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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS CURSO DE DIREITO Mara Julinaide Chaves GUARDA COMPARTILHADA Governador Valadares 2011

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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE

FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS

CURSO DE DIREITO

Mara Julinaide Chaves

GUARDA COMPARTILHADA

Governador Valadares

2011

1

MARA JULINAIDE CHAVES

GUARDA COMPARTILHADA

Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de bacharel em Direito pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas, da Universidade Vale do Rio Doce. Orientadora: Marlene Franklin Alves

Governador Valadares

2011

2

MARA JULINAIDE CHAVES

GUARDA COMPARTILHADA

Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas, da Universidade Vale do Rio Doce.

Governador Valadares, 09 de novembro de 2011.

Banca Examinadora:

____________________________________________________ Profª. Marlene Franklin Alves - Orientadora

Universidade Vale do Rio Doce

____________________________________________________ Profª. Lissandra Lopes Coelho Rocha

Universidade Vale do Rio Doce

____________________________________________________ Profª. Beatriz Dias Coelho

Universidade Vale do Rio Doce

3

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus, pela oportunidade que permitiu que eu

vencesse todos os obstáculos por todos estes anos de curso e concedeu-me esta

grande conquista.

Aos meus familiares sempre presentes em minha vida.

A minha orientadora Marlene Franklin Alves pelas orientações para a

realização deste estudo.

A todos os professores pelos ensinamentos adquiridos.

Aos colegas de curso pela convivência e companheirismo.

O meu agradecimento a todas as pessoas que fazem parte desta caminhada.

4

“A guarda compartilhada tem como

premissa a continuidade da relação da

criança com os dois genitores,

conservando-se os laços de afetividade,

direitos e obrigações recíprocas, não

prevalecendo contra eles à desunião dos

pais, pois mesmo decomposta, a família

continua biparental”.

Grisard Filho

5

RESUMO

O tema em estudo enfoca a questão da guarda de crianças e adolescentes após a dissolução da sociedade conjugal, enfocando a guarda compartilhada, que visa sem dúvidas, o melhor interesse do menor, garantindo-lhe o direito de conviver, preferencialmente, no âmbito de sua família natural, bem como de ter referências paternas e maternas em sua formação. A Lei n. 11.688/2008 trata da guarda compartilhada, ou seja, igualdade de direitos no que diz respeito ao exercício do poder parental, exercido em iguais condições pelo pai ou pela mãe, não importando se separados ou não. O reconhecimento dessa igualdade dos genitores no exercício de suas funções parentais incentiva a participação permanente na vida dos filhos. Portanto, o caráter conjunto da responsabilidade integral e a mútua cooperação na educação dos filhos amenizam o reflexo negativo que uma separação ocasiona. Para que a Lei seja realmente eficaz, faz-se necessária a presença de ambos os pais, opinando, decidindo conjuntamente sobre a vida da criança e/ou adolescente, mesmo que ele esteja fisicamente distante. Para a realização desta pesquisa bibliográfica, busca-se fundamentar em doutrinas e jurisprudências para melhor entendimento do tema. Palavras chave: Guarda Compartilhada. Poder Familiar. Interesse do Menor. Alienação Parental.

6

ABSTRAC

The study theme focuses on the question of custody of children and adolescents after the dissolution of the conjugal partnership, focusing on custody, which aims without doubt, the best interests of the child, guaranteeing the right to live, preferably within their natural family, as well as have references in their paternal and maternal education. The Law 11.688/2008 comes to custody, or equal rights with regard to the exercise of parental power, exercised on an equal footing by the father or mother, whether separated or not. The recognition of the equality of parents in exercising their parental functions encourages ongoing involvement in the lives of children. Therefore, the character set of full responsibility and mutual cooperation in the education of children alleviate the negative effect that causes a separation. For the law to be truly effective, it is necessary the presence of both parents, giving their opinions and decide jointly on the lives of children and / or adolescent, even if it is physically distant. For this research literature, we sought support in doctrine and jurisprudence for better understanding of the subject. Keywords: Shared Guard. Family power. Interests of the Minor. Parental Alienation.

7

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 8

2 O PODER FAMILIAR E O INSTITUTO DA GUARDA DOS FILHOS................ 10

2.1 CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DO PODER FAMILIAR........................ 10

2.2 BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA GUARDA....................................... 12

2.3 CONCEITO DE GUARDA................................................................................ 15

3 A GUARDA COMPARTILHADA - LEI N. 11.698/2008...................................... 17

3.1 CONCEITUAÇÃO E GENERALIDADES......................................................... 17

3.2 GUARDA COMPARTILHADA NO DIREITO COMPARADO........................... 21

3.2.1 No direito francês....................................................................................... 22

3.2.2 No direito Inglês.......................................................................................... 23

3.2.3 No direito americano.................................................................................. 24

3.2.4 No direito canadense................................................................................. 24

3.2.5 No direito alemão........................................................................................ 25

3.2.6 No direito português...................................................................................

25

4 APLICABILIDADE DA LEI N. 11.698/2008 E A RESPONSABILIDADE DOS

PAIS.......................................................................................................................

27

4.1 VANTAGENS DA GUARDA COMPARTILHADA............................................. 27

4.2 ALIENAÇÃO PARENTAL E A GUARDA COMPARTILHADA.......................... 31

4.3 O DESEMPENHO COMPARTILHADO DA RESPONSABILIDADE

PARENTAL AO INTERESSE DO FILHO...............................................................

35

5 CONCLUSÃO..................................................................................................... 38

REFERÊNCIAS...................................................................................................... 40

8

1 INTRODUÇÃO

O objeto deste estudo é a guarda compartilhada e os reflexos na vida da

criança e do adolescente, tendo como objetivo analisar e descrever a relevância no

ordenamento jurídico e a garantia da estrutura familiar na aplicabilidade da guarda

compartilhada.

Entendendo que os primeiros interessados no desenvolvimento saudável dos

filhos devem ser os pais, o interesse pelo tema reside em buscar maiores

esclarecimentos sobre a guarda compartilhada, e com isso, contribuir para ampliar a

compreensão de diretrizes básicas que norteiam os recursos do Direito de Família,

como também assinalar as perspectivas teóricas diferenciadas que se dedicam ao

estudo dessa área.

A guarda compartilhada - Lei n. 11.698/2008 trata da igualdade de direitos no

que diz respeito ao exercício do poder parental e deve prescindir da força de

vontade e da mútua cooperação entre os genitores. Para que a Lei seja realmente

eficaz, faz-se necessária a presença de ambos os pais, opinando, decidindo

conjuntamente sobre a vida da criança e/ou adolescente, mesmo que ele esteja

fisicamente distante. Se estes não colocarem os interesses dos filhos acima dos

deles, realmente o uso da guarda compartilhada, nesses casos, não alcançará êxito.

Independente de qual seja a família em que estão inseridas, a criança e o

adolescente, tem o direito de se sentirem protegidos, confortados, respeitados em

todos os direitos fundamentais e essenciais à sua formação como ser humano. Por

isso, os mesmos não podem ser tratados como objetos na disputa por pais ou

familiares, nem estarem vivenciando conflitos entre os pais, uma vez que esta

experiência poderá acarretar transtornos psicológicos irreversíveis em suas vidas.

Tanto o pai quanto a mãe, querendo e tendo condições morais e psicológicas,

devem estar presentes no processo de formação dos filhos, e possuem condições

de igualdade para exerceram esse direito, é o que dispõe a Constituição Federal de

1988, artigo 5º, inciso I e artigo 226, § 5º. Portanto, o fato dos pais estarem

separados não pode significar para a criança uma restrição ao direito de convivência

com seus genitores. Portanto, a guarda compartilhada tem a finalidade de que os

pais dividam a responsabilidade e as principais decisões relativas aos filhos, como

educação, instrução, religiosidade, saúde, lazer, etc.

9

A questão problema que norteia este estudo é sobre a adequada

compreensão da guarda compartilhada no ordenamento jurídico e a garantia da

estrutura familiar, tendo em vista os princípios, regras e instituições destinadas à

regular a atividade revisora dos órgãos jurisdicionais do direito de família,

especializados na solução dos conflitos individuais e coletivos decorrentes destas

relações.

