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Maria Helena Mesquita Pina temas portugueses O ALTO DOURO O ALTO DOURO UM ESPAÇO CONTRASTANTE EM MUTAÇ UM ESPAÇO CONTRASTANTE EM MUTAÇÃO ÃO I

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Maria Helena Mesquita Pina

temas portugueses

O ALTO DOUROO ALTO DOUROUM ESPAÇO CONTRASTANTE EM MUTAÇUM ESPAÇO CONTRASTANTE EM MUTAÇÃOÃO

Maria H

elena Mesquita Pina

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I

Apesar da singularidade que os vinhedos lhe conferem, a Região Demarcada do Douro não é homogénea, justificando a subdivisão em três sub-regiões: Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior. Esta diversidade territorial amplia-se ainda mais quando se ultrapassam os limites vinhateiros e se entra nas «auréolas», freguesias envolventes da Região Demarcada, que com ela estabelecem uma relação de intensa complemen-taridade. Sobressai, assim, um mosaico territorial muito com-plexo, mas onde o espaço vitivinícola se destaca sempre. Por outro lado, independentemente da escala de análise, existem problemáticas essenciais, como as demográficas e as econó-micas, e, de modo particular, as de um sector agrícola caracte-rizado por uma deficiente estrutura fundiária, um débil perfil cultural e técnico do agricultor e uma dualidade sócio-estrutural muito pronunciada. Através de elementos documentais e imagens vivenciais salienta-se um território muito contrastante mas em mutação, com um historial específico e múltiplas potencialidades, se bem que marcado por profundas assimetrias e problemas que urge ultrapassar.

Maria Helena Mesquita Pina é professora do Departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e autora de diversos trabalhos sobre as dinâmicas e as proble-máticas dos espaços rurais e sobre as estratégias para o seu desenvolvimento.

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ISBN 978-972-27-1463-1

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Título: O Alto Douro: Um Espaço Contrastanteem MutaçãoVol. I

Autor: Maria Helena Mesquita Pina

Edição: Imprensa Nacional-Casa da Moeda

Concepção gráfica: Departamento Editorial da INCM

Revisão do texto: Joaquim Melo

Tiragem: 800 exemplares

Data de impressão: Janeiro de 2007

ISBN: 978-972-27-1463-1

Depósito legal: 251 815/06

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AGRADECIMENTOS

Depois de alguns anos investidos na análise de espaços agrárioslimianos, complementamos este conhecimento com a investigação deum outro território emblemático, complexo e polifacetado, mas atrac-tivo e onde se encontram as nossas raízes: a Região Demarcada doDouro.

Foi um redireccionar científico muito incentivado pela orienta-dora desta tese, a Sr.ª Professora Doutora Rosa Fernanda Moreira daSilva, ao longo destes anos. Apesar das interrupções a que estivemossujeitos por motivos de saúde, uma das quais ultrapassou os trêsanos, sem o seu apoio e dos meus familiares mais directos, este tra-balho não teria sido concluído.

Como é óbvio, seria impossível referenciar todos os que nos auxi-liaram, pois eles constituem um leque muito vasto que inclui desde ostécnicos do Centro de Informática da Universidade do Porto e muitoespecialmente a Dr.ª Maria Odete Machado, bem como os dirigentes etécnicos dos serviços de informática da Casa do Douro e os responsá-veis e técnicos das diversas repartições de finanças durienses; acrescemas entidades autárquicas de múltiplas freguesias, bem como asedilidades camarárias e respectivos serviços técnicos. E como esquecera prestimosa colaboração de associações sectoriais diversas, designada-mente a Associação Comercial e Industrial de Lamego, a AssociaçãoComercial e Industrial da Régua, Santa Marta de Penaguião e MesãoFrio, ou ainda a de Vila Real, para além da NERVIR e de várias outrasde âmbito económico e social, ou ainda do Instituto Português de Car-tografia e Cadastro, através da Delegação Regional do Norte sita emMirandela? E os inúmeros viticultores durienses que muito simpatica-mente responderam aos nossos inquéritos e às nossas dúvidas?

