o debate em atividades de livros didÁticos de lÍngua...

18
Universidade Federal de Campina Grande Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1 ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765 O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA INGLESA Ana Beatriz M. JORGE 1 Williany Miranda da SILVA 2 RESUMO A aprendizagem de uma língua estrangeira tem sido beneficiada em grande medida pela presença de materiais didáticos, elaborados especialmente para esse fim. Nesse caso, nossa atenção voltou-se para as atividades dos manuais de ensino de língua inglesa, em especial para o estudo do debate. Este é um gênero que não só estimula a fala e a escuta, como também as estratégias de argumentação, a linguagem utilizada e o posicionamento dos falantes diante de um tema; apesar de largamente confundido com outros gêneros de uso comum, tais como “discussão” e “conversa”, (PEREIRA e SILVA, 2013). Face a esse fenômeno, nossa atenção voltou-se para tal objeto, desenvolvendo uma investigação de natureza exploratória, analisando atividades de uma Coleção de Língua Inglesa. A questão norteadora do presente trabalho é: Qual a implicação da utilização do termo debate no comando das atividades de uma coleção didática de Língua Inglesa? Para tanto, nosso objetivo foi o de identificar a concepção de debate subjacente às atividades sugeridas pelos autores da Coleção e a sua contribuição para o desenvolvimento da modalidade oral. Os resultados de análise sinalizam que a maioria das atividades pode ser enquadrada na tipologia de debate de opinião de fundo controverso, (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), embora não seja a preocupação dos autores da Coleção em tratar do gênero em si, mas como um instrumento para o desenvolvimento da modalidade oral. Palavras-chave: Debate. Atividades. Livros didáticos. Modalidade oral. 1 Aluna da graduação em Letras Inglês da UFCG ([email protected]) 2 Profa. Dra. na POSLE da UFCG ([email protected])

Upload: nguyennguyet

Post on 11-Feb-2019

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA INGLESA

Ana Beatriz M. JORGE1 Williany Miranda da SILVA2

RESUMO A aprendizagem de uma língua estrangeira tem sido beneficiada em grande medida pela presença de materiais didáticos, elaborados especialmente para esse fim. Nesse caso, nossa atenção voltou-se para as atividades dos manuais de ensino de língua inglesa, em especial para o estudo do debate. Este é um gênero que não só estimula a fala e a escuta, como também as estratégias de argumentação, a linguagem utilizada e o posicionamento dos falantes diante de um tema; apesar de largamente confundido com outros gêneros de uso comum, tais como “discussão” e “conversa”, (PEREIRA e SILVA, 2013). Face a esse fenômeno, nossa atenção voltou-se para tal objeto, desenvolvendo uma investigação de natureza exploratória, analisando atividades de uma Coleção de Língua Inglesa. A questão norteadora do presente trabalho é: Qual a implicação da utilização do termo debate no comando das atividades de uma coleção didática de Língua Inglesa? Para tanto, nosso objetivo foi o de identificar a concepção de debate subjacente às atividades sugeridas pelos autores da Coleção e a sua contribuição para o desenvolvimento da modalidade oral. Os resultados de análise sinalizam que a maioria das atividades pode ser enquadrada na tipologia de debate de opinião de fundo controverso, (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004), embora não seja a preocupação dos autores da Coleção em tratar do gênero em si, mas como um instrumento para o desenvolvimento da modalidade oral. Palavras-chave: Debate. Atividades. Livros didáticos. Modalidade oral.

1 Aluna da graduação em Letras Inglês da UFCG ([email protected])

2 Profa. Dra. na POSLE da UFCG ([email protected])

Page 2: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 2

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Introdução

Ao estudar aspectos da oralidade como conteúdo da disciplina Oralidade e

Escrita na graduação de Letras-Inglês, na UFCG, 2014.2, inquietou-nos a reflexão de

gêneros orais em contextos de ensino de língua inglesa. Assim, pareceu-nos

interessante tomar o objeto, gêneros orais – o debate, para desenvolver a presente

pesquisa, que se encontra em sua fase inicial.