Assim, alguns questionamentos merecem ser investigados, quais sejam:

Como ficam as crianças tratadas como objeto de disputa, sofrendo a alienação

parental, acarretando transtornos psicológicos irreversíveis? Como fica a eficácia na

aplicabilidade da Lei n. 11.698/2008, sem a presença do pai?

Como hipótese acredita-se que a aplicabilidade da guarda compartilhada

depende de fatores como responsabilidade, cooperação e cordialidade entre o casal,

critérios estes que devem ser levados em consideração pelo Magistrado ao

determinar a aplicação da guarda compartilhada, para que a quebra do vínculo

parental cause menos prejuízo à formação da personalidade do filho e sua relação

com o meio social.

Para a consecução da pesquisa foi adotado o método dedutivo, que,

conforme PASOLD consiste em:

Estabelecer uma formulação geral e, em seguida, buscar as partes do fenômeno de modo a sustentar a formulação geral. [...] é a forma lógico comportamental-investigatória na qual se baseia o pesquisador para buscar os resultados que pretende alcançar1.

Como técnica aplicada, destaca-se a da pesquisa bibliográfica, consistente na

pesquisa e colheitas de documentações indiretas presentes em fontes primárias

(norma jurídica, jurisprudências, etc.) e secundárias (doutrinas, artigos, revistas, etc.)

que versam sobre a matéria. O instrumento utilizado foi à coleta de dados

possibilitando ordenar, de forma clara e sistematizada, os achados mais relevantes,

através de fichamento.

1 PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 4. ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2000.

10

2 O PODER FAMILIAR E O INSTITUTO DA GUARDA DOS FILHOS

2.1 CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DO PODER FAMILIAR

O poder familiar encontra sua origem em épocas muito remotas,

ultrapassando as fronteiras culturais e sociais. Instituto este, que alterou bastante no

curso da história, acompanhando, em síntese, a trajetória da história da própria

família. Enorme foi o passo dado nesta matéria, com o Projeto do Código Civil de

1965, ao ser estabelecido que o pátrio poder seja exercido em comum pelos pais do

menor2.

Deferiu também, a Constituição Federal vigente3, o pátrio poder ao casal, tal

como já havia sido concedido pela Lei n. 4.121/62 - Estatuto da Mulher Casada.

Mantendo o princípio, o Código Civil de 2002 estatui no art. 1.631, que, durante o

casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; apenas na falta ou

impedimento de um deles, outro o exercerá exclusivamente4.

A partir de então, havendo divergência entre os cônjuges, não mais prevalece

à vontade paterna, e aquele que estiver inconformado deverá recorrer à justiça, pois

o exercício do pátrio poder é de ambos os cônjuges, igualmente. Nesse sentido,

acentuou o art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei n. 8.069/90:

O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência5.

De acordo com RIZZARDO, vários são os caracteres que marcam o poder

familiar, anteriormente com o nome de pátrio poder, ou poder paternal, ou também

poder marital. Em primeiro lugar, cuida-se de um múnus público (ou seja, uma

2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Direito de família. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 445. 3 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. In: Vade Mecum Acadêmico de Direito. Organização Anne Joyce Angher. 2. ed. São Paulo: Rideel, 2011a - CD ROM. 4 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. In: Vade Mecum Acadêmico de Direito. Organização Anne Joyce Angher. 2. ed. São Paulo: Rideel, 2011c, p. 156. CD ROM. 5 BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. In: Vade Mecum Acadêmico de Direito. Organização Anne Joyce Angher. 2. ed. São Paulo: Rideel, 2011b, p.3. CD ROM.

11

espécie de função correspondente a um cargo privado que estaria numa posição

intermediária entre o poder e o direito subjetivo), pois ao Estado, que fixa normas

para o seu exercício, interessa o seu bom desempenho6.

Cabe agora passar ao estudo acerca conceito do poder familiar.

Para DINIZ, o poder familiar é:

Um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido, em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e proteção dos filhos7.

DIAS afirma que “o poder familiar, concebido como múnus, é um complexo de

direito e deveres”8. No mesmo sentido, para RIZZARDO, o conceito do poder familiar

é “um múnus, encargo, dever, função; é esse o modo pelo qual a consciência

moderna o conceitua”9. Enquanto, GRISARD FILHO afirma que o poder familiar é o

“conjunto de faculdades encomendadas aos pais, como instituição protetora da

menoridade, com o fim de lograr o pleno desenvolvimento e a formação integral dos

filhos, física, mental, moral, espiritual e social”10.

Sendo assim, a ordem de colocação do instituto, sustenta RIZZARDO:

Pode-se ir além e dizer que se trata de uma conduta dos pais relativamente aos filhos, de um acompanhamento para conseguir a abertura dos mesmos, que se processará progressivamente, à medida que evoluem na idade e no desenvolvimento físico e mental, de modo a dirigi-los a alcançarem sua própria capacidade para se dirigirem e administrarem seus bens. Não haveria tão-somente um encargo, ou múnus, mas um encaminhamento, com poder para impor uma certa conduta, em especial entes da capacidade relativa. Não mais há de se falar praticamente em poder dos pais, mas em conduta de proteção, de orientação e acompanhamento dos pais11.

Assim, o poder familiar, deve ser exercido fundamentalmente no interesse do

filho menor, ou seja, enquanto manifestação operativa do poder familiar compreende

6 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei n. 10406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro: Forense, 2009. 7 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 5º vol. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 514. 8 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das Famílias. 4. ed. revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 154. 9 RIZZARDO, Op. Cit, 2009. 10 GRISARD FILHO, Waldir. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 35-36. 11 RIZZARDO, Op. Cit, 2009, p. 609.

12

a convivência entre pais e filhos no mesmo local. Portanto, a guarda dos filhos

menores é atributo do poder familiar.

No entanto, em caso de suspensão (art. 1.637 - CC), destituição (art. 1.635

do CC) ou extinção (interrupção definitiva) do poder familiar, caberá sempre ao juiz,

avaliar a urgência e a necessidade que a situação requer, sempre em prol do que

melhor for para o menor.

De acordo com OLIVEIRA FILHO:

As prerrogativas do poder familiar enfeixam como vistos, direitos que se assemelham a deveres, porque aos pais compete nutrir material e efetivamente a progênie como forma de preparação para a satisfatória condição individual nas fase adulta. Por isso mesmo, a lei traça comportamentos puníveis com a suspensão e a destituição da função paterna ou materna12.

Sendo assim, o abuso, a negligência, a administração ruinosa de bens são

cláusulas que rendem motivo para a suspensão do poder familiar a requerimento de

algum parente ou do Ministério Público para a segurança do menor ou de seus

haveres.

2.2 BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA GUARDA

Voltando ao contexto histórico do instituto da guarda de filhos, o Código Civil

de 1916, quando um casal se separava ocorria o desquite (o casamento não

dissolvia), os filhos menores ficavam com o cônjuge considerado inocente.

Questionando apenas a postura dos pais, para só depois dessa apreciação podia

estabelecer-se de quem era o dever de cuidar de seus filhos. Tais condições

prevaleceram com o Estatuto da Mulher Casada, com isso a legislação não extirpou

a culpa da discussão da guarda judicial na ação de separação judicial13.

Com a Lei n. 6.515/77 - Lei do Divórcio, que apesar de ter estendido as

hipóteses de regulamentação do regime de guarda dos filhos, o legislador repetiu o

12 OLIVEIRA FILHO, Bertoldo Mateus de. Direito de família: aspectos sociojurídicos do casamento, união estáveis e entidades familiares. São Paulo: Atlas, 2011, p. 121. 13 DINIZ, Op. Cit., 2007.

13

dispositivo previsto no Código Civil de 1916, que permite ao magistrado socorrer-se

de outras formas para proteger os interesses dos menores.

Dispondo sobre o princípio da isonomia entre homens e mulheres, entra em

vigor a Constituição Federal de 198814, estabelecendo que a guarda dos filhos deve

ser estabelecida com base no princípio da prevalência dos interesses dos menores,

observando que nem sempre o cônjuge “inocente” pode preservar tais interesses.

Após dois anos, a Lei Federal n° 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da

Criança e do Adolescente - ECA, em seu artigo 28, § 1°; “sempre que possível, a

criança ou adolescente deverá ser previamente ouvido e sua opinião devidamente

considerada”15, portanto, leva em consideração, em relação à guarda de criança, à

vontade da criança, tendo por embasamento a proteção integral da criança e do

adolescente, segundo o direito fundamental de que cada um deles deve ser criado

no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta. Do mesmo

dispositivo, o artigo 32 preconiza que “ao assumir a guarda ou a tutela, o

responsável prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo,

mediante termos nos autos”16.

