monografia lorena otero 08-13-2013 97

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Maria Lorena Otero Hernández Participação para o Desenvolvimento Sustentável Caso de estudo: Uma Investigação Apreciativa com Pescadores da Lagoa Rodrigo de Freitas Monografia Monografia apresentada ao Programa de Pós-graduação em Sustentabilidade da PUC Rio como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Sustentabilidade aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada. Orientador: Luís Carlos Soares Madeira Domingues. Assessora externa: Tamar Bajgielman. Rio de Janeiro, 12 de agosto de 2013

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  • Maria Lorena Otero Hernndez

    Participao para o Desenvolvimento Sustentvel Caso de estudo: Uma Investigao Apreciativa com Pescadores da

    Lagoa Rodrigo de Freitas

    Monografia

    Monografia apresentada ao Programa de Ps-graduao em Sustentabilidade da PUC Rio como requisito parcial para obteno do ttulo de Especialista em Sustentabilidade aprovada pela Comisso Examinadora abaixo assinada.

    Orientador: Lus Carlos Soares Madeira Domingues. Assessora externa: Tamar Bajgielman.

    Rio de Janeiro, 12 de agosto de 2013

  • Agradecimentos

    Esta Monografia no teria sido possvel sem a participao da Colnia de

    Pescadores da Lagoa Rodrigo de Freitas. Especialmente agradeo a Joo

    Rodrigues, Katya, Reginaldo, Orlando Marins Filho, Wellington Andareli Dutna,

    Antonio Claudio M. Paiva, Pedro Marins, Walter Marins, Saturnino E. Riberino,

    Orivan Batista, Paulo Marins, Josemar Santana, Alexandre De Oliveira, Gilson

    Campos e a sua amiga e antiga colaboradora Tamar Bajgielman.

    Ao meu pai e minha me, irmos, professores, amigos e namorado.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Oito degraus da escada da participao ................................... 17

    Figura 2 Ilustrao do Ciclo das 4D da autora. ....................................... 35

    Figura 3 Elementos do Planejamento. .................................................... 38

    Figura 4 Anlise de histrias de sucesso. ............................................... 62

    Figura 5 As 6 perguntas bsicas do planejamento. ................................ 64

    Figura 6 Problemtica Principal .............................................................. 93

    Figura 7 Problemtica Colateral ............................................................. 93

    Figura 8 Quadro de Viso....................................................................... 94

    Figura 9 Objetivos .................................................................................. 94

    Figura 10 Oportunidade de Design ......................................................... 95

    Figura 11 Objetivos do Projeto Passeios de Barco ................................. 95

    Figura 12 Matriz de Parcerias ................................................................. 96

    Figura 13 Proposta de Barcos. Tradies ............................................... 96

    Figura 14 Proposta Barcos. Histria ....................................................... 97

    Figura 15 Proposta Barcos. Ambiental ................................................... 97

  • SUMRIO

    INTRODUO ...................................................................................................................... 5

    OBJETIVO GERAL ................................................................................................................. 7

    1. MARCO TERICO ................................................................................................... 7

    O QUE A SUSTENTABILIDADE. ............................................................................................... 7

    SUSTENTABILIDADE E PARTICIPAO. ..................................................................................... 10

    OS PESCADORES, A SUSTENTABILIDADE E A PARTICIPAO. ........................................................ 19

    MTODOS PARTICIPATIVOS .................................................................................................. 25

    A INVESTIGAO APRECIATIVA. ............................................................................................ 30

    1.1.1 Como Funciona a Investigao Apreciativa.................................................. 32

    1.1.2 Filosofia ........................................................................................................ 39

    1.1.3 Adaptao e vantagens da Investigao Apreciativa em comunidades

    locais. Caso Myrada no sul da ndia........................................................................................ 41

    2 USO DA INVESTIGAO APRECIATIVA COM OS PESCADORES DA LAGOA RODRIGO DE

    FREITAS. .................................................................................................................................... 44

    2.1 PREPARAO DA INVESTIGAO APRECIATIVA. .................................................................. 44

    1.1.4 Reunio de Apresentao ............................................................................. 45

    1.1.5 Escolha dos tpicos positivos e preparao do guia de entrevista individual.

    51

    1.1.6 Descoberta ................................................................................................... 56

    1.1.7 Sonho ............................................................................................................ 61

    1.1.8 Planejamento ............................................................................................... 63

    1.1.9 Futuro ........................................................................................................... 64

    CONCLUSES E DESDOBRAMENTOS. ........................................................................... 65

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................... 73

    APNDICE A GUIA DE ENTREVISTA DE DESCOBERTA ................................................. 77

    APNDICE B AGENDA DE ENCONTRO SONHO E PLANEJAMENTO .............................. 83

    APNDICE C MODELO DE ENTREVISTA DE AVALIAO ............................................. 86

    APNDICE D TABELA DE RESULTADOS DE VOTAO E PRIORIZAO. ...................... 88

    ANEXO A AVALIAO DA TAMAR BAJGIELMAN ....................................................... 91

    ANEXO B RESULTADOS DA OFICINA DE DESIGN ........................................................ 93

  • 5

    Introduo

    A iniciativa de nos aproximar da Colnia de pescadores Z13 na beira da

    Lagoa Rodrigo de Freitas na altura do Parque dos Patins do Rio de Janeiro

    partiu de um exerccio acadmico proposto durante o Curso de Sustentabilidade

    no Projeto da PUC-Rio. O trabalho visava a aproximao de um contexto real de

    estudo para desenvolver um projeto de design a partir dos princpios de

    sustentabilidade trabalhados no curso. O projeto poderia ter como resultado uma

    proposta urbanstica e arquitetnica, um produto o um servio.

    Foi realizada uma Oficina de Design Participativa com as estudantes

    Flvia Maia, Ayara Mendo e Carol Previatello, cujo resultado foi uma proposta de

    passeios de barco em volta da Lagoa com o objetivo de fortalecer o papel da

    Colnia na regio, j que os passeios teriam um contedo ambiental e histrico

    reconhecendo os conhecimentos tradicionais do grupo e seus quase 100 anos

    de existncia.

    A experincia participativa que permitiu a proximidade com a Colnia

    incentivou a possibilidade de desdobramento do projeto como trabalho final de

    curso e aumentou o interesse em mtodos participativos para o trabalho com

    comunidades visando a sustentabilidade.

    A abordagem da Investigao Apreciativa se mostrou adequada para o

    caso com os pescadores por focar no sistema organizacional, nas suas foras e

    capacidades para atingir objetivos comuns, considerando que os desafios da

    Colnia ante o projeto turstico estavam mais no campo da gesto e na

    capacidade para gerar estratgias de viabilizao da iniciativa.

    A deciso de usar o mtodo com os pescadores surgiu das

    potencialidades que oferecia para gerar ao a partir das prprias possibilidades

    do grupo com uma viso positiva, apreciativa e compartilhada da realidade. O

    processo em si gerava valorizao do grupo e reconhecimento das suas foras e

    capacidades.

    O presente trabalho pretende apresentar a experincia de uso da

    ferramenta com os pescadores, os acertos e dificuldades visando uma avaliao

    da Investigao Apreciativa.

    O primer captulo do texto tem como objetivo fornecer uma base terica

    que permita contar com categorias de anlise e qualificao para avaliar o

    trabalho participativo experimentado com os pescadores de Lagoa. Para tal fim

  • 6

    se apresentaro as vises do conceito de Participao que ajudem no

    esclarecimento do seu significado e relevncia no contexto oficial do

    Desenvolvimento Sustentvel a partir de uma comparao analtica do que se

    fala em Participao na Declarao da Rio+20 O Futuro que Queremos e a

    Agenda 21 da Rio 92 com noes de Participao Pblica de Nunes, Santos e

    Arnstein. Pretendo com isso, mapear conceitos, eixos de analise principais de

    aspectos da participao em relao ao conceito hegemnico de

    sustentabilidade.

    Outro objetivo do captulo consiste em apresentar a Investigao

    Apreciativa e contextualizar o mtodo entre outros da sua ndole. Apresentarei

    algumas crticas e adaptaes que o mtodo teve para ser usado com

    comunidades rurais no sul da ndia como referncia para seu uso com a Colnia.

    No Segundo Captulo se pretende apresentar o trabalho de campo

    desenvolvido com os pescadores, a forma como foi aplicada a Investigao

    Apreciativa, as dificuldades e acertos no processo com um olhar reflexivo e

    autocrtico com o intuito de fornecer uma anlise das potencialidades do uso do

    mtodo para o desenvolvimento sustentvel.

    Analisaremos o processo e os resultados da experincia no marco da

    importncia e significao que tem as dinmicas participativas para a construo

    da sustentabilidade e identificando o que a Investigao Apreciativa aporta

    especialmente ao assunto.

  • 7

    Objetivo Geral

    Testar a relevncia da Investigao Apreciativa (IA) para o

    desenvolvimento sustentvel--- ou seja, verificar em que medida a IA gera um

    potencial para solues sustentveis --- atravs de um estudo de caso com a

    colnia de Pescadores da Lagoa Rodrigo de Freitas.

    Objetivos Especficos

    Fornecer comunidade de pescadores um mtodo de planejamento

    participativo, para promover o desenvolvimento sustentveis.

    Avaliar a eficcia da IA como uma metodologia para apoiar o planejamento

    de projetos sustentveis com organizaes locais.

    Documentar e compartilhar as realizaes do grupo de modo que a

    abordagem encontre maior aceitao e aplicao no planejamento

    participativo para o desenvolvimento sustentvel de organizaes locais.

    1. Marco Terico

    O que a Sustentabilidade.

    A viso hegemnica a respeito da sustentabilidade vem avanando nas

    Conferencias Internacionais sobre o Meio Ambiente, reunida pela ultima vez no

    Rio de Janeiro no ano 2012, conhecido como Rio +20. Como resultado

    apresentou um documento intitulado O futuro que queremos. um documento

    poltico, de 53 pginas, acordado por 188 pases, que dita o caminho para a

    cooperao internacional sobre desenvolvimento sustentvel, sendo assim a

    abordagem hegemnica global no assunto.

    O Futuro que Queremos tem a sua origem no documento de nome similar,

    Nosso Futuro Comum, tambm conhecido como Relatrio Brundtland.

    Representa um dos primeiros esforos globais para se compor uma agenda

    global para a mudana de paradigma no modelo de desenvolvimento humano.

