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Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino,
na Pesquisa e na Extensão – Região Sul
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O conhecimento disciplinar do Design e suas contribuições para a teoria
interdisciplinar
Thiago Reginaldo Universidade Federal de Santa Catarina – [email protected]
Maria José Baldessar Universidade Federal de Santa Catarina - [email protected]
Eixo temático: Conhecimento Interdisciplinar
Resumo
No campo do Design existe a contribuição de diversas áreas do conhecimento durante a atividade projetual que o
caracteriza como disciplinar e interdisciplinar. No entanto, a fundamentação teórica na área do Design apresenta
algumas discussões divergentes que suscitam reflexões teóricas. Este artigo tem por objetivo apresentar teorias do
conhecimento disciplinar do Design para a constituição da sua interdisciplinaridade a partir de conceitos, teorias, e do
saber disciplinar e interdisciplinar de Design. Para tanto, foi feita uma revisão bibliográfica a partir de uma busca
sistemática em bases de dados científicos e livros especializados em Design. Conclui-se que para um saber
interdisciplinar de Design é preciso que haja uma base sólida e teórica da disciplina de Design. Na disciplina de
Design seu objeto de estudo específico é “forma e significado”; sua atividade é a “informação”, composta e
apresentada como projeto, e sua finalidade é o “produto”. Este produto pode ser um “artefato ou objeto experiente”.
Palavras-chave: Design. Teoria do Design. Conhecimento. Disciplina. Interdisciplinaridade.
Abstract
In the field of Design there is a contribution of different areas of knowledge during the design activity that
characterizes it as disciplinary and interdisciplinary. However, the theoretical foundations in the area of Design
presents some discussion of very divergent theoretical reflections. This article aims to present theories of disciplinary
knowledge Design for the constitution of its interdisciplinarity from concepts, theories, and disciplinary and
interdisciplinary design. Therefore, we performed a literature review from a systematic search in databases and
scientific books specialized in Design. We conclude that for an interdisciplinary knowledge of Design there must be a
solid foundation and theoretical discipline of Design. Design in the discipline of their object of study is specific "form
and meaning"; their activity is "information", composed and presented as a project, and its purpose is the "product".
This product can be an "artifact or object experienced."
Keywords: Design. Design Theory. Knowledge. Discipline. Interdisciplinarity.
1. Apresentação do tema
No campo do Design existe a contribuição de diversas áreas de conhecimento na elaboração de seus
projetos, assim como na formação teórica e prática do designer. Existem diversos conceitos agregados à
palavra design como: industrial, gráfico, de produto, de interiores, de moda, de animação, de games ou
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simplesmente “Design”. O currículo de formação desses profissionais se embasa em teorias do Design e
práticas de projetos tematizadas em relação à área de atuação. No entanto, nos limites da teoria disciplinar e
interdisciplinar do Design acontecem certas divergências.
Para compreender a interdisciplinaridade do Design é necessário conhecer o Design como disciplina,
e para isso, necessita-se de um corpo teórico e de conhecimento bem fundamentado. Os aspectos de uma
teoria envolvem conceitos gerais e focais da disciplina, e as relações que se estabelecem para o saber
interdisciplinar. Visto tais exigências teóricas, este artigo pretende contribuir para a discussão e
esclarecimento da teoria do Design disciplinar para a interdisciplinaridade. Para tanto, foi feita uma revisão
bibliográfica a partir de uma busca sistemática com alguns estudiosos da área do Design. O objetivo é
determinar pontos de vista teóricos do conhecimento disciplinar do Design para a constituição da sua
interdisciplinaridade a partir da seguinte lógica textual: conceitos de Design, teorias de Design, saber
disciplinar e interdisciplinar de Design. O eixo temático escolhido para o simpósio foi o conhecimento
interdisciplinar devido ao fato do artigo apresentar diferentes manifestações da teoria disciplinar e
interdisciplinar no campo do Design.
2. Procedimentos metodológicos
A pesquisa realizada neste artigo é do tipo exploratório, de técnica bibliográfica e caracterizada por
utilizar a busca sistemática. Essas técnicas de pesquisa foram feitas para eleger os artigos a serem discutidos
por um passo criterioso de escolha para posterior discussão em uma abordagem qualitativa. O tipo
exploratório tem por objetivo dar maior familiaridade ao problema com vistas a torná-lo mais explícito ou
construir hipóteses e aprimorar ideias ou descoberta de intuições com planejamento bastante flexível (GIL,
1991). O procedimento técnico bibliográfico foi elaborado a partir de material já publicado, constituído
principalmente de livros, artigos de periódicos e revisões disponibilizadas na Internet e biblioteca (GIL,
1991). A busca sistemática possibilitou, como uma das etapas da revisão sistemática, aplicar métodos
explícitos e reprodutíveis a partir de uma visão geral de estudos primários. Os métodos explícitos ajudam a
limitar o viés e rejeitar estudos, as conclusões são mais confiáveis e precisas, grandes quantidades de
informações podem ser assimiladas por profissionais e demais pesquisadores, os resultados da pesquisa
podem estabelecer uma generalização e consistência de informações e identificar inconsistências
(GREENHALGH, 1997).
Foi conduzida uma pesquisa da literatura publicada de 1960 até 28 de setembro de 2013 nas bases de
dados on-line e na biblioteca foi feita uma consulta no acervo disponível. Foram usadas as seguintes bases
de dados: Pergamum (UFSC), ScienceDirect e Scopus. A pesquisa foi limitada a livros no Pergamun e a
artigos ou revisões na Scopus e ScienceDirect com a seguinte palavra chave nos títulos: “design theory”.
Foram encontrados artigos em inglês e obras literárias em inglês e português. Os artigos das bases de dados
foram posteriormente reduzidos e se excluíram os que discutiam outros assuntos que não fossem Design ou
não fizessem parte do escopo desta pesquisa. Isso resultou em 19 artigos num total dos 215 encontrados e 9
obras literárias. Os 19 artigos encontrados são do período entre 1981 e 2012 e os 9 livros do período entre
1997 e 2011. Utilizou-se uma abordagem qualitativa de discussão da temática da teoria do design sobre os
seus aspectos de conceito, teoria, conhecimento, disciplina e interdisciplinaridade.
