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Luciara Silveira de Aragão e Frota Yvone Dias Avelino Edgar da Silva Gomes Carlos Danilo Oliveira Lopes (Organizadores) No Laboratório das Palavras: História da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Coletânea de Documentos (1979-1985) Fortaleza Editora - SOCER 2015

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    Luciara Silveira de Arago e Frota

    Yvone Dias Avelino

    Edgar da Silva Gomes

    Carlos Danilo Oliveira Lopes

    (Organizadores)

    No Laboratrio das Palavras: Histria da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo

    Coletnea de Documentos (1979-1985)

    Fortaleza

    Editora - SOCER

    2015

  • 2

    SOCER Editora

    Coordenao Geral: Luciara Silveira de Arago e Frota

    Rua Gilberto Studart, 930 / Coco

    CEP.: 60190-750 / Fortaleza - CE

    Conselho Editorial

    Profa. Dra. Luciara Silveira de Arago e Frota

    Prof. Dr. David Gueiros Vieira

    Prof. Dr. Corcino Medeiros dos Santos

    Profa. Dra. Yvone Dias Avelino

    Prof. Dr. Edgar da Silva Gomes

    Profa. Dra. Andrea Borelli

    Prof. Dr. Ney de Souza

    Prof. Dr. Nataniel Dal Moro

    Profa. Dra. Marcia Barros Valdivia

    Profa. Dra. Claudia dos Reis Cunha

    Prof. Dr. Marcelo Flrio

    Prof. Dr. Alex Moreira Carvalho

    Profa. Dra. Vilma Maria Barreto Paiva

    Prof. Dr. Ettore Quaranta

    Copyright: Luciara Silveira de Arago e Frota, Yvone Dias Avelino, Edgar da Silva Gomes,

    Carlos Danilo Oliveira Lopes

    Digitador: Francisco Celismar Ferreira de Andrade

    Revisor / Seleo de Textos: Eugenia Dsire Silveira de Arago e Frota

    Arte & Capa: Edgar da Silva Gomes, Carlos Danilo Oliveira Lopes

    Imagem: Convento Carmelita - Rua Monte Alegre, dcada de 1920

    Fonte: Museu de Rua. PUC Projeto e Processo, 1979.

    Impresso: Grfica Kazigu

    Todos os direitos dessa edio so reservados a SOCER. proibida a duplicao, reproduo

    ou comercializao desse volume, sob quaisquer meios, sem autorizao expressa da SOCER.

    No Laboratrio das Palavras: Histria da Pontifcia Universidade

    Catlica de So Paulo: coletnea de documentos (1979-1985)/ FROTA,

    Luciara Silveira de Arago e; AVELINO, Yvone Dias; GOMES, Edgar

    da Silva; LOPES, Carlos Danilo Oliveira. (Orgs.). Fortaleza: SOCER,

    2015, 1 CD-ROM, 586 p.

    ISBN 978-85-68767-00-9 - E-BOOK

    Memria; Universidade; Documentao Oral; PUC-SP

  • 3

    in memoriam

    Prof. Dr. Joel Martins

    Carlos Danilo Oliveira Lopes

  • 4

  • 5

    A Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP completa 70

    anos em 22 de Agosto de 2016. Os significados e o valor deste momento mpar

    sobre to importante Universidade levaram a comunidade puquiana a iniciar em

    22 de Agosto de 2015 os eventos acerca deste marco.

    Assim sendo, como integrantes do Ncleo de Estudos de Histria Social

    da Cidade NEHSC PUC-SP, queremos com esta obra homenagear tambm

    esta insigne Instituio de Ensino Superior, onde as ideias sempre foram plurais,

    em um palco de culturas, saberes e lutas. Trata-se esta publicao de um

    mosaico de histrias de vidas, cujos personagens vivenciaram em pocas

    distintas a histria desta Universidade, desde sua criao at os dias atuais.

    Agradecemos aos agentes que, de alguma forma, nos ajudaram a construir

    este livro, assim como aos que ainda fazem desta universidade um espao de

    discusses, debates, contribuies acadmicas e sociais, como professores,

    alunos e funcionrios, produzindo e divulgando conhecimentos para as prximas

    geraes. Que estes 70 anos nicos e de vanguardas se desdobrem por muitos

    outros, junto ao caminhar da nova juventude intelectual que, como a de ontem,

    continua mantendo dinmico este reconhecido espao democrtico.

    Os Organizadores

    Outubro/2015

  • 6

  • 7

    Sumrio

    CONTANDO HISTRIAS: Abrindo o Laboratrio

    Introduo 22

    I A Histria Vivida e Contada: Confidncias na Antessala do Estdio 36

    - D. Paulo Evaristo Arns 37

    - Andr Franco Montoro 42

    - Joel Martins 50

    - Geraldo Ataliba Nogueira 95

    - Jos Carlos de Ataliba Nogueira 123

    - Oswaldo Aranha Bandeira de Melo 128

    - Padre Enzo Campos Guzzo 138

    II A Histria Vivida e Contada: Ao P do Ouvido 163

    - Joaquim Alfredo da Fonseca 164

    - Geraldo Pinheiro Machado 181

    - Aniela Meyer Ginsberg 202

    - Milton de Miranda 207

    - Luis Kubinsky 230

    III Histria & Histrias: Relembrando no Estdio 250

    - Ary Silvrio 251

    - Antnio Penteado de Azevedo 258

    - Jos Massafumi Nagamine 265

    - Ramon Martinez Alcaraz 282

    - Osvaldo Leite de Moraes 302

    IV Histria & Histrias: No Estdio Gravando 317

    - Jos J. Queiroz 318

    - Elza Ferreira Lobo 325

  • 8

    - Carmen Sylvia Junqueira 340

    - Clia Sodr Dria (Madre Cristina Maria) 351

    - Demerval Saviani 356

    -Lus Eduardo Wanderley 368

    V No Estdio Gravando: Mais Histrias 384

    - Nadir Gouveia Kfouri 385

    - Casemiro dos Reis Filho 391

    - Ednio dos Reis Valle 413

    - Antnio Joaquim Severino 424

    - Clia Coelho Pereira Leite (Madre Olvia) 448

    - Jos Feliciano da Rosa Aquino 456

    ANEXOS

    Anexo 1 467

    Palestras Sobre Documentao Oral

    Contribuio do Curso de Direito sob a Coordenao de Michel Temer

    - Eduardo Muylaert Antunes

    - Renan Lotufo

    - Manoel Alceu Affonso Ferreira

    Anexo 2 534

    Proposta de Criao de Laboratrios

    Anexo 3 552

    Museu de Rua

  • 9

    Prefcio

    Prof. Dr. Roberto Coelho Barreiro Filho1

    Para um historiador, toda manifestao importante; todo mito, todo rito, crena(s),

    uma grande pessoa; isso tudo reflete a experincia e por conseguinte implica as noes de ser,

    de significao e de verdade.

    O que se ver nas pginas que me sucedem so memrias, momentos de uma

    instituio que marcou a histria da Igreja, no Brasil, e a histria de uma Universidade na

    histria da nao. Quem no viveu aqueles momentos de uma resistncia acadmica ao

    controle ditatorial poder ver, nos relatos, um pouco da trajetria da busca por democracia

    que vivemos naqueles dias.

    Quem, como eu, que no viu as irmzinhas de ps descalos andando pelo pateo da

    cruz, no pode saber o que foi isso naqueles dias. Quem, como eu, no viu a transio dos

    Bispos Auxiliares Reitores para os leigos s ter como lembrana os dias atuais. Quem, como

    eu, que viu o incndio do TUCA ou a invaso dos policiais na dcada de setenta, no sabe o

    que foi aquilo.

    Assim como a cidade de So Paulo nasce da ideia de uma escola, nos tempos

    trentinos, a PUC-SP nasce da juno de ideais jesutas, beneditinos, agostinianos, que se

    prontificaram a fazer uma Universidade plural. Sua caminhada mostrou um cenrio de

    possibilidades acadmicas que, com o Curso Bsico (um experimento acadmico para alunos

    iniciantes), o Ps-Graduao (para os concluintes) e a Extenso, entrelaados aos cursos de

    graduao, formava no apenas alunos e sim cidados crticos sociais.

    Alguns desses construtores esto nas entrevistas que aqui se presentificam diante

    da complexida de do fazer acadmico da instituio. Poucos trabalhos se

    1 Professor Pesquisador do CELACC ECA USP, professor de ps-graduao do SENAC-SP.

  • 10

    debruaram sobre a histria aqui contada. So meia dzia de pesquisas que, elaboradas,

    viraram ou Teses ou livros para o registro futuro.

    Embora por vrias vezes, via Ncleo de Estudos do Ps-Graduao em Histria

    (antigo grupo Cordis, hoje Ncleo de Estudos de Histria Social da Cidade - NEHSC), se

    tentou elaborar um livro com todos os relatos aqui encontrados, mesmo que por vias da

    editora da PUC-SP ou por algum outro meio, sempre a Universidade se fez ausente de ser

    parceira no resguardo histrico de sua prpria histria. A importncia do que aqui se vai

    encontrar o resgate de uma trajetria de vida de seus participantes. Uma iniciativa de

    pesquisadores e coordenadores de reas de pesquisa que, durante todos estes anos, fizeram

    crescer e ampliar a memria da universidade para o futuro dela prpria.

    A PUC-SP parece, em alguns momentos, querer esquecer o que foi e, assim, se

    transformar no que nunca quis ser. Quem no conhece sua histria est marcado pelo destino

    a repetir seus erros novamente. Se olharmos para o passado, poderemos facilmente ver a

    grandeza da PUC-SP no cenrio nacional e internacional. Foi, em seu momento mais

    expressivo, a quinta maior Universidade do pas. Relacionando seus saberes com toda

    Amrica Latina, entre outros pases, atendeu prontamente aos ecos vindos de Medeln e

    Puebla, incorporando as ideias da igreja ao seu dia-a-dia. Abrigou tantos nomes acadmicos

    em seus muros, abrigou a SBPC, proibida pela ditadura, resistiu bravamente pela democracia.

    Como veremos neste documento ora pblico, a formao das lideranas catlicas

    polticas que assumiram os quadros da sociedade civil poca, so resultado deste projeto das

    dcadas de 60, 70 e 80 na PUC-SP. O perfil filosfico-educacional implantado marca da

    imagem, at hoje verificada, quando se fala da Catlica de So Paulo.

    Fiz parte desse processo, sou criatura desse projeto. Fiz minha personalidade moldada

    pelas mo do Pe. Ednio Reis Valle, do Prof. Dr. Jorge Claudio Noel Ribeiro Junior, da

    orientao primorosa da Profa. Dra. Yvone Dias Avelino e da Ir.

    Valdete Contin e Ir. Leda Maria Pereira Rodrigues, de quem trago

  • 11

    minhas saudades amigas. J no estou mais por estas praias, embora nunca a tenha deixado

    por completo. A PUC-SP no sai de nossas vidas, afinal, ela nos forma!

    A PUC-SP maior que ela prpria. Ela no s paredes ou administrao financeira.

