novos rumos para as empresas

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Sobre Medusas e Capitães... novos rumbos para velhas empresas Há um ditado, pelo menos em espanhol, que diz que “cachorro velho não aprende truques novos”. E é a verdade, mas não só com cachorros, é con tudo. Lembro-me de um comercial americano onde um fazendeiro tentava ensinar sua vaca a deitar-se, sentar-se, girar, etc. Obviamente, a vaca não fazia mais ruminar e ruminar. Nos tempos atuais, as empresas que trabalharam durante um certo período de tempo, que se tornaram grandes como a vaca do comercial, vêem-se numa situação similar: têm que mudar, sabem que têm que mudar, mas não vêem como mudar. “Empresa velha não aprende mudanças novas”, não é mesmo? O novo mercado, o novo cliente, o novo gerente, o novo... Anualmente, jovens recém-saídos da universidade chegam aos escritórios das empresas do mundo. Entram num universo onde tudo está pronto: as tarefas já estão alocadas, as mesas já estão postas, quadros na parede, o lugar para tomar o cafezinho, os horários, onde se colocam os papéis de rascunho, quem sabe quê, etc. Mas a energia é tal que tentam, de forma entusiasmada, aplicar as idéias aprendidas na academia, os idéais que forjaram de como tinha que ser uma empresa, como deveria ser o clima organizacional, etc. Porém, grande parte desta energia é bloqueada pela própria empresa e pelas pessoas que aí trabalham. As poucas que conseguem usar esta energia são as que atualmente dominam o mercado. Mas, a maioria deixa perder todo este entusiasmo. Uma vez, numa corporação bancária, fui pedir uma informação imporante (o cliente SEMPRE pede informações importantes). Ao chegar ao balcão de informação, uma garota nova me atendeu, alguém que eu nunca tinha visto antes. Muito atenta, escutou meu pedido e foi tentar satisfazê-lo. pela falta de experiência, depois de um tempo, pediu ajuda a uma companheira, antiga na corporação e que eu conhecia. Não sei o que falaram, mas imagino que foi algo como “sem problemas, ele é quem tem que esperar”. E aí tive que ficar meia hora mais esperando pela solução. Devo dizer que já não tenho minha conta lá. A luta entre o novo e o velho é tão velha quanto a luta entre o bem e o mal. Mas vivemos momentos críticos e loucos, onde o novo já não é novidade. Isto exige que uma empresa seja mais flexível que um hatha yogue, que seja capaz de atender os novos requerimentos com novas soluções e apreciar o novo mercado emergente. É necessário uma nova empresa. A estátua que dança Uma metáfora que utilizo para falar sobre as empresas atuais e seu desafio para mudar é pensar em ensinar uma estátua a dançar. As empresas são rígidas por natureza, foram construídas para poucas mudanças e transformações de longo prazo. Não estão prontas, ao menos não foram elaboradas para mudanças tão repentinas. O modelo clássico está fundamentado no governo, igreja e exército. As empresas criaram diversos níveis hierárquicos para controlar... mais que para produzir. Como ensinar uma estátua a dançar? De fato, as estátuas NÃO podem dançar... ao menos que estejam vivas. É isso aí! Dar vida às empresas permite que elas dancem. E, bom, como se dá vida? As empresas já são vivas. Computadores, máquinas, papéis, capital, tudo isto gira ao redor das PESSOAS, com coração e cabeça, jovens ou não, homens e mulheres que fazem que a organização adquira certa forma. O problema é que a energia humana dê a

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Um antigo artigo que escrevi sobre minha percepção das empresas atuais e os seus desafios.