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Ao grupo anterior não podemos deixar de agregar outras insti-tuições como o Instituto da Vinha e do Vinho, o Instituto do Vinhodo Porto e a Associação de Exportadores de Vinho do Porto, bemcomo as firmas produtoras/exportadoras e outras já direccionadaspara denominações de origem controlada não licorosos. Neste grupoé imperioso fazer um agradecimento muito particular ao Sr. BruceDuncan Guimaraens, um dos administradores da Fonseca Guima-raens, S. A. Enólogo emblemático reconhecido por todos pela suaexperiência, capacidades técnicas e estratégicas, para além de umaimensa simpatia, faleceu entretanto, muito prematuramente. Sem asua disponibilidade e os seus ensinamentos, uma fatia do Douroempresarial ficaria «enevoada» nesta dissertação. Desta forma lheprestamos uma singela homenagem.

Já no trajecto final deste trabalho, evidentemente que não pode-mos ignorar os que nos apoiaram na revisão do texto, na cartografiae na imagem gráfica, tarefas muito demoradas, mas essenciais paraatingirmos o nosso desiderato. A todos um imenso muito obrigada.

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INTRODUÇÃO

Outros ranchos desciam por outros caminhos em direc-ção a outras quintas. Vinham numa nuvem de pó e num re-demoinho de som de todos os lados da serra. Nos rostosossudos de cada bando lia-se a mesma felicidade nómada deciganos libertos, com os haveres numa saca. Cantavam, riam,paravam a dançar nas encruzilhadas, comiam, bebiam, semhoras e sem ave-marias. E do Senhor Jesus a Terra-feita, deFavaios a Vale de Mendiz, era um poço de alegria, de canti-gas e de sol. A grande festa do mosto ia começar. E os pere-grinos acorriam de longe, chamados pelo aceno das vides.

TORGA, 1965: 13.

A força contida na imagem do texto em epígrafe retrata-nos a des-locação das «rogas» em meados do século XX para as vindimas, períodoemblemático da Região vinhateira portuguesa de maior renome mundial,a Região Demarcada do Douro.

Região criada administrativamente em 1756, no seguimento da ins-tauração da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Dou-ro, teve a sua primeira delimitação no ano seguinte, facto muito aplau-dido pela classe fundiária vitícola, mas objecto de animosidade doscomerciantes e exportadores. Após a demarcação primordial, de acordocom Agostinho F. Guimarães, a área abrangida pelos vinhedos edescontínuos atingia cerca de 40 000 ha 1, mas no início do século XXI

1 A falta de informação neste âmbito é de tal forma notória que SusanSchneider apresenta a dimensão da Região Demarcada para o final do século XVIII

com a seguinte descrição: «o seu comprimento era de cerca de metade e a sualargura bastante inferior a metade da largura actual» (Schneider, 1980: 27).

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ultrapassa já os 250 000 ha 2, embora só cerca de 16% 3 se encontrem comvinha contínua.

A viticultura foi e é incisiva na organização e dinâmica deste espa-ço em análise. Todavia, quando se refere que o vinho do Porto não éapenas um produto, mas uma mistura de história, economia e cultura,sujeito ainda a interferências de um contexto internacionalizado, estaideia sintetiza a complexidade com que nos confrontamos para a inter-pretação deste espaço.

Apesar de nos encontrarmos numa área periférica à escala nacional,a Região Demarcada do Douro é, no entanto, uma unidade territorialespecífica, que se individualiza do espaço circundante, mas que denunciatambém marcantes contrastes internos, visíveis em termos espaciais, so-ciais, económicos e culturais. Contudo, estas diferentes unidades comple-mentam-se e evidenciam um dinamismo notável.

Se a vertente histórica se encontra bem documentada, já as leiturasgeográficas abrangentes dos vectores social e económico e sobretudo dosector produtivo são quase inexistentes, dada a ausência de fontes do-cumentais credíveis e, de modo especial, das que registam uma série tem-poral suficiente para a realização de uma análise diacrónica. Este traba-lho de investigação corresponde a um contributo para minimizar essaslacunas.

Para esta opção territorial e temática assumiram particular impor-tância as nossas vivências pessoais. Recorde-se que desde jovem nos preo-cupamos com as mutações paisagísticas e sociais desta Região, para alémdas mudanças na hierarquia das problemáticas e respectivas hipóteses deresolução. Como ignorar a prevalência das dificuldades no escoamentodas produções, o problema fulcral entre os viticultores até ao início dadécada de 70 do século XX, que minimizava a deficiente estruturafundiária, a dicotomia sócio-estrutural e o deficiente perfil do agricul-tor? Este problema foi posteriormente subvalorizado pelo impacte da fal-ta de mão-de-obra.