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3. Revisão Bibliográfica
Trata-se de uma pesquisa sobre o conhecimento disciplinar e interdisciplinar do Design, que aqui é
compreendido como um campo de estudos para aplicação social. Isso é justificado pelo fato da área de
Desenho Industrial, que abriga os estudos em Design, ser apresentada dentro da grande área de Ciências
Sociais Aplicadas.
O campo inicial para o estudo foram as bases de dados internacionais da Scopus, ScienceDirect e o
acervo de obras literárias disponível na biblioteca universitária da Universidade Federal de Santa Catarina
sobre o tema “teoria do design”. Portanto, esta pesquisa se fundamenta no aporte teórico de autores e
estudiosos da área para uma fundamentação inicial do Design como disciplina e indicar caminhos e
possibilidades no trabalho interdisciplinar. Este capítulo segue estruturado na seguinte ordem: divergências
na conceituação de Design; conceitos de Design; teoria da disciplina do Design; Design interdisciplinar; e
por fim as considerações finais dos autores.
3.1 Divergências na conceituação de Design
A área de Design surge como atividade que acumula o maior número de tentativas de conceituação.
Passado quase um século de seu surgimento, a atividade se mantém polêmica e pouco conhecida, com
definições contraditórias, excludentes ou antagônicas (ESCOREL 2000).
Arte, prática de projeto, matéria tecnológica ou científica, campo de confluência interdisciplinar,
atividade de apoio às técnicas de marketing. O design tem sido isso tudo ora simultaneamente, ora
organizado em torno da predominância de um ou outro desses aspectos, dependendo do viés
intelectual de quem o aborde como terreno de reflexão (ESCOREL 2000, p.62).
Na década passada o conceito de design experimentou uma acentuada difusão e popularização, o que
pode ser considerado um fato positivo. No entanto, houve uma estranha limitação aos produtos de casa,
configurando-o como uma atividade de decoração de interiores. A opinião pública expressa um modismo
questionável, no qual Design é associado à ideia de complicado, de curta duração e de individualmente
rebuscado, como uma promessa de um glamour instantâneo (BONSIEPE, 1997).
No âmbito do senso comum, a tentativa de compreender Design evoca o preconceito de que sua
função se restringe à cosmética, limitando-se a agregar alguns traços decorativos aos projetos industriais ou
eletrônico-digitais, como um make-up. Design é relacionado ao desenho como projeto ou desígnio. Assim,
não é sinônimo de desenho, no sentido deturpado que relaciona a palavra ao estrito ato de rabiscar. Mas, na
opinião pública a atividade do design é estreitamente associada à capacidade física de desenhar (BONSIEPE
1997). Para Bonsiepe (2011, p. 18) o design se “distanciou cada vez mais da ideia de solução inteligente de
problemas e se aproximou do efêmero, da moda, do obsoletismo rápido, [...] da glamourização do mundo
dos objetos”.
O design é utilizado para diversas situações e com uma gama de significados que pode
aparentemente ser ilimitados (SCHNEIDER, 2010). De acordo com Escorel (2000), entre muitos conceitos
que pretendem configurar a área, está o que considera o Design sem um contorno ou terreno próprio e,
portanto, sem definição. Isso indica a atividade do design como um amontoado de saberes e aptidões
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emprestadas de áreas diversas, que utiliza um conjunto de modelos flexíveis e mutáveis, e se ajusta a
qualquer época e circunstância. Assim, haveria um “bom design” no arco e na flecha do índio, nos objetos
artesanais de séculos anteriores e, até mesmo, no caule de uma árvore.
Outra tentativa de definição está correlata a que design se insere no grupo de disciplinas
tecnológicas, pensando talvez, com isso, assegurá-lo da perigosa vizinhança com as formas de expressão
artística ligadas ao artesanato e ao pensamento plástico ocidental (ESCOREL, 2000).
Além das divergências na conceituação de “Design”, Villas-Boas (2003) assinala divergências na
própria compreensão do termo “design” e no entendimento do que seja o profissional denominado como
“designer”. Pois, essas são palavras amplamente usadas por aqueles que assim legitimam uma prática
profissional para qual não foram especificamente preparados. Isso esvazia e banaliza os termos em função
de sua popularização desregrada.
Diante dessas incertezas, Löbach (2001) adverte que o conceito de Design e sua aplicação dependem
do enfoque estabelecido por aquele que se dispõe discorrer sobre o tema, indicando sua origem e suas
consequências. Assim, a imprecisão no posicionamento do falante determina sua insegurança e as
perturbações no processo de conceituação, especialmente quando sua visão é comparada com outras
conceituações. Para Löbach (2001), é necessário, portanto, considerar cinco pontos distintos para se
pronunciar a respeito do tema:
1. O primeiro é determinado pelo “usuário”, que se utiliza pragmaticamente o que lhe
oferecido, considerando seus benefícios ou problemas sem pretender
compreender ou definir sobre o que está tratando;
2. O segundo é determinado pelo “fabricante”, que produz o que foi projetado pelo
designer, podendo conceituar Design como “o emprego econômico de meios
estéticos no desenvolvimento de produtos, de modo que estes atraiam a atenção
dos possíveis compradores, ao mesmo tempo em que otimizam os valores de
uso dos produtos comercializados” (LÖBACH 2001, p.12);
3. O terceiro é determinado pela “crítica”, representado pelo autor como o “crítico
marxista”, que considera o empresário como um explorador de seus
empregados, que ainda são obrigados a comprar o produto de seu próprio
trabalho. Para a crítica, “o design é uma droga milagrosa para aumentar as
vendas, um refinamento do capitalismo, uma bela aparência que encobre o
baixo valor utilitário de uma mercadoria para elevar seu valor de troca”
(LÖBACH 2001, p.13);
4. O quarto é determinado pelo próprio “designer” projetista do produto, que se
posiciona entre os interesses do empresário e dos usuários. Para esse, “Design
é um processo de resolução de problemas, atendendo às relações do homem
com seu ambiente técnico” (LÖBACH 2001, p.14);
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5. O quinto é determinado pela “defesa”, representada pela figura do “designer advogado
dos usuários que, geralmente, não podem expressar seus interesses e raramente
participam dos processos de planejamento de Design, que é considerado como
“processo de adaptação do ambiente „artificial‟ às necessidades físicas e
psíquicas dos homens da sociedade” (LÖBACH 2001, p.14).
