, no mais gaiato e alegre dueto da histdria

das discussdes filos<5ficas.

Depois, Victor reabre o diilogo:

“Voce disse que agora acredita que de fato foi iniciada. Algum

sinal especial?”

“Por um instante, pensei que voce fosse perguntar por qu £.. . ”

“Pra quS? Pra lhe dar a chance de me jogar um “nao tem por

que” na cara?”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 346/411

 Novo dueto de riso e, depois, a namorada, voltando d seriedade:

“Nenhum sinal especial. Quero dizer, nada espetacular. Mas me

arrepiei toda quando voce leu, na reflexao do Tio, coisas como

“potencial de ser” e “jubilosa e intensa consciencia de ser” . Ontem,

depois que lemos a outra reflexao, eu falei nestes termos!”“Eu sei. Notei isto enquanto lia, mas nao quis interromper, pra

nao perder o embalo do pensamento do Tio.”

“Bem, 6   possfvel que voce tenha usado expressoes como estas,

em nossos papos, ou que as tenhamos lido em outras reflexoes do

Tio. Mas, de qualquer forma, sinto que houve mais do que recorda-

gao involuntdria, no meu uso dessas expressoes. Elas foram MI-

 NHAS. Foram produzidas pela minha estrutura psiquica, geradas em

mim, como em ato criador. Talvez minha estrutura psiquica estivessefuncionando como subestagao do Tio, ou do Espfrito do Espago.

 Nao sei. O que sei 6  que senti o conteudo daquelas expressoes r\as- 

cer  em mim.”

“E assim mesmo que acontece. E 6  possfvel que o Tio jd nao es

teja mais nisso. Agora voce sabe o que ele quer dizer com SUSCITAR.”

“Isso!”

“Pois 6. Agora estd em voc£. E VOCE! Voce estd e voce 6, porque nao 6 do Tio, nem meu, e nunca foi nem serd de ningu6m. Estd

em toda parte, sempre; aqui: infinitamente aqui; agora: etemamente

agora. Pode ser meu, seu, de qualquer ser humano que faga o que 6  

 preciso fazer para TORNAR-SE.

“Isto. O caminho 6   um caminho para TORNAR-SE. Qualquer

outra coisa 6  anterior ao Caminho, ou, pelo menos, &“reta de che-

gada” do Caminho. Mas s6   terd quem se tomar; e s6 se tomard

aquele em quem for suscitado; e s6  serd suscitado naquele que jd for bom solo. Voce era bom solo, e foi suscitado em voce e voce se tor-

nou, e agora tem. E, porque tem, a voc6 serd dado em abundSncia

sempre crescente. Ninguem poderd lhe tirar o que tem; nada poderd

eliminar o que voce tem; e voce terd sempre mais. Porque tomou-se;

 porque foi suscitado em voce; porque voce jd era bom solo.”

Alba inalf fundo, suspira, e diz:

“Sabe, se algudm pudesse sentir de repente o que n6s estamos

sentindo agora e tentando.expressar, provavelmente diria.fantdstico!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 347/411

 No entanto, justamente isto 6  que nao 6. E verdadeiro, real, e mesmo

natural.”

“E nao €  “fantdstico” que seja verdadeiro, real, natural,?”

Alba soni e Victor pergunta:

“E quanto a reflexao do Tio, propriamente?”“Uai! Que hd para se dizer? Voce jd disse: “6 isso a f 

“Cada um de n6s 6  um potencial humano e individual de ser. A

felicidade de cada um de n<5s depende de que consiga realizar, a um

grau satisfat<5rio, esse duplo potencial de ser. E a felicidade de TO

DOS depende da felicidade de CADA UM. Se cada “CADA UM”

for feliz, TODOS os “CADA UNS” serao felizes. E somente assim.

E isto que temos? Para TODOS serem felizes, 6   preciso que cada“CADA UM” tenha chance de realizar o seu duplo potencial de ser;

entao, TODOS os “CADA UNS” poderao realizar o seu duplo po

tencial de ser. E somente assim. E isto que temos?

“Que €  que temos? Cada “CADA UM” estd procurando realizar

o seu potencial de ser, sem o menor RESPEITO pelo potencial de

ser dos outios; &s custas, inclusive, da chance dos outros de fazer o

mesmo. Isto 6  o que temos. E em que dd, isto que temos? Evidente:

se uns tantos “CADA UNS” estao conseguindo ser felizes - pelomenos temporariamente e conforme pensam - ao prego da felicidade

de outros, entao, os “CADA UNS” nao podem ser TODOS feli

zes!”

Victor, para testar a namorada:

“Nao €   ingenua, ou infantil, esta sua visao da nossa vida no

mundo?”

“Ingenua? Infantil? Que 6   “ingenua”? Que €   “infantil”? Pois

quer saber de uma coisa? Ingenuidade €  o rdtulo com que encobri-

mos a verdadeira sabedoria,  por contraste com a nossa insensatez,

que falaciosamente rotulamos de “ sabedoria” . E infantilidade . .6  

a mordaga com que tapamos a boca de Deus! Voce sabe o que 6  uma

criancinha? E Deus-no-mundo, sem o bloqueio da adulta insensatez.

“Deus-crianga pergunta a pai-bloqueado: “Pai, voce disse que a

gente nao podia ir no circo porque o seu carro tava na oficina.  Por  

que a gente nao vai no carro do vizinho?  Eu sei que ele nao vaisair. O Joaozinho me disse” .

“Pai-bloqueado balanga a cabega, sorrindo complacentemente an

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 348/411

te a “ingenuidade” de Deus-crianga. E responde: “Mas minha filhi-

nha, voce mesma disse que o carro € do vizinho.  Se 6  do vizinho, eu

nao posso us£-lo, assim como ele nao pode usar o meu” .

“Pois bem, se voce comparar as duas ldgicas, vai perceber que,

na “ingenuidade” de Deus-crianga, h£ sabedoria, e, na “sabedoria”de pai-bloqueado, insensatez.”

O jovem, decidido a levar adiante o seu teste:

“Pelo contr£rio, a “insensatez” de pai-bloqueado 6   sabedoria,

 porque ele reconhece as caractensticas do sistema sdcio-economico

em que vive e a elas se ajusta.”

“Pois bem; examinemos isto.

“A crianga 6   ingenua porque nao pode se aperceber das caracte

nsticas do sistema stfcio-economico vigente. O pai 6   sabio porquereconhece essas caracterfsticas e a elas se ajusta. Qual 6  a id6ia que

fomece a chave do criterio de comparagao? Caracterfsticas do sis

tema sdcio-economico vigente.  Entao e isto que cabe questionar.

Sao s6bias, essas caracterfsticas? E sSbio o sistema socio-economico

sob o qual estamos vivendo? TODOS os “CADA UNS” sao felizes

ou, pelo menos, tem a mesma chance nesse sistema? H£ justiga,  nes-

se sistema?

“Um homem fisicamente perfeito e de compleigao attetica €  colo-cado ao lado de um aleijado. E dizem: “Voces dois tem a mesma

chance. Estao partindo da mesma linha e devem chegar a mesma li-

nha —aquela marcada com a bandeira vermelha. Quem chegar pri-

meiro, ganha” . E assim a “justiga” do nosso sistema s<5cio-economi- / / 

co. E justa, nossa “justiga”? E justiga?

“A justiga de Deus-crianga 6   diferente e melhor. E justiga. Por

que nao 6   criterio maior. O criterio maior, para Deus-crianga, 6  

AMOR. E a justiga de Deus-crianga esti nesse amor, decorre dele,que €  “a lei e os profetas” . Como disse Jesus:

‘‘Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos fagam, 

assim fazei-o vds tambim a eles, 

 porque esta £ a lei, e os profetas.

“Voce pode pensar em lei maior? Em justiga maior? Em sabedo

ria maior? Pois 6   assim a lei de Deus-crianga; 6  assim a justiga de

Deus-crianga; e 6  assim a sabedoria de Deus-crianga, que rotulamos,

insensatamente, de “ingenuidade”. Estamos confundindo palavras e

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 349/411

significados. O que chamamos de “ingenuidade” 6  pureza, verdade,

amor. E h i justi§a, nisso que 6  puro, verdadeiro e amoroso.

“A justiga de Deus-crian§a 6  assim: Que a TODOS seja dado tu-

do o que haja de melhor, desde que cada “CADA UM” de o que

 possa dar  de melhor. H5 amor nisto. E que a nenhum “CADA UM”seja dado o que haja de melhor, se ele nao der o que possa dar de

melhor.  H i amor e justiga nisto. Que tudo o que haja de melhor seja

de TODOS os “CADA UNS” que estejam dando o que possam dar

de melhor, cada qual segundo o seu potential, real e natural. Que

nenhum “CADA UM” tenha mais porque seja mais capaz. No con-

trSrio, nao ha amor nem justiqa.

“Que cada “CADA UM” parta de onde possa partir e chegue on-de possa chegar. E nisto fa?a jus a tudo o que haja de melhor. De

modo que TODOS os que partam de onde possam partir, e cheguem

onde possam chegar, tenham tudo o que haja de melhor. E a nenhum

“CADA UM” que nao parta de onde possa paitir, nem chegue onde

 possa chegar, seja dado tudo o que haja de melhor.

“Nosso melhor crit&rio de justiga parece assentar sobre capacida- 

de.  Nao h i amor nisto. O crit&io de justi?a de Deus-crianga parece

assentar sobre possibilidade e esforgo. HI amor nisto.“E ldgico e racional o nosso crit£rio de justi§a? Grande coisa!

 Novamente estamos confimdindo palavras e significados. O que 6  

logico e racional nao €  necessariamente sdbio, nem verdadeiro, nem

 bom, nem amoroso. Somos felizes na pr£tica dessa nossa 16gica,

dessa tao cultuada e respeitada racionalidade? TODOS? Nao. Nem

mesmo os que pensam que sao!”

Victor, ainda testando:

“Sua argumenta^ao 6   bonita. Mas 6   soffstica. E al^m disso, esta

me cheirando a comunismo.

“E soffstica porque a sabedoria do pai esti em reconhecer que o

sistema existe, com as caracterfsticas que tem, e a ele se ajustar. Nao

em concordar com esse sistema. Nao 6   esta a questao. Isto 6 , a

questao nao €  saber se esse sistema 6  bom ou ruim, correto ou erro-

neo; nem se leva, ou nao, todo mundo a ser feliz. A questao €  saber

que o sistema existe, tal como 6.“E €  comunista precisamente porque nao respeita a justi§a da ca-

 pacidade e da livre empresa. Quem €  mais capaz e produz mais, de-

13451

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 350/411

ve ganhar mais. Quem quiser ganhar mais, que trate de trabalhar e

 produzir mais e melhor. Assim, h£ incentivo para se trabalhar e pro-

duzir mais e melhor. E quanto mais e melhor se produzir, mais e

melhor havera para todos; pelo menos para todos os que fa§am por

onde trabalhar e produzir mais e melhor.”Alba se poe contemplativa, por algum tempo. Depois sorri e co-

me§a o seu revide:

“Sua argumentagao ndo 6   bonita. Mas e sofistica e geradora do

comunismo.✓

“E sofistica porque a questao 6   a que EU levantei, com base na

reflexao do Tio; nao a que VOCE escolheu p ra .. . pra me testar!”

As ultimas palavras, Alba olha com ar matreiro para o jovem, e os

dois caem na risada. Depois, ela continua:“Quem levantou a questao? Eu? Entao €   essa a questao da MI-

 NHA argumenta^ao. E qual 6  essa questao que eu levantei? Em su-

ma: “a felicidade de TODOS depende da felicidade de CADA

UM”. E isto poe o nosso sistema s<5cio-polftico-econ6mico-educa-

cional-etc. em xeque, ou no banco dos r£us.

