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Celso Cunha Lindley Cintra Terceira edição revista Nova Apresentação ti 17 ) A

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  • C e l s o C u n h a L i n d l e y C i n t r a

    Terceira edio revistaN o v a A p r e s e n t a o

    ti17)

    A

  • Esta Gramtica uma descrio do portugus atual em sua forma culta, ou seja, da lngua como a tm utilizado os escritores brasileiros, portugueses e africanos do Romantismo para c, com privilgio concedido aos autores de nossos dias.

    Como pretende ela mostrar a superior unidade da lngua portuguesa dentro da sua natural diversidade, uma ateno particular foi dada s diferenas no uso entre as modalidades nacionais e regionais do idioma, sobretudo as que se observam entre a variedade nacional europia e a americana.

    Houve uma preocupao no s de examinar a palavra em sua forma e em sua funo, de acordo com os princpios da morfossintaxe, mas tambm de salientar e valorizar os meios expressivos do idioma, o que torna este livro, a um tempo, uma gramtica e uma estilstica do portugus contemporneo.

    Termina a obra uma atualizada sntese dos problemas concernentes nossa versificao.

    EDITORANOVA

    FRONTEIRA

    SEMPRE UM BOM

    LIVRO

    3N 85-209-1137-4

  • Gramtica. Do grego, hi: gmmmatikb tkhne, a arte de ler e escrever, ou mais contemporaneamente, o estudo ou tratado que define a estrutura de uma lngua e estabelece regras de normatizao para o seu uso, e tambm assinala as transformaes que ocorrem, durante o perodo de sua existncia, naquela estrutura a partir deste uso.

    Dos gregos aos gramticos e lingistas de hoje, no foram s a especificidade de uma palavra e as caractersticas de um saber que se alteraram profundamente, mas a prpria relao do homem com a lngua e sua maneira de pens-la. De uma gramtica que se confundia com a filosofia e buscava igualmente investigar a adequao dos nomes pela sua capacidade de traduzir a essncia inteligvel dos seres e das coisas a que cies se referiam, passou-se a uma cincia particularizada, que se voltou para um objeto espcdfico, determinado e delimitado, desenvolveu mtodo e nomenclatura prprios, e seI,unificou em subdivises, como a morfologia, .1 lonologia e a sintaxe, para se tornar iiiml.i mais precisa.

    I asi evoluo cientfica compreendeu de liiiin.i abrangente o objeto estudado: identi-I..... e classificaram-se todos os carac-....... das lnguas, seus elementos puderam,i ui.m. let um nome especfico e o compor- l.ilncniii, atravs da histria ou em registros ,|i liinuagucm diferentes, avaliado. Mas, iiiiii i partiSo da unidade lingstica, itiM V,,'ii.i ao conhecimento e fundamental , ui ,< 11 |inin'sso, deixou-se de reconhecer a iiiiliiuM1 hoiiicm-lngua que fazia com quei |i il.is ......... idias e os seres no pudessem

    i pi 11 .,ii lii-, separadamente.

    iluji iiiiii est mais to claro que, na ver-.... . ,i |ii'iiin.itca, talvez muito mais do

    . mu i liolouiu, pode-se caracterizar e . ,i In iulmelite isto , a partir

    nu iiiiii ,i sii,i essncia a espcie i i | i , iiuihi', espues de animais: o

    um ihiin.il que fala, que elabora , ,, , ,i|',ini/.i o seu pensamento em

    iiiii um processo consciente.,,,1111 lnirn.1 minha ptria, no

    ,, ,|m. ,r ii'..i. In,is um espao ml, hiiiiiclii se v como

    CELSO CUNHA LUS F. LINDLEY CINTRA

    Nova Gramtica do Portugus Contemporneo

    3* tullAo I !>" ImpraaiAo

    AM M M I M A

    N O V A f - m i N I M H A

  • 2001 by titulares dos direitos d e Celso Ferreira da C u nha e Luis Filipe Lindley C intra

    D ireitos de edio da obra em ln g u a portuguesa em todo o mundo adquiridos pela E d it o r a N o v a F r o n t e ir a S.A. T o dos os direitos reservados. N en h u m a parte desta obra pode ser apropriada c estocada cm sistem a de banco de dados ou processo similar, cm qualquer form a ou meio, seja eletrnico, de fotocpia, gravao etc., sem a permisso do detentor

    do copirraite.

    E d it o r a N o v a F r o n t e ir a S.A.Rua B am bina, 25 - Botafogo 2 2 2 5 1 -0 5 0Rio de Janeiro - RJ - BrasilT el.: (2 1 ) 2 1 3 1 -1 1 1 1 - Fax: ( 2 1 ) 2 5 3 7 -2 6 5 9http://www.novafronteira.com .br e-m ail: sac@ novafronteira.com .br

    C IP-B rasil. C atalogao-na-fonte Sindicato N acional dos Editores de Livros, R J.

    C 9 7 7 n C u n h a, C e lso , 1 9 1 7 - 1 9 8 9 3_c d. Nova gramtica do portugus contem por

    neo /Celso C unha, Lus F. Lindley C intra. 3 .cd. - Rio de Janeiro : N ova Fronteira, 20 0 1 .

    Inclui b ib liografia IS B N 8 5 - 2 0 9 - 1 1 3 7 -4

    1. Lngua portuguesa G ram tica. I. Cintra,1 ,iis F. Lindley (Lus Filipe Lindley). II. T tulo .

    C D D 4 6 9 .5 C D U 8 0 6 .9 0 .5

    memria de Serafim da Silva Neto, amigo comum e mestre da Filologia Portuguesa.

    A Joseph M. Piei,Jacinto do Prado Coelho,Jos V. de Pina Martins, companheiros e amigos.

  • SUMRIO

    PREFCIO, xxiii

    Captulo 1 - CONCEITOS GERAIS, 1Linguagem, lngua, discurso, estilo, 1

    Lngua e sociedade: variao e conservao lingstica, 2

    Diversidade geogrfica da lngua: dialeto e falar, 4

    A noo de correto, 5

    Captulo 2 - DOMNIO ATUAL DA LNGUA PORTUGUESA, 9Unidade e diversidade, 9

    As variedades do portugus, 1 0Os dialetos do portugus europeu, 11 Os dialetos das ilhas atlnticas, 17 Os dialetos brasileiros, 17

    O portugus de frica, da sia e da Ocenia, 20

    Captulo 3 - FONTICA E FONOLOGIA, 23Os sons da fala, 23

    O aparelho fonador, 23 Funcionamento do aparelho fonador, 24

    Som e fonema, 26Descrio fontica e fonolgica, 27 Transcrio fontica e fonolgica, 28 Alfabeto fontico utilizado, 28

    Classificao dos sons lingsticos, 31Vogais e consoantes, 31 Semivogais, 31

  • Classificao das vogais, 31Articulao, 33 Timbre, 33Intensidade e acento, 34 Vogais orais e vogais nasais, 34 Vogais tnicas orais, 35 Vogais tnicas nasais, 35 Vogais tonas orais, 36

    Classificao das consoantes, 39Modo de articulao, 40O ponto ou zona de articulao, 41O papel das cordas vocais, 42O papel das cavidades bucal e nasal, 43 Quadro das consoantes, 43 A posio das consoantes, 45

    Encontros voclicos, 46Ditongos, 46

    Ditongos decrescentes e crescentes, 46 Ditongos orais e nasais, 47

    Tritongos, 48 Hiatos, 49Encontros intraverbais e interverbais, 49

    Encontros consonantais, 50

    Dgrafos, 51

    Slaba, 52Slabas abertas e slabas fechadas, 52Classificao das palavras quanto ao nmero de slabas, 53

    Acento tnico, 53Classificao das palavras quanto ao acento tnico, 55 Observaes sobre a pronncia culta, 56 Valor distintivo do acento tnico, 57 Acento principal e acento secundrio, 57 Grupo acentuai (ou de intensidade), 58 nclise e prclise, 59 Acento de insistncia, 59

    Acento afetivo, 60 Acento intelectual, 60 Distines fundamentais, 61

    Captulo 4 - ORTOGRAFIA, 63Letra e alfabeto, 63

    Notaes lxicas, 64O acento, 64O til, 65

    v i i i NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    O trema, 65O apstrofo, 65 A cedilha, 65O hfen, 66

    Emprego do hfen nos compostos, 66Emprego do hfen na prefixao, 67Emprego do hfen com as formas do verbo haver, 67Partio das palavras no fim da linha, 67

    Regras de acentuao, 69

    Divergncias entre as ortografias oficialmente adotadas em Portugal e no Brasil, 73

    Captulo 5 - CLASSE, ESTRUTURA E FORMAO DE PALAVRAS, 75

    Palavra e morfema, 75Tipos de morfemas, 76 Classes de palavras, 77

    Estrutura das palavras, 78Radical, 78 Desinncia, 78 Afixo, 79Vogal temtica, 80Vogal e consoante de ligao, 81

    Formao de palavras, 82Palavras primitivas e derivadas, 82 Palavras simples e compostas, 82

    Famlias de palavras, 82

    Captulo 6 - DERIVAO E COMPOSIO, 83Formao de palavras, 83

    Derivao prefixai, 83Prefixos de origem latina, 84 Prefixos de origem grega, 87

    Derivao sufixai, 88 Sufixos nominais, 88 Sufixos verbais, 100 Sufixo adverbial, 101

    Derivao parassinttica, 102 Derivao regressiva, 103 Derivao imprpria, 104 Formao de palavras por composio, 105

    Tipos de composio, 105 Compostos eruditos, 108

    Radicais latinos, 108 Radicais gregos, 109

  • NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Recomposio, 113 Pseudoprefixos, 113

    Hibridismo, 115 Onomatopia, 116 Abreviao vocabular, 116

    Siglas, 116

    Captulo 7 - FRASE, ORAO, PERODO, 119A frase e sua constituio, 119

    Frase e orao, 120 Orao e perodo, 121

    A orao e os seus termos essenciais, 122Sujeito e predicado, 122 Sintagma nominal e verbal, 123

    O sujeito, 124Representao do sujeito, 124 Sujeito simples e sujeito composto, 126 Sujeito oculto (determinado), 127 Sujeito indeterminado, 128 Orao sem sujeito, 129 Da atitude do sujeito, 131

    Com os verbos de ao, 131 Com os verbos de estado, 132

    O predicado, 132Predicado nominal, 132 Predicado verbal, 135

    Verbos intransitivos, 135 Verbos transitivos, 136

    Predicado verbo-nominal, 137 Variabilidade da predicao verbal, 138

    A orao e os seus termos integrantes, 138

    Complemento nominal, 139

    Complementos verbais, 140Objeto direto, 140Objeto direto preposicionado, 142Objeto direto pleonstico, 142Objeto indireto, 143Objeto indireto pleonstico, 145Predicativo do objeto, 146Agente da passiva, 147Transformao da orao ativa em passiva, 148

    A orao e os seus termos acessrios, 149 Adjunto adnominal, 150 Adjunto adverbial, 151

    Classificao dos adjuntos adverbiais, 152

    Aposto, 155Valor sinttico do aposto, 157 Aposto predicativo, 159

    Vocativo, 160

    Colocao dos termos na orao, 162Ordem direta e ordem inversa, 162 Inverses de natureza estilstica, 162 Inverses de natureza gramatical, 163

    Inverso verbo + sujeito, 163 Inverso predicativo + verbo, 167

    Entoao oracional, 167Grupo acentuai e grupo fnico, 168O grupo fnico, unidade meldica, 168O grupo fnico e a orao, 169

    Orao declarativa, 169 Orao interrogativa, 170 Orao exclamativa, 173

    Concluso, 175

    Captulo 8 - SUBSTANTIVO, 177( Classificao dos substantivos, 178

    Substantivos concretos e abstratos, 178 Substantivos prprio-, e comuns, 178 Substantivos coletivos, 178