    Viajamos pelo mundo durante quase trs anos. Ouvindo as pessoas. Em

    audincias pblicas especiais organizadas pela Comisso, ouvimos lderes

    governamentais, cientistas e especialistas, ouvimos grupos de cidados

    envolvidos em vrias questes ligadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento,

  • 8

    e ouvimos milhares de pessoas agricultores, favelados, jovens, - industriais e

    povos indgenas e tribais. (Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e

    Desenvolvimento, 1991)

    A Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMD)

    apelou Assembleia Geral das Naes Unidas para que aps as devidas

    consideraes, transformasse o relatrio num Programa das Naes Unidas

    para o Desenvolvimento Sustentvel, visando convocao de uma conferncia

    internacional pra analisar os progressos obtidos e promover os acordos

    complementares necessrios ao estabelecimento de pontos de referncia e

    manuteno do progresso humano.

    O termo Desenvolvimento Sustentvel foi apresentado oficialmente ao

    mundo nesse relatrio no ano 1987, como um conceito poltico amplo para o

    progresso econmico e social, visando acordos entre as naes na Conferncia

    das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento que se

    aproximava, a Rio 92.

    O desenvolvimento sustentvel aquele que atende s necessidades do

    presente sem comprometer a possibilidade de as geraes futuras atenderem a

    suas prprias necessidades.

    Ele contm dois conceitos chave:

    o conceito de necessidades, sobretudo as necessidades

    essenciais dos pobres do mundo que devem receber a mxima

    prioridade;

    a noo das limitaes que o estgio da tecnologia e da

    organizao social impe ao meio ambiente, impedindo-o de

    atender s necessidades presentes e futuras.

    Portanto, ao se definirem os objetivos do desenvolvimento econmico e

    social, preciso levar em conta sua sustentabilidade em todos os pases

    desenvolvidos ou em desenvolvimento, com economia de mercado ou de

    planejamento central. Haver muitas interpretaes, mas todas elas tero

    caractersticas comuns e devem derivar de um consenso quanto ao conceito

    bsico de desenvolvimento sustentvel e quanto a uma srie de estratgias

    necessrias para sua consecuo.

    Vemos a possibilidade de uma nova era de crescimento econmico, que

    tem de se apoiar em prticas que conservem e expandam a base de recursos

  • 9

    ambientais. E acreditamos que tal crescimento absolutamente essencial para

    mitigar a grande pobreza que se vem identificando na maior parte do mundo em

    desenvolvimento. (CMMD,1991)

    Em seu sentido mais amplo, a estratgia do desenvolvimento

    sustentvel visa promover a harmonia entre os seres humano e

    entre a humanidade e a natureza. No contexto especfico das

    crises do desenvolvimento e do meio ambiente surgidas nos anos

    80, a busca do desenvolvimento sustentvel requer: (CMMD,

    1991:71)um sistema poltico que assegure a efetiva participao

    dos cidados no processo decisrio;

    um sistema econmico capaz de gerar excedentes e know-how tcnico

    em bases confiveis e constantes;

    um sistema social que possa resolver as tenses causadas por um

    desenvolvimento no equilibrado;

    um sistema de produo que respeite a obrigao de preservar a base

    ecolgica do desenvolvimento;

    um sistema tecnolgico que busque constantemente novas solues;

    um sistema internacional que estimule padres sustentveis de comrcio

    e financiamento;

    um sistema administrativo flexvel e capaz de autocorrigir-se.

    A verso hegemnica do Desenvolvimento Sustentvel procura conciliar o

    crescimento econmico e a preservao dos recursos naturais, apostando por

    uma opo conservadora da economia, na qual, o prprio crescimento

    econmico acompanhado do progresso tecnolgico encontrar as formas de

    explorar os recursos naturais de forma racionalizada, conservando e distribuindo

    de forma mais igualitria os recursos naturais para as geraes presentes e

    futuras.

    H sempre o risco que o crescimento econmico prejudique o meio ambiente, uma vez que ele aumenta a presso sobre os recursos ambientais. Mas os planejadores que se orientam pelo conceito de desenvolvimento sustentvel tero de trabalhar para garantir que as economias em crescimento permaneam firmemente ligadas a suas razes ecolgicas e que essas razes sejam protegidas e nutridas para que possam dar apoio ao crescimento a longo prazo. (CMMAD,1991:44)

  • 10

    Existe um aquecido debate internacional1 que considera a opo do

    crescimento econmico e o atual sistema baseado na crescente produo de

    bens de consumo ser insustentvel e irreconcilivel com a ideia de

    racionalizao e preservao dos recursos para as geraes futuras. O relatrio

    Brundtland se presentou como caminho no meio do debate porque incluiu a

    noo de limites do crescimento2 e a noo de justia intergeraes. Dessa

    forma, se alerta sobre os perigos do crescimento econmico e padres de

    consumo para os desenvolvidos e ao mesmo tempo se expe a necessidade de

    crescimento para os pases mais pobres para atingirem suas necessidades

    bsicas, com o desafio de achar modelos de crescimento que no destruam o

    meio ambiente garantindo assim as necessidades das geraes futuras.

    Outra noo importante do relatrio Brundtland a inseparabilidade do

    meio ambiente do ser humano, ou seja, no se pode falar de natureza sem falar

    de sociedade. O Desenvolvimento Sustentvel une a preocupao pela

    capacidade de suporte dos sistemas naturais com os desafios sociais

    enfrentados pela humanidade num trip da seguinte forma: justia social,

    preservao da natureza e viso sistmica do desenvolvimento.

    Meio ambiente e desenvolvimento no constituem desafios separados; esto inevitavelmente interligados (...) Eles fazem parte de um sistema complexo de causa e efeito. Os problemas ambientais e econmicos ligam-se a vrios fatores sociais e polticos (...) o desgaste do meio ambiente e o desenvolvimento desigual podem aumentar as tenses sociais. Pode-se argumentar que a distribuio de poder e influncia na sociedade esto no mago da maioria dos desafios do meio ambiente e do desenvolvimento. Por isso as novas abordagens tm de incluir programas de desenvolvimento social, principalmente para melhorar a posio das mulheres na sociedade, proteger os grupos vulnerveis e promover a participao local no processo decisrio. (CMMAD, 1991:41)

    Sustentabilidade e Participao.

    A participao da sociedade civil um tema transversal ao desenvolvimento

    sustentvel. Ele aparece em todos os documentos oficiais, desde a Conferncia

    de Estocolmo em 1972 at a Rio+20 em 2012. Declarao aps declarao, vem

    sendo reiterado, verificado e ampliado a partir do reconhecimento de novas

    identidades e grupos sociais e com o reconhecimento da necessidade de

    1 Vide Georgecou, Daly e Da Veiga.

    2 A noo de limites ao crescimento foi mostrada ao mundo no livro Limits to growth, publicado no

    ano 1972 com uma recente atualizao em 2005. O livro argumentou que o consumo desenfreado e crescimento econmico em nosso planeta finito estava levando a Terra em direo a superao de sua capacidade de carga, seguido pelo desastre.

  • 11

    estimular novas formas de participao alm das tradicionais. Insiste no reforo

    da democracia, a boa governana e o Estado de Direito como fatores essenciais

    para o desenvolvimento sustentvel, assim como a procura de consenso,

    cooperao e alianas em todas as escalas, desde a local at a internacional.

    Reconhece os governos como os principais responsveis e a importncia da

    participao ampliada de toda a sociedade civil como uma oportunidade de

    solidariedade e unio para a consecuo do desenvolvimento sustentvel.

    No quarto captulo da declarao da Conferencia das Naes Unidas sobre o

    Desenvolvimento Sustentvel, O futuro que queremos, intitulado Quadro

    Institucional Para o Desenvolvimento Sustentvel, identificamos aspectos

    especficos da participao pblica na tomada de decises e os conceitos

    associados ele: atores, escalas, informao e mecanismos se configuram

    como eixos de anlise e cooperao, aliana, viso comum, transparncia,

    consenso, fluxo e inovao so os conceitos principais que qualificam esses

    eixos.

    A noo de atores no processo de tomada de deciso chave para entender

    a viso de participao para o desenvolvimento sustentvel. Segundo a

    Declarao, os atores se organizam de forma mais geral em governantes e

    governados, com um papel central das Naes Unidas e das instituies de

    financiamento internacional e os bancos multilaterais de desenvolvimento para

    garantir a mobilizao de recursos para o desenvolvimento sustentvel. Os

    governos, tanto suas instituies legislativas e judicirias, so os primeiros

    responsveis pelo desenvolvimento sustentvel. Os governados ou sociedade

    civil uma massa de pessoas classificada em grandes grupos chamadas

    consulta e a participao ativa: mulheres, crianas e jovens, povos indgenas,

    organizaes no governamentais, autoridades locais, trabalhadores e

    sindicatos, empresas e setores de atividades, a comunidade cientfica e

    tecnolgica e os agricultores, pescadores, criadores, silvicultores bem como

    outras partes interessadas, incluindo as comunidades locais, os grupos de

    voluntrios e as fundaes, os migrantes, as famlias, os idosos e as pessoas

    com deficincia.

    13. Reconhecemos como fundamental para o desenvolvimento sustentvel as oportunidades dos povos em serem atores de suas vidas e de seu futuro, de participarem das tomadas de decises e de expressarem suas preocupaes. (Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel, 2012:4)

    Todos os atores so chamados a criar alianas entre eles, a trabalharem

    juntos e de forma cooperativa para a consecuo da sustentabilidade o que

  • 12

    precisa a determinao de uma viso comum de futuro entre eles seguindo os

    parmetros base dos acordos internacionais. As Naes Unidas se compromete

    a se aproximar desses grandes grupos, reconhecendo seu papel para atingir os

    objetivos sustentveis.

    Ressaltamos que o desenvolvimento sustentvel exige aes concretas e

    urgentes. Ele s pode ser alcanado com uma ampla aliana de pessoas,

    governos, sociedade civil e setor privado, todos trabalhando juntos para garantir

    o futuro que queremos para as geraes presentes e futuras. (Conferncia das

    Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel, 2012:4)

    Esse mesmo esprito j estava plasmado 20 anos atrs no Princpio 27 da

    Declarao do Rio Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento tambm conhecida

    como a ECO 92:

    Os Estados e os povos iro cooperar de boa f e imbudos de um esprito

    de parceria para a realizao dos princpios consubstanciados nesta Declarao,

    e para o desenvolvimento progressivo do direito internacional no campo do

    desenvolvimento sustentvel.

