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NOSSOS ENCONTROS, NOSSOS OLHARES: A ORGANIZAÇÃO METODOLÓGICA DA AULA NA PERSPECTIVA DO MÉTODO DIALÉ TICO DE

CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO.

Autor: ILNÁ APARECIDA MATTOS1

Orientador: ROSANE TOEBE ZEN2

Resumo: O presente artigo é parte integrante do processo de formação continuada desenvolvido pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná, através do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE). Consiste assim, em um recorte do conjunto de reflexões que desenvolvemos a partir dos encontros propostos e realizados no trabalho de implementação didático-pedagógica. Abordam-se aqui as possibilidades de mudança no olhar da/sobre a prática pedagógica docente, a partir de leituras, reflexões e conclusões por professores em um contexto caracterizado pelo processo dialógico de produção de significações sobre a organização metodológica da aula. Para tanto, utilizamos referenciais teóricos cujo arcabouço conceitual fundamenta-se na concepção dialética do conhecimento tendo o materialismo histórico-dialético como método, o que nos permitiu compreender e perceber os pontos de encontro, as similaridades, as diferenças, a particularidade do olhar de cada participante em relação à temática aula.

Palavras-chave: Aula; Conjunto de Reflexões; Processo Dialógico de Produção de Significações. 1. INTRODUÇÃO 1.1 Do funcionamento do Programa de Desenvolvimento Educacional- PDE

O Programa de Desenvolvimento Educacional- PDE, na Rede Pública

1 Pedagoga, Especialista em Psicopedagogia; Supervisão Escolar e Mestre em Educação. PDE /SEED- UNIOESTE- Núcleo Regional de Educação de Cascavel. E-mail: [email protected]; [email protected] 2 Pedagoga, Especialista em Fundamentos da Educação e Mestre em Educação, Professora do Colegiado de Pedagogia/UNIOESTE – Campus de Cascavel e membro do Grupo de Pesquisa em Gestão Escolar (GPGE).

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Estadual de Ensino foi regulamentado pela Lei 130 de 14 de julho de 2010 e

normatizada pela Resolução n.º 1670/2009, sendo considerado uma política pública

de formação continuada, que vem sendo implementado pela Secretaria de Estado

da Educação, em parceria com a Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e

Ensino Superior e as Instituições de Ensino Superior do Estado do Paraná.

Considera-se objetivo do Programa de Desenvolvimento Educacional:

proporcionar aos professores da rede pública estadual subsídios teórico-

metodológicos para o desenvolvimento de ações educacionais sistematizadas, e que

resultem em redimensionamento de sua prática.

Caracteriza-se assim como um programa integrado às atividades da

formação continuada em educação, que disciplina a promoção do professor para o

nível III da carreira, conforme previsto no "Plano de carreira do magistério estadual",

Lei complementar nº 103, de 15 de março de 2004. Destina-se assim aos

professores do quadro próprio do magistério (QPM), que se encontram no nível II,

classe 8 a 11, da tabela de vencimentos do plano de carreira.

Os meios utilizados para formação se dão através de cursos e atividades

teóricas-práticas orientadas nas modalidades presenciais (nas Instituições de Ensino

Superior públicas do Estado) e, à distância (apoiados pelos suportes tecnológicos

necessários ao desenvolvimento das atividades didático-pedagógicas propostas),

cuja ênfase é dada na produção de conhecimento e mudanças qualitativas na

prática escolar da escola pública paranaense.

Ao ingressar no PDE, após passar por um processo seletivo o professor tem

garantido o direito a afastamento remunerado de 100% de sua carga horária efetiva

no primeiro ano e de 25% no segundo ano do programa, regulamentados estes por

resolução da Secretaria de Estado da Educação-SEED.

1.2 Questionamentos e inquietudes docentes

Postas as considerações acerca do programa e seu funcionamento,

necessário se faz esclarecer o que nos levou a propor o projeto: A ação do

pedagogo e docentes na organização metodológica da aula na perspectiva do

método dialético de construção do conhecimento.

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As falas dos professores de diversas áreas, ao desenvolverem atividades

em sala de aula com seus alunos, particularmente dos 1º anos do Ensino Médio, nos

levavam a observar que era comum da parte desses apontarem situações que

interferiam no andamento das aulas, de formas diversas e em tempos diversos.

No cotidiano escolar (reuniões pedagógicas, conselhos de classe, encontros

informais), ouvíamos com frequência as seguintes questões: Como fazer com que

os alunos se interessem pela matéria? Como despertar e manter sua atenção?

Como nos comunicar para que eles nos entendam? O que fazer para que

aprendam? Como organizar metodologicamente as aulas para que os conteúdos de

ensino sejam significativos para os alunos?

Nesse sentido, como pedagoga, me senti instigada, a partir da percepção do

cotidiano escolar, da necessidade de uma atuação pedagógica mais integrada e

articulada com professores dos 1º anos do Ensino Médio, no sentido de propor

algumas reflexões sobre a temática “aula”, considerando-a como prática para

professores de todas as áreas do conhecimento escolarizado.

Assim, tivemos por objetivos:

• Apresentar uma proposição metodológica de organização e trabalho com os

conteúdos de ensino na perspectiva do método dialético de construção do

conhecimento.

