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INTRODUÇÃO
OBJETIVO
MATERIAIS E MÉTODOS
RESULTADOS
CONCLUSÃO
DISCUSSÃO
NECROSE ESOFÁGICA AGUDA (NEA) EM PACIENTES COM CÂNCER
Tatiana Bueno Santos, Fernanda L. Garcia, Gustavo Mello, Maria Ferreira, Simone Guaraldi, Denise Guimarães, Gilberto Mansur
Seção de Endoscopia Digestiva, Hospital do Câncer I, Instituto Nacional de Câncer (INCA), Rio de Janeiro / RJ.
A necrose esofágica aguda (esofagite necrotizante, esofagite pseudomembranosa ou “black esophagus”) é uma condição clínica incomum, com poucos relatos na literatura, geralmente envolvendo pacientes graves internados em terapia intensiva.
Relato dos casos de dez pacientes oncológicos criticamente enfermos, que evoluíram com quadro de NEA diagnosticada por endoscopia digestiva alta (EDA), no Hospital do Câncer I, do Instituto Nacional de Câncer.
Análise retrospectiva dos dados clínicos, endoscópicos, histológicos, terapêuticos e evolutivos (até o óbito ou alta hospitalar) dos pacientes com diagnóstico de NEA no INCA, de janeiro de 1999 a dezembro de 2008.
Exame endoscópico
Follow-upEDA
Caso
Sexo
Id
Doença de base
Co-morb
Condições associadas
Vent Mec
Indicação
da EDA
Esôfago
Achados associados
Patologia
Evolução pós-
diagnóstico
1
M
17
LMA
(recidiva pós-TMO)
Não
Sepsis
Não
Vômitos
Necrose circunferencial
enegrecida de toda a extensão
Gastrite erosiva
Não
Não
Óbito após 2 dias
2
M
55
PO neurocirúrgico
(Schwanoma vestibular direito)
HAS
Quadro hipertensivo;
Hematoma epidural
Sim
Hematêmese
Necrose circunferencial de
toda a extensão com
pseudomembranas
MW
Não
Idêntica
após 24h
Óbito após 4 dias
3 F 74
Ca cabeça de pâncreas
DM II
Sepsis; PO; desbridamento de celulite MID
Não
Passagem SNE
Necrose circunferencial enegrecida de
ETM+I
HH; UD;Compressão
duodenal extrínseca
Não Não
Óbito após 15 dias
4
F
85
PO RAP (Ca canal anal recidivado pós-
RXT)
HAS
Quadro hipertensivo;
AVE isquêmico;
Sepsis
Sim
Melena
Necrose circunferencial de
toda a extensão
HH; MW;
Pangastrite hemorrágica;
UG;
Duodenite erosiva
Não
Não
Óbito após 9 dias
5
F
44
PO ressecção sarcoma retro-
peritoneal (recidiva pós-RXT+QT)
HAS
Sarcomatose peritoneal
Não
Hematêmese
Necrose circunferencial de
toda a extensão com
pseudomembranas
HH; MW;
Lesâo submucosa gástrica;
Estase gastro-duodenal
Esofagite ulcerada
com material fibrino-
necrótico-leucocitário
Melhora evolutiva da
necrose após 6 dias
Óbito após 11 dias
6
M
64
Ca Reto
(PO tardio RAR + colostomia em alça +
cistectomia)
Não
Infecção urinária;
Suboclusão intestinal
Não
Melena
Necrose circunferencial do
terço distal
HH; Estase gastro-duodenal
Esofagite ulcerada
Melhora evolutiva da
necrose após 7 dias
Alta hospitalar
após 7 dias
7
F
49
PO exenteração pélvica
(Ca Reto recidivado pós- RXT+QT)
HAS
Sepsis
Não
Passagem SNE
Necrose circunferencial dos 3/4 inferiores com pseudomembranas
Gastroduodenite erosiva
moderada;
Estase gastro-duodenal
Não
Re-epitelização completa da
mucosa após 10 dias
Alta hospitalar
após 33 dias
8
M
56
Melanoma dorsal metastático
Não
Sepsis;
Metástases SNC
Não
Hematêmese
Necrose circunferencial dos
¾ inferiores
Metástases gastro-duodenais
de melanoma
Material fibrino-
leucocitário e necrótico
Não
Óbito após 4 dias
9
M
80
Ca próstata
Não
Sepsis
Não
Hematêmese
Necrose circunferencial dos
¾ inferiores
Barrett; Gastroduodenite
moderada
Material fibrino-
leucocitário e necrótico
Melhora evolutiva da
necrose após 6 dias
Alta hospitalar