“A16m disso, mesmo que nao fosse esta a questao que eu tivesse

levantado, ESTA E A QUESTAO! Mesmo que eu tenha sofismado,

ESTA E A QUESTAO! Dizer que a questao “nao 6   saber se o sistema vigente leva, ou nao, todo mundo a ser feliz” 6,  na mais con-

descendente hip6tese, insensato, nao-sdbio. E de que era que esti-

vamos falando? Nao era de sabedoria? Pois bem. Se nao era esta a

questao, esque^a a questao que nao era e o sofisma com que argu-

mentei sobre ela. Errei? Pois nao quero mais a questao em que errei.

Agora quero ESTA, que E A QUESTAO: a felicidade de TODOS

depende da felicidade de CADA UM, e a “ingenuidade” de Deus-

crian^a 6   sabedoria que indica o caminho; e a “sabedoria” de pai- bloqueado €   insensatez que gera infelicidade - para TODOS e paraCADA UM.”

Victor, impressionado:

“Puxa! TouchS!" 

“Problema seu. Quanto a voce me chamar de comunista, isto evi-

dencia ainda mais a intengao de testar. Porque voce sabe que eu

 NAO POSSO ser comunista. Isto equivaleria, no meu caso, a ndo 

 ser; e o que estou tentando na vida, principalmente depois que co-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 351/411

nheci as ideias do Tio e me coloquei sob a influencia dele, 6  justa-

mente o contrario: ser.

“Eu, materialista? Dialdtica ou de qualquer outra esp£cie de fau

na? Impossfvel! J£  disse: seria o mesmo que nao ser. E isto j£ seria

argumento suficiente para derrubar sua “ acusa§ao”.“A verdade €  que nao posso ser nem “capitalista” , nem “comu-

nista” , nem “ista-isso” , nem “ista-aquilo” , nem “ista-coisa-nenhu-

ma” ! Acho que nao 6  sabio ser “ista-alguma-coisa” . Porque —agora

digo eu - esta nao 6  a questao, ou, este nao €  o problema.

“Temos um sistema de vida. E perfeito o nosso sistema? Nao; e

so um tolo responderia o contrdrio. Nosso sistema tem defeitos. Pois

 bem, nao precisamos deixar de ser o “ ista-isso” do nosso sistema e

nos tomar o “ista-aquilo” de qualquer outro sistema, para corrigiresses defeitos. S6 precisamos usar a inteligencia de que tanto e tao

tolamente nos envaidecemos, e fazer esfor§o para nos tomarmos

gradativamente menos egofstas.”

“SO?! Voce achapouco?”

“Nao. Sei que 6   muito e 6  diffcil. E que muita gente nao admite

que os defeitos do sistema sejam realmente defeitos. E que h£ muitas

 pessoas que sabem que sao defeitos, mas nao querem ve-los conigi-

dos, porque justamente gramas a esses defeitos estao bem no sistema.E sei tamb£m que, em ultima an£lise, o homem nao €   movido a

aprimoramentos ideoldgicos, e sim a crises. Ou voce pensa que eu

sou ingenua?

“Pois 6: movido a crises. O sistema tem defeitos; intrmsecos, ine-

rentes. Esses defeitos geram as crises. E, de crise em crise, pode ser

que “a galinha nao encha o papo” , mas o sistema vai ter de ser mo-

dificado, para superar as crises. Qualquer que seja o “ismo” de par-

tida, teri de se aproximar da justi^a de que eu falei h i pouco. Talvezat€  consiga chegar 16, se, depois de muito apanhamios, afmal apren-

dermos ou nos tomarmos verdadeiramente CAPAZES DE VTVER a

exorta^ao maxima do Cristo Jesus.”

"Amai-vos uns aos outros como eu vos am ei.”

“Isso ai. S6 que nao nos vamos tomar capazes de viver isso ai

 por aceitagao racional, ideoldgica, ou mero sendmentalismo.TRANSFORMA(^AO, 6   a palavra. E pense nela assim: TRANS-

FORMA^AO. E CRISE €  o fator dessa transforma^ao, ainda que hs

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 352/411

custas do softimento de violentas, estupidas e sangrentas revolu-

qoe s.”

Victor ve uma brecha e ataca:

“Af estti! Voce 6  uma revolucionista!”

‘Tire o “r”. Se voce faz questao de me pregar um rotulo, que

seja esse que voce falou, sem o “r” : evolucionista. EVOLU£AO €  a

 palavra. E da evolugao de cada “CADA UM” que dependem a paz e

a felicidade que TODOS dizem desejar. E evolugao 6   mudan^a,

TRANS-FORMA^AO pessoal; neste caso, do estado de forte ego-

centrismo para o de altrufsmo (melhor: de onicentrismo) - de amor

ao proximo, caracterizado pela real capacidade de ser no proximo,

ou junto com ele no Ser, igualmente.

“Costumamos culpar o sistema; o “ ista-isso’ ou o “ ista-aquilo” .

E dirigir nossa esperanga para um “ista-sei-15-o-que” , que seja

ideal. Pois bem, sabe o que eu acho? Que, se voce concebesse o

sistema ideal e tivesse poder para aplicS-lo, teria surpresas quando

tentasse implant£-lo. Principalmente, constataria a necessidade de

o impor  a muitos “CADA UNS” ; e nisto ele j l deixaria de ser ideal.

“ E mais: admitindo que voce conseguisse implantar o sistema

ideal sem o impor —que todos os “CADA UNS” o aceitassem de bom grado - eu nao me surpreenderia at£ se boa parte da humanida-

de regredisse em termos de civilizagao; ou, pelo menos, que os psi-

quiatras tivessem muito mais trabalho; ou, enfim, que o sistema fa-

lhasse por falta de produtividade. O fato, para mim, 6   que somos

ainda primitivos e precisamos, psicologicamente, de incentivos egocentricos.

“E assim que eu vejo a situa$ao: Somos TODOS egocentricos - e

isto inclui voce e eu. Nosso egocentrismo se manifesta sob forma devaidade, egoismo propriamente dito, ciiimes, paixoes, cobi$a, omis-

soes, etc. Estas manifestagoes sao, em uns casos, grosseiramente

evidentes, e, em outros, muito sutis. Mas o fato 6   que somos TO

DOS egocentricos, e isto 6  primeiro, relativamente aos tais defeitos

intnnsecos do sistema. Em suma, 6  muito mais o sistema que reflete

o nosso egocentrismo, do que n6s que refletimos e sofremos os de

feitos intnnsecos do sistema (mesmo considerando-se as nobres ex-

ceqoes que certamente existem). Insisto: o sistema €   segundo; n6ssomos primeiro.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 353/411

“Por isso os Grandes Mestres, Grandes Iniciados, Grandes Ilumi-

nados, Grandes Avatares, ou como quer que voce prefira cham£-Ios -

como Gautama e Jesus - empenharam-se precipuamente em apontar

um caminho para essa EVOLU^AO, que 6   TRANSFORM AQ'AO

PESSOAL, Nao posso deixar de ser individualists neste sentido.

“E aqui entra a pedagogia natural, inevit£vel e automdtica, da

CRISE; tanto a nfvel individual como a nfvel coletivo; a nivel de

CADA UM e a nfvel de TODOS. Porque essa transformagao pessoal

nao ocorre por forga e virtude de exortagoes morais, filosdficas,

ideol6gicas, nem de pregagoes religiosas. E fato mental muito mais

 profundo, na real modificagao da estrutura psiquica do individuo.

Insisto: 6   TRANS-FORMAQAO, que 6  muito mais do que concor-dancia racional ou adesao sentimental.

“O egocentrismo 6 o nosso defeito intrfnseco. E 6  gerador de cri

ses. E no jogo emocional de nossa vivencia dessas crises 6   que a

nossa estrutura psfquica 6   afetada e se modifica. Dizemos que

aprendemos ligdes, que adquirimos experiencia, que amadurecemos.

O fato i   que isto ocorre atrav6s de crises, que envolvem, necessa-

riamente,  sofrimento -   aquela hist<5ria de “sentir no couro” . Por-

tanto, 6  sofrendo, “ sentindo no couro” , que aprendemos, adquirimos

experiencia e amadurecemos, desabrochando entao, do estado con-

trafdo de egocentrismo, para o estado expandido de altrufsmo, assim

como... como uma ROSA MISTICA.”

Alba pdra de falar, surpresa, ela mesma, de ter usado a expressao

rosa rrdstica. Victor a traz de volta, perguntando:

“Mas voce nao ve nenhum m6todo positivo, nessa. . . pedagogia

natural?”“Vejo, sim. Nao somos s<5 defeito intrinseco. Pelo contrdrio, creio

que SOMOS de fato, e primeiro, VIRTUDE intrfnseca. Nosso de

feito intrfnseco est£ apenas bloqueando a manifestagao de nossa

virtude intrfnseca. E 6  isto que me d£ esperanga, e coragem para me

empenhar nesse caminho de auto-trans-formagdo,  que - agora eu sei

- 6 o CAMINHO. O resto 6  equivoco; ou ilusao.”

N e s t e p o n l o d a c o n v e r s a , n u m a f a n t ^ s t i c a i n t e r p o s i Q S o

o u s o b r e p o s i g S o d e te m p o ( ! ) - p o s s f v e l p e la m a g ia d o

E s p f r i to d o E s p a c o - p e r c e b e m o s u m s u t i l m o v im e n t o na

m e n t e d o jo v e m . E n t ra m o s n e la e " le m o s " :

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 354/411

“Defeito. . . virtude. . . no ego, que nao 6  o centre, mas 6  impor-

tante, VITAL manifestagao do Centro!

“Isto! A tese do Tio nao 6 niilista. Nao se trata de uma redu^ao a

nada, de um aniquilamento do ego por renuncia fonjada vida no

mundo e extremada desvalorizagao do pn5prio ego, de sua existencia

como tal.

“A tese 6, pelo contr£rio, de aprimoramento do ego, a fim de que,

na sua virtude, ele se tome “filtro eficaz” , ou “canal desimpedido”,

ou manifestagao plena da Virtude do Ser C6smico, em que ele pr6-

 prio 6   fen6meno necess£rio. Portanto, €  uma tese PERFECCIONIS-

TA. Nao niilista; perfeccionista. Lembra Jesus:

. . . que o Pai seja glorificado no Filho.E:

. . . sede v6s perfeitos como perfeito &o vosso Pai celeste.

“(“Quem** 6  o Pai celeste? “Quem” €  o Filho?)

“ Virtude. . . esta palavra, aqui, nao tem conotagao moralista; en-

cerra moral mas nao tem conota$ao moralista. Virtude 6.  . . poten

tial. Isto: potencial - do “Pai” , no “Filho” .

“Isto, sim. Que cada indivfduo valorize o seu ego. NO “PAI” . E

se esforce para ser NO MUNDO ao m£ximo do seu potencial de ser  —ao mdximo do potencial do “ Pai” para ser no “Filho” . O artista na

sua arte, o cientista na sua ciencia, o fi!6sofo na sua filosofia, o reli

giose na sua religiao, o atleta no seu atletismo. . . o homem comum

na sua a?ao comum. TODOS! Cada qual vendo na sua vida a GLO-

RIFICAQAO DO PAI NO FELHO! Nisto o sublime, divino valor do

ego.*’

S e m t e r m o s c o n s u m i d o t e m p o ( ! ) , e s e m t e r c o n s u m i d o t e m p o o j o v e m n a s u a b r e v e r e f l e x a o , s a f m o s d a m e n t e d e l e e

v o l t a m o s a a t e n t a r p a r a a f a l a d e A l b a .

“Portanto, vejo m6todo positivo, sim, nessa pedagogia natural...

divina. H6 eventos belos, nobres, que comovem, inspiram, modifi-

cando a estrutura psfquica por via positiva. Mas isto 6  o que chama-

mos de bom; e o que 6  bom nao requer preocupa^ao; porque €  bom.

O que chamamos de ruim, isto 6  que requer preocupagao, e discus-sao, e providencia; porque 6  ruim.*’

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 355/411

“Isto 6 tudo?”

Alba pensa um pouco e responde:

“Nao. Voce me acusou de ser revolucionista —novamente para

me testar, bem sei. Mas havia uma falha evidente em seu argumento.