• Propor, aos professores do Ensino Médio – 1º anos – um conjunto de

procedimentos didáticos, expressos pelos métodos e técnicas de ensino que

visassem melhor aproveitamento da aprendizagem por parte dos alunos, nas

aulas expositivas.

• Trabalhar a atividade prática da ação didática do professor a partir do método

dialético da construção do conhecimento

Para tanto, organizamos as estratégias de ação distribuídas em duas

etapas. Na primeira, apresentamos nosso Projeto de Intervenção, que recebeu como

título: “A Ação do Pedagogo e Docentes na Organização Metodológica do Conteúdo

de Ensino: método dialético de construção do conhecimento”. A exposição foi feita à

Direção, Equipe Pedagógica e professores do Colégio Marilis Faria Pirotelli EFM do

Município de Cascavel-PR, durante a Semana Pedagógica/julho de 2010.

Propomo-nos através do mesmo trabalhar com os professores do Ensino

Médio – 1º anos, formas de organização metodológica dos conteúdos curriculares, a

partir da perspectiva do método dialético de construção do conhecimento,

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considerando que o professor, em sua atividade intencional, deve organizar o seu

trabalho buscando executar mediações que conduzam à consecução dos objetivos

estabelecidos, tendo em vista um processo vivo e em permanente desenvolvimento,

no qual se realizam e legitimam formas muito diversificadas de ensinar e de

aprender.

Registramos que embora tivéssemos um público alvo (professores do 1º

anos do Ensino Médio), o convite/chamado à participação foi feito a todos os

docentes e pedagogos da escola.

Para a segunda etapa organizamos cinco encontros em forma de grupo de

estudos. O material foi organizado com base em autores/textos cujo arcabouço

conceitual estivesse fundamentado na concepção dialética do conhecimento tendo o

materialismo histórico-dialético como método, com vistas a contemplar a mesma

base conceitual das Diretrizes Curriculares Estaduais - DCE’s, publicadas em 2009.

O total da carga horária para implementação didático-pedagógica do projeto

na escola foi de trinta e duas horas. Dessas, vinte horas foram destinadas aos

encontros de estudo; quatro horas para organização de aulas com base na

fundamentação conceitual proposta, ou seja, a organização metodológica de

construção do conhecimento na perspectiva do método dialético e oito horas

destinadas a leituras dirigidas.

2. Nossos encontros, nossos olhares.

2.1 Primeiro encontro: reflexões e busca de compreensão

Iniciamos nosso primeiro encontro tendo por encaminhamento de trabalho a

leitura reflexiva do texto base: A educação básica e o currículo disciplinar. In

Diretrizes Curriculares Estaduais. SEED/PR, 2009, pgs 13-28, tendo em vista

responder coletivamente as seguintes questões:

Quem são nossos alunos? De onde eles vêm? Que referências sociais e

culturais trazem para a escola? A quem está destinado nosso ensino? Que

identidade escolar estamos estampando em nossos alunos? Que saberes têm do

conhecimento socialmente produzido? Cabe ainda nos dias atuais catalogação, com

base em uma hierarquização de mais capazes, menos capazes, sem problemas ou

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com problemas de aprendizagem? Que alternativas metodológicas estamos

adotando? Que saberes/ fazeres sociais e acadêmicos precisam ter ao concluir a

educação básica, particularmente o ensino médio?

Fundamentando-se nos princípios teóricos expostos neste documento,

situamos os sujeitos/alunos da educação escolarizada em um contexto histórico e

social e, somente, ao completar o movimento interpretativo, indo do particular ao

geral, que compreendemos com mais clareza o que representa este sujeito histórico

aos professores participantes do grupo de estudo.

A princípio, ficou claro que o arcabouço conceitual das diretrizes curriculares

estaduais fundamenta-se na concepção dialética do conhecimento tendo o

materialismo histórico-dialético como método, tanto para fundamentar a concepção

metodológica, como a ação professor-aluno.

Segundo essa linha teórica o aluno precisa ser considerado,

um sujeito que é fruto de seu tempo histórico, das relações sociais em que está inserido, mas é, também, um ser singular, que atua no mundo a partir do modo como o compreende e como dele lhe é possível participar (DCE’s, 2009, p. 14).

Se a proposição curricular visa à formação de sujeitos que se apropriam do

conhecimento para compreender as relações humanas histórica e socialmente

construídas, então a ação pedagógica que se realiza em sala de aula precisa

contribuir para essa formação, dada num processo em que participam na produção

e/ou sistematização do saber científico e tecnológico.

Ainda nas discussões sobre as questões acima referenciadas, de modo

geral, entendemos que nosso aluno, além de sujeito histórico-sócio cultural é

também, como afirma Moraes,

Singular, diferente e único (...) singular no seu capital genético (...) único para sempre em toda a espécie humana. (...) singular em sua morfologia, em sua anatomia, em sua fisiologia, em seu temperamento, em seu comportamento e em suas inteligências. (...) um ser de qualidade, de existência (...) inconcluso, inacabado É de relações (...) indiviso (...) indivíduo de totalidade integrada (...) um sujeito de práxis, de ação e reflexão sobre o seu mundo (...) um sujeito de dialogo (...) ser dotado de inteligências múltiplas em sua individualidade biológica, com diferentes perfis cognitivos e estilos de aprendizagem (...) indivíduo que aprende, representa e utiliza o

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conhecimento de modo diferente, que conhece o mundo de uma maneira especifica dependendo (...) do contexto e da cultura em que foi gerado (...) aprendiz que é produto e síntese de experiências pessoais interiores e exteriores (...) sujeito que é histórico e, ao mesmo tempo, sujeito da história, construtor de sua história (...) (MORAES, 1997, p. 134).

