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. estudos semióticos http://www.revistas.usp.br/esse issn 1980-4016 semestral julho de 2016 vol. 12, n. 1 p. 67-73 Um estudo semiótico de The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey Maria Vitória Laurindo Siviero (USP) * Resumo: Esse artigo discute a performance enquanto manifestação artística. Diante da dificuldade de precisar as características gerais desse gênero experimental, utilizei a semiótica como principal ferramenta para analisar um ato performático e compará-lo a outras duas obras, a fim de destacar a existência de fenômenos recorrentes nos diferentes casos. Por meio de uma abordagem greimasiana, foi analisada a obra “The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey”, um ato performático realizado no ano de 1992, por dois artistas lanito-americanos, Guillermo Gomez-Peña e Coco Fusco, os quais, vestidos como aborígenes, trancaram-se em uma jaula e passaram três dias compondo parte do acervo de museus da Europa, EUA e México. A performance em questão foi comparada com “Rape Scene” (1973), da artista Ana Mendieta, e “First Woman at the Moon” (1999), realizada por Aleksandra Mir, sendo um dos principais objetivos dessa investigação o levantamento de elementos comuns a todas as obras, possibilitando uma observação mais precisa de tais fenômenos a fim de demonstrar que tais obras possuem aspectos por meio dos quais é possível agrupá-las na categoria “performance”, pois essa linguagem se difere de outras manifestações artísticas (como a música, teatro, pintura, etc.) e garante sua autonomia por meio de uma série de características próprias ao gênero. Palavras-chave: Performance; Arte; Semiótica 1. A performance-art A performance é uma manifestação artística que nasceu apoiada no hibridismo e encontra-se num ponto de intersecção entre outras linguagens como a poesia, a música, o teatro e a pintura. É um gênero que nasceu da necessidade de reformular e experimentar com os padrões tradicionais de fazer e mostrar arte. Em A arte da Performance (2011), Glusberg ilustra uma “pré-história” da manifestação performática, na qual se refere às vanguardas como movimentos que inspiraram as primeiras aparições formais desse gênero artístico (na década de 60), além das influências dos rituais tribais e do teatro e dança orientais. Nas palavras de Jocken Gerz (Gerz apud Glusberg, 2007, p. 7): “Performance é aquilo que não foi nomeado, que carece de uma tradição, mesmo recente, que ainda não tem lugar nas instituições. Uma espécie de matriz de todas as artes”. uma dificuldade em estabelecer uma definição precisa e consensual para uma expressão artística de caráter experimental, espontâneo e livre, uma vez que esse próprio gênero artístico mantém- se em movimento, em uma busca constante pela reformulação. A necessidade de uma definição mais precisa para o conceito de performance é gerada pela importância de se conhecer o terreno a ser atravessado na criação e estudo deste fenômeno artístico. Conhecer determinada linguagem artística possibilita a liberdade não apenas de criação, mas também de análise e pesquisa, fortalecendo o próprio fazer artístico e sustentando a performance enquanto linguagem. Diante da dificuldade em precisar as características gerais desse gênero artístico, questiono se é possível definir cientificamente, um ou mais traços semânticos comuns a todos os atos artísticos comumente associados à performance, podendo assim, estabelecer uma definição mais concisa para esta manifestação artística, garantindo sua autonomia. Portanto, pretendo investigar traços comuns em diferentes atos artísticos inseridos nessa categoria sob uma ótica greimasiana, traços estes que possam caracterizar tais atos como uma obra de arte performática. Deste modo, nesse artigo discorrerei sobre a análise semiótica de um ato performático: “The Couple in a Cage: A Guatinaui Odyssey”, de Guillermo Gomez-Peña e Coco Fusco. 2. Registro e Obra Não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado; por causa da impetuosidade e da velocidade da mutação, esta se dispersa e se recolhe, vem e vai. (Heráclito de Éfeso) Um ato performático quando se inicia já implica seu próprio desaparecimento, a performance é uma DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120538 * Mestranda em Linguística pelo programa de pós-graduação de Semiótica e Linguística Geral da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Endereço de e-mail: [email protected]

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estudos semióticoshttp://www.revistas.usp.br/esse

issn 1980-4016semestral

julho de 2016vol. 12, n. 1

p. 67-73

Um estudo semiótico de The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey•