O Código Civil de 2002 em seu capitulo XI art. 1.583 a 1.590 - Da Proteção da

Pessoa dos Filhos, priorizou os superiores interesses das crianças e dos

adolescentes, que prevalecerão, sempre, sobre os dos adultos17. Portanto, o instituto

da guarda é destinado à proteção de menores de idade e ao longo das décadas,

tanto a sociedade como o instituto da guarda vem passando por inúmeras

modificações.

Atualmente, o Projeto de Lei n. 674, de 25 de outubro de 2007, prevendo que

os casais com filhos, em caso de divórcio, poderão optar pela via extrajudicial

(diretamente no cartório), também, se houver acordo quanto à situação da guarda

dos filhos menores18.

As considerações acima, levam a entender que com todas essas mudanças

de valores, a figura paterna começou a reassumir gradativamente uma

responsabilidade diante do lar, tendo um desejo de se relacionar melhor e mais

14 BRASIL. Op. Cit., 2011a - CD ROM. 15 BRASIL. 2011b, p. 4 - CD ROM. 16 BRASIL, Op. Cit., 2009b, p. 5 - CD ROM. 17 BRASIL. 2011c, p. 153-154 - CD ROM. 18 IBDFAM. Instituto Brasileiro de Direito de Família. Estatuto das famílias, que altera regras sobre guarda de filhos, segue para o Senado. Jornal da Câmara, 23/12/2010. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?clippings&clipping=4233> Acesso em: 18 mai. 2011.

14

tempo com seus filhos, almejando urgentemente por uma nova mudança no instituto

da guarda, em que tanto a mãe quanto o pai possam se relacionar com o seu filho.

Nesse sentido afirma PERES:

Com essa modificação de valores, surge consequentemente um anseio por mudanças, que está cada vez mais forte na sociedade em virtude principalmente do nítido desequilíbrio que existe nas relações parentais, uma vez que na maioria dos casos de ruptura conjugal é a figura materna que permanece com a guarda dos filhos, contrariando consequentemente uma das maiores tendências que vem se manifestando no século XXI, ou seja, o principio de igualdade19.

A guarda, portanto, corresponde ao exercício do poder familiar inerente aos

pais, no sentido de terem os filhos sob seus cuidados e responsabilidades. Nesse

sentido, dispõe o art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. § 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros. § 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados. § 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários. § 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público20.

Logo, a guarda significa a posse dos pais sobre os filhos, e, ter os filhos em

seu poder nada mais é do que tê-los sob guarda e cuidados.

19 PERES, Luiz Felipe Lyrio. Guarda compartilhada. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002, p. 2. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/3533>. Acesso em: 10 mai. 2011. 20 BRASIL. Op. Cit. 2010b, p. 5.

15

2.3 CONCEITO DE GUARDA

A princípio entende-se a guarda para exprimir proteção, ou seja, imposta a

certas pessoas de ter em vigilância, zelando pela sua conservação, coisas que lhes

são entregues ou confinadas, bem assim manter em vigilância e zelo, protegendo-

as, certas pessoas que se encontram sob sua chefia ou direção.

Em outro sentido, segundo LEITE é:

Palavra empregada para designar a pessoa que é posta em algum lugar para vigiar o que ali se passa, defendendo o que está sob sua proteção e vigilância de quaisquer pessoas estranhas, que possa trazer dano ou prejuízo. [...] Já a locução guarda de filhos seja no sentido de direito e do dever, que compete aos pais ou a cada um dos cônjuges, de ter em sua companhia ou de protegê-los, nas diversas circunstâncias indicadas na lei civil. [...] E guarda, neste sentido, tanto significa a custódia como a proteção que é devida aos filhos pelos pais21.

Dessa forma, a guarda é um direito que impõe extensos deveres para com o

menor.

A doutrina divide o conceito de guarda em física ou material e jurídica ou

legal. A primeira diz respeito à situação do menor de estar na presença física

daquele que detém a guarda e, a segunda, se refere aos direitos e às obrigações

decorrentes do instituto, como sustento, criação, educação, proteção, correção, guia

moral e intelectual, etc.22.

Sustenta GRISARD FILHO:

A guarda não se define por si mesma, senão através dos elementos que a asseguram. Conectada ao poder familiar pelos arts. 1.634, II, do C.C. e 21 e 22 do ECA, com forte assento na ideia de posse, como diz o art. 33, §1°, dessa Lei especial, surge como um direito-dever natural e originário dos pais, que consiste na convivência com seus filhos e é o pressuposto que possibilita o exercício de todas as funções parentais, elencadas naquele artigo do CC23.

Assim, no entendimento de CARBONERA:

21 LEITE, Gisele. Ponderações sobre a guarda de menor. 2002. Universo Jurídico. Ano X - 11 de Junho de 2011. Disponível em: <http://uj.com.br/publicacoes/doutrinas/1154/PONDERACOES_SOBRE_A_GUARDA_DE_MENOR> Acesso em: 15 mai. 2011. 22 GRISARD FILHO, Op. Cit. 2009 23 GRISARD FILHO, Op Cit. 2009, p. 58.

16

O termo guarda como o ato ou o efeito de guardar e proteger o bem tutelado é exercido por um guardião que sempre alerta, atuará para evitar qualquer dano. Tem como função a responsabilidade de manter a coisa intacta e, caso não logre êxito em sua atividade, responderá pelo descumprimento de seu papel. Esta coisa trata-se do guardado, ou seja, o objeto que está sob os cuidados do guardião que está dotado de, pelo menos duas características básicas: a preciosidade e a fragilidade. É a existência de um valor que provoca nas pessoas a percepção da vontade de pôr a salvo de estranho o que tem sob sua guarda, com a intenção de não correr risco de perda24.

Isso implica dizer que o instituto da guarda é um conjunto de direitos e

deveres atribuídos aos pais em relação aos filhos menores, com o objetivo de

proteger e suprir as suas necessidades, cuja responsabilidade é atribuída por lei ou

mediante decisão judicial25.

Novos rumos mais adequados ao instituto da guarda de filhos vêm sendo

deferidos. Várias foram as modalidades de guarda de filhos encontradas no

ordenamento jurídico. No entanto, o objetivo do próximo capítulo é pormenorizar a

guarda compartilhada, como forma de identificar claramente seus efeitos com

relação à criança, o impacto na sua vida social e emocional, como também o

desempenho compartilhado da responsabilidade parental ao interesse do filho.

24 CARBONERA, Silvana Maria. Guarda de filhos na família constitucionalizada. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2000, p. 44. 25 CARBONERA, Op. Cit. 2000.

17

3 A GUARDA COMPARTILHADA - LEI N. 11.698/2008

3.1 CONCEITUAÇÃO E GENERALIDADES

A guarda compartilhada será exercida por ambos os pais numa

responsabilização conjunta para o exercício do poder familiar. Ou seja, o genitor não

guardião irá participar ativamente nas decisões e interesses a respeito dos filhos

menores. Desse modo, a guarda compartilhada não impõe limites e sim incentiva a

participação efetiva dos genitores no cotidiano dos filhos, como também, tende a

diminuir os conflitos de lealdade os quais podem ser resumidamente traduzidos

como sendo a necessidade da criança ou adolescente de escolher, defender, tomar

o partido de um dos pais em detrimento do outro.

A Constituição Federal de 1988 em seu art. 229 impõe aos pais “o dever de

assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e

amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”26. O Estatuto da Criança e do

Adolescente - Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 de forma objetiva, atribui em seu

artigo 4º, que:

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência familiar e comunitária27.

.

Observa-se que tal previsão contida no art. 4º do ECA deu efetividade ao

artigo 227, da CF/1988, que consolida como dever da família, da sociedade e do

Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos os

direitos fundamentais, dentre os quais, o direito à convivência familiar.

