movimentos periódicos: representação vetorial a experiência

15
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010 1 Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência mostra que uma das maneiras mais úteis de descrever o movimento harmônico simples é representando-o como uma projeção perpendicular de um ponto descrevendo um movimento circular uniforme sobre um dos diâmetros do círculo.

Upload: halien

Post on 08-Jan-2017

229 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

1

Movimentos Periódicos: representação vetorial

A experiência mostra que uma das maneiras mais úteis de descrever

o movimento harmônico simples é representando-o como uma

projeção perpendicular de um ponto descrevendo um movimento

circular uniforme sobre um dos diâmetros do círculo.

Page 2: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

2

Consideremos um ponto P descrevendo um movimento circular

uniforme no sentido anti-horário como na figura acima. Observe que

a projeção perpendicular do ponto P sobre o eixo horizontal Ox ou

sobre o eixo vertical Oy descreve um movimento harmônico

simples.

Vamos supor que o movimento circular uniforme do ponto P se dá

com velocidade angular ω. Vamos supor também que o movimento

circular uniforme teve início a partir de um ponto P0 cujo vetor OP0

faz um ângulo α0 com o eixo Ox (figura abaixo).

A projeção instantânea do ponto P sobre o eixo Ox é dada então por

Page 3: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

3

)(coscos)( 0αωθ +== tAAtx . (1)

Notem que esta equação é idêntica à que foi deduzida na aula 1

passada para descrever o movimento harmônico simples (equação

8).

A representação do movimento harmônico simples em termos do

movimento circular uniforme de um ponto P sobre um círculo de

raio A é chamada de representação em termos do vetor girante OP.

O círculo de raio A é chamado de círculo de referência.

A experiência também mostra que o uso de números complexos para

representar movimentos oscilatórios é muito útil, especialmente

quando combinada com a representação do vetor girante. Por isso,

vamos continuar esta aula fazendo uma revisão (ou introdução, para

aqueles que nunca viram) de números complexos.

Um número complexo pode ser representado algebricamente por

ibaz += , (2)

onde i é a chamada unidade imaginária

1−=i , (3)

ou seja,

i2 = –1.

Page 4: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

4

Um número complexo z também pode ser representado

geometricamente no plano x-y (veja a figura abaixo).

Quando se trata de representar números complexos, o plano x-y é

chamado de plano complexo. O eixo x é chamado de eixo real e o

eixo y é chamado de eixo imaginário.

O número complexo z = a + ib pode ser representado no plano

complexo como um vetor cuja projeção no eixo x é a e cuja projeção

no eixo y é b. Para passar da representação geométrica para a

algébrica, multiplica-se a projeção sobre o eixo y por i. Portanto, um

vetor de coordenadas (a, b) no plano x-y representa o número

complexo z = a + ib.

Page 5: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

5

Dizemos que a componente a do número complexo z é a parte real

de z e que a componente b é a parte imaginária de z:

zbza

ImRe

=

=.

Também dizemos que o ponto de coordenadas (a, b) no plano

complexo é a imagem do número complexo z = a + ib nesse plano.

A soma de dois números complexos z1 e z2 é definida como,

( ) ( ) ( ) ( ),21 dbicaidcibazz +++=+++=+ (4)

que pode ser representada geometricamente pela soma vetorial dos

vetores que representam esses dois números complexos no plano

complexo (veja a figura abaixo).

O complexo conjugado z* do número complexo z = a + ib é definido

como:

( ) ibaibaz −≡+= ** . (5)

Page 6: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

6

A imagem do complexo conjugado z* no plano complexo é simétrica

à imagem de z em relação ao eixo real (veja a figura abaixo).

Mostre como exercício que:

( )*21Re zzz +=

( ).21Im *zzi

z −=

O produto de dois números complexos é definido em termos da

propriedade distributiva da multiplicação:

( )( ) ( ) ( )bcadibdacidcibazz ++−=++=21. . (6)

O módulo z do número complexo z = a + ib é definido como,

Page 7: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

7

22 baz += , (7)

que pode ser escrito em termos do complexo conjugado z* como

(mostre como exercício):

zzz *= . (8)

O quociente de dois números complexos pode ser calculado

multiplicando-se o numerador e o denominador pelo complexo

conjugado do denominador:

( )( )( )( ) 2222 dc

adbcidcbdac

idcidcidciba

idciba

+−

+++

=−+−+

=++

. (9)

Uma das mais belas fórmulas da matemática é a chamada fórmula

de Euler, deduzida pelo grande matemático suíço Leonhard Euler

(1707-1783) por volta de 1740:

xixeix sencos += . (10)

Nas suas Lectures on Physics, o físico norte-americano Richard

Feynman (1918-1988) se referiu a esta fórmula como “nossa jóia” e

“uma das mais notáveis, quase surpreendente, fórmulas de toda a

matemática”. Baseado na fórmula de Euler se escreve a chamada

identidade de Euler,

01=+πie , (11)

Page 8: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

8

que é considerada por muitos como a maior equação de todos os

tempos, por envolver três das principais constantes matemáticas (i, π

e e) e os dois primeiros números (0 e 1).