Maria Vitória Laurindo Siviero (USP)*

Resumo: Esse artigo discute a performance enquanto manifestação artística. Diante da dificuldade de precisar ascaracterísticas gerais desse gênero experimental, utilizei a semiótica como principal ferramenta para analisar um atoperformático e compará-lo a outras duas obras, a fim de destacar a existência de fenômenos recorrentes nos diferentescasos. Por meio de uma abordagem greimasiana, foi analisada a obra “The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey”, umato performático realizado no ano de 1992, por dois artistas lanito-americanos, Guillermo Gomez-Peña e Coco Fusco, osquais, vestidos como aborígenes, trancaram-se em uma jaula e passaram três dias compondo parte do acervo demuseus da Europa, EUA e México. A performance em questão foi comparada com “Rape Scene” (1973), da artista AnaMendieta, e “First Woman at the Moon” (1999), realizada por Aleksandra Mir, sendo um dos principais objetivos dessainvestigação o levantamento de elementos comuns a todas as obras, possibilitando uma observação mais precisa de taisfenômenos a fim de demonstrar que tais obras possuem aspectos por meio dos quais é possível agrupá-las na categoria“performance”, pois essa linguagem se difere de outras manifestações artísticas (como a música, teatro, pintura, etc.) egarante sua autonomia por meio de uma série de características próprias ao gênero.

Palavras-chave: Performance; Arte; Semiótica

1. A performance-artA performance é uma manifestação artística

que nasceu apoiada no hibridismo e encontra-senum ponto de intersecção entre outras linguagenscomo a poesia, a música, o teatro e a pintura. Éum gênero que nasceu da necessidade de reformulare experimentar com os padrões tradicionais de fazere mostrar arte.

Em A arte da Performance (2011), Glusbergilustra uma “pré-história” da manifestaçãoperformática, na qual se refere às vanguardas comomovimentos que inspiraram as primeiras apariçõesformais desse gênero artístico (na década de 60),além das influências dos rituais tribais e do teatro edança orientais. Nas palavras de Jocken Gerz (Gerzapud Glusberg, 2007, p. 7): “Performance é aquiloque não foi nomeado, que carece de uma tradição,mesmo recente, que ainda não tem lugar nasinstituições. Uma espécie de matriz de todas asartes”.

Há uma dificuldade em estabelecer umadefinição precisa e consensual para uma expressãoartística de caráter experimental, espontâneo e livre,uma vez que esse próprio gênero artístico mantém-se em movimento, em uma busca constante pelareformulação. A necessidade de uma definição maisprecisa para o conceito de performance é geradapela importância de se conhecer o terreno a seratravessado na criação e estudo deste fenômeno

artístico. Conhecer determinada linguagem artísticapossibilita a liberdade não apenas de criação, mastambém de análise e pesquisa, fortalecendo opróprio fazer artístico e sustentando a performanceenquanto linguagem.

Diante da dificuldade em precisar ascaracterísticas gerais desse gênero artístico,questiono se é possível definir cientificamente, umou mais traços semânticos comuns a todos os atosartísticos comumente associados à performance,podendo assim, estabelecer uma definição maisconcisa para esta manifestação artística, garantindosua autonomia. Portanto, pretendo investigar traçoscomuns em diferentes atos artísticos inseridos nessacategoria sob uma ótica greimasiana, traços estesque possam caracterizar tais atos como uma obra dearte performática. Deste modo, nesse artigodiscorrerei sobre a análise semiótica de um atoperformático: “The Couple in a Cage: A GuatinauiOdyssey”, de Guillermo Gomez-Peña e Coco Fusco.