    Flexes dos substantivos, 180Nmero, 180

    Formao do plural, 181 Gnero, 188

    Quanto significao, 189 Quanto terminao, 190 Formao do feminino, 190 Substantivos uniformes, 195 Mudana de sentido na mudana de gnero, 196 Substantivos masculinos terminados em -a, 197 Substantivos de gnero vacilante, 197

    Grau, 198Valor das formas aumentativas e diminutivas, 198 Especializao de formas, 199

    Emprego do substantivo, 199Funes sintticas do substantivo, 199 Substantivo como adjunto adnominal, 201 Substantivo caracterizador de adjetivo, 202 Substantivo caracterizado por um nome, 203O substantivo como ncleo das frases sem verbo, 203

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Captulo 9 - ARTIGO, 205Artigo definido e indefinido, 205

    Formas do artigo, 206 Formas simples, 206Formas combinadas do artigo definido, 207 Formas combinadas do artigo indefinido, 209

    Valores do artigo, 210A determinao, 210

    Emprego do artigo definido, 212Com os substantivos comuns, 212

    Empregos particulares, 212 Emprego genrico, 216 Emprego em expresses de tempo, 217 Emprego com expresses de peso e medida, 220 Com a palavra casa, 220 Com a palavra palcio , 221 Emprego com o superlativo relativo, 222

    Com os nomes prprios, 223Com os nomes de pessoas, 224 Com os nomes geogrficos, 226 Com os nomes de obras literrias e artsticas, 229

    Casos especiais, 229Antes da palavra outro, 229 Depois das palavras am bos e todo, 230

    Repetio do artigo definido, 233 Com substantivos, 233 Com adjetivos, 234

    Omisso do artigo definido, 235 Emprego do artigo indefinido, 237

    Com os substantivos comuns, 237 Com os nomes prprios, 239

    Omisso do artigo indefinido, 240 Em expresses de identidade, 241 Em expresses comparativas, 242 Em expresses de quantidade, 242 Com substantivo denotador da espcie, 243 Outros casos de omisso do artigo indefinido, 243

    Captulo 10 - ADJETIVO, 245Nome substantivo e nome adjetivo, 246

    Substantivao do adjetivo, 246 Substitutos do adjetivo, 247

    Morfologia dos adjetivos, 248

    Adjetivos ptrios, 248Ptrios brasileiros, 248 Ptrios portugueses, 249

    Ptrios africanos, 249 Adjetivos ptrios compostos, 249

    Flexes dos adjetivos, 250Nmero, 250

    Plural dos adjetivos simples, 251 Plural dos adjetivos compostos, 251

    Gnero, 251Formao do feminino, 252 Adjetivos uniformes, 253 Feminino dos adjetivos compostos, 254

    Graus do adjetivo, 254Comparativo e superlativo, 254 Formao do grau comparativo, 255 Formao do grau superlativo, 255 Comparativos e superlativos anmalos, 260 Adjetivos que no se flexionam em grau, 261

    Emprego do adjetivo, 261Funes sintticas do adjetivo, 261 Valor estilstico do adjetivo, 265

    Concordncia do adjetivo com o substantivo, 270 Adjetivo referido a um substantivo, 270 Adjetivo referido a mais de um substantivo, 271 Adjetivo adjunto adnominal, 271 Adjetivo predicativo de sujeito composto, 273

    Captulo 11 - PRONOMES, 275Pronomes substantivos e pronomes adjetivos, 275

    Pronomes pessoais, 276Formas dos pronomes pessoais, 277 Formas o, lo e no do pronome oblquo, 277 Pronomes reflexivos e recprocos, 279

    Emprego dos pronomes retos, 281Funes dos pronomes retos, 281 Omisso do pronome sujeito, 282 Presena do pronome sujeito, 282 Extenso de emprego dos pronomes retos, 283 Realce do pronome sujeito, 286 Precedncia dos pronomes sujeitos, 287 Equvocos e incorrees, 287Contrao das preposies de e em com o pronome reto da 3.a pessoa, 289

    Pronomes de tratamento, 289Emprego dos pronomes de tratamento da 2.a pessoa, 291 Frmulas de representao da l.a pessoa, 296

    Umprego dos pronomes oblquos, 296Formas tnicas, 296

    S U M R I O X i i

  • Emprego enftico do pronome oblquo tnico, 298 Pronomes precedidos de preposio, 298

    Formas tonas, 300O pronome oblquo tono sujeito de um infinitivo, 302Emprego enftico do pronome oblquo tono, 302O pronome de interesse, 303Pronome tono com valor possessivo, 303Pronomes complementos de verbos de regncia distinta, 304Valores e empregos do pronome se, 305Combinaes e contraes dos pronomes tonos, 308Colocao dos pronomes tonos, 309

    Pronomes possessivos, 318Pronomes pessoais, possessivos e demonstrativos, 318 Formas dos pronomes possessivos, 319 Valores e empregos dos possessivos, 319

    Concordncia do pronome possessivo, 319Posio do pronome adjetivo possessivo, 320Emprego ambguo do possessivo de 3.a pessoa, 321Reforo dos possessivos, 322Valores dos possessivos, 323Valores afetivos, 324Nosso de modstia e de majestade, 326Vosso de cerimnia, 326Substantivao dos possessivos, 327Emprego do possessivo pelo pronome oblquo tnico, 327

    Pronomes demonstrativos, 328Formas dos pronomes demonstrativos, 329Valores gerais, 329Diversidade de emprego, 331Empregos particulares, 332Posio do pronome adjetivo demonstrativo, 333Aluso a termos precedentes, 334Reforo dos demonstrativos, 336Valores afetivos, 336O (s), a(s) como demonstrativos, 340Substitutos dos pronomes demonstrativos, 341

    Pronomes relativos, 342Formas dos pronomes relativos, 342 Natureza do antecedente, 343 Funo sinttica dos pronomes relativos, 344 Pronomes relativos sem antecedente, 346 Valores e empregos dos relativos, 346

    Que, 346 Qual, o qual, 347 Quem, 350 Cujo, 350 Quanto, 351 Onde, 351

    xiv NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Pronomes interrogativos, 352Flexo dos interrogativos, 353 Valor e emprego dos interrogativos, 353

    Que, 353 Quem, 354 Qual, 355 Quanto, 355

    Emprego exclamativo dos interrogativos, 356

    Pronomes indefinidos, 356Formas dos pronomes indefinidos, 357 Locues pronominais indefinidas, 357 Pronomes indefinidos substantivos e adjetivos, 357 Oposies sistemticas entre os indefinidos, 359 Valores de alguns indefinidos, 360

    Algum e nenhum, 360 Cada, 361 Certo, 362 Nada, 363 Outro, 364 Qualquer, 365 Todo, 366 Tudo, 367

    Captulo 12 - NUMERAIS, 369Espcies de numerais, 369

    Numerais coletivos, 370

    Flexo dos numerais, 370Cardinais, 370 Ordinais, 371 Multiplicativos, 371 Fracionrios, 371 Numerais coletivos, 372

    Valores e empregos dos cardinais, 372Cardinal como indefinido, 373Emprego da conjuno e com os cardinais, 373

    Valores e empregos dos ordinais, 373Emprego dos cardinais pelos ordinais, 374

    Emprego dos multiplicativos, 375

    Emprego dos fracionrios, 375

    Quadro dos numerais, 376Numerais cardinais e ordinais, 376 Numerais multiplicativos e fracionrios, 377

    Captulo 13 - VERBO, 379Noes preliminares, 379

  • Flexes do verbo, 380Nmeros, 380 Pessoas, 380 Modos, 380 Tempos, 381 Aspectos, 382 Vozes, 384

    Formas rizotnicas e arrizotnicas, 386

    Classificao do verbo, 386

    Conjugaes, 387Tempos simples, 388

    Estrutura do verbo, 388 Formao dos tempos simples, 389

    Verbos auxiliares e o seu emprego, 394 Distino importante, 396

    Conjugao dos verbos ter, haver, ser e estar, 399 Modo indicativo, 399 Modo subjuntivo, 400 Modo imperativo, 401 Formas nominais, 401

    Formao dos tempos compostos, 402 Modo indicativo, 402 Modo subjuntivo, 403 Formas nominais, 404

    Conjugao dos verbos regulares, 405 Conjugao da voz passiva, 405

    Modo indicativo, 405 Modo subjuntivo, 406 Formas nominais, 407

    Voz reflexiva, 407Verbo reflexivo e verbo pronominal, 408

    Conjugao de um verbo reflexivo, 408 Modo indicativo, 408 Modo subjuntivo, 410 Modo imperativo, 412 Formas nominais, 412

    Conjugao dos verbos irregulares, 413 Irregularidade verbal, 413 Irregularidade verbal e discordncia grfica, 414 Verbos com alternncia voclica, 415 Outros tipos de irregularidade, 422 Verbos de particpio irregular, 441 Verbos abundantes, 442Verbos impessoais, unipessoais e defectivos, 443

    Sintaxe dos modos e dos tempos, 448Modo indicativo, 448

    Emprego dos tempos do indicativo, 448

    x v i NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Modo subjuntivo, 465Indicativo e subjuntivo, 465 Emprego do subjuntivo, 466 Subjuntivo independente, 466 Subjuntivo subordinado, 468 Substitutos do subjuntivo, 472 Tempos do subjuntivo, 473

    Modo imperativo, 476Formas do imperativo, 476 Emprego do modo imperativo, 477 Substitutos do imperativo, 479 Reforo ou atenuao da ordem, 481

    Emprego das formas nominais, 482 Caractersticas gerais, 482 Emprego do infinitivo, 484 Emprego do gerndio, 490 Emprego do particpio, 494

    Concordncia verbal, 496Regras gerais, 497

    Com um s sujeito, 497 Com mais de um sujeito, 497

    Casos particulares, 499 Com um s sujeito, 499 Com mais de um sujeito, 509

    Regncia verbal, 516Regncia, 516 Regncia verbal, 517

    Diversidade e igualdade de regncia, 517 Regncia de alguns verbos, 519

    Sintaxe do verbo haver, 537

    Captulo 14 - ADVRBIO, 541(Massificao dos advrbios, 542

    Advrbios interrogativos, 543 Advrbio relativo, 544 Locuo adverbial, 544

    Colocao dos advrbios, 545

    Repetio de advrbios em -mente, 547

    (iradao dos advrbios, 548Grau comparativo, 548 Grau superlativo, 548Outras formas de comparativo e superlativo, 549 Repetio do advrbio, 551 Diminutivo com valor superlativo, 551 Advrbios que no se flexionam em grau, 551

    Palavras denotativas, 552

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Captulo 15 - PREPOSIO, 555Funo das preposies, 555

    Forma das preposies, 555Preposies simples, 555 Locues prepositivas, 556

    Significao das preposies, 556Contedo significativo e funo relacional, 558

    Relaes fixas, 560 Relaes necessrias, 560 Relaes livres, 561

    Valores das preposies, 562A, 562 Ante, 564 Aps, 565 At, 565 Com, 566 Contra, 567 De, 568 Desde, 569 Em, 570 Entre, 571 Para, 573 Perante, 574 Por (per), 574 Sem, 576 Sob, 576 Sobre, 577 Trs, 578

    Captulo 16 - CONJUNO, 579Conjuno coordenativa e subordinativa, 579

    Conjunes coordenativas, 580Posio das conjunes coordenativas, 581 Valores particulares, 582

    Conjunes subordinativas, 586Conjunes conformativas e proporcionais, 589 Polissemia conjuncional, 590 Locuo conjuntiva, 590

    Captulo 17 - INTERJEIO, 591Classificao das interjeies, 591

    Locuo interjectiva, 591

    Captulo 1 8 - 0 PERODO E SUA CONSTRUO, 593Perodo simples e perodo composto, 593

    ( Composio do perodo, 593

    Caractersticas da oraao principal, 595 Concluso, 596

    Coordenao, 596Oraes coordenadas sindticas e assindticas, 596 Oraes coordenadas sindticas, 596

    Subordinao, 598A orao subordinada como termo de outra orao, 598 Classificao das oraes subordinadas, 600

