no silêncio entre dois suspiros

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Hayat Shah foi cativado por Mina antes mesmo de conhecê-la. A bela, inteligente e espirituosa amiga de sua mãe é uma lenda na família. Quando ele descobre que Mina está deixando o Paquistão para vir morar com eles na América, Hayat fica entusiasmado. Seu pai, descrente do mundo fundamentalista, nem tanto. O que ninguém esperava é que Mina, ao mostrar a Hayat a beleza e o poder do Islã, transformasse para sempre a vida do garoto. Em No silêncio entre dois suspiros Ayad Akhtar tece um romance verdadeiramente sensível e excitante sobre uma família mulçumana lutando com fé por seu lugar na sociedade americana.

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São Pau l o, 2014

um romance de

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Page 4: No silêncio entre dois suspiros

2014IMPRESSO NO BRASILPRINTED IN BRAZIL

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO ÀNOVO SÉCULO EDITORA LTDA.

CEA – Centro Empresarial Araguaia IIAlameda Araguaia 2190 – 11º Andar

Bloco A – Conjunto 1111CEP 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – SP

Tel. (11) 3699-7107www.novoseculo.com.br

[email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Akhtar, AyadNo silêncio entre dois suspiros / Ayad Akhtar ; [traduzido por Cinthia Alen-car]. -- Barueri, SP : Novo Século Editora, 2014.

Título original: American dervish.1. Ficção norte-americana I. Título.

14-03768 CDD-813

Índices para catálogo sistemático:1. Ficção : Literatura norte-americana 813

American DervishCopyright © 2012 by Ayad Akhtar

Copyright © 2014 by Novo Século Editora Ltda.This edition published by arrangement with Little, Brown, and Company,

New York, New York, USA.All rights reserved.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995)

Editor-Assistente

Coordenação Editorial

Tradução

Preparação

Diagramação

Capa

Revisão

Mateus Duque Erthal

Renata de Mello do Vale

Cinthia Alencar

Lílian Moreira Mendes

Project Nine

Lumiar Design

Tássia Carvalho

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Para minha mãe e Marc H. Glick.

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E Alá disse: estou ao lado dos que têm o coração partido.

Hadith Qudsi

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Prólogo: 1990 ........................................................................................11

LIVRO UM Para íso perdido

1 Mina ............................................................................................23

2 Uma voz calma e suave ........................................................33

3 A abertura .................................................................................47

4 Um novo mundo ....................................................................59

LIVRO DOIS Nathan

5 Amor à primeira vista ...........................................................73

6 O dervixe ...................................................................................93

7 Os judeus e nós ................................................................... 105

8 Dia da Independência ....................................................... 127

9 Os hipócritas ......................................................................... 140

LIVRO TRÊS Retrato de um garoto ant issemita

10 A mesquita em Molaskey Hill ....................................... 161

11 A virada ................................................................................ 185

12 Sonhos febris ...................................................................... 202

13 Atos de fé ............................................................................ 216

Sumário

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LIVRO QUATRO M ina , a der v ixe

14 Sunil, o absurdo ................................................................. 229

15 Começa a despedida ....................................................... 245

16 Nikah ..................................................................................... 261

17 O longo desenrolar .......................................................... 287

Epílogo: 1995 Esta história termina em Boston. .................. 309

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Prólogo: 1990

Lembro-me de tudo com a vivacidade que marca um momento que se tornaria um divisor de águas.

A quadra brilhava, luzes refletidas sobre sua superfície amadeirada com tons de marrom dourado. À beira das linhas, jogadores se amontoa-vam junto a seus técnicos e, ao longe, estávamos nós, fileiras e fileiras de vozes gritando, ansiosas pelo fim do pedido de tempo.

Lá embaixo, avistei um vendedor aproximando-se: um homem cor-pulento, de cintura larga, com um rabo de cavalo marrom-avermelhado caindo por trás de seu boné preto e laranja, as cores de nossa universidade.

– Cachorro-quente! – berrava. – Cachorro-quente!Acenei. Ele fez que sim com a cabeça, mas antes parou três fileiras

abaixo para atender outro cliente. Perguntei a meus amigos se queriam alguma coisa.

Cerveja e cachorro-quente com salsichão de porco foi o pedido de todos.