O designer e sua atividade, portanto, são confrontados por diferentes interesses e abordagens, de
acordo com a postura de quem usufrui ou interpreta sua ação. Para Löbach (2001) o designer deveria atuar
constantemente na defesa dos interesses dos usuários. Aliás, essa foi a postura original que justificou o
advento e o desenvolvimento da área de Design que, desde o início se caracterizou por uma postura moral.
Todavia, o cliente imediato do designer é o fabricante, sendo que o usuário é o receptor final dos produtos
projetados. Assim, os compromissos com o contratante produtor o impedem de praticar livremente suas
atividades de Design de maneira plenamente consequente com o campo moral que deve privilegiar o
interesse dos usuários. Isso impõe ao Design uma relação entre design e sociedade que se estabelece de
diferentes formas e pontos de vista.
Na compreensão das relações entre o design e a sociedade é crucial que se entenda o que se fala
quando se usa a palavra „design‟ afirma Dilnot (1982). Para o autor muitas vezes o termo é usado não para
indicar a atividade de design, mas tanto os resultados dessa atividade (produtos projetados) ou os problemas
que originam esta atividade, ou ambos. Mas considerado dessa forma o processo de design desaparece da
vista conceitual. Esta falta de referência para projetar a atividade, como tal, susceptível de criar
ambiguidades em formulações como o design-e-sociedade, como o que se entende em uma formulação
específica do termo. A importância do projeto só pode ser compreendida, argumenta-se, concentrando-se em
atividade de design. (DILNOT, 1982)
Dentro dessa confusão conceitual Love (2000) sintetiza as divergências presentes nas teorias de
pesquisa em design e aponta quatro críticas a serem feitas: existe uma quantidade substancial de confusão
com respeito às bases subjacentes de muitas teorias, conceitos e métodos; no desenvolvimento e validação
de aspectos teóricos do estudo de design muitos escritores estão injustificadamente misturando conceitos
extraídos de uma variedade de fontes; existe uma multiplicidade desnecessária de teorias de design e
conceitos; e a terminologia de pesquisa em design tornou-se desnecessária e inutilmente confusa e imprecisa
por força dos pontos acima. A partir dessa divergência teórica discutida aqui serão apresentados alguns
conceitos de Design para verificar quais os pontos teóricos são comuns e quais divergem.
3.2 Conceitos de Design
De acordo com Azevedo (1998, p. 9), a palavra “design”, cuja origem é latina, adquire seu sentido
atual a partir da interpretação que “vem do inglês e que dizer projetar, compor visualmente ou colocar em
prática no plano intencional”. Sendo que “a ferramenta do designer hoje é o próprio ato de gerar
informação” (AZEVEDO, 1998, p. 11).
Todos os seres humanos são considerados designers e o design faz parte de todas as atividades
humanas (PAPANEK, 2005; WILLEM, 1991). “Design é o esforço consciente e intuitivo para impor a
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ordem significativa” (PAPANECK, 2005, p. 4). Para tanto alguns autores o consideram uma atividade
humana intencional (WILLEW, 1991; GALLE, 2008; ROSEMAN & GREGO, 1998). Nela os processos
cognitivos são usados para transformar as necessidades humanas e intenções em um objeto incorporado, ou
seja, um artefato (GALLE, 2008; LOVE, 2002; ROSEMAN & GREGO, 1998; FARRELL & HOOKER,
2012). Assim, os seres humanos operam em um ambiente sócio-cultural, enquanto artefatos fazem parte de
um ambiente artificial ou techno-físico, os dois sendo integrados em um ambiente sócio-técnico. Design é
sobre a transição dos conceitos do ambiente sócio-cultural para a descrição dos objetos técnicos
(ROSEMAN & GREGO, 1998).
Para Bürdek (2010) a atividade de Design é relacionada aos conceitos de criatividade, fantasia
cerebral, senso de invenção e de inovação técnica. Assim, gera expectativas no sentido de ser um ato
cerebral. Como exemplo desse pensamento pode ser citado à teoria de Evans (2003), pois, essa afirma que
design é descoberta de ideias existentes, porém ainda não vistas, as ideias são então, a base do design. Isso
faz sentido a partir do momento em que se pensa o design como produção de teorias e ideias que são
verdadeiramente criativas e que faz o sujeito (designer) ser diferente das máquinas (O‟CATHÁIN, 1982).
Contudo, a ideia de criatividade por si só não assegura base ao design, precisa-se de sistematização. Em um
pensamento que reelabora o conceito pensamento criativo e ideativo segue a definição de Schneider (2010,
p.197) que considera o design como:
Design é a visualização criativa e sistemática dos processos de interação e das mensagens de
diferentes atores sociais; é a visualização criativa e sistemática de diferentes funções de objetos de
uso e sua adequação às necessidades dos usuários ou aos efeitos sobre os receptores.
Assim percebe-se uma sistematização nas atividades de Design em conjunto com a criatividade na
interação com objetos e mensagens. No entanto, além desses pontos Bürdek (2010) considera o contexto de
desenvolvimento econômico, tecnológico e cultural, os fundamentos históricos, as condições de produção
técnica, os fatores ergonômicos ou ecológicos e as exigências artístico-experimentais. Ao lidar com design,
é necessário refletir acerca das condições que contextualizam o projeto, considerando-as nos projetos e
produtos (BÜRDEK 2010).
De acordo com Löbach (2001, p.16) “o design é traduzido por nós como configuração (gestaltung)”.
A ideia de “configuração” corrobora o pressuposto que orienta os autores dessa pesquisa, o qual propõe que
o objeto de estudo específico de Design é a “forma” (gestalt). Isso propõe ao Design os conhecimentos e as
atividades desenvolvidas a partir do estudo, da utilização, da produção, da adaptação, da representação e da
significação das formas.