    O segundo eixo estruturante, a escala, nos ajuda a entender a distribuio ou

    hierarquia desses atores e o lugar onde se espera ou se quer incentivar a

    participao deles. Encontramos as escalas local, regional, nacional,

    subnacional e internacional. O princpio 10 da Rio 92 nos apresenta um

    panorama da ideia de escala,

    Princpio 10 A melhor maneira de tratar as questes ambientais assegurar a participao, no nvel apropriado, de todos os cidados interessados. No nvel nacional, cada indivduo ter acesso adequado s informaes relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades pblicas, inclusive informaes acerca de materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisrios (...)

    Segundo a Declarao da Rio+20,

    (...) resolvemos trabalhar de uma forma mais estreita com os grandes grupos e outros interessados e incentiv-los a participar ativamente, conforme o caso, em processos que contribuam com as decises envolvendo as polticas e programas de desenvolvimento sustentvel, seu planejamento e implementao, em todos os nveis.

    3

    3 Idem. Pag. 9

  • 13

    Para o nvel internacional, existe a Assembleia Geral, o Conselho Econmico

    e Social e um Foro de Alto Nvel Poltico o qual mobiliza e apresenta orientao

    e recomendaes para o desenvolvimento sustentvel mobilizando os lderes

    polticos de alto nvel, para definir as linhas de ao e identificar as aes

    especficas assim como promover a transparncia e a aplicao atravs de um

    maior reforo do papel consultivo e participativo de grandes grupos e outros

    intervenientes relevantes no nvel internacional, a fim de melhor fazer uso de

    seus conhecimentos, mantendo o carcter intergovernamental das discusses.

    O terceiro eixo corresponde informao. A participao associada ao

    acesso informao que facilitar a tomada de decises, dando nfase ao fluxo

    de informaes entre os governados e governantes, procurando a transparncia

    dos processos em todas as escalas e a capacitao e conscientizao a partir

    da troca de informaes relevantes e sobre casos de sucesso. importante aqui

    ressaltar que o fluxo de informaes no considerado como participao ativa,

    mas essencial para tal fim. O fluxo de informaes se espera em vrios

    sentidos, dos governantes para governados e governados para governantes e

    entre os grandes grupos de forma a compartilhar know how, e tambm incentivar

    a transferncia tecnolgica e conhecimento cientfico tcnico dos pases

    desenvolvidos para os pases em desenvolvimento, procurando uma

    centralizao e padronizao de dados.

    (...) Reconhecemos que uma maior participao da sociedade civil supe, entre outros fatores, um melhor acesso informao, a capacitao e um ambiente propcio. Reconhecemos que as tecnologias da informao e comunicao (TICs) facilitam o fluxo de informaes entre governantes governados.

    4

    (...) instamos essas instituies a priorizar o desenvolvimento sustentvel, especialmente atravs da capacitao mais eficiente e eficaz, do desenvolvimento e da implementao de acordos e articulaes regionais convenientes, e atravs da troca de informaes, melhores prticas e resultados empricos apreendidos.

    A cincia e a tcnica tem um papel primordial de prover as informaes

    relevantes para uma melhor tomada de decises. Deve se capacitar a sociedade

    no nvel local e principalmente nos pases em desenvolvimento para gerar dados

    e lidar com informaes de forma a padronizar e conversar com a cincia

    4 Idem. Pag. 22

  • 14

    incluindo os conhecimentos tradicionais. Neste aspecto, a Agenda 21 especifica

    que5,

    40.11. Os pases devem com a cooperao de organizaes internacionais, estabelecer mecanismos de apoio para oferecer s comunidades locais e aos usurios de recursos a informao e os conhecimentos tcnico-cientficos de que necessitam para gerenciar seu meio ambiente e recursos de forma sustentvel, aplicando os conhecimentos e as abordagens tradicionais e indgenas, quando apropriado. (Agenda 21, 1995:467)

    O quarto eixo de anlise, mecanismos da participao para a

    sustentabilidade, busca tentar responder a pergunta, de como pode ser

    alcanada a participao de todos os grandes grupos em todas e em cada

    escala? Segundo o documento, em primeira instncia consiste no reforo do

    quadro institucional, ou seja, fazendo uso dos mecanismos institucionais

    existentes de cada escala, os quais so primordialmente de carter

    representativo e de carter judicial no caso de reparao de danos ambientais.

    76. Reconhecemos que uma governana efetiva em nvel local, subnacional, nacional, regional e global que represente as vozes e os interesses de todos fundamental para a promoo do desenvolvimento sustentvel. O fortalecimento e a reforma do quadro institucional no devem ser um fim, mas um meio para alcanar o desenvolvimento sustentvel. (Agenda 21, 1995:15) 99. Encorajamos aes nos nveis regional, nacional, subnacional e local para promover o acesso informao, a participao pblica no processo decisrio e o acesso justia em questes ambientais, se necessrio. (Agenda 21, 1995:21)

    O quadro institucional no seu papel principal de representatividade das vozes

    e os interesses de todos, ou seja, no seu papel de garantir e ampliar a

    democracia, considerado como um meio e no como um fim da

    sustentabilidade, ou seja, que a democracia instrumental e no um fim em si

    mesmo.

    O documento insiste de forma transversal sobre a participao dos grandes

    grupos na determinao de polticas e atuao no planejamento e

    implementao do desenvolvimento sustentvel, mas no clarifica mecanismos

    especficos dentro do quadro institucional, que permitiro a participao desses

    grandes grupos na tomada de decises, alm das formas tradicionais de

    representatividade (governana). Porm, o documento considera necessria a

    5 O ltimo captulo do documento, o nmero 40, Informaes Para Tomada de Decises, inteiramente dedicado a este assunto a partir de duas reas: Reduo das diferenas em matria de dados e a melhoria da disponibilidade da informao.

  • 15

    inovao em matria de mecanismos para a participao, especificamente no

    que concerne dimenso ambiental:

    Garantir a participao ativa de todos os interessados, recorrendo s melhores prticas e modelos estabelecidos pelas instituies multilaterais e explorando novos mecanismos para promover a transparncia e a participao efetiva da sociedade civil. (Agenda 21, 1995:20)

    A Agenda 21 ainda mais especfica em quanto ao tema da inovao na

    participao nos assuntos especficos ao meio ambiente,

    23.2. Um dos pr-requisitos fundamentais para alcanar o desenvolvimento sustentvel a ampla participao da opinio pblica na tomada de decises. (...) Ademais, no contexto mais especfico do meio ambiente e do desenvolvimento, surgiu a necessidade de novas formas de participao. Isso inclui a necessidade de indivduos, grupos e organizaes de participar em procedimentos de avaliao do impacto ambiental e de conhecer e participar das decises, particularmente daquelas que possam vir a afetar as comunidades nas quais vivem e trabalham. Indivduos, grupos e organizaes devem ter acesso informao pertinente ao meio ambiente e desenvolvimento detida pelas autoridades nacionais, inclusive informaes sobre produtos e atividades que tm ou possam ter um impacto significativo sobre o meio ambiente, assim como informaes sobre medidas de proteo ambiental. (Agenda 21, 1995:361)

    Arnstein e Nunes

    Frente a diviso de atores da Declarao da Rio+20 em governados e

    governantes, Sherry Arnstein6 divide os atores em dois grandes grupos: os sem-

    nada e os poderosos. Mas na verdade segundo ela, nem os sem- nada nem os

    poderosos constituem blocos homogneos. Cada grupo engloba uma grande

    gama de pontos de vista diferentes, divergncias significativas, interesses

    encobertos que competem entre si e divises em subgrupos. Desde esse ponto

    de vista, ela define a participao cidad como um sinnimo para poder cidado.

    Participao a redistribuio de poder que permite aos cidados sem-nada,

    atualmente excludos dos processos polticos e econmicos, a serem ativamente

    includos no futuro e poder promover reformas sociais significativas que lhes

    permitam compartilhar dos benefcios da sociedade envolvente.

    6 Sociloga Norte americana. O artigo foi escrito no ano 1968 baseado em exemplos de trs

    programas sociais do Governo Federal dos Estados Unidos: o programa de renovao urbana, o programa de combate pobreza e o programa cidades-modelo. Foi escrito quando trabalhava como Diretora de Estudos Comunitrios do instituto no governamental de pesquisa The Commons. Faleceu em 1997.

  • 16

    Ela ilustra atravs de estudos de caso que a participao sem redistribuio

    de poder permite aqueles que tm poder de deciso argumentar que todos os

    lados foram ouvidos, mas beneficiar apenas a alguns, enfatizando que existe

    uma diferena fundamental entre passar por uma participao vazia e dispor do

    poder real para influenciar as decises finais. A participao vazia mantm o

    status quo.

    De forma similar, o socilogo portugus Arriscado Nunes considera que a

    qualidade crtica e transformadora da participao pblica est vinculada a uma

    definio clara do lugar ou da posio de onde se fala e a partir da qual se atua.

    Na perspectiva de uma filosofia poltica crtica, essa posio dever ser a dos

    silenciados, oprimidos, excludos.

    Desde essa perspectiva, Nunes diferencia dois procedimentos participativos:

    os hegemnicos, e os contra-hegemnicos. A primeira forma est associada

    governao e regulao e organizada para confirmar ou legitimar modos

    hegemnicos de conhecimento e autoridade poltica. Nestes casos, estamos em

    geral perante iniciativas de instituies pblicas ou de grupos que protagonizam

    formas hegemnicas de conhecimento, com poder para definir agendas, os

    critrios de seleo dos participantes, as formas aceitveis de interveno e as

    competncias e conhecimentos considerados como relevantes, a utilizao dos

    resultados dos exerccios de participao nas tomadas de deciso. O segundo

    tipo de procedimentos participativos, os contra-hegemnicos, esto associados

    emancipao e a um horizonte de libertao. Esto marcados pela luta, pela

    controvrsia, criando um espao para que todas as posies sobre um tema em

    discusso possam ter voz. Estes sero mais inclusivos, incorporando os

    cidados nos diferentes passos da sua realizao, desde a elaborao da

    agenda at definio das questes de ordem processual, das formas de

    expresso e das linguagens admitidas, at ampliao do leque de

    conhecimento, de competncias e de experincias consideradas relevantes.

    Segundo o autor, desde esta perspectiva e ampliando assim a viso de

    Arnstein- se alarga a experincia da participao cidad fazendo parte de um

    processo mais amplo, no qual formas institucionais de interveno podem se

    articular com mobilizaes ou aes coletivas. O objetivo poder ser o de

    colocar na agenda poltica os problemas em discusso e a obrigar a seu

    reconhecimento como problemas pblicos, e no s a influenciar decises como

    considera Airnstein.