Ficou então, claro, que o aluno real e concreto, sujeito do seu tempo e

espaço histórico, que efetivamente está na sala de aula é um ser que tem suas

necessidades, interesses, nível de desenvolvimento cognitivo, quadro de

significações, experiências anteriores.

Nessa perspectiva a constituição do aluno/sujeito, seus saberes/fazeres

precisam ser entendidos na sua relação com outrem. Assim, também o aluno, junto

com seu professor, é chamado à condição de produtor/construtor de saberes.

Todavia, para que essa condição se efetive a dinâmica da sala de aula, via

organização metodológica dos conteúdos de ensino precisa permitir que o aluno

experimente inúmeras possibilidades de trocas e descobertas, assim como a adotar

uma postura de questionamento frente à ciência com vistas à ampliação de seu

universo de conhecimentos.

Isso implica em considerar que o processo de construção, apropriação e

difusão do conhecimento é decorrente das trocas que o aluno estabelece na

interação com o meio (natural, social e cultural), cabendo ao professor exercer a

mediação desse processo e articular essas trocas tendo em vista a assimilação

crítica e ativa dos conteúdos, vivos e atualizados.

Assim, é possível afirmar que o conhecimento, via conteúdos de ensino, é

resultante das interações produzidas entre sujeito e objeto, individualmente, e ao

mesmo tempo de forma coletiva e dinâmica porque se dá entre sujeito e objeto do

conhecimento e dos sujeitos entre si.

Considerando as premissas anteriores, evidenciou-se para os participantes

que nesse processo, professor e aluno têm papéis preponderantes. Cabe ao

professor assumir a mediação entre sujeito e objeto da aprendizagem, a fim de

posicionar o aluno como sujeito de sua própria aprendizagem.

Para tanto, as intervenções do professor devem ser intencionalmente

planejadas, contemplando a adoção de diversas proposições metodológicas,

apropriadas às diferentes atividades de ensino. Além disso, evidenciou-se ainda que

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as práticas pedagógicas, incorporando nessas, uma pedagogia fundamentada numa

concepção mais crítica das relações existentes entre educação, sociedade e

trabalho, contribuem na medida em que conseguirem assegurar a todos um ensino

de qualidade, comprometido com a formação de cidadãos/cidadãs conscientes de

seu papel na sociedade.

Incorporar na ação de ensinar, uma pedagogia, fundamentada numa

concepção mais crítica, significa compreender que a “prática pedagógica é uma

dimensão da prática social...”. Veiga (1992, p. 16). Isso significa dizer que prática

pedagógica não pode estar desvinculada da dinâmica social, da cultura, da política,

das ideologias, etc. Considerando essa relação necessária, “nenhum processo

didático pode ser entendido apenas como aplicação de técnicas ou metodologias; ao

contrário, elas só tem sentido na articulação com as concepções da educação, da

sociedade, da cultura e da política”. (Sanches, 2001. 26)

Nesse sentido é possível afirmar que o trabalho do professor em sala de

aula,

depende da concepção que se tenha da tarefa social da escola. O que se espera da escola? Quais suas funções sociais? A questão do que fazer passa, portanto, antes de qualquer coisa, pela postura do professor (e da escola), pela maneira como o professor entende seu papel social. Não dá para falar em metodologia separada de uma concepção de educação (e de sociedade). (VASCONCELLOS, 2005, p. 32)

Fica evidente, então, que práticas pedagógicas consistentes precisam estar

vinculadas a bases teórico/metodológicos que a sustentam, indispensáveis à

concretização de concepções assumidas coletivamente.

Percebemos que há ideias, conceitos, concepções profissionais docentes

que norteiam a prática pedagógica, porém que diariamente exigem o

desenvolvimento de capacidades de reflexão crítica que permitem perceber que os

processos de organização metodológica das aulas só consolidam-se com ações

voltadas para a preparação de um aluno construtor de seu conhecimento e sujeito

ativo do processo.

Neste sentido, os professores participantes entenderam ser necessário

ampliar seu mundo de ação e de reflexão, ultrapassando os limites da sala de aula,

transcendendo para um espaço de análise das relações entre as formas de ensinar

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e o contexto social amplo em transformação, assim como as dimensões do processo

de ensino e de aprendizagem, que regem a intencionalidade educativa de uma

escola democrática.

A concepção de sujeito/aluno assumida pelas DCE’s e, por consequência

pela escola e por professores, implica uma relação de ensino-aprendizagem

dialética, supondo-se que é no espaço escolar que o aluno deve se apropriar

ativamente dos conhecimentos acumulados e sistematizados historicamente pela

humanidade, formulando conceitos científicos.

