mortalidade de criancas com doenca falciforme

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  • 7/23/2019 Mortalidade de Criancas Com Doenca Falciforme

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    Abstract

    Objective: To describe the deaths of children with sickle celldisease (SCD) in Minas Gerais, Brazil, and followed up at the FundaoHemominas.

    Methods: Cohort of children diagnosed by the Neonatal ScreeningProgram in Minas Gerais (March/1998 February/2005). Deaths wereidentied by searching for children who did not attend scheduledconsultations at hemocenters. Clinical and epidemiological data wereabstracted from death certicates, the newborn screening database,individual medical records, and from interviews with families.

    Results: During the period, 1,833,030 newborns were screened;1,396 had SCD (1:1,300). There were 78 deaths: 63 with SS genotype,12 with SC genotype, and three with S+thalassemia genotype. Fifty-sixchildren (71.8%) died before 2 years of age; 59 died in hospitals and 18at home or during transportation. Causes of death according to certicates(n = 78): infections, 38.5%; acute splenic sequestration, 16.6%; othercauses, 9%; did not receive medical care, 15.4%; and not identiedon certicates, 20.5%. According to interviews (n = 52), acute splenicsequestration was responsible for one third of deaths, in contrast with14% recorded on death certicates. Survival probabilities at 5y (SEM) for

    children with SS, SC, and S+thalassemia were 89.4 (1.4), 97.7 (0.7),and 94.7% (3.0), respectively (SS vs. SC, p < 0.0001).

    Conclusions:Even with a carefully controlled newborn screeningprogram, the probability of SS children dying was still found to be high.Causes not identied on death certicates may indicate difcultiesrecognizing SCD and its complications. Educational campaigns directedat health professionals and SCD patients families should be boosted inorder to decrease SCD mortality.

    J Pediatr (Rio J). 2010;86(4):279-284: Anemia, sickle cell, mortality,socioeconomic factors, health services.

    Resumo

    Objetivo:Caracterizar os bitos das crianas com doena falciforme(DF) triadas no estado de Minas Gerais e acompanhadas na FundaoHemominas.

    Mtodos: Coorte de crianas diagnosticadas pelo Programa deTriagem Neonatal de Minas Gerais (maro/1998 fevereiro/2005). Osbitos foram identicados pela busca ativa das crianas ausentes nasconsultas agendadas nos hemocentros. Dados clnicos e epidemiolgicosforam coletados dos documentos de bito, banco de dados da triagemneonatal, pronturios mdicos e em entrevistas com as famlias.

    Resultados: Foram triadas 1.833.030 crianas no perodo, sendo1.396 com DF (1:1.300). Ocorreram 78 bitos: 63 em crianas comgentipo SS, 12 em crianas com gentipo SC e trs em crianas comgentipo S/+talassemia. Cinquenta e seis crianas (71,8%) morreramantes dos 2 anos de idade; 59 morreram em hospitais e 18 no domiclio outrnsito. Causas de bito pelo atestado (n = 78): 38,5% infeco; 16,6%sequestro esplnico agudo; 9% outras causas; 15,4% sem assistnciamdica; e 20,5% indeterminada. Segundo as entrevistas (n = 52), osequestro esplnico foi responsvel por quase 1/3 dos bitos, contrastandocom a porcentagem de apenas 14% registrada nos atestados de bito.

    As probabilidades de sobrevida aos 5 anos (erro padro da mdia) paracrianas SS, SC e S+talassemia foram: 89,4 (1,4), 97,7 (0,7) e 94,7%(3,0), respectivamente (SS versusSC, p < 0,0001).

    Concluses:Mesmo em um programa de triagem neonatal comrigoroso controle do tratamento, a probabilidade de bito em crianascom gentipo SS ainda elevada. Os bitos com causa indeterminadaindicam diculdades no reconhecimento da DF e das suas complicaes.Esforos educativos dirigidos a prossionais da sade e familiares devemser incrementados para diminuir a mortalidade pela DF.

    J Pediatr (Rio J). 2010;86(4):279-284:Anemia falciforme, mortali-dade, fatores socioeconmicos, sistemas de sade.