    A importncia conferida pelo autor a estas formas de experincias alargadas

    de participao a sua possvel contribuio emergncia de novas formas de

  • 17

    esfera pblica7, que sero espaos de dilogo, de confrontao democrtica de

    posies e de deliberao, capazes de reconhecer e de mobilizar diferentes

    repertrios de linguagens, de recursos expressivos, de modos de conhecimento,

    de narrativas e registros de experincias, de competncias e recursos

    mobilizveis para a ao coletiva.

    O formato das conferncias de consenso tende, assim, muitas vezes, a

    reproduzir a diviso entre peritos e profanos. A fase final do processo, que

    inclui a discusso pblica com um novo painel de especialistas e a elaborao

    de um documento de posio sobre o tema da conferncia, a ser entregue s

    instituies que iro tomar decises sobre as questes em debate, culmina,

    assim, num processo que susceptvel de deixar pelo caminho as posies

    sobre o tema consideradas como radicais. Estas, contudo, so frequentemente

    aquelas que expressam de maneira mais clara e aberta os problemas de maior

    relevncia para a sade pblica, a segurana alimentar ou o ambiente. 8

    Arnstein faz um aporte importante discusso da participao no nvel local.

    A autora cria oito degraus para medir a participao segundo o maior ou menor

    grau de capacitao e influncia sobre as decises, principalmente do cidado

    sem-nada. O degrau no depende diretamente do tipo de ferramenta o

    mecanismo de participao usado. O que interessa aqui o resultado,

    pragmtico.

    Figura 1 Oito degraus da escada da participao

    8 Controle Cidado Nveis de poder cidado

    7 Delegao de Poder Nveis de poder cidado

    6 Parceria Nveis de poder cidado

    5 Pacificao Nveis de concesso mnima de poder

    4 Consulta Nveis de concesso mnima de poder

    3 Informao Nveis de concesso mnima de poder

    2 Terapia No-participao

    1 Manipulao No-participao

    Segundo a autora, a escada constitui uma simplificao, mas ela ajuda a

    ilustrar que existem graus bastante diferentes e conhecer esta graduao

    7 Termo que Nunes confere a Boaventura de Sousa Santos.

    8

  • 18

    possibilita cortar os exageros retricos e entender tanto a crescente demanda

    por participao dos sem-nada, como o leque completo de respostas confusas

    por parte dos poderosos. Os ningum destas arenas esto tentando se tornar

    algum com poder suficiente para tornar suas organizaes mais adequadas

    s suas opinies, aspiraes e demandas.

    Numa participao real, h distribuio do poder, o que se traduz em

    benefcios reais, materiais e imateriais como consequncia do processo de

    participao efetivo. A participao influi nas decises para o beneficio das

    comunidades, melhorando sua qualidade de vida.

    Nesta percepo, a participao considerada como distinta dos momentos

    de mobilizao e ao coletivas explicadas acima por Nunes. Airnstein centra

    sua escada na deliberao. Segundo Nunes, os momentos de demonstrao e

    de irrupo no espao pblico, em muitos casos, obriga a uma redefinio dos

    atores e identidades que tem voz e visibilidade e a uma abertura de novos

    espaos de debates e de deliberao orientados para a transformao das

    situaes que geram sofrimento, desigualdade, injustia ou excluso.

    O incentivo a novas e tradicionais formas de participao na Declarao da

    Rio+20 no coloca de forma direta a relao entre as assimetrias de poder

    claramente identificadas por Nunes e Airnstein, e as assimetrias econmicas e

    ambientais. O Futuro que Queremos, recalca a inseparabilidade das trs

    dimenses do desenvolvimento sustentvel, e coloca a participao como meio

    essencial mas no como sustentabilidade em si.

    Se a falta de participao uma das causas da insustentabilidade, o seu

    incentivo no deveria ser um fim e no s um meio instrumental? O Relatrio

    Brundtland, foi uma base de discusso, mas ele guardou independncia dos

    consensos globais. Nele, a sua autora clarifica:

    Muitos dos problemas de destruio de recursos e do desgaste do meio ambiente resultam de disparidades no poder econmico e poltico. Uma indstria pode trabalhar com nveis inaceitveis de poluio do ar e da gua porque as pessoas prejudicadas so pobres e no tm condies de reclamar. Pode-se destruir uma floresta pela derrubada excessiva porque as pessoas nela vivem ou no tm alternativa ou so em geral menos influentes que os negociantes de madeira. (Nosso Futuro Comum, 1991:50)

    Mudar a realidade ambientalmente indesejada passa pela capacidade dos

    grupos prejudicados de influenciarem as decises ou de inclurem assuntos

    desconsiderados at o momento na agenda poltica.

    Para a Declarao da Rio+20, a participao se apresenta como instrumento

    necessrio de envolvimento da humanidade para atingir objetivos comuns e

  • 19

    criao de consenso e no como forma de incluso em si e a necessria

    distribuio do poder como forma de diminuir as disparidades na distribuio dos

    recursos.

    Considero este fator um ponto principal de divergncia entre O Futuro que

    Queremos e as vises de Airnstein e Nunes. Para os socilogos, a participao

    esta situada como um assunto de conflito de poderes, de atores divididos entre

    quem detm o poder e toma as decises e de quem carece dele. Seja dentro

    dos mecanismos tradicionais e institucionais analisados por Airnstein ou dentro

    dos mecanismos de experimentao de Nunes, os atores esto em conflito e

    nem sempre ser possvel um consenso, mas sim uma srie de momentos tanto

    de controvrsia, denncia, crtica e luta como de avanos e acordos. Os dois

    tipos de momentos so indissociveis.

    Os processos de libertao e os processos de democratizao parecem

    partilhar um elemento em comum: a percepo da possibilidade da inovao

    entendida como participao ampliada de atores sociais de diversos tipos em

    processo de tomada de deciso. Em geral, estes processos implicam a incluso

    de temticas at ento ignoradas pelo sistema poltico, a redefinio de

    identidades e pertencimentos e o aumento de participao, nomeadamente ao

    nvel local. (Santos e Avritzar, 2002)

    Os Pescadores, a Sustentabilidade e a Participao.

    Os Pescadores de Subsistncia do mundo so mencionados nas

    Declaraes internacionais, em dois momentos principais: fazendo parte dos

    grandes grupos e no relativo a mares e oceanos. Os grupos de pescadores de

    pequena escala so includos dentro do grupo de agricultores na Agenda 21, no

    captulo 32. Neste documento h o reconhecimento de que uma parte

    significativa da populao rural depende primariamente da pequena escala,

    orientada para a subsistncia e baseado no trabalho da famlia a qual tem

    limitado acesso aos recursos, tecnologia e mdios alternativos de produo e

    subsistncia. Em consequncia, diz o texto, exploram em excesso os recursos

    naturais, situao que pode ser superada com a combinao da autoajuda e

    incentivos governamentais,

    A chave para o sucesso da implementao de programas est na motivao e nas atitudes de cada agricultor

    9 e nas polticas governamentais que

    9 O termo agricultura na Agenda 21 inclui a pesca e a explorao de recursos florestais.

  • 20

    proporcionem incentivos aos agricultores para que gerenciem seus recursos de maneira suficiente e sustentvel. (Agenda 21,1992:399)

    Reconhecidos como grupos vulnerveis pela incerteza econmica, jurdica e

    institucional para investir nas suas terras e em outros recursos, esse captulo da

    Agenda considera como condio chave, a descentralizao das tomadas de

    deciso, entregando-as a organizaes locais e comunitrias. (Agenda 21,

    1992:400). Esta viso contrasta com as opes de participao e tomada de

    deciso propostos para as mesmas comunidades na mesma Agenda no captulo

    17 sobre oceanos e mares, na qual os programas de gerenciamento, proteo,

    uso sustentvel, anlise de incertezas e fortalecimento da cooperao,

    planejada e organizada nas escalas nacional e internacional, visando

    centralizao dessas funes. Os interesses das comunidades de pescadores

    nos diferentes programas sero considerados por parte das instituies

    tomadoras de decises a travs da sua consulta e representatividade nas

    escalas local e nacional. Na escala internacional se deve assegurar que os seus

    interesses sejam levados em conta, em especial seu direito subsistncia, mas

    no destacado nenhum mecanismo de participao nesse nvel,

    17.6 Cada Estado costeiro deve considerar a possibilidade de estabelecer ou quando for necessrio, fortalecer- mecanismos de coordenao adequados (por exemplo organismos altamente qualificados para o planejamento de polticas) para o gerenciamento integrado e o desenvolvimento sustentvel das zonas costeiras e marinhas e dos respectivos recursos naturais, tanto no plano local como nacional. Tais mecanismos devem incluir consultas, conforme apropriado, aos setores acadmico e privado, s organizaes no-governamentais, s comunidades locais, aos grupos usurios dos recursos e aos populaes indgenas. (Agenda 21,1992:233)

    Os pescadores artesanais tem um papel mais especfico no programa sobre

    Uso Sustentvel e Conservao dos Recursos Marinhos Vivos sob Jurisdio

    Nacional, possivelmente porque nele a pesca encontra problemas cada vez mais

    graves o que representa maiores ameaas para a subsistncia das

    comunidades. O excesso de pesca local, as incurses no autorizadas de frotas

    estrangeiras, a degradao dos ecossistemas, a supercapitalizao e o tamanho

    exagerado das frotas, a subestimao da coleta, a utilizao de equipamento de

    captura insuficientemente seletivo, bancos de dados pouco confiveis e uma

    competio crescente entre a pesca artesanal e a pesca em grande escala, bem

    como entre a pesca e outros tipos de atividade, so os problemas destacados

    desta atividade. (Agenda 21, 1992:249). Os mecanismos de participao das

    comunidades locais previstos para programa so a representao e

    reconhecimento de direitos,

  • 21

    17.81 Os Estados (pases) costeiros devem apoiar a sustentabilidade dos pequenos empreendimentos de pesca artesanal. Para tanto devem, conforme apropriado: (a) integrar ao planejamento das zonas marinhas e costeiras o desenvolvimento

    dos pequenos empreendimentos de pesca artesanal, levando em conta os interesses dos pescadores, dos trabalhadores de empreendimentos pesqueiros em pequena escala, das mulheres das comunidades locais e das populaes indgenas e, conforme apropriado, estimulando a representao desses grupos;