Evidenciou-se ao final do nosso primeiro encontro que a prática docente, os

saberes/fazeres no cotidiano do exercício profissional, nossa percepção do aluno

acerca de seu papel na sala de aula estão carregados de significados sociais,

filosóficos e pedagógicos. Concluímos ainda que o ensino requer clareza efetiva de

intencionalidades e respectivos sentidos que orientam a ação docente partindo de

situações concretas na qual esse se realiza.

2.2 Segundo encontro: Não há docência sem discência: fragmentos e reflexões.

A partir da leitura prévia do texto: Não há docência sem discência. In:

Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Freire, Paulo.

São Paulo: Paz e Terra, 1997, p. 23-51, propomos aos professores participantes

extrair do mesmo, fragmentos para refletirmos coletivamente, os quais se encontram

abaixo elencados.

O criar, o sonhar, o inventar, possa ir sendo instrumentalizado por um educador. Possibilitando assim, um pensar e um fazer criativo diante dos grandes desafios, na construção deste educador pesquisador que faz ciência de educação. Fazer ciência exige exercício metodológico sistematizado, rigoroso, de: observar, refletir, avaliar e planejar (...).

A prática de velejar coloca a necessidade de saberes fundantes como o do domínio do barco, das partes que o compõem e da função de cada uma delas, como o conhecimento dos ventos, de sua força, de sua direção, os ventos e as velas, à posição das velas, o papel do motor e da combinação entre motor e velas. Na prática de velejar se confirmam, se modificam ou se modificam ou se ampliam esses saberes.

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Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo dos tempos mulheres e homens perceberam que era possível-depois, preciso-trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. Aprender precedeu ensinar, ou em outras palavras, ensinar se diluía na experiência realmente fundante de aprender. Não temo dizer que inexiste validade no ensino de que não resulta um aprendizado em que o aprendiz não se tornou capaz de recriar ou de refazer o ensinado, em que o ensinado que não foi aprendido não pode ser realmente aprendido pelo aprendiz. É preciso que, desde os começos do processo, vá ficando claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.

O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas, histórico como nós, o nosso conhecimento do mundo tem historicidade. Ao ser produzido, o conhecimento novo supera outro que antes foi novo e se fez velho e se “dispõe” a ser ultrapassado por outro amanhã. Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros. É a “outredade” do “não eu”, ou do tu, que me faz assumir a radicalidade de meu eu.

As reflexões acerca dos fragmentos extraídos da obra de Paulo Freire nos

permitiram compreender a priori que a relação ensino-docência-discência trata-se de

uma relação de sujeitos, cujas práticas devam estar fundamentadas no princípio do

conhecimento/emancipação e que isso só se torna possível pela coparticipação pela

corresponsabilidade de quem ensina e de quem aprende. Compreendemos, assim,

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que os alunos, são sujeitos aprendentes, que realizam sua aprendizagem-

autoaprendizagem na relação/interação com seu professor.

Os fragmentos selecionados nos permitiram ainda compreender que a

reflexão crítica sobre a prática docente e condições/formas/organização

metodológica para a produção ou construção do conhecimento pressupõe o

movimento dialético entre o fazer, e o pensar sobre o fazer. Que o ensino exige o

exercício metodológico docente de observar, refletir, avaliar e planejar. Que é nas

ações metodologicamente organizadas que se confirmam, se modificam ou se

ampliam saberes. Que estar no mundo, é ser sujeito histórico-social, capaz de

conhecer, intervir, criar e modificar o seu mundo. Portanto, não há docência sem

discência.

2.3 Terceiro encontro: Olhares sobre a metodologia dialética de construção do conhecimento: fragmentos e reflexões.

Neste encontro tivemos por texto base: Metodologia Dialética de Construção

do Conhecimento em Sala de Aula. In: Vasconcellos, Celso dos Santos, São Paulo:

Libertad, 2005, pgs 55-84. Organizamos adotando o mesmo procedimento dos

demais encontros, ou seja, leitura prévia por parte dos professores participantes e

recorte de fragmentos. Dentre os quais destacamos:

Conhecer é construir significados (“produto”), através do estabelecimento de relações (“processos”) no sujeito, entre as representações mentais (“matéria prima”) que visam dar conta das diferentes relações constituintes do objeto, ou das diferentes relações do objeto de conhecimento com outro(s). O chamado “saber escolar” é composto de uma série de objetos do conhecimento (físicos, sociais ou lógico-matemáticos) acumulados pela humanidade: linguísticos, históricos, geográficos, artísticos, matemáticos, das ciências naturais, tecnológicos, etc. que podem ser apresentados diretamente aos alunos ou através de alguma mediação (...). O que define um objeto são suas determinações, suas relações (internas e externas), que o compõem, delimitam, caracterizam; cada objeto é resultado de múltiplas relações.

