o custo de transporte na emprÊsa - scielo.br · o valor intrínseco do bem transportado, menor...

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o CUSTO DE TRANSPORTE NA EMPRÊSA DANIEL L'HUILLlER "Transportar materiais de um a outro ponto do globo, eis tôda a atividade do homem." ]ULIAN HUXLEY Três pontos nos parecem particularmente importantes na discussão desta matéria: - o desconhecimento quase geral da verdadeira natureza do custo de transporte, de seu lugar na emprêsa e de sua contribuição à rentabilidade global; - a falta de meios de gestão dêsses custos, cuja redução tem, contudo, implicações importantes; - a infinita diversidade de problemas concretos de trans- porte que, para cada emprêsa, são originais e devem ser tratados com instrumentos apropriados. O transporte sempre foi considerado como um fator eco- nômico dependente. Êle está ligado de maneira indissolú- vel ao ato de troca, mas seu custo representa uma barreira por vêzes insuperável, que impede o estabelecimento das correntes de troca ou, pelo menos, lhes modifica a direção e as restringe. DANIEL L'HUILLIER- Professor de Diretrizes e Diretor do Centro Pedagógico do Instituto de Administração de Emprêsas da Universidade de d'Aix - Mar- seille, França. NOTA: :ítste artigo foi escrito para a "Revista de Administração de Emprêsas" e traduzido do original francês por Y olanda F. Balcão.

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o CUSTO DETRANSPORTE NA EMPRÊSA

DANIEL L'HUILLlER

"Transportar materiais de um a outro ponto do globo,eis tôda a atividade do homem."

]ULIAN HUXLEY

Três pontos nos parecem particularmente importantes nadiscussão desta matéria:

- o desconhecimento quase geral da verdadeira naturezado custo de transporte, de seu lugar na emprêsa e de suacontribuição à rentabilidade global;

- a falta de meios de gestão dêsses custos, cuja reduçãotem, contudo, implicações importantes;

- a infinita diversidade de problemas concretos de trans-porte que, para cada emprêsa, são originais e devem sertratados com instrumentos apropriados.

O transporte sempre foi considerado como um fator eco-nômico dependente. Êle está ligado de maneira indissolú-vel ao ato de troca, mas seu custo representa uma barreirapor vêzes insuperável, que impede o estabelecimento dascorrentes de troca ou, pelo menos, lhes modifica a direçãoe as restringe.

DANIEL L'HUILLIER- Professor de Diretrizes e Diretor do Centro Pedagógicodo Instituto de Administração de Emprêsas da Universidade de d'Aix - Mar-seille, França.NOTA: :ítste artigo foi escrito para a "Revista de Administração de Emprêsas"e traduzido do original francês por Yolanda F. Balcão.

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Devido à falta de interêsse pelo custo de transporte, deconhecimento de sua definição correta e, por conseqüên-cia, de conhecimento de como o utilizar e gerir de modoeficaz, na maioria das emprêsas, grandes ou pequenas,notam-se erros, desperdícios custosos e perdas de oportuni-dades de ganho.

Com efeito, o custo de deslocação dos bens, que vai alémdo que se entende comumente por custo de transporte,está ligado a quase tôdas as decisões fundamentais do em-presário, desde a localização da firma até a mercadizaçãode seus produtos. O custo de transporte é um elementoessencial da política geral da emprêsa e o melhor conheci-mento de sua natureza e de seus efeitos deve conduziràs condições ótimas de sua aplicação e da rentabilidadeglobal da emprêsa.

Quer-nos parecer, portanto, que seja interessante, no trata-mento do problema, definir e situar mais precisamente ocusto de transporte, ampliando esta noção de modo a nelaincluir todos os custos da deslocaçêo física de bens.

Abordaremos aqui os interêsses da emprêsa em particular,como utilizadora de transporte; nesta acepção, o utilízadorpode ser definido, de uma parte, como aquêle que tem in-terêsse em efetuar ou mandar efetuar (no caso de nãolhe pertencer o meio de transporte) uma deslocação demercadorias entre dois pontos e, de outra parte, como oque decide, considerados todos os elementos em causa,onde, quando e como essa deslocaçâo será realizada.