2. Registro e ObraNão se pode percorrer duas vezes o

mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma substânciamortal no mesmo estado; por causa da impetuosidade e davelocidade da mutação, esta se dispersa e se recolhe, vem e

vai. (Heráclito de Éfeso)

Um ato performático quando se inicia já implicaseu próprio desaparecimento, a performance é uma

• DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120538 * Mestranda em Linguística pelo programa de pós-graduação de Semiótica e Linguística Geral da Faculdade de Filosofia, Letras e CiênciasHumanas da Universidade de São Paulo. Endereço de e-mail: [email protected]

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linguagem efêmera, cujo tempo será sempre opresente. Diferentemente de um poema ou de umafotografia, uma performance jamais será capturadapela perpetuidade, mas se sujeita a perecer, não nosavisa de sua extinção e muitas vezes, nem de seusurgimento. Uma performance simplesmente“acontece”, de maneira única e irreprodutível. Paraser fruída, a obra performática precisa que seuespectador esteja presente no momento e lugaronde ela acontece, do contrário, não haverá catarse,tão pouco haverá a própria performance. Da mesmamaneira, perde-se também a possibilidade deanalisar com a mesma precisão cada evento duranteuma performance.

Qualquer análise de obra se ampara em seusregistros, por exemplo, para analisar uma pintura,como “Saturno devorando a un hijo”, uma daspinturas de óleo sobre reboco da casa de Franciscode Goya, o analista certamente recorrerá a umagravura do mesmo afresco. É lógico que no caso daperformance não haveria de ser diferente, masconsiderando que não se pode fruir desse gênero deobra por outro meio que não seja presente narealização do ato, não faz nenhum sentido registrá-la, afinal, o registro jamais será o próprio ato. Sendoassim, os registros de performance sãorelativamente difíceis de se obter, tratam-se defragmentos obscuros de vídeos, fotografias edescrições verbais, os quais conseguem recomporuma determinada performance após um intrincadolevantamento.

Sendo assim, a primeira dificuldade nodesenvolvimento da pesquisa é tornar claros oslimites entre o registro e a obra, de forma que oprimeiro (seja ele, por meio de vídeo, descriçãoverbal ou fotografia) não acabe por protagonizar aanálise do segundo.

Segundo a dicotomia expressão/conteúdoproposta pelo linguista Louis Hjelmslev, o textosurge da articulação entre dois planos, o plano doconteúdo, onde se constrói o significado, e o planoda expressão, por meio do qual este significado éexpresso. Pode-se dizer que se trata do que é dito ede como é dito, é dessa relação que surge umtexto, verbal ou não. No caso da performance,assim como em todo texto poético (cf. Jakobson,2010, p. 150 e segs), há uma relação dereciprocidade estabelecida entre o plano doconteúdo e o plano da expressão, não é o queaconteceria em um texto utilitário, como porexemplo, uma bula de remédio, na qual o plano daexpressão se limita a apenas explicitar o conteúdo.

Essa função utilitária é atributo também dosregistros através dos quais se acessa o objeto daanálise – excetuando-se os casos nos quais oregistro e o plano da expressão são o mesmo, porexemplo na poesia concreta – o exame do plano daexpressão do registro pouco interessa ao analista do

discurso, pelo contrário, deve ser atravessado porele, pois sua função está limitada a expressar oconteúdo e não a criar um diálogo com ele. Aotomar como exemplo a análise de um soneto deCamões, pouco importa que esteja grafado com letraArial ou Times New Roman, o resultado da análiseserá o mesmo em ambos os casos.

No caso de um poema, o plano de expressão é alinguagem verbal, mas há duas formas de registropara ele, sendo estas a voz humana e a formaescrita; ao analisar seu conteúdo, tanto faz a qualdos dois recorrer. No gênero performance, pode-sedizer que seu plano de expressão é o ato do ator.Diferentemente de um filme ou fotografia, osrecursos audiovisuais são apenas forma de registrá-lo, assim como os textos verbais que o descrevem.

A comparação pela qual essa pesquisa seinteressa é a da compatibilidade sintagmática entreuma performance e outra e, para isso, é necessárioinvestigar quais paradigmas coexistem, ou seja,quais eventos compuseram o ato. Para isso, nãoimportará se estas informações forem coletadas emuma entrevista com os performers ou retiradas deum vídeo. O objeto de estudo também pode serreproduzido por meio de depoimentos deespectadores e fotografias ao mesmo tempo.

Portanto, da mesma forma que não influencia aanálise de um poema não concreto a fonte com oqual ele é grafado, a análise de uma performancetambém não deve se ater ao plano de expressão doregistro (suas filmagens, fotografias e testemunhos).É preciso considerar que essa é apenas uma dasformas pelas quais uma performance pode serrevisitada apenas como objeto histórico e científico,mas não necessariamente estético.