    Mortality of children with sickle cell disease:a population study

    Mortalidade de crianas com doena falciforme: um estudo de base populacional

    Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes1, Jos Nlio Janurio2, Camila Blanco Cangussu3,

    Daniela Lino de Macedo3, Marcos Borato Viana4

    ARTIGOORIGINAL

    0021-7557/10/86-04/279

    Jornal de Pediatria

    Copyright 2010 by Sociedade Brasileira de Pediatria

    279

    1. Ncleo de Aes e Pesquisa em Apoio Diagnstico (NUPAD), Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG.2. NUPAD, Faculdade de Medicina, UFMG, Belo Horizonte, MG. Professor assistente, Departamento de Clnica Mdica, UFMG, Belo Horizonte, MG.3. NUPAD, Faculdade de Medicina, UFMG, Belo Horizonte, MG. Acadmica, Curso de Medicina, UFMG, Belo Horizonte, MG.4. NUPAD, Faculdade de Medicina, UFMG, Belo Horizonte, MG. Professor titular, Departamento de Pediatria, UFMG, Belo Horizonte, MG.

    Apoio:Ncleo de Aes e Pesquisa em Apoio Diagnstico (NUPAD), Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte,MG; Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) o ltimo autor bolsista 2 do rgo de fomento pesquisa; pesquisa financiadaparcialmente pelo CNPq atravs do edital MCT/CNPq/MS-SCTIE-DECIT n 026/20.

    No foram declarados conflitos de interesse associados publicao deste artigo.

    Como citar este artigo:Fernandes AP, Janurio JN, Cangussu CB, de Macedo DL, Viana MB. Mortality of children with sickle cell disease: a population study. JPediatr (Rio J). 2010;86(4):279-284.

    Artigo submetido em 28.12.09, aceito em 10.03.10.

    doi:10.2223/JPED.2005

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    Introduo

    A doena falciforme (DF) uma desordem gentica degrande importncia clnica e epidemiolgica cuja caractersticaprincipal a herana do gene da globina beta S (gene s).Este gene determina a presena da hemoglobina variante Snas hemcias. Os fenmenos vaso-oclusivos e a hemlisecrnica so os principais determinantes das manifestaes

    clnicas da DF. Apesar de a alterao principal estar restritaaos eritrcitos do sangue, trata-se de doena sistmica quepode acometer qualquer rgo1.

    No Brasil, a DF um importante problema de sadepblica. Estima-se que o nmero de indivduos com traofalciforme seja de 7.200.000, com prevalncia na populaogeral entre 2 e 8%2. Em Minas Gerais (MG) a incidncia dotrao falciforme de 3,3%, e a da DF de, aproximada-mente, 1:1.400 recm-nascidos triados, tendo como baseo Programa Estadual de Triagem Neonatal (PETN-MG), queimplantou a triagem para hemoglobinopatias em maro de1998. O PETN-MG abrange todos os municpios do estado, esua cobertura de 94% dos recm-nascidos vivos3.

    Embora a DF determine elevadas morbidade e morta-lidade, principalmente nos primeiros 5 anos de vida4-9, amortalidade das crianas com DF nos primeiros 10 anos devida tem diminudo10-14. Em 1970, a mediana de sobrevida,para cidados estadunidenses com a forma homozigtica(SS), era de 20 anos1-5. Aps a implantao dos programasde diagnstico neonatal, educao e ateno integral aopaciente, a criana SS passou a apresentar 85% de chancede sobrevida aos 20 anos4.

    Apesar de a maioria dos gentipos da DF determinar di-minuio da expectativa de vida, a anemia falciforme, estadode homozigose para hemoglobina S, representa o gentipo

    mais comum e a apresentao clnica mais grave da doena.Vrios estudos mostram maior incidncia de bitos e menorsobrevida entre pacientes com anemia falciforme4,9,16,17. Den-tre as principais causas de bito na primeira dcada de vidaesto as infeces e o sequestro esplnico agudo4,16-23.

    Este estudo teve como objetivo conhecer mais detalha-damente as causas e circunstncias dos bitos ocorridosem crianas com DF triadas pelo PETN-MG. A utilizao deuma coorte de base populacional indita no Brasil. A com-preenso dos diversos determinantes do evento bito podefavorecer o planejamento de polticas pblicas e outras aesque possam contribuir para reduzir a morbimortalidade emelhorar a qualidade de vida das pessoas com DF.