Na explicação da configuração Löbach (2001) afirma que essa pode ser descrita como materialização
de uma ideia, é o processo já descrito de informação ou formalização da matéria. Como os conceitos
“configuração” e “design” são muito amplos, quando ambos são relacionados, a definição do objeto a ser
configurado permanece em aberto. Assim, sua especificidade depende da relação entre o conceito “design” e
um outro conceito, que lhe tenha alguma ascendência, caracterizando o objeto de design como, por exemplo,
“Design Ambiental”:
Design ambiental significa, como se sabe, configuração do meio ambiente. O conceito do ambiente se une ao do design. O resultado, porém, continua sendo um conceito geral, que se desdobra em vários
tipos de configurações do ambiente. O design industrial [...] é o conceito geral para as diversas
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especialidades do design compreendidas na configuração do meio ambiente. O design industrial é,
portanto, uma especialidade da configuração do meio ambiente (LÖBACH 2001, p.17).
Desta maneira se abrem diversas possibilidades de se trabalhar o design e justifica as diferentes
denominações presentes na academia e no mercado. Schneider (2010) cita algumas dessas possibilidades:
Design Industrial, Design Gráfico, Design de Produto, Design de Interiores, Design de Serviços, Design
Ambiental, Ecodesign, Design de Interação, entre outros.
Outro conceito de design é proposto por Bonsiepe (1997) com a ideia de que seu domínio é a
“interface”, um sistema que faz interagir o usuário e o artefato em função de uma tarefa. Isso estabelece uma
tríade, porque há um usuário que pretende realizar uma tarefa; há também a tarefa proposta e, ainda, uma
ferramenta ou artefato para efetivar sua execução. Assim, o processo de mediação entre essas três instâncias
é denominado interface. As características do produto resultante são previstas e determinadas na interação
entre o caráter do artefato, da tarefa e do usuário. A interface é representada no “diagrama ontológico do
design” (Fig. 1).
Figura 1 – Diagrama ontológico do design de Bonsiepe (1997, p.10).
O conceito de “interface” privilegia a ideia de que a função característica do design é mediar de
maneira ergonômica e eficiente o procedimento, o engenho ou a maquinaria e o usuário. Este conceito se
assemelha bastante com o de Ullman (1991) que apresenta três focos diferentes dentro do fenômeno do
design: em primeiro lugar, elas podem ser formuladas para explicar o objeto concebido em si, ou seja, a
forma como o objeto passa a existir e se transforma em um produto manufaturado final; em segundo lugar,
podem ser formulados teorias para explicar como o criador (es) transforma um problema mal definido em
um produto totalmente descrito; e finalmente, as teorias podem ser desenvolvidas para tentar explicar o
processo de design, a interação do artefato e as pessoas e/ou computadores no ambiente do projeto.
A palavra artefato presente nas conceituações anteriores é definida por Galle (2008) que afirma que
design são todos os projetos que elaboram cursos de ação que visam à produção de um artefato. Artefato
aqui é compreendido como um objeto que tenha sido intencionalmente feito ou produzido para certo
propósito. Os artefatos podem incluir produtos não materiais (software, organizações e processos) (Ibid.). O
objeto no design é visto como experiente, ou seja, é mais que a experiência do objeto (REDSTRÖM, 2006).
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Compreendido o que os autores explicam como conceito de interface na relação mediada sujeito-
artefato aparece mais um significado que decorre dessas relações – o designing. Trata-se de um conceito que
é a chave no conhecimento do design (REDSTRÖM, 2006; LOVE, 2002) e que coloca o designer nessa
relação de mediação da interface. Designing é compreendido como “a atividade humana de não-rotina que é
um aspecto essencial do processo que conduz para o design de um artefato” (LOVE, 2002, p. 359). Ou seja,
é a atividade humana conduzindo a produção de um design. A partir dessa perspectiva, conclui-se que um
'designer' é alguém que é, tenha sido, ou irá fazer o designing: alguém que cria designs. Os conceitos de
design e designing são fundamentais para reduzir a ambiguidade e inconsistência e permitir cumprir seu
papel epistemológico e ontológico na decisão da teoria do design (Ibid).
Outro conceito que aparece na literatura de design é o de Escorel (2000, p.14) que assinala: “Design
é uma linguagem”. Assim, Bonsiepe (1997) propõe Design como mídia e Escorel (2000) como linguagem,
assinalando que o cinema e a fotografia, manifestam-se como linguagens da era industrial. Deste modo, a
linguagem do design também surgiu com a indústria na Revolução Industrial, visando à reprodução seriada
de um original. Como toda linguagem, Design apresenta propriedades combinatórias e associativas, sendo
que as primeiras estão relacionadas aos aspectos formais (expressivos ou estéticos) e a segunda aos aspectos
simbólicos do produto, o qual é decorrente da combinação desses dois aspectos.
Para Escorel (2000), o amplo campo de Design é constituído por duas áreas com características
lingüísticas diferentes: (1) a área de Design de Produto e (2) a área de Design Gráfico. A área de produto
apresenta uma organização mais uniforme, aproximando-se da linguagem fotográfica. A área gráfica
apresenta uma organização mais acidentada, assemelhando-se ao cinema:
Os recursos expressivos do designer de produto se restringem à invenção e à articulação de volumes
e de suas respectivas conexões, no âmbito do objeto e de sua interface com o ser humano (...) não
altera a essência eminentemente uniforme e homogênea da linguagem do design de produto. Já o
designer gráfico, como o cineasta, deve partir do princípio de que para organizar e dar corpo a seu
discurso deverá conjugar linguagens originalmente independentes entre si como fotografia, a tipografia, a ilustração. O que, certamente, configura um terreno de base bastante menos regular
(ESCOREL 2000, p. 65).