    Oraes subordinadas substantivas, 600 Oraes subordinadas adjetivas, 601 Oraes subordinadas adverbiais, 604 Oraes reduzidas, 609

    Captulo 19 - FIGURAS DE SINTAXE, 619Elipse, 619

    A elipse como processo gramatical, 620 A elipse como processo estilstico, 622

    Zeugma, 624

    Pleonasmo, 625Pleonasmo vicioso, 625 Pleonasmo e epteto de natureza, 625 Objeto pleonstico, 626

    Hiprbato, 627

    Anstrofe, 627

    Prolepse, 628

    Snquise, 628

    Assndeto, 628

    Polissndeto, 629

    Anacoluto, 630

    Silepse, 631Silepse de nmero, 631 Silepse de gnero, 632 Silepse de pessoa, 633

    Captulo 20 - DISCURSO DIRETO, DISCURSO INDIRETO E DISCURSO INDIRETO LIVRE, 635

    Estruturas de reproduo de enunciaes, 635Discurso direto, 635

    Caractersticas do discurso direto, 636 Discurso indireto, 637

    Caractersticas do discurso indireto, 638 Transposio do discurso direto para o indireto, 639

  • Discurso indireto livre, 641Caractersticas do discurso indireto livre, 642

    Captulo 21 - PONTUAO, 643Sinais pausais e sinais meldicos, 643

    Sinais que marcam sobretudo a pausa, 644 A vrgula, 644O ponto, 650O ponto-e-vrgula, 652 Valor meldico dos sinais pausais, 654

    Sinais que marcam sobretudo a melodia, 655 Os dois-pontos, 655O ponto de interrogao, 656O ponto de exclamao, 657 As reticncias, 659 As aspas, 662 Os parnteses, 665 Os colchetes, 667O travesso, 668

    Captulo 22 - NOES DE VERSIFICAO, 671Estrutura do verso, 671

    Ritmo e verso, 671 Os limites do verso, 672 As ligaes rtmicas, 673

    Sinalefa, eliso e crase, 673 Ectlipse, 674O hiato intervocabular, 675

    A medida das palavras, 676 Sinrese, 676 Direse, 677Crase, afrese, sncope e apcope, 678

    A cesura e a pausa final, 679Cavalgamento ( en jam bem en t), 6800 cavalgamento e a pausa final, 681

    Tipos de verso, 682Os versos tradicionais, 682

    Monosslabos, 682 Disslabos, 683 Trisslabos, 683 Tetrasslabos, 684 Pentasslabos, 684 Hexasslabos, 685 Heptasslabos, 686 Octosslabos, 687 Eneasslabos, 6881 kcasslabos, 689

    Hendecasslabos, 691 Dodecasslabos, 692

    Isossilabismo e versificao flutuante, 694O verso livre, 695

    A rima, 697A rima e o acento, 697 Rima perfeita e rima imperfeita, 698 Rima pobre e rima rica, 700 Combinaes de rimas, 701 Rima interior, 702Indicao esquemtica das rimas, 703 Versos sem rima, 703

    Estrofao, 705O dstico, 705O terceto, 706 A quadra, 706 A quintilha, 706 A sextilha, 707 A estrofe de sete versos, 708 A oitava, 709A estrofe de nove versos, 711 A dcima, 711Estrofe simples e composta, 713 Estrofe livre, 713

    Poemas de forma fixa, 713O soneto, 713

    ELENCO E DESENVOLVIMENTO DAS ABREVIATURAS USADAS, 717

    NDICE ONOMSTICO, 731

    Indice de assuntos, 739

  • PREFCIO

    Esta gramtica foi idealizada h muito tempo, quando, unida a forte amizade, j nos ligava uma convergncia de formao, interesses e objetivos. Sentamo- la como uma urgente necessidade para o ensino da lngua portuguesa no s em Portugal, no Brasil e nas naes lusfonas da frica, mas em todos os pases em que Ne estuda o nosso idioma.

    Parecia-nos faltar uma descrio do portugus contemporneo que levasse em conta, simultaneamente, as diversas normas vigentes dentro do seu vasto domnio geogrfico (principalmente as admitidas como padro em Portugal e no Brasil) e servisse, assim, fosse de fonte de informao, tanto quanto possvel Completa e atualizada, sobre elas, fosse de guia orientador de uma expresso orale, sobretudo, escrita que, para o presente momento da evoluo da lngua, se pudesse considerar correta , de acordo com o conceito de correo que adotamos no captulo 1.

    De ento para c vrias descries importantes do portugus se foram publicando, entre as quais justo destacar a Estrutura da lngua portuguesa, de Joaquim Matoso Cmara Jnior (1969); a G ram tica sim blica do portu - HiiPs, de scar Lopes (1971); a G ram tica portuguesa, de Pilar VzquezCuesta e Maria Albertina Mendes da Luz, mormente a partir da 3.a edio refundida (1971), sobre a qual se fez a traduo portuguesa (1980); e a G ram tica da Hngua portuguesa, de Maria Helena Mira Mateus, Ana Maria Brito, Ins Silva Dunrte e Isabel Hub Faria (1983). Nenhuma no entanto, e por diversas razes, correspondia ao nosso objetivo inicial. A de Pilar Vzquez Cuesta e Maria Albertina Mendes da Luz, apesar do seu rigor e qualidade, considerava iin caractersticas do portugus do ponto de vista de um falante da lngua eupanhola, com todos os inconvenientes (e tambm as vantagens) que isso Implica. A de Matoso Cmara Jnior baseava-se no padro do portugus do

  • NUVA b K A M A T I L A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Brasil1; as outras duas levavam em conta fundamentalmente a norma de Portugal e tinham como objetivo, no propriamente o ensino da lngua portuguesa, mas anlises e reflexes, do maior interesse, sobre a sua estrutura e funcionamento interno, expostas numa linguagem tcnica de difcil acesso para os no iniciados.

    Digno tambm de particular meno pelo seu alto nvel o M anuel de la langue portugaise (Portugal Brsil)2, de Paul Teyssier, obra em que pela primeira vez se apresentam sistematicamente em confronto as normas europia e americana do portugus.

    Por outro lado, um de ns, Celso Cunha, elaborou e publicou em sucessivas edies a sua G ram tica do portugus contem porneo ( l .a ed., 1970 10.a ed., 1983) e a sua G ram tica da lngua portuguesa ( l .a ed., 1972 10.a ed., 1983), que, embora amplamente baseadas, quanto linguagem escrita, tanto em autores portugueses como brasileiros, tinham principalmente em conta a variedade americana e ainda no correspondiam, portanto, ao projeto primitivo.

    Foi esse projeto que h pouco mais de trs anos resolvemos retomar, e o resultado do esforo conjunto a obra que agora apresentamos ao pblico.

    As caractersticas gerais desta N ova gram tica do portugus contem porneo so fceis de definir.

    Trata-se de uma tentativa de descrio do portugus atual na sua forma culta, isto , da lngua como a tm utilizado os escritores portugueses, brasileiros e africanos do Romantismo para c, dando naturalmente uma situao privilegiada aos autores dos nossos dias. No descuramos, porm, dos fatos da linguagem coloquial, especialmente ao analisarmos os empregos e os valores afetivos das formas idiomticas.

    No desejamos discorrer sobre o plano da obra, mas no podemos deixar de fazer uma breve referncia a alguns aspectos metodolgicos.

    Como esta gramtica pretende mostrar a superior unidade da lngua portuguesa dentro da sua natural diversidade, particularmente do ponto de vista diatpico, uma acurada ateno se deu s diferenas no uso entre as modalidades nacionais e regionais do idioma, sobretudo s que se observam entre a variedade nacional europia e a americana.

    No estudo da fontica e da fonologia, procurou-se estabelecer, sempre que possvel, a equivalncia entre os conceitos e a terminologia tradicionais e os da fontica acstica e da fonologia moderna; no estudo das classes de palavras,

    ' I )U88 gramticas dc inegveis mritos e de larga difuso no Brasil - a Gramtica da lngua />(> rliiyiiesa, de Rocha Lima (23.a ed., 1983), e a M oderna gram tica portuguesa, de Evanildo llri hura (27." ed 1982) - so bem anteriores ao nosso projeto.

    1 1' u i I n , Klincksieck, 1976.

    examinou-se a palavra em sua forma e, a seguir, em sua funo, de acordo com os princpios da morfossintaxe.

    Notar-se-, por outro lado, uma permanente preocupao de salientar e valorizar os meios expressivos do idioma, o que torna este livro no apenas uma gramtica, mas, de certo modo, uma introduo estilstica do portugus con temporneo.

    Embora, a rigor, o estudo da versificao no faa parte de uma descrio gramatical, incluiu-se um captulo final sobre o enunciado em verso, complementar, a nosso ver, do estudo da entoao da prosa, a que se deu ateno no captulo 7.

    Toda a obra foi objeto de exame conjunto e de troca de sugestes entre os seus autores. Cumpre-nos, no entanto, dizer, para resguardar as responsabilidades de autoria, que a Lindley Cintra se deve a redao do captulo 2, da maior parte do captulo 3 e do tratamento contrastivo do captulo 13. A Celso Cunha cabe a redao dos demais captulos, bem como a exemplificao aduzida.

    Queremos, por fim, expressar a nossa gratido a todos os que contriburam para que esta obra sasse com menos imperfeies, em particular os nossos colegas Joram Pinto de Lima, Maria do Carmo P. Machado, Edila Viana da Silva, Slvia Figueiredo Brando e Cilene da Cunha Pereira.

    Um agradecimento especial endereamos a Cinira, permanente animadora da obra, pelo penoso trabalho de ajuda na reviso das provas tipogrficas e de confronto textual da verso brasileira com a portuguesa, assim como pela elaborao do ndice Onomstico; a Maurcio Machevsky, por algumas das ilustraes; a Srgio e Sebastio Lacerda, pela confiana e interesse demonstrados desde o incio na execuo do projeto e, finalmente, equipe de Produo da Nova Fronteira pelo paciente cuidado posto na apresentao deste livro.

    Rio de Janeiro, 28 de fevereiro de 1985.C elso C u n h a

    Lus F. L in d le y C in t r a

  • Captulo 1

    Conceitos gerais

    LINGUAGEM, LNGUA, DISCURSO, ESTILO

    1. L in gu agem um conjunto complexo de processos resultado de uma certa atividade psquica profundamente determinada pela vida social que torna possvel a aquisio e o emprego concreto de uma l n g u a qualquer 1. Usa-se tambm o termo para designar todo sistema de sinais que serve de meio de comunicao entre os indivduos. Desde que se atribua valor convencional a determinado sinal, existe uma lin gu agem . lingstica interessa particularmente uma espcie de lin gu agem , o u seja, a lin gu agem fa la d a o u a r t ic u la d a .

    2. L n g u a um sistema gramatical pertencente a um grupo de indivduos. Expresso da conscincia de uma coletividade, a l n g u a o meio por que ela concebe o mundo que a cerca e sobre ele age. Utilizao social da faculdade da linguagem, criao da sociedade, no pode ser imutvel; ao contrrio, tem de viver em perptua evoluo, paralela do organismo social que a criou.

    3. D isc u rso a lngua no ato, na execuo individual. E, como cada indivduo tem em si um ideal lingstico, procura ele extrair do sistema idiomtico de que se serve as formas de enunciado que melhor lhe exprimam o gosto e o pensamento. Essa escolha entre os diversos meios de expresso

    1 Tatiana Slama-Casacu. Langage et contexte. Haia, Mouton, 1961, p. 20.

  • N O V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    que lhe oferece o rico repertrio de possibilidades, que a lngua, denomi- na-se e s tilo .2

    4. A distino entre l in g u a g e m , l n g u a e d isc u rso , indispensvel do ponto de vista metodolgico, no deixa de ser em parte artificial. Em verdade, as trs denominaes aplicam-se a aspectos diferentes, mas no opostos, do fenmeno extremamente complexo que a comunicao humana.