3. The Couple in the Cage: AGuatinaui Odyssey

Em março de 1992, por três dias, os artistasGuillermo Gomez-Peña e Coco Fusco se trancaramem uma gaiola dourada travestidos de Guatinauis(os fictícios aborígenes habitantes de uma ilha doGolfo do México que teria sido supostamenteesquecida por Colombo), o ato foi intitulado “TheCouple in the Cage: A Guatinaui Odyssey” etambém é conhecido como “Two UndiscoveredAmerindians”.2

Ao longo da performance, executavam atividadesdiárias da vida moderna ocidental: utilizavamlaptops, assistiam televisão etc. Por uma pequenadoação dos visitantes do museu Columbus Plaza(em Madrid, na Espanha), o casal posava parafotografias e Fusco dançava hip-hop. No horário dealimentação, os guardas do museu passavambananas para os artistas e, quando eles precisavamusar o banheiro, eram escoltados em coleiras. Osvisitantes recebiam informações enciclopédicas

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igualmente fictícias sobre os aborígenes descritoscomo “amostras”; o público era informado sobre ocomportamento sexual desinibido e a afetividadedos Guatinauis e ainda era possível examinar, emum mapa do Golfo do México, a localização dasuposta ilha.

Esta performance, que durante dois anos viajoupor cidades dos Estados Unidos, Europa e México,evoca a experiência dos zoológicos humanos,também conhecidos como exposições etnológicas oublack villages, que foram populares ao longo dosséculos XIX e XX, em museus, bares, restaurantese freak shows. Algumas vezes se sucedem, ainda,na atualidade em situação semelhante3, emboratenham sido historicamente suprimidos da nossamemória coletiva. No zoo humano eram exibidos emseu estado “natural” ou “primitivo”4, homens,mulheres e crianças pertencentes a tribos africanase indígenas. Eles eram colocados em gaiolas,algumas vezes acompanhados por aves emacacos, que serviam para aumentar o efeito denegação da cultura e ilustrar a semelhança dosaborígenes mais com os próprios animais do quecom os seres humanos.5

Revisitar as exposições etnológicas por umaperspectiva moderna e crítica é provocar umamemória social e denunciar um aspecto ignorado esombrio de nosso desenvolvimento cultural. Aexistência desse componente sinistro contribuiilustrando, ao longo da história, uma parte daconstrução do pensamento europeu e americanoa respeito de grupos étnicos não-ocidentais.

A performance de Guillermo Gómez-Peña e CocoFusco trabalha com estereótipos construídos aolongo dos anos por povos do Ocidente. Fusco estáusando tranças nos cabelos, uma saia de palha, umtop estampado imitando pelo de onça e tem o rostopintado de cores fortes e Gómez-Peña usa umamáscara de lutador de “lucha libre”, ele se vestecom estampas étnicas e tem um cocar de penas nacabeça. Tanto o visagismo quanto o figurino que foiconcebido para a performance abusa de cores,penas, estampas, colares de sementes etc., além dedeixar boa parte da pele à mostra. Mas adicionadosa esse visual tido como “exótico”, estão acessórioscomuns da moda e da cultura americana eeuropeia, como óculos escuros e tênis de cano alto.

Além da presença inusitada de acessórios damoda ocidental, a cultura moderna do ocidenteaparece representada pelos aparelhos eletrônicos,laptop, televisor e nos demais apetrechospertencentes aos aborígenes dessa “terraimaginária”, como a garrafa de Coca-Cola e ostênis de cano alto usados por Fusco. Na composiçãode tal cena irônica a etnia dos artistas é umelemento fundamental, pois trata-se exposição decorpos latino-americanos, o que reforça ainda maiso formato pastiche da obra.

Nesse zoo, concebido por artistas hispano-americanos, está exposto o “humano exótico”, essaexposição e aprisionamento se justifica por suascaracterísticas “primitivas” e “estranhas”. Eles estãoexpostos como objeto de curiosidade do público. Ovisitante ocidental tem a oportunidade de interagircom uma cultura ancestral e exótica, que apareceengaiolada no museu (justamente por suaestranheza), mas ao fazê-lo, está diante de um“show” de ações comuns a sua própria cultura.