Acontece que eu estava expressando uma constatagao de base histd-

rica, e nao o meu ideal. Tem sido assim na histdria da humanidade, e

ser& assim ainda por sei 1&eu quantos milenios - se nao nos des-

truirmos - ate nos tomarmos realmente capazes de verdadeiro FRA-

TERNALISMO, por EVOLUgAO, que 6 TRANSFORMA^AO

PESSOAL, do egocentrismo (contrafdo estado de desamor) para o

altrufsmo (descontrafdo e expandido estado de AMOR).”

“Puxa! Estou impressionado! Menos com o que voce disse e maiscom vocS. Agora i  tudo?”

“Ainda nao. Tenho uma ressalva importante a fazer. Estive falan-

do do ideal. Mas, e a  situaqao de fato?  Ante a situaqao de fato de

que existem o “ismo-isso” e o “ ismo-aquilo” , por exemplo o capi-

talismo e o comunismo, vem a necessidade de optar. E minha opqao

6  o capitalismo. Mas nao posso ter no capitalismo o meu ideal. Ape-

nas o prefiro ao comunismo, talvez porque nele vejo algum respeito

&liberdade individual (relativa como tem de ser) e maior vulnerabi-lidade &divina pedagogia da crise, na educaqao natural e automitica

 para o Fratemalismo.

“Num sistema em que as pessoas estejam condicionadas e cercea-

das sob a mira de uma metralhadora, o que se ter£ serf isto mesmo:

condicionamento e restri^ao pela for^a. As manifestaqoes de ego

centrismo poderao ser menores, por forga  das circunstancias; mas

ele estarl presente em cada “CADA UM” , latente como energia re-

 presada. Muito menos isto poderia ser o meu ideal.  Nao me deixo

enganar. Nao confundo condicionamento  com a verdadeira trans-

formagao para o Fratemalismo —de que, ali&s, e lamentavelmente,

voce e eu ainda nao somos capazes em alto grau.

“E isto ainda nao €  tudo. Mas j£ estou cansada. Chega de discutir

filosofia polftica!”

“E; este 6  o tipo de tema que se pode discutir interminavelmente.

Quantas reflexoes do Tio ainda faltam?”Alba, depois de verificar

“Tres.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 356/411

“Bem, s6 temos mais tres dias aqui. Proponho que a gente leia

mais uma hoje, as duas ultimas amanha, e passe o ultimo dia sim-

 plesmente cuitindo a vida aqui na chacara, em comunhao espontanea

com a natureza, contemplando-a e meditando, sem ler nem discutir

coisa alguma.”“Falou. J6 estou mesmo saturada disso. Depois do almogo, a

gente le a outra reflexao de hoje. Agora venha me ajudar na cozi-

nha.”

Victor, com ironia:

“Sim senhora.”

E os dois seguem para a cozinha, entre risos, beliscoes, tapinhas e

cutucadas.

T o d o s . . . c a d a u m . . .

t r a n s - f o r m a g a o . . .

f r a i e r n a l i s m o . . .

r o s a m f s t ic a . . .

G l o r i f i c a g a o d o P a i n o F i l h o !

D i v i n o v a l o r d o e g o !

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 357/411

BEBES, POETAS, MISTICOS, E MENINOS-REIS

M f s t i c o s . . . m e n i n o s . . . R e is !

E q u a s e - r e i s j S s S o n o s s a s m e n i n a s - s o m b r a s ,

r o s a s m f s t i c a s e m s e u m S g i c o d e s a b r o c h a r p a ra o R e i n o o n d e re i n i n g u ^ m §,

n o E s p a g o o n d e r e i n a a V i d a d o E s p f r i t o .

S6!

“Eu compro.”

Victor, despertado de sua contemplagao:

“Hum?!”

“Eu compro, esse construto que voce esti bolando ai. Quando

voc£ esta contemplativo, est3 montando algum construto.”

“Nem sempre. S6 quando eu nao estou de fato contemplativo, e

sim, reflexivo.  Quando estou contemplativo, nao estou pensando — 

conscientemente, pelo menos. Estou passivo, apenas curtindo inten-

samente essa maravilhosa consciencia de ser.  Portanto, nao estouvazio; antes, estou pleno da sutil vibragao da VIDA maiuscula, nes-

sa misteriosa, deleitosa, m£gica sensagao de ser. Quando reflexivo,sim, estou pensando e, com frequencia, bolando algum construto.

Sinto prazer nisto; gosto de montar construtos. Agora mesmo, de

fato estava montando um, esse que voce se ofereceu para comprar.”

“E qual 6?”

“Bern, creio que nao 6   propriamente um novo construto. Quero

dizer, que nao h& originalidade nele. Trata-se, mais provavelmente,

de um modo interessante de expressar ou formular a id£ia bdsica do

Tio, que, alids, creio ser a mesma id£ia b^sica do Buda Gautama e

do Cristo Jesus.”

“Claro. A menos que o Tio nao se tenha realmente tornado -  se €  

que o caminho 6  de fato, como voc£ disse, um caminho para tomar- 

 se.  Esse tomar-se deve ser alcangar a verdade subjacente a nossa

realidade perceptiva, por vivencia. E essa verdade nao pode ser se-

nao UMA. Nao pode haver duas, nem mais, em essencia. Os que se

tomam podem dar expressoes diferentes, mas a verdade que se tor-nam e expressam diferentemente €  a mesma. Veio Gautama e se tor-

nou e disse: “Eu sou o Tathdgata" . Quer dizer, “aquele que che-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 358/411

 gou,  (alcangou, conquistou, tomou-se,  a verdade, a realidade su-

 prema, a natureza essencial subjacente a tudo). E veio Jesus e se

tomou e disse: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida” . . .

“As expressoes sao diferentes; os construtos sao diferentes; con-

forme a personalidade do que “chegou” , o publico da 6poca e dolugar, e a missao que aquele que se tomou sinta-se impelido a cum-

 prir, no empenho de indicar o caminho de tomar-se aos seus seme-

lhantes. Mas a verdade que se manifesta nessa personalidade, a esse

 publico, e nessa missao, 6  a mesma, ainda que as personalidades, os

 publicos e as missoes, sejam diferentes nos diversos casos.

“Quem tiver olhos para ver, nao se iludir£ nem se confundirf com

aparencias. Assim como o homem modemo, cientificamente infor-

mado, que em tudo ve el6trons, ou leis ffsicas e equa^oes matemati-cas.”

Victor, balan§ando entre admirado com a lucida e espontanea

rea§ao da namorada e espantado com sua referencia ao Tathagata,diz afinal:

“Estou suipreso com sua referencia ao Tathagata.”“Voc6 e o Tio reverenciam o Buda Gautama. Fiquei interessada e

li sobre ele na Britannica e em dois livros que comprei. Alem disso,

achei que essa informa$ao seria importante e valiosa na nossa vida.

Agora, tamb6m eu reverencio Gautama. Nao lhe falei nada porque

queria fazer surpresa.”

“E fez!”

Alba sorri, satisfeita. Pede, depois:

“Mas vamos ao seu construto.”

“Bem. . . veio-me a palavra ARQUETIPO e, nela, um modo inte-

ressante de expressar intelectualmente a id6ia do Tio. Sem novidade,como eu ] i  disse - a palavra nao €  nova e, a id£ia, tambim nao; e

como o.prdprio Tio certamente diria, naquele jeito dele:  Nao £ dife- 

rente; £ igual. Como o homem que muda de roupa mas continue o 

mesmo. Ou cada fogo que £ produzido no mundo, que £ outrofogo, 

mas £ FOGO.”

“Sim, mas eu nao me surpreenderia se ele..

“Dissesse que €   diferente, isso que €   igual? Eu sei. Tambim eu

nao me surpreenderia, porque i  FOGO, mas 6 outro fogo.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 359/411

“E isso af.” - Diz Alba, no primeiro folego do riso.

Victor, depois, passa a apresentar o seu construto:

“Diffcil definir a palavra arquitipo  como a sinto. Talvez seja

melhor eu tentar montar um construto e deixar que, com a sua sensi-

 bilidade, voce apreenda o sentido do termo pela sugestao do con-

texto.”

“Vamos 15, entao.”

O jovem fixa um olhar penetrante no poqo sem fundo e, ap(5s al-

guns segundos, comeqa:“HI o Grande Arqu^tipo. Sua essencia 6  a essencia de tudo. Sua

energia €   a energia de tudo. Sua natureza €   a realidade primeira e

Ultima de tudo. Por tr&s de tudo, estao POTENC1AIS da natureza doGrande Arqu6tipo. Todas as coisas sao, portanto, FJiNOMENOS de

manifestaqao de potenciais arquetfpicos.

“O potencial arquetfpico fundamental 6  VIDA. Este potential se

manifesta como fenomeno (ou fenomenalmente) em diversos nfveis.

Os nfveis que podemos entender e interpretar intelectualmente, e

constatar experimentalmente, sao:

1. O nfvel de formaqao, organizaqao e interaqao da matdria, nas

leis do eletromagnetismo.2. O nfvel de formaqao, organizagao e interaqao dac^lula vege

tal, nas leis da botdnica.3. O nfvel de formaqao, organizaqao e interaqao da c61ula animal,

nas leis da zoologia.“H i evidente ascensao na manifestaqao desse potencial arquetfpi

co —VIDA —do nfvel 1 para o nfvel 3, culminando, neste Ultimo e a

diversos subnfveis, no fen6meno que chamamos de consciertcia.  No

ser humano, este fendmeno de consciencia atinge a mais avanqada e

 poderosa mamfestaqao que conhecemos. Assim, a percepqao, a con-

cepqao, a memdria e a vontade, por exemplo, sao funqoes arquetfpi-

cas, manifestaqoes de potenciais do Grande Arqu6tipo, em v&ios

nfveis.“Pois bem, como fendmenos avanqados que somos, de manifesta-

qao do potencial arquetfpico VIDA, nosso destino natural 6  evoluir

 para a plenipotencia de manifestaqao —a manifesta?ao maxima do potencial arquetfpico VIDA, atrav^s do fenomeno temporal  ser hu

mano.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 360/411

“J£ percebi. E €   af que temos de transcender.  Isto 6, ser, para

al£m dos limites da consciencia intelectual (o intelecto nao 6  o rei).

E pr&ticas como a contemplagao e a meditagao, combinadas com a

experiencia decorrente do processo de viver, 6   que podem levar a

essa transcend&ncia.”

“Certo. E, na medida em que conseguimos transcender - gradati-vamente e em condigao de DOMfNIO - aproximamo-nos do poten-

cial arquetipico, na manifestagao de sua fungao na VIDA do Grande

Arqu6tipo. Trata-se, portanto, de alcangarmos O DOMINIO DA

VIDA. No “final” do processo, seremos m anifestoes vivas e ple-

nipotentes do Grande Arqu6tipo.”

“Haveremos, entao, de nos tomar UM COM O PA]!" “Exatamente.”

“Gostei do seu construto, apesar do estilo ou do car&er intelec

tual.”

“Ora, nao devemos saltar para o extremo de abominar ou despre-

zar o intelecto. Ele pode nao ser o rei no Reino do Grande Arqu&i-

 po. Pode nao ser o prdprlo potencial arquet/pico VIDA. Mas 6 cer- 

tamente o rei no mundo, no nosso nfvel relativo de manifestagao do

fenomeno de consciencia. E neste reino em que ele 6  rei, €  maravi-lhoso e extremamente util. Mais: forgosamente necessdrio na VIDA

do Grande Arqudtipo; ou nao existiria. Afinal, a inteligencia 6   tarn-

Wm fungao anjuetfpica e pode refletir, em grau deslumbrante, a fun-

gao INTELIGENCIA da VIDA do Grande Arqu^tipo. Todos os

grandes Mestres demonstraram-se extraordinariamente inteligentes — 

e liicidos.

“Nosso problema, portanto, 6  de conseguirmos “rasgar o v6u” da

manifestagao  do potencial arquetipico - como fen6meno de cons-ciencia intelectual —e “ver a face” do pr6prio potencial, por medo-

nha que seja.