– Acho que ele não tem cerveja, pessoal – respondi.Na quadra, os jogadores retornavam às suas posições para o último

minuto do quarto. A multidão se levantou.O vendedor entregou o troco, levou a caixa de metal à cintura e subiu

os degraus que conduziam até onde estávamos.– Tem cerveja? – perguntou um de meus amigos.– Só cachorro-quente.– Então, três cachorros, dois com salsichão de porco e um normal

– falei.Com um discreto aceno, abriu a tampa da caixa e retirou dela nosso

pedido. Peguei minha carteira, rejeitando o dinheiro que meus amigos

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me estendiam. O rapaz me entregou três pacotes brilhantes, macios e mornos.

– O normal é o de cima. São nove dólares.Distribuí os sanduíches e paguei-os.A torcida se agitou quando o time se aproximou da cesta. Desembrulhei

meu pacote e descobri que não segurava um cachorro-quente normal, mas um com salsicha de porco.

– Pessoal? Alguém ficou com o cachorro normal? – gritei para meus amigos em meio a todo o barulho.

Os dois balançaram a cabeça. Eram salsichões também.Virei-me para chamar o vendedor novamente, mas me contive. Que

razão eu teria para não comer aquilo?Nenhuma, pensei.Nosso time seguia novamente em direção à cesta, onde sofreu falta.

Quando o apito tocou, os gritos eram ensurdecedores.Levei a salsicha à boca, fechei os olhos e mordi. Meu coração dis-

parou conforme eu a mastigava; o gosto adocicado e defumado, leve-mente picante, me parecia absolutamente extraordinário, talvez pelo fato de ter sido proibido por tanto tempo. Senti-me simultaneamente corajoso e ridículo. Ao engolir, experimentei uma estranha calmaria.

Olhei para o teto.Ainda estava ali. Nem perto de desmoronar.Depois do jogo, caminhei pelo campus sozinho; as luzes dos pos-

tes cintilavam na névoa, sobre flores brancas em uma agradável noite de novembro. O ar úmido soprava e serpeava. Senti-me vivo. Braços e pernas livres. Até um pouco zonzo.

De volta ao dormitório, fitei-me no espelho do banheiro. Meus ombros pareciam diferentes. Estavam abertos, e não contraídos. Aliviados do fardo. Meus olhos atraíram minha atenção; foi ali que vi o que sentia: algo silencioso, forte e tranquilo.

Senti-me completo.Dormi profundamente naquela noite, um sono sereno como o de um

bebê repousando nos braços amorosos da mãe. Quando finalmente ouvi o despertador, eram 9h15. A luz do sol inundava o quarto. Era quinta-feira,

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ou seja, tinha aula de Pesquisa sobre História Islâmica com o Professor Edelstein em quinze minutos. Ao vestir meu jeans, surpreendi-me com a sensação de formigamento que o brim novo causava em minha pele. Aparentemente, as maravilhas da noite anterior ainda estavam por ser descobertas.

Lá fora, outro dia atípico para a estação, quente e com vento. Depois de correr até o Grêmio Estudantil para tomar uma xícara de chá, voei para o Schirmer Hall. Alcorão debaixo do braço, derramando água quente por onde passava. Não gostava de me atrasar para as aulas de Edelstein. Precisava garantir um lugar no fundo da sala, perto da janela que ele mantinha aberta, onde teria espaço para observar e contemplar silen-ciosamente enquanto um Edelstein diminuto e magnético continuava a derrubar, semana após semana, o que ainda restava da fé que conheci na infância. E havia ainda outro motivo para eu escolher o fundão: era onde Rachel se sentava.

O Professor Edelstein parecia mais divertido e formal usando uma variação de sua corriqueira mistura de tons pastéis: camisa malva impe-cavelmente passada, abotoada até o pescoço, gravata borboleta rosa-pink e suspensórios que combinavam com o tom castanho de seus sapatos recém-polidos.

Cumprimentou-me com um caloroso sorriso quando entrei.– Olá, Hayat.– Oi, Professor.Desviando das carteiras, dirigi-me ao canto onde normalmente me

sentava. Rachel mastigava um biscoito.– Oi.– Olá.– Como foi o jogo?– Bom.Ela concordou, e o canto de seus lábios se curvaram timidamente sob

o efeito do meu olhar. Foi essa beleza, os olhos azuis cintilantes, que me levou a arriscar convidá-la para o jogo na noite anterior. Esperei todo o semestre para chamá-la para sair. No entanto, quando tomei coragem, ela disse que precisava estudar.