Após a definição do objeto de investigação, nosso intuito foi confrontar as

considerações teóricas discutidas em sala de aula, na graduação, que tomaram o

debate como objeto de estudo e de ensino, com as atividades praticadas em algum

aspecto vinculado ao ensino de língua inglesa.

Como é sabido, a aprendizagem de uma língua estrangeira tem sido conduzida,

em grande medida, pela presença de materiais didáticos, elaborados especialmente

para esse fim. Nesse caso, nossa atenção voltou-se para as atividades de uma coleção

de livro didático de língua Inglesa, utilizada em uma escola de idiomas. Assim, a partir

da questão norteadora – Qual a implicação da utilização do termo debate no comando

das atividades de uma coleção didática de Língua Inglesa? – a presente investigação

objetiva identificar a concepção de debate subjacente às atividades sugeridas pelos

autores, refletindo sobre o tratamento do gênero para o desenvolvimento da

modalidade oral.

O debate é focalizado, pois, como central para a análise das atividades da

Coleção. O suporte teórico respalda-se em autores como Schneuwly e Dolz (2004) que

defendem que o oral tanto pode ser objeto de ensino quanto de estudo. Além disso, as

perspectivas de estudo em relação à oralidade para o ensino de língua “relaciona-se à

múltiplas conexões, cuja principal influência se dá na formação de professores” e, um

dos percursos identificados, advém de contribuições complementares da linguística de

texto, ao tomar o ensino de leitura e da produção oral dos gêneros textuais, como uma

materialização exclusivamente da modalidade oral, (ARAÚJO, RAFAEL e AMORIM,

2013: 37-45).

Page 3: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 3

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Além da introdução, esse artigo está organizado segundo os tópicos:

Metodologia, com destaque para a sistematização e categorização das atividades

selecionadas; base teórica para o confronto entre teoria e análise de dados;

considerações finais e referências.

1. Metodologia

A metodologia desenvolvida é de natureza descritivo-interpretativa, de base

exploratória, com abordagem qualitativa dos dados. Nesse caso, tomamos uma única

coleção para análise. Esta trata-se de um material utilizado numa escola de idiomas

para alunos em nível intermediário, que já praticam o idioma há, pelo menos, dois

anos e é composta por quatro volumes com cinco unidades em cada um. A coleção

possui o título Make Your Point, e cada volume é diferenciado pelo numeral, 1, 2, 3 e

4. As unidades, por sua vez, trazem um tema geral organizado em uma tabela de

conteúdo, cujos tópicos (numa tradução livre) são: A linguagem em seu contexto (e

seus temas geradores – Relacionamentos, Preconceito, Mídia, Humor, Globalização,

etc); objetivos comunicativos; aspectos gramaticais; vocabulário; e construção do

ponto de vista. Nos dois últimos volumes da coleção, aparece um tópico que focaliza

aspectos típicos da fala, tais como entonação, elisão, etc.

No interior do volume, aparece uma seção em cada unidade com o mesmo

título da coleção Make Your Point (Construa seu ponto de vista – tradução livre), cujo

principal objetivo é proporcionar um espaço de comunicação em inglês para que os

alunos pratiquem todo o vocabulário e as estruturas gramaticais estudadas na unidade

dentro de um contexto sociocomunicativo, proporcionado pelos comandos das

unidades.

A coleção propõe um formato visual heterogêneo na disposição das atividades,

pois em algumas unidades há textos verbais e não verbais (fotografias ou imagens), e,

em outras, nem isso, para tratarem o tema. Vejamos as figuras 01 e 02, que seguem.

Page 4: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 4

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Figura 01:

(Fonte: Make Your Point 1, p.11)

Page 5: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 5

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Figura 02:

(Fonte: Make Your Point 4, p.27)

As figuras 01 e 02 são uma amostra da disposição variada para sugerir as

atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade não compromete a proposta

da coleção quanto ao objetivo de motivar a interação entre os usuários que

necessitam praticar o idioma em foco, ao contrário, evidencia o ambiente dinâmico

pelos quais um tema pode ser abordado.