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  • Sobre Medusas e Capites... novos rumbos para velhas empresas

    H um ditado, pelo menos em espanhol, que diz que cachorro velho no aprende truques novos. E a verdade, mas no s com cachorros, con tudo. Lembro-me de um comercial americano onde um fazendeiro tentava ensinar sua vaca a deitar-se, sentar-se, girar, etc. Obviamente, a vaca no fazia mais ruminar e ruminar. Nos tempos atuais, as empresas que trabalharam durante um certo perodo de tempo, que se tornaram grandes como a vaca do comercial, vem-se numa situao similar: tm que mudar, sabem que tm que mudar, mas no vem como mudar. Empresa velha no aprende mudanas novas, no mesmo? O novo mercado, o novo cliente, o novo gerente, o novo... Anualmente, jovens recm-sados da universidade chegam aos escritrios das empresas do mundo. Entram num universo onde tudo est pronto: as tarefas j esto alocadas, as mesas j esto postas, quadros na parede, o lugar para tomar o cafezinho, os horrios, onde se colocam os papis de rascunho, quem sabe qu, etc. Mas a energia tal que tentam, de forma entusiasmada, aplicar as idias aprendidas na academia, os idais que forjaram de como tinha que ser uma empresa, como deveria ser o clima organizacional, etc. Porm, grande parte desta energia bloqueada pela prpria empresa e pelas pessoas que a trabalham. As poucas que conseguem usar esta energia so as que atualmente dominam o mercado. Mas, a maioria deixa perder todo este entusiasmo. Uma vez, numa corporao bancria, fui pedir uma informao imporante (o cliente SEMPRE pede informaes importantes). Ao chegar ao balco de informao, uma garota nova me atendeu, algum que eu nunca tinha visto antes. Muito atenta, escutou meu pedido e foi tentar satisfaz-lo. pela falta de experincia, depois de um tempo, pediu ajuda a uma companheira, antiga na corporao e que eu conhecia. No sei o que falaram, mas imagino que foi algo como sem problemas, ele quem tem que esperar. E a tive que ficar meia hora mais esperando pela soluo. Devo dizer que j no tenho minha conta l. A luta entre o novo e o velho to velha quanto a luta entre o bem e o mal. Mas vivemos momentos crticos e loucos, onde o novo j no novidade. Isto exige que uma empresa seja mais flexvel que um hatha yogue, que seja capaz de atender os novos requerimentos com novas solues e apreciar o novo mercado emergente. necessrio uma nova empresa. A esttua que dana Uma metfora que utilizo para falar sobre as empresas atuais e seu desafio para mudar pensar em ensinar uma esttua a danar. As empresas so rgidas por natureza, foram construdas para poucas mudanas e transformaes de longo prazo. No esto prontas, ao menos no foram elaboradas para mudanas to repentinas. O modelo clssico est fundamentado no governo, igreja e exrcito. As empresas criaram diversos nveis hierrquicos para controlar... mais que para produzir. Como ensinar uma esttua a danar? De fato, as esttuas NO podem danar... ao menos que estejam vivas. isso a! Dar vida s empresas permite que elas dancem. E, bom, como se d vida? As empresas j so vivas. Computadores, mquinas, papis, capital, tudo isto gira ao redor das PESSOAS, com corao e cabea, jovens ou no, homens e mulheres que fazem que a organizao adquira certa forma. O problema que a energia humana d a

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    criatividade e a transformao esteja bloqueada e, com isto, depois que foi dada uma certa forma, a empresa se paralisa, ou seja, se torna uma esttua. Aprendemos muito das lendas e histrias. Na antiga Grcia, havia a medusa, um ser como cabea de mulher e corpo de monstro; seus cabelos eram de fato serpentes vivas e o pior era que transformava todos os que a viam em pedra. Mas um heri grego conseguiu, com um bom truque, mat-la. O truque foi mutio simples: em vez de olh-la diretamente, usou seu escudo como se fosse um espelho. Somente o olhar direto transformava as vtimas em pedra usando um espelho improvisado, conseguiu salvar-se da maldio. Podemos dizer que o mesmo deve acontecer com a empresa. Os jovens que entram, tentam enfrentar a emprea de frente, sem um diagnstico claro, isto , sem ter em conta um espelho para proteg-los da parlise. Deste conto, se podem sacar algumas lies de como devolver a vida empresa:

    1. Identificar a medusa. Um primeiro passo seria descobrir, dentro da empresa, a rea e, dentro da rea, as circunstncias que provocam a parlise da energia humana. no exemplo da corporao era a antiga recepcionista e sua forma de pensar.