    Ela histria, projeto e processo em construo, vida acadmica que transpira em cada sala

    de aula, em cada corredor, nas conversas, no ar que circula nesta ilha democrtica da

    academia puquiana. No pode ser esquecida, no pode ser ignorada. Deve ser, sempre,

    lembrada.

  • 12

    Apresentao

    Profa. Dra. Yvone Dias Avelino2

    A presente publicao, ao ser organizada, nos levou a pensar muitos momentos

    vividos, lembranas e reminiscncias de um mundo acadmico vivenciado com toda a

    plenitude de um ideal. Ecos de um passado que nos chega como se estivssemos

    contemplando o que foi e no aconteceu, o que aconteceu e que no foi. Ideais e sonhos que

    no se realizaram, lutas e embates que nos desgastaram, mas no nos tiraram o nimo para

    novas empreitadas, que nos impulsionaram a continuar e perquirir novos caminhos, com

    foras revitalizadoras e propostas ainda mais originais. uma vida de esperanas, de

    empreendimentos, realizaes, frustraes, rudos polifnicos de uma longa e rdua

    caminhada.

    Apresentamos nestas pginas os resultados de uma investigao sobre o nascedouro e

    o desenvolvimento da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP), atravs do

    uso da tcnica da Documentao Oral, tcnica complementar de pesquisa ligada elaborao

    de documentao contempornea. Foi usada em nosso trabalho com as mesmas preocupaes

    que norteiam o historiador com relao ao documento histrico e concepo prpria da

    Histria. Por meio de entrevistas com agentes que gestaram e vivenciaram esta Universidade,

    cenrio onde se desenrolaram as tramas polticas, sociais e religiosas de to importante e

    significativa Instituio, trazemos luz tais testemunhos. Ao alargarmos o nosso olhar, mais

    nos parece que o horizonte factual fica indefinido, pois tudo o que compe a

    vida cotidiana se constitui de direito, no dizer de Paul Veyne3, caa para o

    historiador, pois na vida cotidiana que se pode refletir a historicidade,

    embora a Histria no se transforme na Histria da vida cotidiana. Um

    2 Professora Titular do Departamento de Histria da PUC-SP, Editora da revista Cordis e coordenadora do

    NEHSC da PUC-SP 3 VEYNE, Paul. Como se Escreve a Histria, In: Foucault Revoluciona a Histria. Braslia: Universidade de

    Braslia, 1982.

  • 13

    acontecimento s tem sentido dentro de uma srie, e o nmero de sries indefinido. Elas no

    se ordenam hierarquicamente, e no convergem para formar um bloco igualitrio de

    perspectivas.

    Nos Anos 80, quando coordenvamos na Ps Graduao da PUC-SP o Curso de

    Histria, nos chegou s mos uma proposta instigadora, a de acrescentar ao currculo do nosso

    Mestrado um curso de Documentao Oral, que passou ento a ser ministrado pela Professora

    Doutora Luciara Silveira de Arago e Frota, oriunda da Universidade Federal do Cear. Eram

    poucos docentes que aceitavam Documentao Oral como uma fonte para as pesquisas

    histricas contemporneas. A grande maioria era refratria, mas mesmo assim, a PUC-SP,

    depois do CPDOC, foi a pioneira na objetivao do assunto na academia brasileira com esse

    curso de Documentao Oral, e com a disseminao de pesquisadores aptos ao emprego da

    tcnica. A prpria USP s a aceitou atravs do CERU (Centro de Estudos Rurais e Urbanos) e

    dos esforos do Professor Doutor Jos Carlos Sebe Bom Meihy, do Departamento de Histria,

    nos Anos 90, com a proposta de criao da Associao Brasileira de Histria Oral4.

    Com a criao do referido curso, este projeto ora apresentado surgiu quando o ento

    Vice-Reitor Acadmico da PUC-SP, o Professor Doutor Joo Ednio dos Reis Valle, solicitou

    ao Departamento de Histria que fosse escrita a Histria desta Universidade. Somente dois

    professores do Departamento interessaram-se pelo tema, os Professores Doutores Yvone Dias

    Avelino e Euclides Marchi, que trabalharam concomitantemente na organizao do "Museu

    de Rua". Este Museu, ideia original do Professor Doutor Jorge Cludio Ribeiro, foi exposto

    em um evento festivo, por ocasio do aniversrio da Universidade. Mais tarde, teve

    4 Ns particularmente utilizamos o termo Documentao Oral, visto que o oral apenas documento criado com o

    depoimento, instrumento que muito auxilia nas pesquisas contemporneas.

  • 14

    seus painis distribudos sem sequencia em vrios espaos da Instituio, e foram totalmente

    danificados e violentados nos corredores do subsolo.5

    O curso de Documentao Oral alocado no Programa de Estudos Ps Graduados em

    Histria recebeu um grande incentivo do Coordenador Geral do Setor de Estudos Ps-

    Graduados poca, Professor Doutor Joel Martins. Formou-se ento um grupo especial de

    pesquisa, incluindo alunos e professores, estabelecendo-se um plano de trabalho que remetia

    ao ano de 1945, organizando o levantamento de fontes nos arquivos da prpria instituio e

    entrevistas dirigidas com alguns dos agentes que fizeram a Histria da Universidade.

    Teoricamente, os historiadores reconheciam a utilidade da tcnica, mas o seu uso

    prtico era pouco, apenas restrito a alguns eruditos da rea. A Documentao Oral parte da

    descoberta do passado, e de fontes que se busca localizar, apreendendo, compreendendo,

    estabelecendo um sentido do que foi, do que aconteceu. Esta linha de preocupaes nos

    conduziu confeco de documentos no s fidedignos quanto procedncia, mas ricos de

    contedos6. Assim, fizemos muitas leituras sobre Universidade e dos trabalhos daqueles que

    foram entrevistados, submetendo-os a um processo de anlise. Familiarizados com os seus

    pensamentos, ficou mais fcil a confeco dos documentos orais.

    Dentro da prpria Histria, preciso admitir que no h com o tipo de

    coleta de material oral, uma Histria que se possa chamar de totalmente

    espontnea. Tais quais outros tipos de fontes para o historiador, o resultado da

    entrevista, ou seja, o texto transcrito, deve ser submetido ao mesmo trabalho crtico de

    outros documentos e s mesmas leituras mltiplas e acuradas. A atrao de

    5 Participaram tambm do projeto deste Museu a professora Doutora Luciara Silveira de Arago e Frota; os

    Professores Doutores Jorge Cludio Ribeiro e Roberto Coelho Barreiro Filho, ambos do Jornal Porandubas; a

    Professora Mestra Selma Siqueira Carvalho, do Departamento de Antropologia; o Professor Doutor Adilson Jos

    Gonalves; e ainda contou com a colaborao do Engenheiro Jlio Abe Wakahara, ligado documentao

    fotogrfica da Prefeitura de So Paulo. 6 Cf. Frota, Luciara Silveira de Arago e. Documentao Oral e a Temtica da Seca (Estudos). Braslia: Centro

    Grfico/Senado Federal, 1985.

  • 15

    tornar possvel a apreenso da Histria em processo de fazer-se , portanto, um risco a ser

    minimizado. Os caminhos ampliam-se e distanciam-se s do fazer falar a documentao,

    agora trata-se, de tornar-se responsvel tambm por elabor-la, preservando-a para o futuro.

    Muitas dificuldades fizeram com que esta ideia inicial sofresse alteraes. Dentre elas,

    podemos mencionar o pssimo estado da documentao sobre o assunto, que empoeirada e

    desorganizadamente repousava, no em "bero esplndido", mas no rs do cho de uma sala

    do "Prdio Velho" na PUC-SP. Esta documentao era imprescindvel ao estudo dos

    primeiros tempos da Universidade e no dispnhamos, na ocasio, de condies e tempo para

    catalog-la. Uma das razes foi o grupo ter sido reduzido, em virtude dos alunos participantes

    terem prazo para a entrega de suas Dissertaes de Mestrado e iam embora aps um perodo,

    gerando uma rotatividade de integrantes no projeto, que sempre se reiniciava e, ao mesmo

    tempo, avanava. Na prtica, continuaram atuando apenas dois professores do Programa de

    Estudos Ps Graduados em Histria, responsveis pelo tema7. Assim, a falta de pessoal exigiu

    uma reestruturao do plano inicial de pesquisa. De comum acordo, optamos por inverter a

    abordagem prevista, ou seja, partimos da realidade do "aqui e o agora", levando em

    considerao os personagens que pensavam e faziam a PUC-SP naquele momento

    histrico. Isto tudo, naturalmente, dentro de uma compreenso da complexidade do

    conceito de Universidade, do que era a Universidade brasileira e especificamente

    desta Universidade "democrata e pluralista".8 Esta terminologia era voz corrente entre

    os depoimentos extrados atravs das entrevistas coletadas entre os que detinham

    cargos de direo acadmica e/ou administrativos na PUC-SP. Optamos pela

    7 O trabalho passou efetivamente a ser realizado pelas professoras Doutoras Yvone Dias Avelino e Luciara

    Silveira de Arago e Frota. 8 A Universidade brasileira havia se democratizado e era assunto de mesas redondas, palestras e comunicaes

    em simpsios nacionais. Na realidade, observava-se que em alguns aspectos, ela havia falido, e em outros,

    crescido. O binmio docncia/pesquisa cada vez mais se solidificava. Ela "inchou" com o aumento de clientela,

    mas permaneceu elitista em outros aspectos.

  • 16

    Documentao Oral por ser, no caso, a tcnica de pesquisa mais adequada ao nosso trabalho.

    De qualquer forma, o valor da incorporao destes testemunhos nada representam, no

    fora a proposta de atravs desta forma atingir-se pela prtica a etnolgica retrospeco de um

    revisionismo, que tem como propsito, fazer construir uma Histria com nova base, dando

    palavra aos representantes das minorias culturais. Paul Thompson vai mais longe9. Pretende

    que a tcnica atue como instrumento de uma contra histria. Com o aumento do interesse pelo

    assunto, estas reflexes podem repousar sobre a concordncia com o antroplogo sobre o fato

    de que o homem percebe, pensa e se exprime nos termos da sua cultura especfica.

    Alm da falta total de um apoio institucional, do descrdito poca da tcnica

    utilizada, a professora Luciara, que conosco colaborava, por razes pessoais prestou concurso

    em uma Universidade Federal, a Fundao Universidade de Braslia (UnB). Deixou a PUC-

    SP e a proposta da Histria da Universidade. Isto apenas institucionalmente, pois sempre nos

    preocupamos em apresentar tal pesquisa, que muito rica ainda hoje, tanto no que tange a

    respeito de ideias sobre Universidade, tanto pelo ineditismo de sua confeco e pela

    importncia e significados desses agentes que ajudaram a construir a Pontifcia Universidade

    Catlica de So Paulo e, consequentemente, um ideal de disseminao de saberes, que s

    agora parte vem tona.