NATUREZA DO CUSTO DE TRANSPORTE

O transporte nada acrescenta ao ciclo econômico além decustos. É verdade que se poderia dizer o mesmo de qual-quer atividade e observar que, para compensar os custos,o transporte dá aos bens uma "utilidade no tempo e noespaço" .

Com efeito, poder-se-ia dizer que o transporte tem a fun-ção de transferir bens de um ponto do espaço em que sua

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utilidade é relativamente baixa 11 outros nos quais é rela-tivamente elevada.O transporte assegura o contacto do comprador e do ven-dedor, do produtor e do utilizador. Parece, portanto, queo custo de transporte tenha definição dupla:

- é, por um lado: uma fôrça de atrito que gera atrasos,demoras e até desajustes nos fluxos de bens através dociclo econômico;

,- é, por outro lado, uma espécie de tributo (ou de taxade investimento) que se deve pagar para permitir a cir-culação dos bens e o contacto das unidades econômicas.O custo de transporte pode ser considerado como um custode produção ou de distribuição: seu nome mudará deacôrdo com a pessoa que o pague, mas o fato importanteé que alguém deve definitivamente arcar com êle. Muitasemprêsas tentam desvencilhar-se de seus custos de trans-porte transferindo-os para outras (ou melhor, pensandoque o fazem) comprando "FOB" e vendendo "CIF".

Essas emprêsas, porém, não se d8,0conta de que, de umaou outra forma, o custo de transporte de seus suprimentosestá compreendido no preço do que pagam, pois não com-praram somente um bem, mas também o transporte, sô-bre o qual não têm nenhum contrôle. Da mesma forma,quando se vende "CIF", o custo de transporte conservasua importância, pois o comprador calcula seu preço cominclusão do transporte e sôbre esta base é que faz suaescolha entre diversas fontes de suprimentos (desde quehaja, é claro, igualdade na qualidade); é possível, portan-to, ampliar e melhorar o serviço à clientela pela reduçãodo custo de transporte das expedições, ainda que o seupreço seja pago pelo freguês.

Certas emprêsas insistem mesmo em conservar o contrôledos custos de transporte de encomendas e expedições. Êsteé o caso, por exemplo, da "Régie Renault", na França.

WALRAS definiu a função do empresário como a de entro-samento ótimo dos fatôres de produção a fim de colocar

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um produto num mercado; as escolhas do empresário de-vem tender a maximizar as funções de produção e o em-presário de sucesso é aquêle que torna igual a zero a deri-vada primeira destas funções, através do arranjo ótimodos fatôres de produção. Uma destas funções é a de trans-porte, definida como aquela que permite o movimentodos bens entre duas etapas sucessivas de transformaçãoe distribuição.

Muitas emprêsas não se dão conta de que existe uma fun-ção de transporte: elas sabem somente que fabricam evendem um produto e queé necessário expedi-lo. A maio-ria das firmas pequenas e médias não sabe sequer calcularou controlar seus custos de transporte. Todavia, a mágestão dêsses custos pode dificultar a vida de certas em-prêsas, enquanto que outras sobrevivem com resultadosbem inferiores àqueles que poderiam apresentar.

O responsável pela atividade de transporte deve formularseu pedido de transporte (pedido indireto ligado ao dosbens que são objeto de transporte) em função dos seguin-tes critérios:

- eficiência do fluxo de bens: ela depende da diferençade valor dos bens entre o ponto de origem e o de desti-nação, diferença que é comparada ao custo de trans-porte;

- rapidez e período do fluxo) pois o transporte se faznão somente no espaço mas também no tempo;

- conservação da integridade do fluxo: êste critério estáligado à idéia de segurança.

O empresário deveria procurar a maximização dêsses trêsfatôres, isto é, minimizar a perda econômica provenientedo custo de transporte, quer no tocante a seus suprimentos,quer na distribuição de seus produtos. Mais ainda, êledeveria maximizar a eficiência, a rapidez e a segurança dofluxo de bens, em seu processo de produção.