    2. Utilizar as armas corretas. Nas lendas gregas muito fcil: cortam-se cabeas e j se acabou! Mas, por favor, no o faa na sua empresa. necessrio tomar tempo, pensando em que armas devem ser usadas para enfrentar a medusa. Vou falar sobre isto no prximo tpico.

    3. Um bom espelho mo. fundamental um diagnstico bem claro na mo para evitar a maldio da medusa. No, no necessariamente montanhas de nmeros. No caso dos problemas com o pessoal, h uma tcnica que a avaliao horizontal, ou seja, como os demais companheiros vem uma pessoa especfica. Esta avaliao, ligada, quando seja preciso, avalliao vertical e avaliao dos clientes, pode dar uma idia clara de quem relamente o problema. De todas formas, leia o prximo tpico antes de mandar essa pessoa ao olho da rua.

    O novo manejo do staff Assim como existem novos mercados, etc. tambm deve haver novas polticas para lidar com as pessoas que convivem na empresa. Na minha experincia pessoal lidando com gente de diversos tipos, observei alguns aspectos que podem ajudar voc.

    As pessoas mudam em momentos diferentes. Algumas pessoas precisam de mais tempo para aprender que outras, mas no quer dizer que sejam menos capazes que seus companheiros. Ao observar que algum demora em aprender, mude sua mentalidade com relao a esta pessoa. Tambm, faa o esforo para que ela esteja numa parte da empresa onde a velocidade seja menos importante que a pacincia.

    As pessoas precisam de um espao para crescer. Em primeiro lugar, no acredito que possvel mudar algum; em vez disso, ao tentar ajudar algum a mudar, deve-se dar os recursos necessrios para isto. Antes falei sobre o tempo, mas tambm acho importante dar um espao para mudar, ou seja, uma rea da empresa onde elas possam errar e aprender e crescer. Esta rea tem que ser dirigida por algum cuja capacidade seja lidar com pessoas, alm de tcnicas. Uma sugesto no dar s pessoas que estejam num processo de crescimento desafios muito grandes; antes de aprender a construir um prdio, deixem que comecem com um muro.

    As pessoas so boas por natureza. Todos so bons por natureza; tentativas de trapaa e fraudes, fofocas e problemas do gnero so fruto de uma certa

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    insatisfao assim que a pessoa esteja satisfeita, estes problemas desaparecero. Se h pessoas que causam problemas, o correto identificar que necessidades tm e trabalhar com elas de uma forma apropriada.

    As pessoas podem optar por no mudar. duro, mas verdade. Algumas pessoas simplesmente no desejam mudar, ou porque no entendem ou porque no querem, ou porque no acham que podem. Bom, se este o caso, h que tomar uma ao que solucione o problema. Demitir a pessoa o mais fcil, mas no demonstra a liderana de um gerente. O melhor descobrir em que a pessoa se sente bem, que gosta de fazer e tentar concentr-la nisto. muito provvel, e j vi isto, que a pessoa quando esteja alocada numa posio confortvel comece a mudar.

    Bom, estas so algumas armas que apliquei e ainda uso quando manejo pessoas. No fcil, estou cem por cento de acordo: recordo quando um gerente comentava que cuidar mquinas muito fcil, pois se do problemas pode-se ligar para o provedor ou ler o manual de referncia. Mas, com as pessoas, diferente: no vm com manual e no se pode ligar para o provedor, o pai ou a me, para entender que est acontecendo! O timoneiro e o capito Do meu ponto de vista, mais importante que as conquistas externas de novos mercados, novos clientes, um nome, etc. est a conquista interna, as fronteiras inexploradas que existem dentro da prpria companhia. Isto se deve provavelmente minha experincia como pessoa: uso a meditao e a reflexo para minha prpria evoluo humana. Ou seja, o que sou hoje fruto de uma explorao das minhas capacidades interiores, mais que cortar cabeas e ser heri. Voltando ao ponto anterior, quando a empresa trata os seus empregados (ou clientes internos, ou colaboradores, ou scios, como voc queira) de forma humana, respeitando os quatro pontos antes mencionados, identifica as medusas da organizao e lhes d o cuidado apropriado, a empresa comea a danar. Mas ento surge um novo desafio: como coordenar tanta energia. No sei se inconsciente, mas s vezes me d a impresso que a razo da falta de lderes num mundo cheio de gerentes e chefes o medo de ter mais capites que timoneiros. Os timoneiros levam o barco ao rumo identificado pelo capito; nem mesmo passa pela sua cabea mudar este rumo. So os capites os que devem estar atentos s possveis mudanas. A mesma coisa passa com as empresas: os gerentes e os chefes so pessoas que tradicionalmente devem cuidar da empresa como um patrimnio, sem saltos espetaculares, mas com um progresso constante. Tradicionalmente tambm, cabe ao presidente o papel de capito. Isto funcionou e ainda funciona. Mas novos rumos implica novos capites, ou tavlez que cada um seja um capito do barco. Isto possvel na medida que as empresas adquiram mais flexibilidade menos centralizao, mais delegao de responsabilidade, mais incentivo de participao. Vejamos:

    Menos centralizao. Nos anos oitenta, a palavra descentralizao passou a ser parte de um moderno vocabulrio. Nos anos noventa, empresas que gastaram milhes descentralizando, tentam centralizar novamente, pois perderam o controle. De fato, a descentralizao o mais eficiente: imagina se a sua mo esquerda tivesse que pedir autorizao ao brao para mover-se! Descentralizado, mas controlado. O crebro controla tudo o que pasa e o mesmo pode acontecer com a empresa suas reas so autnomas, devem ser capazes de auto-dirigir-se, auto-administrar-se, mas sob um mesmo crebro e um mesmo corao. Assim, temos que criar um controle bastante eficiente, usando a informtica e pessoas

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    capazes como enlaces (um novo posto na empresa), de tal maneira que as diferentes reas da empresa possa avanar sem mais problemas.

    Mais delegao de responsabilidade. Quando se fala de delegao, a idia a delegao das tarefas. Porm, nos ltimos anos, especialmente a corrente do empowerment, esta filosofia mudou. A idia que as responsabilidades esto aumentando cada vez mais. O caixa do super-mercado hoje uma pessoa quase to importante como o gerente, pois seu manejo dos clientes, sua forma de falar, sua capacidade de perceber alternativas de pagamento e a auditoria da qualidade que pode fazer com os produtos estragados que o cliente, inocentemente, escolheu, tudo isto pode determinar a perda ou a conquista do mercado. Assim que a distribuio adequada da responsabilidade, com a devida educao do staff, faz a empresa um lugar muito mais vivo e atraente.

    Mais participao. Todos querem participar em algo hoje em dia. Se algum no participou das decises tomadas, evitar, consciente ou inconscientemente, ajudar no processo. Mas como fazer numa empresa de cem ou mil pessoas? Perguntar a cada um? Obviamente no soa lgico e parece bastante difcil. Ao focalizar na descentralizao da empresa, porm, j no sero centos de pessoas tendo que tomar uma deciso, mas umas dezenas ou menos. Outra possibilidade que a misso da empresa faa parte da vida das pessoas de forma to intensa que elas sintam que esto participando em tudo o que converja a isto. Mesmo assim, temos que considerar que a misso deve abarcar os desejos, anseios e valores de todas estas pessoas o que mais factvel num ncleo menor.

    Ao desenvolver esta flexibilidade, os muitos capites vo ter espao suficiente para desempenhar e a empresa vai comear a colher os frutos da sua transformao. Novos ventos no sempre so de tempestade Depois de ler este artigo, gostaria que voc fizesse uma pequena reflexo.

    Como est a sua empresa no cenrio local, nacional e internacional? Quantos lderes a sua empresa tem? Por que voc os define como lderes? Que falta empresa para uma transformao substancial da sua forma de ser? Que tipo de ldere pode levar adiante esta transformao? A empresa j o tem?

    O vento sopra forte. Vejo atravs da janela da minha imaginao no um barco sozinho, seno uma frota de barcos, manejado por hbeis timoneiros, dirigidos por excelentes capites. Vejo pessoas contentes e felizes, navegando por diferentes mares. E lembro-me da cano portuguesa que dizia navegar preciso, viver no preciso. E penso: mudar preciso, viver mudar.