A metodologia de trabalho em sala de aula é uma síntese, uma concretização, um reflexo de toda uma concepção de educação e de um conjunto de objetivos (mais ou menos explícitos). Uma metodologia na perspectiva dialética baseia-se numa concepção de

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homem e de conhecimento onde se entende o homem como um ser ativo e de relações (...). A teoria dialética do conhecimento nos aponta que o conhecimento se dá basicamente em três grandes momentos: a Síncrese, a Análise e a Síntese. Ora, sendo essa dinâmica de conhecimento universal, vale também para a situação pedagógica e que; apesar das diferenças, existem pontos fundamentais de aproximação entre a situação de conhecimento em geral e em sala de aula. Uma metodologia dialética de construção do conhecimento em sala de aula poderia ser expressa através de três grandes dimensões, eixos ou preocupações do educador no decorrer do trabalho pedagógico, que não podem ser separadas de forma absoluta, a não ser para fins de melhor compreensão da especificidade de cada uma. Como superação tanto da metodologia tradicional quanto da escolonovista, indica-se, pois: Mobilização para o Conhecimento, Construção do Conhecimento e Elaboração e Expressão da Síntese do Conhecimento. O método dialético de conhecimento em sala de aula se pauta, pois, pela construção do conhecimento a partir do movimento do pensamento que vai do abstrato (enquanto indeterminado, com relações não aprendidas) ao concreto (de pensamento). (...) o professor lança mão da cultura acumulada pela humanidade; diante dos desafios da realidade e coloca o aluno em contato com este saber (...). Este é um aspecto fundamental da concepção dialética da educação (...) o papel do professor, portanto, é ajudar a mediação aluno-conhecimento, realidade. Na perspectiva dialética, o conhecimento de um objeto se dá por um sujeito concreto, numa realidade também concreta, portanto localizada, datada, histórica (...). A tarefa pedagógica, por sua especificidade, implica num determinado período de tempo, num determinado espaço, um determinado grupo de sujeitos sobre um determinado objeto de conhecimento.

Esses fragmentos permitiram ao grupo de participantes compreenderem que

a aquisição/apropriação do conhecimento pressupõe a relação sujeito–objeto, o que

significa dizer que a compreensão de mundo está vinculada a uma relação de um

sujeito que observa a realidade e interage com ela, de forma sistemática. A relação

sujeito-objeto é, portanto, dialética.

Nessa perspectiva o conhecimento é um conceito dinâmico, que reconhece

a herança cultural da humanidade, em toda a sua diversidade. Portanto, há que se

considerar que a aquisição do conhecimento não acontece de maneira isolada e

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individual, mas é fruto das relações humanas que se concretizam num contexto

sociocultural, que se modifica no tempo e espaço.

Além do quê, as reflexões acerca da obra de Vasconcellos, nos levaram a

perceber que a organização metodológica do ensino não pode ser pensada em

termos de uma aula, mas sim, para um conjunto de aulas com vistas à totalidade do

curso.

Compreendemos, sobretudo que uma metodologia na perspectiva dialética

baseia-se na concepção de homem/sociedade/conhecimentos; que uma

metodologia dialética de construção do conhecimento implica na

mobilização/construção/elaboração do conhecimento; que na perspectiva dialética, o

conhecimento se dá por um sujeito concreto (aluno) numa realidade concreta (aula)

e que, para a concepção dialética da educação o papel do professor é o de

contribuir na mediação entre aluno/conhecimento/realidade; que a relação dialógica

mediatizada, deverá ser um exercício praticado num processo contínuo de

aprimoramento profissional com vistas a perceber a tessitura dessa rede real que

denominamos de aula.

2.4 Quarto encontro: Aula: tempo/momento e cenário pedagógicos: fragmentos e reflexões.

Selecionamos para texto base o artigo produzido para atender a um dos

critérios da formação do PDE, o qual recebeu como título: Aula: organização

metodológica de fazeres docentes numa perspectiva do método dialético de

construção do conhecimento. (Johann, Ilná A., 2011). Este material sintetiza e

fornece as linhas gerais para a implementação didático pedagógica que ora foi

realizado na escola.

A ênfase deste material que estudo consistiu em oferecer aos profissionais

da educação, particularmente, aos docentes, alguns elementos que permitissem a

reflexão e a discussão de questões que consideramos significativas para a

organização metodológica da aula, na perspectiva do método dialético de

construção do conhecimento. Destacamos que no referido artigo buscamos refletir

sobre a sala/ambientes de aula enquanto tempo (momento) e espaço (sala de

aula/ambientes escolares pedagógicos).

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A seguir elencamos os fragmentos do texto base selecionados pelos

professores participantes, a partir do olhar de alguns autores.

A sala de aula é qualquer espaço físico onde haja interação direta entre professor-aluno (seja a sala em si, a quadra, a oficina, o laboratório, o ateliê, etc.). (...) A sala de aula é o centro do acontecimento da educação escolar, pois a formação básica do educando se dá neste espaço de interação entre os sujeitos, mediados pela realidade. (VASCONCELLOS, 2005)

A sala de aula é um local especifico destinado a atividades especificas de ensino e de aprendizagem, de saberes também específicos, em níveis e complexidades diferenciadas, através de metodologias apropriadas. (SANFELICE, 1989) A sala de aula, espaço aberto que deve favorecer e estimular a presença, o estudo e o enfretamento de tudo o que constitui a vida do aluno: de suas ideias, crenças e valores (...) é um espaço que fornece explicações sobre os conhecimentos novos, sobre as relações e atitudes que se esperam do educando face à sociedade. (MASETTO, 1997)