Região que sofreu diferentes delimitações envoltas em controvérsias,sobretudo as do século XVIII, na actualidade estende-se desde Barqueiros

2 Informação cedida pela Casa do Douro e pelo Instituto do Vinho do Porto,2001.

3 Informação cedida pela Casa do Douro e pelo Instituto do Vinho do Porto,2001.

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e Barrô no seu extremo ocidental até à fronteira espanhola em Barca deAlva, seu limite oriental (fig. 1). Nesta paisagem sucedem-se os socalcosque ascendem nas vertentes declivosas do Douro e dos seus principaisafluentes.

Todavia, este espaço regista uma contrastante organização, notóriaquando nos deslocamos de ocidente para oriente ou ainda se ascendemosnas vertentes, surgindo as diferenças de uma forma gradativa. Estasradicalizam-se quando ultrapassamos a área vinhateira, confrontando-nosentão com problemáticas diversas mas onde a complementaridade com oespaço duriense permanece indelével.

Uma diversidade de factores de origem antrópica e natural contri-bui para a justificação desses contrastes. Com efeito, quer os fortes decli-ves morfológicos, que apenas foram superados recorrendo a uma mão-de--obra hercúlea distribuída por vários séculos, quer as característicasclimáticas, com o acentuar das deficiências hídricas a leste, fundamenta-ram o quadro existente. Acrescia a debilidade das acessibilidades, outrodos grandes constrangimentos ao dinamismo deste território. Só recente-mente, desde a década de 70 do século XX, se iniciou uma nova políticaviária.

Se era este o cenário da Região Demarcada, o do espaço envolventeainda era mais deficitário, pois sobrevivia num contexto quase «autogé-nico», o que incentivava a fuga da população integrada nos fluxos mi-gratórios que têm alimentado a crescente «litoralização» da populaçãoportuguesa, ou a emigração.

Estas freguesias rurais que envolvem o espaço vitícola duriense, mascom o qual possuem uma histórica interdependência, que apoiavam a suaeconomia numa débil agropecuária de estrutura familiar e cuja popula-ção subsistia num limiar mínimo, apenas aliviado no período das vindi-mas no Alto Douro, constituem neste trabalho as «auréolas» da RegiãoDemarcada. Consideramos esta designação «auréolas», no plural, a maisadequada, pois existem descontinuidades geográficas nestes espaços ru-rais que circundam a Região Demarcada, além de que também são evi-dentes diferenciações geomorfológicas, climáticas e na própria organiza-ção territorial, quando nos deslocamos de oeste para leste.

Era, pois, impossível nesta investigação não confrontar o espaçovitícola com as «auréolas» (fig. 1). Recorde-se que esta interdependênciajustificou ao longo do tempo fluxos intensos de produtos agrícolas com-plementares a cada um dos espaços, mas também maiores ou menoresmobilidades populacionais. Como ignorar a importância das «rogas» nasvindimas, cenário com raízes profundas e que prossegue? Neste contex-

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to, esta dissertação poderá ser um contributo para a percepção de umaunidade territorial específica, a Região Demarcada do Douro, mas numaperspectiva em que a tradicional complementaridade com os espaçosenvolventes nunca poderá ser esquecida.

Tendo em consideração estes dois espaços tipológicos, a RegiãoDemarcada e as «auréolas», neste trabalho abarcamos os 20 concelhospelos quais a Região Demarcada do Douro se estende 4, independente-mente de o abrangerem na íntegra ou apenas algumas freguesias. A tí-tulo de exemplo, das 24 freguesias do município de Lamego, apenas 10se integram no perímetro vitícola duriense 5, enquanto as restantes seinserem nas «auréolas» (fig. 1).

Este enquadramento vai repetir-se na generalidade dos concelhos,pois, se exceptuarmos Mesão Frio, Peso da Régua, Santa Marta dePenaguião e Vila Nova de Foz Côa, que se inserem integralmente naRegião Demarcada, todos os restantes possuem um número mais oumenos reduzido de freguesias vitícolas, pelo que, por vezes, nos confron-tamos com «auréolas» muito amplas, incidindo as de perfil montanhosoa oeste e as de morfologia planáltica a leste.