Estabelece o art. 5º do ECA que: “nenhuma criança ou adolescente será

objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência,

crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado por ação ou

omissão, aos seus direitos fundamentais”. Nos artigos subsequentes, afirma

26 BRASIL. Op. Cit. 2011a, p. 128. 27 BRASIL, 2011b, p. 1

18

PEREIRA, o Estatuto da Criança e do Adolescente trata das disposições que devem

ser observadas e garantidas às crianças e adolescentes, para a garantia dos direitos

fundamentais assegurados no artigo 4º, já referido28.

Então, desde a Constituição Federal de 1988, do Estatuto da Criança e do

Adolescente e do Código Civil de 2002 a adoção da guarda compartilhada já era

perfeitamente admissível, pois a nível constitucional e infraconstitucional, já se

encontrava no Brasil suporte para sua plena adoção. Para TAVEIRA, drásticas

foram as mudanças surgidas com a promulgação da Constituição Federal de 1988,

igualando homens e mulheres em direitos e obrigações. Assim, se faz importante

que ambos estejam cientes da responsabilidade de participação de cada um na vida

dos filhos e a guarda compartilhada é um caminho muito interessante para se atingir

esse fim. O poder paternal pertence a ambos os pais, quer na constância do

matrimonio (ou sociedade de fato), quer rompido o laço de união do casal. Os pais

devem exercê-lo de comum acordo e, se este faltar, em questão de particular

importância, qualquer dos genitores poderá recorrer à esfera jurisdicional29.

Com o propósito de avançar, a Lei n. 11.698, de 13 de junho de 2008,

disciplinou a guarda compartilhada dando nova redação aos artigos 1.583 e 1.584

do Código Civil, assim dispõem:

Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. § 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. § 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: I - afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; II - saúde e segurança; III - educação. § 3º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos. § 4º VETADO. Lei n. 11.698, de 13-6-2008. Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:

28 PEREIRA, Clovis Brasil. A guarda compartilhada, o novo instrumento legal para enriquecer e estreitar a relação entre pais e filhos. Revista Jus Vigilantibus, Quinta-feira, 10 de julho de 2008. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/34567> Acesso em: 20 mai. 2011. 29 TAVEIRA, Alberto Atência. Guarda compartilhada: uma nova perspectiva sobre os interesses psic...(2-2), 2002. Disponível em: <http://www.pailegal.net/guarda-compartilhada/578> Acesso em: 4 jun. 2011.

19

I - requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; II - decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. (Incisos I e II acrescidos pela Lei no 11.698/2008, Art. 42, § 5º, do ECA). § 1º Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. § 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada. § 3º Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar. § 4º A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência com o filho. § 5º Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade (§§ 1º a 5º acrescidos pela Lei n. 11.698/2008, Art. 1.587 deste Código)30.

Em sua conceituação legal, “a guarda compartilhada é a responsabilização

conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe, dos filhos comuns”31.

Para DEIRDRE citado por PARIZZATO:

A guarda compartilhada almeja assegurar o interesse do menor, com o fim de protegê-lo, e permitir o seu desenvolvimento e a sua estabilidade emocional, tornando-o apto à formação equilibrada de sua personalidade. Busca-se diversificar as influências que atuam amiúde na criança, ampliando o seu espectro de desenvolvimento físico e moral, a qualidade de suas relações afetivas e a sua inserção no grupo social. Busca-se, com efeito, a completa e a eficiente formação sócio-psicológica, ambiental, afetiva, espiritual e educacional do menor cuja guarda se compartilha32.

Portanto, considera-se que a guarda compartilhada tende a diminuir os

conflitos de lealdade os quais podem ser resumidamente traduzidos como sendo a

necessidade da criança ou adolescente de escolher, defender, tomar o partido de

um dos pais em detrimento do outro.

Segundo o entendimento de GRISARD FILHO, a guarda compartilhada:

30 BRASIL. Op. Cit. 2011c, p. 153-154 - CD ROM. 31 OLIVEIRA FILHO. Op. Cit, 2011, p. 109. 32 DEIRDRE, Neiva. A Guarda compartilhada. Pai Legal, 2002 citado por PARIZATTO, João Roberto. Manual prático do direito de família. 2. ed. p. 380. São Paulo: Edipa, 2008.

20

Assume uma importância extraordinária, na medida em que valoriza o convívio do menor com seus dois pais, pois mantém, apesar da ruptura conjugal, o exercício em comum da autoridade parental e reserva, a cada um dos pais, o direito de participar das decisões importantes que se referem à criança. [...] Este modelo, priorizando o melhor interesse dos filhos e a igualdade dos gêneros no exercício da parentalidade, é uma resposta mais eficaz à continuidade das relações da criança com seus dois pais na família dissociada, semelhantemente a uma família intacta. É um chamamento dos pais que vivem separados para exercerem conjuntamente a autoridade parental, como faziam na constância da união conjugal, ou de fato33.

O fato dos pais estarem separados, não pode significar para a criança um

bloqueio ao direito de convivência com ambos. Assim, a guarda compartilhada vem

com a ideia de que tanto o pai quanto a mãe devem estar presentes na educação

dos filhos, exercendo conjuntamente esse direito, pois, legalmente, possuem

igualdade de condições.

Sábias palavras de PEREIRA, quando anota que compartilhar, ao contrário

do que muitos pais imaginam, não é simplesmente dividir a responsabilidade e o

tempo de convivência, mas sim, pensar junto, fazer junto, proporcionar junto, o que é

melhor para o desenvolvimento emocional, material e moral dos filhos. Cabe agora

aos pais, entenderem o verdadeiro significado da nova modalidade de guarda

introduzida na legislação pátria. Os filhos, com certeza, ficarão eternamente gratos

se, na prática, isso ocorrer de forma efetiva e verdadeira34.

Para TAVEIRA, é importante se frisar que na guarda compartilhada não existe

um arranjo padrão, ou seja, o melhor arranjo será aquele que possibilitar o maior

contato das crianças com os pais, os quais deverão dispensar interesses em seu

bem estar, saúde, educação e seu desenvolvimento como um todo. Essa

modalidade de guarda surge como uma solução que incentiva ambos os genitores a

participarem igualmente da convivência, educação e responsabilidade pela prole.

Deve ser compreendida como aquela forma de custódia em que as crianças têm

uma residência principal e que define ambos os genitores como detentores do

mesmo dever de guardar os filhos. É inovadora e benéfica na maioria dos casos em

que os pais aceitam cooperar entre si visando o bom desenvolvimento da prole

sendo também, muitas vezes bem sucedida mesmo quando o diálogo não é bom

entre as partes, desde que estas sejam capazes de discriminar seus conflitos

conjugais do adequado exercício da parentalidade. De acordo com o autor:

33 GRISARD FILHO. Op. Cit. 2009, p. 220. 34 PEREIRA, Op. Cit. 2008.

21

O que se procura atualmente é levar em conta a vontade e o direito dos filhos de terem a função parental preenchida, de forma igualitária, por seus pais. O tempo em que a mulher apenas aos filhos se dedicava e o homem ao trabalho, privado da convivência familiar, não existe mais. Os filhos devem ter seus ideais identificados, tanto com a mãe quanto com o pai, profissionais e cidadãos responsáveis, pois assim crescerão com maiores possibilidades de vivência salutar e completa, na sociedade da qual farão parte35.

Daí a extrema importância dos pais compreenderem que, com a guarda

compartilhada, só haverá ganhadores, nenhum perdedor e que, sobretudo, os

direitos e interesses do menor poderão ser satisfeitos sem maiores traumas, de

modo a obterem um melhor padrão de desenvolvimento. Como também, é de suma

importância que o casal tenha consciência que as crianças precisam tê-los por perto

e de não transformar os filhos em um instrumento de batalha contra o ex-cônjuge.

Ter com quem dividir a responsabilidade de criar, educar e sustentar os filhos pode

tornar essas tarefas menos difíceis e é por isso que o entendimento de que a guarda

compartilhada está mais próxima disso.

3.2 A GUARDA COMPARTILHADA NO DIREITO COMPARADO

Há muito tempo no direito alienígena, à guarda compartilhada já é utilizada

como uma forma de superar as limitações trazidas pelo arcaico sistema de visitas,

por possibilitar um melhor nível de relacionamento entre pais e filhos.