    Mtodos

    A populao estudada constituiu-se de crianas diagnosti-cadas com DF pelo PETN-MG, acompanhadas nos hemocentrosda Fundao Hemominas, que evoluram para bito no perodode 1 de maro de 1998 a 28 de fevereiro de 2005.

    O PETN-MG realiza a triagem para DF e outras hemoglo-binopatias desde maro de 1998. Todos os 853 municpios doestado esto cadastrados no programa, sendo a coberturadeste de 94% dos nascidos vivos. As amostras de sanguedos recm-nascidos so coletadas no quinto dia de vida em

    papel-ltro e encaminhadas ao laboratrio de triagem neo-

    natal do Ncleo de Aes e Pesquisa em Apoio Diagnstico(NUPAD) da Faculdade de Medicina da Universidade Federalde Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte (MG), que respondepela coordenao tcnica e operacional do programa.

    A informao do bito resulta da investigao do motivodo no comparecimento consulta agendada no hemocentro.As aes de busca ativa do NUPAD abrangem a totalidade dos

    pacientes triados com DF em acompanhamento na FundaoHemominas, no sendo necessrio, portanto, processo deamostragem. seguro armar que todos os bitos ocorridosno perodo do estudo foram contabilizados.

    Os dados foram extrados do banco de dados do PETN-MG, de documentos de bito, do banco de dados do Siste-ma nico de Sade (DATASUS) e do Instituto Brasileiro deGeograa e Estatstica (IBGE), de pronturios mdicos dosambulatrios da Fundao Hemominas e em entrevista comfamiliares e/ou cuidadores da criana. Dos 78 documentosde bito foram extrados os dados referentes s causas, datae local do bito.

    O banco de dados do NUPAD foi a fonte das informaessobre a localizao das famlias e avaliao da adeso aoprotocolo de acompanhamento, pois todas as consultas feitasnos hemocentros geram uma cpia do atendimento que remetida ao Setor de Controle e Tratamento do NUPAD. Oestudo, por ser retrospectivo, no incluiu coleta especcade dados para avaliar adeso a medidas prolticas contrainfeco (vacinas especiais e antibiticos).

    A entrevista foi realizada com o responsvel pela criana apartir de roteiro semiestruturado durante o ano de 2006 e apstranscorridos de 1 a 8 anos desde a ocorrncia do bito. Foinecessrio que a pesquisadora APPCF visitasse pessoalmente41 municpios, percorrendo cerca de 10 mil quilmetros.

    Apesar de muito esforo, 24 famlias no foram localizadas,principalmente aquelas nas quais o bito da criana haviaocorrido mais de 5 anos antes; duas famlias se recusarama participar da entrevista. Ela teve durao mediana de 25minutos e abordou quatro aspectos: 1) as circunstnciasrelacionadas ao evento bito; 2) o acompanhamento para DFe a ocorrncia de outros eventos agudos; 3) condio socio-econmica e cultural; e 4) impresses sobre as experinciasvividas com a criana com DF. A realizao da entrevista foicondicionada leitura e assinatura de um termo de consen-timento que abrangeu os objetivos, os procedimentos e ospossveis benefcios e custos oriundos do estudo.

    Os dados dos pronturios da Fundao Hemominas foram

    digitados em um banco de dados que utiliza o programa Accessda Microsoft, construdo especicamente para a pesquisa.

    Para a anlise estatstica, as comparaes das frequnciasentre variveis nominais foram feitas utilizando-se o teste dequi-quadrado, sem correo de continuidade, ou teste exatode Fisher, quando necessrio. As curvas de sobrevida forambaseadas no mtodo de Kaplan-Meier, e as comparaesentre curvas foram feitas pelo teste de logrank. Todos os 78bitos ocorridos, independentemente de relacionados ou no DF, foram considerados eventos adversos. As crianas vivasem 15/02/2005 (n = 1.318) foram censuradas nessa data.Consideraram-se signicativos os testes com probabilidade

    de erro alfa 0,05.