Escorel (2000) defende que as duas áreas, de produto e gráfico, exprimem sua linguagem através do
projeto, uma vez que requerem capacidade de abrangência e de coordenação dos diferentes aspectos
implicados no processo do qual resulta o produto (ESCOREL 2000). Observa-se, contudo, que atualmente a
área do Design extrapola os campos do produto e gráfico que foram no início deste século e no final do
século passado as áreas dominantes do Design que sucederam o Design Industrial.
Apresentadas as diferentes conceituações do Design outro ponto dessa pesquisa a ser definido é
como acontece à estruturação da teoria do Design. O conceito serve como um ponto inicial para se
identificar do que se fala e aonde se pretende chegar e tem estrita relação com a teoria da disciplina do
Design.
3. 3 Teoria da disciplina do design
As ciências socialmente aplicáveis, como as Ciências Sociais que abrigam a área de Design,
caracterizam-se por apresentar um corpus teórico e um corpus de pesquisa. Isso configura um conjunto de
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teorias ou conceitos e um conjunto de fenômenos materiais, os quais são primeiramente observados ou
produzidos. A relação entre os dois conjuntos ou corpus é mediada pelo método científico adotado, de
acordo com a razão metodológica considerada.
A área de Design é descendente direta da Ciência positiva, entretanto, o método científico foi
adaptado ao processo de projetação dos produtos. Portanto, Design desenvolveu uma prática metódica e
sistemática e, continuamente, os representantes da área investem no aprimoramento e na criação de
metodologias. A área também se apropria de teorias de outras áreas do conhecimento para compor seu
corpus teórico. Todavia, há teorias que são consideradas características da área de Design. Além da
configuração especializada ou peculiar que uma área de aplicação como Design pode propor sobre as teorias
adotadas.
Para que o conhecimento sistemático ou científico apareça no design é preciso de teorias que
permitam questionar e aprender com o mundo que está em volta das pessoas (FRIEDMAN, 2003). Para
Bürdek (2010), teoria de Design se constrói a partir do campo de Ciências Humanas, para tanto, o Design
necessita desenvolver algo específico, com um corpo de conhecimento próprio em sua teoria. Corroborando
com as ideias de Bürdek para uma teoria de design que se separe de outras atividades Love (2002) elege
quatro pontos para que isso aconteça. O primeiro ponto é a identificação do termo design. Ele atualmente é
utilizado como verbo ou substantivo, advérbio ou adjetivo. O substantivo refere-se à representação ou plano,
o verbo à atividade humana que resulta em um „design‟ (substantivo). Quando utilizado como adjetivo ou
advérbio é feito com significado que reflete as diferentes formas de substantivo e verbo de forma acrítica,
para completar a designação de um objeto ou processo com a intenção de adicionar algo ao seu status. A
identificação de uma base conceitual nuclear constitui o segundo ponto-chave para o estabelecimento de
uma disciplina unificada e coerente de pesquisa e teoria para fazer relações com designing e design. A
definição de conceitos é o terceiro ponto fundamental para o desenvolvimento de um corpo unificado de
teoria. Exige, portanto, conhecimentos epistemológicos e conceitos e teorias bem definidos de modo a
distingui-los de diferentes teorias. Atualmente é difícil ou impossível de construir um corpo de teoria
interdisciplinar devido aos conceitos básicos ou definições “frouxas” que não conduzem a um discurso
analítico. O design/designing é considerado como diferente a partir de conceitos, teorias e atividades
associados com práticas específicas e disciplinas. Este é o quarto ponto chave para o desenvolvimento de
uma teoria transdisciplinar.
Na compreensão dessa teoria, no entanto, é preciso lembrar que além dos aspectos técnicos
científicos existem as influências históricas. A teoria afeta o design corrente através de sua história mais do
que de qualquer outro modo (BALJON, 2002). Assim, compreender a história do design deve ser o quadro
principal para os designers, e para que isso seja ilustrado aqui será apresentado um delineamento do
surgimento da teoria do design. De acordo com Bürdek (2010) a primeira tentativa de compreender a base
teórica da área de Design ocorreu no ano de 1977, durante o Fórum Congresso do IDZ de Berlim
(Alemanha). Considerando o proposto por Krauspe (1978), Bürdek (2010, p. 273) apresenta quatro linhas de
interesse que, naquele momento, orientaram a reflexão sobre teoria de Design:
1. Tornar transparente o processo de Design e obter métodos operacionais de projetação
(Metodologia de Projeto);
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2. Obter controle sobre a quantificação dos fenômenos visuais (Estética da Informação);
3. Desenvolver uma teoria crítica em Design (Fundamentação Político-Econômica);
4. Discutir o funcionalismo, visando um “funcionalismo ampliado” (Pragmática).
Este fato histórico serve como exemplo de como a teoria do design começou a ser delineada e
esclarece alguns pontos que são empregados até hoje na atividade de Design. Consciente da importância da
historicidade dos fatos deve-se lembrar de que esses agregam valor ao corpo de conhecimento do Design. A
teoria do Design também é conhecimento em Design.
Desenvolver a teoria em Design significa interagir com a teoria do Conhecimento, pois, a área de
Design emergiu sob os parâmetros de produção do conhecimento científico, considerando-se teoria e
metodologia, como esforços para aperfeiçoar métodos, regras e critérios próprios para que Design seja
pesquisado, avaliado e melhorado (BÜRDEK, 2010). Na teoria do conhecimento do design aparecem
algumas categorias de confusão, pois, por vezes se confunde o conhecimento tácito que é importante para
todas as áreas de atuação, com o conhecimento geral de design (FRIEDMAN, 2003). Isso está relacionado
com o fato da prática do design ser confundida com a pesquisa, uma vez que, em vez de desenvolver a teoria
com a prática por meio de articulação e investigação indutiva, alguns designers simplesmente argumentam
que a prática é a pesquisa e investigação com base na prática, que é em sim mesma, uma forma de
construção da teoria (Ibid).
Pela compreensão do conhecimento do Design começa a se estruturar aquilo que é tangível dentro da
área de atuação do designer, e então, se estabelece um corpus de conhecimento. Nesse conhecimento
construído historicamente ao longo do tempo, como observado até agora, as relações sociais foram
ganhando espaço em um mundo que passou do enfoque da máquina para o ser humano. Assim, a teoria do
design começou a percorrer os fatores humanos com mais força nos últimos tempos. Todavia, isso é somente
o início de um trabalho árduo de conhecimento das necessidades da sociedade.