A fórmula de Euler pode ser provada usando-se a expansão de uma

função em série de Taylor em torno da origem,

...6)0(

2)0()0()0()(

32

+ʹ́ʹ+ʹ́+ʹ+=xfxfxffxf . (12)

A expansão em série de Taylor em torno da origem para a função

exponencial ex é então (lembre-se da propriedade da derivada de ex:

dex/dx = ex):

...2462

1432

+++++=xxxxex

e a expansão de eix é:

eix =1+ ix +ix( )2

2+ix( )3

6+ix( )4

24+...⇒

eix =1+ ix − x2

2− i x

3

6+x4

24+... . (13)

Por outro lado, as expansões em série de Taylor em torno da origem

para cos x e sen x são:

...242

1cos42

++−=xxx (14)

Page 9: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

9

e

...1206

sen53

−+−=xxxx (15)

Observe que agrupando as partes real e imaginária da expansão de ex

podemos escrever,

eix = 1− x2

2+x4

24+...

⎝⎜

⎠⎟+ i x −

x3

6+x5

120+...

⎝⎜

⎠⎟ .

Comparando a expressão acima com as expansões em série de

Taylor para cos x e sen x, pode-se ver que os termos real e

imaginário são idênticos (até a ordem que se queira) às expansões

para o cosseno e o seno, respectivamente. Portanto:

eix = cos x + isenx .

A fórmula de Euler relaciona a função exponencial com funções

trigonométricas. Mostre como exercício que ela permite definir as

funções seno e cosseno como:

( ) ( )ixixix eeei

x Im21sen =−= −

(16)

( ) ( )ixixix eeex Re21cos =+= −

(17)

Page 10: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

10

Agora veremos como usar a fórmula de Euler para representar um

número complexo no plano complexo.

A figura abaixo mostra a imagem do número complexo z = x + iy.

Se passarmos da representação cartesiana (x, y) para a representação

em coordenadas polares (r, θ) teremos:

θθ

sencosryrx

=

=. (18)

E o número complexo z fica escrito como

( )θθθθ sencossencos irirriyxz +=+=+= .

Usando a fórmula de Euler, z pode ser escrito como: θirez = . (19)

Esta é a chamada forma trigonométrica do número complexo z.

Page 11: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

11

O termo 22 yxr += é chamado de módulo de z (r = |z|) e o

ângulo θ é chamado de argumento de z.

Um número complexo de módulo unitário (r = 1) é escrito como z =

eiθ e a sua imagem no plano complexo é um vetor com extremidade

no círculo unitário fazendo um ângulo igual a θ com o eixo x (veja a

figura abaixo).

Um número complexo de módulo unitário é chamado de fator de

fase.

Em termos da representação trigonométrica, o produto de dois

números complexos 111

θierz = e 222

θierz = é dado por:

( )( ) ( )2121212121.

θθθθ +== iii errererzz . (20)

Page 12: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

12

O módulo do produto é o produto dos módulos e o argumento do

produto é a soma dos argumentos.

Um caso particular de (20) é quando z1 é um fator de fase,

( ) ( )θααθθ +== iiii rereeze , (21)

ou seja, a multiplicação de um número complexo por um fator de

fase de argumento θ equivale a uma rotação de θ (no sentido anti-

horário0 na imagem do número complexo.

Na representação trigonométrica, o quociente de dois números

complexos é escrito como:

( )21

2

1

2

1

2

1

2

1 θθθ

θ−

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛== i

i

i

err

erer

zz

. (22)

O módulo do quociente é o quociente dos módulos e o argumento do

quociente é a diferença dos argumentos.

A função exponencial de um número complexo z = a + ib é definida

como:

( )bibeeee aibaiba sencos +==+ . (23)

Vamos agora combinar o que foi visto sobre números complexos

com o oscilador harmônico simples.

Page 13: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

13

Para começar, vamos considerar novamente a equação diferencial

para um MHS. Só que agora vamos supor que a variável que a

obedece é uma função complexa z(t):

)()( 22

2

tzdttzd

ω−= . (24)

Quando resolvemos esta equação para uma variável real x(t) na aula

1, mostramos, por substituição, que as funções funções

trigonométricas sen(ωt) e cos(ωt) são soluções dela. Vamos aqui

também resolver a equação (24) por substituição. Vamos propor que

a solução de (24) seja a seguinte função complexa, ticetz ω=)( , (25)

onde c é uma constante complexa.

Substitua (25) em (24) e mostre como exercício que se obtém uma

identidade. Ou seja, (25) é solução de (24).

Como a equação (24) é de 2a ordem, a sua solução é determinada a

menos de duas constantes reais arbitrárias. No caso da aula 1, essas

constantes eram a amplitude A e a fase inicial φ0. No caso da solução

(25) isso também é assim, pois a constante complexa c pode ser

escrita como, 0ϕiAec = , (26)

Page 14: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

14

com A e φ0 constantes.

Portanto, a solução geral da equação diferencial complexa (24) é ( )otitii AeeAetz ϕωωϕ +== 0)( . (27)

Esta é a solução de uma equação diferencial complexa. Isto

aparentemente nada tem a ver com física, pois as grandezas físicas

são todas reais. Notem, porém, que a parte real da solução (27) é

exatamente igual à solução da equação diferencial para o MHS real:

( ) )(cos)(Re 0 txtAtz =+= ϕω (28)

Isto nos sugere um método de resolver problemas envolvendo

oscilações: usar a representação complexa para resolver os

problemas e depois tomar a parte real das soluções como a solução

do problema físico real em questão.

A vantagem de se usar a representação complexa é que é mais fácil

trabalhar com exponenciais do que com senos e cossenos. Além

disso, a própria representação geométrica de um número complexo

Aeiθ corresponde a um vetor de módulo A formando um ângulo θ

com o eixo real, que é a representação do vetor girante para um

movimento oscilatório.

Page 15: Movimentos Periódicos: representação vetorial A experiência

5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 5 2010

15