    (b) reconhecer os direitos dos pescadores em pequena escala (...) inclusive seus direitos utilizao e proteo de seus habitats sobre uma base sustentvel: 17.82 Os Estados costeiros devem assegurar que, na negociao e implementao dos acordos internacionais sobre desenvolvimento ou conservao dos recursos marinhos vivos, os interesses das comunidades locais sejam levados em conta, em especial seu direito a subsistncia. (Agenda 21,1992:251)

    No eixo correspondente a informao, prevista a capacitao em

    gerenciamento integrado de desenvolvimento sustentvel das zonas costeiras e

    marinhas, o qual inclui gerenciadores baseados na comunidade e a incluso dos

    conhecimentos tradicionais aos sistemas de gerenciamento. Se pretende

    assistncia tcnica e financeira para organizar, manter, intercambiar e

    aperfeioar os conhecimentos tradicionais sobre recursos marinhos vivos e

    tcnicas pesqueiras e melhorar os conhecimentos acerca dos ecossistemas

    marinhos. necessrio promover o intercmbio de dados cientficos e

    tradicionais e assegurar sua disponibilidade para os responsveis pela

    determinao de polticas. buscada a considerao dos conhecimentos

    ecolgicos tradicionais dentro dos currculos de ensino e campanhas de

    conscientizao. (Agenda 21,1992:235,251,254,256)

    Podemos sintetizar que no contexto das Declaraes Internacionais, o

    desenvolvimento sustentvel dos pescadores artesanais significa manuteno

    da subsistncia e do direito a posse e explorao controlada do seu habitat, o

    que reflete sua posio de vulnerabilidade dentro do panorama dos recursos

    martimos. As comunidades esto associadas a contextos de pobreza e

    desvantagem ante outros grupos que fazem uso dos mesmos ecossistemas em

    concorrncia por um recurso cada vez mais escasso. A condio de

    desvantagem, se da tambm na capacidade de organizao politica que gere

    uma representatividade capaz de ter voz na hora de garantir, por exemplo,

  • 22

    recursos financeiros para o desenvolvimento sustentvel10. O que garante que

    os interesses das comunidades de subsistncia sero levadas em conta na

    escala regional ou nacional e ainda na internacional? Num cenrio de disputa

    por recursos escassos, quem vai defender os interesses dos pescadores

    artesanais?

    Os pescadores da Lagoa Rodrigo de Freitas so representados pela cmara

    municipal. Mas quem controla atravs do processo representativo? Os projetos

    ambientais que se apresentam como sustentveis para a Lagoa- despoluio da

    gua, controle de esgoto, melhora da troca de gua com o mar- no incluram

    uma consulta a Colnia ou a suas lideranas. Ainda o projeto de melhora de

    troca de gua entre o mar e a lagoa, alm de no ter sido consultado, representa

    uma ameaa direta para a pesca porque no garante a entrada do alevino do

    peixe do mar para a lagoa. Em que medida pode-se dizer que o sistema de

    democracia representativa falou por esta comunidade? Como sabem os

    representantes o que os representados precisam?

    Desde o ponto de vista de Arnstein, solicitar a opinio das comunidades,

    assim como informa-los, pode ser um passo legtimo rumo participao. Mas

    se a consulta no estiver integrada com outras formas de participao, este

    degrau da escada continua sendo uma vergonha na medida em que no oferece

    nenhuma garantia de as preocupaes e ideais dos cidados sero levadas em

    considerao. Os instrumentos mais utilizados para consultar a populao so

    pesquisas de opinio, assembleias de bairro e audincias pblicas. As pessoas

    so vistas basicamente como abstraes estatsticas e a participao medida

    pelo nmero de pessoas presentes nas reunies, quantos folhetos foram

    distribudos ou quantas pessoas foram entrevistadas. O que os cidados

    conseguem em todas estas atividades que eles participaram da participao.

    E o que os tomadores de deciso conseguem a evidncia de que eles

    cumpriram as normas de envolver aquelas pessoas. (Arnstein,1968)

    Esta situao cria tenses sociais e deixa claro que seja pela via institucional

    de representao ou pelos mecanismos anti-hegemnicos de participao

    definidos por Nunes, h necessidade de incluir as vozes da comunidade nos

    processos de planejamento e tomada de deciso porque nesses processos

    que so definidas as condies reais de acesso aos recursos, defesa dos

    10

    No programa de Uso Sustentvel, onde parece maior destaque o papel para os pescadores artesanais, foram estimados $60 milhes de dlares em recursos a serem promovidos pela comunidade internacional em termos concessionais ou de doaes para o perodo 1993-2000.

  • 23

    direitos a posse e explorao do habitat e finalmente subsistncia, condio

    mnima para o desenvolvimento sustentvel.

    Alm dos obstculos desde as estancias de poder para permitir a

    participao, tambm existem os obstculos dos grupos vulnerveis, o que

    Arnstein chamou de obstculos da participao dos sem-nada: inadequao da

    infra-estrutura poltica e socioeconmica, o limitado acesso educao e

    informao, alm das dificuldades em organizar um grupo comunitrio

    representativo e legitimado face s desavenas pessoais, a alienao e a

    desconfiana mtua. (Arnstein, 1968). O reconhecimento da sua identidade, das

    suas necessidades prprias e a valorizao dos conhecimentos relacionados ao

    meio ambiente no qual vivem.

    Novas esferas pblicas que incluam combinaes inovadoras de democracia

    participativa com democracia representativa surgem do experimentalismo

    democrtico. As novas experincias11 bem sucedidas estudadas por Santos e

    Avritzer se originaram de novas gramticas sociais nas quais o formato da

    participao foi sendo adquirido experimentalmente. Os autores consideram

    necessrio para a pluralizao cultural, racial e distributiva da democracia que se

    multipliquem experimentos em todas essas direes. No existe motivo para a

    democracia assumir uma s forma. Pelo contrrio, o multiculturalismo e as

    experincias recentes de participao, apontam no sentido da deliberao

    pblica ampliada e para o adensamento da participao. (Santos e Avritzer,

    2002:50).

    No existe nenhum motivo para democracia assumir uma s forma. Pelo contrrio, o multiculturalismo e as experincias recentes de participao, apontam no sentido da deliberao pblica ampliada e para o adensamento da participao. (...) necessrio que se multipliquem experimentos em todas essas direes. (Santos e Avritzer, 2002:49)

    Todos os casos de democracia participativa estudados pelos autores iniciam-

    se com uma tentativa de disputa pelo significado de determinadas prticas

    polticas, por uma tentativa de ampliao da gramtica social e de incorporao

    de novos atores ou de novos temas na poltica.

    Os pescadores da lagoa procuram seu reconhecimento como atores, com

    identidade prpria e necessidades diferenciadas na determinao e

    planejamento de programas e projetos ambientais na Lagoa dos quais eles

    11

    Os casos estudados pelos autores so entre eles, o oramento participativo em Porto Alegre, reivindicaes de direito a moradia em Portugal, direitos do reconhecimento da diferena na Colmbia, ndia, frica do Sul e Moambique.

  • 24

    sero diretamente afetados. Eles se reconhecem a si mesmos com

    conhecimentos ecolgicos tradicionais para colaborar positivamente com as

    pesquisas, o planejamento e tomada de deciso. Serem consultados nas

    audincias pblicas quando os projetos j se encontram definidos e as

    intervenes ou mudanas viram lutas polticas, no s colocam a Colnia em

    desvantagem, se no tambm os projetos perdem a oportunidade de contar no

    s com seus conhecimentos quanto com seu apoio na sua execuo e

    monitoramento. Eles tm um permanente contato e vivncia com o ecossistema

    da lagoa e lhes interessa pessoalmente o bem-estar do habitat, no s pelo seu

    valor paisagstico se no pelo seu valor de subsistncia.

    Deste este ponto de vista, a participao no s adquire importncia em

    termos de incluso social, mas tambm um valor de eficcia. Paulo Freire

    defendia esta ideia da participao como forma mais eficaz da sociedade, na

    qual as formas dialgicas permitiam a evoluo do conhecimento e das formas

    de se pensar e criar o mundo. (Freire, ........).

    O fortalecimento dos grupos vulnerveis, o reconhecimento da sua

    identidade prpria, direitos e necessidades especficas, a valorizao dos

    conhecimentos no cientficos e o seu dilogo com a cincia e os tcnicos, a

    considerao desses grupos e novos assuntos nos debates pblicos e

    finalmente a influncia na tomadas de deciso, so os desafios que so causa e

    efeito da sustentabilidade na sua relao com os processos participativos. As

    novas esferas pblicas, se configuram como espaos onde podem ser

    construdos esses novos valores democrticos chave para o desenvolvimento

    sustentvel.

    Estas experincias podem ter como objetivos, desde permitir uma maior

    visibilidade e fortalecimento dos grupos sociais, neste caso, dos pescadores,

    como atores do cenrio da lagoa, visando incluir temticas no consideradas at

    o momento pelos projetos, como por exemplo, a entrada do alevino na lagoa, at

    serem includos no planejamento e na tomada de deciso dos mesmos.

    Os pescadores tm colaborado em vrias pesquisas iniciadas por

    universidades e centros de pesquisa. Eles colaboram como fontes de dados

    para os pesquisadores, mas ainda no foram envolvidos em pesquisas

    participativas, ou processos de pesquisa-ao ou, ainda, como parte do

    planejamento de algum projeto para a lagoa. Alguns deles trabalham na

    manuteno dos manguezais contratados por Mario Moscatelli e um deles

    funcionrio do INEA nas tarefas de fiscalizao da qualidade da gua. Todos

    eles trabalham na despesca na poca das mortandades em conjunto com a

  • 25

    prefeitura e atualmente esto vinculados a um projeto de recoleco de garrafas

    Pet e latas de alumnio no setor, projeto patrocinado pela Siemens. Os projetos

    ambientais mais relevantes para a lagoa so feitos em parceria entre a prefeitura

    e a empresa privada (Eike Batista) que realiza as audincias pblicas de forma

    limitada na sua funo democrtica e participativa j que os pescadores so

    escutados mas sentem que suas opinies, direitos e necessidades no afetam

    as decises finais.

