nós e a gente na fala de alunos

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NÓS E A GENTE NA FALA DE ALUNOS DE ESCOLA PÚBLICA Diana Pilatti Onofre – SED/MS Rosângela Villa da Silva – CPAN/UFMS II Seminário Internacional de Língua e Literatura na Fronteira Sul Linguagem: pesquisa e ensino

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Comunicação apresentada no II Seminário Internacional de Língua e Literatura na Fronteira Sul Linguagem: pesquisa e ensino em Chapecó/SC

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Page 1: Nós e a gente na fala de alunos

NÓS E A GENTE NA FALA DE ALUNOS DE ESCOLA PÚBLICADiana Pilatti Onofre – SED/MSRosângela Villa da Silva – CPAN/UFMS

II Seminário Internacional de Língua e Literatura na Fronteira Sul

Linguagem: pesquisa e ensino

Page 2: Nós e a gente na fala de alunos

Hipótese inicial

Procuramos observar como membros de uma comunidade escolar da periferia de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, utilizam a primeira pessoa do plural, partindo da hipótese inicial que ambas variedades coexistem em harmonia.

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Comunidade Escolar

A Escola Estadual José Ferreira Barbosa localiza-se na Vila Bordon, periferia oeste de Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Fundada em 1974, a escola visava, originalmente, atender famílias de trabalhadores do curtume. Atualmente a escola oferece Ensino Fundamental e Médio para famílias que residem também nos bairros vizinhos (trabalhadores do curtume, autônomos, ou funcionários das fábricas de calçados e roupas da Zona Industrial Oeste da capital).

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Córpus

O córpus organizado para esse artigo é uma parte de um córpus maior, cujas entrevistas foram realizadas em meados de 2007, originalmente para uma dissertação de mestrado sobre o uso do Tópico como forma de organização frasal (UFMS). Durante o desenvolvimento da dissertação observamos que vários informantes utilizavam a gente para fazer referência a primeira pessoa do plural, como este não era o foco naquele momento, guardamos essa “inquietação” para uma nova pesquisa.

Page 5: Nós e a gente na fala de alunos

Metodologia

A teoria que nos serviu de base é a Sociolinguística Variacionista, que ocupa-se do estudo da língua em relação ao seu contexto de uso, assim, observamos fatores sociais e linguísticos que podem contribuir (ou não) para compor a preferência dos falantes (LABOV, 1983).

São pesquisadores que nortearam esta pesquisa Lopes (1998), Bueno (2003), Muniz (2008), Brustolin (2010), Mendonça (2012).

Page 6: Nós e a gente na fala de alunos

Análise dos dados

Após tratamento e análise das doze entrevistas, constatamos 171 ocorrências de primeira pessoa plural, sendo 96 para a gente e 75 para nós. Partimos do pressuposto que ambas coexistiriam dentro do grupo de falantes, porém em se tratando de oralidade e variação linguística, colocamos a forma inovadora a gente como valor de aplicação, e obtivemos um input de 0,55 indicado pelo programa.

Page 7: Nós e a gente na fala de alunos

Gráfico n° 1: percentagens de ocorrências de nós versus a gente.

Page 8: Nós e a gente na fala de alunos

Fatores Linguísticos

Concordância e desinência verbal

Eu-ampliado

Paralelismo formal

Função sintática

Tempos verbais

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Concordância e desinência verbal

(a) nós + verbo na 1ª pessoa plural

Nóis temus qui ajudá as pessoas. (feminino 16 anos)

(b) nós + verbo na 3ª pessoa singular

Logu qui nóis mudô lá na minha casa... era um buracu! (masculino 16 anos)

(c) a gente + verbo na 1ª pessoa plural

A genti falamus: óó vai see issu... (masculino 20 anos)

(d) a gente + verbo na 3ª pessoa singular

A genti brinca de pega-pega na física. (feminino 6 anos)

Page 10: Nós e a gente na fala de alunos

Das 149 ocorrências de nós e a gente (ocupando a posição de sujeito), somente 27 sentenças apresentaram concordância verbal com a pessoa plural, para 122 sentenças cujos verbos não apresentaram a desinência -mos marcando o plural segundo a norma, apresentando peso 0,59.

Gráfico n° 2: concordância verbal nós/agente na posição de sujeito.

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Eu-ampliado

(a) nós/a gente = eu

Nóis sonha cum lugar grandi... eu tenho curiosidade em conhecer cidades estrangeiras... (feminino 16 anos)

(b) nós/a gente = eu + ele/eles

Eu descobri minha irmã... a genti tinha mais di trinta anus já! (feminino 40 anos)

(c) nós/a gente = qualquer pessoa

U mundu tá evoluindu i a genti tem qui concordá... (masculino 37 anos)

Page 12: Nós e a gente na fala de alunos

Tabela nº 01 Eu-ampliado

Aplicação/ocorrências

% Peso relativo

nós/a gente = eu 003/004 2 0,90

nós/a gente = ele/eles 066/125 73 0,73

nós/a gente = qualquer pessoa 024/042 24 0,10

total 096/171 100

Page 13: Nós e a gente na fala de alunos

Paralelismo formal

(a) A gente ... Ø (isolado)

A genti si desintendeu lá, i minha irmã tinha ganhadu um invelopi di carta. (masculino 16 anos)

A gente ... a gente

A genti ficô cum medu di acontecê... delis ficá cum raiva da genti. A genti era novu na cidadi. (feminino 18 anos)

A gente ... nós

(...) E dái a genti si conhecemus, só qui daí quandu nós casamus eu fui morar com minha sogra... (masculino 20 anos)

Page 14: Nós e a gente na fala de alunos

Tabela nº 02 Paralelismo formal

Aplicação/ocorrências

% Peso relativo

A gente ... Ø 035/068 36 0,65

A gente ... a gente 049/079 46 0,50

A gente ... nós 012/024 14 0,49

total 096/171 100

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Função sintática

Visamos obsevar qual a maior ocorrência de nós/a gente em relação à função sintática que desempenha, se sujeito ou objeto.