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– Quer um pouco? – perguntou-me. – São de aveia e passas.– Claro.Quebrou um pedaço do biscoito e me entregou.– Fez a leitura para hoje? – indagou.– Não precisei.– Por que não?– Conheço os capítulos que ele pediu... de cor.– Conhece? – Seus olhos se arregalaram de surpresa.– Cresci tendo de memorizar essas coisas – expliquei. – Algumas

crianças muçulmanas passam por isso. Decoramos o Alcorão... Somos chamados de hafiz.

– Sério? – Ela estava impressionada.Dei de ombros.– Não que eu me lembre de muita coisa. Mas dos capítulos que ele

passou para hoje eu me recordo...Lá na frente, Edelstein começou a falar.– Tenho certeza de que todos fizeram sua leitura. O que veremos

hoje não é fundamental, porém trata-se obviamente de um material importante. Gostaria que vocês continuassem. O Alcorão pode ser bas-tante vagaroso e, portanto, quanto mais conseguirmos ler neste semestre, melhor. – Fez uma pausa e organizou seus papéis.

Rachel ofereceu-me o resto de seu biscoito de aveia, sussurrando:– Quer acabar?– Com certeza – respondi, aceitando o pacote.– Hoje, gostaria de compartilhar com vocês o recente trabalho que

alguns de meus colegas têm realizado na Alemanha. Não pude lhes ofe-recer nenhum texto a respeito, pois tudo está acontecendo neste exato momento. É a vanguarda do mundo acadêmico islâmico. – Edelstein fez nova pausa, agora olhando especialmente para os estudantes que eram muçulmanos desde que nasceram (éramos três), e acrescentou com cui-dado: – E o que tenho a dizer poderá chocar alguns de vocês.

Assim, começou sua aula sobre os manuscritos de Sana’a.Em 1972, enquanto restaurava um antigo mosteiro em Sana’a,

Iêmen, um grupo de trabalhadores, ocupado em reparar o telhado

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original, encontrou uma pilha de pergaminhos e livros deteriorados escondida entre as vigas. Era uma espécie de túmulo, do tipo que os muçulmanos, proibidos de queimar o Alcorão, usam para descartar respeitosamente cópias danificadas ou velhas de seu livro sagrado. Os homens colocaram os manuscritos em sacos de batata e os guardaram em local seguro até que o amigo de Edelstein, um colega de trabalho, procurou os documentos cerca de sete anos mais tarde para examiná--los. Era uma descoberta sem precedente: as folhas dos pergaminhos datavam dos primeiros dois séculos do Islã; eram os fragmentos do mais antigo Alcorão já encontrado. O mais chocante, segundo Edelstein, é que havia anormalidades e divergências em relação ao Alcorão que os muçulmanos vinham utilizando havia mais de mil anos. Resumindo, Edelstein afirmou, seu colega alemão estava prestes a revelar ao mundo que a arraigada crença islâmica em seu livro sagrado como a direta, imutável e eterna palavra de Deus não passava de ficção. Os muçul-manos não seriam poupados do destino dado aos cristãos e judeus ao longo dos últimos três séculos: o Alcorão, como a Bíblia, seria um docu-mento histórico, segundo o senso comum.

Na fileira da frente, um dos estudantes, Ahmad, um muçulmano, interrompeu Edelstein levantando as mãos com raiva.

Edelstein parou.– Sim, Ahmad?– Por que seu amigo ainda não publicou essas descobertas? – Ahmad

perguntou rispidamente.Edelstein encarou Ahmad por um momento antes de responder e, ao

fazê-lo, seu tom era conciliatório:– Meu colega e sua equipe estão preocupados em perder acesso aos

textos se revelarem suas descobertas às autoridades iemenitas. Uma série de artigos está sendo preparada com a garantia de que haverá tempo sufi-ciente para examinar todas as 14 mil páginas cuidadosamente, caso nunca mais possam tocar nesses documentos.

Ahmad elevou o tom de voz, áspero e amargo:– E como exatamente seriam impedidos de vê-los novamente?Silêncio. O clima ficou pesado e tenso.

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– Não há razão para se exaltar, Ahmad. Podemos conversar como acadêmicos...

– Acadêmicos! Que tipo de acadêmico faz afirmações sem descober-tas documentadas? Huh?!

– Compreendo que se trata de um assunto controverso, mas não há necessidade...