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    A pesquisa foi aprovada pelos Comits de tica em Pesquisada UFMG e da Fundao Hemominas e foi selecionada parananciamento pelo Conselho Nacional de DesenvolvimentoCientco e Tecnolgico pelo edital MCT/CNPq/MS-SCTIE-DECIT n 026/20.

    Resultados

    No perodo estudado, 1.833.030 recm-nascidos foramtriados pelo PETN-MG, e 1.396 crianas tiveram perl he-moglobnico compatvel com DF: 764 com gentipo SS ouS0-talassemia, 555 com hemoglobinopatia SC, 10 comhemoglobinopatia SD e 67 com S+talassemia (incidnciade 1:1.313 para todas as formas, 1:2.400 para SS/S0-ta-lassemia e 1:3.300 para SC).

    Em 7 anos, ocorreram 78 bitos. Desses, 41 ocorreramem crianas do gnero masculino (52%) e 37 em pacientesdo feminino (48%). A maioria das crianas que faleceram

    residia em rea urbana (78%) e em municpios de pequenoporte, com populao de at 50.000 habitantes (56,4%).

    A mediana da idade coleta do sangue para a triagemfoi de 9 dias, sendo que 75% das crianas foram triadas atos 18 dias de vida. A mediana de idade primeira consultano hemocentro foi de 2,1 meses. Trs crianas faleceramantes da realizao da primeira consulta no hemocentro, com19, 55 e 57 dias de vida. Em dois casos a causa do bito foisepticemia e em um caso foi indeterminada.

    A Figura 1 mostra a distribuio dos bitos segundo a faixaetria. A maioria dos bitos (71,8%) ocorreu em crianasde at 2 anos de idade. A mediana de idade ao bito foi de13,7 meses.

    De acordo com o perl hemoglobnico detectado na triagemneonatal, 63 bitos ocorreram em crianas SS/S0(80,8%),12 em SC (15,4%) e trs em S+talassemia (3,8%).

    Segundo a informao do documento de noticao dobito, houve prevalncia de bitos hospitalares (59); entre-tanto, ocorreram 15 bitos domiciliares, trs em trnsito eum na unidade bsica de sade.

    A infeco (incluindo pneumonia e septicemia) foi aprincipal causa mortis registrada no documento de bito,seguida pelo sequestro esplnico agudo. Foi considerada

    como desconhecida a causa de bito em cujo registro cons-tava sem assistncia mdica (Figura 2).

    Figura 1 - Distribuio por faixa etria dos bitos das 78 crianascom doena falciforme que faleceram no perodo demaro de 1998 a fevereiro de 2005 (Programa Estadualde Triagem Neonatal de Minas Gerais, PETN-MG)

    Figura 2 - Causas de bito das 78 crianas com doena falciformeque faleceram no perodo de maro de 1998 a feve-

    reiro de 2005 segundo as informaes do documentode bito (Programa Estadual de Triagem Neonatal deMinas Gerais, PETN-MG)

    Em relao s crianas das famlias entrevistadas (n = 52)ocorreram algumas discordncias entre as causas de bitodocumentadas e as relatadas ou sugeridas pela entrevista.O sequestro esplnico, por exemplo, foi a causa de sete dos52 bitos (13,5%) quando se considerou a informao dodocumento de bito, mas, quando foram considerados osdados da entrevista, o sequestro esplnico passou a responder

    por 16 dos 52 bitos (30,8%).

    A Figura 3 mostra as curvas de sobrevida das crianascom hemoglobinopatia SS/S0-talassemia, SC, SD e S+

    talassemia. A curva de sobrevida das crianas SS/S0-talassemia signicativamente inferior quela das crian-as SC (p < 0,0001). A curva de sobrevida das crianasSS/S0-talassemia no difere signicativamente daquelascorrespondentes s crianas S+talassemia e SD (p = 0,21e p = 0,36, respectivamente). Constatou-se, ainda, que nodecorrer dos primeiros 5 anos de vida, as crianas SS/S0-talassemia apresentaram maior queda na probabilidade desobrevida em comparao com as crianas SC e S+ talas-semia (Tabela 1).