    Pela sua prpria etimologia, entendemos por Universidade o local em que o universo

    dos conhecimentos at ento desenvolvidos so trabalhados de forma a garantir a sua

    conservao e o seu progresso, nos diversos ramos em que se distribui, seja pelo

    ensino, pela pesquisa, ou pela prestao de servios sociais. Se considerarmos que,

    na nossa civilizao, o conhecimento para fins de aprofundamento e

    especializao est dividido por reas, podemos considerar como pressuposto

    bsico que, uma Universidade deve trabalhar para a universalidade dos

    9 Thompson, Paul. The voice of Past: Oral History. Oxford, Oxford Press, 1978.

  • 17

    conhecimentos at ento desenvolvidos, de forma a garantir a sua contribuio nesse

    processo.

    A Histria no se debrua na originalidade dos acontecimentos individuais, mas nas

    especificidades deles, pois a escolha de um assunto sempre livre. Porm, dentro da temtica

    escolhida, os fatos e suas ligaes so o que so, e nada poder mud-los. Eles no existem

    isoladamente e, nesse sentido, o tecido da Histria que se chama de trama. Essa trama no

    se organiza em uma sequncia cronolgica, ela pode passar de um plano para outro, sendo

    impossvel descrever a sua totalidade. O historiador nunca faz o levantamento do mapa

    factual, ele pode, no mximo, multiplicar as linhas que o atravessam. A Histria um

    caleidoscpio, onde a reflexo crtica nas entrelinhas necessria e fundamental, onde os

    cruzamentos de itinerrios possveis so rastreados e inteligentemente recuperados.

    A cidade de So Paulo despontou com os sinais do progresso. esta a cidade que

    abriga a Pontifcia Universidade Catlica. A expanso territorial e a variedade de construes

    e da populao, entremeada de paulistanos, paulistas, brasileiros de vrios territrios e de

    imigrantes, fizeram surgir nesta cidade novos bairros no incio do Sculo XX. Alguns deles

    eram territrios burgueses da elite cafeeira, como o caso de Campos Elseos e Higienpolis,

    com praas e jardins bem cuidados, ruas de traados perfeitos, com imensas e arborizadas

    manses, onde habitavam os detentores do poder.

    Nos baixios e nas vrzeas dos rios situavam-se os bairros fabris, pobres, de moradias

    operrias, que eram os menos valorizados. No espao simples de uma rea onde gorjeavam

    aves chamadas perdizes, nasceu um convento de Freiras Carmelitas, em 1908, que cederam

    mais tarde este espao para a criao da sede da Universidade Catlica de So Paulo, em

    1946, uma das mais importantes, entre outras, no contexto da Amrica Latina. Alguns anos

    antes, j havia esta cidade abrigado a Universidade de So Paulo, um centro de excelncia que

    respondeu culturalmente ao desastre da perda militar na Revoluo Constitucionalista de

    1932.

  • 18

    A Universidade Catlica de So Paulo no seu nascedouro j apontava para as

    necessidades das composies poltico-sociais e ideolgicas, atravs da problemtica

    religiosa, que afligia o Brasil naquele momento: a busca de entendimentos da identidade

    nacional, que indicava para o nacional trabalhismo, de um populismo decalcado na crise do

    ps-guerra e na necessria criatividade para responder aos impasses e demandas

    democrticos. Ressaltava-se o significado e o papel da atuao da Igreja, no sentido de

    colocar-se enquanto personagem e interlocutora do novo espao poltico que se institua

    poca. Neste cadinho, justificou-se a criao e estmulo s entidades culturais de carter

    universitrio em algumas metrpoles brasileiras, como Rio de Janeiro, So Paulo e Porto

    Alegre, a exemplo de suas congneres na Amrica Latina.

    Estes setores tornaram possvel a formao de lideranas catlicas para assumirem a

    composio de quadros na sociedade civil e nos aparelhos de Estado, estratgia para

    disseminar seus princpios filosficos e participar, efetivamente, atravs dos leigos, da

    composio do poder, atingindo assim patamares mais elaborados de divulgao distintos dos

    utilizados no sentido tradicionalista e particular no plpito.

    As particularidades desta Universidade encontraram lastros no perfil de seu projeto

    filosfico-educacional, na sua organizao institucional e na composio social dos trs

    segmentos que englobava: professores, alunos e funcionrios, destacando-se tenses e formas

    especficas de insero no cenrio nacional, por seu carter confessional. Surgiu esta

    Universidade no processo de dilatao dos horizontes da Ao Catlica, organizando-se

    timidamente pela configurao dos princpios filosficos que a orientavam, o neotomismo,

    com objetivo de compor quadros e formar profissionais competentes sem, no entanto,

    enfatizar as atividades de pesquisa.

    Na real dimenso da Instituio, enquanto centro de produo de

    conhecimento, pela sua divulgao, encontrou caminhos que despontaram como

    uma de suas caractersticas apenas no decurso dos Anos 70, com a interao entre

  • 19

    ensino e pesquisa. Foram os anos da reforma educacional. Apesar de atravessarmos um dos

    momentos mais dramticos da recente Histria do pas, decalcados no Estado Militar, o

    perodo configurou-se e solidificou-se em uma enorme efervescncia cultural. Foi marcado

    por reivindicaes e presses para ampliao dos espaos, do exerccio da cidadania, em suas

    mltiplas facetas.

    Ressaltava-se uma presena mais marcante dos diferenciados setores da sociedade,

    onde a Igreja apareceu como um ponto de refgio, e com uma mo protetora, amiga daqueles

    que sofreram injustias mais gritantes, por ainda no terem sido silenciados. A longa trajetria

    desta Universidade foi marcada por situaes dspares no cenrio nacional, na cidade de So

    Paulo, e na forma especfica de ao da Igreja. Vamos mergulhar no tempo, refletir, e

    recuperar esta jornada, atravs das doutas entrevistas de alguns agentes que fizeram parte

    desta histria e desta Universidade.

  • 20

    MUSEU DE RUA: PUC-SP - PROJETO E PROCESSO

    Prof. Dr. Jorge Claudio Noel Ribeiro Junior10

    Inaugurado em 1980 e ativo nos seis anos seguintes, o Museu de Rua foi uma aula ao

    ar livre sobre a histria desta universidade. Essa exposio circulava pelos campi e era

    composta de 30 painis fotogrficos montados sobre bases de dupla face, com dois metros de

    altura por um de largura.

    A mostra nasceu num contexto que se articulou em dois nveis. O primeiro, nacional,

    foi a resistncia a uma ditadura j nos estertores, uma frente integrada por figuras como o

    arcebispo dom Paulo Evaristo Arns, tambm gro-chanceler da PUC-SP. O segundo nvel,

    local, foi a ao da reitora Nadir Kfouri e dos vice-reitores Casemiro dos Reis F (acadmico),

    Ednio dos Reis Valle (comunitrio) e Armando Caropreso (administrativo). Esse grupo

    liderou a construo de uma universidade que anteciparia utopicamente a nao pela qual se

    ansiava e que lanaria pontes na direo do povo brasileiro.

    Na rea acadmica, essa proposta se materializou na pesquisa e docncia crtica, no

    acolhimento a uma dezena de professores perseguidos pelo regime, na abertura a encontros da

    intelligentsia nacional, de lideranas estudantis e de vrios segmentos sociais. Na frente

    comunitria, destacou-se a atuao do Instituto de Estudos Especiais, a dinamizao do teatro

    Tuca apontado como templo da resistncia democrtica e o setor de comunicao, que

    vocalizava as inquietaes e conquistas da comunidade universitria.

    Desse caldo de cultura em ebulio, brotou o Museu de Rua a partir da

    colaborao de mltiplas mos. A pesquisa e as entrevistas de histria oral ficaram a

    cargo de equipe da Ps-Graduao em Histria liderada pelas professoras

    Yvone Dias Avelino e Luciara Frota; a coordenao, texto final e diagramao foram

    10

    Doutor em Cincias Sociais pela PUC-SP, Livre Docente e Professor Titular na PUC-SP, Scio Proprietrio

    da Editora Olho Dgua.

  • 21

    realizadas por Jorge Claudio Ribeiro e Roberto Coelho Barreiro F, que editavam o

    Porandubas, jornal da universidade; o design e a montagem couberam ao experiente arquiteto

    Jlio Abe Wakahara.

    Os painis de PUC-SP - Projeto e Processo apresentavam textos didticos, fotos

    histricas e ilustraes atraentes. A exposio foi dividida em trs blocos sobre eventos da

    universidade, em consonncia com a histria brasileira. O primeiro momento trazia a

    concepo inicial da instituio, as unidades que a constituram e as tendncias das dcadas

    1940-50; o segundo bloco cobria a dcada de 1960, a efervescncia poltica e cultural tanto na

    sociedade como na PUC-SP, a Reforma Universitria, a Ps-Graduao, o Ciclo Bsico e os

    movimentos estudantis; o terceiro momento enfocou a dcada de 1970, a resistncia

    ditadura e a afirmao da PUC-SP como espao cultural democrtico.

    O Museu de Rua foi rapidamente acolhido como algo prprio pelo pblico a que se

    destinava e que nele se mirou como ante o espelho da faceta mais progressista de sua

    identidade. Essa caracterstica teria motivado a depredao de sete painis, em setembro de

    1983, talvez prenunciando o incndio que viria a destruir o Tuca, um ano depois.

    Os pequenos estragos decorrentes do uso e transporte eram prontamente reparados.

    Entretanto, a incria infligiu dano definitivo a PUC-SP - Projeto e Processo. Depois da

    troca da equipe responsvel pelo setor, e que fazia a manuteno do museu, alguns painis

    sofreram uso inadequado, como tapumes, o conjunto foi-se dispersando e terminou

    deteriorado num depsito imprprio.

    Mas, sendo da natureza da memria afrontar teimosamente o olvido, surgem planos de

    recuperar a exposio original e traz-la at os dias de hoje.

  • 22

    Introduo

    Profa. Dra. Luciara Silveira de Arago e Frota11

    A insero da Histria Oral na PUC-SP deu-se a partir de um Curso Interdisciplinar de

    Leitura Sistemtica necessrio aos estudos e projetos de mestrado do Programa de Estudos

    Ps- Graduados em Histria nos anos noventa. O curso era oferecido no s aos demais

    alunos de outros programas de Mestrado da instituio como a alunos de vrias outras

    universidades. Isto permitiu um amplo e prtico entrosamento entre alunos da PUC e da USP,

    alguns dos quais aceitos como ouvintes e gerando uma interligao entre vrios profissionais

    como arquitetos, advogados e jornalistas. Quase todos eles pretendiam empregar a Histria

    Oral nos seus trabalhos e me ocorreu, ento, propor Coordenao da Ps-graduao, ento

    dirigida pelo Doutor Joel Martins, e coordenao do Mestrado em Histria, com a

    Professora Doutora Yvone Dias Avelino, que o curso de Leitura Sistemtica pudesse ser

    dividido em duas fases. Na primeira, os alunos estudariam Teoria da Histria, tcnicas de

    entrevista utilizadas pelos mais diversos profissionais, como mdicos, psiclogos, educadores,

    e seriam encaminhados, em seminrios e exposies, a discusses sobre a validade da Histria

    Oral, seu surgimento, conceito, importncia, e introduo no Brasil.