“Isto: temos de “ ver a face do Grande Arqudtipo”. E, quando

isto acontecer, seremos irrcsistivelmente atrafdos para ele, tragados

 por ele, e assimilados a ele, Seremos nele e seremos ele, por medo-

nhos que entao sejamos. Enquanto isto nao acontecer, na medida em

que conseguirmos transcender, sob DOMINIO, estaremos refletindo

o potencial arquetfpico. Nosso intelecto ir£ se tomando espelho maislimpo e de melhor qualidade, refletindo cada vez mais poderosa-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 361/411

mente e melhor a Luz do Grande Arqu^tipo. Nosso pensamento ser£

cada vez mais lticido e, nossa palavra, cada vez mais iluminadora.”

“Voce insistiu nesse “sob DOMINIO”. Quer dizer que tdxico

nao adianta.”“Nao. Nao 6   o CAMINHO DE TORNAR-SE. Poderf produzir

experiencias impressionantes e inusitadas do fen6meno de consciSn-

cia, mas o resultado serd aberragao, ou autodestruigao, ou imbecili-

dade, ou demencia; na melhor hipdtese, ilusao e desilusao. Justa-

mente por falta de DOMINIO, gradativamente conquistado e, como

voct  disse, combinado com a experiencia decorrente do processo de

viver.

“Ali£s, conforme o Tio certa vez me preveniu, este €  tamb6m ocaso (embora menos grave, talvez) dos que adquirem a mania dos

chamados “fenomenos psfquicos” (parapsicoldgicos); quero dizer,

fendmenos de percept ao extra-sensorial, associados h visao, h audi-

§ao, etc. (ou interpretados visualmente, auditivamente, etc.) e fend

menos como a premoni?ao e a recordagao de vidas ou encama^des

 passadas. Prefere o Tio que tais fendmenos, se manifestagoes neces-

sfcias do potencial arquetfpico, ocorram e se desenvolvam natural-

mente, em lugar de se tentar “pavimentar com eles o CAMINHO DE

TORNAR-SE” . Ele acha, mesmo, que muitas pessoas estao trocan-

do a ilusao do materialismo pela ilusao do psiquismo, j£ que, con

forme ele sente, esse psiquismo tambSm  tem de ser transcendido; 6  

ilusao em nfvel mais sutil, mas €  ilusao.”

“E a “psiquite” , entao.”

“Isso af!” - Exclama o jovem, acompanhando a namorada em

mais uma boa risada. Alba, depois, propoe a leitura da reflexao se-guiute de Ldgus:

“Com essa, acho que estamos em bom estado de humor para a

 pr6xima reflexao do Tio. Minha vez.”

Acomodam-se os dois, e logo a voz da jovem rompe o breve si-

lfcncio, iniciando a leitura:

Bebds, Poetas, Mfsticos, e Meninos-Reis

Debrugo-me sobre o berjo. O rostinho do bebe se aproxima do

meu rosto. O rostinho do bebt:  pequenino, tenro; pele imaculada e

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 362/411

macia. Os olhinhos: tao lunpidos!. . . Por tr£s das negras pupilas.. .

oque? •

Olhos: fascinantes instrumentos na manifestaqao da vida!

Os ouvidos? Captam; recebem; s6. Os demais drgaos dos sentidos

ffeicos? Captam; recebem; s<5. Ouqo; ocorre peculiar consciencia:som. Sensaqao de ser, no som, no fen6meno de ouvir; de fora para

dentro. Captaqao de fora; transformaqao; sensaqao interior de ser, no

som. Assim com os demais sentidos ftsicos: sensaqoes diversas de

ser, nos diferentes fenomenos de captaqao; de fora para dentro. Sen-

saqoes de ser, dentro; em funqao do que parece ser, fora.

Homem: ser. Ser: sensaqoes diversas de existir, nos diferentes

estados de consciencia; em funqao dos diferentes fenomenos de

captaqao e transformaqao; de estimulos, de fora para dentro, atrav£sdos 6rgaos dos sentidos ffsicos. Homem: consciencia de ser, na

captaqao de fora para dentro.

Captaqao. . . de que, de fora para dentro? Nos ouvidos: vibraqao

do ar; pulsar de mol6culas agitadas. Mol&ulas? Atomos? E16trons,

 pr6tons e neutrons? Energia. Homem: consciencia de ser, na capta

qao de energia de fora para dentro. Captaqao. . . de que, de fora para

dentro? Nos olhos: luz; energia; energia radiante. Homem: conscien

cia de ser, na captaqao de energia radiante, de fora para dentro.Que capta? Homem. Mol6culas? Atomos? Etetrons, pr6tons e

neutrons? Energia. Energia confronta energia; e capta; e transforma,

num fluxo para dentro. Fluxo. . . de que? De energia. Energia capta

energia e transforma num fluxo de energia, para dentro, de fora.

Para dentro. . . de que? Do homem. De fora. . . de onde? Do

mundo. Homem: consciencia, na captaqao de energia do mundo; de

fora para dentro. O mundo esti fora do homem. Homem: consciencia

de ser, em funqao da captaqao de energia do mundo, que est& fora.Mundo. . . que 6? Natureza: mol6culas? itomos? etetrons, prdtons

e neutrons? Energia. Coisas artificials, natureza modificada pelo

homem: moldculas? dtomos? etetrons, prdtons e neutros? Energia.

Mundo: energia.

Homem: consciencia, em funqao da captaqao de energia do mun

do, que esti fora. Energia capta energia de fora e transforma num

fluxo de energia para dentro. Homem: ser. Ser: estado de conscien

cia. Consciencia: fenomeno de energia; impacto da energia-mundo

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 363/411

na energia-homem, gerando fluxo de energia para dentro da energia-

homem. Jogo de energias produzindo consciencia. Entao. . . cons

ciencia: energia. Energia capta energia de fora e transforma em flu

xo de energia para dentro, produzindo consciencia, fenomeno de

energia. Energia fora, energia que capta, energia que flui, energia dedentro. Energia, tudo. Fora, captando, transformando, fluindo, mani-

festando-se dentro.

Consciencia. Homem sente consciencia; e diz: sou. Sou. . . o

que? Meu corpo? Nao; isto 6 meu corpo. EU, sou consciencia, pen-

samento, fen6meno de energia. Sou pensamento. Palavras? Nao.

Pensamento-energia; consciencia.

Pensamento-energia; consciencia. Como no bebe? Nao. porque

aprendi palavras. Em mim, o pensamento nao €  puro.  H i palavras e

 penso:  sou - ou hesito e penso: ou existo? Penso com palavras e me

confundo; e hesito; e me complico. Porque nao sinto, s<5. Penso: o

 jogo do intelecto; com palavras, que me fazem hesitar, me confun-

dem, me complicam. Melhor seria: aprender a pensar sem palavras.

Entao, pensar seria: sentir o pensamento-energia, puro, em si mes-

mo; a consciencia, pura, em si mesma. Pensamento: sentimento di-

reto da consciencia; sem palavras. E nisto. . . VIDA! Nao interpre-tagao, nao representagao, nao imagem, nao simbolismo, nao concei-

tuagao, nao sonho, nao ilusao, nao palavras, mas. . . VIDA! Senti

mento direto, pensamento puro, consciencia... VIDA!

Que 6   primeiro? Consciencia ou palavra? Tenho consciencia de

 palavra. Entao, consciencia €  primeiro. Nao tenho “palavra de cons

ciencia” . Isto 6   um vazio absoluto; um absurdo! Sim: consciencia €  

 primeiro, e €  VIDA. Olho a flor e digo na mente: “flor”. E 6  s<5 isto

que acontece. Energia capta energia, transforma energia, faz fluirenergia. . . e tomo consciencia do meu ato mental na energia “flor”.

S<5. Agora, contemplo a flor; passivo; descontrafdo mas concentrado

na flor. Nao penso na  flor; nao penso “ flor” . A mente? Vazia.

CONTEMPLO. S6.  Entao. . . sinto! Entao. . . VIDA! Entao. . . ex-

tase! Tento dizer? Entao .. . “flor”; s6. Tristemente... s6.

Inventamos palavras. Aprimoramos palavras. Fomos inteligentes.

Palavras. . . para inteipretagao, representagao, comunicagao? Muitodteis; boa invengao. Perfeita? Nao; imperfeita. Mas Util, boa, pr&i-

ca.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 364/411

Inventamos e aprimoramos palavras. Fomos inteligentes. (Os ma

cacos nao foram; continuam guinchando; continuam macacos. N<5s,

nao; somos homens e fomos inteligentes; criamos palavras.) M as.. .

a que pre$o? De terrfvel, MORTIFERA RENUNCIA! A que renun-

ciamos?  A o   pensamento puro; &consciencia; ao extase; k   VIDA!

Olhamos e sentimos? Em extase? Em consciencia, pura e plena?

 Nao. Olhamos e pensamos; em palavras; frios, MORTOS. Somos

mortos-vivos. Nao vivos, nem mortos; mortos-vivos.

Salve poeta! Que regateou e nao pagou o pre^o! Salve mfstico,

verdadeiro mfstico! Que regateou e nao pagou o pre^o! Salve poeta!

Salve mfstico! Que escrevem nas palavras o que nelas nao querem

dizer; que dizem fora das palavras o que por elas suscitam. Porque

sentem; porque conhecem o Sxtase; porque estao VIVOS. Regatea-

ram e nao pagaram o pre^o. Por isto fazem sentir; levam ao extase;

fazem VIVER. Mas s<5 aos que estao mais vivos do que mortos; pao

aos mortos-vivos. Explicar o poeta? Analisar o poeta? Pensar o

 poeta? Erro; morte. Sentir o poeta? Acerto; vida! Salve poeta! Salve

mfstico verdadeiro! Porque suscitam por palavras o que sabem que

nelas nao podem exprimir! Louvados sejam, poeta e mfstico verda

deiro! Regatearam e nao pagaram o pre^o! Magos! Meu amor Ihes

dou, porque mais nao tenho para dar.

Sentimento direto, pensamento-energia; consciencia. . . Como no

 bebe? No bebe. . . como? Se pudlssemos lembrar. . . Lembrar o

qu£?O beb£: c^rebro subdesenvolvido e que nao conhece palavras. O

 bebe olha e ve; com pureza; no sentimento direto, que €  consciencia

e extase e VIDA! Se pud£ssemos lembrar. . . Nao precisamos lem

 brar!’S6   precisamos aprender a ver. . . AGORA! Como retardadosmentais. Nao retardados mentais. Como  retardados mentais. Como

 bebes. Nao bebes. Como bebes. Olhando e vendo; com pureza; sem

 palavras; no sentimento direto, que €  consciencia e extase e VIDA!

Contemplando, com a mente vazia de palavras. Elas vem, como aves

de arribagao, guinchando, em bandos. V6m, e passam. Deixam o si-

lencio; o silencio da mente. E no silencio da mente que contempla

vem a consciencia, que €  dxtase e VIDA. Nao precisamos lembrar.

S<5 precisamos ser. . . NATURAIS! T6cnicas? As que sejam natu-rais:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 365/411

Umhomemprocuravaumreinoondesetornasse rei.Efoiandando.

Encontrou uns que falavam, liam,escreviam, emuito seagitavam.Per-

guntou: “Que reino6este"?Responderam: “E omundo. Neleh£osques6

gozam,osqueapenassofrem,eosquegozamesofrem.Pelomenosassim

parece; nSoestamosentendendobem,masassim6 avida.Eestamospre-

cisandodeumrei.Querseronossorei"?Nossohomemreplicou:"NSo.Sua

vida6morte. Seumundo6 iiusSo.NSoqueroser reinoseu reino”. Econti-

nuou:

Encontrououtrosquefalavam, liam,escreviam,pesquisavamemuitose

agitavam. Perguntou: “Que reino 6 este"? Responderam: “ £ o reino das

ci§ncias. Paratudoestamos construindomodelosracionais;jSencontramos

muitas expiicapSese construlmos muitosmodelosCiteis. E tudotemdeser

comprovado; s6 precSria e temporariamente aceitamos hipdteses. E estamos precisandode um rei. Quer seronosso rei"?Nossohomemreplicou:

"NSo.Sua racbnalidaden§o6omSximo,eoque6omdximonSopodeser

explicado.Seusmodeloss5oiiusSo.NSoqueroserreinoseureino” .Econ-

tinuou.