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    Considerando o total de consultas agendadas nos hemo-centros para as 78 crianas que faleceram (580 consultas),houve 77,3% de comparecimento e 22,7% de no compa-recimento.

    De acordo com os dados apurados nas entrevistas(n = 52), 57,7% das crianas foram atendidas nas primeiras

    6 horas aps o incio dos sintomas relacionados ao eventoque determinou o bito, 71,2%, em at 24 horas e 17,3%faleceram sem receber assistncia mdica. O bito, nessegrupo, ocorreu nas primeiras 12 horas do incio dos sintomasem 55,8% dos casos e em 67,3%, nas primeiras 24 horas.Febre, dor, vmito e prostrao foram, pelo relato das fam-lias, os sintomas iniciais mais frequentemente relacionadosao evento bito. Os hospitais foram o primeiro servio desade procurado por 19 famlias (36,5%), seguidos pelas

    unidades bsicas de sade, procuradas por 12 (23%), e asunidades de pronto atendimento, por seis (11,5%). O usoregular da prolaxia com antibitico foi relatado por 43 famlias(82,7%), e o uso regular do cido flico, por 47 (90,4%). Ouso regular dos imunobiolgicos especiais foi relatado por 21famlias (40,4%). Quanto evoluo clnica anterior ao bito,65% das crianas j haviam sido internadas pelo menos uma

    vez, sendo que 19% foram internadas mais de trs vezes. Acrise lgica j tinha acontecido em 67,3% das crianas antesdo bito e o sequestro esplnico agudo j havia ocorrido em14 crianas (27%), sendo que em duas essa intercorrnciahavia acontecido mais de uma vez.

    Quanto situao socioeconmica das famlias en-trevistadas (n = 52), 58% das famlias tinham renda percapitamensal de at R$ 100,00 e, em 20% dos casos, deat R$ 50,00. O valor mnimo da renda per capitafoi 0 eo mximo foi de R$ 380,00. O valor do salrio-mnimo naocasio da pesquisa era de R$ 350,00. A mdia do nmerode pessoas por famlia foi de 5,6. Quanto escolaridade dospais, 76,8% das mes e 86,8% dos pais tinham o ensino

    fundamental incompleto, sendo que 13,5% das mes e 19%dos pais no eram alfabetizados.

    Discusso

    A casustica estudada no presente estudo reete a reali-dade global de sade das crianas mineiras com DF, porquea cobertura do PETN-MG atinge, em mdia, 94% de todosos recm-nascidos e 100% dos municpios do estado. Todosos bitos de crianas triadas com DF e em acompanhamentonos hemocentros foram informados, sendo que os casos

    representam a totalidade dos bitos ocorridos nesse grupode crianas no perodo, o que congura um estudo com basepopulacional.

    Neste estudo, assim como em outros, no houve diferenasignicativa na incidncia dos bitos entre os gneros na faixaetria estudada4,23. A maior incidncia de bitos (80,8%)entre os pacientes com Hb SS, que representa o gentipomais comum e a apresentao clnica mais grave da doena,tambm foi constatada em outros trabalhos4,9,16,17.

    Figura 3 - Curvas de probabilidade estimada de sobrevida de1.396 crianas diagnosticadas entre maro de 1998e fevereiro de 2005 conforme o tipo de hemoglobi-nopatia (Programa Estadual de Triagem Neonatal deMinas Gerais, PETN-MG). As curvas de sobrevida dascrianas SS/S0-talassemia e SC so signicativamentediferentes (mtodo de Kaplan-Meier, teste de logrank,p < 0,0001)

    Probabilidade estimada de sobrevida

    Tipo de hemoglobinopatia (n diagnosticadas) 1 ano 3 anos 5 anos

    SS ou S0-talassemia (n = 764) 96,6 (0,7*) 91,6 (1,1*) 89,4 (1,4*)

    SC (n = 555) 98,7 (0,5*) 98,0 (0,6*) 97,7 (0,7*)

    S+ talassemia (n = 67) 96,8 (2,2*) 94,7 (3,0*) 94,7 (3,0*)

    SD (n = 10) 100,0 100,0 100,0

    Todos (n = 1.396) 97,5 (0,4*) 94,3 (0,7*) 93,1 (0,8*)