    Nessa segunda fase do curso, os alunos tiveram acesso ao material do I Curso de

    especializao em Histria Oral dado no Brasil pelos professores James e Edna Wilker e a

    professora mexicana Eugnia Mayer do qual participei como aluna. O curso foi patrocinado

    pela Fundao Getlio Vargas e pela Universidade Federal Fluminense com

    a coordenao das professoras doutoras Aidil de Carvalho Press e Ismnia Lima.

    Utilizaram tambm, o material fornecido na Universidade de Braslia

    pelo Professor Doutor David Gueiros Vieira que ali organizou, pela

    11

    Doutora em Cincia Humanas pela USP, Ps-Doctor em Cincia Poltica pela Universidade de Buenos Aires e

    Ps-Doctor em Histria pela UnB. Professora Titular da Universidade de Braslia UnB.

  • 23

    primeira vez no Brasil, em 1975 um seminrio sobre a importncia da Histria Oral do qual

    tambm participou.

    O interesse despertado entre os alunos do Curso Interdisciplinar de Leitura Sistemtica

    foi tanto que os prprios alunos pesquisaram, selecionaram e propuseram textos para estudo

    privado e coletivo. Em sua segunda fase, o curso de Leitura Sistemtica tinha tambm a

    proposta de ajudar o aluno a formular e redigir o seu projeto e organizar entrevistas para o seu

    trabalho monogrfico.

    A interdisciplinaridade do curso favoreceu a ideia da criao de um Laboratrio de

    Documentao Sonora e Grfica do setor de Ps-Graduao da PUC/SP para ser utilizado

    pelos professores e alunos de todos os programas dos cursos da Ps-graduao. Tanto o Dr.

    Joel como a Dra. Yvone manifestaram o maior interesse pela criao do Laboratrio sendo o

    seu projeto por mim elaborado e aprovado pela Comisso de Ps-Graduao. Mais tarde, no

    Projeto PUC ano 2000, o mesmo Dr. Joel pediu que eu o reapresentasse para que fosse

    includo e implantado paulatinamente. Infelizmente, o seu plano no vingou e a PUC/SP

    perdeu um hbil administrador e um grande cientista.

    Vale lembrar que um Laboratrio do porte idealizado e proposto pedia, em funo da

    doao de documentos e conservao de material gravado, como palestras, discursos,

    conferncias e propriamente a guarda das entrevistas de Histria Oral, certo resguardo

    jurdico. Sob o patrocnio dos dois coordenadores j mencionados, doutores Joel e Yvone

    foram efetuados trs palestras, pelos renomados advogados Eduardo Muylaert, Manuel Alceu

    Afonso Ferreira e Renan Lotufo a partir de um tema geral: a documentao oral e seus

    aspectos jurdicos, inclusas na parte Anexa desta publicao. Desde a ideia da formao do

    Laboratrio, numa conversa com o Dr. Joel, e a Dra. Yvone, ficou acertado que o primeiro

    dos seus projetos seria um resgate da Histria da PUC/SP a partir de entrevistas de Histria

    Oral. Os alunos de Leitura Sistemtica adoraram a ideia e se tornaram, em

    sua maioria, a partir de ento, preciosos colaboradores. Formou-se um

    corpo de entrevistadores incentivado, respectivamente, pelas coordenaes da

  • 24

    Ps-Graduao em Histria, e professores como o saudoso Geraldo Pinheiro Machado,

    (CEDIC), Maria Luza, (Educao) Carmem Junqueira (Antropologia), Maria do Carmo

    Guedes (Psicologia) e Lucrcia Ferrara (Semitica).

    As entrevistas aqui apresentadas so, portanto, fruto de um trabalho feito com boa

    vontade e entusiasmo. Suas imperfeies resultam das prprias condies inerentes s

    dificuldades de pesquisa, custos onerosos que um trabalho dessa natureza requer, sem dispor,

    ento, de financiamento das agncias de pesquisa e sendo as despesas de fitas, gravadores e

    transcries, repassadas aos prprios alunos do Curso.

    Sem dvida, esse trabalho espera engavetado por uma publicao h j um bom

    tempo. Ao ser dado luz ele de fato ilumina o percurso da PUC como Instituio de relevo e

    que tem fornecido ao Pas vultos de destaque nacional. A PUC uma Universidade sempre

    como a Histria: um processo em construo a espera do fazer-se. Desvelamos e revelamos

    nesse trabalho alguns dos seus pilares, cones e talvez segredos. Alguns dos entrevistados com

    quem privei magnficas e solidrias criaturas, j nos antecederam na jornada ltima. Certo,

    ficou um pouco de cada um deles nas conversas, e prvias informais e mesmo nas entrevistas.

    Ainda posso ouvir o eco da fala mansa de Joel Martins e rever, em minha imaginao, o

    sorriso franco de Pinheiro Machado. Muitos sussurros, emoes e alegrias cercaram tambm a

    obteno destas entrevistas. Muitos colaboraram, alguns nem tanto, outros muito pouco. O

    que importa que em cada uma delas surgem ntidas as evidncias perseguidas pelo

    historiador convencido de que no h resgate histrico que se sustente sem elas. Elas so o fio

    condutor a surgir do emaranhado de ideias e palavras. Repetidas revises que moldam a

    orao aos fatos, a luta para abordar a verdade sugere, exige, material mais abundante, melhor

    e mais depurado. E a montagem da ltima linha traz consigo no a certeza de estar certa, mas

    a certeza de ter exaurido a evidncia12.

    12 Cf. Oscar Handlin in A Verdade na Histria, (1982), trad. de Luciara de Arago e Yvone Avelino.

  • 25

    O leitor, com certeza se deparar com imperfeies, mas, espero colher daqui

    algumas orientaes e informaes de como foram trabalhadas e selecionadas as entrevistas

    que compem este livro. Principiamos por recordar que propriamente, em termos de Histria,

    o recurso aos testemunhos orais antigo. J em sua Histria da Revoluo Francesa, Michelet

    pe na palavra do povo o prprio fundamento da tradio nacional. Modernamente, em 1948,

    Allan Nevins, da Universidade de Columbia, acrescentou as fontes orais captadas junto a

    testemunhos da Histria, aquelas que j constavam de arquivos impressos e escritos. De

    qualquer forma, o valor da incorporao desses testemunhos nada representaria no fora a

    proposta de atravs de esta forma atingir-se pela prtica a etnolgica retrospeco de um

    revisionismo que tem como propsito fazer construir uma histria com nova base, dando a

    palavra tambm aos representantes das minorias culturais13 . As dificuldades sobre a sua

    validade e as discusses situando-a como tcnica ou como mtodo, assunto que conduz a

    reflexes. Com o aumento crescente do interesse pelo tema, essas reflexes podem, a partir da

    concordncia com o antroplogo repousar sobre o fato de que o homem percebe, pensa e se

    exprime nos termos de sua cultura especfica. preciso admitir que no haja como o tipo de

    coleta de material oral uma Histria que se possa chamar de totalmente espontnea. Bem

    como, ainda admitir que tal quais outros tipos de fontes para a histria o resultado da

    entrevista, ou seja, o texto transcrito deve ser submetido ao mesmo trabalho crtico de outros

    documentos e as mesmas leituras mltiplas e acuradas. A atrao de tornar possvel a

    apreenso da histria em processo de fazer-se , portanto, um risco a ser minimizado. Os

    caminhos se ampliam e se distanciam a partir s do fazer falar a documentao, trata-se agora

    de um novo desafio: tornar-se responsvel, tambm, por ajudar a elabor-la, preservando-a

    para o futuro. E esta foi a proposta do Laboratrio de Documentao Sonora e Grfica.

    13Cf. David Gueiros - Palestra sobre Importncia da Historia Oral - Universidade de Braslia, 1980.

  • 26

    Temos as entrevistas aqui apresentadas como um instrumento de captao do real. Ao

    pensarmos nos eventos contemporneos, observamos que eles incluem recursos como

    audiovisuais, fotografias, slides, filmes; tapes, notas estenogrficas, gravaes, como no caso

    de um jogo de futebol ou de uma corrida de automveis. Esses recursos, assim com as

    entrevistas, podem enriquecer a documentao contempornea sem se perder de vista a

    decorrncia de um processo de seleo entre o ocorrido e a verdade. Um exemplo claro disso,

    advm do fato de que um locutor de rdio, por exemplo, registra o que pensa que viu

    enquanto um estengrafo aquilo que ele pensa que ouviu. No so estes materiais de to boa

    evidncia quanto o que transcrevemos depois de repetidamente ouvirmos uma gravao.

    Consideramos as entrevistas deste livro, como um registro seletivo de tudo aquilo que o

    narrador, ator, depoente, testemunho, entrevistado, ou qualquer outra denominao que se lhe

    queira dar, disse ao entrevistador que se lembra.

    A nossa posio como historiador a de procurar, nessas fontes, o acesso rea de

    memria, sem pode esquecer a sutileza da memria, daquilo que foi percebido e o registro

    propriamente dito desta memria. Contudo, o que o indivduo pensa que ocorreu da maior

    importncia dentro do trabalho de recuperao do passado. Os esforos conscientes do

    narrador para interpretar dentro do contexto emocional e racional podem ser detectados, pois

    os reflexos, no so registros nem so passados, so indcios da nossa busca de Verdade e

    Realidade. O significado que cada narrador d aos seus eventos denota, ainda, que um

    participante, naquele momento pensou no passado daquela maneira.

    Uma anlise histrica do processo de formao da PUC/SP pede, naturalmente, muito

    mais que uma srie de narraes de eventos, requerendo o estudo de conceitos de poca,

    documentos divergentes sobre o mesmo tema, comparaes, enfim, uma gama de avaliaes e

    pesos que podem levar a formulao de hipteses. Esta anlise documental de vrias fontes

    ser decerto mais suscetvel aos preconceitos do que propriamente a coleta de memrias em

    si. No percamos de vista o fato de que o significado pode se misturar e ser forado,

  • 27

    dentro da prpria anlise a ser feita, pois que a anlise deve levar em conta todas as fontes

    disponveis e explicaes satisfatrias.

    Quando comparamos a importncia da histria oral com outras fontes usadas na sua

    preparao, como o jornal, do qual cada vez mais o historiador fica dependente nesse incio de

    sculo XXI, verificamos que ele tambm passvel de algumas consideraes sobre a sua

    validade. O historiador no ignora que s de forma inadequada o material necessrio

    impresso diria corresponde importncia que poderia traduzir. Isto, porque a circunstncia

    do imediatismo do noticirio e a urgncia da composio e vendagem, no horrio previsto,

    no permitem a preciso. Este imediatismo vai permitir, raras vezes, que haja uma pausa

    adequada para a reflexo. O comum a superficialidade das explicaes dos acontecimentos.