Encontrou outros que falavam, liam,escreviam, refletiamemuitoseagi

tavam. Perguntou: “Que reino6 este” ? Responderam: “£ o reinodasfiloso-

fias.Grande6 anossainteiigfenciaepoderosoonossoprincipalinstrumento,

a I6gica, naprocuraracionalqueempreendemos. N5oprecisamosdecom-prova^Soexperimental;nossa pura racionalidadenoslevacomseguran?a&

sabedoria. E estamos precisandodeum rei. Querseronossorei"?Nosso

homem respondeu: “NSo.A I6glcanSo6prova suficientedaverdade;como

elamesmanSopretendeser.Aracbnalidadendo6 omSximo,nememmkn,

nemem vocSs. Sua sabedoria6 iiusSo. E num reinoonde a inteligfincia 6

rainha,nSoqueroserrei”.Econtinuou.

Encontrou outros que falavam, liam, escreviam, oravame cantavam, e

muitoseagitavam.Perguntou:“Quereino6este"?Responderam:“ £oreinodas religbes. Temosmuitas religi6es,emgeralcadaqualcomseusdogmas

ouartigosde f6.Narevela?5otemosanossa InspiragSoeanossafontede

conhecimento; na f6 temos a nossa forgae cremos queela nos levarS k 

verdadeek vidaeterna.NSodependemosda I6gicanemdeprovasexperi-

mentals.A racionalidadenSo6anossarainha;a F t, sim,6anossarainha,

eestamos precisandodeum rei.Querseronosso  ref”?Nossohomemre

plicou: “ NSo. Dogmas sfio grilh6es. Como pode um rei tergrilh6es?Seos

tem,nfio6rei;6 escravo.E,seasuaf6levarid vidaetema,entSo,nSo6 AFl=.Como pode aetemidade tercomego? Eterno6AGORA, sempre.Sua

vidaeterna6 iiusSo.NSoqueroserreinoseureino".Econtinuou.

Encontrou um que nSo falava, nem iia, nem escrevia, nem seagitava.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 366/411

Sentado, placidamente,k  luzamenaeao reconfortantecalordosoldoalvo-

recer, contemplava a flor. Nossohomemperguntou: "Que reino6este”?O

outronSorespondeu.Continuoucontemplandoaflor,sorrisodocenosISbios

epaz noolharvago.Nossohomemrepetiu:"Que reino6este”?Ooutron£o

respondeu.Continuou contemplandoa flor, sorriso docenosISbiosepazno

olhar vago. E assim uma terceira vez. Ent5o, nossohomemsentoucomo

outro.Eficaramosdois,contemplandoaflor,sorrisodocenosISbiosepaz

noolharvago.

Passou-se algum tempo,emqueaquelesdois reis sedeixaram ficar, no

gozo da bem-aventurangadaquele reino de puroamor; sempalavras;con

templandoaflor. Depois,entreolharam-se.Deseusolhosjorravatalfelicida-

deeseirradiavatalpoder,queoespagoentreelesresplandecia.

Afinal, um falou. Disse:"Houve umqueveioemostrouaflor; eistofoio

seumaiorsermSo”.Foioque\& estavaali,queassimfalou.Enossohomem,agora rei,sorriuedisse: “Ehouveoutroquevetoeadvertiu:"Enquantonao 

vostomardescomocriangas . .

Depois, os dois se levantarame foram trabalhar. Um,acuitivarflorese

plantas ornamentals, porquemuitoasamavaeassimganhavasuasubsis*

tfincia.Ooutro, nossohomem(quedecidiraficarali),aescreverlivros,por

quemuitogostavadeescrevereassimganhavasuasubsistftncia.

Enquanto trabalhavam, aqueles dois reis, entreolhavam-se de vez em

quandoeexplodiamemfelicfssimagargalhada;ousorriamsuabem-aventu

ranga naquele reinoonde ci§ncias, filosofiase religioes,tinhamoseu lugarmas nSoeram omSximo. Ningu6m trabalhavamaisdoqueeles e s6eles

estavamvivos; s6eles estavamno reino.Os quenaoestavamnoreinotra

balhavam muito, mas n§oeram felizes, porque estavammortos. E diziam:

s&omalucos, aqueles dois! E os dois riam.Como riamaquelesdoismeni-

nos-reis!

Alguns passavam e sentiamalgodiferentenaquelamaluquice.Eos reis

Ihesensinavammuitasmaravilhaseelesficavamcontagiadosdedivinocon-

tSgio. E punham-se tamb6m a contemplara flor, sorrisodoce nos l6biose

paznoolharvago.Safamdepois acontagiaromundotodo,endoidecidosde

divinadoidice.Ecomoriamaquelesdoismeninos-reis!

Sorriso demorando-se ainda nos l£bios, eco do riso dos meninos-

reis, debrugo-me novamente sobre o bergo do bebe.

O bebe: c£rebro imaturo que nao conhece palavras. Homem:

consciencia, na captagao de energia do mundo; de fora para dentro.

De fora para dentro. . . consciencia. . . cfrebro imaturo. . . ho

mem incompleto...

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 367/411

Homem incomplete! Sem visao; cego. Mundo, que 6? Tudo, me-

nos o que depende de ser visto. Homem incomplete: sem visao e

sem audigao. Mundo, que 61  Tudo, menos o que depende de ser

visto e o que depende de ser ouvido. Homem incomplete: sem visao

e sem audigao e sem olfato. Mundo, que £? Tudo, menos o que de pende de ser visto e o que depende de ser ouvido e o que depende

de ser cheirado. Homem incomplete: sem visao e sem audigao e sem

olfato e sem paladar. Mundo, que €1 Tudo, menos o que depende de

ser visto e o que depende de ser ouvido e o que depende de ser chei

rado e o que depende de ser degustado. Homem incomplete: sem vi

sao e sem audigao e sem olfato e sem paladar e sem tato. Mundo,

que £? Tudo, menos o que depende de ser visto e o que depende deser ouvido e o que depende de ser cheirado e o que depende de ser

degustado e o que depende de ser tateado.

Tudo?  Mas. . . que sobrou? O mundo nao existe! Sem captagao

de fora, o mundo nao se realiza na consciencia desse homem. Nao

h i consciencia de coisa alguma, de fora. Entao. . . alguma conscien

cia, de dentro? Prdpria de dentro?Mundo: consciencia no ser humano. Nenhum homem no mundo.

 Nenhuma consciencia de alguma coisa. Entao. . . alguma consciencia? Pairando num espago sem mundo? Consciente de si mesma?

Autoconsciencia de. . . de uma consciencia vivendo a s<5s num espa-

§o sem mundo? Nenhuma consciencia? Nada? Energia vibrando num

espago sem mundo? Energia? Palavra.

O bebe. A maozinha. . . tao tenra!. . . Entemecedora suavidade,

no toque macio e inocente. E os olhinhos. . . tao puros e limpi-

dos!.. . Os olhos. . . Meu Deus! Que 6   isto? Este olhar!. . . Num

 bebe. . . este olhar! Por que. . . por que estou nervoso, agitado,

 pertuibado e at6 ..  . a t i . . . amedrontado? Este olhar. . . continua!.. .

PODER! Terrifxcante poder! Do bebe! E continua!. . . Meu Deus!

Isto! Meu DEUS!

O bebe pisca, mexe-se um pouco, fecha os olhos longamente, bo-

ceja, outra vez fecha os olhos, mais longamente.. . adormece.

Saio do quarto. Nas temporas, ainda, aquele forte latejo. E a res-

 piragao, irregular. Tomo uma inalagao profunda; retenho um poucoo ar nos pulmdes; exalo num prolongado suspiro. Sento.

Penso:

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 368/411

 Nao. Deve ser fantasia minha. Talvez quaisquer olhos, parados,fixos, a mente vazia de intengao,  sugiram   poder. E a sugestao,aceita, desencadeie reagoes mentais e ffsicas de medo. Deve ser isto.Senao. . . num beb£?! De um bebe?! Ou nao era do bebe? Entao, de

quem? Do Espfrito do Espa§o? Que olha atrav^s dos olhos das cria-turas viventes no mundo?Se assim 6.  . . entao, ouvidos e outros drgaos captam; s<5; olhos

captam, tamb€m; mas, al£m disto, irradiam! Irradiam. . . o que? O

Poder do Espfrito do Espa§o? E num mundo sem olhos? E no espagosem mundo?

Olhos: <5rgaos; sd. Olhar: consciencia. Olhar do bebe: consciencia

do Espfrito do Espa$o, irradiando-se para o mundo; Poder do Espfrito do Espa$o, irradiando-se para o mundo. E quando contempla-

mos o bebe e somos por ele olhados e nos sentimos entemecer?Amor do Espfrito do Espago, irradiando-se para o mundo? Atrav6sdos olhos do bebe? Entao, PUREZA E CONDI£AO! Temos de nostomar meninos-reis; e rir e sorrir e contemplar a flor.

E no espa$o, infinito e sem mundo? Olho invisfvel que tudo ve?Olho: <5rgao. Olhar consciencia. Olho-que-tudo-ve: sfmbolo egfpcioantigo. Olho-que-tudo-ve: consciencia onipresente!. . . do. . . d e . . .do Ser?... de Deus?

Os egfpcios nao contemplaram flores. Contemplaram bebes! Deve

ter havido, entre eles, meninos-farads, que riam e sorriam e contem- plavam bebes!

* # *

Conclufda a leitura, Victor d£ infcio a um coment£rio:

“6 . . . nesta reflexao..Alba interrompe com um gesto de siiencio. Sente-se comovida e

 prefere nao profanar sua emo^ao com vas observa^oes intelectuais.

Estende a mao para o jovem, e os dois saem a pas sear na chdcara.Felizes, em profunda e muda comunhao com a natureza, na VIDAdo Grande Arqu6tipo, que vibra em tudo ao seu redor e palpita em

seu cora§ao. Sob o olhar, etemo e infinito, do OLHO-QUE-TUDO-VE e tudo enche de VIDA e LUZ e AMOR!

P r o f u n d a e m u d a c o m u n h S o n a V I D A d o G r a n d e A r q u t t i p o

d o E s p f r i t o d o E s p a g o , q u e t u d o S E t o r n a ,

n a v id a d a q u e le s q u e , d e s p e r t o s , m e n i n o s - re i s ,

v i v o s s 3 o . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 369/411

UM SER INFINITO E VIVO

I n f i n i t o . . . v i v o . . . S E R !

Victor, quebrando o sileneio:“Pena... amanha 6 o nosso liltimo dia aqui."

“E, sim. E depois de amanha estaremos percorrendo aquela estra-

da que eu nao posso dizer que existe, de volta &vida que 6  morte, ao

carrossel dos tontos..

“Espantando gafanhotos da esfinge e preparando o futuro prete-

rito no enredo do sonho ..

“S6   espero que o guarda do pendulo nao durma demais e que a

gente nao esque^a de buscar respostas de ningu6m no canto da se-

reia cdsm ica..

“E de usar a parte que nao pensa para entender o “X” da questao

no bico do passarinho..

“E de botar o piano mudo pra tocar, na gldria do universo, sem

queimar a chaJeira..

“Nus, no Deus sem buracos!”

E a risadaria come§a. Depois, Alba reabre o difilogo:“E. . . um menino-rei, esse Tio. Adoi4vel menino-rei! Um deus

neste planeta-hospfcio, onde os malucos vivem procurando “pron6-

quios”, juntando lenha  s6  pra juntar mesmo, garimpando o ouro dos

trouxas, procurando orquestrinhas liliputianas, e construindo labi-

rintos s6 pelo gosto de se perder..

Ao enunciar a illtima das “maluquices” , Alba lan§a um olhar

matreiro para Victor. Este diz, entao, fingindo-se atingido: “Eu sa-

 bia que meus construtos iam entrar nessa..