Ahmad interrompeu-o:– Controverso, não, Pro-fes-sor – exclamou, cuspindo com asco a

sílaba do meio para Edelstein –, é explosivo. – Ahmad levantou-se da car-teira, os livros em mãos. – Ul-tra-jante e ex-plo-sivo! – gritou. Com um olhar em direção a Sahar, uma garota malaia geralmente reticente que se sentava à sua esquerda e que baixou a cabeça, arranhando nervosamente seu material, e outro em minha direção, Ahmad saiu irritado.

– Alguém mais deseja sair? – Edelstein perguntou, visivelmente inco-modado. Depois de uma breve pausa, Sahar juntou suas coisas em silên-cio, levantou-se e saiu.

– Só falta o senhor, Hayat.– Não se preocupe, Professor. Sou um Mutazalite genuíno e praticante.O rosto de Edelstein iluminou-se com um sorriso.– Abençoado seja.

Terminada a aula, levantei-me e me estiquei, mais uma vez surpreso com o quão vivo e acordado me sentia.

– Para onde você vai? – Rachel perguntou.– Para o Grêmio.– Quer caminhar um pouco? Estou indo para a biblioteca.– Claro – respondi.Do lado de fora, enquanto passeávamos sob as árvores desfolhadas

até a biblioteca, Rachel comentou que havia se surpreendido com a saída de Ahmad e Sahar.

– Não se assuste – sugeri. – Em alguns círculos, por muito menos, uma pessoa pode perder a vida.

Ela pareceu não acreditar.

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– Veja Rushdie – disse eu. Há apenas um ano tinha ocorrido a fatwa, um evento que ainda estava na mente de todos1.

Rachel balançou a cabeça.– Não entendo dessas coisas... Mas qual o significado do que você

disse a Edelstein?– Sobre ser um Mutazalite?– É.– Trata-se de uma vertente muçulmana que não acredita no Alcorão

como a palavra eterna de Deus. Mas eu estava brincando. Não sou Mutazalite. Eles foram extintos há mil anos.

Ela acenou com a cabeça. Caminhamos mais um pouco.– Como se sentiu na aula? – indagou.– O que deveria sentir? A verdade é a verdade. É melhor conhecê-la

do que ignorá-la.– Tem razão – ela disse, observando-me, – mas isso não quer dizer que

você não possa sentir algo, certo? – a pergunta foi feita com delicadeza. Havia ali certa doçura.

– Honestamente? Fez com que me sentisse livre.Ela concordou. Andamos em silêncio.– Importa-se se eu fizer uma pergunta pessoal? – indaguei afinal.– Depende.– De?– Do que você quer saber.– Você realmente tinha de estudar ontem à noite ou apenas disse

aquilo por dizer?Rachel riu, os lábios se abriram revelando seus pequeninos dentes

quadrados. Ela era realmente linda.– Tenho prova de química orgânica amanhã, já disse. Por isso estou

indo para a biblioteca. – Então, parou e colocou sua mão sobre meu braço. – Mas prometo que irei ao próximo jogo... ok?

Meu coração encheu-se subitamente de alegria.

1 Salman Rushdie, ensaísta e autor britânico de origem indiana que, após escrever Versos satâni-

cos, obra que condenava o Islã por perseguição contra várias religiões cristãs e hindus, foi condenado

à fatwa de execução pelo Aiatolá Khomeini, líder do Irã. (N.T.)

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– Ok – respondi tossindo.Quando estávamos subindo os degraus da biblioteca, senti necessi-

dade de contar a ela sobre o que havia me acontecido na noite anterior.– Posso fazer outra pergunta pessoal?– Manda.– Você acredita em Deus?Por um momento, Rachel pareceu espantada. Então, deu de ombros.– Não. Pelo menos não nessa coisa de cara lá de cima.– Desde quando?– Desde sempre, eu acho. Minha mãe era ateia, portanto acho que

nunca levei isso a sério. Quer dizer, meu pai nos fazia ir ao templo de vez em quando, Rosh Hashaná e coisas do tipo, e, mesmo assim, mamãe pas-sava todo o caminho da ida e da volta reclamando.

– Então você não sabe o que é perder a fé.– Não exatamente.Concordei com a cabeça.– É libertador. Tão libertador. O evento mais libertador que já me

aconteceu... Você me perguntou como me senti na aula? Ouvir Edelstein falar sobre o Alcorão como um simples livro, um livro como qualquer outro, deu vontade de sair para comemorar.

– Parece divertido – ela disse, sorrindo. – Se você esperar até amanhã, podemos celebrar juntos...