Page 6: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 6

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Sistematicamente, observa-se um padrão na organização das atividades que

permite a realização da proposta, seja através de um tema gerador (representado por

um texto verbal ou não-verbal) que serve como base para a formação e/ou preparação

de argumentos; seja através da definição de grupos diferentes, com participantes

posicionando-se favorável ou contrário em relação ao tema proposto.

Percebe-se que o texto-base fornecido na atividade, da figura 01, representa o

tópico do debate (a luta pela guarda judicial de uma criança entre os avós e a

companheira da falecida mãe) e serve como ponto de partida para os alunos pensarem

em seus argumentos, “In favor of the grandparents”, em favor dos avós, ou “In favor of

Donna Vickers”, em favor da companheira; incentivando, nesse caso, grupos com

posições contrárias.

A figura 02, por sua vez, apesar de não apresentar um texto verbal com a

contextualização do tema gerador, divide a página em dois tópicos, marcados pela

letra “X”, em destaque no meio da página, com a presença de duas imagens, com

cores de fundo contrastantes, em sobreposição. O desenvolvimento do tópico impõe

posicionamentos opostos, em dois grupos diferentes, “Group A (You are against...)” e

“Group B (You are in favor of...)”.

A observação das figuras mencionadas, acima, permite perceber duas etapas

para a realização da atividade. Na figura 01, os itens 1 e 2 servem como planejamento

para a execução do debate, momento de culminância, explicitado no item 3. Já a figura

02, expõe a etapa de planejamento em comando único, presente no item “Task”. Após

essa instrução, cabe aos grupos organizarem-se e realizarem o solicitado, evidenciado

pelo fragmento “... Read what Groups A and B stand for and join one of them”.

As etapas de planejamento e de execução estão distribuídas em toda a Coleção

em igual formato e podem ser categorizadas, de forma geral, pelo quadro 01, que

segue:

Page 7: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 7

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Quadro 01: Organização macroestrutural das atividades da coleção

Etapas para a realização das atividades

Planejamento Execução

Tema gerador

Definição de grupos

Instrução para a realização da tarefa: Debate/

Discussão/ Expressão de ponto de vista

Fonte: Elaborado pelas autoras

Conforme é possível constatar, a partir do quadro 01, “Organização

macroestrutural das atividades da coleção”, o termo debate está vinculado à etapa de

execução e, algumas vezes, é substituído pelos termos discussão ou expressão de

ponto de vista. A próxima seção discutirá o que essa diversidade implica, tomando

como base as reflexões teóricas acerca do termo debate.

2. Bases teóricas

2.1 Reflexões sobre a oralidade e o gênero Debate

A presença da oralidade se dá a partir de práticas sociais produzidas pela fala

para fins comunicativos. Marcuschi (2001), ao citar a perspectiva sociointeracionista da

língua, afirma que esta é um fenômeno interativo que ao se manifestar através da fala

e da escrita envolve aspectos discursivos e interpretativos, seja com o locutor, seja

com o leitor. A construção de sentido de um texto (falado ou escrito) está diretamente

relacionada ao contexto de uso em que os indivíduos estão inseridos e os aspectos

comunicativos da língua que serão utilizados, como negociação e inferência.

Em relação à fala e escrita, o autor defende que ambas ocorrem de forma

contínua, desconsiderando qualquer superioridade que uma possa ter em relação à

outra. Em se tratando de gêneros mistos, as duas modalidades se apresentam em

Page 8: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 8

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

intensidades diferentes. O meio de divulgação, o nível de formalidade e os propósitos

comunicativos são fatores que determinam o quanto cada modalidade influencia

nesses gêneros.

O debate pode ser considerado um gênero misto por apresentar as duas

modalidades: a preparação de argumentos por meio da escrita e a execução do debate

em si através da fala. Entretanto, segundo a teoria do contínuo de Marcuschi (2001),

as duas modalidades, apesar de presentes, se manifestam diferentemente. A escrita

faz parte da caracterização do debate, porém é na fala e através da interação que ele

se desenvolve. Por mais que o indivíduo pense e escreva os pontos de vista que irá

auxiliá-lo durante o debate, a resposta do interlocutor é sempre imprevisível, podendo

gerar uma reformulação de argumentos na mente do indivíduo necessária para que a

comunicação não se perca.