Na sua globalidade, a área em análise aproxima-se dos 400 000 ha,incluindo os cerca de 250 000 ha da Região Demarcada do Douro, abran-gendo 309 freguesias, das quais 168 estão integradas na região vi-nhateira. Refira-se desde já que, nas análises que vamos empreender, onúmero de freguesias varia de acordo com a estrutura das fontes do-cumentais e a temática em análise.

Além disso, embora o objectivo principal deste estudo tenha comofinalidade a interpretação geográfica da conjuntura duriense e suas «au-réolas» nas últimas quatro décadas do século XX, tendo como horizonte

4 São eles, de ocidente para oriente, Mesão Frio, Peso da Régua, Santa Martade Penaguião, Vila Real e Lamego, que com Resende e Armamar preenchem odesignado Baixo Corgo, Tabuaço, São João da Pesqueira, Sabrosa, Alijó, Murça eCarrazeda de Ansiães, que já pertencem a uma outra unidade sub-regional, o CimaCorgo, e ainda Torre de Moncorvo, Vila Flor, Alfândega da Fé, Freixo de Espadaà Cinta, Vila Nova de Foz Côa, Meda e Figueira de Castelo Rodrigo, inseridos nasub-região mais oriental, o Douro Superior. Nesta abordagem não ignoramos aindaos prédios rústicos vitícolas englobados pela delimitação, mas implantados no con-celho de Mirandela. Dado o seu reduzido número, apenas os referiremos na se-gunda parte deste trabalho quando analisamos a conjuntura vitícola duriense.

5 A que se associam alguns prédios rústicos de uma outra freguesia, Várzeade Abrunhais.

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temporal o ano de 2002 6, sempre que a fundamentação dos temas selec-cionados o exigiu, recorremos também à leitura de documentos abran-gentes de vários séculos, embora a incidirem de sobremaneira entre oséculo XVIII e o final do século XX. Só assim, segundo a nossa opinião, épossível apreender e explicar as diversificadas e contrastadas dinâmicasespaciais desta área.

Obviamente que, para atingirmos estes objectivos, foi indispensávela conjunção de um intenso trabalho empírico e a realização de uma car-tografia abrangente das diversas temáticas.

Para uma melhor compreensão deste espaço, e dada a sua extensão,decidimos ainda empreender percursos temáticos e temporais, iniciandoquase sempre a nossa planificação, independentemente da época em cau-sa, pelo Baixo Corgo, a sub-região que abrange o extremo oeste da áreaem estudo, a que se seguirá o Cima Corgo e, por fim, o Douro Superior.Embora esta metodologia possa ser considerada anacrónica quando re-cuamos no tempo, facilita a percepção das mutações territoriais ocorridasao longo dos séculos.

Colocados os requisitos para a percepção deste trabalho, façamos al-gumas referências à sua estrutura.

Dividimo-lo em três partes. Na primeira, muito abrangente em ter-mos territoriais, começaremos por caracterizar sumariamente o substractofísico regional, evidenciando a sua diversidade e os reflexos na humani-zação da paisagem (capítulo 1), enquanto no capítulo 2 iniciaremos umaanálise demográfica, destacando as suas dinâmicas e assimetrias.

Para além destas questões, havia que compreender o substrato econó-mico dos dois espaços tipológicos em estudo sempre numa perspectivadiacrónica, basilar neste trabalho. Foi o que fizemos no capítulo 3. Paraatingirmos os nossos objectivos, tivemos de conjugar novamente o estudodocumental com um intenso trabalho de campo, pois se em relação ao sec-tor agrícola, que continua a dominar o tecido económico local, era possívelrecorrer aos recenseamentos agrícolas, já no âmbito dos outros sectores deactividade, a informação quantitativa era ocasional e circunscrevia-se àescala concelhia. Por esta razão, foi indispensável a coordenação entre otrabalho de campo e a análise dos processos individuais de contribuiçãoindustrial. Só assim conseguimos analisar o dinamismo do tecido econó-

6 Existe uma excepção a este marco temporal, o ano de 2002. Decorre designificativas «incursões» nos resultados do XIV Recenseamento Geral da Popula-ção de 2001, entretanto disponibilizados.

