movimento harmônico simples: exemplos (continuação)

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5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 4 1 Movimento Harmônico Simples: Exemplos (continuação) O Pêndulo Físico O chamado pêndulo físico é qualquer pêndulo real. Ele consiste de um corpo rígido (com qualquer forma) suspenso por um ponto O e que pode girar livremente (sem atrito) em torno desse ponto. Antes de estudarmos o pêndulo físico, é conveniente voltarmos ao pêndulo simples e analisa-lo usando o conceito de torque. Consideremos o diagrama de forças para o pêndulo simples e o sistema de coordenadas (r, θ, z) definido na figura abaixo, cujos versores são ( ˆ r , , ˆ k ).

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5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 4

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Movimento Harmônico Simples: Exemplos (continuação)

O Pêndulo Físico

O chamado pêndulo físico é qualquer pêndulo real. Ele consiste de

um corpo rígido (com qualquer forma) suspenso por um ponto O e

que pode girar livremente (sem atrito) em torno desse ponto.

Antes de estudarmos o pêndulo físico, é conveniente voltarmos ao

pêndulo simples e analisa-lo usando o conceito de torque.

Consideremos o diagrama de forças para o pêndulo simples e o

sistema de coordenadas (r, θ, z) definido na figura abaixo, cujos

versores são ( r̂ , , k̂ ).

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O torque em relação ao ponto de rotação (ponto pivô) O é dado por, !τO =!rO ,m ×m

!g . (1)

Escrevendo os vetores !rO ,m e m

!g em termos de suas componentes

no sistema ( r̂ , , k̂ ): !rO ,m = ℓr̂ (2)

e

m!g =mg cosθr̂ −mg sinθθ̂ . (3)

Substituindo (2) e (3) em (1): !τO = ℓr̂×mg cosθr̂ − sinθθ̂( ) ,

ou !τO = ℓmg r̂× cosθr̂ − sinθθ̂( )⎡

⎣⎤⎦ .

Usando a tabela abaixo (tente obter os valores da tabela usando a

regra do “determinante” para calcular o produto vetorial):

r̂× r̂ = 0; r̂×θ̂ = k̂; r̂× k̂ = −θ̂θ̂ × r̂ = −k̂; θ̂ ×θ̂ = 0; θ̂ × k̂ = r̂k̂ × r̂ = θ̂; k̂ ×θ̂ = −r̂; k̂ × k̂ = 0

,

obtemos: !τO = −ℓmg sinθk̂ . (4)

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O torque em relação ao pivô O tem componente apenas na direção z.

Quando θ > 0, o torque em relação a O aponta no sentido negativo

de z; quando θ < 0, o torque em relação a O aponta no sentido

positivo de z.

O momento de inércia do corpo pontual de massa m em relação ao

eixo que passa pelo pivô O é definido por (lembre de Física I):

IO =mℓ2 . (5)

Como o corpo de massa m está girando em torno de O, a sua

equação de movimento é:

τO = IOα , (6)

onde α = dω dt = d 2θ dt2 é a aceleração angular do corpo.

Podemos reescrever (6) usando (4), (5) e a definição de α:

−mgℓsinθ =mℓ2 d2θdt2 ,

ou

d 2θdt2

= −gℓsinθ . (7)

Esta é a equação de movimento para o pêndulo simples obtida na

aula passada (equação (4)).

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Portanto, o tratamento baseado no torque e na equação de

movimento rotacional é equivalente ao feito anteriormente, baseado

na segunda lei de Newton1.

Vamos agora aplicar a abordagem baseada no torque e na lei

rotacional de movimento ao caso do pêndulo físico.

A figura abaixo ilustra um pêndulo físico.

O centro de gravidade (CG) do corpo está situado a uma distância s

de O. Na posição de equilíbrio, quando o pêndulo está na vertical, o

ponto CG está localizado abaixo de O ao longo da linha vertical.

1 Tinha que ser, pois a equação de movimento rotacional é obtida a partir da segunda lei de Newton.

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Quando o corpo oscila, seu deslocamento em relação à vertical é

descrito pelo ângulo θ como indicado no desenho.

Vamos supor que a massa total do corpo é m e que o seu momento

de inércia em relação ao eixo que passa por O é I.

Quando o corpo está na posição indicada pelo desenho, o seu peso

provoca um torque restaurador em relação a O dado por

)sen( θτ mgs−= . (8)

O sinal negativo decorre do fato de que a direção positiva é a que se

afasta da vertical.

Esta equação pode ser obtida pelo mesmo método usado na dedução

da equação (4) para o torque do pêndulo simples. Basta usar !rO ,m = sr̂ e m

!g =mg cosθr̂ −mg sinθθ̂ .

A equação de movimento para o corpo é

2

2

dtdII θ

ατ == ,

ou seja,

θθ sen2

2

mgsdtdI −= ,

que rearranjando nos dá

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0sen2

2

=+ θθ

Imgs

dtd

. (9)

Note que esta equação é idêntica à equação de movimento para um

pêndulo simples (equação (10) da aula passada ou equação (7) desta

aula) se fizermos o comprimento do pêndulo simples ser igual a

msIl = . (10)

Na realidade, o pêndulo simples é um caso particular do pêndulo

físico em que toda a massa m está concentrada a uma distância l de

O. Neste caso, a distância s entre o CG deste sistema e o ponto de

suspensão O é igual a l e o momento de inércia do sistema em

relação a O é I = ml2.