Segundo TAVEIRA, nos países europeus e americanos deixou de predominar

a guarda unilateral, pois nos mesmos, através de pesquisas e estudos, conclui-se

que a guarda conjunta é a forma mais benéfica ao desenvolvimento global do

menor, com adaptação de suas legislações às realidades sociais e econômicas nas

áreas que regem a igualdade entre os ex-cônjuges e entre esses e seus filhos,

resultantes da extinta união conjugal36.

Para AZEVEDO citada por SCHWARTZ:

A guarda compartilhada, já utilizada há décadas no Direito alienígena, é o melhor modelo a ser praticado, porque privilegia a busca de preservação

35 TAVEIRA. Op. Cit. 2002, p. 3 36 TAVEIRA. Op. Cit. 2002.

22

com o melhor nível de relacionamento entre os pais, e cria a possibilidade de propiciar o desenvolvimento ótimo, dos filhos de pais separados37.

A guarda compartilhada teve sua origem na Inglaterra, ou seja, nasce dentro

do sistema common law, na década de 1960, onde ocorreu a primeira decisão

relativa ao instituto joint custody. Como expressa OLIVEIRA LEITE:

A manifestação inequívoca dessa possibilidade por um Tribunal inglês só ocorreu em 1964, que demarca o início de uma tendência que fará escola na jurisprudência inglesa. Em 1972, a Court d´Appel da Inglaterra, na decisão Jussa x Jussa, reconheceu o valor da guarda conjunta, quando os pais estão dispostos a cooperar e, em 1980 a Court d´Appel da Inglaterra denunciou, rigorosamente, a teoria da concentração da autoridade parental nas mãos de um só guardião da criança. No célebre caso Dipper x Dipper, o juiz Ormrod, daquela Corte, promulgou uma sentença que, praticamente, encerrou a atribuição da guarda isolada na história jurídica inglesa38.

O interesse maior da criança e a igualdade parental foram privilegiados nas

decisões inglesas, fazendo repercutir nas províncias canadenses da common law.

De lá passou à França, espalhou-se pela Europa, depois atravessou o Atlântico

penetrando no Canadá, alcançando, inclusive, os Estados Unidos, que atualmente

aplica a noção de guarda compartilhada na maioria de seus Estados, objetivando o

equilíbrio dos direitos do pai e da mãe.

3.2.1 No direito francês

De acordo com BARRETO, a guarda compartilhada, na França, surgiu em

1976. A influência do novo instituto não demorou a se manifestar de maneira mais

contundente. O Código Civil Francês estabeleceu com a inovação trazida pela Lei

Malhuret - Lei n. 87.570, de 22 de julho de 1987, que, após a oitiva dos filhos

menores, o juiz deve fixar a autoridade parental (expressão que lá substituiu o termo

guarda), de acordo com interesses e necessidades dos filhos e, caso fique

37 AZEVEDO, Maria Raimunda Teixeira de. Seminário organizado pela OAB/RJ, em 25 de abril de 2001 citada por SCHWARTZ, Gustavo Bassini. Argumentos a favor da guarda compartilhada. 2005. Disponível em: <http://www.direitodefamilia.com.br/Mate...dMater=183> Acesso em: 20 mai. 2011. 38 OLIVEIRA LEITE, Eduardo de. Famílias monoparentais: a situação jurídica de pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2. ed. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos tribunais, 2003, p. 266.

23

estabelecida a guarda única, o magistrado deverá decidir com quem ficarão. Mas,

estando o casal de acordo, basta uma declaração conjunta perante o juiz, para que

seja decidido pelo compartilhamento da guarda39.

Assim, as vastas jurisprudências favoráveis à guarda conjunta harmonizaram

o Código Civil francês. A Lei Malhuret permite aos pais organizarem sua

comunidade de criação e educação dos filhos, para além do divórcio.

Segundo PEREZ, com a referida lei, o pátrio poder deverá ser exercido por

ambos os genitores, mesmo após o fim da sociedade conjugal, retirando a

característica da divisibilidade da guarda após o divórcio, e impondo a

responsabilidade compartilhada em relação à vida e aos bens do menor. Os

avanços trazidos pela referida lei, em muito privilegiaram os cuidados relativos aos

interesses da criança, sobretudo, no planejamento familiar no tocante às decisões

sobre a vida do menor, mesmo após a separação dos pais40.

Portanto, foram consideráveis avanços no campo da guarda compartilhada

que, mesmo no caso de casais não casados, ou seja, de união livre, unidos ou não,

é reconhecido ao pai o direito de solicitar ao judiciário, o exercício conjunto da

guarda.

3.2.2 No direito inglês

.

Afirma BARRETO, a guarda compartilhada no direito inglês busca-se distribuir

igualmente, entre os genitores, as responsabilidades perante os filhos, cabendo à

mãe os cuidados diários com o filho - care and control - resgatado ao pai o poder de

dirigir conjuntamente a vida dos menores - custody. As decisões inglesas

privilegiaram o interesse maior da criança e a igualdade parental, fazendo repercutir

nas províncias canadenses da common law, alcançando, inclusive, os Estados

39 BARRETO, Lucas Hayne Dantas. Considerações sobre a guarda compartilhada. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 108, 19 out. 2003. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/4352>. Acesso em: 4 jun. 2011. 40 PEREZ, Suellen da Costa. Guarda compartilhada: sob o enfoque do melhor interesse do menor. 2005. 60 f. Monografia (Bacharelado em Direito) - Fundação de Ensino Eurípides Soares da Rocha, mantenedora do Centro Universitário Eurípides de Marília - UNIVEM. Disponível em: <http://www.apase.org.br/81012-soboenfoque.htm.> Acesso em: 4 jun. 2011.

24

Unidos, que atualmente aplica a noção de guarda compartilhada na maioria de seus

Estados, objetivando o equilíbrio dos direitos do pai e da mãe41.

3.2.3 No direito americano

No direito americano, a guarda compartilhada foi absorvida intensamente,

desenvolvendo-se em larga escala, devido às preocupações oriundas de filhos de

divorciados e suas alterações comportamentais. A influência também foi grande, nos

chegando-se à edição do Uniform Child Custody Jurisdiction Act, que buscou

uniformizar a jurisprudência em todo o país. Inúmeros juristas americanos estão

dedicando-se a pesquisar e discutir uma aplicação cada vez mais uniforme em todo

o país. Ou seja, sustenta PEREZ:

Na mesma linha de raciocínio, objetiva-se assegurar ao menor um contato ininterrupto com os seus pais, sendo que a estes caberia a divisão dos direitos e das responsabilidades. Atualmente, em todos os estados norte-americanos, a guarda compartilhada é aceita legalmente, sendo autorizada de forma expressa, presumida ou decorrente do acordo entre os pais42.

A maior contribuição do direito norte-americano ao instituto em análise, sem

dúvida, foi admitir uma presunção natural de que a guarda compartilhada está nos

melhores interesses do menor, pois é o que se pretende resguardar através do novo

modelo. Desta forma, a regra é o compartilhamento; a exceção deve ser muito bem

fundamentada para ser admitida. A mesma presunção natural, em relação aos

interesses do menor, é reconhecida no direito canadense, tornando-se, dessa

maneira, um dos principais argumentos dos defensores do instituto43.

3.2.4 No direito canadense

A pedra de toque para a adoção da guarda compartilhada no direito

canadense, da qual resulta uma presunção de guarda conjunta, como melhor

41 BARRETO. Op. Cit, 2003. 42 PEREZ. Op. Cit., 2005. 43 BARRETO. Op. Cit, 2003.

25

interesse do menor, onde, a separação dos genitores não deve gerar um sentimento

de perda para nenhuma das partes envolvidas, seja mãe, pai, ou filhos44.

Atualmente, no direito canadense, os tribunais decidem no sentido de, em

caso de pais separados, será garantido o direito de guarda através do instituto da

guarda compartilhada. Em função desta, possuir benefícios psicológicos para todos

os envolvidos. O relacionamento entre pais e entre pais e filhos torna-se melhor. A

sessão dezesseis de The Divorce Act, de 1985, diz que o Tribunal deve garantir à

criança o contato constante com cada pai, na medida de seus interesses45.

3.2.5 No direito alemão

Até 1982, no direito alemão possuía uma lei sobre guarda que estipulava que

a entrega da guarda deveria se basear no interesse do filho, devendo predominar a

guarda unilateral. Essa regra foi considerada inconstitucional e a Corte

Constitucional entendeu que o Estado não pode intervir, quando ambos os pais,

depois do divórcio, são capazes e dispostos à guarda conjunta/compartilhada de

seus filhos46.