    A interdependncia desses aspectos, salienta-a Tatiana Slama-Casacu, ao escrever: A l n g u a a criao, mas tambm o fundamento da l in gu agem que no poderia funcionar sem ela ; , simultaneamente, o instrumento e o resultado da atividade de comunicao. Por outro lado, a lin gu agem no pode existir, manifestar-se e desenvolver-se a no ser pelo aprendizado e pela utilizaao de uma l n g u a qualquer. A mais freqente forma de manifestao da l in g u a gem constituda de uma complexidade de processos, de mecanismos, de meios expressivos a lin gu a gem fa la d a , concretizada no d iscu rso , o u seja, a realizao verbal do processo de comunicao. O d iscu rso um dos aspectos da lin gu a gem o mais importante e, ao mesmo tempo (...), a forma concreta sob a qual se manifesta a l n g u a . O d iscu rso define-se, pois, como o ato de utilizao individual e concreto da l n g u a no quadro do processo complexo da lin gu agem . O s trs termos estudados lin gu agem , l n g u a , d iscu rso designam no fundo trs aspectos, diferentes mas estritamente ligados, do mesmo processo unitrio e complexo. 3

    LNGUA E SOCIEDADE: VARIAO E CONSERVAO LINGUISTICA

    Embora desde princpios deste sculo lingistas como Antoine Meillet e Ferdinand de Saussure tenham chegado a configurar a lngua como um fato social, rigorosamente enquadrado na definio dada por Emile Durkheim , s nos ltimos vinte anos, com o desenvolvimento da s o c io l in g s t ic a , as relaes entre a lngua e a sociedade passaram a ser caracterizadas com maior preciso.

    2 Aceitando a distino de Jules Marouzeau, podemos dizer que a l n g u a a soma dos meios de expresso de que dispomos para formar o enunciado e o e s t il o o aspecto e a qualidade que resultam da escolha entre esses meios de expresso (Prcis de stylistique franaise, 2. ed. Paris, Masson, 1946, p. 10).

    3 Obra cit., p. 20.1 Veiam-se Antoine Meillet. Linguistique historique et linguistique gnrale, 2 ed. Paris,

    Champion, 1926, p. 16, 230 passinv, Ferdinand de Saussure. Cours de linguistique gnrale, dition critique prpare par Tullio de Mauro. Paris, Payot, 1973, p. 31.

    CO NCEITO S G E R A IS

    A sociolingstica, ramo da lingstica que estuda a lngua como fenmeno social e cultural, veio mostrar que estas inter-relaes so muito complexas e podem assumir diferentes formas. Na maioria das vezes, comprova-se uma covariao do fenmeno lingstico e social. Em alguns casos, no entanto, faz mais sentido admitir uma relao direcional: a influncia da sociedade na lngua, ou da lngua na sociedade.

    , pois, recente a concepo de lngua como instrumento de comunicao social, malevel e diversificado em todos os seus aspectos, meio de expresso de indivduos que vivem em sociedades tambm diversificadas social, cultural e geograficamente. Nesse sentido, uma lngua histrica no um sistema lingstico unitrio, mas um conjunto de sistemas lingsticos, isto , um d iassistem a , no qual se inter-relacionam diversos sistemas e subsistemas. Da o estudo de uma lngua revestir-se de extrema complexidade, no podendo prescindir de uma delimitao precisa dos fatos analisados para controle das variveis que atuam, em todos os nveis, nos diversos eixos de diferenciao. A variao sistemtica est, hoje, incorporada teoria e descrio da lngua.

    Em princpio, uma lngua apresenta, pelo menos, trs tipos de diferenas internas, que podem ser mais ou menos profundas:1) diferenas no espao geogrfico, ou v aria e s d ia t p ic a s (falares locais, va

    riantes regionais e, at, intercontinentais);2 ) d ife ren as en tre as cam adas soc io cu ltu ra is , o u va ria e s d ias tr t ic a s (n v e l

    cu lto , ln g u a p a d r o , n v e l p op u la r , e tc .);

    3o) diferenas entre os tipos de modalidade expressiva, ou v aria e s d iafsic as5 (lngua falada, lngua escrita, lngua literria, linguagens especiais, linguagem dos homens, linguagem das mulheres, etc.).

    A partir da nova concepo da lngua como d iassiste m a , tornou-se possvel o esclarecimento de numerosos casos de polimorfismo, de pluralidade de normas e de toda a inter-relao dos fatores geogrficos, histricos, sociais e psicolgicos que atuam no complexo operar de uma lngua e orientam a sua deriva.

    Condicionada de forma consistente dentro de cada grupo social e parte integrante da competncia lingstica dos seus membros, a variao , pois, inerente ao sistema da lngua e ocorre em todos os nveis: fontico, fonolgico, morfolgico, sinttico, etc. E essa multiplicidade de realizaes do sistema em nada prejudica as suas condies funcionais.

    Veja-se Eugenio Coseriu. Structure lexicale et enseignement du vocabulaire. In Actes du premier Colloque International de Linguistique Applique. Nancy, Universit de Nancy, 1966, p. 199.

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Todas as variedades lingsticas so estruturadas, e correspondem a sistemas e subsistemas adequados s necessidades de seus usurios. Mas o fato de estar a lngua fortemente ligada estrutura social e aos sistemas de valores da sociedade conduz a uma avaliao distinta das caractersticas das suas diversas modalidades diatpicas, diastrticas e diafsicas. A lngua padro, por exemplo, embora seja uma entre as muitas variedades de um idioma, sempre a mais prestigiosa, porque atua como modelo, como norma, como ideal lingstico de uma comunidade. Do valor normativo decorre a sua funo coercitiva sobre as outras variedades, com o que se torna uma pondervel fora contrria variao.

    Numa lngua existe, pois, ao lado da fora centrfuga da inovao, a fora centrpeta da conservao, que, contra-regrando a primeira, garante a superior unidade de um idioma como o portugus, falado por povos que se distribuem pelos cinco continentes.

    DIVERSIDADE GEOGRFICA DA LNGUA: DIALETO E FALAR

    As formas caractersticas que uma lngua assume regionalmente denomi- nam-se d iale to s .

    Alguns lingistas, porm, distinguem, entre as variedades diatpicas, o fa la r DO DIALETO.

    D ia le to seria u m s istem a d e sinais d esga rrad o d e u m a ln gu a c o m u m , v iv a

    o u d esap arec id a ; n o rm a lm e n te , c o m u m a c on c re ta d e lim ita o g eo g r fic a , m as

    sem u m a fo r te d ife re n c ia o d ia n te d os o u tro s d a m e sm a o r ig e m . D e m o d o

    s ecu n d rio , p o d e r -s e - ia m ta m b m ch a m a r d ia le to s as estru tu ras lin g s ticas ,

    s im u ltn eas d e o u tra , q u e n o a lcan am a c a te g o r ia d e l n g u a 6.

    F a la r seria a peculiaridade expressiva prpria de uma regio e que no apresenta o grau de coerncia alcanado pelo dialeto. Caracterizar-se-ia, do ponto de vista diacrnico, segundo Manuel Alvar, por ser um dialeto empobrecido, que, tendo abandonado a lngua escrita, convive apenas com as manifestaes orais. Poder-se-iam ainda distinguir, dentro dos falares r e g io n a is , os falares lo c a is , que, para o mesmo lingista, corresponderiam a subsistemas idiomticos de traos pouco diferenciados, mas com matizes prprios dentro da estrutura regional a que pertencem e cujos usos esto limitados a pequenas circunscries geogrficas, normalmente com carter administrativo7.

    6 Manuel Alvar. Hacia los conceptos de lengua, dialecto y hablas. Nneva Revista de Filologia Hispnica, 15:57, 1961.

    1 Itl., ibid., p. 60.

    C O N C E I T O S G E R A I S 5

    No entanto, vista da dificuldade de caracterizar na prtica as duas modalidades diatpicas, empregaremos neste livro e particularmente no captulo seguinte o termo d ia l e t o no sentido de variedade regional da lngua, no importando o seu maior ou menor distanciamento com referncia lngua padro.

    A NOO DE CORRETO

    Uma gramtica que pretenda registrar e analisar os fatos da lngua culta deve fundar-se num claro conceito de norma e de correo idiomtica. Permitimo-nos, por isso, uma ligeira digresso a respeito deste controvertido tema.

    Os progressos dos estudos lingsticos vieram mostrar a falsidade dos postulados em que a gramtica logicista e a latinizante esteavam a correo idiomtica e, com isso, deixaram o preceptismo gramatical inerme diante da reao anticorretista que se iniciou no sculo passado e que vem assumindo, em nossos dias, atitudes violentas, no raro contaminadas de radicalismo ideolgico.8

    Por outro lado, idia, sempre renovada, de que o povo tem o poder criador e a soberania em matria de linguagem associa-se, naturalmente, outra a de considerar elemento perturbador ou estril a interferncia da fora conservadora ou repressiva dos setores cultos.

    Contra essa concepo demolidora do edifcio gramatical, pacientemente construdo desde a poca alexandrina com base na analogia, levantam-se alguns lingistas modernos, procurando fundamentar a correo idiomtica em fatores mais objetivos.

    Dessa nova linha de preocupaes foi precursor Adolf Noreen, o lingista sueco a cujas idias geniais hoje se comea a fazer justia.9

    Para Noreen h trs critrios principais de correo, por ele denominados histrico-literrio, histrico-natural e racional, o ltimo, obviamente, o seu preferido.

    De acordo com o critrio histrico-literrio, a correo estriba-se essencialmente em conformar-se com o uso encontrado nos escritores de uma po-

    " Veja-se, a propsito, Angel Rosenblat. El critrio de correccin lingstica: un idad y pluralidad de normas en el espanol de Espana y Amrica. Separata de P.I.L.E.I. El Simposio de Indiana. Bogot, Instituto Caro y Cuervo, 1967, p. 27. Consulte-se tambm Celso Cunha. Lngua portuguesa e realidade brasileira, 8.a ed. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1981, p. 35-39, texto em parte aqui reproduzido.

    * Leiam-se Bjrn Collinder, Les origines du structuralisme, Stockholm - Gteborg - Upsala, Almqvist & Wiksell, 1962, p. 6 e ss.; Bertil Malmberg. Les nouvelles tendances de la linguistique, Irad. por Jacques Gengoux. Paris, P.U.F., 1966, p. 42, 52-55, 130, 184-186, 197, 279.

  • 6 NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    ca pretrita , em geral escolhida arbitrariamente. o critrio tradicional de correo, fundado no exemplo dos clssicos.

    O segundo critrio, o histrico-natural de Noreen e que Jespersen prefere chamar anrquico, baseia-se na doutrina, a que nos referimos, de que a linguagem um organismo que se desenvolve muito melhor em estado de completa liberdade, sem entraves. Dentro desse ponto de vista no pode haver, em princpio, nada correto ou incorreto na lngua.

    Depois de deixar patente o carter arbitrrio do primeiro critrio e o absurdo do segundo, se levado a suas naturais conseqncias, Noreen tenta justificaro nico que resta, o dele Noreen, expresso na frmula: o melhor o que pode ser apreendido mais exata e rapidamente pela audincia presente e pode ser produzido mais facilmente por aquele que fala ; ou no enunciado mais sinttico de Flodstrm: o melhor a forma de falar que rene a maior simplicidade possvel com a necessria inteligibilidade 10.

    Jespersen considera a frmula de Noreen oportunista, individualista, atomstica, pois que divide demasiado a comunidade lingstica em indivduos particulares e olvida excessivamente o conjunto 11.

    Em nome de que princpio se corrige, ento, o falar de uma pessoa? Por que uma criana aprende de seus pais que no deve dizer sube por soube, fazerei por fa re i e, medida que vai crescendo em anos, continua a ter o seu comportamento lingstico ora corrigido por outros, ora por esforo prprio?

    Para Jespersen nenhum dos critrios anteriormente lembrados e enumera sete: o da autoridade, o geogrfico, o literrio, o aristocrtico, o democrtico,o lgico e o esttico o explica. evidente, no entanto, que existe algo que justifica a correo, algo comum para o que fala e para o que ouve, e que lhes facilita a compreenso. Este elemento comum a norma lingstica que ambos aceitaram de fora, da comunidade, da sociedade, da nao 12.