A teoria do Design tem muito a percorrer para incorporar questões sociais, não só do ponto de vista
de ajudar os designers a navegar o complexo processo de compreender e integrar as necessidades de
sociedade em um design estruturado, mas também no que diz respeito à forma como os indivíduos e as
organizações colaboram e cooperam (WOOD, 2003). Dessa maneira o processo de comunicação é vital para
o projeto. Wood (2003) afirma que teorias que não abordam atividades no espaço de design são apenas
teorias parciais de design. Da mesma forma, as teorias em que a colaboração do elenco é mais competitiva
do que coordenada não conseguem explicar o poder de construções sociais no processo de design.
Para que a prática de design possa trazer mais contribuições para a sociedade ela precisa de uma
teoria. Friedman (2003) apresenta uma visão do design abrangente e traz uma importante colaboração na
relação entre a produção industrial e as necessidades sociais relacionadas com a teoria de Design. Muitas
pessoas no mundo de hoje vivem sob condições restritas em que as suas necessidades de alimentação,
vestuário, abrigo e conforto material não são totalmente satisfeitas. Quanto ao resto, a maioria das
necessidades só pode ser satisfeita pela produção industrial. Deste modo, o autor afirma que só quando
formos capazes de desenvolver uma prática industrial abrangente e sustentável em escala e escopo rentável
seremos capazes de atender suas necessidades. O Design nunca vai alcançar essa meta até que descanse em
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todas as três pernas da ciência, observação, teorização, e experimentação para classificar as teorias úteis do
resto. Para fazer isso, a prática de design e pesquisa em design exige teoria.
Não obstante apesar de toda essa teoria do conhecimento do Design e da presença dessa área na vida
cotidiana, percebe-se que o Design não é um fenômeno devidamente pesquisado. Diante disso, Bonsiepe
(1997) propõe sete caracterizações para Design, além do referencial da boa forma e das referências sócio-
pedagógicas.
1. Design pode se manifestar em qualquer área do conhecimento ou práxis humana,
sendo mais amplo que as disciplinas projetuais, incluindo a invenção de novas
práticas na vida cotidiana;
2. Design é voltado para o futuro;
3. Design é relacionado à inovação, como palavras que se superpõem mediadas pela
ética;
4. Design está particularmente ligado ao espaço retinal, mas não se limita a esse, porque
seu conjunto de tarefas inclui acoplar os artefatos ao corpo humano;
5. Design visa à ação efetiva, superando denominações como “forma”, “função” e
“estilo”, porque diz respeito a critérios de eficiência da ação e ao
comportamento social;
6. Design está linguisticamente ancorado no campo dos juízos;
7. Design é orientado à interação entre usuário e artefato, como domínio da interface.
Esses passos ajudam a caracterizar a atividade de projeto de design, no entanto enquanto ciência, de
acordo com o mundo da cognição, Bonsiepe (2011) aponta que ainda existem perspectivas diferentes da
atividade projetual e científica. O autor especula a possibilidade de que no futuro o ensino do projeto será
uma disciplina básica para todas as disciplinas científicas.
Farrell e Hooker (2012) observam ligações entre design e ciência, visto que, ambos utilizam
processos de design e estratégias de raciocínio para a produção de objetos artificiais, por isso colocam a
inquirir de novo sobre a natureza deste processo comum inteligente de resolução de problemas. No entanto,
alguns autores não consideram o design ciência e questionam a “ciência do design” (CROSS et al., 1982;
SARGENT, 1994). Cross et al. (1982) não concebem o design como ciência e sim como tecnologia. Para
eles há um paradoxo inerente a tal desejo desde design e ciência que são claramente tipos muito diferentes
de atividades. Além disso, afirmam que o conceito de "método científico" agora parece ser um caos
epistemológico. Por estas razões, as tentativas de método de modelo de design sobre o método científico
parecem equivocadas. Propõem então, que seria mais proveitoso considerar design como uma tecnologia,
em vez de ciência. Eles justificam isso porque a tecnologia é orientada para a ação ou soluções de problemas
definidos; utiliza diferentes tipos de conhecimento organizado, das quais o científico é um só, e depende do
conhecimento do ofício, design, organizacional e habilidade gerencial; muitas dessas atividades ocorrem em
ambiente organizacional.
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No entanto apesar de alguns autores questionarem o Design como ciência Bürdek (2010) apresenta
um caminho para estruturar a disciplina do design através ciência. Adotando as ideias de Maser (1972),
Bürdek (2010, p.282) relata três categorias sobre as quais uma ciência se caracteriza, são essas: (1) objetivo
(meta); (2) objeto (assunto), e (3) método (procedimento). Apesar de não ter a pretensão de ser Ciência,
Design pode se basear nessas categorias para configurar sua teoria e constituir seu caráter disciplinar (Ibid.,
2010).
Bürdek (Ibid., p.283) propõe (1) como “objetivo” da ciência de Design “o desenvolvimento de uma
linguagem profissional, quer dizer, formular conceitos e frases de tal forma que sejam válidos amplamente
para a disciplina”. (2) O “objeto” da ciência de Design “compreende as questões de forma e contexto ou de
forma e significado, que podem ser descritos com o conceito da função comunicativa” (Ibid, p.283). (3) O
“método” científico da ciência de Design “deve ser procurado no âmbito das ciências humanas, já que não se
pode descrever a essência comunicativa específica do design com a ajuda das ciências naturais ou com os
métodos formais das ciências” (Ibid., p.283).