após 11 dias
10
M
65
CEC de região glútea; Pós-
operatório de obstrução intestinal
HAS
Sepsis;
Peritonite fecal;
IRA
Sim
Hematêmese
Necrose circunferencial
enegrecida de toda a extensão
Sangramento de cavidade oral
Não
Idêntica após 24h
Óbito após 3 dias
Em nosso estudo, de 26.650 endoscopias digestivas altas realizadas no período, foram diagnosticados 10 casos de NEA (0,0004% dos casos). Na maioria dos casos, a indicação de EDA foi para avaliação de hemorragia digestiva alta. Todos apresentavam doença maligna como base associada à comorbidades e/ou complicações clínicas graves e evoluíram com o aspecto endoscópico típico da doença. Dos 10 pacientes, 4 realizaram biópsias (40%), sem complicações agudas (perfuração). Refletindo a gravidade dos casos, 7 evoluíram para óbito (70%) em até 15 dias (relacionados à doença de base) e apenas 3 (30%) obtiveram alta hospitalar (Tabela 1).
Tabela 1- Dados demográficos, clínicos, endoscópicos e anatomo-patológicos dos pacientes com necrose esofágica aguda (n=10)
Legenda: Id: idade; M: masculino; F: feminino; LMA: leucemia mielóide aguda; TMO: transplante de medula óssea; PO: pós-operatório; Ca: câncer; RAP: ressecção abdominoperineal; RAR: ressecção anterior de reto; RXT: radioterapia; QT: quimioterapia; CEC: carcinoma espinocelular; Co-morb: comorbidades; HAS: hipertensão arterial sistêmica; DM II: diabetes mellitus tipo II; MID: membro inferior direito; AVE: acidente vascular encefálico; SNC: sistema nervoso central; IRA: insuficiência renal aguda; Vent Mec: ventilação mecânica; SNE: sonda nasoenteral; ETM+I: esôfago torácico médio e inferior; MW: Mallory-Weiss; HH: hérnia de hiato; UD: úlcera doudenal; UG: úlcera gástrica.
A NEA é uma condição rara (0,01 a 0,2% de exames endoscópicos) e sua etiologia e fisiopatologia permanecem pouco compreendidas. O aspecto endoscópico típico é caracterizado por esofagite necrotizante circunferencial da metade inferior do esôfago, com coloração enegrecida terminando abruptamente na junção epitelial esofagogástrica. O exame histopatológico mostra material composto por exsudato fibrinoso, debris necróticos e células inflamatórias; não é identificada a membrana basal. Nota-se, ainda, ulceração epitelial completa, com inflamação aguda ou crônica e formação de tecido de granulação. É discutida a necessidade da realização de biópsias, principalmente tendo em vista o possível risco de perfuração.O tratamento é sintomático e o prognóstico reservado da doença não é relacionado à esofagite propriamente, mas sim à idade, condição geral, co-morbidades e gravidade da doença de base. Os casos que evoluem para cura apresentam um curso favorável, não sendo comum a sua recorrência, embora haja relatos de desenvolvimento de estenoses cicatriciais.
Necrose esofágica aguda é uma condição rara, de causa provavelmente multifatorial e fisiopatologia ainda pouco compreendida, possivelmente relacionada com isquemia esofágica associada a estados de hipoperfusão e doença crítica. A apresentação do quadro em pacientes com neoplasia possivelmente está associada com quadro clínico desfavorável.
Figura 1 - Esôfago distal. Necrose circunferencial da mucosa esofágica com coloração enegrecida (caso 1).
Figura 2 - Necrose esofágica com necrose circunferencial e pseudomembrana (caso 5).
Figura 3 - Necrose esofágica, mucosa com coloração enegrecida (caso 3).
Figura 4 - Esôfago. Mucosa com necrose circunferencial e enegrecida (caso 6)