3.2.6 No direito português

Conforme TAVEIRA, os Tribunais portugueses passaram a admitir a guarda

conjunta, mesmo antes de possuírem previsão legal para a mesma, recomendando-

a como a mais adequada ao interesse do menor. Com a entrada em vigor da Lei n.

84, de 31 de agosto de 1995, no direito português, passou-se a facultar aos pais

acordarem sobre o exercício da guarda comum de seus filhos47.

Com a entrada em vigor da referida lei, foi alterado parte do artigo 1.906 do

Código Civil Português, cujo n. 2 estabelece que os pais podem acordar sobre o

44 BARRETO. Op. Cit, 2003. 45 GRISARD FILHO. Op. Cit, 2009. 46 BARRETO. Op. Cit, 2003. 47 TAVEIRA. Op. Cit. 2002.

26

exercício comum do poder paternal, decidindo as questões relativas à prole em

condições idênticas à que vigoravam na constância do matrimônio. Assim, Portugal

introduziu em sua legislação um breve conceito de guarda compartilhada. Nas

palavras de TAVEIRA:

A maioria dos países integrantes do movimento, porém, o Poder Judiciário é um dos principais fomentadores dos conflitos que ocorrem na separação conjugal, devido a falta de adaptação às mudanças sociais, baseando até hoje suas decisões no pressuposto de que uma criança é propriedade de um dos seus genitores. Crianças são usadas, com freqüência, por pais irresponsáveis e por profissionais sem ética, para fomentar a ‘Indústria do Divórcio’, apoiando-se na discriminação praticada pelo judiciário48.

Pode-se considerar nos sistemas citados acima, constitui, na opinião de

GRISARD FILHO, a vanguarda inquestionável no estudo da guarda compartilhada

como um modelo de cuidado parental que garante aos dois genitores um papel mais

ativo em relação aos filhos do divórcio, e o foro de seu desenvolvimento. Seguindo a

trilha aberta pelos diplomas internacionais e legislação alienígena mais avançada, o

Direito brasileiro igualmente elegeu o interesse do menor como fundamental para

reduzir os efeitos patológicos que o impacto negativo das situações familiares

conflitivas provoca na formação da criança. Assim, é perceptível entender que, não

existe e nem deve existir rigidez de hábitos e formas que só prejudicam a igualdade

e a liberdade dos cônjuges referente a sociedade conjugal e diminuem o exercício

da paternidade responsável49.

Finalizando o estudo deste capítulo, observa-se que foram várias as

alterações em relação à guarda dos filhos. Uma série de modificações legislativas foi

surgindo neste instituto, encontrando em nosso ordenamento jurídico, vasta

admissibilidade, no próprio texto Constitucional, na Lei do Divórcio e mesmo no

Estatuto da Criança e do Adolescente.

48 TAVEIRA. Op. Cit. 2002. 49 GRISARD FILHO. Op. Cit., 2009.

27

4 APLICABILIDADE DA LEI N. 11.698/2008 E A RESPONSABILIDADE DOS PAIS

4.1 VANTAGENS DA GUARDA COMPARTILHADA

Sob o ponto de vista do bem-estar da criança, não restam dúvida das

vantagens do compartilhamento das responsabilidades parentais. Sendo assim, se

constrói o consenso que a guarda compartilhada é o melhor modo de os pais

cuidarem dos filhos quando do rompimento da relação conjugal. Este novo modelo

de responsabilidade parental consiste numa modalidade de guarda onde ambos os

genitores têm a responsabilidade legal sobre os filhos menores e compartilham, ao

mesmo tempo e na mesma intensidade, todas as decisões importantes relativas a

eles, embora vivam em lares separados.

No entendimento de GRISARD FILHO:

Esse amparo está ancorado no texto do art. 229, da Constituição Federal, que impõe aos pais o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, independentemente de conviverem ou não no mesmo lar. O Estatuto da Criança e do Adolescente confirma o preceito maior ao incumbir aos pais o dever de sustento, guarda e educação de seus filhos, sem discriminar ou condicionar o exercício da guarda à convivência dos genitores. Estas disposições convergem aos postulados da Convenção sobre os Direitos da Criança, que lhe proclama uma proteção especial e o pleno direito de ser cuidada por seus pais50.

Assim, a prioridade deste tipo de guarda é inegável ainda se, junto ao

atendimento das necessidades de referenciais socioafetivos inerentes ao

desenvolvimento da geração mais jovem, lembrar-se que ela concretiza o que

preconiza a Convenção sobre o Direito da Criança em seu art. 9º, inciso 3, ou seja:

“[...] o direito da criança que esteja separada de um ou de ambos os seus pais de

manter regularmente relações pessoais e contato direto com ambos, a menos que

isso seja contrário ao interesse maior da criança”51.

50 GRISARD FILHO. Op. Cit., 2009, p. 214. 51 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção sobre os direitos da criança. Adotada pela Resolução L.44 (XLIV) da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20.11.1989 - ratificada pelo Brasil em 24.09.1990. Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/.../crianca.htm> Acesso em: 25 jul. 2011.

28

Nesse sentido, afirma BRUNO, “como a guarda compartilhada só é possível

quando não há a destituição ou a suspensão do poder familiar, está claro que a

convivência plena com ambos os pais não contraria o interesse maior da criança”52.

Nessa perspectiva segundo PARIZATTO:

Na guarda compartilhada, onde o menor apesar de residir com um dos pais poderem ficar com o outro também, tem seus benefícios, cabendo nesse caso as responsabilidades a ambos os cônjuges, que exercitarão o poder familiar conjuntamente, em igualdade de condições que se adapta ao regime constitucional. É uma excelente oportunidade de os filhos ficarem sob a guarda de ambos os pais, contribuindo-se para sua própria formação educacional e moral53.

Na verdade, a guarda compartilhada é uma excelente oportunidade da

criança ou do adolescente ficar sob a guarda de ambos os pais, contribuindo-se para

sua própria formação educacional e moral, sendo tal convivência fundamental para a

construção da identidade social e subjetiva da criança e do adolescente em

processo de desenvolvimento. Além de permitir que os pais sejam mais

participativos da vida dos filhos, com igualdade de importância e relevância na vida

dos filhos. Como também, dificulta a usarem seus filhos como armas para atacar

seus ex-cônjuges, beneficiando assim, tanto os filhos como também os pais,

possibilitando a redução do stress e do acúmulo de responsabilidade do genitor que

é o guardião único; favorece a que ambos compartilhem a educação dos filhos;

ambos ficam mais satisfeitos, principalmente se tomarem a decisão sobre a guarda

em si e não por imposição de uma decisão judicial54.

Para OLIVEIRA FILHO:

A principal vantagem da guarda compartilhada é valorizar o conteúdo jurídico e social da convivência entre pais e filhos, mesmo porque, ressalvados os casos imperativos da exclusividade do encargo à vista de motivos importantes (fase lactente do neonato, diminuta idade do filho, necessidades especiais, cuidados ininterruptos de saúde, entre outros), o antagonismo guarda/visita sempre teve uma compreensão de implícita

52 BRUNO, Denise Duarte. A guarda compartilhada na prática e as responsabilidades dos pais. In: Congresso Brasileiro de Direito de Família, Belo Horizonte, 2009. Família e responsabilidade: teoria do direito de família. (Coordenado por Rodrigo da Cunha Pereira). Porto Alegre: Magister/IBDFAM, 2010, p. 223. 53 PARIZATTO, João Roberto. Manual prático do direito de família. 2. ed. São Paulo: Edipa. 2008, p. 380. 54 ALVES, Leonardo Barreto Moreira. A Guarda compartilhada e a lei nº 11.698/08. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2106, 7 abr. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12592>.Acesso em: 25 jul. 2011.

29

qualidade assimétrica. É dizer que, no senso comum do entendimento leigo, a guarda tem um plus em face do direito apenas de visita, malgrado a complementaridade de ambos os institutos55.

Assim, o filho, usufruindo de lares que se completam na finalidade de abrigo e

proteção, vivencia um projeto comum de felicidade tripartite capaz de restaurar, em

boa extensão, os sentimentos fragmentados pela separação dos pais. A custódia

conjunta permite ainda, que pela maior disponibilidade de tempo passado em

comum com o filho também os familiares dos casais separados possam integrar a

vivência continuada, principalmente porque há naturalmente na criança as afluentes

referências parentais dos núcleos paterno e materno.