Dolz e Schneuwly (2004) citam e explicam alguns fatores sociais que são

trabalhados na execução de um debate. No caso da língua inglesa, além dos aspectos

linguísticos, como a organização de ideias, argumentação, intervenção, o uso de

vocabulário específico e de estruturas, o debate também é “um lugar de construção

interativa”, onde o aluno executa a escuta da fala do outro, a espera por sua vez e o

respeito a opinião do outro, quando esta se diferencia da sua. Os autores reforçam:

O debate coloca assim em jogo capacidades fundamentais, tanto dos pontos de vista linguístico (técnicas de retomada do discurso do outro, marcas de refutação, etc.), cognitivo (capacidade crítica) e social (escuta e respeito pelo outro), como do ponto de vista individual (capacidade de se situar, de tomar posição, construção de identidade). (p. 248-249)

Sabendo que o debate põe em evidência capacidades tão relevantes para

verificar a fluência de um falante não nativo, resta-nos averiguar as capacidades

mencionadas sugeridas para a realização das atividades.

Page 9: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 9

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

2.2 O debate – um gênero ou um meio?

Segundo Dolz e Schneuwly (2004), o debate enquanto objeto de estudo pode

ser caracterizado em três tipos: debate de opinião de fundo controverso, debate

deliberativo e debate para resolução de problemas. Nossa análise sinalizou uma

prática que aponta identificarmos o tipo de debate como de opinião de fundo

controverso, pois

(...) diz respeito a crenças e opiniões, não visando a uma decisão, mas a uma colocação em comum das diversas posições, com a finalidade de influenciar a posição do outro, assim como de precisar ou mesmo modificar a sua própria; (...) o debate representa aqui um poderoso meio não somente de compreender um assunto controverso por suas diferentes facetas, mas também de forjar uma opinião ou de transformá-la. (p. 250)

Entretanto, nos exemplos em análise, depreende-se sua concepção como um

instrumento facilitador ou viabilizador de conteúdo de ensino, um meio, portanto. Ao

concebê-lo como um objeto de estudo, constata-se uma semelhança para sua

descrição tanto em relação à denominação “discussão” quanto “ponto de vista”, pois

são gêneros que giram em torno da interação verbal.

O debate é um gênero que não só estimula a fala e a escuta, como também as

estratégias de argumentação, a linguagem utilizada e o posicionamento dos falantes

diante de um tema, (SCHNEUWLY e DOLZ, 2004). Além disso, é uma oportunidade de

desenvolver as competências comunicativas dos participantes. É preciso que as falas

sejam compreensíveis (tanto em nível de pronúncia quanto em nível de

argumentação) para que não prejudique a comunicação.

A pergunta que se coloca no título da seção é pertinente, porque podemos

constatar, através do quadro 01, “Organização macroestrutural das atividades da

coleção”, etapas diferenciadas para a execução da atividade que, na Coleção, em

análise, em geral, culmina com a realização de um debate, mesmo que o termo

utilizado, nos enunciados, algumas vezes, seja substituído por “discussão” ou “ponto

Page 10: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 10

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

de vista”. Nosso propósito é analisar o uso desses termos e sua implicação para o

tratamento do gênero. Vejamos o exemplo 01, que segue:

Exemplo 01:

(Fonte: Make Your Point 1, p.11)

O exemplo 01 foi retirado da Figura 01 e ilustra a etapa da execução da

atividade anteriormente planejada pelos autores do manual, verificada nos itens 1 e 2.

A realização do debate está condicionada ao entendimento das etapas de

planejamento que incluem: conhecimento do tema e organização de grupos para uma

tomada de posição em relação ao tópico desenvolvido durante a unidade.