E, finalmente, o jovem limpa a garganta com dois bons pigarros e

come^a a ler a reflexao do Tio:

Um Ser Infinito e Vivo

Olho e vejo. .  .  E sinto e penso e creio.  . . Ougo e escuto. . . 

 E sinto e penso e creio. . . Sinto. . . e penso e creio. .  . Penso. . . e creio. .  . Sinto. . . e creio.  . . Porque sou no Ser e sinto o Ser. . . E  

 sinto no Ser. . . porque o Ser £ em mim!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 370/411

A £rvore, rodeada de espago. Projetando o tronco para cima e es-

 palhando-se depois na ramagem. As folhas verdes. O movimento,

a luz, as cores e as sombras.

Vida no Ser. . . e do Ser. A drvore estd no Ser. . . porque £ do 

Ser. Na drvore se manifesto a natureza do Ser!A pedra a direita, no solo mais alto. A grama forrando o solo, ro-

deando a pedra e descaindo rapidamente para a 6rvore. O halo de

terra nua em volta do tronco &spero. As folhas no halo e o cachorro

 preto que cheira e fuga.

Vida no Ser. . . e do Ser. A pedra estd no Ser.  . . porque £ do 

Ser. Na pedra se manifesta a natureza do Ser!

A 6gua da represa \ i  embaixo e distante, por tr£s da &rvore e da

grama e da pedra. A danga dos reflexos na superffcie encrespada pelo vento. A tenue sensagao do cabelo suavemente soprado. O ca

lor, a luz.

 Paz e beleza.  . . Comunhdo.  . . Serenidade.  . . Sentimento de 

 participa§ao imanente num todo imortal. . . Descontragdo e renova- 

 gao da confianga na vida!

Uma inalagao profunda e um longo suspiro. O cachorro preto,

ainda cheirando e fugando. O tronco 5spero, um leve farfalhar. .. o

verde.. . a 6gua.Vida no Ser. . . e do Ser. A dgua estd no Ser. . . porque £ do 

Ser. Na dgua se manifesta a natureza do Ser! O Ser £ na dgua e a 

dgua £ no Ser. . . E o Ser £ na drvore e na pedra e no cao e no 

vento e em mimJ. . .

Passos lentos na grama que cede. A leve cdcega da grama em

volta dos p6s e o tac fraquinho das sandcilias nos calcanhares. A 6r- 

vore vai aumentando. O cachorro p£ra de fu?ar. Levanta a cabe^a e

ergue as orelhas. Olha para mim. Dois segundos. . . tres. Volta-se esai caminhando, devagar. Agora mais depressa, e vai ficando peque-

no. Desaparece no denso arvoredo. A coceira no rosto. Cogo. A luz,

o calor agrad^vel.

Calor.  . . luz.  . . que sao? Maravilho-me deles. E sinto que sao 

no Ser.  . . e do Ser. Manifestam leis da natureza do Ser!. . . Calor  

e luz. . . vida! Como na grama e na pedra, no vento e na dgua; nas 

cores, nos passos e no suspiro; na energia do movimento; no far

 falhar da folhagem e no tac fraquinho das sanddlias nos calcanha-

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 371/411

res. E no cdo e em mim.  . . O Ser no color e n a lu ze n a vida!. .  .

A mao na drvore; sensagao de aspereza. Materia; palpdvel e gros-

seira. A contemplagao do tronco e a sensagao de aspereza na mao.

Materia.. . palpdvel e grosseira.

 Encanto, por£m, na mente em comunhao!. . . O sentimento de uma esseneia sutil que vibra na natureza da dryore: A VIDA DO 

SERf 

O ruido que vem do solo. A folha, soprada pelo vento, esbarra no

 p6.  Quase seca.  Nela tamb£m a VIDA DO SER! A mesma esseneia

vibrante e su til! .. . Tamb&n no p 6 ... E no pldstico da sanddlia.

0 verde. . . A dgua.. . Deraorada contempla$ao. . .

 Na mente uma consciencia diferente: transcendencia. E a consciencia se expande, como a se integrar na VIDA DO SER, que vi

bra no espago.  . . no tronco, na folha, no p£, no pldstico e na 

dgua. .  .

Tudo desaparece. . . Nada vejo nem ou§o; nem sinto o tronco na

mao nem a folha no p6.

S6 a mente.  . . expandida na consciencia deleitosa da presenga 

ubfqua do Ser!. . . Sinto a vida no Ser.  . . porque sou Nele como 

 Ele £ em mim. .  . e no pldstico e no p£ e na folha e no tronco! O Ser em tudo e tudo no Ser.  . . VIDA onipresente na esseneia do 

Ser. . . sutil e vibrante!. . .

Sensa^ao no p6.  A folha que se desprende e segue empurrada

 pelo vento. O farfalhar. Os troncos retos dos eucaliptos. Por tr£s, o

caminho torto interrompendo a grama e desaparecendo na curva do

corte feito na colina. A dgua da represa, os reflexos. O mono do

outro lado. A casa branca no topo. Grande, modema.

 Bela vista deve ter aquela casa. . . Gente rica, por certo. Gente 

rica. . . gente pobre. .  . estupidez!

 Forte sentimento de desgosto. . . Tristeza. . . revolta!

Um suspiro. ..

Gente rica. . . gente pobre.  . . realidade na vida dos homens. 

 Dura, mas decerto necessdria e justa experiencia na escola da 

mente em evolugao. Porque o Ser £ Mente Perfeita.  . . O AMOR 

£ impulso imanente da Sua natureza. . . e o Bem £ o resultado for-  goso da Sua Lei!.  . . O Ser se manifesto segundo a Sua Lei!. .  . Na

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 372/411

Sua Lei manifesto o Ser o Seu PODER!.  . . E nao hd outro poder, 

 porque s6 o Ser existe! PODER 6 a VIDA do Ser!

 Riqueza.  . . pobreza.  . . realidade na vida dos homens. Necessd- 

ria e justa experiencia. . . Dificil, porim , conviver com ela. Impos- 

 sfvel ignord-la. Porque a mente de todos estd unificada na mente do Ser! E sente e sabe na consciencia do Ser!.  . . Tudo £ no Ser. . . e 

do Ser! Nada existe fora Dele. . . porque o Ser &infinito. .  . ou ha- 

veria o nada (um absurdo!). .  .

O Ser i tudo: maiiria e mente. . . energia e consciencia. Nao 

existe espago vazio. . . Hd vida em tudo!. . . Porque o Ser 6 vivo! 

TUDO E UM SER INFINITO E VIVO!

As batidas aceleradas do coragao. Sensa§ao de leveza e expansao.

Vibra§ao intensa de energia sutil, no corpo todo. Alegria. .  . deleite. . . extase!. . .

Tudo desaparece novamente.

 Mais expansao. .  . e a consciencia vibra na VIDA DO SER. . . 

exultando num canto de AMOR. . . e parecendo iluminar-se na LUZ  

do Ser!. . .

TUDO E UM SER INFINITO E VIVO!

 Maravilhoso e fascinante SENTIR isto e te4o como verdade!. . . 

 EU SOU NO SER!. . . SOMOS TODOS NO SER!. . . TUDO E NO SER, PORQUE NADA EXISTE SENAO ELE!. .  . Arvore, pedra, 

dgua e ar. Cao e homem, Calor e luz. Mente e consciencia. Tudo! 

O todo infinito. . . e vivo!.  . . O SER!

A sensagao do cabelo esvoa?ado pelo vento. Novamente o tron-

co da £rvore. . . o verde. . . a dgua. . . e aquelas pessoas, tao miu-

das, 1£   do outro lado da represa. . . Gente. . . homens. . . Um arre-

 p io .. . A sensa§ao das Mgrimas escorrendo pelo rosto. . .

* * *

E pelo rosto vao escorrendo, da jovem namorada as htgrimas. E

os dois ficam em silencio, por fora e por dentro. Casal de esfinges,

contemplando o etemo presente, infinitamente aqui. No SER INFI-

 NTTO E VIVO!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 373/411

AMANHA. . . A RESSURREigAO!

A r e s s u r - R E l ~ g a o . . .

R e s s u r g e o R EM

V i v a o R e i ! . . .

n o E s p a g o d o E s p f r i t o ,

i n f i n i l a e e t e r n a m e n t e !

“Finalmente, a ultima reflexao do Tio. Voce notou que ) i  nao d&

mais pra comentar?”

“Nao 6  mais pra comentar.” - Retruca Victor, acrescentando:

“Agora, 6   s<5 pra  sentir.  O que precedeu foi prepara§ao. Nissoque foi preparagao, voce foi conduzida a um m£gico portal de ini-

cia^ao. Voce cruzou o portal e foi iniciada; entrou uma e saiu outra.

Agora pode sentir. E pode criar, nisso que j£ 6   capaz de sentir. E

com o poder dessa inicia^ao, tomou-se tamb£m capaz de suscitar,

em seus irmaos humanos, a Luz e o Amor que o Tio sentiu em sua

vida na Vida do Espfrito do Espa§o.”

“E nao terei de me preocupar com a maneira como deverei susci

tar, porque nao serei eu quem estar& suscitando. Pelo contr&rio, sefor eu, talvez nao seja bom o que venha a ser suscitado. Mas sempre

que eu conseguir ser em VERDADE e AMOR, naquele deixar de

ser em mim mesma que 6  condi^ao, serei CANAL, e o poder da Vi

da do Ser se manifestar£ em mim e, atrav£s de mim, iluminari a

consciencia e comover^ o coragao dos meus irmaos humanos, como

voce os chamou.”

“E eles serao conduzidos ao portal m£gico. Se o cruzarao, ou

nao, nao ser& responsabilidade sua, nem poder£ ser decisao sua.

Muitos, ali&s, nem sentirao o poder de sua iniciagao, porque ele serf

como vento em casa de paredes fortes.”

“As paredes do materialismo e do egocentrismo.”

“Certo. E voce t&ri  de fazer como o vento: chocar-se contra as

 paredes e se desviar e passar por cima; e deixar a casa para tr£s e

continuar soprando, no Espago onde vibra a Vida do Espfrito .. .”

“At£ encontrar uma casa de paredes fracas e rach£-las e fazer acasa desmoronar. E envolver o seu morador e penetr6-lo, acendendo

em sua mente a luz da Verdade do Espfrito do Espa^o, despertando

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 374/411

em seu coragao o extase do Amor do Espfrito do Espago, e fazendo

todo o seu ser vibrar com a Vida do Espfrito do Espa^o!”

“Entao ele serf conduzido ao portal m£gico, e o cruzarf e sairf

outro e se tomar£ tamb6m CANA L.. . ”

“Da Vida do Espfrito do Espago, em Verdade e Amor.”Os dois jovens ficam em silencio, por algum tempo, tocados pela

sublimidade da comunhao que os faz vibrar em unfssono na Vida do

Espfrito do Espago. Entreolham-se depois, sorriem o sorriso doce da

 pureza do Espfrito, e Alba comega a ler a ultima reflexao de L6gus:

Amanha.. . a Ressurreigao!

ONTEM.. . senti a dor do humano sofrimento.

Chorei.

ONTEM.. . fui envolto nas trevas da humana luz.

Perplexidade.

O vtirtice medonho no pogo da ilusao.

Temi.

Descri.

ONTEM.. . fui colhido na pegajosa teia do reino conceptual.A principio exultei.

Os fios pareciam dourados e resplandecentes.

Subito enegreceram.

O erro se fez hedionda e asquerosa aranha.

Senti-me devorado e temi a morte!

ONTEM... olhei.

Enxerguei a Irvore, mas nao a vi.

Arvore. S6. Viva? Aprendera que sim.Informagao. S6.

Um pdssaro pousou na Arvore.

Ave. S<5.

Olhei e enxerguei. Mas nao senti.

Permaneci vazio e cego.

ONTEM. . . senti o vento.

At em movimento. S6.

Frio, arrepiante.

Estremeci. S6.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 375/411

ONTEM..

ONTEM..

ONTEM. .

ONTEM..

ONTEM. .

ONTEM. .

ONTEM. .

ONTEM. .

. contemplei um morto e temi a morte!

O fim! Misterioso e apavorante!