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IMPORTÂNCIA no CUSTO DE TRANSPORTE

"Todavia", dir-se-á, "o custo de transporte não é senãoum dos inúmeros custos de exploração da emprêsa e a fun-ção de transporte não é senão uma dentre as demaisfunções. Por que, então, devemos dar-lhes um lugar privi-legiado?"A pergunta é procedente. Porém, se ressaltamos êstescustos e esta função, é exatamente porque os mesmos nãosão geralmente reconhecidos como tais e sua incidênciaexata sôbre o preço dos produtos fabricados e comprado>é ignorada. Ademais, a importância do custo de trans-porte com relação aos preços dos bens é muitas vêzes con-siderável, mesmo sem levar em conta a série de custosde transporte que cada produto acarreta nas fases de ela-boração anteriores à final.O custo de transporte depende de muitos fatôres taiscomo distância percorrida, modalidade de transporte, quan-tidade expedida etc. Por outro lado, do custo de transpor-te dependem as condições em que a troca se realiza. Quan-do uma circunstância excepcional aumenta ou diminui bas-tante o valor de um bem num ponto do espaço, imedia-tamente se estabelecem os fluxos dêsse bem e o custo detransporte deixa de constituir um obstáculo, pois é mais doque compensado pela diferença de valor entre o ponto dechegada e o de partida. Êste é, por exemplo, o caso detodos os transportes de urgência (peças avulsas, medica-mentos etc.), em que a modalidade de transporte maiscustosa, porém mais rápida, é a empregada. É também ocaso da evacuação de certas matérias-primas quando sedescobrem novas jazidas dessas matérias a preço de customuito baixo, tais como as jazidas de ferro do Lavrador, decobre ou de urânio do Congo etc.É preciso lembrar que, freqüentemente, os custos de trans-porte não estão em evidência na contabilidade, sendo in-cluídos nas despesas gerais.Mesmo quando existe uma contabilidade analítica, o custode transporte é muitas vêzes encontrado numa categoriageral.

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Não há distinção nítida entre os custos de transporte naencomenda e na entrega. Isto é particularmente verda-deiro quando a emprêsa possui seus próprios veículos. Oscustos de exploração de uma frota de caminhões, porexemplo, são atribuídos às despesas de exploração da em-prêsa como um todo, não havendo contabilização, noscustos de transporte, senão das sornas pagas a transporta-dores externos, o que, naturalmente, dá uma imagem de-formada da realidade.

O mesmo êrro é feito na contabilidade nacional quandoali se insere a parte de transporte no produto nacionaltomando por base as receitas dos transportadores públi-cos: 5%, aproximadamente, nos Estados Unidos em 1950,4% na França em 1954. Estas avaliações, devidamenteretificadas, permitem chegar à conclusão de que esta par-ticipação é, na realidade, de 13%, aproximadamente, naFrança e sem dúvida mais alta nos Estados Unidos.

Há setores da economia para os quais o custo de trans-porte parece muito importante, outros nos quais parecemínimo e desprezível. Esta dispersão é ainda maior seconsiderarmos emprêsa por emprêsa. Quanto maior fôro valor intrínseco do bem transportado, menor será a im-portância relativa do custo de transporte. É necessário,todavia, que se considerem não somente as porcentagensmas também os valôres absolutos: 5% do produto na-cional bruto dos Estados Unidos em 1950 representammais ou menos 14 bilhões de dólares; 4% do produto na-cional bruto da França em 1954 6,5 bilhões de francosfortes.No nível da emprêsa pode-se fazer a mesma constatação.A "Régie Renault", por exemplo, apresenta um custo detransporte que é mínimo em percentagem; mas a funçãode transporte é ali plenamente. considerada, pois seus res-ponsáveis manejam uma soma muito considerável de di-nheiro. Assim, uma economia de 0,01 francos fortes porquilo de material podia, em 1958, representar para a com-panhia um ganho de 3,5 milhões de francos fortes.

R.A.E./4 CUSTO DE TRANSPORTE 99o CUSTO DE TRANSFER1l:NCIA

Até aqui nos referimos apenas aos custos brutos de trans-porte, isto é, às somas pagas a transportadores externos ouàs desembolsadas para funcionamento de um meio de trans-porte de propriedade da emprêsa. Contudo, se considerar-mos a operação global da deslocação física dos bens, per-ceberemos que êste preço (ou custo) não é o único -nem mesmo o principal - elemento do tributo pago pelatroca no espaço e no tempo. Um número importante deoperações precedeu e seguiu o transporte propriamentedito e cada uma delas foi realizada em função da necessi-dade de deslocar os bens. O custo destas operações deveser acrescentado ao custo bruto de transporte.