A sala de aula é por excelência, um espaço plural, coletivo, o palco no qual professores e alunos/atores/sujeitos vivem, aprendem, ensinam, relacionam-se uns com os outros, com o mundo, com os saberes. Ali eles se expressam se expõem, se revelam, se colocam por inteiro, na totalidade. Objetividade e subjetividade, corpo e mente, razão e sensibilidade, o bio/psico/social em ação. Na sala de aula, o professor re/constrói sua bio/grafia, sua história, sua trajetória, sua experiência pessoal e profissional. Espaço de aprender e ensinar, logo, um espaço, um campo de relações. (...) A sala de aula é um espaço pleno de experiências. Os saberes, os valores culturais e políticos e os hábitos são transmitidos e reconstruídos na escola por sujeitos históricos, que trazem consigo um conjunto de crenças, significados, valores, atitudes e comportamentos construídos nos vários espaços de vivência, antes e durante o processo de escolarização. (FONSECA, 2010)

Analisado o cenário pedagógico, nos propomos a pensar então, a aula,

como momento, situação didática, espaço para investigação, formação e informação

intelectual, de criação e expressão de valores científicos; de construção e

socialização de conhecimento e de cultura; de formas de pensar, agir e interagir;

processo social de condições e oportunidades de crescimento e transformação,

utilizando o mesmo procedimento quando nos propomos a refletir sobre o espaço

sala de aula, ou seja, a partir do olhar de alguns autores utilizados no texto base.

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O termo aula se aplica a todas as formas didáticas organizadas e dirigidas direta ou indiretamente pelo professor, tendo em vista realizar o ensino e a aprendizagem (...) a aula é toda situação didática na qual se põem objetivos, conhecimentos, problemas, desafios, com fins instrutivos e formativos, que incitam as crianças e jovens a aprender. (LIBÂNEO, 1993) A aula em si deve ser um celeiro de dúvidas e, quando estas existirem, ela não deve ser vista como um espaço material, mas, sim, como um instante de construção sócio intelectual. Dessa forma, desejo explicitar o fato de que a escola necessita romper seus próprios limites físicos e se fazer vida com a vida. A aula é um espaço para investigação, para a busca de pistas que componham a construção do saber, que é um dos valiosos papéis da dúvida e, também, uma instância socializante, uma vez que nos permite estabelecer contato com uma imensa diversidade de seres e formas pensantes que precisam ser ouvidas e, consequentemente, respeitadas. É, ainda, um laboratório de formação e informação intelectual, passando a ser uma via que nos possibilita perceber outros caminhos. (BEZERRA, 2006) A aula constitui o desvelar do novo, do imprevisto, que surge na própria ação e que faz da aula um ato de criação e expressão de valores científicos, estéticos e éticos do professor, dos alunos, de um tempo, de uma cultura. (AMARAL, 2000) A aula (...) é a concretude do trabalho docente propriamente dito, que ocorre com a relação dialógica entre professor e alunos. Ela é o lócus produtivo da aprendizagem, que é também produção por excelência. O resultado do ensino é a construção do novo e a criação de uma atitude questionadora, de busca e inquietação, sendo local de construção e socialização de conhecimento e cultura. O objetivo essencial do ensino volta-se, assim, para a construção do conhecimento mediante o processo de aprendizagem do aluno. (VEIGA, 2000)

Em relação ao espaço físico, cenário pedagógico, ampliamos nosso olhar

para que pudéssemos transcender a concepção de que ensino e aprendizagem, no

âmbito escolar acontecem além do espaço da sala de aula. Percebemos que a

estruturação dos espaços/ambientes pedagógicos, a forma de organização

metodológica do ensino reflete significativamente a concepção metodológica

adotada pelo professor; que é preciso que os espaços sejam acolhedores no sentido

de aguçar a curiosidade e o interesse do aluno por outras formas de modos de

pensar, sentir, agir e de produzir conhecimentos.

Além disso, compreendemos que a sala de aula é espaço físico singular,

tempo, ritmo e atividades planejadas, mas, sobretudo, o ensino e a aprendizagem

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realizam-se através da construção e produção do conhecimento e se dá nas

relações/interações que se estabelecem entre sujeito/meio/objeto do conhecimento.

Espaço/local de relações sociais, em que há um encontro de sujeitos de

naturezas diversas, que compartilham ideias, trocam experiências, que trazem e

carregam consigo saberes/fazeres cotidianos que foram apropriados/internalizados

durante sua trajetória de vida oriunda dos meios sociais e culturais. Saberes/fazeres

que precisam ser transformados em conhecimento cientifico, via

organização/intervenção metodológica dinâmica dos conteúdos de ensino.

Tendo clareza do cenário pedagógico, compreendemos então, que a aula é

situação didática; é momento para investigação; é situação de formação e

informação intelectual; vivência de criação e expressão de valores científicos, de

construção e socialização de conhecimento e cultura; é relação entre sujeitos

envolvidos numa mesma ação de intencionalidades explícitas.

É uma prática pedagógica contextualizada; atividade docente intencional e

planejada porque se constrói em torno de uma estrutura teórico-prática,

sistematizada, organizada; é momento de conhecimento do aluno, coautor de sua

história escolarizada; é visualização de que o conhecimento gerado precisa ser

tratado sob o enfoque da transformação, da diversidade e da emancipação, da não

finitude; é aprimoração necessária da prática pedagógica; é produção e utilização de

ferramentas, técnicas e métodos considerando múltiplos recursos; é possibilidade de

ousar ensinar por novos caminhos.