    Todo o nosso comportamento social est regulado por normas a que devemos obedecer, se quisermos ser corretos. O mesmo sucede com a linguagem, apenas com a diferena de que as suas normas, de um modo geral, so mais complexas e mais coercitivas. Por isso, e para simplificar as coisas, Jespersen define o lingisticamente correto como aquilo que exigido pela comunidade lingstica a que se pertence. O que difere o lingisticamente incorreto . Ou, com suas palavras: fa la r correto significa o falar que a comunidade espera, e erro em linguagem equivale a desvios desta norma, sem relao alguma com o

    111 Citados por Otto Jespersen. Humanidad, nacin, individuo, desde el punto de vista lin-Kstico, trad, por Fernando Vela. Buenos Aires, Revista de Occidente, 1947, p. 113 e 114.

    11 < )bm dl., p. 120. Ibid,, p. 120 e ss.

    CO NCEITO S (il K A IS 7

    valor interno das palavras ou formas . Reconhece, porm, que, independente mente disso, existe uma valorizao da linguagem na qual o seu valor se mede com referncia a um ideal lingstico , para cuja formao colabora eficazmente a frmula energtica de que o mais facilmente enunciado o que se recebe mais facilmente 13.

    Entre as atitudes extremadas dos que advogam o rompimento radical com as tradies clssicas da lngua e dos que aspiram a sujeitar-se a velhas normas gramaticais , h sempre lugar para uma posio moderada, termo mdio que represente o aproveitamento harmnico da energia dessas foras contrrias e que, a nosso ver, melhor consubstancia os ideais de uma s e eficaz poltica educacional e cultural dos pases de lngua portuguesa.

    Na linguagem importante o plo da variedade, que corresponde expresso individual, mas tambm o o da unidade, que corresponde comunicao interindividual e garantia de intercompreenso. A linguagem expressao indivduo por seu carter de criao, mas expressa tambm o ambiente social e nacional, por jeu carter de repetio, de aceitao de uma norma, que ao mesmo tempo histrica e sincrnica: existe o falar porque existem indivduos que pensam e sentem, e existem lnguas como entidades histricas e como sistemas e normas ideais, porque a linguagem no s expresso, finalidade em si mesma, seno tambm comunicao, finalidade instrumental, expresso para outro, cultura objetivada historicamente e que transcende ao indivduo 14.

    A hiptese da linguagem monoltica no se assenta numa realidade, e a sua corporificao nas gramticas no tem sido benfica ao ensino dos diversos idiomas. Sem nenhuma dvida, escreve Roman Jakobson, para qualquer comunidade lingstica, para todo indivduo falante existe uma unidade de lngua, mas esse cdigo global representa um sistema de subcdigos em comuni- caao recproca; cada lngua abarca vrios sistemas simultneos, cada um dos quais se caracteriza por uma funo diferente 15.

    Se uma lngua pode abarcar vrios sistemas, ou seja, as formas ideais de sua realizao, a sua dinamicidade, o seu modo de fazer-se, pode tambm admitir vrias normas, que representam modelos, escolhas que se consagraram dentro das possibilidades de realizaes de um sistema lingstico. Mas pondera

    " Ibid., p. 178.

    Hugenio Coseriu. La geografia lingstica. Montevideo. Universidad de la Repblica, 1956,p. 44-45. A propsito, consultem-se tambm os magistrais estudos do autor: Sistemanorma y habla e Determinacin y entorno, agora enfeixados no volume Teoria dei lem uaiey lingustica general. Madrid, Gredos, 1962, p. 11-113 e 282-323.

    Closing Statement: Linguistics and Poetics. In Style in Language. Edited by Thomas A Sebeok. New York-London, M.I.T. & John Wiley, 1960, p. 352.

  • NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Eugnio Coseriu, o lcido mestre de Tbingen se um sistema de realizaes obrigatrias, consagradas social e culturalmente, a norma no corresponde, como pensam certos gramticos, ao que se pode ou se deve dizer, mas ao que j se disse e tradicionalmente se diz na comunidade considerada 16.

    A norma pode variar no seio de uma mesma comunidade lingstica, seja de um ponto de vista diatpico (portugus de Portugal / portugus do Brasil / portugus de Angola), seja de um ponto de vista diastrtico (linguagem culta / linguagem mdia / linguagem popular), seja, finalmente, de um ponto de vista diafsico (linguagem potica / linguagem da prosa).17

    Este conceito lingstico de norma, que implica um maior liberalismo gramatical, o que, em nosso entender, convm adotarmos para a comunidade de fala portuguesa, formada hoje por sete naes soberanas, todas movidas pela legtima aspirao de enriquecer o patrimnio comum com formas e construes novas, a patentearem o dinamismo do nosso idioma, o meio de comunicao e expresso, nos dias que correm, de mais de cento e cinqenta milhes de indivduos.

    No se repreende de leve num povo o que geralmente agrada a todos, disse com singeleza o poeta Gonalves Dias. Com efeito, por cima de todos os critrios de correo aplicveis nuns casos, inaplicveis noutros paira o da aceitabilidade social, a consuetudo de Varro, o nico vlido em qualquer circunstncia.

    justamente para chegarem a um conceito mais preciso de correo em cada idioma que os lingistas atuais vm tentando estabelecer mtodos que possibilitem a descrio minuciosa de suas variedades cultas, seja na forma falada, seja na escrita. Sem investigaes pacientes, sem mtodos descritivos aperfeioados nunca alcanaremos determinar o que, no domnio da nossa lngua ou de uma rea dela, de emprego obrigatrio, o que facultativo, o que tolervel, o que grosseiro, o que inadmissvel; ou, em termos radicais, o que e o que no correto.

    Slncroiii, diacrona e historia: el problema dei cam bio lingstico, 2.a ed. Madrid, Gredos, 1973, p. 55.

    1 ' NC ( :dso ( Ainha. Lngua, nao, alienao. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, p. 73-74 e ss.

    Captulo 2

    Domnio atual da lngua portuguesa

    UNIDADE E DIVERSIDADE

    Na rea vastssima e descontnua em que falado, o portugus apresenta-se, como qualquer lngua viva, internamente diferenciado em variedades que divergem de maneira mais ou menos acentuada quanto pronncia, gramtica e ao vocabulrio.

    Embora seja inegvel a existencia de tal diferenciao, no ela suficiente para impedir a superior unidade de nosso idioma, fato, alis, salientado at pelos dialectlogos.

    Com relao a Portugal, observa o professor Manuel de Paiva Bolo: Uma pessoa, mesmo alheia a assuntos filolgicos, que haja percorrido Portugal de norte a sul e conversado com gente do povo, no pode deixar de ficar impressionada com a excepcional homogeneidade lingstica do Pas e a sua escassa diferenciao dialectal ao contrrio do que sucede noutros pases, quer de lngua romnica, quer germnica 1.

    Com referncia situao lingstica do Brasil, escreve Serafim da Silva Neto:f. preciso ter na devida conta que unidade no igualdade; no tecido lingsti

    co brasileiro, h, decerto, gradaes de cores. Minucioso estudo de campo determinaria, com segurana, vrias reas. O que certo, porm, que o conjunto dos falares brasileiros se coaduna com o princpio da unidade na diversidade eda diversidade na unidade2.

    1 Manuel de Paiva Bolo e Maria Helena Santos Silva. O Mapa dos dialectos e falares de Portugal Continental . Boletim de Filologia, 20:85, 1961.

    Introduo ao estudo da lngua portuguesa no Brasil, 2.a ed. Rio de Janeiro MEC/1NI 1963, p. 271.

  • NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    AS VARIEDADES DO PORTUGUS

    Excetuando-se o caso especial dos c r io u lo s , que estudaremos adiante, temos, pois, de reconhecer esta verdade: apesar da acidentada histria que foi a sua expanso na Europa e, principalmente, fora dela, nos distantes e extensssi- mos territrios de outros continentes, a lngua portuguesa conseguiu manter at hoje aprecivel coeso entre as suas variedades por mais afastadas que se encontrem no espao.

    A diversidade interna, contudo, existe e dela importa dar uma viso tanto quanto possvel ordenada.3

    OS DIALETOS DO PORTUGUS EUROPEU

    A faixa ocidental da Pennsula Ibrica ocupada pelo galego-portugus apresenta-nos um conjunto de d iale to s que, de acordo com certas caractersticas diferenciais de tipo fontico, podem ser classificados em trs grandes grupos:a) d ialeto s g aleg o s ;b) d iale to s portugueses s e te n tr io n a is ;c) d ialeto s po rtugueses c e n t r o - m e r id io n a is .4

    Esta classificao parece ser apoiada pelo sentimento dos falantes comuns do portugus-padro europeu, isto , dos que seguem a n o r m a ou conjunto dos usos lingsticos das classes cultas da regio Lisboa Coimbra, e que distinguiro pela fala um galego, um homem do Norte e um homem do Sul.

    3 Veja-se, sobre o conjunto das variedades do portugus, a Bibliografia dialectal galego- portuguesa. Lisboa, Centro de Estudos Filolgicos, 1974. Sobre o portugus do Brasil, em particular, possumos hoje uma bibliografia muito completa: W olf Dietrich. Bibliografia da lngua portuguesa do Brasil. Tbingen, Gunter Narr, 1980.

    4 Quanto classificao dialetal aqui adotada, veja-se Lus Filipe Lindley Cintra. Nova proposta de classificao dos dialectos galego-portugueses. Boletim de Filologia, 22:81- 116, Lisboa, 1971. Entre as classificaes anteriores, duas merecem realce particular: a de Jos Leite de Vasconcelos e a de Manuel de Paiva Bolo e Maria Helena Santos Silva. A de Leite de Vasconcelos, baseada na diviso de Portugal em provncias, mais geogrfica do que lingstica. Foi publicada, inicialmente, no seu M appa dialectologico do continente portugus (Lisboa, Guillard, Aillaud, 1897), depois reproduzida na Esquisse d une dialectologie portugaise (Paris-Lisboa, Aillaud, 1901; 2.a ed., com aditamentos e correes do autor, preparada por Maria Adelaide Valle Cintra, Lisboa, Centro de Estudos Filolgicos, 1970) e, com alteraes, nos Opsculos, IV, Filologia, parte II (Coimbra, 1929, p. 791 -796). A de Manuel de Paiva Bolo e Maria Helena Santos Silva, exposta em: ( ) "Mapa dos dialetos e falares de Portugal Continental ( Boletim de Filologia, 20: 85-I 12, l.isboa, 1961), assenta-se em fatos lingsticos, principalmente fonticos, que se loNNom apresentados numa certa e possvel hierarquizao permitiriam talvez um maisi litro agrupamento das variedades.

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U E S A

    A distino funda-se principalmente no sistema das sib ilantes .Assim:

    1. Nos dialetos galegos no existe a sibilante sonora /z/: rosa articula-se com a mesma sibilante [?] ou [s] (surda) de passo; fazer, com a mesma sibilante [9] ou [s] (surda) de caa. Inexiste tambm a fricativa palatal sonora [3 ] grafada em portugus j ou g (antes de e ou i). Em galego, hoxe tem a mesma fricativa [J] de enxada.

    2. Nos dialetos portugueses setentrionais existe a sibilante pico-alveolar [?] , idntica do castelhano setentrional e padro, em palavras como seis, passo. A ela corresponde a sonora [?] de rosa.Em alguns dialetos mais conservadores coexistem com estas sibilantes as pr-dorsodentais [s] (em cinco, caa) e [z] (em fazer), que, noutros dialetos, com elas se fundiram, provocando a igualdade da sibilante de cinco e caa com a que aparece em seis e passo, ou seja [?], bem como a da de fa z er com a que se ouve em rosa, isto [?].