    Mtodos Participativos

    A utilizao de mtodos participativos uma til ferramenta para a

    viabilizao de novos espaos democrticos, mas para isso, sua utilizao deve

    ocorrer no mbito de processos mais amplos que envolvam a mobilizao e

    organizao social como evidencia o estudo de Santos e Avritzer os quais

    mapearam experincias que vo alm do mtodo e que envolveram um conjunto

    de mobilizaes e organizao social fora e dentro do mbito institucional no

    hemisfrio sul.

    Atualmente os mtodos participativos so amplamente usados e difundidos

    por Ongs e movimentos sociais. Encontramos tambm mtodos participativos na

    rea da pesquisa cientfica, no design, nas artes e no setor empresarial. Paulo

    Freire um precursor internacional desta forma de enxergar a produo do

    conhecimento, principalmente na sua obra A pedagogia do Oprimido e o mtodo

    Crculos de Cultura. Existe um amplo leque de ferramentas, tcnicas, mtodos e

    experincias que visam facilitar a participao ativa de diferentes pessoas no

    processo de criao, construo e deciso.

    A partir das reflexes sobre criao de Novas Esferas Pblicas e

    demodiversificao, podemos definir esse leque de ferramentas como todas

    aquelas que permitam mobilizar as comunidades dentro de um processo mais

    amplo que incluem outras formas de interveno, seja dentro da

    institucionalidade ou fora delas. O objetivo pode ser criar um efeito de

    demonstrao, de maneira a colocar na agenda poltica os problemas em

    discusso e a obrigar ao seu reconhecimento como problemas pblicos, ou a

    influenciar decises. (Nunes 2007:89). A mobilizao das comunidades implica o

    seu fortalecimento, em termos de legitimidade da sua representao,

    fortalecimento de identidade prpria e necessidades diferenciadas, incluso de

    seus conhecimentos e opinies.

  • 26

    Os mtodos participativos colaboram com o experimentalismo democrtico e

    fortalecimento de grupos vulnerveis (libertao).

    No objetivo de este trabalho classificar, nem comparar os mtodos.

    Considerou-se importante apresentar alguns exemplos representativos

    permitindo contextualizar de forma crtica o mtodo a Investigao Apreciativa,

    objeto da pesquisa.

    A Oficina de Cartografia de Conhecimentos inspirada em dois tipos de

    iniciativa, na mapping workshops e os crculos de cultura do Paulo Freire. Os

    Mapping Workshops realizados na Universidade de Tampere, na Finlndia,

    (so) dirigidos a especialistas em ecologia, com o objetivo de cartografiar os

    diferentes problemas e processos envolvidos em situaes caraterizadas pela

    complexidade e a incerteza. Os Crculos de Cultura consistem em um meio de

    construo dialgica de um conhecimento situado prximo das experincias e

    linguagens de populaes ou comunidades locais.

    A Oficina de Cartografia permite que os participantes explicitem, atravs de

    linhas narrativas que incorporam as suas linguagens prprias e as suas

    experincias, a sua definio da situao e dos problemas em discusso e

    identificar as convergncias e divergncias entre as suas posies. Os

    resultados do processo vo sendo registrados em tempo real atravs de

    representaes grficas num quadro ou em papel de cenrio. Posteriormente

    so trabalhados pelo facilitador e devolvidos aos participantes para comentrio e

    aprovao final. O produto final de uma oficina um mapa de posies e de

    atores que permite visualizar os diferentes modos de conhecer o problema em

    discusso para poder atuar sobre ele. (Nunes, 2007:94)

    O Jri de Cidados um procedimento deliberativo no qual os participantes

    avaliam o conhecimento disponvel sobre o problema em discusso, que pode

    ser apresentado seja sob a forma de resultados de uma oficina de cartografia,

    seja sob depoimentos de testemunhas peritas expressamente convidadas para

    expor as diferentes posies resultantes da deliberao, especificando os pontos

    de acordo e de desacordo entre os membros do jri. O documento de posio

    poder incluir recomendaes a dirigir as instituies pblicas que lidam com o

    problema de debate. (Nunes, 2007:95)

    O ZOPP uma ferramenta de planejamento introduzido pela GTZ

    (cooperao tcnica alem) em 1983, quando integrou e aperfeioou estes

    elementos em um sistema de procedimentos e instrumentos. Consiste da

    integrao de trs elementos distintos: o Marco Lgico; o instrumental

  • 27

    METAPLAN (tcnicas de Visualizao e Moderao); e a sistemtica bsica de

    planejamento. Deve ser aplicado em duas fases principais, diagnstico e

    planejamento, e cada uma contm outras etapas que devem ser seguidas de

    forma sucessiva e interligada. Faz uso de reunies e oficinas, onde um

    moderador, no papel de facilitador, utiliza instrumentos como a visualizao de

    ideias em tempo real a partir de fichas de diferentes tamanhos e cores afixadas

    ao longo do trabalho do grupo, podendo estas serem modificadas ou removidas.

    A moderao usa principalmente a problematizao: o grupo estimulado a

    discutir, a pensar, a construir sobre determinado tpico a partir de perguntas

    norteadoras, preparadas especialmente para aquele fim pelo moderador o qual

    pode ser parte do grupo ou ser um convidado externo. A aplicao indicada a

    grupos pequenos, de at 30 pessoas, no mximo. O moderador deve estar

    capacitado para dar uso correto ferramenta.

    A PRA (Participatory Rural Appraisal) - Avaliao Participativa Rural consiste

    em um conjunto de tcnicas, em grande parte visual, para avaliar os recursos do

    grupo e da comunidade, identificar e priorizar problemas e estratgias para

    resolv-los. uma metodologia de pesquisa / planejamento em que a

    comunidade local (com ou sem a ajuda de pessoas de fora) estuda uma questo

    respeito da populao, prioriza problemas, avalia as opes para resolver o

    problema e produz um plano de ao comunitrio para abordar as preocupaes

    que foram levantadas. O mtodo visa que as mltiplas perspectivas que existem

    em qualquer comunidade estejam representadas na anlise e que a prpria

    comunidade assuma a liderana na avaliao de sua situao e encontre

    solues. Pessoas externas podem participar como facilitadores ou na prestao

    de informaes tcnicas, mas eles no devem tomar conta do processo. O

    facilitado deve prover a estrutura e o estimulo, mas o contedo deve ser

    resultado da escolha de todos os membros.

    O HCD - Human Centered Design (Design Centrado no Ser Humano) um

    mtodo Open Source que serve como guia de inovao e design, desenvolvido

    principalmente pela equipe da empresa IDEO (http://www.ideo.com)

    especificamente para Ongs e empresas sociais que trabalham com comunidades

    que sobrevivem com menos de 2 dlares por dia na frica, sia e Amrica

    Latina. , ao mesmo tempo, um processo e um conjunto de ferramentas que

    tm como objetivo gerar solues, incluindo produtos, servios, ambientes,

    organizaes e modos de interao. Conceitualmente est sustentada na

    interao de trs pilares: o desejvel, o praticvel e o vivel. Pode ser usado em

  • 28

    exerccios de tempo curto como uma semana, ou em processos de maior

    imerso de campo. Baseia-se em trs fases: ouvir, criar e implementar.

    conduzido por um grupo de tcnicos, de preferncia de diferentes disciplinas,

    que interagem com as pessoas da comunidade a partir de diferentes tcnicas

    para se aproximar das suas necessidades e desejos e conseguir chegar a

    prottipos que so criados em conjunto com o grupo.

    A Pesquisa Participante busca envolver aquele que pesquisa e aquele que

    pesquisado no estudo do problema a ser superado, conhecendo sua causa,

    construindo coletivamente as possveis solues. A pesquisa ser feita com o

    envolvimento do sujeito-objeto. O pesquisador no s passa a ser objeto de

    estudo, assim como os sujeitos-objetos so igualmente pesquisadores onde

    todos, pesquisador e pesquisados, identificam os problemas, buscam-se

    conhecer o que j conhecido a respeito do problema, discutem as possveis

    solues e partem para a ao, seguido de uma avaliao dos resultados

    obtidos. A finalidade da Pesquisa Participante a mudana das estruturas com

    vistas melhoria de vida dos indivduos envolvidos. Neste caso, pesquisador

    aquele que teve formao especializada, mas tambm se estende aos indivduos

    do grupo que participam da construo do conhecimento, tendo como princpio

    filosfico a conscientizao do grupo de suas habilidades e recursos disponveis.

    O Teatro do Oprimido um mtodo teatral que rene exerccios, jogos e

    tcnicas teatrais elaboradas pelo teatrlogo brasileiro Augusto Boal. Os seus

    principais objetivos so a democratizao dos meios de produo teatral, o

    acesso das camadas sociais menos favorecidas e a transformao da realidade

    atravs do dilogo (tal como Paulo Freire pensou a educao) e do teatro. Parte

    do princpio de que a linguagem teatral a linguagem humana que usada por

    todas as pessoas no cotidiano. Sendo assim, todos podem desenvolv-la e fazer

    teatro. Do teatro do oprimido surgiu o teatro legislativo, no qual a atividade

    poltica exercida para transformar em lei a necessidade expressa e debatida de

    forma ldica atravs da cena.

    O World Caf um mtodo de dilogo colaborativo a partir de perguntas

    relevantes a servio de assuntos reais do dia a dia, em ambientes corporativos,

    governamentais e comunitrios. Grupos de 4 pessoas discutem um assunto em

    vrias mesas, trocando de mesa periodicamente para introduzir a discusso

    anterior na nova mesa com ajuda de um anfitrio. importante criar um clima

    aconchegante, como um caf, com mesas redondas, pano de mesa, papel,

    canetas coloridas, flores, etc. O Caf construdo sobre a suposio de que as

    pessoas j possuem dentro delas a sabedoria e criatividade para confrontar at

  • 29

    mesmo os desafios mais difceis. Dado o contexto e foco adequado, possvel

    acessar e usar este conhecimento mais profundo sobre o que mais relevante.

    A Desobedincia Civil prtica cujo autor americano Henry David Thoreau foi

    o pioneiro em estabelecer uma teoria relativa mesma em seu ensaio de 1849.

    Entre os vrios exemplos de desobedincia civil ocorridos na histria, podemos

    destacar os protestos em que as mulheres britnicas se acorrentavam em praa

    pblica a fim de conseguirem o direito ao voto. Entre as dcadas de 1920 e

    1940, Mahatma Gandhi liderou milhares de indianos em marchas pacifistas que

    requeriam o fim da dominao inglesa em seu pas. Hoje no Brasil temos

    exemplos de milhares de pessoas ocupando as ruas o que se iniciou como

    protesto pelo aumento da passagem de nibus em vrias cidades. So muitos os

    exemplos ao redor do mundo de desobedincia civil por questes ambientais.