Um airepio e o pressuroso desvio do olhar.

. contemplei a vida.L£pida e ruidosa! Alegre!

Mas veio a frustra^ao e o jubilo se fez

angustia.

. fitei o homem e chamei-o de irmao.

Porque Jesus dissera que somos todos irmaos.

S6.

Quis amar mas nao pude.

Eu era eu. Ele era ele.

E nao tmhamos o mesmo pai.

. desejei muito o objeto.

Trabalhei e o adquiri.

Deleitoso apego.

Mas vieram os cuidados e sofri.

. li as palavras do Mestre e acreditei.

 Novo alento!

Esperan^a.

Um tenue raio de luz. Indistinto, quase

imperceptfvel.

Um longo suspiro. ..

. por6m, as luzes do mundo brilharam mais forte.

Segui-as fascinado.

Mas as luzes dos homens me ofuscaram.

Tropecei e caf.Sujo e ferido, sofri decep^ao e dor.

. desejei a mulher.

Mulher de famflia? Prostituta?

 Nao fazia diferen§a. Mulher. S6.

Para o instinto e o gozo.

O meu gozo. S<5.

. pensei em Deus.

O pai.Informagao. S6.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 376/411

Eu era eu: o filho.

Ele era Ele: o Pai.

O Pai e eu 6ramos dois.

ONTEM... pensei.

O complicado, admir&vel e fascinante jogodas palavras.

Elas pareciam guiar meus passos

 para o Jardim Celestial;

onde haveria jiSbilo,

anjos e musica maravilhosa.

E Jesus e o Pai.

E eu.

E todos e tudo.Um s<5!Infinito extase e felicidade etema!

Profunda Paz!

De repente. ..

caf no buraco;

tenebroso e sem fundo!

Quis agarrar-me k  verdade,

mas ela era corda escorregadia te eu ca f.. . ca f.. . e ca f.. .

Pavor e desespero!

Desilusao. .. vazio.

ONTEM.. . olhei-me no espelho e disse:

“Eu sou. Quero ser sempre.

Mas hd a morte,

e um dia vou deixar de ser.

Terrfvel, pensar no fim!O fim da vida” !

E repeti:

“Eu sou”.

E pensei:

“Os outros tamb£m sao.

O mais importante, por6m, 6  que

Eu Sou!

Preciso ere seer, ganhar importancia,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 377/411

 projegao.. .

 porque Eu Sou!

EU!

ONTEM. . . ainda, o doce mas vigoroso alento

do Espfrito do Espagoassoprou em mim.

E o divino sopro afastou um pouco

as trevas

e eu vi uma luz.

O anjo, \£  dentro do meu ser,

tomou-me entao pela mao

e me conduziu k  luz.

L£, eu vi a rosa.

Depositei a cruz no chaoe me aproximei da rosa.

Linda!

Botao ainda, a desabrochar.. .

orvalhada pelas l&grimas

do humano sofrimento.

 No peito, a dor cruciante.Fechei os olhos e respirei fundo.

Pensei no Pai

e desejei o Pai

e quis ser no Pai!

O Espfrito do Espago me abragou

e veio a paz.

Abri os olhos. M as.. .

a rosa nao estava mais 16!

Triste, voltei-me para apanhar a cruz e . . .

<5!... 14 estava a ro sa.. .

na cruz!

 Novamente a dor cruciante.

Renovei a invocagao

e de novo senti o abrago

do Espirito do Espago.E o beijo da Verdadeno coragao aberto!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 378/411

HOJE..

HOJE..

HOJE..

HOJE..

HOJE..

Luz, enfun;

Vida, enfim;

Amor, enfim,

no segundo que se cristalizou

na etemidade!Jubiloso, cheio de poder e compreensao,

apanhei a cruz

com a rosa

e prossegui

no Caminho.

sinto a dor do humano sofrimento.

Vem a compaixao,

mas compreendo.uma r£stia da luz do Jardim Celestial

dissipa as trevas da humana luz.

Cheio de coragem,

creio.

E sei!

a aranha jaz morta

e a teia perdeu o visgo.

olho a &rvore e VEJO!E sinto a Vida na arvore,

a mesma Vida

que vibra em mim!

E o pdssaro que pousa na arvore. . .

que lindo!

E tem a vida da Swore

e a minha vida

e a Vida do Esprrito do Espa^o!E ele canta,

e eu canto,

e a drvore canta,

e tudo canta

o canto do Amor

Infinito e Etemo!

E EU VEJO!

sinto o vento.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 379/411

HOJE..

HOJE. .

HOJE..

E 6  o hdlito de Deus que me acaricia!

Doce Extase,

no sentimento inefavel

de etemidade.

. contemplo o morto e vejo a vida.Transigao. S6.

A vida que continua

no Espfrito do Espa?o.

Paz.

Serenidade.

A vida na Lei da Natureza do Ser.

A vida que nasce de novo para a morte

e morre de novo

 para a vida.

Muitas vezes no tempo eterao,

que 6  presente.

Paz.

Serenidade.

. contemplo a vida e vejo a morte.Mas vejo a vida

nessa morte,

 porque vejo a vida

em tudo.

Transigao.

S6.

. fito o homem e o chamo de irmao.

E o amo, porque ele e eu

temos o mesmo Pai.

E eu sou no irmao

e o irmao 6  em mim

e n6s somos no Pai.

Assim creio

e as vezes sinto,embora vagamente ainda.

Mas. . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 380/411

que jtibilo,

nessa doce mesmizagao!

HOJE .. . desejo o objeto.

E trabaiho e o adquiro.

Chamo-o de meu, porque esta 6  a lei dos homens.

Dele cuido mas nao sofro,

 porque o possuo

em s^bio desapego.

HOJE. . . leio as palavras do Mestre

e SINTO!

Confianga!

Certezade que a Luz que brilha

no horizonte distante

nunca mais sera velada!

E a r£stia que penetra no meu ser,

feito translucido na lustra^ao da vida,

alimenta a perene chama

em minha consciencia desperta.

E o poder da Luzimpulsiona o desabrochar da rosa

na cruz!

Sentimento glorioso:

as luzes do mundo

nunca mais brilharao mais forte!

HOJE .. . olho a mulher.

Mulher de famflia? Prostituta?

 Nao faz diferenga.Minha irma,

minha esposa,

minha mae.

Irma universal,

esposa universal,

mae universal!

Ela e eu temos o mesmo Pai

e somos no mesmo Pai!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 381/411

HOJE. . . penso em Deus.

O pai? O Ser?

Vas palavras!

Expressar? Pensar?[nil til.

SENTIR?

TUDO!

E sinto

e me maravilho

em gozo inefivel!

Palavras?

Estorvo.

Abandono-as,

e vivo no pensamento puroo sentimento direto

de ser

no Ser,

no Pai,

em Deus!na Vida

do Espfrito do Espago!

HOJE .. . olho-me no espelho

e vejo a ilusao.

E digo:

“Desgragadamente,

ainda sou.Mas, um dia,

viverei a gltiria da morte

na cruz!

E nao serf o fim,

 porque nao h i fun,

nem comedo.

H i somente Vida

no Ser

e do Ser.

Sim:

Um dia vou nascer 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 382/411

 para a Vida,

 pela morte.

E quando eu deixar de ser,

tamb6m os outros nao mais serao,

 porque elese euseremos UM!

HOJE.. . o Espfrito do Espago me abraga

e seu doce alento me impele

 para um glorioso amanha.

E amanha...

AMANHA...

vir£ a RESSURREI^AO!E o Cristo

e eu

seremos UM!”

E a drvore e o p£ssaro,

e o vento e a Vida,

e o homem e a Luz,

e a mulher e o Amor,

e o Pai e o Espfrito do Espago,e eu e a Natureza,

e as coisas feitas pelo homem,

e eu

e tudo,

SEREMOS UM!

E haver£

PROFUNDA,

INFINITAEETERNA

PAZ!

* * *

Algum tempo depois que Alba conclui a leitura, Victor suspira e

comenta:

“Ele diz amanha, mas acho que foi ontem, esse amanha.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 383/411

“Mas foi ontem  que ele disse amanhd; 6   claro que, hoje,  esseamanha 6  ontem!’*

Risos, puros, espontaneos e fortes, ecoando pelo Espago, onde

vibra a Vida do Espfrito, infinitamente aqui e etemamente agora!

E p e l o E s p a g o e c o a m o s n d s ,

p u r o s , e s p o n t a n e o s e J o r l e s ,

n a V I D A d o E s p f r i t o ,

i n - l i n i t a - M E N T E a q u i

e e - l e r n a - M E N T E a g o r a .

N 6 s . . .e a s s o m b r a s .

N d s . . . a s s o m b r a s )

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 384/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 385/411

TERCEIRA PARTE

POSLUDIO

" . . . contudo nao estou sd, 

 porque o Pai estd comigo.”

' ‘No mundo passais por afligoes; 

mas tende bom animo, 

eu venci o mundo.”

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 386/411

Trevas , fo i .E m e d o n h a s t re v a s f o i . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 387/411

Po rque m or to e steve ,

n a s s o m b r a s d o m u n do .N a s s o m b r a s q ue a L u z

do E sp fr i to projetou,

d a s c o i s a s q ue n o E sp a g o

se f ize ra E le .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 388/411

I nqu ieto es teve,

na de s ven tu r a da m o r te

q u e n o f a b ir in t o d a s s o m b r a s v i ve u .

M a s a L u z q u e a s s o m b r a s p ro je ta va ,

vez e s ne l e r e sp l andeceu .

E ne s s a Luz que vez e s i n t u i u ,a V i d a do E sp f r it o s en t iu

- do E sp f r i to que po r t o da pa rte e st a .

E , em t r eva s ,

v id a s u a m o rt e ch a m o u ,

po rque a V i da do E sp f r it o nao co n hec i a

- d o E s p f ri to q u e p o r t od o o E s p a g o v i v o e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 389/411

l iusao, fo i .

E t ris te i lu s a o f o i . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 390/411

P o r qu e n a s s o m b r a s fo i

e da il u sa o a m ent i ra v iveu ,

n a m o d e ,

que por su a i gnoran c ia c r iou e v i veu ,

n o E s p a g o ,

onde o E s p f r i t o e s ta e tudo e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 391/411

Inqu ie to e s teve ,

na desven tura do f r io e da f raque za da m orte

q u e n a s s o m b r a s v iv eu .

N a s s o m b r a s da L u zque o Esp ir i to projetara,

d a s c o i s a s q u e n o E s p a g o s e fiz er a.

E f r aco s en t iu - s e ,

porque poder nao t inha.

V o lt a d o p ara a s s o m b r a s ,

a Luz nao v ia .N e m v i a n a s so m b r a s

a Lu z que a s p ro je tava,

do E sp i r ito ,

que no E sp ag o po r t oda pa rte e st a .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 392/411

Ego, foi .

E a to r m e n t a d o e g o f o i . . .

[388]

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 393/411

P o rq u e n a s s o m b r a s a s u a m o r te viv e u.

N a s s o m b r a s d a s c o i s a s q ue n a o s a o

s e n a o n a L u z d o E s pfr it o ,

que no Es p ag o por toda parte v ib ra .

Na co isa que nao e, fo i ,

e s ua m or te v iveu ;

no jogo da s om bra

que po r s ua a g i t agao m ov im entav a , d iz endo :

“ m o v e - se ; t e m v id a e e ” .

M a s nao era , nem v ida tinha ,

a s o m b r a q ue s e m o v ia .

So m bra era,da Luz ,

que da V ida do E sp f r it o

n o E s p a g o v ib ra va .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 394/411

I nqu ieto es teve,

po r que a Lu z na o v ia

n e m a V i d a s e n ti a,

e i s que a m o r te v iv i a ,

d a p a i xa o d o m o v im e n t o - d a so m b r a ,o nde a Luz nao po d i a ve r

nem a V i da po d i a s en tir .

Dor so f reu,

na pa i x ao do ego

q u e n a c o i s a p e n s a v a s e r.