Foi indicado que Design e outras áreas aplicadas do conhecimento desenvolvem um conjunto teórico
e um conjunto de práticas e produtos. Tradicionalmente, ciência é teoria e prática é Arte, a aplicação
metódica de Ciência ou teoria na Arte ou prática, caracteriza o que é denominado de Tecnologia. Por ser
teórica, Ciência ou teoria é descrita por símbolos matemáticos e linguísticos. Assim, Habermas (1985 apud
BÜRDEK, 2010, p. 283) afirma que a língua é a “chave da construção da teoria” com o qual se pode ter
melhor domínio das estruturas do mundo e da vida. Por meio da língua esclarece a verdade, que é um
aspecto que também diz respeito ao design. “A comunicação se desenvolve por meio de um processo
contínuo de troca, que se baseia sempre em novos “entendimentos” (convenções). Os produtos não falam
por si sós, eles são levados a falar por meio da linguagem” (BÜRDEK 2010, p.283).
Compreendido os conceitos da teoria de conhecimento do Design é possível agora começar a abarcar
as potencialidades da interdisciplinaridade da disciplina do Design.
3.4 Design interdisciplinar
Ao discutir a teoria de Design apresentam-se as diversas possibilidades de como ela pode ser
edificada, sob a perspectiva interdisciplinar, multidisciplinar ou transdisciplinar, entretanto, raramente se
cogita a possibilidade de ser também “disciplinar” (BÜRDEK, 2010). Para compreender como um corpo
interdisciplinar de teoria e conhecimento unificado e coerente é preciso compreender os limites de pesquisa
em design e das outras disciplinas (LOVE, 2002).
O fato de a teoria disciplinar do Design ser pouco ancorada pode ser justificado, segundo Bürdek
(2010), pelo fato dos desenvolvedores de teoria em Design ter pouca confiança sobre suas contribuições,
necessitando se apoiar em outras disciplinas. Assim, a contribuição de diversas disciplinas é muito
valorizada, indicando o Design como área interdisciplinar, sem haver a devida compilação das contribuições
teóricas da área do Design. Dessa maneira “o design sempre teve dificuldade em desenvolver algo
específico, em cuja base pudesse cooperar com outras disciplinas. Isto é incompreensível, já que a tão
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propalada interdisciplinaridade só pode existir quando as disciplinas individuais podem atuar em conjunto”
(BÜRDEK 2010, p.281).
A perspectiva interdisciplinar do Design é defendida por Villas-Boas (2003), que o considera como
uma área do conhecimento interdisciplinar em estreita ligação com as áreas de Comunicação Social, Artes
Plásticas e Arquitetura. Por outro lado, Escorel (2000) critica a posição interdisciplinar como insustentável.
Por exemplo, diante do caráter disciplinar da área de Cinema:
Basta lembrar o cinema, forma de expressão que justapõe sistemas de signos independentes entre si, conferindo-lhes nova natureza a partir da maneira particular como os aglutina e funde, fazendo-os
assumir uma realidade diferente daquela representada pelas unidades constitutivas iniciais. No
entanto, apesar desse somatório, o cinema não costuma ser visto como atividade multidisciplinar,
mas como campo perfeitamente identificável e coeso (ESCOREL 2000, p. 63).
Os sistemas de signos citados são: música, literatura, cenografia e figurinos que, no cinema são
inseridos em uma disciplina particular, diferenciando-se da música na sala de concerto, do texto literário no
livro, da cenografia no teatro e da vestimenta no desfile de moda. No filme, os signos se alteram por estarem
inseridos em um sistema particular, que é organizado como sistema disciplinar. A assertiva de Escorel faz
sentido à medida que o cinema apresenta uma mídia que congrega em si diferentes formas de comunicação
em um ambiente de representação fechado, as informações convergem para a produção cinematográfica. O
Design, por exemplo, aparece no cinema como parte constitutiva de suas composições no figurino, no
roteiro, efeitos especiais, mixagem de som, fotografia, entre outros. O fato de o Design permear atividades
como essa ou outras, não o desabilita como disciplina e possibilidade interdisciplinar. O Design apresenta
várias disciplinas que o constituem, num currículo universitário, por exemplo, as disciplinas de Criatividade,
História da Arte, Teoria da Cor, Metodologia de Projeto, Semiótica, Comportamento do Consumidor,
Composição, Projeto, Desenho, Sociologia e Cultura, entre outras. O Design estuda tudo isso para poder
compor interfaces, fazer configurações visuais, serviços e artefatos baseados em um conceito de projeto
como disciplina. Deste modo, como afirma Verma (1997), o design é caracterizado não como uma disciplina
única, mas que pode ser aumentada através de uma variedade de experiências para uma compreensão ampla
e interdisciplinar de design.
Em uma abordagem sociológica de conhecimento de design como disciplina é preciso olhar dentro
de suas várias disciplinas (CARVALHO & DONG, 2009). O campo do design apresenta diferenças na
interpretação das atividades de projeto e os conhecimentos necessários para realizá-los (Ibid.). Tais tensões
expressam divergências existentes dentro do campo de conhecimento sobre o que a pessoa precisa para
projetar e qual é o tipo "certo" de conhecimento preocupante no clima contemporâneo que incentiva a inter
ou até mesmo pós-disciplinaridade (Ibid.).
O conhecimento contemporâneo que se tem do design, como visto, favorece a multidisciplinaridade e
interdisciplinaridade. Isso é legitimado pelo surgimento do design digital no advento das tecnologias das
últimas décadas, e com isso, se apresentam novos quadros teóricos e filosóficos que constituem os
fundamentos intelectuais do design (OXMAN, 2006). Estas colaborações multidisciplinares são
características do design digital, tais como não-linearidade, a interconectividade, continuidade, redes,
dinamismo, diagrama, máquinas de design, entre outros (Idid.). Por exemplo, no âmbito das conexões
interdisciplinares para as ciências biológicas, particularmente no que diz respeito a novas teorias, como a
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teoria da complexidade, o caos, o surgimento, a teoria da catástrofe, e bio-miméticos agora estão
relacionados às áreas de tecnologias emergentes a partir de uma perspectiva de pesquisa (Ibid).
A vivência da interdisciplinaridade no Design pode ser percebida durante a trajetória universitária em
que os estudantes e professores tem contato com diferentes experiências no currículo, em sala de aula e
macro esfera universitária (congressos, encontros) através de contatos com outros cursos e profissionais.