– Parece uma boa ideia.Rachel demorou-se no degrau de cima apenas o tempo suficiente

para que o pensamento me ocorresse. E, quando isso aconteceu, não hesi-tei. Inclinei-me e encostei meus lábios aos dela.

Sua boca pressionada à minha. Senti sua mão em minha nuca, a ponta de sua língua encostando suavemente na minha.

De repente, afastou-se. Virou-se e subiu as escadas. Em seguida, parou na porta e lançou-me um rápido olhar.

– Deseje-me sorte na prova – pediu.– Boa sorte – falei.Quando ela entrou, fiquei pensando, atordoado, quase incapaz de

acreditar em minha sorte.

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Naquela noite, depois de um dia inteiro de aulas e um fim de tarde de pingue-pongue no Grêmio, sentei-me em minha cama e tentei estudar, mas só conseguia pensar em Rachel... O telefone tocou. Era minha mãe.

– Ela se foi, behta. – Fiquei calado. Sabia, obviamente, de quem ela falava. Há um mês tínhamos ido a Kansas City para visitar Mina, não apenas a melhor amiga da vida inteira de minha mãe, mas talvez a pessoa de maior influência em minha existência, em uma cama de hos-pital. O câncer a corroía por dentro. – Você me ouviu, Hayat? – mamãe perguntou.

– Foi melhor assim, não é, mamãe? Quer dizer, ao menos ela não sente mais dores.

– Mas ela se foi, Hayat – lamentou. – Ela se foi...Escutei seu choro em silêncio. Então, consolei-a. Ela não me pergun-

tou naquela noite como eu me sentia em relação à morte de Mina, o que foi bom. Eu provavelmente não teria sido sincero. Nem mesmo a confis-são que fiz a Mina naquele que se tornaria seu leito de morte, nem mesmo aquilo foi capaz de aliviar a culpa que eu carregava desde os doze anos. Se eu relutava em demonstrar minha aflição à minha mãe, era porque meu luto não era só por Mina, mas também por mim mesmo.

Agora que ela partiu, como vou poder consertar o mal que fiz?

Na noite seguinte, Rachel e eu nos sentamos lado a lado no balcão de uma pizzaria, nosso jantar antes do cinema. Não lhe disse nada a res-peito de Mina, porém, não sei como, ela percebeu que havia algo errado. Perguntou-me se eu estava bem. Disse-lhe que sim. Ela insistiu.

– Tem certeza, Hayat? – Olhava-me com um carinho imensurável. – Pensei que quisesse comemorar – comentou com um sorriso.

– Bem... depois que nos vimos ontem, recebi más notícias.– O que foi?– Minha tia faleceu. Era como... uma segunda mãe para mim.– Oh, Deus. Sinto muito.Subitamente, minha garganta queimava. Estava prestes a chorar.– Desculpe – disse, desviando o olhar.

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Sentindo sua mão sobre meu braço, escutei sua voz:– Não precisamos falar disso...Fitei-a novamente, concordando.

* * *

O filme era uma comédia. Consegui me distrair. Quase no fim, Rachel aconchegou-se a meu lado e ficamos de mãos dadas por algum tempo. Depois da sessão, ela me convidou para entrar em seu quarto, onde acen-deu velas e tocou no violão uma canção que ela mesma havia escrito. Era algo nostálgico e melancólico sobre um amor perdido. Três dias antes, não poderia imaginar que teria tanta sorte. No entanto, não conseguia afastar os pensamentos de Mina.

Quando Rachel terminou a música, disse-lhe que era maravilhosa.Mas ela sabia que minha cabeça estava em outro lugar.– Ainda está pensando em sua tia, não está?– É assim tão óbvio?Ela suspirou e sorriu.– Tudo bem – disse, colocando o violão de lado. – Minha avó também

era muito importante para mim. Foi difícil quando a perdi.– Mas o problema não é simplesmente ela ter morrido... É que eu tive

algo a ver com isso. – Não percebi que dizia aquilo em voz alta até quase terminar a frase.

Rachel olhou-me, confusa, testa franzida.– O que aconteceu? – indagou.– Você não me conhece direito... Quer dizer, é claro que não me

conhece. É que... Acho que você não sabe a maneira como fui criado.– Não estou entendendo, Hayat.– Você é judia, certo?– Sim? E daí?– Pode ser que você não goste mais de mim se eu lhe contar o que

aconteceu... – Ela se moveu, endireitou as costas. Desviou o olhar. Você mal a conhece, pensei. O que está tentando provar? – Acho melhor eu ir – disse.