    3. Nos dialetos portugueses centro-meridionais s aparecem as sibilantes pr- dorsodentais que caracterizam a lngua padro:

    a) a surda [s], tanto em seis e passo como em cinco e caa;5b) a sonora [z], tanto em rosa como em fazer.

    As fronteiras entre as trs zonas mencionadas atravessam a faixa galego- portuguesa de oeste a leste, ou, mais precisamente, no caso da fronteira entre dialetos portugueses setentrionais e centro-meridionais, de noroeste a sueste.

    Mas h outros traos importantes em que a referida distino se fundamenta, sem que, no entanto, as suas fronteiras coincidam perfeitamente com as das caractersticas j indicadas.

    So eles:a) a pronncia como [b] ou [b] do v grfico (emitido como labiodental na

    pronncia padro e na centro-meridional) na maior parte dos dialetos portugueses setentrionais e na totalidade dos dialetos galegos: binho, ab por vinho, av;

    b) a pronncia como africada palatal [ t J| do ch da grafia (emitido como fricativa [J] na pronncia padro e em quase todos os dialetos centro-meridionais) na maior parte dos dialetos portugueses setentrionais e na totalidade dos dialetos galegos: tchave, atchar por chave, achar,

    Pronncia semelhante do francs ou do italiano padro, do castelhano meridional e do hispano-americano.

  • NOV A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Alguns traos fonticos diferenciados dos dialetos galego-portugueses

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U E S A

    DIALETOS GALEGOS

    galego ocidental

    galego oriental

    DIALETOS PORTUGUESES SETENTRIONAIS

    --dialetos transmontanos ealto-minhotos

    - - dialetos baixo-minhotos-

    durienses-beires

    DIALETOS PORTUGUESES CENTRO-MERIDIONAIS

    dialetos do centro-litoral

    ------- dialetos do centro-interior e do sul

    Limite de regio subdialectal com

    caractersticas peculiares bem

    diferenciadas

    100 km

    Classificao dos dialetos galego-portugueses

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    1. Entre moger (e outras formas em -er) e mugir, mojar e afins; 2. Entre bere e amojo; 3. Entre anho e cordeiro-,4. Entre espiga e maaroca;A primeira das formas citadas fica sempre ao Norte e a Oeste da segunda;5. rea de recobrimento das formas mais arcaicas;6. rea de almece; no resto do pas diz-se soro, exceto no Minho onde no se usa nenhuma designao.

    Alguns [imites lexicais

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U L S A

    c) a monotongao ou no monotongao dos ditongos [ow] e [ej]: a pronncia [o] e [e] desses ditongos (por exemplo: ru por ouro, ferrro por ferreiro) caracteriza os dialetos portugueses centro-meridionais e, no caso de [o], a pronncia padro perante os dialetos portugueses setentrionais e os dialetos galegos.6

    Merecem meno especial mesmo numa apresentao panormica dos dialetos portugueses trs regies em que, a par dos traos gerais que acabamos de apontar, aparecem caractersticas fonticas peculiares que afastam muito vincadamente os dialetos nelas falados de todos os outros do mesmo grupo.

    Trata-se, em primeiro lugar, de uma regio (dentro da zona dos dialetos setentrionais) em que se observa regularmente a ditongao de [e] e [o] acentuados: pjeso por peso, pw orto por porto. Abrange uma grande parte do Minho e do Douro Litoral, incluindo o falar popular da cidade do Porto e de seus arredores.

    Em segundo lugar, temos uma extensa rea da Beira Baixa e do Alto Alentejo (compreendendo uma faixa pertencente aos dialetos setentrionais, mas, principalmente, uma vasta zona dos dialetos centro-meridionais) em que se registra uma profunda alterao do timbre das vogais. Os traos mais salientes so:a) a articulao do u tnico como [] (prximo do u francs), por exemplo: [t], ['mla], por tu, mula; b) a representao do antigo ditongo grafado ou por [] (tambm semelhante ao som correspondente do francs), por exemplo: | pka] por pouca; c) a queda da vogal tona final grafada -o ou sua reduo ao som [9], por exemplo: cop (3), cop (d)s, por copo, copos; td (3) por tudo.

    Por fim, no ocidente do Algarve situa-se outra regio em que se observam coincidncias com a anteriormente mencionada, no que se refere s vogais. Em lugar de w, encontramos []: [t], ['mla] (mas o ou est representado por [o]). Por outro lado, o a tnico evolveu para um som semelhante ao o aberto: bata pronunciado quase bota, alterao de timbre que no estranha a alguns lugares da mencionada zona da Beira Baixa e Alto Alentejo, embora seja a mais Ireqente a passagem, em determinados contextos fonticos, de a a um som [] semelhante a e aberto [e], por exemplo: afilhdo por afilhado, fu m r p or fum ar. A vogal tona grafada o tambm cai ou se reduz a [3]: cop{3), cop(3 )s, por copo, copos; td(d) por tudo.

    " Com referncia ao ditongo [ej], a pronncia padro e a de Lisboa (neste caso uma ilhota de conservao ao sul) coincidem com os dialetos setentrionais na sua manuteno. Note- se contudo que, devido a um fenmeno de diferenciao entre os dois elementos do ditongo, este se transformou na referida pronncia em [cxj].

  • 16 NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    No so, porm, apenas traos fonticos que permitem opor os diversos grupos de dialetos galego-portugueses. Se, no que diz respeito a particularidades morfolgicas e sintticas, a grande variedade e irregularidade na distribuio parece impedir um delineamento de reas que as tome como base7, j no que se refere distribuio do lxico podemos observar, ainda que num restrito nmero de setores e casos, certas regularidades. No raro, por exemplo, que os dialetos centro-meridionais se oponham aos setentrionais e aos galegos por neles se designar um objeto ou noo com um termo de origem rabe enquanto nos ltimos permanece o descendente da palavra latina ou visigtica. o caso da oposio alm ece / soro (do queijo), ceifar / segar.

    Talvez ainda mais freqente seja a oposio lexical entre os dialetos do sul e leste de Portugal, caracterizados por inovaes vocabulares de vrios tipos, e os dialetos do noroeste e centro-norte, que, como os galegos, se distinguem pelo conservadorismo, pela manuteno de termos mais antigos na lngua. o caso da oposio de ord en h ara moger, m u gire am ojar, de am ojo a bere-, de borrego a cordeiro e a anho-, de chibo a cabrito; de m aaroca a espiga (de milho), etc.

    Advirta-se, por fim, que em relao a muitas outras noes grande a variedade terminolgica na faixa galego-portuguesa, sem que se observe este ou qualquer outro esquema regular de distribuio. que a distribuio dos tipos lexicais depende de numerosssimos fatores, no s lingsticos, mas sobretudo histrico-culturais e sociais, que variam de caso para caso. A regularidade atrs observada parece depender, em alguns casos, da ao de um mesmo fator histrico: a Reconquista aos mouros do Centro e do Sul do territrio portugus, movimento que teria criado o contraste entre uma Galiza e um Portugal do Noroeste para Oeste mais conservadores, porque de povoamento antigo, e um Portugal do Nordeste, Este e Sul mais inovador, justamente o que foi repovoado em conseqncia daquele acontecimento histrico.8 Trata-se, alis, de um contraste que tem o seu paralelo na histria da arte. Ao Norte, resistncia do estilo romntico, enquanto ao Sul, a partir do sculo XIII, se acentua progressivamente a penetrao e a expanso do estilo gtico.

    ' Quando muito, poder-se- dizer, por exemplo, que certos traos, como os perfeitos em -i da Iconjugao ( lavi por lavei, canti por cantei), so exclusivamente centro-meridionais.

    Vcja-se, a este respeito, principalmente, Lus F. Lindley Cintra. reas lexicais no territrio portugus. Boletim de Filologia, 20: 273-307, 1961; e Orlando Ribeiro. A propsito de Arcns lexicais no territrio portugus. Boletim de Filologia, 21: 177-205, 1962-1963 (artigos reproduzidos em Lus F. Lindley Cintra. Estudos de dialectologia portuguesa. Lisboa, Sil dil ( Insta, 1983, p. 55-94 e 165-202).

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U E S A 17OS DIALETOS DAS ILH AS ATLNTICAS

    Os dialetos falados nos arquiplagos atlnticos dos Aores e da Madeira representam como era de esperar da histria do povoamento destas ilhas, desertas no momento em que os portugueses as descobriram um prolongamento dos dialetos portugueses continentais.

    Considerando a maior parte das caractersticas fonticas que neles se observam, pode-se afirmar, com maior preciso, que prolongam o grupo dos dialetos centro-meridionais. Com efeito, no se encontram nos dialetos aorianos e madeirenses nem o [?] pico-alveolar, nem a neutralizao da oposio entre | v| e [b], nem a africada [ tf | dos dialetos setentrionais do continente. Quanto monotongao dos ditongos decrescentes [ow] e [ej], observam-se as mesmas tendncias da lngua padro: o ditongo [ow] reduz-se normalmente a [o], mas a reduo de [ej] a [e] fenmeno espordico; s ocorre como norma na ilha de So Miguel.

    Esta ilha, assim como a da Madeira, constituem casos excepcionais dentro do portugus insular. Independentemente uma da outra, ambas se afastam do que se pode chamar a norma centro-meridional por acrescentar-lhe um certo nmero de traos muito peculiares.

    No que se refere ilha de So Miguel, os mais caractersticos dentre os traos que afastam os seus dialetos dos das outras ilhas coincidem, curiosamente, com os traos que, na Pennsula, distinguem a regio da Beira Baixa e do Alto Alentejo (e tambm, parcialmente, com os que se observam no ocidente do Algarve): a) o u tnico articulado como []: t, miila; b) o antigo ditongo ou pronuncia-se como []: pca, lra; c) o atnico tende parao o aberto [o]: quase bota por bata; d) a vogal final grafada -o cai ou reduz-se a [s]: cop(d), cop(a)s, tiid(3 ), pk(d), por copo, copos, tudo, pouco.

    Quanto ilha da Madeira, os seus dialetos apresentam caractersticas fonticas singulares, que s esporadicamente (e no todas) aparecem em dialetos continentais. Assim, o u tnico apresenta-se ditongado em [aw], por exemplo: [la w a ] por lua-,o /tnico em [a j],por exemplo: ['faj,a] por filha. Por outro lado, a consoante l, precedida de i, palatiza-se: [ VajXa] por vila, { 'focjaJ por fila (confundindo-se, portanto, desse modo fila com filha).

    0S DIALETOS BRASILEIROS

    Com relao ao extensssimo territrio brasileiro da lngua portuguesa, a insuficincia de informaes rigorosamente cientficas sobre as diferenas de natureza fontica, morfossinttica e lexical que separam as variedades regionais nele existentes no permite classific-las em bases semelhantes s que foram adotadas na classificao dos dialetos do portugus europeu. Deve-se

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    reconhecer, contudo, que a publicao de dois atlas prvios regionais o do Estado da Bahia9 e o do Estado de Minas Gerais10 e a anunciada impresso do j concludo Atlas dos fa lares de S e r g i p e bem como a elaborao de algumas monografias dialetais, so passos importantes no sentido de suprir a lacuna apontada.

    Entre as classificaes de conjunto, propostas em carter provisrio, sobreleva, pela indiscutvel autoridade de quem a fez, a de Antenor Nascentes, fundada em observaes pessoais colhidas em suas viagens por todos os estados do pas.

    A base desta proposta reside como no caso do portugus europeu em diferenas de pronncia.

    De acordo com Antenor Nascentes, possvel distinguir dois grupos de dialetos12 brasileiros o do Norte e o do Sul , tendo em conta dois traos fundamentais:a) a abertura das vogais pretnicas, nos dialetos do Norte, em palavras que no

    sejam diminutivos nem advrbios em -mente: pgar por pegar, crrer por correr,

    b) o que ele chama um tanto impressionisticamente a cadncia da fala: fala cantada no Norte, fala descansada no Sul.

    A fronteira entre os dois grupos de dialetos passa por uma zona que ocupa uma posio mais ou menos eqidistante dos extremos setentrional e meridional do pas. Esta zona se estende, mais ou menos, da foz do rio Mucuri, entre Esprito Santo e Bahia, at a cidade de Mato Grosso, no estado do mesmo nome .

