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ANALISE DAS ANOMALIAS DAS TEMPERATURAS NO ANO DE 2015 O ano de 2015 foi marcado pela sensação de calor maior que em anos recentes, também muito quentes. Segundo a Agência Espacial Americana (NASA), o ano de 2015 foi o mais quente já registrado no planeta desde 1880, com 0,90°C acima da média do século XX e 0,16°C acima do recorde anterior, registrado em 2014. O objetivo desta nota técnica é verificar se realmente o ano de 2015 foi o mais quente já registrado no Brasil e quais as regiões mais notáveis. Toda a análise é baseada nas medições das temperaturas médias registradas em 237 estações meteorológicas do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), espacialmente distribuídas no território brasileiro. Importante frisar que o período histórico analisado é menor que o apresentado pela NASA, pois os dados meteorológicos observados e disponíveis digitalmente no INMET, para a maior parte das estações, tem pouco mais de 50 anos (desde 1961). Análise da Temperatura do ar no Brasil durante 2015 Os mapas da Figura 1 mostram a evolução, de janeiro a dezembro de 2015, das anomalias das temperaturas médias registradas. Percebe-se que em todos os meses predominaram áreas com anomalias positivas, ou seja, com temperaturas médias mensais que ultrapassaram a média histórica do período de referência 1981-2010. No entanto, tais anomalias foram mais fortes em magnitude, assim como em abrangência espacial, a partir do mês de junho de 2015. Essa característica esteve associada ao desenvolvimento do fenômeno El Niño nas águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical, que se estabilizou a partir de abril, quando as anomalias da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) ultrapassaram 0,5°C em relação a sua média histórica, em uma área de referencia para monitoramento no Oceano Pacífico denominada “Área Niño 3.4”. Estudos demonstram que, em anos de El Niño, a temperatura média em grande parte do Brasil tende a ficar mais elevada, principalmente durante o inverno na Região Sudeste.

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ANALISE DAS ANOMALIAS DAS TEMPERATURAS NO ANO DE 2015

O ano de 2015 foi marcado pela sensação de calor maior que em anos recentes,

também muito quentes. Segundo a Agência Espacial Americana (NASA), o ano de 2015 foi o

mais quente já registrado no planeta desde 1880, com 0,90°C acima da média do século XX e

0,16°C acima do recorde anterior, registrado em 2014.

O objetivo desta nota técnica é verificar se realmente o ano de 2015 foi o mais quente

já registrado no Brasil e quais as regiões mais notáveis. Toda a análise é baseada nas

medições das temperaturas médias registradas em 237 estações meteorológicas do Instituto

Nacional de Meteorologia (INMET), espacialmente distribuídas no território brasileiro.

Importante frisar que o período histórico analisado é menor que o apresentado pela NASA,

pois os dados meteorológicos observados e disponíveis digitalmente no INMET, para a maior

parte das estações, tem pouco mais de 50 anos (desde 1961).

Análise da Temperatura do ar no Brasil durante 2015

Os mapas da Figura 1 mostram a evolução, de janeiro a dezembro de 2015, das

anomalias das temperaturas médias registradas. Percebe-se que em todos os meses

predominaram áreas com anomalias positivas, ou seja, com temperaturas médias mensais que

ultrapassaram a média histórica do período de referência 1981-2010. No entanto, tais

anomalias foram mais fortes em magnitude, assim como em abrangência espacial, a partir do

mês de junho de 2015. Essa característica esteve associada ao desenvolvimento do fenômeno

El Niño nas águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical, que se estabilizou a partir de

abril, quando as anomalias da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) ultrapassaram 0,5°C

em relação a sua média histórica, em uma área de referencia para monitoramento no Oceano

Pacífico denominada “Área Niño 3.4”. Estudos demonstram que, em anos de El Niño, a

temperatura média em grande parte do Brasil tende a ficar mais elevada, principalmente

durante o inverno na Região Sudeste.

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Figura 1 - Anomalias das temperaturas médias, em °C, observadas entre janeiro e dezembro de 2015, em relação à média do período 1981-2010.

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A temperatura média no Brasil, tomando-se como base as temperaturas médias

observadas em todas as 237 estações meteorológicas do INMET, relativa ao período de

referencia 1981-2010, é de 23,78°C. Em 2015 a temperatura média foi de 24,74°C, um desvio

de 0,96°C acima da média, colocando 2015 como o ano mais quente já registrado no Brasil

desde 1961, deixando em segunda posição o ano de 1998, até então o ano mais quente, com

temperatura média de 24,42°C, ou 0,64°C acima da média.

A Figura 2 mostra o gráfico das temperaturas médias registradas anualmente, a partir

de 1961 até 2015. A linha vermelha indica a média climatológica, possibilitando observar que

a partir do ano de 2001 todos os anos apresentaram temperaturas médias anuais superiores à

média climatológica. A Figura 3 mostra um gráfico com desvios de temperatura, com

predomínio de desvios positivos a partir de 2001.

Figura 2 - Temperaturas Médias do Brasil entre 1961 e 2015, em °C, versus a climatologia, tomando-se como base as temperaturas médias observadas em 237 estações meteorológicas do INMET.

Figura 3 - Desvios das Temperaturas Médias do Brasil entre 1961 e 2015, em °C.