Ela não respondeu.

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Eu não me mexi. A verdade é que não queria ir embora. Queria ficar. Queria contar tudo a ela.

Ficamos sentados ali, em silêncio, por um longo tempo e, então, Rachel segurou minha mão.

– Conte-me – pediu.

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LIVRO UMPara íso Perdido

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Mina

Muito antes de conhecer Mina, já sabia de sua história.Mamãe contou-me muitas vezes: como sua linda e talentosa melhor

amiga, quase genial, segundo minha mãe, se frustrara tanto, tendo seu crescimento contido pela família mesquinha e sua sólida força de vontade ignorada por uma cultura em que não havia espaço para a mulher. Sempre ouvi falar das aulas que Mina nem precisou cursar e daquelas em que era a melhor aluna, muitas vezes para desgosto de seus pais, mais preocupados com um possível casamento do que com suas notas. Soube de quantos homens a amaram e de quando, aos doze anos, ela também se apaixonou, causando a fúria de seu pai, que lhe quebrou o nariz com um soco ao encontrar um bilhete do namorado colado no livro de Matemática. Escutei histórias sobre seus ataques de nervos, seus problemas para comer e, claro, sobre os poemas que sua mãe queimou na lareira da sala certa noite enquanto discutia sobre permitir ou não que Mina entrasse na faculdade para se tornar escritora.

Talvez por ter ouvido falar tanto sobre uma mulher que não conhecia pessoalmente, Mina Ali e seus talentos e dificuldades eram como o cons-tante cheiro de curry em nossa casa: uma presença permanente à qual eu pouco me atentava.

Então, em uma tarde de verão, quando eu tinha oito anos, vi um retrato dela. Enquanto mamãe desdobrava a mais recente carta enviada do Paquistão, uma fotografia colorida do tamanho da palma da mão caiu.

– Essa é sua tia Mina, kurban – disse mamãe quando me abaixei para pegá-la. – Veja como ela é linda.

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Linda mesmo.A foto mostrava uma mulher estonteante sentada em uma cadeira de

vime, tendo como fundo folhas verdes e flores laranja. A maior parte de seus cabelos perfeitamente negros estava coberta por um lenço cor-de--rosa, emoldurando um rosto absolutamente marcante: bochechas bem desenhadas, levemente destacadas pelo suave blush, olhos ovais e um nariz pequeno e empinado sobre lábios grossos. Seus traços tinham uma harmonia perfeita, que traziam uma sensação de proteção, de doçura, mas não era só isso. Havia uma intensidade em seu olhar que insinuava certo conforto maternal ou, pelo menos, o tornava complicado: eram olhos negros e brilhantes, como se tivessem sido afiados por um bom tempo pela lâmina de uma dor interna desconhecida. Embora estivesse sorrindo, seus lábios pareciam ocultar a alegria e, assim como os olhos, sugeriam algo de misterioso e evasivo, algo que desejávamos saber.

Mamãe colocou a foto em nossa geladeira, usando o mesmo ímã em forma de arco-íris que afixava o cardápio do almoço da escola (consultado por mamãe todas as noites para ver se seria servida carne de porco no dia seguinte, e, nesse caso, eu deveria levar comida de casa, e o qual eu lia todas as manhãs esperando ver entre as opções o meu prato preferido, lasanha à bolonhesa). Durante dois anos, portanto, dificilmente se passava um dia sem que eu olhasse, ao menos de relance, para a foto de Mina. Muitas vezes, ao terminar meu copo de leite de manhã, ou quando comia queijo depois de chegar do colégio, eu me demorava observando sua imagem da mesma forma que fazia no lago em Worth Park nas tardes de verão: concentrando--me o máximo possível para conseguir ver o que estava no fundo.

Era um retrato importante, como viria a saber da própria Mina anos mais tarde, com uma história igualmente notável. Seus pais, acreditando que a beleza da filha pudesse atrair um casamento lucrativo, contrataram um profissional para fotografá-la, e a imagem em questão foi parar, por intermédio de um casamenteiro, nas mãos de Hamed Suhail, filho único de uma abastada família de Karachi.

Hamed apaixonou-se por Mina no momento em que a viu.Os Suhail visitaram a casa dos Ali cerca de uma semana depois e, ao

final da reunião, os pais selaram um acordo sobre o noivado dos filhos.

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Mamãe sempre contou que Mina não detestava Hamed, e que poderia até ser feliz a seu lado. Não fosse por Irshad, a mãe de seu marido.