A instrução regula a capacidade argumentativa em função de um tempo

cronometrado e pressupõe que os falantes falarão de forma alternada “one member

of a group will have one minute to express his/her point of view. Then someone in the

other group will heve the right to do so”. O comando privilegia a oportunidade de

todos falarem, pois a instrução final no tópico é “This process will go on until everyone

has had a chance to present their arguments”. Isso significa, que o foco da atividade

não está na “construção interativa”, mas na exposição do ponto de vista de cada um,

sugerido, pela instrução, no exercício de capacidades de se expor de forma adequada,

segundo as normas linguísticas e uso do vocabulário, enfatizando-se a capacidade

crítica individual, e, deixando de fora, aspectos mais sociais, ao insistir em

possibilidades de retomada do discurso do outro, marcas de refutação, etc.

Nesse sentido, o termo debate, parece sinônimo de outros, podendo inclusive

ser substituído, sem prejuízo de realização do comando. Vejamos os exemplos 02 e 03:

Page 11: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 11

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Exemplo 02:

(Fonte: Make Your Point 4, p.27)

O exemplo 02 não evidencia o termo “debate” em seu enunciado de forma

explícita. Entretanto, a expressão “discuss” em “You are going to discuss” é a palavra-

chave do comando para a realização da atividade. O mesmo procedimento pode ser

observado no exemplo seguinte. Vejamos:

Exemplo 03:

(Fonte: Make Your Point 3, p.64)

O exemplo 03 sintetiza, na expressão “point of view”, na instrução “Choose

your group, read the instructions carefully, and get ready to defend your point of

view”, a etapa de execução da atividade. Além disso, o enunciado reúne comandos

anteriores à própria explanação do ponto de vista, que dependem do tema gerador,

ilustrado na pergunta posta inicialmente “Can science explain these mysteries or are

they supernatural phenomena?” e da definição de grupos, “Choose your group...”.

A variedade terminológica apontada nos exemplos 01, 02 e 03 em destaque

coincide com o que autores como Pereira e Silva (2013) discutem em suas

investigações. Para eles, a flutuação está no uso dos termos debate, discussão e

Page 12: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 12

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

conversa que diz respeito a algumas características em comum. Todos são orais e

podem envolver interação entre os participantes.

Entretanto, o nível de formalidade, a natureza do local, o número dos

participantes e o objetivo da interação, dos gêneros citados por Pereira e Silva (2013)

são fatores diferenciadores. Apesar de ser um gênero predominantemente oral, o

debate possui um pequeno espaço antes da sua realização que envolve leitura de

textos-base sobre aquele tema a ser debatido e organização de argumentos dos

participantes, para que se expressem com mais clareza e segurança durante sua

execução.

Esta característica está, parcialmente, presente nos exemplos em análise. A

condição para atender ao gênero restringe-se a etapa de planejamento oferecida pelo

autor do manual. Dar conta do gênero, para os autores da coleção, implica na

realização das duas ações: ter noção do tema gerador e posicionar-se como favorável

(ou não) a esse mesmo tema. Conhecendo um pouco mais da teoria de gêneros, sabe-

se que a oralidade inclui a fala, mas não se trata apenas do domínio de um código, com

uma produção de sons articulados, com pronúncia e entoação perfeitas.

O paradigma que evidencia a oralidade reconhece nesse tipo de produção o

mesmo status das produções escritas, conferindo-lhes assim, o mesmo valor como

objeto que precisa ser descrito e estudado (ARAÚJO, RAFAEL e AMORIM, 2013: 33) e,

sobretudo, tratado como exemplar de uma situação formal de exposição da fala.

As atividades necessitam, portanto, de uma condução que envolve um

planejamento da performance de “expor pontos de vista” em várias etapas,

conduzindo o aluno a um exercício consciente de mobilização das capacidades

fundamentais exigidas para o entendimento do debate enquanto gênero.