Em um contexto de globalização e consciênciada falácia de qualquer teoria de superioridadeétnica, quer seja ela baseada em princípios moraisou religiosos, exibir indígenas em um museu,seria tão ilógico quanto cruel. A falta de lógica,porém, é ainda maior quando estes executamtarefas modernas, um absurdo que é aindareforçado pela qualidade caricata e estereotipada doato.

A performance admite argumentos incoerentesatravés do apelo ao ridículo, através da exposiçãoirônica de um discurso contrário à lógica,apontando, assim, a absurdidade, acontrariedade6 daquilo que está sendo exposto.Esse ato performático ironiza o olhar ocidentalsobre a cultura estrangeira e seu conceito de“exótico” quando faz uso da linguagem comum aosmuseus e à autoridade do ambiente para exibir umcasal de aborígenes, tratados como uma espécie derelíquia histórica, espécime científico e objeto decuriosidade na sociedade pós-colonial trancada eexposta em uma jaula de ouro. Trata-se de umaafirmação disfórica da cultura.

A obra revisita o zoo humano, uma instituiçãohoje repudiada pela humanidade, para trazê-la àtona de forma crítica, valendo-se de uma figuraretórica: a ironia, dispositivo no qual admite-seuma tese oposta para que, por meio de suasincompatibilidades, possa chegar à tese que sedefende. Segundo Fiorin:

A ironia (…) é um alargamento semântico,uma difusão sêmica. No eixo da extensão,um significado tem seu valor invertido,abarcando assim o sentido e seu oposto.Com isso, há uma intensificação maior aosentido, pois se finge dizer uma coisa paradizer exatamente o oposto. (Fiorin, 2011, p.69)7

A relação do ocidente com as demais civilizaçõesé de poder e de dominação, como se o mundo nãoocidentalizado fosse uma espécie de problema a serresolvido através da intervenção dessa civilizaçãodita “superior”. O objetivo dessa performance éressaltar esta postura racista do mundo ocidentalatravés da ironia. A cultura europeia – tão comume cotidiana – aqui é distanciada do espectadorocidental quando este se depara com suasatividades diárias realizadas por aborígenes de umaterra recém-tocada pela civilização, isso acentua o

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quanto essa cultura é também “esquisita”, namedida em que é estranhada por outros povos.

O Orientalismo nunca está muito longe doque chama[-se] “a idéia de Europa”, umanoção coletiva que identifica a “nós”europeus contra todos “aqueles” não-europeus, e pode-se argumentar que oprincipal componente da cultura européiaé precisamente o que tornou hegemônicaessa cultura, dentro e fora da Europa: aidéia de uma identidade européia superior atodos os povos e culturas não-europeus.(Said, 2007, p. 34)8

O mundo recebe as culturas não ocidentais porum crivo eurocêntrico que converte esses povos emestereótipos excêntricos. Em vez de compreenderque as sociedades se desenvolvem sob estruturas depensamento distintas, o ocidental tende a condenaro que não alcança, como se houvesse um padrão aoqual todas as culturas deveriam estar submetidas.Esse fenômeno pode ser percebido por meio daobservação, por exemplo, do materialcinematográfico considerado “cultura de massa”,distribuído pela indústria americana, cujadisseminação e aceite abrange o globo quase quepor completo. As imitações grosseiras de outrasetnias pela televisão brasileira também servem comoexemplo do alcance de influência cultural desteeurocentrismo no âmbito do entretenimento.

O próprio povo afro-americano, embora ativo naformação cultural dos Estados Unidos, foi umgrupo social para o qual durante muitos anos foramdelegadas funções secundárias no cinema ou, emoutros casos, papéis cuja etnia do personagem éfundamental à narrativa. São filmes nos quais ospersonagens protagonistas devem necessariamenteser interpretados por atores negros como, porexemplo, o filme “Doze anos de escravidão”, queestreou em 2013 e foi dirigido por Steve McQueen;ou o drama político “O Presidente Negro” dirigido porJoseph Sargent em 1972; ou “Faça a Coisa Certa”,um filme dirigido por Spike Lee que estreou em1989, dentre outros. Em contrapartida, aos brancosdesde sempre coube a possibilidade de ser tudo, e,como exemplo disso, podem ser citadas diversasproduções hollywoodianas nas quais personagens deetnia árabe ou africana são interpretados poramericanos descendentes de europeus.