    Hoje a Colmbia passa por grandes manifestaes12 contra a explorao mineira

    incentivada pelo governo central a qual ameaa fontes de gua para agricultura

    e uso domstico. Msicas, fechamento de vias, ocupao de prdios e espaos

    pblicos, protestos, cartazes, criao de imagens, caricatura, passeatas, no

    pago de impostos, abrao de rvores. O ato de desobedincia civil faz uso de

    diversas tcnicas, hoje em dia tambm organizadas atravs das redes sociais na

    internet.

    A Desobedincia Civil considerada uma forma de expresso do Direito de

    Resistncia que possui cunho jurdico, mas no precisa de leis para garantia. A

    Desobedincia Civil est no mesmo patamar jurdico do Direito de Greve e do

    Direito de Revoluo, o qual se refere ao direito do povo de resguardar sua

    soberania quando ofendida.

    Os mtodos de Oficina de Cartografia de Conhecimentos, ZOPP e PRA

    so pr[oximas Investigao Apreciativa porque tem como objetivo fortalecer as

    capacidades organizativas dos grupos nas quais so aplicadas. A Pesquisa

    Participante e o HCD procuram resolver problemticas especficas das

    comunidades a travs do trabalho conjunto com tcnicos de diferentes reas do

    conhecimento. O Jur de Cidados e o World Caf, procuram gerar perspectivas

    12

    Essas manifestaes conseguiram que o Municpio de Piedras, Tolima convocasse uma consulta popular entre os 5015 cidados com direito ao voto para saber se eles querem que se assente uma planta de explorao de ouro na regio. Matria em jornal Nacional El Tiempo. Acesso 28/01/2013. http://www.eltiempo.com/colombia/tolima/consulta-popular-minera-en-el-tolima_12953231-4

  • 30

    sobre um assunto especfico para serem avaliadas ou includas dentro de outros

    processos. O Teatro do Oprimido e a Desobedincia Civil se localizam em

    esferas de libertao ante situaes consideradas como injustas.

    Sabemos por Arnstein que o mtodo em si no garante uma participao

    legtima nem processos mais ampliados de participao e democracia. Na

    prtica, os processos participativos so usados tambm para cooptar, manipular

    e inclusive para criar o que foi denominado tirania da participao13. A

    autocrtica e a anlise permanente dos processos na sua aplicao so chave

    para entender estas situaes.

    As prticas de democracia participativa so suscetveis a cooptao ou

    manipulao para legitimar interesses hegemnicos. Estes perigos se podem

    prevenir atravs da aprendizagem e da auto-reflexividade constantes donde se

    possam extrair incentivos para novos aprofundamentos democrticos. No

    domnio na democracia participativa, mais do que em qualquer outro, a

    democracia um principio sem fim e as tarefas de democratizao s se

    sustentam quando elas prprias so definidas por processos democrticos cada

    vez mais exigentes.

    A Investigao Apreciativa.

    A Investigao Apreciativa, tambm conhecida em portugus como

    Indagao Valorativa, um mtodo que visa a anlise e mudana organizacional

    e social. Identifica o melhor do que a organizao para perseguir sonhos e

    possibilidades do que poderia ser. uma procura cooperativa pelas foras e

    valores que do vida organizao a partir de uma srie de passos cclicos com

    o envolvimento da maior quantidade possvel de pessoas de diferentes nveis ou

    posies dentro da organizao, sob a liderana de pessoas capacitadas para

    facilitar o processo. Nas palavras dos autores,

    A Investigao Apreciativa a busca colaborativa e evolutiva em conjunto

    pelo melhor que existe nas pessoas, nas suas organizaes e no mundo que as

    rodeia. Ela envolve a descoberta do que d vida a um sistema vivo quando ele

    13

    Essas crticas referem-se a situaes em que, no lugar de a participao ser considerada como um direito dos cidados passa a ser uma obrigao a que estariam sujeitos todos os que, por exemplo, esto envolvidos em projetos locais de desenvolvimento apoiados por organizaes internacionais, multilaterais ou no governamentais. O no cumprimento da obrigao de participar nessas condies estabelecidas pelas instituies implica em muitos casos, a suspenso desses projetos. (Nunes, 2007:90)

  • 31

    mais eficiente, vibrante e construtivamente capaz em termos econmicos,

    ecolgicos e humanos. A IA envolve a arte e a prtica de formular perguntas que

    fortalecem a capacidade do sistema de assimilar, prever e realar o potencial

    positivo. A investigao mobilizada atravs da criao da pergunta positiva

    incondicional, que sempre envolve centenas ou milhares de pessoas. As

    intervenes da IA focalizam-se na velocidade da imaginao e inovao - em

    vez de diagnsticos negativos, crticos e espiralados geralmente usados nas

    organizaes. Os modelos de descoberta, sonho, planejamento e futuro

    vinculam a energia do ncleo positivo s mudanas que jamais se pensou

    fossem possveis. (Cooperrider, Whitney e Stravos, 2008:19)

    Comparada com outros mtodos similares, como por exemplo o ZOPP, o

    METAPLAN, ou o PRA, a realidade de uma organizao no vista como

    problemas a serem resolvidos, mas sim como oportunidades ou sonhos a serem

    alcanados. O princpio positivo que caracteriza a IA diz que para construir

    mudanas preciso esperana, inspirao e alegria pura na criao coletiva. As

    pessoas preferem colocar seus esforos naquilo que as fazem sentir bem.

    Quanto mais positivo o processo, mais pessoas so cativadas e durante mais

    tempo os benefcios permanecem.

    A IA ao mesmo tempo uma abordagem e um mtodo. Nasce no mbito das

    teorias organizacionais de corporaes norte-americanas e transnacionais. Foi

    criado e pensado por um grupo de pesquisadores da Universidade Case

    Western, liderado pelo professor e catedrtico de Programa sobre Negcios

    como Agente em Benefcio do Mundo, David L. Cooperrider, junto com o Dr.

    Suresh Srivastva em 1987. Eles consideraram que a linguagem e o ambiente

    organizacional das empresas estavam sempre empregados de forma a procurar

    problemas, encaminhando as pesquisas na procura das causas dos problemas e

    no nas causas de aquilo que dava certo e entender quais so os fatores que

    permitem essas coisas positivas acontecerem.

    O mtodo tem sido testado em vrios cenrios organizacionais e culturais no

    mundo como, por exemplo, grandes corporaes (Avon, British Airways), ONGs

    (Myrada, World Vision Relief, Save the Children, Agncia Americana para o

    Desenvolvimento Internacional), instituies educacionais (U. Tecnolgica de

    Lawrence), organizaes governamentais (NASA). Nesses mbitos tem sido

    usada para criar viso e estratgia comuns para o futuro, acelerar a

    aprendizagem organizacional, unir a fora de trabalho e a gerncia em parcerias,

    para melhorar a comunicao, fortalecer as implementaes de maiores

    mudanas envolvendo a tecnologia da informao, contruir equipes de alto

  • 32

    desempenho que facilitem a mudana, entre outros. (Cooperrider, Whitney e

    Stravos, 2008:3)

    No Brasil foi testada no Frum Futuro 10 Paran como parte da experincia

    de planejamento participativo para o desenvolvimento regional sustentvel da

    Regio Metropolitana de Curitiba, realizado no ano de 2005 com a participao de

    centenas de lideranas regionais paranaenses14.

    Em cada um desses cenrios, a IA foi adaptada aos propsitos especficos

    de cada situao. Para o presente trabalho, consideraremos as adaptaes

    realizadas pela equipe da ONG Myrada no sul da ndia, quem testou a IA com

    500 comunidades rurais.

    1.1.1 Como Funciona a Investigao Apreciativa

    A Investigao Apreciativa est fundamentalmente constituda pelo ciclo das

    4D das iniciais em ingls Discovery, Dream, Design, Destiny cuja traduo em

    portugus se refere respectivamente a Descoberta, Sonho, Planejamento e

    Futuro. No estgio da Descoberta o melhor do que em um sistema

    identificado como o ncleo positivo. Envolve valorizar aquelas coisas que vale

    pena serem valorizadas. O segundo estgio, o Sonho, procura visualizar o que

    pode ser o que o mundo ou contexto est solicitando, a criao de uma imagem

    positiva de um futuro escolhido. O terceiro estgio, o Planejamento define os

    passos para criar o sistema ideal de uma organizao, baseia-se no ncleo

    positivo e nos resultados previstos para os dois estgios anteriores. Ele define o

    formato ideal do como pode ser. O estgio final, o futuro, abrange a

    implementao e o modelo para apoiar um ambiente de aprendizagem

    apreciativa, ou o que ser.

    A Descoberta e o Sonho esto baseados principalmente em entrevistas

    individuais15 cujos dados so organizados e avaliados por uma equipe

    facilitadora que depois apresentam esses dados em sesses grupais nas quais

    se fazem mais perguntas para gerar discusso e construo colaborativa de

    14

    Para uma anlise crtica do mtodo desta experincia brasileira, vide CABALLERO e CONCEIO que fazem uma contribuio com a discusso analtica sobre o processo de planejamento participativo relacionado ao desenvolvimento regional sustentvel.

    15 As entrevistas podem ser realizadas pelo Grupo Orientador ou podem

    ser feitas em forma de cascata. Neste esquema, uma pessoaa depois de ser

    entrevistada convidado para virar entrevistador.

  • 33

    propostas. As fases podem incluir outras formas de expresso como imagens ou

    msicas, mas a tcnica principal de todo o processo so os relatos ou story

    telling. Para o estgio de Planejamento e Futuro, as tcnicas so criadas ou

    proposta pela mesma organizao. desejado que o ciclo se repita quantas

    vezes for necessrio para uma investigao, comeando sempre com as

    perguntas fundamentais e depois passando para as perguntas especficas ou

    tpicos selecionados para a investigao. A durao de uma Investigao pode

    variar de algumas horas at Investigaes mais profundas de um ano ou mais.

    Isso vai depender do tamanho da organizao, dos objetivos e da profundidade

    requerida.