22,022,523,023,524,024,525,0

1961

1964

1967

1970

1973

1976

1979

1982

1985

1988

1991

1994

1997

2000

2003

2006

2009

2012

2015

Tem

pera

tura

(°C

)

Anos

Temperatura Média Anual no Brasil de 1961 a 2015

Médias Anuais

Média Climatológica 1981‐2010

-1,0-0,8-0,6-0,4-0,20,00,20,40,60,81,0

1961

1964

1967

1970

1973

1976

1979

1982

1985

1988

1991

1994

1997

2000

2003

2006

2009

2012

2015

Des

vio

(°C

)

Anos

Desvios da Temperatura Média Anual no Brasil entre 1961 e 2015 em Relação à Média 1981-2010

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A Tabela 1 mostra o ranking dos dez anos mais quentes no Brasil, com respectivo

valor absoluto e desvio em relação a média climatológica.

Tabela 1: Os dez anos mais quentes no Brasil.

Ano Temperatura Média 

Observada (°C)  Desvio (°C) 

2015  24,74  0,96 

1998  24,42  0,64 

2012  24,30  0,51 

2002  24,28  0,49 

2014  24,26  0,48 

2005  24,20  0,42 

2010  24,18  0,40 

2013  24,16  0,38 

2003  24,12  0,34 

2007  24,11  0,33 

A Tabela 2 mostra a distribuição das temperaturas médias observadas nas cinco

regiões brasileiras no ano de 2015. A que apresentou as maiores temperaturas foi a região

Centro-Oeste, com 1,21°C acima da média.

Tabela 2: Temperaturas médias observadas por regiões brasileiras no ano de 2015.

Região Temperatura Média 1981‐2010 

(°C) Observado em 2015 

(°C) Desvio (°C) 

Norte  26,29  27,30  1,01 

Nordeste  24,98  25,84  0,86 

Centro‐Oeste 23,92  25,13  1,21 

Sudeste  22,62  23,58  0,96 

Sul  19,36  20,29  0,93 

A Tabela 3 mostra a distribuição das temperaturas médias observadas mensais do ano

de 2015 no Brasil, desvios em relação a média e ano do maior recorde para cada um destes

meses. Nota-se que sete meses do ano de 2015 apresentaram recordes históricos das

temperaturas médias. Este fator é fundamental para colocar o ano de 2015 como o mais

quente do Brasil, em mais de 50 anos, desde 1961.

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Tabela 3: Distribuição das temperaturas médias observadas mensais em 2015 no Brasil, desvios e ano do recorde.

Meses de 2015  Temperatura Observada (°C) Desvio em relação a Média (°C)  Ano do Recorde

Janeiro  26,06  0,91  2015 

Fevereiro  25,39  1,05  2010 

Março  25,11  0,96  1998 

Abril  24,59  1,23  1998 

Maio  23,26  0,76  2002 

Junho  22,56  1,07  2013 

Julho  22,49  1,13  2015 

Agosto  23,67  1,26  2015 

Setembro  25,23  1,65  2015 

Outubro  25,97  1,36  2015 

Novembro  26,18  1,27  2015 

Dezembro  26,41  1,32  2015 

A Figura 4a mostra o mapa da temperatura média observada em 2015 e a Figura 4b

suas respectivas anomalias distribuídas espacialmente para o Brasil, em °C.

(a) (b)

Figura 4- (a) Temperaturas médias observadas em 2015 e (b) respectivas anomalias em relação à média histórica, em °C.

Evolução do Fenômeno El Niño

A circulação geral da atmosfera é modificada por uma série de fatores ao longo do

ano, com grande variação temporal e espacial. O fenômeno conhecido como El Niño tem sua

origem na mudança da circulação dos ventos no sentido zonal (leste-oeste) na área do Oceano

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Pacífico tropical. Esta mudança no padrão dos ventos, que favorece a formação do El Níño,

auxilia o acúmulo de águas mais aquecidas sobre a faixa equatorial do Oceano Pacífico,

causando mudanças dos padrões climáticos médios observados. O El Niño é a parte oceânica

de um fenômeno acoplado entre atmosfera e oceano (conhecido como El Niño-Oscilação do

Sul), afetando o clima a níveis regionais e globais. As áreas oceânicas mais importantes para

monitoramento da ocorrência deste fenômeno estão indicadas na Figura 5, denominadas Niño

1+2, Niño 3, Niño 4 e Niño 3.4.

Figura 5- Áreas do Oceano Pacífico tropical utilizadas para o monitoramento do fenômeno El Niño.

O monitoramento da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) em toda a bacia do

Oceano Pacífico é de fundamental importância para acompanhamento da evolução do

fenômeno, e possibilitar previsões sobre sua intensidade e duração.

Os mapas da Figura 6 mostram o progresso, entre janeiro e dezembro de 2015, do

fenômeno El Niño. O atual episódio atingiu seus maiores valores de anomalias positivas da

TSM a partir de agosto, com o trimestre outubro-novembro-dezembro apresentando os

desvios mais pronunciados até o momento.

Este episódio é classificado como de forte intensidade, situando-se entre os mais

fortes já ocorridos e monitorados.

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Figura 6 – Anomalias da TSM, em °C, observadas entre janeiro e dezembro de 2015.

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Nota: Participaram da elaboração desta Nota Técnica: Fabrício Daniel dos Santos Silva e

Mozar de Araújo Salvador – Coordenação-Geral de Desenvolvimento e Pesquisa

(CGDP/INMET)