    Tabela 1 - Probabilidades estimadas de sobrevida (% EP) de 1.396 crianas diagnosticadas entre maro de 1998 e fevereiro de 2005conforme o tipo de hemoglobinopatia e o tempo de sobrevida (1, 3 e 5 anos)

    * Erro padro da mdia

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    A distribuio por faixa etria em que ocorreu o bitoevidenciou uma concentrao nos primeiros 2 anos de vida,semelhante ao relatado por outros autores4,16,19,21. Segundopublicao do Centers for Disease Control and Prevention(CDC), com dados do acompanhamento das crianas comDF provenientes dos programas de triagem neonatal detrs estados estadunidenses, a mediana da idade ao bito

    foi de 22 meses24

    . Aelevada mortalidade nos primeiros 5anos de vida poderia ser explicada pela maior incidncia deeventos agudos graves na infncia. Trs crianas faleceramcom menos de 2 meses de idade, antes da realizao daprimeira consulta, por causas que, provavelmente, no serelacionaram ao diagnstico de base.

    Embora prevalecessem os bitos hospitalares, impor-tante ressaltar que quase 1/4 deles ocorreu no domiclio ouem trnsito para uma unidade de sade. Alguns fatores,como residncia em rea rural, diculdade de transporte ata unidade de sade e diculdade da famlia na identicaode situaes de risco para a criana, parecem ter contribudopara esse quadro. Um estudo realizado na Inglaterra relatou

    sete bitos domiciliares em um grupo de 11 pacientes comDF e idade abaixo de 20 anos. Os autores enfatizaram quea agilidade no reconhecimento do evento agudo e a buscapor atendimento mdico devem contrapor-se rapidez daevoluo dos sinais e sintomas graves da doena25.

    A infeco foi a principal causa de bito no presente estudo,seguida pelo sequestro esplnico agudo. Dados semelhantesforam publicados por outros autores4,17-21,26,27. Entretanto, elevado o nmero de bitos com causa indeterminada edesconhecida. O bito por causa indeterminada pode sugerircerta diculdade da equipe de sade em reconhecer a DFe suas complicaes agudas, j que a maior parte desses

    registros foi proveniente de bitos hospitalares. A causa debito desconhecida se relacionou, em sua maioria, aos bitossem assistncia mdica. A comparao entre os dados dosdocumentos de bito e os das 52 entrevistas evidencioudiscordncias, principalmente em relao identicao dosequestro esplnico agudo como causa do bito. interes-sante destacar a aparente diculdade no reconhecimento dosequestro esplnico pelas equipes de sade, pois se trata deum dos principais eventos agudos graves da DF na infncia,cuja histria e apresentao clnica so muito evidentes26.

    A anlise da curva de sobrevida mostrou que, nosprimeiros 5 anos de vida, as crianas SS/S0-talassemiaapresentaram maior queda na probabilidade de sobrevida

    em comparao com as crianas SC. A falta de signicnciaestatstica na comparao com os grupos S+ talassemia eSD provavelmente devida ao nmero reduzido de indivduosnessas duas categorias.

    A taxa geral de mortalidade para menores de 5 anos emMinas Gerais foi de 30,4 por mil no ano de 200028, o que,descontada a taxa de mortalidade neonatal precoce, resultanuma estimativa de 18 por 1.000 para efeito de comparaocom a probabilidade estimada de sobrevida aos 5 anos nopresente estudo. Para as crianas SS, essa estimativa foi de106 por 1.000 (10,6%), ou seja, cerca de seis vezes supe-rior do estado. A curva de sobrevida das 310 crianas SSque faziam parte do estudo de coorte na Jamaica mostrou

    mortalidade de 6% no primeiro ano de vida5. A estimativa debito aos 6 anos de idade para crianas SS/S0-talassemiana coorte de Dallas foi de 5%29. Ressalve-se, entretanto, quea rea abrangida se restringiu ao nordeste do Texas e que aincluso no estudo s ocorreu aps o comparecimento parauma primeira consulta no Comprehensive Sicke Cell Center(mediana de 4,2 meses) e no aps o diagnstico labora-

    torial do recm-nascido (sensibilidade prxima a 100%), oque, evidentemente, subestima o clculo da probabilidadede bito na populao real.