Em síntese, ficou claro aos participantes, agora, com um olhar mais

cientificamente elaborado por conta das reflexões/discussões feitas, que a sala de

aula, (espaço), e a aula em si (momento) tem uma linguagem própria, singular, que

gera significância a partir da concepção que temos sobre espaço/tempo escolar.

Outros significados e sentidos foram construídos neste encontro mediante ações

reflexivas e de certa forma até criticas sobre a natureza da atividade docente e a

organização metodológica do ensino.

Dentre esses destacamos que ficaram evidente para o grupo que nossas

ações docentes, por vezes estão subordinadas a perspectivas ideológicas,

concepções de como o conhecimento pode ser trabalhado, diferentes processos de

enfoques da aprendizagem, que sustentam nossas decisões pedagógicas e

delimitam nosso trabalho desenvolvido em sala de aula.

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Entendeu o grupo que compreender/refletir sobre a natureza dos discursos

pedagógicos possibilita-nos interpretar as ações educativas com maior clareza,

segundo modelos teóricos a que estão subjacentes, e que nos ambientes/espaços

de ensino, o professor é quem organiza metodologicamente a aula, compreende e

executa uma ação, a priori planejada.

E, por se tratar de ação educativa há que se contemplar fundamentalmente

o “sujeito, o objeto e o contexto do conhecimento” (VASCONCELOS, 2005, p.65).

Portanto, a organização da aula entendida como questão metodológica, é de

responsabilidade do professor, que tem a tarefa de desencadear, de provocar

inicialmente este processo que implica em “planejar, executar, (re) avaliar”,

sistematicamente.

2.5 Quinto encontro: Análise do filme: O Sorriso de Mona Lisa (Mona Lisa Smile, 2003): recortes e reflexões.

Para finalizar nossos encontros selecionados um filme que permitisse aos

participantes estabelecer relações entre o próprio cenário pedagógico tempo/espaço

e aquele trazido pela história do filme, as quais resumidamente registramos. A

centralidade histórica do filme se dá sobre a vida profissional de Katharine Watson,

que recém-graduada como professora consegue emprego no conceituado colégio

Wellesley, para lecionar aulas de História da Arte. Incomodada com o

conservadorismo da sociedade e do próprio colégio em que trabalha, decide lutar

contra essas normas e acaba inspirando suas alunas a enfrentarem, além dos

desafios da vida, a (re) construírem conhecimentos.

O encaminhamento deste encontro se deu em comum acordo entre os

participantes: assistir o filme da forma mais proveitosa para cada um. Alguns

optaram por assistir individualmente, outros optaram por assistir com os alunos. A

atividade proposta foi a de que todos deveriam fazer pequenos recortes para análise

reflexiva do grupo. Dos recortes feitos, elencamos:

Primeiro contato da professora com a turma: surpresa e estarrecimento ao perceber que as alunas haviam aprendido eficientemente o “exercício” da memorização, evidenciando-se assim um conhecimento limitado acerca dos conteúdos de ensino,

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organizados em material de consulta: apostila e o desconhecimento da própria disciplina História da Arte.

Suas primeiras aulas foram frustrantes do ponto de vista pedagógico.

Não contente se propôs ao exercício da prática reflexiva de sua ação docente, particularmente sobre a organização metodológica do conhecimento, pois a forma de apropriar-se dos mesmos pelas alunas não condizia com aquilo que entendia por (re) construção de saberes.

A professora em diferentes situações “provoca” didaticamente, questiona, instiga as alunas buscarem outros saberes além-apostila, ou seja, a partir do conhecimento dado, (re) construir outros, refletindo sobre os mesmos com um “olhar mais apurado, elaborado”.

Cena em que a professora leva as alunas para conhecer um quadro de Jackson Pollack. Diante da obra, pede que as mesmas apreciem apenas o quadro. O “apreciar”, nas entrelinhas e “construam saberes próprios” acerca desse objeto do conhecimento. Faz com que as alunas percebam que através da pintura, o artista mostra como “pensa” o mundo, qual é sua atitude, sua capacidade de ver e de recortar no que vê aquilo que é necessário, para que ele realize seu trabalho. Questionem os conceitos pré-estabelecidados.

Noutra cena, a professora incentiva às alunas a procurarem respostas novas para as próprias perguntas. “Olhem além da pintura”, diz ela. Que olhar é esse? É o olhar do enfrentamento à resistência em mudar; fazer diferente, buscar respostas outras, para as mesmas perguntas; posicionar-se; envolver-se e envolver o aluno “no e sobre” o objeto do conhecimento. A professora mostra às alunas a tela Girassol de Van Gogh, esclarecendo que o pintor não pintava as coisas como elas eram, mas sim como ele as via. Desafia as alunas a se conformarem em reproduzir a mesma tela ou ainda produzir uma nova tela a partir de seus saberes/fazeres. Aguça, nas alunas, a capacidade de inovar, registrar, sistematizar a sua prática, a sua experiência. Nesse contexto, a professora se apresenta como mediadora entre a aprendizagem e o objeto do conhecimento. Conjugando diversas formas metodológicas de aprendizagem (olhar, pensar, observar, sentir), na cena em que visitam a exposição de novos artistas, as alunas veem de perto uma tela de Jackson Pollock. A professora pede para que suas alunas não comentem, critiquem ou teçam qualquer comentário sobre a obra. Sua solicitação é de imediata atendida. Evidencia-se que a forma proposta de “apreciar o objeto do conhecimento” possibilitou às alunas perceberem que é possível construir saberes com base no “olhar que vai além da simples aparência” ou “impressão primeira”. Ao se deparar com o conservadorismo da instituição de ensino, a professora trabalha além conteúdos programáticos. Decide questionar os papéis de gênero impostos pela sociedade e pela escola. Nessa perspectiva, procurou-se discutir sobre questões relativas às diferenças de gênero, ao casamento, divórcio,