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mico regional e apercebermo-nos dos principais parâmetros indutores dasrecentes mutações, bem como dos seus reflexos na conjuntura regional.

Esta análise econométrica seria, porém, muito restritiva se abran-gêssemos apenas as últimas quatro décadas do século XX, apesar decorresponderem ao período mais representativo das recentes alteraçõessócio-económicas registadas na Região Demarcada. Por conseguinte, ti-vemos de as fundamentar em perspectivas anteriores, como foi a infor-mação de Ruy Fernandes para o século XVI, a que reunimos outras jáconsecutivas à demarcação da Região vitícola duriense. Para o final doséculo XIX recorremos ao Inquérito Industrial de 1881, uma das fontesversadas sobre esta temática para o espaço em análise.

Assim, procuramos obter uma imagem da complexidade territorialquer do espaço vitícola, quer das «auréolas», sem ignorar as heterogenei-dades existentes e os reflexos de crises de maior ou menor incidênciaterritorial, ou ainda a interferência das acessibilidades que, no seu con-junto, conduziram ao destaque da sub-região mais ocidental. Aliás, estasituação reflecte ainda a evolução decorrente da conflitualidade entre umaestratégia que pretendia minimizar as assimetrias, diversificando os cen-tros polarizadores regionais, e uma outra que potencializava cada vezmais o eixo de centralidades desta sub-região, o Baixo Corgo.

Estas são as temáticas abordadas na primeira parte do presente tra-balho, uma perspectiva globalizante mas em que os contrastes territoriaisestão patentes e permitem confirmar, para além da individualidade daRegião Demarcada do Douro, as suas múltiplas problemáticas e as po-tencialidades, distintas sem dúvida das existentes nas «auréolas».

Na segunda parte, circunscrevemo-nos à Região Demarcada do Dou-ro. Privilegiamos no capítulo 1 os parâmetros histórico-jurídicos, fazendosobressair os períodos e os factos históricos que maior incidência tiveramna organização e nas dinâmicas deste território. Assim nos habilitare-mos a compreender um quadro onde as problemáticas se avolumam, so-bretudo as sociais e as económicas e, de modo particular, as fundiárias eas correlacionadas com a tipologia dos vinhedos, já que só após a décadade 70 do século XX se descobriram efectivamente as múltiplas potencia-lidades endógenas desta Região.

No entanto, a vinha mantém-se omnipresente, pelo que não podíamosabandonar o século XX sem aprofundar alguns aspectos da actual estrutu-ra agrária duriense, aproveitando um dos ficheiros da maior importânciapara um estudo como o nosso: referimo-nos ao cadastro das vinhas da Casado Douro. Esta fonte documental permitiu-nos obter um pormenorizadorelato da sua estrutura fundiária. É esta a temática do capítulo 2.

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A encerrar a segunda parte, decidimos formular alguns apontamen-tos prospectivos referentes à reorganização deste espaço vitícola para oinício do século XXI.

Numa terceira e última parte, preocupamo-nos com o «estudo decasos» à escala da freguesia e do lugar, bem como com a incidência dahistórica complementaridade entre o espaço vinhateiro e as «auréolas».Consideramos esta opção de singular importância para a apreensão destecomplexo e contrastante território duriense. Para tal, seleccionámos doiscasos tipológicos, Cambres, uma freguesia de longo historial vitícolainserida no Baixo Corgo (capítulo 1), e Magueija, uma freguesia das«auréolas» que absorve as ambiências serranas, bem como as de transi-ção para o planalto beirão (capítulo 2).

Como é óbvio, esta nossa opção, dadas as lacunas bibliográficas edocumentais existentes, obrigou a um intenso trabalho de campo nas duasfreguesias e à conjugação de diferentes tipologias de inquéritos concreti-zados à escala do lugar. Só assim foi possível compreender as dinâmicasexistentes e sublinhar os seus reflexos na organização espacial.