É caso do filme “Êxodo: Deuses e Reis”, dirigidopor Ridley Scott e inspirado em uma narrativabíblica. A produção, que estreou em 2014, tem porbase os livros antigos provenientes da culturajudaica e traz uma releitura da trajetória de Moisés,interpretado pelo ator Christian Bale (ex-Batman),que lidera os hebreus durante o Êxodo no Egito. Asingularidade dessa produção que aqui serádestacada é a escolha do elenco principal, pois eletodo é composto por homens e mulheres deascendência europeia, mesmo sabendo-se há muito

tempo que isso seria pouco provável e, muito pelocontrário, estudos antropológicos tendem a sugerir ooposto9 (cf. Figura 2 e 3).

Outro exemplo de deturpação cultural é oclássico de Steven Spielberg e George Lucas,“Indiana Jones e o Templo da Perdição”. Aqui, aÍndia aparece como uma civilização em completamiséria e assombrada por um grupo de Tuguesadoradores da deusa hindu Kali, que, liderados porum sumo sacerdote sanguinário, cultuam magianegra, rituais de sacrifício humano e praticamescravidão infantil. Elementos de “adoração aoDiabo”, provenientes da cultura cristã, assim comoa falsa retratação da dieta hindu (e.g. a cena docérebro de macaco, abaixo) também aparecem nessacontroversa releitura da Índia e do hinduísmo (cf.Figura 4 e 5).

Mas esses são apenas dois dos muitos filmesdentro de uma longa tradição cinematográfica deperverter culturas não ocidentais. Durante muitotempo, vários filmes debateram questões raciais eetnológicas, mas mesmo assim, eram estas própriasas poucas produções onde se podia ver umprotagonismo etnologicamente heterogêneo dentrodo universo mainstream. Embora tantodescendentes de africanos quanto de hispânicose de povos asiáticos já componham uma parcelasignificativa da população dos EUA, essaapropriação estereotipada e implausível das culturasestrangeiras ainda é aceita e consumida pelopúblico; não por seu aspecto cômico desencadeadopelo abalo das estruturas lógicas, mas como idealartístico e cultural.

O poder de narrar, ou de impedir que seformem e surjam outras narrativas, émuito importante para a cultura e oimperialismo, e constitui uma das principaisconexões entre ambos. Mais importante, asgrandiosas narrativas de emancipação eesclarecimento mobilizaram povos do mundocolonial para que se erguessem e acabassemcom a sujeição imperial; nesse processo,muitos europeus e americanos tambémforam instigados por essas histórias e seusrespectivos protagonistas, e também eleslutaram por novas narrativas de igualdade esolidariedade humana. (Said, 2011 p. 8)10

A compreensão que o ocidental tem dos povosdistribuídos sobre o globo desenvolveu-se ancoradano conceito de superioridade racial, imposto atravésda dominação das culturas ditas “inferiores”. Aperformance “Two Undiscovered Amerindians”aborda de maneira irônica o olhar eurocêntrico queé lançado sobre o mundo, resquício da ideiacolonialista de que era preciso levar o “progresso”aos povos ditos bárbaros e primitivos e empregarviolência por meio do castigo, da morte ou doaçoitamento na medida em que oferecessemresistência à dominação.

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Os “Guatinauis” representados por Coco Fusco eGuillermo Gomez-Peña estão dentro da sociedadeocidental moderna, são os descendentes dos queforam engaiolados nos zoológicos do passado.Assim como o americano e o europeu, muitosdeles usam tênis de cano alto, assistem televisão ebebem Coca-cola, vivem nas mesmas cidades ebairros e frequentam os mesmos ambientesmodernos e civilizados que europeus e americanos,no entanto ainda lutam contra resquícios de umpensamento regressista de mais de quinhentosanos. Durante esse ato performático, portanto, foipossível engaiolá-los e exibi-los diante do públicocomo prova empírica de sua existência, sendopossível, então, transformá-los em objeto de análisee reflexão do racismo e das ideias coloniais, queadvindas do conceito de supremacia racial aindapermeiam a sociedade contemporânea.