Na antevisão de LÔBO, são evidentes as vantagens da guarda

compartilhada:

Prioriza o melhor interesse dos filhos e da família, prioriza o poder familiar em sua extensão e a igualdade dos gêneros no exercício da parentalidade, bem como a diferenciação de suas funções, não ficando um dos pais como mero coadjuvante, e privilegia a continuidade das relações da criança com seus pais. Respeita a família enquanto sistema, maior do que a soma das partes, que não se dissolve, mas se transforma, devendo continuar sua finalidade de cuidado, proteção e amparo dos menores. Diminui, previamente, as disputas passionais pelos filhos, remetendo, no caso de litígio, o conflito conjugal para seu âmbito original, que é o das relações entre adultos. As relações de solidariedade e do exercício complementar das funções, por meio da cooperação, são fortalecidas a despeito da crise conjugal que o casal atravessar no processo de separação56.

Nesse contexto, o grande mérito da Lei n. 11.698/2008 é possibilitar mudança

de paradigma, pois o ponto mais importante é a convivência compartilhada, onde o

filho deve sentir-se bem, seja na residência de um quanto na do outro. Portanto, a

sentença que resume a guarda compartilhada é a união no exercício em comum da

responsabilidade dos pais para com o melhor interesse da criança e do adolescente.

Os pais precisam saber que inexiste um plano de cuidado parental que não traga

efeitos colaterais. O exercício compartilhado da guarda obrigará os pais a conciliar e

harmonizar suas atitudes pessoais a favor do bem estar dos filhos, afirmando a co-

parentalidade e o direito de serem criados e educados por ambos os pais em

55 OLIVEIRA FILHO. Op Cit., 2011., p. 109. 56 LÔBO, Paulo Luzi Netto. Guarda e convivência dos filhos após a Lei n. 11.698/2008. Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, v. 6, p. 33, out./nov. 2008.

30

condições de plena igualdade e com eles manter relações pessoais e estreito

contato direto57.

Daí concluir que, a guarda compartilhada possui pontos favoráveis, tais como:

maior responsabilidade dos genitores ao atendimento das necessidades dos filhos;

maior interação do pai e da mãe no desenvolvimento físico e mental das crianças;

menos atrito entre os ex-cônjuges, pois deverão, em conjunto, atender as

necessidades dos filhos por um caminho de cooperação mútua.

GRISARD FILHO observa que, não são só os filhos que se beneficiam desse

modelo de guarda, pois:

Em relação aos pais a guarda compartilhada oferece múltiplas vantagens. Além de mantê-los guardadores e lhes proporcionar a tomada de decisões conjuntas relativas ao destino dos filhos, compartilhando o trabalho e as responsabilidades, privilegiando a continuidade das relações entre cada um deles e seus filhos, minimizando o conflito parental, diminui os sentimentos de culpa e frustração por não cuidar dos filhos, ajuda-os a atingir os objetivos de trabalharem em prol dos melhores interesses morais e materiais da prole. Compartilhar o cuidado aos filhos significa conceder aos pais mais espaço para suas outras atividades58.

Assim, a guarda compartilhada não deixa de reafirmar a igualdade parental

desejada pela Constituição Federal. Os genitores continuam a ter participação na

vida do menor como se dava no período em que viviam sobre o mesmo teto, de

forma que sempre prevalecerá o melhor interesse do menor. Os sentimentos de

todos os envolvidos também são afetados de forma positiva, conforme destaca

DIAS:

O compartilhar da guarda dos filhos é o reflexo mais fiel do que se entende por poder familiar. A participação no processo de desenvolvimento integral dos filhos leva à pluralização das responsabilidades, estabelecendo verdadeira democratização de sentimentos59.

Sendo assim, faz-se necessário que as barreiras que geram divisão entre os

pais em relação a criação e educação dos filhos, na ocorrência da separação ou

divórcio, sejam superadas, para que os filhos, oriundos da falida união, tenham um

57 ALVES. Op Cit., 2009. 58 GRISARD FILHO. Op. Cit., 2009, p. 222. 59 DIAS, Maria Berenice. Guarda compartilhada, uma novidade bem-vinda! Disponível em: www.mariaberenice.com.br/.../1_-_guarda_compartilhada,_uma_novidade...Acesso em: 25 jul. 2011.

31

desenvolvimento seguro e saudável, vindo a tornarem-se cidadãos úteis e

necessários ao desenvolvimento da sociedade em que viverem.

4.2 ALIENAÇÃO PARENTAL E A GUARDA COMPARTILHADA

A síndrome da alienação parental constitui uma forma grave de maltrato e

abuso contra a criança, que se encontra especialmente fragilizada por estar vivendo

um conflito que envolve a figura de seus próprios pais.

O artigo 2° da Lei n. 12.318, de 26 de agosto de 2010 estabelece que:

Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este60.

Segundo TRINDADE, a síndrome da alienação parental é:

Um tipo sofisticado de maltrato ou abuso, e o direito deveria estudar novos caminhos para reparar o dano que recai sobre o filho(a) e sobre o alienado. A responsabilização civil e criminal do alienador pode representar um freio ao ódio inveterado que produz a metamorfose do amor. [...] o alienador, como todo abusador, é um ladrão da infância, que utiliza a inocência da criança para atacar o outro. A inocência e a infância, uma vez roubadas, não podem mais ser devolvidas61.

Com a aprovação da Lei n. 12.318/2010, o Poder Judiciário ganhou mais

força, podendo ser punidos o alienador, como consequência a perda do Poder

Familiar, pois, sustenta DIAS:

Flagrada a presença da síndrome da alienação parental, é indispensável a responsabilização do genitor que age desta forma por ser sabedor da dificuldade de aferir a veracidade dos fatos e usa o filho com finalidade

60 BRASIL. Lei n. 12.318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. VADE MECUM - CD- ROM, 2011d. 61TRINDADE, Jorge. Síndrome da alienação parental. In: Incesto e alienação parental: realidade que a justiça insiste em não ver / coordenação Maria Berenice Dias. 2. ed. revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 32.

32

vingativa. É necessário que sinta que há o risco, por exemplo, de perda da guarda, caso reste evidenciada a falsidade da denúncia levada a efeito62.

Portanto, sem punição a posturas que comprometem o sadio

desenvolvimento do filho e colocam em risco seu equilíbrio emocional, certamente

continuaria aumentando esta onda de falsas denúncias. Por mais que tais

mecanismos não venham a acabar com os maus-tratos, têm enorme significado,

pois, além de minimizarem as sequelas de ordem psicológica nas pequenas vitimas,

permitem que se identifique com mais segurança quem é o seu autor: o genitor que

de fato pratica os maus-tratos com o filho ou aquele que denunciou falsamente tal

ocorrência, duas formas igualmente perversas de abuso que precisam ser punidas.

Nos ensinamentos de TRINDADE, o primeiro passo para proteger o(a) filho(a)

da ação do alienador, que muitas vezes age desfraldando a bandeira do amor, é

conscientizar os operadores do Direito (juizes, promotores, defensores públicos,

advogados, conselheiros tutelares), os professores e os agentes de saúde (médicos,

psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais), pois os filhos só podem ver aquilo que

a mente está preparada para compreender. Ressalta o autor, em casos de maltrato

e abuso são sempre graves e merecem eficaz reprimenda judicial, inclusive com a

adoção de medidas que façam cessar o abuso, ainda que para isso seja necessário

separar temporariamente o(a) agressor(a) do filho(a). Nesses casos, em se tratando

de uma medida radical e extrema, recomenda-se uma minuciosa avaliação

psicológica dos envolvidos63.

Nas palavras de GAMA, o princípio do melhor interesse da criança representa

mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais em que o filho deixa de ser

considerado objeto para ser alçado - com absoluta justiça, ainda que tardiamente - a

sujeito de direito, ou seja, à pessoa merecedora de tutela do ordenamento jurídico,

mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da família

que ele participa64.