    O jornal feito para informar e esta sua finalidade. Alguns problemas adicionais podem ser

    acrescentados. So os casos dos comprometimentos dos seus donos, com o sistema de

    governo, grupos financeiros ou mesmo interesses privados, ou ainda, as compreensveis

    limitaes de interpretao de analistas internacionais, a censura oficial governamental e

    mesmo simpatias e antipatias dos prprios editores a esta ou aquela personagem.

    A prpria consulta ao jornal, seja ou no, como fonte de pesquisa para a prpria

    entrevista de histria oral j se constitui um duro trabalho para o historiador. A ele vai caber

    discernir entre o fato e opinio do jornal, a circunstncia de impresso e as diferenas entre

    textos originais e cortes sofridos e mais ainda, a ligao entre a importncia dada ao editorial,

    chamada da primeira pgina e o prvistaprio contedo de manchete da primeira pgina.

    Assim, parece ridculo considerar o jornal como um tipo de evidencia. um meio ou um

    veculo que rene vrios tipos de evidncias - conselhos e reportagens especiais com registros

    de transaes efetivadas ou putativas; a testemunha das reportagens, a retrica

    dos editoriais I comentrios e cartas dos leitores e obras tais como piadas, histrias

    em quadrinhos e fotografias embora os jornais sejam uma excelente

    fonte de consulta pelo fornecimento de dados organizados, convm no perder de vista

  • 28

    que o essencial encontrar neles o suficiente e no mais, informaes e outros itens de

    interesses para preencher as colunas cada vez porque os leitores suportam-nos buscando

    interesse, eles no podem permitir que sua ateno decline14.

    Outro tipo de fonte, quase obrigatria, quando pensamos em histria oral a biografia.

    Suas restries principiam pelas consideraes feitas a respeito das biografias, no passarem

    geralmente de meras descries. Contudo, quando os Annales reabilitaram as biografias

    valorizando-se, o gnero biogrfico, to de agrado da histria tradicional, pode integrar sem

    maiores preconceitos o elenco de fontes da Histria Social, dentro da ideia de que o

    indivduo, por mais excepcional que seja no pode escapar ao que o rodeia. Sem dvida, o

    ideal o da interao entre o homem e o meio, pois se o grupo social prope ou impe aos

    indivduos os seus quadros de pensamentos e atividade15. As reaes individuais podem

    colaborar na modificao do meio. Se for verdade que a multiplicao de biografias pode

    permitir chamar ateno para um tipo social, no caso da entrevista, o homem, centro em

    torno do qual ela vai gravitar, tambm no dever ser visto como parte isolada em uma

    concepo individualista de histria - o seu papel como integrante de uma sociedade no pode

    ser desdenhado. Assim, mesmo que forma elementar um mnimo de conhecimento sobre o

    testemunho a ser ouvido se faz, portanto, necessrio. Na confeco dessas entrevistas essas

    premissas foram observadas.

    Um ponto que talvez deva tambm ficar claro o relativo que cada um da equipe de

    trabalho, de posse dos dados essenciais construo do seu roteiro de entrevistas, na

    verificao das proposies que o interessam, mesmo estabelecendo suas influncias, no

    pode, todavia, nenhum deles, estabelecer certezas plenas.

    O fio condutor encontrado nas entrevistas aqui apresentadas pode, porm, dar

    continuidade ao caminho de uma para outra entrevista. Reside a uma das

    14 Idem. Ibidem. 15 Cf. tambm este ponto de vista nos resultados publicados no livro Documentao Oral e a Temtica da Seca,

    Braslia, Senado Federal, 1978 e em separata do Projeto PUC/SP Ano 2000.

  • 29

    vantagens da histria oral, pois a oportunidade de privar da convivncia do testemunho vai

    permitir colocar com acerto a palavra certa na digitao, identificar personagem e locais

    citados, e inquirir, avaliar, ajuizar ao vivo tema e personagem. Embora, algumas vezes, de

    modo restrito sua experincia seja individual, ser-lhe- possvel ampliar ou diminuir suas

    dvidas podendo conferir suas impresses originais.

    Na elaborao das entrevistas aqui apresentadas, poucos foram os problemas

    encontrados. Alguns adiamentos, alguma indisponibilidade de tempo, foram algumas das

    dificuldades enfrentadas pela equipe de entrevistadores. Como um problema comum as

    entrevistas e pesquisas em geral, elas podem apresentar alguma dificuldades de fundo.

    Poderemos conjecturar, indagar: - falam livremente os entrevistados sobre o sistema institudo

    com o qual esto comprometidos.

    Ou ainda: - De modo geral, quando entrevistamos algum baseado em registros

    oficiais, no incorreremos no erro de o nosso planejamento abranger somente uma fatia da

    realidade?

    Estas questes so colocadas em funo de que sabemos o quanto s condies de

    presso e ansiedade atuam sobre o indivduo levando-o, inclusive, a confundir fatos com

    fantasias, ou seja, a sua capacidade de discernimento pode sofrer alteraes. Isto posto, para

    no esquecermos que quer resolvamos entrevistar empresrios, professores ou sindicalistas,

    pobres ou ricos, as dificuldades sero basicamente as mesmas. O grau de seu compromisso

    pessoal, ou mesmo a sua inexistncia em demonstr-lo e o resistir a esta ou quela indagao

    pode estar ligadas, ou no, a uma viso corporativista ou interesseira. Todas as vises de

    testemunhos esto assim dentro daquilo que eles prprios consideraram como aceitveis.

    Concluindo, foram-se os velhos e bons tempos da receita de sntese

    oriunda da consulta dos manuais de embasamento terico, pura e simplesmente.

    A generalizao, as falhas da evidencia histrica preenchidas pela teoria so solues

  • 30

    passadas. Se os fatos no justificam as teorias, por sua vez, estas tambm no requerem as

    justificativas correspondentes destes.

    O processo de reconstruo do passado nos nossos dias, mesmo quando falamos de

    passado recente, como o nosso caso, segue condicionado ao respeito pelo fato conhecido -

    sempre sujeito ao revisionismo - bem como, pela obrigatoriedade de manuteno e

    estabelecimento do correto registro. A entrevista de histria oral , portanto, mais um

    instrumento para a reconstruo desse passado. Instrumento importante que exige para o seu

    preparo, leitura cuidadosa de publicaes do entrevistado e de outros autores sobre o mesmo

    assunto, conversas prvias, conferncias e palestras, em suma, observao direta aonde o

    historiador, necessariamente apoiado, procura, alm do aumento do conhecimento, a

    manuteno de absoluto respeito s aspas da palavra escrita ou falada. As entrevistas esto

    apresentadas nos moldes tradicionais de perguntas e respostas, isto, por entender que a

    fluncia, a fala percebida com maior facilidade bem ou o seu contrrio, levar o pesquisador

    interessado ao delas utilizarem-se as prprias reflexes dos entrevistadores em suas anotaes

    pessoais j est, encaminhado para o seu contedo. Ele prprio avaliar contedo e

    personagem. Poder naturalmente fazer reflexes do tipo: - que evidncias outras temos para

    assegurar que o que diz verdadeiro? Parece o entrevistado forte ou fraco, sua ao foi anloga

    a sua fora ou a sua fraqueza? Ele convence na sua fala ou o que diz demonstra insegurana?

    Claro que a comprovao de suas hipteses no est restrita a histria oral em si

    mesma. Mas, ela imprescindvel como elemento para sustentar as possibilidades surgidas e

    avaliar abordagens de textos vistos em outras fontes e ainda, para estabelecer as necessrias

    comparaes entre eles.

    Em tese, coloca-se por si mesma, a credibilidade do testemunho. Como em

    qualquer outro tipo de documento histrico, o problema da credibilidade permanece mesmo

    quando se trata de entrevista. Todos os cientistas sociais sabem - e os historiadores em

    particular - que a respeitabilidade de um testemunho no oferece nenhuma

    certeza precisa de exatido. Erros de percepo, lapsos de memria e

  • 31

    hesitaes podem ocorrer durante a entrevista. Tambm, as tendncias latentes em cada ser

    humano podem se manifestar advindas de convices pessoais, interesses de grupos ou de

    classe, preconceitos e envolvimento pessoal e emocional. Isto no significa necessariamente

    uma mentira, podemos mesmo encontrar nesse tipo de testemunho a mxima sinceridade.

    Verdade que, embora cada testemunho nos interesse em particular, do conjunto deles que se

    nos vai oferecer um leque de vises, podendo guiar o pesquisador rumo verdade procurada.

    Passa-se, ento, a um processo de avaliao das possibilidades e probabilidades de que

    determinados eventos que interessam a nossa pesquisa tenham-se dado desta ou daquela

    forma. A certeza buscada continua, nesta e noutras pesquisas a nos escapar na sua totalidade,

    pois as concordncias dos testemunhos, assim como as discordncias no atentam in totum

    para a veracidade do que se pretende investigar. Dificuldades que podem ser acentuadas na

    razo direta do tema escolhido.

    Para tanto, basta que nos lembremos de alguns pontos dos quais partimos na

    preparao para as entrevistas, com o acordo de doao assinado pelo testemunho, e

    formalizado, dando-lhe aspecto legal. Todos estes cuidados no impedem a falncia de

    obteno de uma verdade completa que continua a existir, independente de como sejam

    julgados os resultados. Sabemos, portanto, das limitaes do nosso trabalho.

    Registro puro e simples e registro de impresso ou texto literrio as entrevistas, em seu

    conjunto, podero compensar a fraqueza de alguns testemunhos. (Falta de disponibilidade de

    tempo do entrevistado, receio de exposio pessoal, questes de sade, ferir susceptibilidades,

    temperamento pessoal entre outros). Apesar dos riscos na sua confeco, o conhecimento de

    como os homens que fizeram e fazem a histria nossa de todo o dia falam das suas

    experincias, pode, em parte, diminuir os riscos da insuficincia e simplificao da evidncia

    histrica a qual esto expostos todos os historiadores nas suas apreciaes.

  • 32

    A questo das entrevistas aqui apresentadas como resgate da histria viva da

    Instituio ou como fonte para registros futuros poder gerar o prprio julgamento da medida

    em que as palavras correspondem ao, e seu valor ter por base, tambm, a conscincia

    profissional dos que elaboraram este trabalho, a qual no permite a preparao prvia da

    evidncia histrica. Alguns deles j no esto entre ns como o nosso dileto e aplicado aluno,

    o arquiteto Jos Carlos Gonalves, que se transformou num grande amigo.

    Deixamos, assim, cada um de vocs com os entrevistados agentes dessa histria, face a

    face, no Laboratrio. E por ltimo, no estdio, reconhecendo a atualidade da histria oral que,

    independente do mundo globalizado, onde a valorizao do volume de informaes sobrepuja

    os significantes individuais, a significao da fala absorvida na sua ressonncia no seno

    um eco, um espelho da sociedade, uma abertura.

    O homem, sua histria prpria, seus atos, gestos e palavras continuaro sendo uma

    instigante novidade. Para ele, convergem teorias, tcnicas e mtodos de estudo desvelando o

    seu caminhar no processo histrico luz da mobilidade do testemunho no territrio das suas

    prprias certezas e hesitaes. Esse trabalho foge a generalizao compulsiva ao restituir ao

    prprio sujeito, de forma individual, o balizar sua trajetria e sua histria de vida.