    O atendimento mdico, na maioria dos casos, ocorreunas primeiras 6 horas do incio dos sintomas. No houve,portanto, grande atraso na busca pelo atendimento. As uni-dades bsicas de sade foram responsveis por 23% dessesatendimentos, o que pode ser explicado pelo grande nmerode crianas residindo em municpios de pequeno porte. A altaadeso prolaxia com antibiticos deve ser considerada comceticismo, pois estudo especco realizado no Hemocentrode MG evidenciou que os nveis de adeso so bem maisbaixos que esse valor30. Pode-se concluir que as principais

    diculdades encontradas que poderiam ter contribudo parao bito estariam relacionadas ao atendimento em si, ou seja, capacitao da equipe de sade para o atendimento aoseventos agudos da DF e aos recursos disponveis na unidadede sade procurada para as aes necessrias. Outro fatorque deve ser considerado a rapidez da evoluo de deter-minados quadros clnicos. A reduzida escolaridade dos pais ea baixa renda familiar constituram entraves adicionais.

    A principal limitao do estudo foi seu carter retrospec-tivo, pois o protocolo de acompanhamento clnico utilizadopossua nalidades de assistncia e no de pesquisa. A au-sncia de entrevistas em 1/3 dos casos decorreu tambm

    do fato de se tratar de uma coorte retrospectiva, pois alocalizao das famlias dicultada com o passar dos anos.Como a nalidade principal das entrevistas era conhecer comoocorreram os bitos, acrescentando ao estudo um carterqualitativo mais renado e humano do que a simples inspe-o dos atestados e registros mdicos, consideramos que aausncia de 26 entrevistas em 78 no comprometeu osobjetivos almejados.

    Diante dos resultados deste estudo, percebe-se que naDF o fator social se associa fortemente ao determinante bio-lgico, contribuindo de maneira decisiva para o aumento damorbidade e mortalidade da doena. Assim, a problemticada DF no se limita apenas a questes tcnicas, mas , tam-

    bm, uma questo poltica e social. O programa de atenointegral pessoa com DF, do Ministrio da Sade, representauma meta a ser conquistada pelos pacientes, familiares eprossionais envolvidos com o objetivo de melhorar a atualcondio de vida e sade dessas pessoas.

    Conclui-se que, mesmo em um programa de triagemneonatal com rigoroso controle do tratamento, a probabi-lidade de bito aos 5 anos em crianas SS nos 7 primeirosanos do PETN-MG foi bem maior que a mortalidade geral.Os bitos com causa indeterminada indicam diculdades noreconhecimento da DF e suas complicaes. Esforos edu-cativos dirigidos a prossionais de sade e familiares devemser incrementados para diminuir a mortalidade e morbidade

    Mortalidade por doena falciforme - Fernandes AP et al.

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    284 Jornal de Pediatria - Vol. 86, N 4, 2010

    Correspondncia:Marcos Borato VianaFaculdade de Medicina, Departamento de PediatriaUniversidade Federal de Minas GeraisAv. Alfredo Balena, 190/267CEP 30130-100 - Belo Horizonte, MGTel.: (31) 3409.9772Fax: (31) 3409.9770E-mail: [email protected]

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    causadas pela DF. A capacitao das Unidades Bsicas deSade deve ser priorizada, pois intervenes simples, comoa triagem neonatal, o uso da penicilina proltica, as imu-nizaes e as prticas educativas, tm grande impacto nasade pblica. Muitos bitos seriam evitados pela educaoe melhora das condies sociais, econmicas e culturais dasfamlias que possuem crianas com DF.

    Agradecimentos

    A todas as famlias que, apesar do sofrimento que en-volve a perda de uma criana, dispuseram-se a contar o queaconteceu poca do bito de seu lho.

    Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientco eTecnolgico (CNPq) que, pelo edital MCT/CNPq/MS-SCTIE-DECIT n 026/20, nanciou este projeto.

    Ao NUPAD-UFMG, em especial aos membros do Setor deControle e Tratamento, pela dedicao prossional e suporteao estudo.

    Mortalidade por doena falciforme - Fernandes AP et al.

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