Na Coleção em análise, o caráter de espontaneidade parece predominar nas

atividades, embora seja possível encontrar alguns comandos que contradizem tal

afirmação, em consonância com a afirmação dos autores supracitados. Vejamos os

exemplos 04 e 05, que seguem:

Page 13: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 13

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Exemplo 04:

(Fonte: Make Your Point 2, p.40)

Exemplo 05:

(Fonte: Make Your Point 3, p.64)

Os exemplos 04 e 05 evidenciam um tratamento dado à oralidade que se apóia

na tomada de notas e não unicamente na memória para a expressão de pontos de

vista ou opinião sobre o tema abordado. O exemplo 04 utiliza no comando a expressão

“write them down” após o comando “think of arguments”, destacando a ressalva de

que não basta confiar na memória durante a execução do debate. Instrução

semelhante pode ser constatada no exemplo 05 com a explicitação do item 2, com o

destaque para que o aluno procure em outras fontes informações que o auxiliem na

construção dos argumentos, e do item 3, em que é solicitado que o aluno tome nota

do que ele considera importante.

Ambos os exemplos evidenciam que os autores do manual parecem considerar,

em alguns momentos, a necessidade de um tratamento mais formal para a realização

da atividade, permeando-a com a produção escrita. Não temos como saber,

entretanto, se o objetivo é promover um caráter formal à execução da atividade oral,

com a exigência do escrito, ou se se trata da mera retomada de estruturas linguísticas

ou fixação de vocabulário, necessárias ao ensino de uma língua estrangeira.

Vejamos as figuras 03 e 04, que seguem, e o exemplo 06, em destaque.

Page 14: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 14

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Figura 03:

(Fonte: Make Your Point 2, p.27)

A observação da figura 03 permite constatar a definição das etapas de

planejamento e execução (Task 1 e Task 2, respectivamente). Contudo, a inserção do

quadro “Useful language”, na referida figura, funciona como um apoio linguístico-

estrutural para a realização do solicitado, uma vez que categoriza quatro estruturas

prototípicas para uma tomada de posição, exemplificando cada uma delas, tais como

“Expressing a point of view” (As far as I’m concerned...), “Asking for clarification”

Page 15: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 15

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

(What exactly do you mean by that?), “Expressing disagreement” (I wouldn’t go so far

as to say that...) e “Making a recommendation” (I think/ I dont’t think we should ...).

De uma forma mais pontual, visando à utilização de estruturas e vocabulário

em língua inglesa, parece sinalizar o exemplo que segue com o destaque da instrução

mencionada. Vejamos o exemplo:

Exemplo 06:

(Fonte: Make Your Point 2, p.53)

O exemplo 06 destaca que o aluno, para realizar a atividade, necessita de

conhecimentos armazenados na memória. Caso não os tenha, é possível resgatá-los

em uma seção anterior, com a explicitação do comando “You may use the examples

provided in Task 1 of Language in Context 2 to illustrate your points of view”. Tal

retomada é uma forma de o aluno praticar vocabulário, pois se trata de uma tabela

que, uma vez preenchida, fornecerá argumentos que podem ser utilizados, conforme

destacado no exemplo 06. Vejamos em que consiste esta tabela e a explicitação dos

argumentos na figura 04, que segue:

Page 16: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 16

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

Figura 04:

(Fonte: Make Your Point 2, p.48)

Os comandos em destaque, nas primeiras colunas da tabela, oportunizam uma

prática de linguagem baseada em experiências pessoais, desconsiderando a faixa

etária, a condição socioeconômica e cultural do aluno, na solicitação de respostas para

“use credit/bank card”; “drive through E-Z pass lanes on highways”...; uma vez que ele

pode ter (ou não) vivência com as situações elencadas na tabela.

Outro forte componente para caracterizar a formalidade do gênero encontra-se

na figura do mediador. Este constitui-se relevante para monitorar as falas dos

participantes e manter o encadeamento e as especificidades no momento de

execução. No manual, em análise, esse personagem é anulado completamente, o que

reforça ainda mais a inexistência do tratamento do debate como um gênero. Trata-se,

portanto, de um instrumento para treinar o idioma, seja na modalidade oral, com

destaque para os exemplos 01, 02 e 03, enfatizando a espontaneidade para exposição

de opiniões, seja na modalidade escrita, com destaque para os exemplos 04, 05 e 06,

Page 17: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 17

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

enfatizando estruturas linguísticas prototípicas, como condição necessária para essa

mesma exposição de ponto de vista.