    O grupo Orientador ou Facilitador: o grupo que vai planejar e lanar a

    investigao. Deve compreender muito bem a ferramenta. Vai articular o

    propsito e os objetivos, selecionar os tpicos positivos, formar subgrupos para

    executar tarefas e responsabilidades, localizar o progresso e os resultados, criar,

    analisar e interpretar as entrevistas, sintetizar e apresentar a informao. A

    equipe composta de participantes de qualquer nvel organizacional, para que

    seja formado um comit dirigente bastante representativo. Em nveis ideais, a

    equipe envolve um microcosmo da organizao. Quanto mais pessoas melhor. A

    equipe deve conter uma variedade de vozes que garanta pontos de vista e

    experincias de diferentes nveis e de diferentes perspectivas da organizao.

    No est limitada aos membros da organizao. Podem e devem ser convidados

    atores externos que possam enriquecer a Investigao.

    O Ncleo Positivo: A premissa da IA a ideia de que as organizaes

    movem-se em direo daquilo que estudam. A IA faz a escolha consciente de

    estudar o melhor na organizao, seu ncleo positivo. aquilo que da

    significao e vida organizao, identificado na fase da Descoberta e

    ampliado e desenvolvido durante todas as outras fases. O Ncleo Positivo est

    entrelaado ao longo do ciclo das 4D. Sob esse aspecto, o ncleo positivo o

    comeo e o fim da investigao. (Cooperrider, Whitney e Stravos, 2008:51)

    Pode ser expresso de inmeras maneiras retiradas de um grupo, todas elas

    passveis de serem identificadas com a Investigao. A seguir, esto algumas

    das formas sob as quais o ncleo positivo pode ser expresso:

    Melhores prticas de negcios, inovaes, valores, pontos fortes do produto,

    tradies vitais.

    Os tpicos positivos: Os tpicos so os assuntos principais que sero

    tratados, o que definir a agenda da investigao e que conduzir o ciclo das

    4D. Pode ser qualquer item relacionado eficincia organizacional. Geralmente

  • 34

    so de trs a cinco em uma investigao. A escolha dos tpicos um ato

    decisivo para o resto da Investigao. O mais importante que eles representam

    o que as pessoas da organizao realmente desejam descobrir ou saber a

    respeito, aquilo que desejam ver crescer e prosperar em suas organizaes.

    Para garantir isso, os tpicos devem ser procurados numa primeira

    rodada de perguntas fundamentais na qual vo aparecer esses assuntos. Essa 4

    perguntas fundamentais da IA so:

    1. Qual foi a experincia de pico ou ponto alto?

    2. Que coisas voc mais valoriza:

    Em si prprio?

    Na natureza de seu trabalho?

    Em sua organizao?

    3. Quais so os principais fatores que do vida para organizar?

    4. Quais so seus trs desejos para melhorar a vitalidade e a sade?

    Segundo a teoria da IA, os sistemas humanos geralmente crescem na

    direo de suas imagens de futuro, suas imagens de futuro so informadas pelas

    conversaes que mantm e pelas histrias que contam, as histrias que

    contam so informadas pelas perguntas que fazem, ento, as questes feitas

    so decisivas, isto , elas afetam as respostas dadas.

    A escolha dos tpicos uma funo geralmente exercida dentro do Grupo

    Orientador. As escolhas de tpicos afirmativos encorajam as pessoas

    escolherem os tpicos que desejam ver crescer e prosperar em suas

    organizaes.

    Os tpicos devem ser afirmativos ou baseados no positivo. So desejveis e

    identificam os objetivos que as pessoas desejam. Alguns exemplos de tpicos

    positivos so: Felicidade no trabalho, parcerias revolucionrias, liderana

    inspiradora, aprendizagem contnua, comunicaes empolgantes. (Cooperrider,

    Whitney e Stravos, 2008:50-60).

    Podemos observar nos exemplos que os tpicos incluem um adjetivo que

    informa uma situao ideal de um aspecto da organizao. Isto caraterstico do

    mtodo, que defende a importncia da linguagem usada no processo de

    mudana a qual procura ser positiva, apreciativa e entusiasta.

  • 35

    O ciclo das 4D: Descoberta, Sonho, Planejamento e Futuro.

    Figura 2 Ilustrao do Ciclo das 4D da autora.

    A fase da Descoberta est fundamentalmente composta por uma entrevista

    individual, de preferncia annima. O entrevistado convidado a relatar

    momentos de pico da organizao ou da sua vida, tanto de questes gerais

    como seguindo os tpicos especficos definidos para a investigao. A partir da

    anlise desses momentos, sero identificados os valores e circunstncias que

    permitiu isso acontecer, mapeando histrias de sucesso, desejos, exemplos e

    prticas. A tarefa desta fase identificar e avaliar o melhor do que . A ideia

    identificar o que deve ser conservado e valorado na organizao, aquilo que no

    deve mudar.

    O Grupo Orientador prepara o guia de entrevistas a qual tem uma introduo

    formal para explicar o propsito da entrevista e contm trs tipos de perguntas:

    as perguntas de abertura, as perguntas tpicas e as perguntas conclusivas.

    As perguntas de apertura seguem este formato abaixo,

    Descreva uma experincia importante em sua organizao, um

    tempo em que voc estava mais vivo e envolvido.

    Sem modstia, o que voc mais valoriza em si, em seu trabalho e

    em sua organizao?

    As perguntas tpicas devem ser feitas sob a forma de perguntas com

    uma introduo presumindo que a matria em questo j existe. No exemplo a

    continuao, o tpico positivo era o valor de ser pescador artesanal. A

    introduo ao tpico e uma das perguntas do tpico segue embaixo:

  • 36

    O ofcio da pesca artesanal representa uma riqueza ancestral em

    conhecimentos, em tcnicas e ferramentas de explorao sustentvel dos

    recursos naturais, ou seja, uma forma de produzir alimentos permitindo a

    reposio natural dos recursos para garantir a sobrevivncia das espcies e a

    alimentao das geraes humanas futuras.

    Conta-me histrias onde a colnia beneficiou a Lagoa, os

    vizinhos, o pblico em geral.

    As perguntas conclusivas devem ser provocativas. Convidar o

    entrevistado a imaginar, desejar e pensar no futuro. Alguns exemplos desse tipo

    de perguntas segue embaixo,

    Olhando para um futuro, o que estamos sendo chamados para

    nos tornar?

    Quais so os trs desejos que voc possui para mudar a

    organizao?

    Os resultados da Descoberta da entrevista individual devem ser organizados

    e interpretados pela Equipe Orientadora. O objetivo achar as histrias,

    assuntos e valores destacados pelas pessoas que participaram e o que permitiu

    isso acontecer. aqui onde encontramos o Ncleo Positivo e aquilo que vai

    conduzir o resto da Investigao. Deve-se organizar os dados para serem

    apresentados na reunio de grupo na qual as pessoas sero convidadas a

    compartilhar e analisar em pblico algumas das histrias como forma de

    aquecimento para entrar fase do Sonho.

    Na Investigao Apreciativa no existe uma nica forma correta de analisar

    os dados. O que importante encontrar formas criativas de organizar, escutar

    e compreender o que est sendo dito a partir de mltiplas perspectivas. Os

    autores recomendam procurar tanto tramas comuns, como anomalias para

    identificar temas emergentes.

    A fase do Sonho tem como objetivo criar vises de futuro compartilhadas

    baseadas nas fortalezas, sucessos e valores identificados na Descoberta, ou

    seja, baseados na realidade, nas experincias. As pessoas so desafiadas

    positivamente a criar cenrios futuros contendo o que elas acham que o mundo

    precisa deles e o que a organizao poderia ser. Esta fase acontece em grupo.

    Geralmente iniciada com um breve processo de Descoberta, relembrando

  • 37

    histrias de sucesso surgidas da entrevista individual. usada uma pergunta

    que estimula os dilogos entre os participantes sobre criar o futuro desejado.

    Segue o tipo de perguntas da fase do Sonho,

    Imagine que voc acordou aps um sono de 5 anos. Como voc

    espera que a sua organizao esteja? O que estar acontecendo

    no mundo externo? Como sua organizao est contribuindo para

    esse novo mundo? Em que voc est contribuindo para fazer a

    diferena?

    Se voc for ser visitado por voc mesmo daqui a 5 anos, o que

    gostaria encontrar?

    Quais so seus trs desejos para o futuro da sua organizao?

    Depois de dar o tempo de reflexo individual, se criam grupos de at mximo

    12 pessoas para falar sobre as coisas que experimentaram durante as

    entrevistas de Descoberta. Esta atividade finaliza quando o Grupo tenha

    compartilhado e tenham criado um cenrio verbal coletivo do futuro desejado.

    O grupo convidado para descrever o que viram nesse sonho se valendo de

    qualquer forma de expresso como poesia, pintura, msica, uma histria, uma

    pardia, um jornal, um comercial, mapas de oportunidades, colagem, etc. Cada

    equipe prepara um breve Relatrio Apreciativo de seus sonhos.

    Segundo os autores, no se pergunta se a nova viso atingvel, os

    participantes j demostraram seu desejo, sua vontade e sua capacidade de

    torna-la possvel. Essa energia e sinergia que conduzir o grupo fase do

    Planejamento.

    A fase do Planejamento define a estrutura bsica que permitir que o sonho

    ou a viso torne-se realidade. Est baseada no dilogo. Pode-se fazer uso de

    tcnicas como grupos de enfoque, brainstorm, mapeamentos, entre outros.Os

    autores acreditam que a transformao organizacional muito mais do que uam

    massa crtica de transformaes pessoais. Ela requer mudanas em nvel macro

    na prpria estrutura da organizao, a arquitetura social. (Cooperrider, Whitney e

    Stravos, 2008:181).

    O planejamento comea com a criao de proposies provocativas escritas

    no presente indicativo. Elas recriam a prpria imagem da organizao

    apresentando figuras claras e convincentes de como as coisas sero quando o

    ncleo positivo for eficaz em todas suas estratgias, processos, sistemas,

  • 38

    decises e colaboraes. Estas proposies so geradas a partir dos resultados

    das fases anteriores. Um grupo de proposies provocativas o tipo de

    Arquitetura Social para a organizao ideal. Ele trata dos elementos de

    planejamento crticos para uma organizao para sustentar o ncleo positivo. Os

    passos do planejamento so a seguir:

    Selecionar os elementos do planejamento.

    Identificar relaes internas e externas.

    Identificar temas e estabelecer o dilogo.

    Anotar proposies provocativas.

    Os participantes podem optar por articular sua prpria arquitetura social

    ou escolher elementos de outros modelos16. Segue os elementos de

    planejamento que os autores apresentam como sugesto para serem

    considerados:

    Figura 3 Elementos do Planejamento.

    Elementos do Planejamento a Considerar