Ao finalizar esta análise, é possível elencaralguns fenômenos comuns a todas as performancesanalisadas até agora, sendo o primeiro deles umtraço semântico inerente à arte performática, adespersonalização. O espectador deixa de identificaro performer unicamente como o indivíduo original(Guillermo Gomez-Peña e Coco Fusco), mas tambémnão consegue associá-lo a nenhum sujeitoenunciador particular pois eles tornam-se parteda obra, nesse caso, Guillermo Gomez-Peña e CocoFusco são “um casal de guaitinauis” e essainformação é suficiente para que o público possafruir de uma obra como essa. Nenhum delestinha um nome ou qualquer maneira de seidentificarem ou se diferenciarem (além do gênerosexual), eram apenas guatinaui-macho e guatinaui-fêmea e tornaram-se tão objetos quanto as demaispeças do museu.

Esse traço semântico despersonalização parecepertencer à essência da própria performance.Analisando outros exemplos de atos performáticospode-se observar a recorrência desse traço, umexemplo é a performance “Rape Scene” realizadapela artista Ana Mendieta, na cidade de Iowa em1973. Ela deixou entreaberta a porta de seuapartamento e amarrou-se a uma mesa, nua dacintura para baixo e suja com sangue. Nesse casotambém houve apenas um sujeito enunciadorfeminino despersonalizado compondo a cena de umcrime, ou seja, a artista tornou-se o próprio ato.

Outro exemplo é a performance “First Woman atthe Moon” de Aleksandra Mir, realizada emcomemoração do aniversário de 30 anos do pousoda nave americana Apollo 11 na Lua. Moradores dosmunicípios de Belsen e Beverwijk, no Norte daHolanda se voluntariaram ao longo do dia criandouma paisagem lunar na areia da praia para que Mircaminhasse sobre ela e pudesse realizar o primeiropouso feminino na Lua. Nessa performance tambémnão existem personagens, mas apenas um sujeitoenunciador feminino despersonalizado caminhado

sobre superfície lunar; pouco importa sua históriaou nome.

Outro fenômeno comum às três obras analisadasé o inacabamento da obra. Diferentemente de umquadro ou de uma peça de teatro que pressupõesua finalização antes de vir a público, aperformance é um eterno work in progress, cujaexistência se sustenta durante a interação com seusespectadores. Uma escultura, uma peça de teatro,um filme realizam-se enquanto arte somente napresença do público, mas existemindependentemente da existência dele, já aperformance só acontece quando o espectador éarrebatado para dentro da obra e passa a compô-la.

No caso “Two Undiscovered Amerindians” deGuillermo Gómez-Peña e Coco Fusco, os artistaspassaram-se por parte do acervo do museu, os doisinteragiam diretamente com os visitantes, quemuitas vezes nem compreendiam que se tratava deuma performance.

Os espectadores procuravam informar-se sobreos índios guatinauis como faziam com os demaisobjetos em exposição, além disso tiravam fotos epagavam para que Fusco dançasse, interagindodiretamente com a obra. Mesmo independente dessainteração, a ação do sujeito enunciadordespersonalizado dependia da ação do público evice-versa, ou seja, mesmo havendo narrativas pré-estabelecidas, o desenrolar das ações durante o atoperformático é decisão direta do público.

Esse fenômeno também se repete nas demaisperformances já citadas aqui. Em “First Woman atthe Moon”, a obra sustenta-se pelo trabalho dospróprios espectadores, a performance é a construçãodo cenário lunar e a interação da comunidade localcom o evento ao longo do dia e não sua finalização, oque tirou o “público” da confortável posição deobservador de uma obra de arte e o colocou em meioa ação, não mais apenas como espectadores, mascomo parte da obra.

No outro exemplo, “Rape Scene”, de AnaMendieta, a artista arrebatava o público para dentrode uma cena de estupro, ele quisesse ou não vê-la,era pego desprevenido e sem qualquer aviso prévio,tornava-se um estuprador diante do crime oualguém que se surpreende com o vislumbre de talcena. Cada espectador presente torna-seimediatamente parte da obra. Em todos os casos opúblico foi transportado para a ação, muitas vezes,sem que soubesse.