    Em cada grupo, distingue Antenor Nascentes diversas variedades a que chama subfalares . E enumera dois no grupo Norte:a) o am azn ico ;b) o n o r d e s t in o ;

    9 Nelson Rossi. Atlas prvio dos falares baianos. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1963.

    10 Jos Ribeiro et alii. Esboo de um atlas lingstico de Minas Gerais. V.l. Rio de Janeiro, MEC/Casa de Rui Barbosa/UFJF, 1977.

    1' Elaborado por Nelson Rossi, com a colaborao de um grupo de professores da Universidade Federal da Bahia.

    12 Empregamos o termo d ia l e t o pelas razes aduzidas no captulo 1 e para mantermos o paralelismo com a designao adotada para as variedades regionais portuguesas. Ao que chamamos aqui d ia l e t o Nascentes denomina s u b f a l a r .

    1' Antenor Nascentes. O linguajar carioca, 2.a ed. completamente refundida. Rio de Janeiro, Simes, 1953, p. 25. Por ser quase despovoada, considerava ele incaracterstica a rea compreendida entre a parte da fronteira boliviana e a fronteira de Mato Grosso com Amazonas e Par.

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U E S A

    reas lingsticas do Brasil (diviso proposta por Antenor Nascentes)

  • NOVA G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    e quatro no grupo Sul:a) o baiano;b) o flum inense;c) o mineiro;d) o su lis ta .

    Assinale-se, por fim, que as condies peculiares da formao lingstica do Brasil revelam uma dialectalizao que no parece to variada e to intensa como a portuguesa. Revelam, tambm, estas condies que a referida dialectalizao muito mais instvel que a europia.

    0 PORTUGUS DE FRICA, DA SIA E DA OCENIA

    No estudo das formas que veio a assumir a lngua portuguesa em frica, na sia e na Ocenia, necessrio distinguir, preliminarmente, dois tipos de variedades: as c r io u la s e as n o - c r io u la s .

    As variedades c r io u la s resultam do contacto que o sistema lingstico portugus estabeleceu, a partir do sculo XV, com sistemas lingsticos indgenas. Talvez todas elas derivem do mesmo p r o to c r io u lo ou l n g u a fr a n c a que, durante os primeiros sculos da expanso portuguesa, serviu de meio de comunicao entre as populaes locais e os navegadores, comerciantes e missionrios ao longo das costas da frica Ocidental e Oriental, da Arbia, da Prsia, da ndia, da Malsia, da China e do Japo. Aparecem-nos, atualmente, como resultados muito diversificados, mas com algumas caractersticas comuns ou, pelo menos, paralelas , que se manifestam numa profunda transformao da fonologia e da morfossintaxe do portugus que lhes deu origem. O grau de afastamento em relao lngua-me hoje de tal ordem que, mais do que como d iale to s , os crioulos devem ser considerados como lnguas derivadas do portugus.

    Os crioulos de origem portuguesa na frica, que so os de maior vitalidade, podem ser distribudos espacialmente em trs grupos:

    1. Crioulos das ilhas do Golfo da Guin:a) de So Tom;b) do Prncipe;c) de Ano Bom (ilha que pertence Guin Equatorial).

    2. Crioulos do arquiplago de Cabo Verde, com as duas variedades:a) de Barlavento, ao norte, usada nas ilhas de Santo Anto, So Vicente, So

    Nicolau, Sal e Boa Vista; l>) dc Sotavento, ao sul, utilizada nas ilhas de Santiago, Maio, Fogo e Brava.

    D O M N I O A T U A L DA L N G U A P O R T U G U E S A 213. Crioulos continentais:a) da Guin-Bissau;b) de Casamance (no Senegal).

    Dos crioulos da sia subsistem apenas:a) o de Malaca, conhecido pelas denominaes de pap i cristo, m alaqueiro,

    malaqus, m alaqu enho , malaquense, serani, bahasa geragau e portugus basu;b) o de Macau, m acasta ou m acauenho, ainda falado por algumas famlias de

    Hong-Kong;c) o de Sri-Lanka, falado por famlias de Vaipim e Batticaloa;d) os de Chaul, Korlai, Tellicherry, Cananor e Cochim, no territrio da Unio

    Indiana.

    Na Ocenia, sobrevive ainda o crioulo de Tugu, localidade perto de Jacarta, na ilha de Java.14

    Quanto s variedades n o -c r io u la s , h que considerar no s a presena do portugus, que a lngua oficial das repblicas de Angola, de Cabo Verde, da Guin-Bissau, de Moambique e de So Tom e Prncipe, mas as variedades faladas por uma parte da populao destes Estados e, tambm, de Goa, Damo, Diu e Macau, na sia, e Timor, na Ocenia. Trata-se de um portugus com base na variedade europia, porm mais ou menos modificado, sobretudo pelo emprego de um vocabulrio proveniente das lnguas nativas, e a que no faltam algumas caractersticas prprias no aspecto fonolgico e gramatical.

    Estas caractersticas, no entanto, que divergem de regio para regio, ainda no foram suficientemente observadas e descritas, embora muitas delas principalmente no que se refere a Angola, Cabo Verde e Moambique transpaream na obra de alguns dos modernos escritores desses pases.15

    14 Sobre o estado atual dos crioulos portugueses, veja-se Celso Cunha. Lngua, nao, alienao. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981, p. 37-106, onde se remete bibliografia especializada; veja-se, tambm, Jos Gonalo Herculano de Carvalho. Deux langues croles: le cril du Cap Vert et 1 e forro de S. Tom. Biblos, 57: 1-15, Coimbra, 1981.

    " Sobre a linguagem de um deles, do maior significado, o angolano Luandino Vieira, lei um-se: Michel Laban. L uvre littraire de Luandino Vieira, tese de 3. ciclo, apresentada em 1979 Universidade de Paris-Sorbonne; e Salvato Trigo. Luandino Vieira, o logoteta. Porto, Braslia Editora, 1981.

  • Captulo 3

    Fontica e fonologia

    OS SONS DA FALA

    O s sons d e nossa fa la resu lta m quase to d o s d a ao d e c ertos rg o s s ob re a

    c o r ren te d e ar v in d a d o s p u lm es .

    Para a sua p ro d u o , trs c o n d i e s se fa z e m necessrias:

    i i ) a c o r ren te d e ar;

    b) um o b s t cu lo e n c o n tra d o p o r essa c o r re n te d e ar;c ) u m a ca ixa d e resson n cia .

    Estas c o n d i e s so criadas p e lo s rg o s d a f a l a , d en o m in a d o s , e m seu c o n

    junto, APARELHO FONADOR.

    0 APARELHO FONADOR

    fi c o n s titu d o das segu in tes partes:

    il) os pu lm es , o s b r n q u io s e a TRAQUiA - rg o s re sp ira t r io s qu e fo rn e c e m a c o r ren te d e ar, m a t r ia -p r im a d a fon a o ;

    h ) a la r in g e , o n d e se lo c a liz a m as c o r d as v o c a is , q u e p ro d u z e m a e n e rg ia s o n o

    ra u tiliza d a n a fala;

    t ) a.s c avid ad e s s u pr alar n g e as ( f ar in g e , b o c a e fossas n a s a is ), qu e fu n c io n a m como ca ixas d e resson n cia , s en d o q u e a ca v id a d e b u ca l p o d e v a r ia r p r o fu n d a m e n te d e fo r m a e d e v o lu m e , graas aos m o v im e n to s dos rg o s a tivos ,

    s o b re tu d o d a l n g u a , qu e , d e t o im p o r ta n te n a fo n a o , se to rn o u s in n im o

    de id io m a .

  • 2 4 Nova GRAMTICA DO PORTUGUS CONTEMPORNEO

    Observao:Quase todos os sons de nossa fala so produzidos na expirao. A inspirao

    normalmente funciona para ns como um instante de silncio, um momento de pausa na elocuo. Lnguas h, porm, como o hotentote, o zulo, o boximane e outros idiomas africanos, que apresentam uma srie de consoantes articuladas na inspirao, os rudos que se denominam c l iq u e s . Em portugus praticamos alguns c l iq u e s , mas sem valor fontico: o beijo, que uma bilabial inspiratria; o muxoxo, um clique linguoalveolar; o estalido linguodental com que animamos o andar das cavalgaduras; e uns poucos mais. Sobre o assunto consulte-se Rodrigo de S Nogueira. Tem as de lingstica banta : dos cliques em geral. Lisboa, Agncia Geral do Ultramar, 1957.

    f u n c io n a m e n t o d o a p a r e l h o f o n a d o r

    O ar expelido dos pu lm e s , por via dos br n q u io s , penetra na traq u eia e chega la r in g e , onde, ao atravessar a g lo te , costuma encontrar o primeiro obstculo sua passagem.

    A g lo te , que fica na altura do chamado p om o-d e-ad o ou gog, a abertura entre duas pregas musculares das paredes superiores da la r in g e , conhecidas pelo nome de co rd as v o c a is . O fluxo de ar pode encontr-la fechada ou aberta, em virtude de estarem aproximados ou afastados os bordos das co rd as v o c a is . No primeiro caso, o ar fora a passagem atravs das co rd as vo c a is retesadas, fazendo-as vibrar e produzir o som musical caracterstico das articulaes so n o r as . No segundo caso, relaxadas as co rd as v o c a is , o ar se escapa sem vibraes larngeas. As articulaes produzidas denominam-se, ento, su rd as .

    A distino entre so n o r a e surd a pode ser claramente percebida na pronncia de duas consoantes que no mais se identificam. Assim:

    /b/ [= s o n o r o ] /p/ [= s u r d o ]

    Ao sair da la r in g e , a corrente expiratria entra na c a v id a d e far n g e a , uma encruzilhada, que lhe oferece duas vias de acesso ao exterior: o c a n a l b u c al e o Na sa l . Suspenso no entrecruzar desses dois canais fica o v u p a l a t in o , rgo dotado de mobilidade capaz de obstruir ou no o ingresso do ar na c a v id a d e Nasa l e, conseqentemente, de determinar a natureza o r a l ou n a sa l de um som.

    Quando levantado, o vu p a l a t in o cola-se parede posterior da f a r in g e , deixando livre apenas o c o n d u t o b u c a l . As articulaes assim obtidas denominam-se o rais (adjetivo derivado do latim ors, oris, aboca ). Quando abaixado, o vu p a l a t in o deixa ambas as passagens livres. A corrente expiratria ento divide-se, e uma parte dela escoa-se pelas fossas nasais , onde adquire a ressonncia caracterstica das articulaes, por este motivo, tambm chamadas n a sa is .

    F O N T I C A E F O N O L O G I A 2 5

    1.2.3.4.5.6. 7.

    (A LARINGE E AS CAVIDADES SUPRALARNGEAS) produo da fala

    9.10 . 11. 1 2 .13.14.15.16. 17.

    Cavidade nasal Palato duro Vu palatino LbiosCavidade bucal Lngua Faringe oral EpigloteAbbada palatinaRinofaringeTraquiaEsfagoVrtebrasLaringePomo-de-ado Maxilar superior Maxilar inferior

    0 APARELHO FONADOR

  • 26 NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    Compare-se, por exemplo, a pronncia das vogais:

    /a/ [= o r a i.] // [= n a s a l ]

    e m p a lavras c o m o :

    l / l m a to / m a n to

    , p o r m , na c a v id a d e b u cal qu e se p ro d u z e m os m o v im e n to s fo n a d o re s

    m a is v a r ia d o s , graas m a io r o u m e n o r sep arao d os m a x ila r e s , das boch ech as

    e, s o b re tu d o , m o b il id a d e da l n g u a e d os i . b io s .

    CORDAS VOCAIS

    SOM E FONEMA

    Nem todos os sons que pronunciamos em portugus tm o mesmo valor no funcionamento de nossa lngua.