O custo de transferência integra tôdas as despesas decor-rentes da não-gratuidade e não-instantaneidade do deslo-camento dos bens. Trata-se, portanto, de um conceito maisamplo do que o de custo de transporte empregado no sen-tido habitual. Os custos anexos ou auxiliares de transporteconstituem, por outro lado, essa parcela do custo de trans-ferência que ultrapassa o custo bruto de transporte:

Custo de transferência = Custo bruto de transporte :-l-Custos Anexos.

Custos anexos são todos aquêles que podem ser encontra-dos na ocasião da transferência dos bens e que não tenhamsido incluídos no preço pago pelo transportador. Em cadacaso em particular, êles têm uma importância relativa queé diversa. Por vêzes, o custo bruto de transporte não cons-titui mais a parcela principal do custo de transferência,como no transporte por via marítima, por exemplo. Certoscustos anexos são de difícil quantificação e podem tomarvalôres variáveis em função de cada expedição. Êles de-vem, às vêzes, ser avaliados sob forma de probabilidades.

Outra característica dos custos anexos é que os mesmosnão são, em geral, proporcionais à distância: a maior partedêles se comporta como despesas fixas, outros como pro-porcionais a uma outra quantidade, o tempo, por exemplo.

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É pràticamente impossível encontrar um elemento com oqual o. custo de transferência global esteja em relaçãoconstante.A função de transporte na emprêsa deve controlar oscustos anexos, geri-los de modo a reduzi-los ao mínimo, ouao menos fazer com que dêem sua contribuição máximapara a rentabilidade global da firma.

ESPÉCIES DE CUSTOS ANEXOS

Eis uma lista de fontes de custos anexos: (1)

- acondicionamento, embalagem e preparação paratransporte;- levantamento (inicial ou terminal) ;- carga;

- baldeação e manutenções diversas (rupturas de car-ga);- descarga;- armazenamento e estocagem (aqui incluídos a esperado material, os atrasos nas estadias etc.);- custo de instalações terminais do utilizador (ramifi-cação, cais de carga, portos particulares etc. );- perdas, avarias, atrasos ou deteriorações, seguro:- imobilização dos capitais representados pelo valor dasmercadorias durante o transporte;- outras despesas eventuais (despesas administrativas,tarifas aduaneiras, impostos etc.) .

Entre essas despesas, algumas são mais importantes queoutras para uma dada operação, podendo ser mais ou me-nos substituíveis entre si.As despesas de aproximação (no carregamento ou no des-carregamento) e de baldeações na viagem são, às vêzes,

(1) "Le Prix de Revient dans l'lndustrie des Transportes Intérieurs", Na-tions Urdes, 1955, pág. 57.

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incluídas no custo bruto de transporte; mas muito fre-qüentemente devem ser pagas à parte pelo utilizador.Elas fazem parte das rupturas de carga, que sempre cau-sam riscos comerciais e financeiros (perda, avaria, tempoperdido) . Êstes riscos podem provocar perda de clientela,prejuízo financeiro para a emprêsa (apesar do seguro),deterioração do serviço e energia desperdiçada no reparode erros. Êstes são custos anexos devido às somas suple-mentares desembolsadas para estas operações e devido aosriscos que são eventuais, mas podem, ao ocorrer, acarre-tar perda de somas importantes; êstes riscos podem serobtidos pelo cálculo das probabilidades. Tudo o que re-duz o risco reduz o custo de transferência. Porém, por ou-tro Iado, é preciso evitar- a reserva de uma margem de se-gurança muito grande, pois o custo desta margem podeser superior à economia potencial dada pelo plano de se-gurança.

É, pois, muito útil seguir o trajeto completo das mercado-rias: o trajeto direto nem sempre é o mais econômico -há lotes que permitem tarifas mais baixas - mas o é co-mumente. Em 1949 as estradas de ferro francesas estima-vam que, para cada 20 toneladas de mercadorias trans-portadas por 200 quilômetros, os dois levantamentos (ini-cial e terminal) dobravam o preço de custo por quilôme-tro. Um meio de transporte flexível como o caminhão podeser preferido a um meio de transporte rígido como a estra-da de ferro. Todavia, na fábrica "Renault" francesa, em vir-tude da dispersão das usinas que fabricam as diferentespeças que compõem o produto final, procuram-se os tra-jetos que, no total, minimizem as rupturas de carpa.