Depois do casamento, Mina mudou-se para Karachi, ao sul, para morar com os pais de Hamed, e os problemas entre nora e sogra começa-ram já na primeira noite de Mina naquela casa. Irshad entrou no quarto da nora segurando um colar de pedras grandes cor-de-romã, uma relíquia de família, Irshad explicou, passada de mãe para filha havia cinco gerações. Como não tinha filhas, a senhora sempre imaginara um dia entregar a única joia da família à esposa de seu filho.

– Experimente – apressou-a Irshad, calorosamente.Mina colocou-o. Quando as duas olharam para o espelho, a jovem

não pôde deixar de notar que o brilho nos olhos de Irshad diminuíra. Percebeu que a sogra a invejava.

– A senhora não deveria, Ammi1 – disse Mina, tirando as pedras do pescoço.

– Não deveria o quê?– Não sei... É lindo... Quer dizer, a senhora tem certeza de que quer

entregá-lo a mim?– Não estou lhe dando nada ainda – respondeu Irshad abruptamente.

– Só queria ver como ficava em você.Magoada com a súbita mudança de humor de Irshad, Mina devolveu

as pedras à sogra, que as tomou e, sem dizer mais nada, saiu do quarto.Começou assim a hostilidade de Irshad. Primeiro, vieram os comentá-

rios pejorativos feitos aos cochichos ou fortuitamente: sobre quão teimosa era a “nova garota”; sobre seus modos à mesa que pareciam os de uma criada; ou sobre como, nos termos de Irshad, Mina parecia um “rato”. Em seguida, vieram as mudanças na rotina da casa feitas apenas para tornar a vida de Mina mais difícil: empregados eram enviados para limpar seu quarto quando ainda dormia; seus pratos preferidos foram retirados do cardápio; constantes críticas maldosas, embora agora feitas em alto e bom som. Mina tentou de tudo para acalmar e apaziguar a relação das duas, o que só aumentou as suspeitas da sogra. Com as atitudes de submissão da

1 Ammi significa mãe, no idioma urdu. (N.T.)

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moça, Irshad percebeu suas intenções e as interpretou como evidências de sua natureza sagaz. Depois, iniciou boatos sobre os “olhos inquietos” e as “mãos leves” de sua nora. Aconselhou o filho a mantê-la longe de outros homens e sugeriu aos empregados que trancafiassem tudo o que fosse de valor. (Nem Hamed nem o pai, ambos com medo de Irshad, tentaram intervir no conflito.) Então, quando cansou do abuso verbal, a mãe de Hamed recorreu ao físico.

Passou a bater em Mina por deixar roupas sujas espalhadas pelo quarto ou falar em momento inoportuno na frente de convidados. Uma vez, sentindo-se insultada por um comentário de Mina sobre o jantar não estar tão apimentado como de costume, Irshad agarrou-a pelos cabelos e arrastou-a da mesa até o saguão.

Depois de quatorze meses vivendo nesse pesadelo, Mina engravidou. Para fugir das agressões e levar sua gravidez até o fim em paz, a pobre jovem decidiu retornar para a casa dos pais, ao norte, na região de Punjab. Sem a companhia do marido, que se recusou a compartilhar com ela o medo do sofrimento causado pela ira de Irshad, deu à luz um menino três semanas antes do previsto. Quando descansava no leito do hospital, exausta após o parto que durara o dia todo, um homem vestindo um sobretudo preto apareceu à porta logo após sua mãe sair para buscar uma xícara de chá. Ele entrou e perguntou se ela era Amina Suhail, anteriormente Ali.

– Sou eu – Mina respondeu.O homem se aproximou carregando um envelope.– Seu marido acaba de pedir o divórcio. Aqui estão os papéis para ofi-

cializar a situação. Ele escreveu de próprio punho, a senhora reconhecerá a letra, que deseja se divorciar, divorciar-se imediatamente, divorciar-se da senhora. Como bem sabe, Sra. Suhail, digo, Srta. Ali, é como manda a lei. – Depositou delicadamente o envelope sobre a barriga da moça. – A senhora acaba de conceber o filho do Sr. Hamed Suhail. O nome Imran foi escolhido para a criança. O menino ficará com a senhora até completar sete anos e, a partir de então, o Sr. Hamed Suhail terá direito total e irres-trito à custódia do filho.

O advogado recuou um passo, mas ainda não havia terminado. Mina observava-o atônita.