  • 33

    Tabela de Entrevistas

    Entrevistado Entrevistador(es) Temtica Data

    D. Paulo

    Evaristo Arns

    Jorge Claudio

    Luciara S. de Arago

    e Frota

    Jos Mario Getimane

    Yvone Dias Avelino

    A Universidade na

    caminhada do povo 10/03/1980

    Andr Franco

    Montoro

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    M. Lcia P. de

    Mesquita Barros

    Um poltico dentro da

    Universidade Catlica 30/09/1981

    Joel Martins

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Carlos Lucas Mali

    Experincias de trabalho

    na Ps-Graduao 02/10/1980

    Jos Carlos

    de Ataliba

    Nogueira

    M. Lcia P. de

    Mesquita Barros

    A criao da Universidade

    Catlica 23/09/1981

    Oswaldo

    Aranha

    Bandeira de

    Mello

    M. Lcia P. de

    Mesquita Barros

    A Reitoria e a

    Universidade na opinio

    do primeiro Reitor Leigo

    07/03/1979

    Enzo Campos

    Guzzo (Padre

    Enzo)

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    A Universidade no

    pensamento de um de seus

    pensadores

    29/06/1979

    Geraldo

    Ataliba

    Nogueira

    M. Lcia P. de

    Mesquita Barros

    O perodo de Reitoria

    (1972/1976) 21/06/1983

    Joaquim

    Alfredo da

    Fonseca

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    Joelza Ester

    Domingues

    A Faculdade de So Bento

    e o curso de Geografia na

    Universidade Catlica de

    So Paulo

    02/07/1979

    Geraldo

    Pinheiro

    Machado

    M. Paula P. de Aguiar

    Vera Lcia Baleroni

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    A criao da Universidade

    Catlica e seus propsitos

    a partir do movimento do

    Centro D. Vital no Rio de

    Janeiro; A fundao do

    CEDIC e a criatividade

    filosfica

    24/09/1981

  • 34

    Aniela Meyer

    Ginsberg

    Yvone Dias Avelino

    Jos Carlos Gonalves

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Uma experincia na

    Psicologia 15/12/1980

    Milton de

    Miranda

    Vera Lcia L. Baleroni

    Vera M. D. de

    Andrade Rinoldi

    Projetos e administrao 26/08/1981

    Luis

    Kubinsck

    Feigue Killer

    Mrcia T.

    Mielennhausen

    Nlli Silva K. Rizzo

    A biblioteca e a sua

    formao 12/12/1980

    Ari Silvrio Luciara S. de Arago

    Jean-Claude Silberfield

    A vida administrativa na

    Universidade 28/06/1979

    Antonio

    Penteado de

    Azevedo

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    Jos Carlos Gonalves

    A importncia cultural e

    poltica da PUC-SP e suas

    fontes de sobrevivncia

    11/06/1979

    Jos

    Massafumi

    Nagamine

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Carlos Eduardo

    Caldarelli

    Paulo da C. Pan

    Chacon

    Erivaldo Fagundes

    Neves

    O Curso Bsico, O

    movimento de reforma

    universitria na PUC-SP e

    o desenvolvimento

    nacional

    10/12/1980

    Ramn

    Martinez

    Alcaraz

    Heraluise M. de

    Almeida

    Eduardo Roberto D. da

    Silva

    A Revista da PUC-SP 12/03/1981

    Oswaldo

    Leite de

    Moraes

    Mrcia T.

    Mielennhausen

    Feigue Killer

    O Estatuto da

    Universidade. A

    Faculdade de Direito

    11/12/1980

    Feliciano da

    Rosa Aquino

    Nlli Silva K. Rizzo

    Manoel Severo de

    Farias

    Dados para a Histria da

    PUC-SP 28/06/1979

    Jos J.

    Queiroz

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Joelza Ester Vieira

    A criao do Instituto de

    Estudos Especiais e seus

    resultados

    16/12/1980

    Elza Ferreira

    Lobo

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    Jorge Cludio

    O TUCA, o Tuquinha, as

    Agregadas e as

    Incorporadas

    07/12/1979

  • 35

    Carmem

    Sylvia

    Junqueira

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Jean Claude Silberfeld

    A Antropologia da

    Universidade 26/04/1981

    Clia Sodr

    Doria (Madre

    Cristina)

    Adilson Jos

    Gonalves

    Yvone Dias Avelino

    O poltico repressor, o

    movimento estudantil a

    criao do Instituto Sedes

    Sapientiae

    07/12/1980

    Demerval

    Saviani

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Joelza Ester

    Domingues

    Helena Freire Moreau

    O papel do educador nesta

    Universidade 13/08/1981

    Lus Eduardo

    Wanderley

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Jean Claude Silberfield

    Das experincias na JUC

    s experincias da PUC-

    SP

    04/04/1981

    Nadir Gouva

    Kfouri

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    O processo de

    democratizao e o

    episdio da invaso da

    Universidade

    27/09/1982

    Casimiro dos

    Reis Filho

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    Juvenal de A. Penteado

    Neto

    A reforma universitria e

    o Curso Bsico 10/10/1981

    Ednio dos

    Reis Valle

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Yvone Dias Avelino

    Jean Claude Silberfeld

    A USP e a PUC: dois

    transplantes europeus 21/08/1982

    Antonio

    Joaquim

    Severino

    Luciara S. de Arago e

    Frota

    Jos Carlos Gonalves

    Ilka Stern

    Igreja, Universidade e

    Sociedade 14/02/1981

    Clia Coelho

    Pereira Leite

    (Madre

    Olvia)

    Slvia Ins Conegliani

    Carrilho de

    Vasconcelos

    O Programa de Lngua

    Portuguesa na Ps-

    Graduao

    10/03/1979

  • 36

    HISTRIA VIVIDA E CONTADA

    CONFIDNCIAS NA ANTE SALA DO ESTDIO

  • 37

    D. PAULO EVARISTO ARNS

    P- D. Paulo, ns o admiramos muito, e sabemos muita coisa sobre o seu sacerdcio, porm

    nada melhor do que o senhor mesmo para nos falar informalmente sobre a sua vida.

    R- Nasci em Forquilhinha, no dia 14 de setembro de 1921, e realizei meus estudos

    fundamentais ali mesmo. Mais tarde ingressei no seminrio Franciscano, Seminrio Serfico

    So Lus de Tolosa, em Rio Negro no Paran. Assim, sou um frade Franciscano, um sacerdote

    catlico, e Deus me confiou ser o dcimo stimo bispo de So Paulo, o seu quinto arcebispo e

    terceiro cardeal.

    P- Como era o nome de seus pais?

    R- Minha me foi Helena Steiner Arns, e meu pai Gabriel Arns.

    P- O senhor deve ter boas recordaes de sua ordenao, no ?

    R- Sem dvida. Fui ordenado presbtero, na cidade de Petrpolis, no dia 30 de novembro de

    1945. uma data inesquecvel para mim. Quem me ordenou foi o arcebispo de Niteri, Dom

    Jos Pereira Alves. Eu j exercia o meu ministrio em Petrpolis h cerca de uma dcada,

    trabalhando com a populao carente. Lecionei no Teologado Franciscano de Petrpolis e

    tambm na Universidade Catlica.

    P- E quanto aos estudos do senhor na Sorbonne?

    R- Fui para a Frana estudar na Sorbonne, que uma grande Universidade. Ali aprendi muito

    e tive a oportunidade de praticar bastante a lngua francesa. Meu desejo era, contudo, retomar

    minha ptria e transmitir os conhecimentos ali aprendidos. Acho que poucos ou nenhum de

    vocs precisaram ficar cerca de 12 anos e meio estudando em trs escolas superiores e ficar

    pouco tempo como professor e j me mandaram para So Paulo e eis que aqui estou com

    vocs. Bom, mas de fato, no meu retomo, fui professor nas faculdades de Filosofia, Cincias e

    Letras de Agudos e Bauru, mas no deixei de, retornando Petrpolis, continuar a dar

    assistncia aos desfavorecidos. Todas estas atividades foram realizadas antes do meu

    episcopado, pois em 2 de maio de 1966, fui eleito bispo auxiliar de Respecta e auxiliar de So

    Paulo...

    P- O senhor era um jovem de 44 anos e tinha um longo percurso pela frente como pastor...

    R- Vejam, creio que continuarei sempre jovem em esprito. O meu prprio lema EX SPE IN

    SPE que significa de esperana em esperana reflete meus sentimentos e Deus tem me

    alimentado com esta esperana.

  • 38

    Recebi a ordenao Episcopal na Igreja Matriz do Sagrado Corao de Jesus na minha

    saudosa Forquilhinha, tendo como sagrante principal o arcebispo de So Paulo Dom Agnelo

    Rossi e como consagrantes o bispo coadjutor de Lages Dom Honorato Piazera, e o ento

    bispo de tubaro Dom Anselmo. Mas, um das mais importantes fatos da minha vida foi

    nomeao pelo Papa Paulo VI, como arcebispo metropolitano de So Paulo. Teve comeo

    uma grande misso. Primeiro, uma misso junto ao povo; segundo, uma misso na

    Universidade. Afinal os caminhos se encontram... o que eu sempre digo a Universidade

    deve estar na caminhada do povo. Quando fui nomeado arcebispo de So Paulo, no primeiro

    encontro com a direo da PUC ressaltei vrios pontos que achei importantes. Ento, eu disse

    que a Universidade, tal como hoje, s teria sentido ajudando a solucionar problemas reais. A

    ela cabe sensibilizar os estudantes e toda a sociedade tocando o ego do cristo no povo e no

    ser somente um local de encontros, mas um laboratrio onde se constri positivamente o que

    existe dentro de uma cidade ou de uma nao.

    P- E quanto s dificuldades que j se anunciavam em 1961?

    R- Foi uma poca difcil para o Brasil, uma poca que teve muita influncia na prpria

    democratizao da PUC.

    P- Bom, mas o senhor falava do papel da Universidade...

    R- Sim, ela tambm um local privilegiado para a busca de alternativas para a sociedade e

    para a nao. Prioritariamente o local onde se faz pesquisa consciente, onde se deve saber

    falar com o povo, discutir com o povo, e onde o povo fala. A universidade deve atuar com as

    comunidades e elaborar projetos com o povo e para o povo, nos mais diversos nveis. Por que

    no aproveitar a experincia do povo se sem ela no se pode analisar o que ele faz ou

    colaborar com ele? Ao povo cabe tambm tomar a histria na mo.

    P- O que o senhor prefere em suas atividades?

    R- Gosto de escrever. Creio que tenho cerca de 50 livros. So obras sobre a ao pastoral da

    Igreja, e estudos da literatura crist dos primeiros sculos do cristianismo. Voltei a atuao

    pastoral para a periferia, para os trabalhadores e para a formao das comunidades. Penso que

    a ajuda aos menos favorecidos e o patrocnio dos direitos humanos dever de todo cristo.