Conjugando estas três partes, a primeira das quais generalista, asegunda direccionada ao espaço vinhateiro e a terceira organizada na basede «estudo de casos», um representativo do espaço vitícola e o outro das«auréolas», tentamos dar o nosso contributo para uma leitura de umespaço paradigmático no panorama nacional. É uma perspectiva geográ-fica concretizada a diferentes escalas, que inclui a Região Demarcada eas «auréolas», na qual se assimilam as diversificadas problemáticas e noshabilitamos à apresentação das principais tendências da sua reorganiza-ção territorial.

Certamente que muitos parâmetros ficaram por analisar, mas umadissertação de doutoramento apenas constitui o corolário de uma etapana pesquisa científica e, neste caso, da análise de um espaço dinâmico,heterogéneo, multifacetado e problemático, mas muito aliciante para umgeógrafo.

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ÍNDICE GERAL

Agradecimentos ....................................................................................... 7

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 9

Fontes documentais e bases metodológicas ....................................... 17

Siglas e abreviaturas ............................................................................... 37

1.ª PARTE

A Região Demarcada do Douro e suas «auréolas»:uma perspectiva geográfica

CAPÍTULO 1 — ENQUADRAMENTO FÍSICO (BREVES NOTAS) ..... 41

CAPÍTULO 2 — ALGUNS INDICADORES DEMOGRÁFICOSE SEUS RITMOS EVOLUTIVOS .................................................. 55

2.1 — Aspectos demográficos do século XVI ao século XVIII .... 562.2 — O conturbado século XIX ..................................................... 642.3 — A primeira metade do século XX e os acréscimos po-

pulacionais ................................................................................ 922.3.1 — Do início do século à crise da «pneumónica» ............. 922.3.2 — O período entre os dois conflitos mundiais: algumas

reflexões .................................................................................... 1012.4 — A segunda metade do século XX: a incidência da re-

cessão demográfica ................................................................. 1132.4.1 — Os anos 50 e 60: a grande recessão demográfica ....... 1132.4.2 — As últimas três décadas do século XX: abrandamento/

estabilização das anteriores tendências ............................... 1222.5 — As grandes tendências demográficas e a reorganização

territorial no início do século XXI ......................................... 141

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CAPÍTULO 3 — O DINAMISMO DO TECIDO ECONÓMICO RE-GIONAL PERANTE O ACENTUAR DE UMA ANTIGA PO-LARIZAÇÃO TERRITORIAL ........................................................ 155

3.1 — Do século XVI ao final do século XIX (alguns aspectos re-trospectivos) ............................................................................. 155

3.1.1 — O século XVI e a importância da endogenia económica 1563.1.2 — A expansão vitícola do século XVIII e a sua incidência

nas dinâmicas territoriais ...................................................... 1683.1.3 — A interferência da tradição e das pragas fitossanitárias

na organização espacial do final do século XIX ................. 1933.2 — O século XX — o quebrar do imobilismo e da tradição 2113.2.1 — A primeira metade do século e a vivência de um ce-

nário tradicional ...................................................................... 2113.2.2 — As décadas de 60 e 70 e o início da expansão econó-

mica ........................................................................................... 222

a) A «estagnação» do tecido industrial .............................. 225b) O sector terciário: o início da renovação estrutural ... 242c) O sector primário em 1979: o impacte da viticultura 253c.1) Estrutura fundiária: a individualização da Região

Demarcada do Douro .................................................... 254c.2) O tecido humano de apoio às exploração agrícolas 264

3.2.3 — As duas últimas décadas do século xx com o acen-tuar das tendências polarizantes .......................................... 266

a) O sector secundário: recessão/especialização num ter-ritório de fortes contrastes estruturais ........................... 269

b) A crescente terciarização nas últimas decadas do sé-culo xx ................................................................................. 275

c) O sector agrícola em 1989 e 1999: o perpetuar da es-trutura tradicional ............................................................. 283

c.1) A estrutura fundiária: uma evolução diferenciada eproblematizante ............................................................... 283

c.2) A estrutura humana de apoio às explorações agrí-colas: um elo entre o passado e o presente .............. 290

3.3 — Algumas tendências da conjuntura económica regional 299

Índice de fotografias e quadros ............................................................ 317

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Acabou de imprimir-seem Janeiro de dois mil e sete.

Edição n.o 1013821

www.incm.ptE-mail: [email protected]

E-mail Brasil: [email protected]