Estas despesas são particularmente amplas nos países sub-desenvolvidos. Pudemos constatar sua importância "inloco", em diversos países da África. A penetração dos pro-dutos no interior se faz por custos crescentes: em 1950,uma tonelada de cimento que chegava a Point Noire (noCongo) ao preço de 4 .400 francos CIF valia 5 . 886 fran-cos CIF em Brazzaville, 7.988 em Bangui (RepúblicaCentro-Africana) e 25.444 em Fort-Lamy (Tchad) de-

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pois de longas demoras e de ter passado por quatro oucinco meios diferentes de transporte. O aperfeiçoamentoda infraestrutura de transporte permite remediar êste es-tado de coisas e tal aperfeiçoamento deve ser conseguidoa fim de se assegurar o serviço global mais econômico parao utilizador. Nesta ordem de idéias, devemos assinalar queuma infraestrutura própria da emprêsa (ramificações fer-roviárias particulares, portos particulares, por exemplo)pode contribuir para minimizar as despesas de ruptura decarga, desde que os custos de manutenção e de amortizaçãonão sejam superiores à economia realizada.

As despesas administrativas de diversas espécies formam,por vêzes, uma barreira importante para a troca. Sua in-fluência é sensível, sobretudo nas tarifas internacionais.O cálculo é feito muitas vêzes em percentagens, chegando--se a uma inflação exagerada dos custos. Na escolha domeio de transporte, as diferenças de regulamentação de-vem ser tomadas em consideração. Mas é desejável quea integração cada vez maior das economias nacionais emgrandes consórcios venha reduzir êste fator parasitário;grandes progressos já foram feitos na Europa, neste terre-no, através do Mercado Comum Europeu.

MANUTENÇÃO E ACONDICIONAMENTO

Estas duas operações (e as despesas que envolvem) sãocada vez mais substituíveis entre si. A manutenção, tantona carga como na descarga (e também no decurso das rup-turas de carga) poderá ser feita de forma mais ou menoseconômica, muitas vêzes podendo ser até eliminada, de-pendendo do acondicionamento do produto (por exem-pio: o transporte do leite em embalagem de papelão emvez de em garrafas com dupla manutenção) .

Por outro lado, algumas vêzes os meios de manutenção deque dispõe a emprêsa são fatôres determinantes na esco-lha da embalagem. Êstes custos anexos estão ligados aoutras despesas do custo de transferência (e também deoutros custos de produção) e são, em parte, substituíveis

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por elas, especialmente quanto ao risco de deterioração doproduto. Quanto menor fôr o risco, menos importante ecustosa será a embalagem. O transporte aéreo, por exem-plo, se satisfaz freqüentemente com um acondicionamen-to sumário. Quanto mais numerosas forem as manuten-ções necessárias, maior será o risco, como, por exemplo,nos transportes marítimos ou fluviais.

Para os produtos de ourivesaria, o pêso da embalagem aé-rea é equivalente a um quarto da usada no transporte ma-rítimo. Da mesma forma, a manutenção é o ponto de es-trangulamento no transporte marítimo. Aqui uma eco-nomia de 10% sôbre a manutenção poderá reduzir as des-pesas totais em 3%. O efeito de tal redução será par-ticularmente grande nos países subdesenvolvidos, que .sãoos que mais utilizam o transporte por via marítima.

Todos os estudos relativos à manutenção e ao acondicio-namento devem ser feitos em conjunto. Em certa emprê-sa americana, o responsável pela produção insistia em re-ceber um produto químico em barris em vez de a granel,por causa da facilidade de manutenção. Entretanto, umestudo feito mostrou que as economias conseguidas pelotransporte a granel amortizariam as novas instalações ne-cessárias em seis meses e representariam um ganho líqui-do de dois mil dólares por mês.

O desenvolvimento de técnicas como a "contenerização"("containerization") e a "paletização" ("palettization")pode trazer numerosas contribuições à redução desta ca-tegoria de despesas anexas que figura entre as mais im-portantes. A "paletização" - que permite aumentar acarga unitária que deve ser manipulada pelo agrupamentodas mercadorias numa plataforma de transporte que é ele-vada por empilhadeiras de garfos. - permite dispor deuma unidade de manutenção tôdas as vêzes que uma car-ga deve ser colocada num ponto e retomada inalterada. A"contenerização" procura, também, agrupar numa mesmaunidade de transporte e manutenção as diversas mercado-rias destinadas a um mesmo ponto do espaço. A determi-nação do tamanho ótimo dos recipientes adaptados à ati-

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vidade da emprêsa apresenta problemas complexos quepodem ser resolvidos pela pesquisa operacional. (2 )

Estas técnicas, assim como a substituição da manutençãomanual pela mecânica, substituem os custos fixos porcustos variáveis e as despesas de mão-de-obra por despe-sas de amortização.