    Quando era bispo auxiliar, trabalhei em Santana na regio norte e o que vivenciei ali e em

    outros lugares nunca me deixa esquecer a importncia do papel do cristo e o fato de que seus

    deveres no tm aspectos formais, mas de fundo, de contedo. Durante o regime militar lutei

    pelo fim da tortura no Brasil e pelo restabelecimento da democracia. No poderia ser de outra

    forma, pois o ato de torturar incompatvel com a natureza do cristo, com a dignidade da

  • 39

    pessoa humana, sagrada diante de Deus. O que me alegra e impressiona aqui na PUC e

    mesmo em So Paulo o contato pessoal com tanta gente que militou na Ao Catlica. Ser

    cristo portar o fogo de Cristo, ser acolhedor pensar novas ideias para a juventude, para

    os migrantes que devem ser tratados com compreenso, para os casais, enfim fomentar,

    implementar ideias que tomem o mundo melhor. O ideal de ser bom e justo deve ser sempre

    uma meta, um desejo sincero de nosso corao. Quando criei em 1972 a Comisso Justia e

    Paz de So Paulo e incentivei a Pastoral Operria e a Pastoral da Moradia cumpriu com esta

    atividade a minha obrigao crist e pretendi colaborar para que os demais sintam o quanto

    algum se importa, o quanto a Igreja se importa com cada um deles. A minha verso da Igreja

    a de que haver uma consonncia entre ela, o homem e a participao do homem.

    P- E quanto ao papel da Universidade? A ligao entre Universidade e democracia?

    Estamos vivendo uma fase, nova fruto de vrias tentativas de democratizao. Apesar de toda

    escola formar mais para o individualismo competitivo do que para o universalismo e o

    pluralismo. A Campanha da Fraternidade de modo claro, vocs viram o discurso de D. Hlder

    Cmara? Ele soube acentuar no seu discurso o individualismo do estudante que passa pela

    escola e nunca retoma, sobe na vida, e deixa a Universidade sem lembrar-se sem retomar para

    dizer um obrigado. Nesse processo deram-se as eleies para a Reitoria da Universidade para

    chefe de Departamento e isto uma coisa nova que dever dar bons frutos no futuro. As

    reflexes da CNBB sobre orientao poltica dizem respeito a que para ns cristos o que se

    procura a democracia como forma de sociedade, como forma de organizar-se, e neste

    sentido na Universidade deve pulsar o corao da sociedade.

    P- E quanto importncia dos temas, digo, dos estudos especiais dentro da Universidade?

    R- Claro que os estudos especiais tm repercusso aqui e em outras reas l fora. Temas de

    debate so as cadeias e prises, as comunidades de base, o problema do menor o prprio

    simpsio sobre Psicologia do homem de rua e outros assuntos apontam para uma meta: a de

    pelo menos encaminhar os problemas do povo.

    P- As suas obrigaes como Chanceler so muito pesadas?

    R- Eu no diria pesadas, mas so grandes responsabilidades, pois tenho que cuidar dessas

    diretrizes como pano de fundo, isto porque sabemos que atrs de qualquer ao est uma

    poltica e a nossa dentro da PUC manter a identidade com o evangelho orientao da Igreja

    universal, e claro, da Igreja no Brasil e a daqui de So Paulo. A sigla CNBB conhecida

    mundialmente e provoca discusses e divises e mesmo conflitos. H sempre um grande tema

    humano e social. Houve um outro documento com o que eu ganhei o ttulo de mau brasileiro.

  • 40

    P- Foi o do apelo de paz e fabricao de armas?

    R- Sim. Este foi feito por uma equipe que elaborou entre os 250 bispos e notem que entre 250

    bispos nenhum deles deixou de dar o seu voto a favor, ento so 250 mos nesse documento

    que eu reputo muito importante.

    P- Mas D. Paulo, outros temas discutidos so tambm muito polmicos, como: Poltica

    externa e conflito de terras...

    R- Sim. E so questes sobre as quais devemos refletir de forma crist.

    So tambm assuntos universitrios e na Universidade deve-se examinar o contedo e a

    previso de problemas que geram consequncias sobre cidades e pases. O tema dos direitos

    humanos no deve ficar s com os bispos, a comunidade crist quem deve assumir este

    papel. No comeo, esperava-se uma soluo dada pela cria, mas o povo pelas cartilhas

    distribudas j sabe como reagir.

    P- Qual a ajuda da equipe de Paulo Freire?

    R- Ele nos ajudou a elaborar um caderninho e a fazer audiovisual para as comunidades de

    base. Treinaram monitores durante seis meses, bem dentro da caminhada da igreja, nestes

    ltimos dez anos, e discutindo com o povo despertou o interesse sobre a situao brasileira em

    vrias reas. Tirou-se a sntese da gravao e ficou a lio de que este trabalho parecia ser o

    de uma Universidade unida. Quando algum pergunta quando que a Universidade vai

    caminhar com o povo, ficam todos olhando e esperando pela PUC.

    P- 91% das pessoas em So Paulo trabalham remuneradas e no faz diferena se so ricas ou

    pobres. A justia e trabalho devem ser iguais para todos. Justia e trabalho no podem ser

    assumidos por uma cpula, mas voltar s mos das classes trabalhadoras, aos sindicatos e as

    comunidades de base. Contudo, isto no pode substituir o povo nas suas reivindicaes.

    Sempre nos pedem para assegurar a formao de lideranas populares que no permitam que

    o povo seja manipulado e ai a Universidade tem um grande papel.

    P- O que o senhor nos diz sobre a Campanha da Fraternidade de 1982?

    R- Ela encara, em primeiro lugar, a formao do povo brasileiro. Os cursos Primrio e

    Secundrio, a realidade das escolas de periferia e do interior do Estado so calamitosas. A

    grande pergunta : o que que a Universidade pode fazer para reanimar o ensino? O

    professor, este marginalizado, est quase perdendo o entusiasmo de ser professor. E professor

    uma pessoa de vocao, mas o que desestimula a marginalidade de suas reivindicaes.

    Mas quero terminar esta entrevista com um aceno de esperana. Sei que na Universidade est

    em crise o prprio ensino isto se vincula ao econmico e ao social, provocando uma ao

  • 41

    poltica. Aqui na PUC o grande problema como conservar a autonomia dentro de um

    sistema que inclui ou determina a prpria subsistncia da nossa Universidade. A PUC, nestes

    anos, influenciou a comunidade de So Paulo e mesmo todas as Igrejas do Brasil. Ela vem

    influenciando outras Universidades nestes ltimos dias. Tivemos a coragem de ser a primeira

    instituio brasileira a conferir a D. Helder Cmara o ttulo de Doutor Honoris Causa.

    Quero est ao lado de vocs sempre, se vocs estiverem ao lado do povo nesta caminhada que

    fazemos. Meu sonho que a universidade seja o povo. De fato, a sua alma e a sua esperana.

    P- D. Paulo receba a nossa gratido e o nosso respeito. Estamos felizes por saber o quanto o

    senhor tem se destacado pela defesa dos direitos humanos. Tal como D. Helder, o senhor

    tambm mereceu o ttulo de Doutor Honoris Causa da Universidade de Notre Dame, em

    Indiana, nos Estados Unidos. Esta distino o coloca no mesmo patamar do Presidente Jimmy

    Carter, do Cardeal Stephen Kim Sou-hwan da Coria e Daniel Lamont, bispo de Umtali da

    Rodsia... No sei se lembram de que isto foi em 22 de maio de 1977. Sabe, D. Paulo, o

    senhor o nosso Cardeal campeo.

  • 42

    ANDR FRANCO MONTORO

    P- O senhor foi o primeiro presidente da JUC, no ?

    R- Em 1937, 1938, o ano exato eu no me lembro, mas fcil eu ver a documentao, ns

    organizamos, em So Paulo, os dois primeiros ncleos da Ao Catlica, representados pelo

    JOC, tendo presente, o Gesto La Creta, pela JUC, da qual eu fui o 1 Presidente, e Rubens

    Padim, hoje, D. Cnd ido Padim, o 1 Vice-Presidente. Foram dois movimentos que tiveram,

    na poca, a significao de uma mudana de atitude, e que representavam a participao do

    setor operrio e do setor estudantil no debate dos problemas nacionais, e no encaminhamento

    de solues, diante de uma perspectiva de substituio do paternalismo do Estado e das

    prprias autoridades religiosas, por uma participao responsvel e ativa.

    Eu fui, por duas vezes, presidente da JUC: a primeira vez foi a da fase em que era Bispo

    auxiliar de So Paulo, D. Jos Gaspar da Fonseca e Silva, que foi o grande dinamizador da

    Ao Catlica. Ele era um mineiro de Uberaba, jovem, ativo, entusiasta.

    Ns organizvamos vrios movimentos no campo social. Por exemplo, ns construmos uma

    colnia de frias em Itanham, que era um lugar de refeio e de encontro de estudantes de

    todas as escolas: medicina, engenharia, letras, filosofia, educao, economia, etc. Essa colnia

    foi sendo construda com campanhas nossas. Em parte, ns mesmos trabalhvamos ajudados

    por alguns irmos leigos beneditinos. Pena que essa colnia tenha sido vendida

    posteriormente.

    Depois com a morte de D. Jos Gaspar, que era Arcebispo de So Paulo. Houve um pedido de

    quase interveno, realizado pela Junta da Ao Catlica, que era comandada pelo Plnio

    Correia de Oliveira. Com a nomeao do novo Arcebispo, que era D. Carlos Carmelo de

    Assuno, houve a discusso de prosseguir a Ao catlica na linha anterior. Foi a que eu fui

    chamado, mais uma vez, l, para presidir uma nova transio... essa fase da junta.

    P- Quais eram as perspectivas dos grupos de Ao Catlica?

    R- Os grupos de Ao Catlica tinham uma perspectiva de uma mudana fundamental,

    fomentados pelas direes marcadas da encclica Mater Magistra, da quadragsima, isto , de

    uma reforma de uma linha no capitalista, nem individualista... Digamos de uma afirmao

    dos trabalhadores.

    Pela sua repercusso, a JOC era o movimento, talvez, mais importante. claro, os

    trabalhadores tm um peso social muito maior. A grande figura da poca era o Cnego

    Cardin, que era filho de operrios, e que, no episdio histrico que era muito citado, por

  • 43

    ocasio da morte do pai que morria, assim, vtima de acidente de trabalho, vtima do

    capitalismo, prometeu dar a sua vida numa luta pelo trabalhador...enfim, pela causa operria.

    E fundou, iniciou, na Blgica, um movimento, que originou a JOC Internacional.

    Ele veio, varias vezes, ao Brasil. Eu o conheci aqui, no Brasil. Ele tinha contato com os

    operrios. Era um movimento internacional, uma luta de grande porte. Foi to grande a

    influncia do Cnego Cardim, que ele acabou sendo feito Cardeal, Cardeal Operrio. H

    expresses dele muito interessantes... Uma das frases que ns repetimos do Cardin, era de que

    Se voc quiser saber qual a situao de uma comunidade, procure conhecer o salrio dos

    trabalhadores daquela comunidade. As outras questes so assistenciais, assistencialistas, e,

    pela remunerao que ele recebe se pode medir o grau justia ou de injustia de uma

    comunidade. Esse fulgor teve repercusso no mundo inteiro: Amrica Latina, sia, frica...