    Alguns servem para diferenciar palavras que no mais se identificam. lor exemplo, em:

    erro

    ii diversidade de timbre (fechado ou aberto) da vogal tnica suficiente para CHlubclccer uma oposio entre substantivo e verbo.

    F O N T I C A E F O N O L O G I A ? !

    Na srie:

    dia via miatia fia pia

    temos seis palavras que se distinguem apenas pelo elemento consonntico inicial.Toda distino significativa entre duas palavras de uma lngua estabelecida

    pela oposio ou contraste entre dois sons revela que cada um desses sons representa uma unidade mental sonora diferente. Essa unidade de que o som representao (ou realizao) fsica recebe o nome de f o n e m a .

    Correspondem, pois, a fo n e m as diversos os sons voclicos e consonnticos diferenciadores das palavras atrs mencionadas.

    A disciplina que estuda minuciosamente os sons da fala, as mltiplas realizaes dos f o n e m a s , chama-se f o n t ic a .

    A parte da gramtica que estuda o comportamento dos fo nem as numa lngua denomina-se f o n o l o g ia , f o n e m At ic a ou f o n m ic a .

    DESCRIO FONTICA E FONOLGICA

    A descrio dos sons d a fala ( d escrio f o n t ic a ), para ser completa, deveria considerar sempre:a) como eles so produzidos;b) como so transmitidos;c) como so percebidos.

    Sobre a impresso auditiva deveria concentrar-se o interesse maior da descrio, pois ela que nos deixa perceber a variedade dos sons e o seu funcionamento em representao dos fo n e m a s . A descrio f o n o l g ic a mal se compreende que no seja de base acstica.

    Acontece, porm, que a descrio do efeito acstico de um fonema no se laz com termos precisos, semelhantes aos que se usam para descrever os movimentos dos rgos que participam da produo de um som. Os progressos da 1'ONTIC a c st ic a so, alis, relativamente recentes.1

    1 I )uta de 1952, com o trabalho Preliminaries to Speech Analysis, de R. Jakobson, C. G. M. l'uni c M. Halle, a primeira tentativa convincente de uma classificao acstica dos fonemas. De ento para c, a utilizao de uma nova aparelhagem e, principalmente, o cllforo coordenado de foneticistas e engenheiros do som tm permitido progressos sen- nlvds no particular, de que nos do mostras as penetrantes anlises acsticas de PierreI )elut t re, enfeixadas em Studies iti French and Comparative Phonetics (London - The Hague

    Paris, Mouton, 1966), e os estudos recentes sobre a fontica portuguesa de Maria

  • NOV A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    A f o n t ic a FISIOLGICA, de base articulatria, uma especialidade antiga e muito desenvolvida, porque bem conhecidos so os rgos fonadores e o seu funcionamento. Da serem os fonemas freqentemente descritos e classificados em funo das suas caractersticas articulatrias, embora se note, modernamente, uma tendncia de associar a descrio acstica fisiolgica, ou de realiz-las paralelamente.

    TRANSCRIO FONTICA E FONOLGICA

    Para simbolizar na escrita a pronncia real de um som usa-se um alfabeto especial, o alfab e to f o n t ic o .

    Os sinais fonticos so colocados entre colchetes: [ ].Por exemplo: ['kaw], pronncia popular carioca, ['kal], pronncia portuguesa

    normal e brasileira do Rio Grande do Sul, para a palavra sempre escrita cal.Os fonemas transcrevem-se entre barras oblquas: / /.Por exemplo: o fonema Isl pode ser representado ortograficamente por s,

    como em saco; por ss, como em osso; por c, como em cera; por , como em poo; por x, como em prxim o; e pode ser realizado como [s], no portugus normal de Portugal e do Brasil, ou como [?], em regies do Norte de Portugal e da Galiza, conforme se disse no captulo 2.

    ALFABETO FONTICO UTILIZADO

    Empregamos nas nossas transcries fonticas, sempre que possvel, o Alfabeto Fontico Internacional. Tivemos, no entanto, de fazer certas adaptaes e acrescentar alguns sinais necessrios para a transcrio de sons de variedades da lngua portuguesa para os quais no existe sinal prprio naquele Alfabeto.2

    Raquel Delgado Martins, principalmente Aspects de laccent en portugais. Voyelles toniques et atones (Thse de doctorat de troisime cycle, Strasbourg, 1977), publicada em Hamburger Phonetische Beitrge (Hamburg, Buske Verlag, 1982), e Sept tudes sur la perception. Accent et intonation du portugais (2.a ed., Lisboa, Laboratrio de Fontica da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1983) e de Mirian Therezinha da Matta Machado, tude articulatoire et acoustique des voyelles nasales du portugais de Rio de Janeiro (Thse de doctorat de troisime cycle, Strasbourg, 1981). Os dois ltimos trabalhos so dissertaes policopiadas.

    N essas adaptaes e acrscimos seguimos, em geral, o alfabeto fontico utilizado pelo grupo do Centro de Lingstica da Universidade de Lisboa, encarregado da elaborao do Atlas lingtistico-etnogrfico de Portugal e da Galiza.

    F O N T I C A E F O N O L O G I A

    Eis o elenco dos sinais aqui adotados:

    1. Vogais:I a ] portugus normal de Portugal e do Brasil: p, gato

    portugus normal do Brasil: pedra, fazerI a ] portugus normal de Portugal: cama, cana, pedra, fazer; portugus de

    Lisboa: lei, lenhaportugus normal do Brasil: cama, cana

    I e ] portugus normal de Portugal e do Brasil: p, ferroI e ] portugus normal de Portugal e do Brasil: medo, saber

    portugus normal do Brasil: regar, sedentoI o ] portugus normal de Portugal: sede, corre, regar, sedentoI o I portugus normal de Portugal e do Brasil: p, colaI o I portugus normal de Portugal e do Brasil: morro, fora

    portugus normal do Brasil: correr, morarI i ] portugus normal de Portugal e do Brasil: vir, bico

    portugus normal do Brasil: sede, correI li I portugus normal de Portugal e do Brasil: bambu, sul, caro

    portugus normal de Portugal: correr, morar

    2. Semivogais:I j 1 portugus normal de Portugal e do Brasil: pai, feito, vrioI w I portugus normal de Portugal e do Brasil: pau, gua

    3. Consoantes:I b I portugus normal de Portugal e do Brasil: bravo (!), ambos

    portugus normal do Brasil: boi, aba, barba, abrirI I portugus normal de Portugal: boi, aba, barba, abrir|il I portugus normal de Portugal e do Brasil: dar (!), andar

    portugus normal do Brasil: ida, espadaI ft I portugus normal de Portugal: dar, ida, espadaI il I portugus do Rio de Janeiro, de So Paulo e de extensas zonas do Brasil:

    dia, sedeUhl portugus popular do Rio de Janeiro e de algumas zonas prximas: dia,

    sedeportugus dialectal europeu de zonas fronteirias muito restritas: Jesus, jaqueta

    I (I I portugus normal de Portugal e do Brasil: guarda (!), frango portugus normal do Brasil: guarda, agora, agrado

  • NO V A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    [ y ] portugus normal de Portugal: guarda, agora, agrado [ p ] portugus normal de Portugal e do Brasil: pai, caprino[ t ] portugus normal de Portugal e do Brasil: tu, canto[ t ] portugus do Rio de Janeiro, de So Paulo e de extensas zonas do Brasil:

    tio, sete[t j ] portugus de extensas zonas do Norte de Portugal e de reas no bem

    delimitadas de Mato Grosso e regies circunvizinhas, no Brasil: chave, encherportugus popular do Rio de Janeiro e de algumas zonas prximas: tio, sete

    [ k ] portugus normal de Portugal e do Brasil: casa, porco, que[m] portugus normal de Portugal e do Brasil: mar, amigo[ n ] portugus normal de Portugal e do Brasil: nada, cano[ ji ] portugus normal de Portugal e do Brasil: vinha, caminho[ 1 ] portugus normal de Portugal e do Brasil: lama, calo[ \ ] portugus normal de Portugal e de certas zonas do Sul do Brasil: alto,

    Brasil[ , ] portugus normal de Portugal e do Brasil: filho, lhe[ r ] portugus normal de Portugal e do Brasil: caro, cores, dar[ r ] portugus normal de vrias regies de Portugal, do Rio Grande do Sul e

    outras regies do Brasil: roda, carro [R ] portugus normal de Portugal (principalmente de Lisboa), do Rio de

    Janeiro e de vrias zonas costeiras do Brasil: roda, carro [ f ] portugus normal de Portugal e do Brasil: filho, afiar[ V ] portugus normal de Portugal e do Brasil: vinho, uva[ s ] portugus normal de Portugal e do Brasil: saber, posso, cu, caa[ z ] portugus normal de Portugal e do Brasil: azar, casa[ s ] portugus de certas zonas do Norte de Portugal: saber, posso; e, noutras

    zonas, tambm: cu, caa [ z ] portugus de certas zonas do Norte de Portugal: casa; e, noutras zonas,

    tambm: azar[ 0 ] galego normal: cu, facer (port, fazer), caza (port, caa), azar[ J ] portugus normal de Portugal e do Brasil: chave, xarope

    portugus normal de Portugal, do Rio de Janeiro e de algumas zonascosteiras do Brasil: este

    [ 3 ] portugus normal de Portugal e do Brasil: j, genroportugus normal de Portugal, do Rio de Janeiro e de algumas zonascosteiras do Brasil: mesmo

    F O N T I C A E F O N O L O G I A

    CLASSIFICAO DOS SONS LINGSTICOS

    Os sons lingsticos classificam-se em v o g a is , c o n so a n te s e se m ivo g ais .

    VOGAIS E CONSOANTES

    1. Do ponto de vista articulatrio, as vogais podem ser consideradas sons formados pela vibrao das cordas vocais e modificados segundo a forma das cavidades supralarngeas, que devem estar sempre abertas ou entreabertas passagem do ar. Na pronncia das consoantes, ao contrrio, h sempre na cavidade bucal obstculo passagem da corrente expiratria.

    2. Quanto funo silbica - outro critrio de distino - cabe salientar que, na nossa lngua, as vogais so sempre centro de slaba, ao passo que as consoantes so fonemas marginais: s aparecem na slaba junto a uma vogal.

    SEM IVOGAIS

    Entre as vogais e as consoantes situam-se as semivogais, que so os fonemas /i/ e /u/ quando, juntos a uma vogal, com ela formam slaba. Foneticamente estas vogais assilbicas transcrevem-se [j] e [w]. Exemplificando:

    Em riso [ rizu] e viu ['viw] o li/ vogal, mas em rei ['rej] e vrio [Varju] lemivogal. Tambm vogal o /u/ em muro ['muru] e rua ["rua], mas semivogal em meu [mew] e quatro ['kwatru],

    CLASSIFICAO DAS VOGAIS

    I . Segundo a classificao tradicional, de base fundamentalmente articulatria, as vogais da lngua portuguesa podem ser:

    rt) quanto regio de articulaoanteriores ou palatais centrais ou mdias posteriores ou velares

    li) quanto ao grau de abertura

    abertassem i-abertassemifechadasfechadas

    I ) quanto ao papel das cavidades bucal e nasal oraisnasais

  • 3 2 NOV A G R A M T I C A DO P O R T U G U S C O N T E M P O R N E O

    de base acstica a classificao em:

    d ) quanto intensidade tnicastonas

    2. Tem-se difundido recentemente uma classificao das vogais com base em certo nmero de traos que so distintivos numa perspectiva fonolgica ou fonemtica, isto , que apresentam caractersticas capazes por si s de opor um segmento fnico a outro segmento fnico.Por exemplo: o trao distintivo ab e r tu r a , ligado, do ponto de vista fisiolgico, maior ou menor elevao ou altura da lngua no momento da articulao, ope s por si peso (substantivo) a peso (forma verbal) e a piso (substantivo ou verbo). A presena ou a ausncia de cada trao , neste tipo de classificao, assinalada pelos sinais matemticos (+ ) e (- ). Assim: le i de peso (verbo) ser [+ baix