Vemos atualmente que há uma especialização cada vezmaior dos próprios instrumentos de transporte (vagões oujamantas equipados com bombas, vagões ou jamantasequipados para o transporte de pós a granel, e de veículos,navios petroleiros ou de minérios etc.) e uma multipli-cação dos equipamentos que, não sendo mais econômicos,têm, entretanto, tráfego suficiente para amortizar seucusto. A rentabilidade dos diversos processos deve serapreciada em cada caso, também consideradas as despesasmenos quantificáveis mas nem por isso menos reais, taiscomo o risco de perdas, o custo de estocagem e os custosde tempo.Os custos de tempo são, certamente, os mais desconheci-dos, devido a serem os menos discerníveis dos custos ane-xos. Êles resultam dos atrasos no tempo entre as diver-sas operações que constituem as etapas do ciclo dos bense das interrupções que são decorrentes da não-linearidadeda progressão das quantidades econômicas. É certo quese a transferência dos bens fôsse instantânea e contínua,os atrasos seriam excluídos por definição, levando à su-pressão dos estoques de segurança: o volume de merca-dorias inativas seria reduzido a zero e os ritmos de pro-dução dos diversos escalões do ciclo poderiam ser coor-denados de modo perfeito. A partir do momento em quese admite que um bem que não tem utilidade (ou que ficaimóvel) custa dinheiro (com exceção de certos casos,como os de estoques especulativos), vê-se a importânciaque toma a rapidez da circulação no custo de transferên-

(2) Vide F. Weldon, "Cargo Containerieation in the West Coast, HawaianTrade", Operetions Research, setembro-outubro 1958.

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cia, isto é, a presteza da operação de transporte em si mes-ma e, sobretudo, a presteza com que o bem é transferidode uma fase a outra de seu ciclo.

Podem ser incluídos nesta categoria de custos anexos to-dos aquêles que estão relacionados com a imobilização dematerial ou capitais representados por mercadorias: bense veículos em transporte, estoques de matérias-primas ede produtos finais, assim como as instalações necessáriaspara o depósito de mercadorias; podem-se aqui incluirigualmente as despesas de exploração dos armazéns e deadministração de estoques, as despesas de espera ou deestacionamento (custo de subutilização do material detransporte) e os riscos de perda ou de deterioração dosprodutos perecíveis. Ao contrário, pode-se considerar orisco de ruptura de estoque como um custo de tempo, poiso custo de parada de uma unidade de produção, de ruptu-ra de um contrato ou de uma venda perdida são riscos quecrescem no decorrer do tempo e podem chegar a valôresconsideráveis. Isto, aliás, não esgota a lista dos custosmais ou menos ligados ao tempo.

Os meios de transporte mais rápidos podem ser os maiseconômicos em virtude da intervenção dêsses custos. NaTabela 1 damos um exemplo significativo de transportede artigos têxteis entre os Estados Unidos e a Alemanha.Os custos de transporte fazem com que haja uma ligaçãoestreita, através dos custos de tempo, entre a política detransporte e as diretrizes de armazenamento e níveis deestoque. Não é preciso, aliás, que a busca de rapidez con-duza a abusos, pois ela é econômica somente até um certoponto de equilíbrio: é preciso equilibrar constantemen-te os custos e os riscos; a compra de grandes quantidadespode gerar economias que não compensem os custos deestocagem. É, todavia, impressionante constatar o de-sinterêsse pelo problema do custo de estoques por partede numerosas emprêsas. Um questionário enviado a 115firmas americanas foi preenchido por 42: somente 73%das respostas mencionavam o juro do capital como umcusto de armazenamento, 67% os impostos, 67% os se-

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guros, 84% a amortização, 39% a depreciação técnica,1% o custo de colocação de pedidos. (3)

O mesmo tipo de. problema se apresenta com a questãodo armazenamento. Na medida em que um transporterápido permite diminuir o volume dos estoques, êle per-mite também diminuir as superfícies ou os volumes dearmazenamento de produtos inativos. A "Régie Renault"considera êste fator quando inclui em seu "custo de trans-ferência" o custo do metro quadrado de armazém. As des-pesas de armazenamento podem chegar a uma cifra ele-vada se nelas se incluem tôdas as despesas de manutençãodos armazéns, bem como o juro do capital imobilizado.