Essa preparação universitária já mostra que a sociedade, o mercado e a indústria transitam no design
interdisciplinar e de certa forma esperam um sujeito (designer) interdisciplinar. Na atuação em equipes de
projeto geralmente existem diferentes profissões atuando em um projeto que é comum o que confere
características interdisciplinares, e ao mesmo tempo, confere características disciplinares porque o designer
terá que aplicar seus conhecimentos de prática projetual (processos criativos, organização da informação e
pesquisa), semiótica, teoria da forma e cor, e tantos outros que compõem a disciplina de Design.
4. Considerações finais
O Design se caracteriza por fazer parte das Ciências Sociais Aplicadas e necessita desenvolver seu
corpus teórico específico para ter um conhecimento sistemático, e por consequência, compreender seus
conceitos gerais e o ponto-chave do seu núcleo como disciplina. Isso exigirá conhecimentos epistemológicos
e conceitos bem definidos de modo a ser distinguido das outras disciplinas. Este artigo pretendeu dar início a
essas discussões a partir de uma busca sistemática sobre a teoria do design com enfoque em seus conceitos,
teorias, conhecimentos disciplinar e interdisciplinar de Design.
Os autores pontuaram que para trazer contribuições sociais mais pertinentes para o design precisa-se
de uma teoria. Deste modo, na estruturação dessa teoria deve-se guiar a partir de que o design pode ser
manifestar em qualquer área do conhecimento e prática humana, é voltado para o futuro e inovação, está
ligado ao humano, e visa à ação e interface de mediação. Nessa teoria o design não aparece com pretensão
de ser ciência, no entanto, o padrão científico pode colaborar na estruturação de sua disciplina pelos
objetivos, objeto e método.
Assim, percebemos o Design como campo de estudos ou área do conhecimento com os seguintes
pressupostos: o objeto de estudo específico de Design é a “forma e significado”; sua atividade é a
“informação”, composta e apresentada como projeto, e sua finalidade é o “produto”. Este produto pode ser
um “artefato ou objeto experiente”. Isso não implica materialidade no processo, já que é possível, por
exemplo, fazer o design do som. Essa nossa conclusão foi baseada nas discussões do artigo e no que Bürdek
(2010) apresenta dentro das características de ciência, no entanto, sem ter a pretensão de ser ciência apenas
como um referencial: o objetivo do design é o "desenvolvimento de uma linguagem profissional"; o objeto
são as "questões da forma e significado na função comunicativa"; e o método está "embasado nas ciências
humanas".
Observou-se que nas conceituações de design se usaram diferentes palavras como configuração,
informação, criatividade, sistematização, atividade humana intencional na produção de um artefato, entre
outros. Nota-se que o foco está na solução de um determinado problema através da atividade do projeto de
um artefato que deve se adequar as necessidades humanas. Bürdek (2010) afirma que Design não é apenas
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configuração, porque envolve condições e decisões. É possível concordar com o autor. Porém, deve-se
pensar que, tradicionalmente, o resultado das condições e decisões se estabelece como informação ou
conjunto de figuras, móveis ou estáticas, planas ou tridimensionais, entre outras, as quais são reunidas como
produto para cumprir determinadas funções. Lobach (2001) adverte que, “configuração”, é um termo muito
amplo e aberto. Portanto, assim como “forma” que, também, é sinônimo de ideia. Portanto, “design” como
um termo relacionado à configuração ou à forma requer uma especificação como, por exemplo, design
industrial, design gráfico ou design de produto.
Deve-se considerar, entretanto, que as palavras “forma”, “informação” ou “configuração” não são
unicamente relacionadas ao processo de comunicação. Pois, toda informação propõe algum tipo de
comunicação, ou seja, um produto simbólico-funcional. Mas, a finalidade principal do ato de informar ou
configurar pode ser outra, por exemplo, compor o produto prático-funcional.
Por fim, há quem interpreta o termo “design” como “planejamento eficiente”, incluindo a capacidade
de mediação formal ou informação que, ergonomicamente, possibilita e potencializa a relação entre o
funcionamento e o uso, indicando o conceito de interface e do designing. Esse conceito tem uma ligação
forte com os seres humanos e sua função no uso e no desenvolvimento das atividades. Ao se pensar nisso
alguns autores afirmam que todos os seres humanos são considerados designers, no entanto, há de se ter
cuidado com as generalizações para não transformar o “design” em uma “grande palavra”. Visto que,
grandes palavras são caracterizadas pela falta de critério. Assim, “arte”, “ciência”, “religião” e, agora
“design”, dizem tudo e não definem nada. Pode-se dizer que todo fazer, como administrar ou desenvolver
experiências genéticas, é uma arte, que toda área do conhecimento tem sua ciência e design é tudo que
requer planejamento. Mas, apesar disso, há distinções claras entre artistas, cientistas e designers. Portanto,
deve haver também clareza sobre o objeto de estudo, a atividade e a finalidade de cada uma dessas áreas do
conhecimento para relacionar o disciplinar com o interdisciplinar.
O saber disciplinar do Design pode contribuir para diversas áreas do conhecimento e promover sua
interdisciplinaridade. Não obstante, é necessária a compreensão da atividade do designer em relação à
elaboração de projetos e do estudo e aplicação de formas comunicativas como parte de sua teoria. O
conceito de designing apresentando no artigo pode ajudar nessa compreensão disciplinar-interdisciplinar
através da atividade humana do designer que não é de rotina, mas sim intencional e aplicada em um
contexto. É imprescindível estar atento também às teorias de design, pois, estas apresentam intrinsicamente
seu saber histórico – a história da teoria do design – e os aspectos humanos sociais e culturais.
A interdisciplinaridade no Design acontece devido à contribuição de diferentes áreas que fazem parte
do contexto em que o projeto é aplicado ou desenvolvido e conduze a um objeto mais experiente e como
resultado um melhor resultado para a sociedade. Dessa maneira, o design exige que o projeto seja feito em
conjunto com outras áreas de conhecimento para solucionar um determinado problema que está presente na
sociedade. O design precisa olhar dentro das suas disciplinas e conhecimentos, no entanto, para poder
elaborar essas atividades de projeto e conhecimento interdisciplinar.
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