Considerações finais

Para responder ao questionamento posto no início desse trabalho, em que se

indagava “a implicação da utilização do termo debate no comando das atividades de

uma coleção didática de língua inglesa”, realizamos uma sistematização das atividades

da coleção e refletimos sobre a noção do termo debate, nos moldes do paradigma que

envolve a oralidade como objeto de estudo e de ensino.

Tal sistematicidade permitiu identificar procedimentos em que as orientações

para a realização de atividades se resumem em duas etapas: planejamento e execução.

O debate é presença recorrente na segunda etapa e, com outros termos com

equivalência de instrução. Assim, constatou-se o uso de expressões e termos como

“exprima seu ponto de vista” e “discuta” como substitutos de “debate”. Essa flutuação

terminológica evidenciou um não tratamento do debate como um gênero em si, o que

foi reforçado pela ausência de instruções na coleção que não considerava um

mediador; o contexto situacional e algumas capacidades fundamentais para o exercício

desse gênero como da modalidade oral formal.

Os exemplos 01, 02 e 03 evidenciam uma implicação no tratamento do debate

como um recurso para a prática da modalidade oral de um idioma estrangeiro em que

se considera, principalmente, a capacidade individual de usar vocabulário e estruturas

prototípicas do referido idioma, enfatizando a memória, a experiência individual dos

falantes não nativos, fazendo jus a momentos de informalidade e espontaneidade na

performance para praticar o idioma. Nos exemplos 04, 05 e 06, os autores sugerem o

apoio de fontes externas para a realização do debate, em especial, mencionando a

tomada de notas ou produção escrita; possibilitando um tratamento mais formal para

a sua realização. Como esses exemplos aparecem nos volumes da coleção de forma

aleatória, não podemos afirmar que se trata de um contínuo crescente de dificuldades

Page 18: O DEBATE EM ATIVIDADES DE LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA …2015.selimel.com.br/wp-content/uploads/2016/03/Ana-Beatriz-e... · atividades para os alunos. Apesar disso, essa diversidade

[Digite texto]

Universidade Federal de Campina Grande

Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 18

ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765

para se chegar ao entendimento de que o debate é tratado ora como um instrumento

ora como um gênero.

Por tudo isso, a implicação do uso do termo promove duas possibilidades de

respostas: a primeira é a sua não vinculação à ideia de gênero, razão pela qual a

utilização dos termos “ponto de vista” ou “discussão”, no comando das atividades,

como similar não causa estranhamento; e a segunda, o comando enfatiza a ação,

tratando-o como um instrumento com o qual os alunos necessitam fazer uso para

mobilizar práticas de linguagem em torno de um tema gerador, mobilizado em cada

unidade.

Referências ALLEN, Christina Porto. FERREIRA, Francisco Manuel C. C. GUIDO, Marcos Roberto. VIEIRA, Maria Rita Corrêa. Make Your Point Intermediate Plus, vol. 1, 2, 3, 4. São Paulo: Editora Ltda, 2004. ARAÚJO, Denise Lino de; RAFAEL, Edmilson Luiz e AMORIM, Karine Viana. Estudos de oralidade: o ponto de vista na percepção do objeto e suas implicações para a formação docente. In: ARAÚJO, Denise Lino de e SILVA, Williany Miranda da. (Org.). Oralidade em Foco: conceito, descrição e experiências de ensino. Campina Grande: Bagagem, 2013. cap. 2, p. 23-53. DOLZ, Joaquim. SCHNEUWLY, Bernard. PIETRO, Jean-François de. Relato da elaboração de uma sequência: o debate público. In: ______. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004. p. 247-278. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Oralidade e Letramento. In: ______. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001. p. 15-43. PEREIRA, Bruno Alves. SILVA, Williany Miranda da. O debate no espaço escolar: objeto de ensino ou estratégia metodológica?. In: ARAÚJO, Denise Lino de; e SILVA, Williany Miranda da. (Org.). Oralidade em Foco: conceito, descrição e experiências de ensino. Campina Grande: Bagagem, 2013. cap. 6, p. 161-194.