(a) Sujeito:

A genti tava fazendu piquiniqui. (feminino 40 anos)

(b) Objeto:

Di veiz im quandu eli dá aula pra genti. (feminino 6 anos)

Mesmo em proporções menores, o programa GoldVarb, indicou a posição de objeto com maior peso para a presença de a gente: ocorrências 010/019, com peso 0,88; sendo o sujeito 079/144, com peso 0,46.

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Tempos Verbais

Tabela nº 04 – Tempos VerbaisAplicação/ocorrências

% Peso relativo

Presente 054/093 58 0,66Pretérito perfeito 019/035 54 0,33Pretérito imperfeito 011/026 42 0,60Infinitivo 008/012 66 0,54

Page 17: Nós e a gente na fala de alunos

Fatores Sociais

Sexo do informante

Faixa etária

Gênero

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Sexo do informante

Nos estudos de Muniz (2008), Brustolin (2010) e Mendonça (2012), as mulheres apresentaram maior peso para a variedade inovadora a gente.

Em nossa pesquisa, o sexo feminino possui peso 0,67, enquanto o sexo masculino fez maior uso da forma canônica, com peso 0,46.

Page 19: Nós e a gente na fala de alunos

Escolaridade

Por se tratar de uma pesquisa em torno de comunidade escolar, todos os informantes estão em faze de escolarização, tanto no início (Ensino Fundamental) e ao final (Ensino Médio).

Tabela nº 05 – Escolaridade dos informantesAplicação

/ocorrências% Peso

relativoEnsino Fundamental 020/032 81 0,61Ensino Médio 076/139 18 0,54

Page 20: Nós e a gente na fala de alunos

Faixa Etária

Neste grupo, buscamos averiguar os usos de nós/a gente em três faixas etárias: 06 até 14 anos, 15 até 24 anos e de 25 até 40 anos.

Nossos resultados apontaram que informantes mais jovens apresentaram maior peso (0,67) favorecendo o uso da forma inovadora, enquanto adolescentes e adultos tiveram pesos equiparados (0,53).

Page 21: Nós e a gente na fala de alunos

Considerações finais

Confirmando-se nossa hipótese inicial, contatamos que os falantes do grupo estudado usam tanto a forma inovadora, quanto a canônica. Ao atribuirmos valor de aplicação a forma inovadora, constatamos que, em sua maioria, os pesos eram iguais ou superiores a 0,50, demonstrando uma tendência deste grupo a manutenção dessas variedades ao fazer referência a primeira pessoa plural.

Page 22: Nós e a gente na fala de alunos

Contatamos também que há uma forte tendência ao apagamento da desinência -mos dos tempos verbais, o que nos sugere tanto a economia linguística (uma vez que o falante marca o plural por meio de um pronome e não vê necessidade em marcar o restante da sentença) e, em menor proporção, para que a sentença assuma um teor indeterminado (nos casos do eu-ampliado referente a quaisquer pessoas).

Page 23: Nós e a gente na fala de alunos

No que diz respeito às formas paralelas, percebemos que o falante tende a manter o pronome inicial (pois os pesos relativos mantiveram-se próximos), como a forma inovadora a gente foi mais recorrente na amostra (56%) é mais provável que ela mantenha-se até o próximo “turno”.

Page 24: Nós e a gente na fala de alunos

Quanto às variedades sociais, chamou-nos a atenção o grupo referente ao sexo do informante, uma vez que as mulheres apresentaram uma preferência pela forma inovadora.

Quanto aos outros fatores sociais, percebemos que quanto mais jovens e menos escolarizados forem os falantes desse grupo maior a tendência do uso da forma inovadora a gente para marcar a primeira pessoa plural.

Page 25: Nós e a gente na fala de alunos

Referências

BUENO, Elza Sabino da Silva. Nós, a gente e o boia-fria. São Paulo: Editora Arte & Ciências, 2003.

BRUSTOLIN, Ana Kelly Borba da Silva. Uso e variação de nós e a gente na fala e escrita de alunos do ensino fundamental. Anais do IX Encontro do CELSUL. Palhoça SC, out. 2010.

ILARI, Rodolfo et alli. Os pronomes pessoais do português falado: roteiro para a análise. In: CASTILHO, Ataliba Teixeira de; BASÍLIO, Margarida (orgs.) Gramática do português falado. 2. ed., Campinas: Editora da Unicamp, 2002.

LABOV, William. Modelos sociolinguísticos. Tradução de José Miguel Marinas Herreras. Madrid: Cátedra, 1983.

LOPES, Célia Regina dos Santos. Nós e a gente no português falado culto do Brasil. DELTA, São Paulo, v. 14, n. 2, 1998. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script =sci_arttext&pid=S0102-44501998000200006&lng=en&nrm=iso Acesso em 10 nov 2013. 

MENDONÇA, Alexandre Kronemberger de. Nós e a gente na cidade de Vitória: análise da fala capixaba. Revista PERcursos linguísticos. v2. n4. 2012. Disponível em http://periodicos.ufes.br/percursos/article/view/3173, acesso em 02 nov 2013.

MONTEIRO, José Lemos. Para compreender Labov. 2ª edição. Rio de Janeiro: Vozes, 2002.

MUNIZ, Cleuza Andrea Garcia. Nós e a gente: traços sociolinguísticos no assentamento. Dissertação de Mestrado. Campo Grande/MS: Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 2008.