O ponto do corpo que está a uma distância l de O está indicado por

C na figura. Como visto acima, se toda a massa do corpo estivesse

concentrada em C e ele estivesse ligado a O por um fio sem massa

teríamos um pêndulo simples equivalente, do ponto de vista

dinâmico, ao pêndulo físico. O ponto C é denominado de centro de

oscilação do pêndulo físico.

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A observação de que um pêndulo físico com toda a sua massa m

concentrada no seu centro de oscilação é equivalente a um pêndulo

simples foi feita por Huygens em seu tratado sobre o relógio de

pêndulo (ver aula passada).

No caso de pequenas oscilações, a equação de movimento para o

pêndulo físico torna-se

02

2

=+ θθ

Imgs

dtd

. (11)

Esta é a equação de um MHS com

Imgs

=ω . (12)

A frequência das oscilações é

Imgsf

π21

= (13)

e o período é

mgsIT π2= . (14)

Compare estas equações com as equações (7), (8) e (9) da Aula 3

para o pêndulo simples.

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A equação (14) nos sugere um método para determinar o momento

de inércia de um corpo de forma complicada. Vamos supor que seja

possível determinar o centro de gravidade do corpo, por exemplo,

por testes de equilíbrio. Conhecendo-se o CG do corpo, este é

colocado para fazer pequenas oscilações em torno de um eixo

passando por um ponto O.

Mede-se então o período T das oscilações de pequenas amplitudes e

a distância s entre o ponto O e o CG do corpo. Como também temos

a massa m do corpo, a única variável desconhecida em (14) é o

momento de inércia I em relação a O. O valor de I, portanto, pode

ser determinado por substituição direta dos valores das demais

variáveis em (14).

Líquido em Um Tubo em Forma de U

Um sistema físico com comportamento oscilatório similar ao de um

pêndulo é um líquido no interior de um tubo em forma de U. Seja

um líquido de densidade ρ no interior de um tubo em forma de U

como na figura abaixo.

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A seção reta do tubo é A e o comprimento total da coluna de líquido

é l. Portanto, a massa total de líquido é m = ρAl.

No equilíbrio, o nível do líquido é o mesmo nos dois lados do tubo,

que tomado como a altura de referência y = 0 (veja a figura acima).

Vamos considerar que a energia potencial do sistema é nula no

equilíbrio: U = 0 quando o nível do líquido é y = 0.

Vamos supor que a coluna de líquido é posta para oscilar no interior

do tubo. Vamos assumir que cada pedaço do líquido se move com a

mesma velocidade v = dy/dt.

Uma situação como a da figura, em que a altura do nível de líquido

baixa de y no lado esquerdo e aumenta de y no lado direito,

corresponde a uma situação imaginária em que um bloco de líquido

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de massa ρAy é levantado por uma altura y do lado esquerdo e

transportado rigidamente para o lado direito, sendo colocado sobre a

coluna neste lado. Como isto resulta na elevação de um bloco de

líquido de massa ρAy por uma altura y, a energia potencial do

sistema aumenta para 2.)( AgygyAyyU ρρ == .

Tomando a situação da figura como a do instante inicial, a coluna

líquida passa, a partir daí, a oscilar em torno da posição de equilíbrio

com velocidade v = dy/dt. A energia cinética da coluna é então 2

21

⎟⎠

⎞⎜⎝

⎛=dtdyAlK ρ .

Desprezando forças dissipativas, a energia mecânica total do líquido

se conserva. Ela é,

22

21 Agy

dtdyAlE ρρ +⎟⎠

⎞⎜⎝

⎛= . (8)

Comparando esta expressão com a da energia do pêndulo simples na

aproximação de pequenas oscilações,

( )222

21

21

θωθ lmdtldmE +⎟

⎞⎜⎝

⎛= ,

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vemos que elas são idênticas fazendo-se

2

21

ωρ mAg =

e

.mAl =ρ

Combinando estas duas equações, temos que

lg22 =ω . (9)

As oscilações de um líquido em um tubo em forma de U equivalem

às oscilações harmônicas de um pêndulo simples de comprimento

l/2. Este resultado foi deduzido pela primeira vez por Newton (1642-

1727) nos Principia.

Corpo Flutuando

Quando um corpo flutuando em um líquido é ligeiramente abaixado

ou levantado em relação à sua posição de equilíbrio, aparece uma

força restauradora igual ao aumento ou à diminuição do peso do

líquido deslocado pelo corpo (lei do empuxo de Arquimedes, que

será vista mais adiante neste curso). Por causa disso, o corpo passa a

oscilar em relação ao nível original.

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No caso em que a parte do corpo que oscila tem seção reta

constante, como na figura abaixo, as oscilações constituem um

MHS.

A figura mostra um densímetro afundado por uma altura y em

relação à sua posição de equilíbrio.

Vamos supor que a massa do densímetro é m, que a densidade do

líquido no qual ele está imerso é ρ e que a seção reta da parte do

densímetro que oscila é A.

Desta forma, quando o densímetro está afundado por y, o volume de

líquido deslocado é Ay e o seu peso é ρgAy. O densímetro sofre uma

força para cima (contrária ao seu deslocamento) dada por −ρgAy.

Uma situação análoga ocorre quando o densímetro está acima do

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líquido por uma altura y em relação à linha de flutuação de

equilíbrio.

A equação de movimento para o densímetro de massa m é então

gAydtydm ρ−=2

2

ou

02

2

=+ ymgA

dtyd ρ

. (10)

A solução desta equação é um MHS com

mgAρ

ω = , (11)

mgAf ρ

π21

= (12)

e

gAmTρ

π2= . (13)