Na co i sa que nao e ra ,

po rque v ida nao t inha .So m br a e ra;

morte era;

n o E s p a g o o n d e l u z ia a L u z

e v ib r a va a V i da

do Espi ' ri to,

que po r toda pa r te es ta e tudo e .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 395/411

E i s q ue v o lt o u -s e p ara a L u z ! . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 396/411

E ceg o f icou ,

d a s s o m b r a s

q u e na L u z n ao m a i s p od e ver,

po rque v i da na o ti nham,

n a V i d a d o E sp i'r it o d o E sp ag o

que por toda parte esta e tudo e.

E m o r r eu p a ra a v i d a d a s omb ra ,

e d a p a i x ao d o t e n e b ro so m ov i m e n t o

a dor curou.

E da V ida do Esp i 'r ito ,

n e s s a m o r te a v id a r e cob rou ;

no A m or do E sp i'r it o ,n e s s a mo r t e r e vi ve u ,

pa ra a V ida

q u e p o r t od o o E sp ag o v i b ra

e T U D O e.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 397/411

E n t a o . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 398/411

L U Z ,

P O D E R

e A M O R

a se r vo i tou,

n a V I D A d o E S P I R IT Oq ue p or f od o o E S P A Q O e s ta

e n e le T U D O e!

0 que era vo i tou a se r,

no que t  ,

A Q U I e A G O R A ,

S E M P R E ! . . .

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 399/411

POSTSCRIPTUM

Abri a tomeira e fluiu. Da nao-fonte fluiu.

 E  foi Agua Viva, isso que fluiu,e em sagrado banho quase de todo me purificou.

E Fogo foi, essa Agua que fluiu,

 porque m&gica era a divina fonte

que fonte nao era.

E nas chamas desse Fogo sagrado

veio o ensaio da morte

que para a Vida

quase de todo me volatilizou.

E me banhou e em suas chamas

quase de todo me consumiu,

essa Agua-Fogo,

que nas 16grimas do humano pecado

raeus olhos lavou e o coragao purificou;

que a cinzas minha humana paixao reduziu,

no enjoo e no jiSbilo

que do mundo em meu ser insdlou.

Mas - ai!

que no gozo do banho sagrado,dele saf antes de terminado;

 porque nesse gozo tentei viver,

essa Vida que s<5 no nao-gozo

se pode viver;

que no extase da sagrada crema^ao,

do Fogo saf 

antes que voldteis se fizessem as cinzas;

 porque nesse extase tentei viver,

essa Vida que s<5 no nao-extase

se pode viver.

E continuei a ser,

nesse ser que d6i e causa prazer.

E nao passei a ser,

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 400/411

nesse nao-ser no Ser,

que nao d6i nem causa prazer.

E agora?

Agora...

Vem, ubiquo Espfrito do Espago!Arrebata-me novamenmte no teu abrago

que mata para a VIDA!

De novo sopra, no meu coragao,

o teu supremo alento,

que a Chama Sagrada vivifica,

nesse Fogo que 6  Agua Viva

e me banhou e purificou!

S<5 para mim serviu, esse banho?Que pena.. .

Triste fico.

A outros pode servir,

esse banho sagrado que me lavou e purificou?

Que bom!

Jubiloso fico!

E oferego, essa Agua Viva

que em suas chamasconsome e incinera e volatiliza

 para a VIDA

- infinitamente aqui

e eternamente agora.

E agora?

Agora. ..

Em cruz abro os bragos

e o coragao exponho- rosa mfstica

em doce anseio

 pelo beijo do Sol!

Vem, Fogo Sagrado!

E me ilumina e consome!

Vem, Agua Santa!

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 401/411

E me lava e purifica!Vem, Sacrossanta Agua-Fogo!

E me purifica e consome,

no teu AMOR!

Vem!

E me lava e purifica,

e ilumina e consome,

e por mim jorra

e lava e purifica

e ilumina e consome

os meus irmaos,no leu AMOR!

Vem, ubfquo Espirito do Espa$o!Arrebata-me novamente no teu abrago

que mata para a VIDA!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 402/411

LOGUS - Corruptela de logos: razao ou inteligencia divina impli-

cita no cosmo e ordenadora do mesmo, dando-lhe formae significado.

(Filosofia e teologia gregas.)

VICTOR - Vftor. . . vitorioso. . . O buscador empenhado na Senda

do desenvolvimento esotdrico e que j£ alcangou algum

rcsultado - que ji  se tomou algo LUCIDO.

ALBA - Alva. . . o primeiro alvor da manha. . . alvorecer. . .despertar!

o O o

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 403/411

A Biblioteca Rosacruz consiste de muitos livros interessantes

que vao descritos nas paginas seguintes e que podem ser adquiri-

dos no Departamento de Suprimentos

da

GRANDE LOJA DO BRASIL - AMORC

CAIXA POSTAL 307

80001 - CURITIBA - PARANA

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 404/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 405/411

R E L A ^ A O D E L IV R O S

PERGUNTAS E RESPOSTAS ROSACRUZES (COMA HIST6RIA COMPLETA DA ORDEM ROSACRU Z-

AMORC)

H. Spencer Lewis, F.R.C,, Ph.D.

MANSOES DA ALMA

H. Spencer Lewis, F.R.C., Ph.D.

LUZ QUE VEM DO LESTEMensagens Especiais Rosacruzes (em 4 volumes)

ANTIGOS MANIFESTOS ROSACRUZES

Joel Disher F.R.C.

ALGUMAS REFLEXOES MfSTICAS

G. R. S. Mead

INTRODUCAO A SIMBOLOGIA

O UNIVERSO DOS NUMEROS

JACOB BOEHME - O PRINCIPE DOS FIL6SOFO S

DIVINOS

LUZ-VIDA—AMOR 

(Mensagens de H. Spencer Lewis, F.R.C., Ph.D.)

O HOMEM - ALFA E 6M EG A DA CRIACAO

(em 4 volumes)

GLANDULAS - O ESPELHO DO EU

Onslow H. Wilson, FJR.C., Ph.D.

O RETORNO DA ALMA

O LEGADO DO SABERMax Guilmot, F.R.C.

SAUDE

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 406/411

c6 d igo  r o s a c r u z  de  vida

Christian Bernard, F.R.C.

O TESTEMUNHO DO ESPfRITO

Horatio W. Dresser 

FRAGMENTOS DA SABEDORIA ORIENTAL

(em 3 volumes)

A VIDA MfSTICA DE JESUS

H. Spencer Lewis, F.R.C., Ph.D.

MOMENTOS DE REFLEXAO

Charles Vega Parucker, F.R.C.

CO NH ECE-TE A TI MESMO (em 4 volumes)Walter J. Albersheim

ALESSANDRO CAGLIOSTRO (em 2 volumes)Ana Rfmoli de Faria D6ria

INICIACAO A ASTRONOMIA (em 2 volumes)

Euclides Bordignon

A v 6 s CONFIO

A VERDADE DE CADA UM

Joao Mansur Jtinior, F.R.C.

AS GRANDES INICIADASHSlfcne Bernard

DOCUMENTOS ROSACRUZES

O PROCESSO INIClATICO NO EGITO ANTIGO

Max Guilmot

A PROPRIEDADE ESPIRITUAL DO ALIMENTO

O ROMANCE DA RAINHA MfSTICA

Raul Braun

A VIDA ETERNA

(Baseado nos escritos de John Fiske)

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 407/411

OS SONHOS

Phyllis Pipitone

ARTE ROSACRUZ DE CURA A DISTANCIA E

CHAVE PARA A ARTE DA CONCENTRAQAO E DA

MEMORIZACAO

H. Spencer Lewis, F.R.C., Ph.D. e SaraJden

VOCE MUDOU?

Charles Vega Parucker, F.R.C.

REAUZACA O ESPIRITUAL

Gary L. Stewart, F.R.C.

EDUCANDO PARA A IMORTALIDADE

Ana Rfmoli de Faria Dtfria, F.R.C.

AERADE AQUARIUS

Ary Medici Ardufno e Rosangela A. G. Alves Ardutno

AUTODOMI'NIO E O DESTINO COM OS CICLOS DA VIDA

H. Spencer Lewis, F.R.C. Ph.D.

MANUAL ROSACRUZ

H. Spencer Lewis, F.R.C. Ph.D.

PRINCIPIOS ROSACRUZES PARA O LAR E OS NEG6CIOS

H. Spencer Lewis, F.R.C. Ph.D.

AS DOUTRINAS SECRETAS DE JESUS

H. Spencer Lewis, F.R.C. Ph.D.

A DIV1NA FILOSOFIA GREGA

Stella Telles Vital Brazil, F.R.C.

O ESPIRITO DO ESPACO

Zaneii Ramos, F.R.C.

ANSIEDADE - UM OBSTACULO ENTRE O HOMEME A FELICIDADE

Cecil A. Poole, F.R.C.

LEMURIA - O CONTINENTE PERDIDO DO PACIFICO

W. S. Cerv6

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 408/411

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 409/411

Devido aos frequentes pedidos de esclarecimento sobre

a Ordem Rosacruz, AMORC, e as obras que ela publica,

aproveitamos este espago para informar que a Ordem 6 

uma organizagao tradicional nao-sectttria, dedicada ao es-

tudo e i aplicagao construtiva das leis naturais que regem a

vida humana, com vistas ao auto-aprimoramento de cada

indivlduo. Trata-se de uma organiza^ao sem fins lucrati-

vos, assim reconhecida no mundo inteiro. Desde 1915, ano

de seu ressurgimento para um novo ciclo de atividades ex-

temas, ela vem se desenvolvendo e realizando sua obra em

todos os continentes, contando hoje com elevado ntSmerode estudantes.

Dada a natureza de sua prdpria filosofia, a Ordem seexime de toda discussao ou atividade de car5ter polftico,

deixando aos seus Membros a livre escolha pessoal nessa

irea.

Analogamente, recomenda que seus estudantes reflitam

com mente aberta sobre os ensinamentos rosacruzes, mas

tirem suas prdprias conclusoes, rejeitando livremente

aquilo que nao esteja em consonSncia com suas convic^oes

 pessoais. Assim, a afilia^ao rosacruz nao faz objegao £s

convicgoes e prSticas religiosas do estudante, que perma-

nece livre para decidir a este respeito.

O sfmbolo tradicional da Ordem Rosacruz - uma cruz

com uma finica rosa vermelha no centro - nao tem signifi-cado sectirio ou religioso, pois a Ordem nao 6  uma seita

nem uma religiao. Seus ensinamentos, que nao cont£m

dogmas, abrangem o conhecimento prdtico das leis natu

rais, principalmente psfquicas e espirituais, aplic£veis ao

desenvolvimento e aprimoramento do ser humano.

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 410/411

As obras publicadas pela Ordem, na Biblioteca Rosa

cruz, tratam dos mais diversos assuntos, a maioria dos

quais refere-se a questoes filos6ficas, psicol6gicas, espiri-

tuais, mlsticas, esot6ricas e tradicionais.

Os autores assumem inteira responsabilidade por suasid£ias, como opinides pessoais, mesmo em se tratando de

altos representantes da Ordem. Podem, portanto, escrever

sobre assuntos que nao estao inclufdos nos ensinamentos

rosacruzes e, ao faz6-lo, exprimem uma interpreta§ao pu-

ramente pessoal.

Julgar a Ordem Rosacruz, AMORC, ou comentar.seus

ensinamentos, suas preocupagdes e atividades, a partir das

obras destinadas ao publico, pode conduzir a conclusdes

 parciais e errfineas. Essas obras nao representam, necessa-riamente, a posigao oficial da Ordem sobre os assuntos de

que tratam.

Aqueles que desejarem conhecer a proposigao de estudo

e desenvolvimento pessoal feita pela AMORC, a fim de

considerarem sem compromisso sua conveniSncia de se

afdiar & Ordem, poderao solicitar o livreto informativo

gratuito “O Domlnio da Vida”, escrevendo para:

Ordem Rosacruz, AMORC

Caixa Postal 307

80001 - Curitiba - Pr 

7/17/2019 O Espírito Do Espaço

http://slidepdf.com/reader/full/o-espirito-do-espaco 411/411