    Eram reivindicaes sociais e operrias, reivindicando um lugar para o trabalhador na vida

    social; trabalhando pela maioridade de classe operria.

    Havia os jucistas e os jucistas, que ocupavam assim, posies de liderana no meio operrio.

    Participavam das lutas sindicais. Queriam, tambm, as duas polticas. Por exemplo, o

    Presidente do JOC era o Zez Moraes, que foi Vereador; o Gasto La Creta, o Z Moraes,

    etc., e esta moa que est hoje na escola, na Universidade, na parte de Servio Social... a

    Suzana. A Suzana participou muito desse movimento. O movimento da JOC... Yay Soares...

    Foi um movimento precursor, na poca; era a negao do paternalismo. Tinha uma posio,

    assim, antipaternalista e muito ciosa da independncia e da maioridade da classe operria. Os

    lderes da JOC faziam concentraes, muitas vezes, com milhes de pessoas. Agora, no

    queriam se confundir com partidos polticos.

    As coisas foram amadurecendo e houve transformaes, mas a JOC, realmente, no se

    confundiu nunca com um movimento poltico, com um partido poltico. Tinha se quisermos

    um sentido poltico, no sentido de mudar a direo da vida social, querendo dar uma marca de

    uma participao preponderante dos trabalhadores, mas nunca se confundiu com um partido.

    Havia muitos, por exemplo, o Zez Moraes, que entrou para o Partido Democrata Cristo, e

    eu, que pertencia Ao Catlica e fui, at, Secretrio Geral da Ao Catlica, que na sua

    fase final. Quando entrei para a ao poltica, por conselhos da prpria direo da Ao

    Catlica, desliguei-me da direo da Ao Catlica para entrar na ao poltica com minhas

    responsabilidades pessoais de cidado.

  • 44

    Fui lanado candidato... Fui primeiro, candidato a vereador. Fui candidato a Vereador,

    lanado pelo grupo da JOC, do grupo operrio do Moinho Velho, no Ipiranga. Minha votao

    foi no bairro operrio do Ipiranga, embora eu tambm tivesse votao de estudantes.

    Eu fui eleito vereador, e renunciei ao mandato s no momento em que houve, l, uma

    Malufada, a compra... H homens que acham que, na ao poltica, o prprio deve ser este:

    Todo homem tem seu preo. Ento, aplicaram o princpio, e elegeram o candidato

    Presidncia, na base da compra. Em sinal de protesto, eu renunciei ao meu mandato.

    Renunciei, e meu suplente que assumiu. Meu suplente era exatamente o lder do JOC, Jos

    Moraes, que era presidente da JOC. E, eu retomei minha cadeira na Universidade. Mas, dois

    anos depois, fui candidato a Deputado estadual. Fui, tambm, eleito, com a maior votao. E,

    no dia da eleio, eu fui eleito Presidente da Assembleia. Fiquei na Assembleia quatro anos, e

    depois, fui Deputado federal.

    P- O PDC foi formado pelos senhores?

    O PDC no foi formado por ns. Ele foi formado aqui, em So Paulo, a partir de So Paulo

    pelo prof. Cezarino Jr. E por grupo de professores. Ns estvamos fora da ao poltica.

    Cezarino Jr. Foi o primeiro Presidente e Fundador do PDC, e era, tambm, professor de

    Direito do Trabalho da USP. Faculdade de Direito da USP. Ele e o pessoal do Instituto de

    Direito Social fundaram o PDC, logo depois da guerra, mais ou menos na linha dos partidos

    democratas cristos que surgiram no aps-guerra, na Europa, e que tiveram uma funo

    histrica notvel: foram como que os construtores da Europa: De Gasperi, na Itlia; Adenauer

    na Alemanha; Schumann, na Frana. E os outros movimentos semelhantes na Holanda, na

    Blgica e na ustria. Eles fizeram esse movimento aqui, mas no tinham... eles eram

    professores, intelectuais, no tinham ...

    At que se realizou, em 1949, uma reunio em Montevidu, um encontro de lideranas crists,

    que estavam engajadas na ao poltica. Em nome do Brasil, compareceram Tristo de

    Athayde, que me convidou insistentemente para que fosse. Eu estava saindo da Faculdade. Eu

    era secretrio da Junta da Ao Catlica, quando fui convidado pelo Dr. Alceu para ir a esse

    encontro de Montevidu. E, foram, para Montevidu, trs representantes do Brasil: Dr. Alceu,

    Sobral Pinto, e eu. Eles, mais velhos, e cada um na sua vocao, dizendo que no se

    desligavam disso. E, na volta, estivemos aqui, em casa, aqui, nesse lugar, mesmo, com um

    grupo, achando que deveramos organizar um movimento democrata cristo. E, aqui,

    organizamos um movimento que se chamou Vanguarda Democrtica, que acabou entrando

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    no PDC, e pegando a direo do PDC. De algumas reunies, participaram o Padre Lebret e D.

    Hlder Cmara, aqui mesmo. E, a, entramos para poderamos dizer, um partido.

    Essa frente queria uma integrao poltica, mas no tnhamos coragem de entrar para um

    partido... Todos nos pareciam inaceitveis. Eu me lembro de que para vencer a posio

    farisaica em que a gente se colocava, eu escrevia um artigo num jornal, no de So Paulo,

    com esse ttulo: Poltica, no s digna, numa caricatura mostrando a aposio farisaica em

    que ns no tnhamos disposio para sujar as mos, e a poltica, que era impura. O Padre

    Lebret, numa das reunies, aqui, nos dizia: preciso ter a coragem de sujar as mos, entrar

    na histria. Vocs no podem ficar no escuro. E entramos na ao poltica. Entramos no

    PDC.Com a poltica interna, l, cheguei a ser expulso do partido. Convocamos uma

    Assembleia Geral, e eu acabei como Secretrio Geral desta conveno geral do partido. E

    iniciamos a experincia no PDC. Comeou pequena. Na nossa primeira experincia poltica,

    apresentamos como Deputados Federais, o Queirs Filho e o Jos Reis; e, para Deputados

    Estaduais, quatro: o Gasto Lacreta, que era presidente da JOC, o Luiz Tolazza Filho, que

    advogado ainda hoje, era representante da JUC, etc., o Clvis Garcia, professor de teatro da

    USP... o Clvis Garcia... Quem era o quarto? Ah! O Pereira Junqueira. Esses eram quatro

    candidatos a Deputados Estaduais de outra chapa do PDC. Entramos como um grupo dentro

    do PDC. Eu no era candidato, no. No pretendia ser. Trabalhei muito por eles, mas Houve a

    derrota geral. E, ai, o Queirs Filho, que era o grande poeta, lembrava a poesia de Zanille de

    Saint Martin, que dizia assim: preciso que a semente seja esmagada para que a rvore

    cresa. E na eleio seguinte, foi a eleio para vereador. Eu no pretendia ser candidato, mas

    o pessoal me lanou para candidato a Vereador. A, ns elegemos cinco vereadores. E,

    comeamos o movimento... Depois, na eleio seguinte eleger o Queirs Filho Deputado

    Federal... e, com mais dois que se elegeram em outros Estados, o PDC tinha trs Deputados

    Federais. Na eleio seguinte, foi que se elegeu sete Deputados Federais. J, na outra, vinte; e,

    nas eleies, que se realizariam em 1965, se elegeria seguramente mais de 50 Deputados

    Federais. Era a fora que mais crescia no Brasil.

    A Igreja no estava, totalmente, separada desse processo, s respeitavam a deciso, mas ns

    fazamos questo de fazer.. O PSD, a UDN tinham muito mais candidatos ligados Igreja do

    que o PDC. Ns tnhamos, em lugares, dificuldades. Em muitos setores, ns ramos suspeitos

    de subverso, de comunistas. A minha tese de doutoramento da PUC era sobre Propriedade.

    Trs temas sobre propriedade. Ela foi tida como tese de comunista, subversiva, etc. Alguns

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    professores tentaram at recusar a tese, que desmembrava a propriedade humana na linha de

    Maurier, propriedade privada e formas particulares de propriedade.

    P- O senhor pode falar sobre a importncia do Ncleo de Ao catlica e do nascimento da

    PUC?

    Nesse Ncleo de Ao catlica, tnhamos contato com D. Carlos, com autoridades de uma

    grande situao: o Almeida era o presidente da DIC, Liga dos Intelectuais Catlicos, uma

    coisa assim; tnhamos algum contato com D. Paulo, por meio de Dominicanos, Frei Rosrio

    Joffrin, que teve uma grande atuao aqui. Mas, no tinha a parte poltica, tanto que, quando

    eu entrei para a ao poltica, eu me desliguei da posio na Ao Catlica, para separar as

    experincias.

    A PUC nasceu, praticamente, desse contato do cardeal de So Paulo, D. Carlos Carmelo, com

    esse grupo, que se reunia, muitas vezes, no Palcio. Ns, uma vez por semana, ns reunamos

    l, tnhamos uma missa de manh cedo, tomvamos caf com ele, com D. Carlos Carmelo e a

    presena dos Dominicanos, principalmente, Frei Rosrio Joffrin, Romeu Detti tambm e

    outros...

    Da foi surgindo a ideia de se constituir uma Universidade Catlica. Numa dessas reunies, D.

    Carlos pediu que ns elaborssemos um esboo de estatuto, de estrutura jurdica. Ns vimos

    primeiro, que era preciso estabelecer uma Fundao que fosse entidade mantenedora da

    Universidade. Elaboramos todo o primeiro esboo de estatuto... Ainda devo ter, at comigo, o

    primeiro estatuto da Fundao.

    E, a primeira reunio que ns tivemos, foi um desses encontros, uma reunio noite, com D.

    Carlos l no Palcio. Ns fomos chamada Pizzaria Giordano na Av. Brigadeiro Luiz

    Antnio. E, depois de uma pizza, l, cerveja, chope, no verso... A pizza vinha numa bandeja

    de papelo, e, no verso, que ns comeamos... Havia vrios advogados presentes. Ns

    sabamos que, de acordo com a lei, precisaramos constituir pontos fundamentais;

    denominao, sede, fins, estatutos, afora o que se administra e representa... Todos os outros

    itens. E, fizemos ali, no papelo mesmo, uma indicao dos pontos fundamentais, e que foi,

    depois, datilografado. Ali, no tinha papel, ento, fomos colocando os pontos fundamentais

    no papelo.

    Ento, achvamos que devia ser Fundao So Paulo, e uma ideia que, alis, estava nos

    primeiros itens, quando se examinava os estatutos da Fundao So Paulo da PUC era fazer

    da Universidade de So Paulo... Nosso pensamento no era de que ela fosse uma

    Universidade Catlica, Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Ela deveria ter o

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    esprito desse humanismo cristo, mas deveria se