A rapidez do transporte permite reduzir estas despesas: otransporte aéreo permitiu mesmo que certas emprêsas su-primissem seus armazéns. Uma fábrica americana de car-buradores, por exemplo, depois de analisar detidamenteos custos de exploração de seus armazéns, decidiu suprimir6 de 7 dêles e fornecer seus clientes por avião diretamenteda fábrica. O 7.° foi mantido em virtude de ter movimen-to elevado, suficiente para amortizar as despesas fixas. Otransporte aéreo substituía custos quase inteiramente pro-porcionais por custos quase inteiramente fixos. A elimi-nação dos 6 entrepostos permitiu grandes economiasanuais e desembaraçou um capital extremamente precioso.pois a emprêsa sofria de falta crônica de capital circulante,razão que a havia levado a estudar êste problema.

CONCLUSÕES

A adoção desta noção de custo de transferência levar-nos--ia, naturalmente, a considerar os meios de administraçãodêste custo na emprêsa. Todavia, êste é um assunto vastoque, por si só, merece um estudo. (4)

(3) H. Lewis, J. Culliton & J. Steele, "The Role oi Air Freight in PhysicelDistribution", Harvard University Press, Cambridge, Mass, 1956, pág. 60.

(4) A ser publicado brevemente sob o título "L'lnlluence du Co'Útde Trens-port SUl' Ies Mouvements de Merchandise:i', pela editôra "Cujas", Paris,

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Limitemo-nos, portanto, a indicar, de forma resumida (nãoexaustiva), algumas diretrizes que o dirigente empresa-rial deve considerar em relação aos problemas de trans-porte:

1 Preocupar-se com o encaminhamento dos supri-mentos vendidos "CIF";

2 - Utilizar a função de transporte como fonte de in-formação sôbre os custos de transporte dos con-correntes;

3 - Ter um responsável pelo movimento global demercadorias (sobretudo nas pequenas firmas);

4 Pedir informações sôbre o custo de transporte decada produto fabricado ou vendido;

5 Não relegar a função de transporte a nível subal-terno;

6 - Considerar a importância dos custos de transportena apreciação das ofertas de diversos fornecedores;

7 - Não limitar a ligação do serviço de transporte comos outros departamentos, quando o mesmo aindalhes pode prestar serviços;

8 - Consultar o diretor de transporte desde o início,quando se prevê uma nova implantação, um nôvoproduto, uma nova embalagem;

9 Indicar claramente as responsabilidades do dire-tor de transporte, particularmente nos domíniosque lhe são anexos: manutenção, embalagem, ar-mazenamento etc. ;

10 Não tentar diminuir as despesas de transportetransferindo-as sistemàticamente para o cliente,isto é, adotando uma política de preços "FOB" .

o custo de transferência, como aqui o definimos, diferegrandemente do quadro do custo de transporte no seusentido mais comum. Os custos anexos o encarecem de

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modo considerável, sendo seu montante superior, muitasvêzes, ao preço pago pelo transportador. Em' cada casoparticular, os componentes dêste custo são diferentes, mastôda modificação de uma das partes repercute de maneiraproporcional à sua importância relativa.

Êste custo de transferência é de difícil compreensão devi-do, especialmente, à falta de atenção que recebe: as esta-tísticas nacionais e internacionais, ao dar cifras globais.não permitem destacá-lo, pois sua natureza é flutuante emultiforme; no nível da firma, êle não é contabilizadocomo tal e seus diversos elementos se encontram geral-mente esparsos nos documentos, o que não permite seucontrôle.

Todavia, na medida em que se integra no custo final, ocusto de transferência merece a atenção das firmas quepretendem melhorar sua rentabilidade global; e a maiorou menor rentabilidade pode significar, entre duas emprê-sas concorrentes, a diferença entre lucro e prejuízo, a di-ferença entre sobrevivência e desaparecimento.