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discriminação e emancipação da mulher na sociedade daquela época e da atualidade, bem como analisar a influência que a cultura e a sociedade exercem sobre as relações sociais a serem desempenhadas entre homens e mulheres em determinado contexto social.

Averiguamos que foi possível compreender o “conteúdo fílmico” com um

olhar didático e que o trabalho com filmes em situações de formação continuada

pode contribuir significativamente para revermos nossas ações do “pensar e fazer”

didático- pedagógico que envolve situações de ensino e de aprendizagem.

Reconhecemos do ponto de vista didático que o filme nos possibilitou

perceber que já não há tempo para “reproduzirmos a mesma tela”. Que precisamos

sim produzir outras telas, e, que essas podem ser “pensadas, desenhadas” a partir

de reflexões/discussões com nossos pares, durante o exercício profissional. Isso

significa afirmar que entendemos ser necessário questionar continuamente nossas

próprias posições filosóficas, epistemológicas, políticas e ideológicas à medida que

nos vemos como sujeitos históricos de um tempo/espaço escolar.

Criar uma nova postura como professor em relação ao aluno é outra reflexão

que o grupo entendeu ser indispensável. Para tanto, contínuas e habituais reflexões

críticas sobre a própria prática necessitam ser exercitadas, com vistas a “olhar todas

as cores da tela”.

Evidenciou-se ainda nas discussões/reflexões que em muitas situações

vividas em sala de aula olhamos apenas um ou alguns aspectos da realidade da

aula a cada momento, ofuscando assim os demais que compõem a totalidade de

uma aula (objetivos, conteúdos, metodologia, avaliação, relações interpessoais).

Por vezes, os recortes do filme nos permitiram ainda perceber que a “parte

mais desafiadora” no exercício profissional é produzir novos conhecimentos para a

teoria e a prática de ensinar, o que demanda uma compreensão profunda da razão

de ser de nosso ato pedagógico.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Se considerarmos que a escola deve ser o local onde os alunos participam

de relações cujo objetivo seja a aquisição de conhecimentos diversos que os

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capacitem a compreender o mundo e sua dinâmica histórica, e ainda, que possam

intervir criticamente, teremos, então, que problematizar e interrogar

permanentemente as práticas escolares.

O trabalho docente implica em selecionar e organizar metodologicamente

conhecimentos, bem como torná-los passíveis de ser objeto de escolarização dos

alunos. Assim, existe para o professor de qualquer campo do conhecimento a

necessidade concreta de estudar, discutir coletivamente e construir a condição de

produzir a sua prática pedagógica.

O estudo dos textos e as discussões que emergiram durante nossos

encontros apontam para a convergência de que a organização metodológica dos

conteúdos de ensino é complexa, portanto exige uma formação teórico-prática que

favoreça a apropriação dos fatos e teorias que servem de base para a construção

dos processos educativos em seus diferentes espaços e dimensões, e, ainda, que

precisamos no exercício da docência nos apropriar criticamente das diversas formas,

procedimentos, métodos e técnicas através dos quais se acessa e produz os

conhecimentos acumulados pela humanidade.

Para tanto, precisamos de um olhar diferenciado para nossos alunos. Um

olhar para o mundo em que vivem. Um olhar cauteloso para seus valores, para suas

aspirações e para suas necessidades. Talvez seja este o grande desafio da

educação na atualidade, o de reconhecer este mundo tão diferente, porém,

indissociável da prática pedagógica manifesta nos espaços/ambientes escolares.

O aluno insere-se, assim, nessa perspectiva, como um ser em constante

transformação, edificando-se no espaço social e no tempo histórico e é concebido

como sujeito ativo que cria o meio e a realidade é, ao mesmo tempo, produto dessa

realidade construída e (re) construída por ele próprio. A educação, portanto, como

fenômeno social, só pode ser compreendida como dinâmica de inter-relações entre

os homens e entre eles e sua realidade concreta.

Nossas reflexões advindas dos encontros nos permitiram compreender que

é possível vencer as dificuldades originárias de uma prática pedagógica quando se

descobre novos caminhos para agir dialeticamente, possibilitando a construção

coletiva de novos saberes/fazeres identificando-se com uma categoria de ação que

transforma o velho e constrói novo.

Por fim é importante ressaltar que esse trabalho é um convite a contínuos

momentos de estudo e reflexão, estendido aos professores, responsáveis diretos

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pela organização metodológica de suas aulas, ação essa, que não pode mais ser

olhada de forma unilateral, linear e fragmentada, mas sim, em sua totalidade.

4 REFERÊNCIAS

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