ConclusãoOs três atos performáticos citados aqui já

possuem mais de um aspecto congruente por meiodo qual é possível agrupá-los na mesma categoria.Há, porém, ainda um terceiro fator que os unaenquanto linguagem, um terceiro componenteintrínseco de toda e qualquer performance: a

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performance não constrói um novo “universo”,mas faz uso daquele que já está lá, dada aarbitrariedade do signo conforme definida pelolinguista Ferdinand de Saussure. Ela está inseridanum cenário cotidiano e aproveita-se de um sistemaque já existe antes dela. Nesse caso, os artistashispano-americanos Coco Fusco e Guillermo Gomez-Peña não construíram um novo universo, masassumiram o museu enquanto parte daperformance, aproveitando-se da linguagemcaracterística do museu e do ethos de autoridadedessa instituição para criar uma imagem literalda maneira como a sua própria etnia foiinserida na história do mundo.

O mesmo fenômeno acontece nas demaisperformances citadas nesse artigo, no caso de“First Woman at the Moon”, Mir não constrói umcenário lunar, mas assume a praia como parte daperformance, ou seja, não é a Lua, mas o signo“praia” sendo convertido em signo “Lua” pelo própriopúblico, além do desencadeamento, a figura delinguagem gerada por essa estrutura, a artista usado aniversário de um evento que simboliza otriunfo do capitalismo americano para criar umaestrutura socialista sem recursos financeiros,sustentada por meio de trabalho voluntário dacomunidade local e administrada por uma mulher.E novamente em “Rape Scene”, performance na qualAna Mendieta, em protesto contra o assassinato eestupro de uma colega dentro da universidade,utiliza seu apartamento, convertendo-o em cena docrime, para dar a amigos e professores a visãochocante do estuprador.

Como em “Two Undiscovered Amerindians”, odiscurso da performance tem sido frequentementeum discurso de militância e luta – tema lugar-comum na arte teatral – mas diferentemente dadoutrinação declamatória do teatro politiquementengagé, a performance opera verdadeiramente porsua força visual, plástica, sonora e sinestésica.Todavia, a propriedade que a difere das demaislinguagens artísticas é o poder inserir-se em umsistema ao mesmo tempo em que faz dele metáforapara o próprio discurso, o que torna a performanceuma linguagem artística com o poder de manipulara vida fazendo dela matéria-prima para sua obra.

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Maria Vitória Laurindo Siviero

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Dados para indexação em língua estrangeira

Siviero, Maria Vitória Laurindo.A semiotic study of The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey.

Estudos Semióticos, vol. 12, n. 1 (2016)issn 1980-4016

Abstract: This article discusses performance as an artistic manifestation. Facing the challenge of making thegeneral characteristics of this genre more precise, I made use of semiotics as the main tool to analyze aperformatic act and compare it to two works of the same nature, in order to highlight the existence of recurringphenomena on different cases. Through Greimasian semiotics analysis, a study of the performance "TheCouple in the Cage: A Guatinaui Odyssey", conducted by the Latin American artists Guillermo Gomes-Penaand Coco Fusco was made. During the act, the artists locked themselves in a cage and spent three daysmaking part of the expositions in museums in Europe, USA and Mexico. This performance was compared to"Rape Scene" (1973), by Ana Mendieta and "First Woman at the Moon" (1999), by Aleksandra Mir; being one ofthe main objectives of this investigation the gathering of elements which are common to all works, enabling amore precise observation of these phenomena in order to demonstrate that these works have aspects throughwhich it is possible to group then under the category of "performance", for this language is different from otherartistic manifestations (such as music, theater, painting, etc.) and guarantees its autonomy via a series ofcharacteristics which belong strictly to the genre..

Keywords: Performance art; Art; Semiotics.

Como citar este artigoSiviero, Maria Vitória Laurindo. Um estudo semiótico de

The Couple in the Cage: A Guatinaui Odyssey.Estudos Semióticos [on-line]. Disponível em: ( http://www.revistas.usp.br/esse ).

Editores responsáveis: Ivã Carlos Lopes e José Américo Bezerra Saraiva.Volume 12, Número 1, São Paulo, Julho de 2016, p. 67-73.

DOI: 10.11606/issn.1980-4016.esse.2016.120538.Acesso em “dia/mês/ano”.

Data de recebimento: 13/01/2016Data de aprovação: 28/05/2016

Anexos

Figura 1

Figura 2

Figura 3

Figura 4

Figura 5