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– Tudo que lhe disse está de acordo com a lei, no dia 15 de junho de 1976, no Paquistão. A senhora tem direito de apelar pela custódia, mas aconselho-a a entender, Sra. Suhail, digo Srta. Ali, que qualquer esforço será inútil e fará somente com que sua família gaste os recursos de que não dispõe.

Com isso, virou-se e saiu.Mina chorou por dias, noites, semanas. Porém, mesmo arrasada pela

brutalidade de Hamed, e aterrorizada pela ameaça de ter seu filho arran-cado, ao fitar os olhos do pequenino, murmurou com carinho o nome que seu agora ex-marido havia escolhido sem seu consentimento: chamou-o de Imran.

Era 1981 quando ouvi pela primeira vez que mamãe desejava trazer Mina para os Estados Unidos. Eu tinha dez anos. Os reféns iranianos aca-bavam de retornar a seu país e bandeiras americanas brilhavam no notici-ário noturno. Em uma tarde de sábado, na hora do chá, meus pais estavam sentados frente a frente na mesa da cozinha, sorvendo suas xícaras em silêncio. Eu estava na outra extremidade, de costas para o copo de leite que mamãe acabara de me servir. Observava meia dúzia de moscas para-das na janela avistando o quintal.

– Sabe, kurban, sua tia Mina deve vir passar uns dias conosco – mamãe disse finalmente. – Kurban?

Virei em sua direção.– Quando? – perguntei.– Quanto mais cedo, melhor. A família dela a enlouquece. E ela precisa

tirar aquele menino do país... ou o pai tomará a criança. A verdade é que os dois precisam fugir.

Mamãe fez uma pausa e lançou um olhar para papai. Ele batia os dedos na mesa, lendo uma revista de pesca, alheio a tudo.

Olhei novamente para as moscas, que zuniam ameaçadoras tentando passar pelo vidro.

– Essas moscas! De onde vêm? – mamãe gritou de repente. – E há tantas no sótão! Só Deus sabe como estão lá em cima!

Papai interrompeu a leitura da revista, irritado.

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– Você fala como se nunca tivéssemos escutado nada disso, como se fosse a primeira vez. Estou tentando aceitar isso tudo.

– Não estava falando com você, Naveed.– Então, estava falando com quem? – perguntou papai, ríspido. – Porque

só estamos o garoto e eu, e não consigo ver o que ele tenha a ver com isso.Mamãe encarou-o, pálida. Os olhos mel-esverdeados de papai retri-

buíram com frieza. Então, afundou-se novamente na revista de pesca.Mamãe levantou-se da mesa e foi até a geladeira.– Não será fácil, kurban. Mesmo se conseguirmos organizar tudo,

não sabemos se os pais permitirão que ela venha. Às vezes acho que eles desejam tê-la por perto somente para haver alguém para torturar. Sabe o que o pai dela fez? Vendeu seus livros! Você pode imaginar? Mina sem seus livros!

Mamãe olhou novamente para papai e, em seguida, para mim, pare-cendo esperançosa. Tenho certeza de que ela queria que eu falasse alguma coisa, mas eu não sabia o que dizer.

– Por que ele vendeu seus livros? – indaguei finalmente.– Porque ele pensa que livros causam divórcio. Ele acha que os livros

estimularam o jeito dela de ter resposta para tudo... é o que ele dizia sobre sua inteligência. “Isso só serve para que ela tenha resposta para tudo...” – Mamãe deu outra olhada para papai. Ele só se mexeu e virou a página da revista. Mamãe resmungou, tirando um jarro de água da geladeira. – Hayat, a inteligência de Mina tem sido a maldição de sua vida. Quando uma muçulmana se mostra muito esperta, tem de pagar por isso. E não se trata de dinheiro, behta, ela é agredida. – Mamãe parou esperando que papai reagisse. Ele não disse nada. – Sabe o que Freud dizia, behta? Aquele homem brilhante?

Não conhecia muito a respeito de Freud além de algumas de suas ideias que mamãe gostava de me contar de tempos em tempos.

– Dizia que o silêncio mata. Se não pudermos falar sobre as coisas... apodrecemos por dentro. – E mais uma vez olhou para papai.

Dessa vez, ele levantou o olhar, mas não pelo que ela dizia. Jogando a cabeça para trás, bebeu o resto de chá. Mamãe bateu a porta do refrigera-dor atrás dele. Ele se limitou a baixar a xícara e virar outra página.

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