Dentro deste contexto, a criança e o adolescente passam a ter visibilidade,

passando a figurar como sujeito de direitos, pessoa em desenvolvimento e

prioridade absoluta, revolucionando conceitos e práticas até então incorporadas pelo 62 DIAS, Maria Berenice. Incesto e alienação parental: realidade que a justiça insiste em não ver / coordenação Maria Berenice Dias. 2. ed. revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 19. 63 TRINDADE. Op Cit., 2010. 64 GAMA, Guilherme Calmon da. A nova filiação: o biodireito e as relações parentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 456.

33

mundo adulto. Mudar de paradigmas não é tarefa para ser realizada em pouco

tempo, exige compromisso, conhecimento, vontade e renovada disponibilidade por

parte da família, sociedade e do poder público65.

Para DIAS, é necessário ter coragem para ver a realidade, pois:

Não se pode fechar os olhos e fazer de conta que nada acontece. Esta é a missão de cada um que tem o dever de assegurar proteção integral a criança e adolescentes, proteção nem sempre encontrada no reduto do seu lar, que às vezes de doce nada tem66.

Transcreve-se, a seguir o entendimento do Desembargador André Luiz

Planella Villarinho, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, constatadas a

síndrome de alienação parental e o direito de visitas em ambiente terapêutico,

evitando a reedição do trauma experimentado pela criança e o agravamento dos

danos causados ao seu aparelho psíquico, atendendo assim, assegurar à criança o

direito de ser visitada.

AGRAVO DE INSTRUMENTOS. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS PATERNAS. SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL. O direito de visitas, mais do que um direito dos pais constitui direito do filho em ser visitado, garantindo-lhe o convívio com o genitor não guardião a fim de manter e fortalecer os vínculos afetivos. Evidenciado o alto grau de beligerância existente entre os pais, inclusive com denúncias de episódios de violência física, bem como acusações de quadro de síndrome da alienação parental, revela-se adequada a realização das visitas em ambiente terapêutico. Agravo de instrumento parcialmente provido (TJRS, Agln 70028674190, 7ª Câm. Civ. 15.04.2009, rel. Des. André Luiz Planella Villarinho – Santa Cruz do Sul)67.

Também, no entendimento do Desembargador Vieira de Brito, transcreve-se

ementa do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, pelo processo de alienação parental

que põe em situação de risco a integridade psicológica de menores, seguir:

EMENTA: MEDIDA DE PROTEÇÃO INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM FAVOR DE MENORES. SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL. INTERESSE DE MENORES. LEGITIMIDADE. COMPETÊNCIA DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. RECONHECIMENTO. DECISÃO QUE ARQUIVOU O FEITO. DESCABIMENTO. REFORMA. 1. Tendo em vista o disposto nos artigos

65 AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. A criança vítima de violência sexual intrafamiliar: como operacionalizar as visitas? In: Incesto e alienação parental: realidade que a justiça insiste em não ver / coordenação Maria Berenice Dias. 2. ed. revisada, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 66 DIAS. Op Cit., 2010, p. 8. 67 AZAMBUJA. Op. Cit., 2010, p. 313.

34

141 e 201, VIII, da Lei n° 8.069/1990 c/c artigo 82, I, do CPC, o Ministério Público tem legitimidade para figurar no pólo ativo de ação em que se pleiteia a adoção de medidas protetivas contra ALIENAÇÃO PARENTAL. 2. Conjugando-se o disposto no artigo 98, II, com as determinações do artigo 148, § único, d, ambos do ECA, tem-se a competência do Juízo da Infância e da Juventude para conhecer, processar e julgar medida de regulamentação de visita, que busca coibir ALIENAÇÃO PARENTAL promovida pela mãe contra o pai. 3. Impõe-se a reforma da decisão que determinou o arquivamento dos autos em que se pleiteou medida protetiva para menores, se restar verificado a plausibilidade de eles estarem em situação de risco, especificamente em SÍNDROME de ALIENAÇÃO PARENTAL. 4. Recurso provido. APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0114.10.014405-3/001 - COMARCA DE IBIRITÉ – Relator Des. Vieira de Brito. Data do julgamento: 26/05/2011. Data da publicação: 03/08/20168.

Observa-se que o julgado acima, considera que há sérios indícios de situação

de risco dos menores, devido a possível alienação parental.

Mediante o exposto, fica claro que a guarda compartilhada possui o

importante efeito de impedir a ocorrência do fenômeno da alienação parental e a

consequente síndrome da alienação parental, já que, em sendo o poder familiar

exercido conjuntamente, não há que se falar em utilização do menor por um dos

genitores como instrumento de chantagem e vingança contra o genitor que não

convive com o mesmo, situação típica da guarda unilateral ou exclusiva69.

Ou seja, as grandes vantagens da guarda compartilhada é o incremento da

convivência do menor com ambos os genitores, não obstante o fim do

relacionamento amoroso entre aqueles, e a diminuição dos riscos de ocorrência da

alienação parental.

Desse modo, constata-se que, em verdade, a guarda compartilhada tem

como objetivo final a concretização do princípio do melhor interesse do menor

(princípio garantidor da efetivação dos direitos fundamentais da criança e do

adolescente, tratando-se de uma franca materialização da teoria da proteção integral

- art. 227 da Constituição Federal e art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente),

pois é medida que deve ser aplicada sempre e exclusivamente em benefício do filho

menor.

68 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. Apelação cível n° 1.0114.10.014405-3/001 - Comarca de Ibirité – Relator Des. Vieira de Brito. Data do julgamento: 26/05/2011. Data da publicação: 03/08/2011 Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br> Acesso em: 25 jul. 2011. 69 ALVES. Op Cit., 2009.

35

4.3 O DESEMPENHO COMPARTILHADO DA RESPONSABILIDADE PARENTAL

AO INTERESSE DO FILHO

Como já visto no decorre deste estudo, os filhos menores permanecem sob a

responsabilidade e proteção dos genitores até alcançarem a maioridade ou forem

emancipados, caracterizando a temporariedade do poder familiar, que tem duração

limitada. Contudo, ainda que temporária a vigência do poder familiar, não há que se

perder de vista que os valores de respeito entre os membros da família, amor, afeto

e cooperação devem sempre perdurar. Sendo assim, não podem os pais se escusar

de garantir o bem-estar, a formação e a manutenção da prole, devendo zelar pela

vida de filhos, principalmente, enquanto perdurar a menoridade e, estes, por sua vez

a eles são subordinados, devendo-lhes obediência e respeito70.

Quando os pais se dispõem a compartilhar a guarda dos filhos, assumindo

conjuntamente as responsabilidades, mantendo uma postura cooperativa, evitando o

máximo possível comportamento e atitudes que apresentem qualquer viés

competitivo, com certeza, a guarda compartilhada será bem sucedida.

Nesse sentido, as atitudes de caráter cooperativo, sugerindo os pontos que

devem ser observados, pelos adultos quando se dispõem a compartilhar os

cuidados dos filhos, afirma BRUNO, é a confiança e o respeito mútuos, pois:

A confiança e o respeito mútuos vinculam-se à compreensão dos adultos de que a mútua capacidade do pleno exercício parental não se altera, mesmo que tenham deixado de se amar e, possivelmente, causado sofrimento um ao outro. Esta compreensão pode surgir naturalmente quando conseguem desvincular suas mágoas de uma visão mais objetiva sobre a parentalidade, ou pode ser buscada com a intervenção de um mediador, um conciliador ou um terapeuta71.

Independente da forma como se consolide a atitude de confiança e respeito,

uma outra atitude cooperativa lhe deve ser agregada de forma indissociável: o

reconhecimento e a aceitação das diferentes formas como cada um dos adultos

exerce o papel parental. Manter o foco no bem-estar da criança significa tanto

priorizar o direito e a necessidade desta em conviver de forma mais plena possível 70 FRANCISCHETI, Sheila Rosana Leal Rodrigues. A solução para a continuidade do exercício da responsabilidade parental após a ruptura da relação conjugal: a guarda compartilhada dos filhos. (Mestrado em Direito) Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo, 2008. Disponível em: <http://www.fadisp.com.br/.../SHEILA_ROSANA_LEAL_RODRIGUES_ > Acesso em: 25 jul. 2011. 71 BRUNO. Op Cit., 2010, p. 226.

36

tanto com o pai quanto com a mãe, e principalmente, não manter com o filho uma

relação de posse. A relação de posse, via de regra, está ligada a ideia de que sua

felicidade, enquanto adulto, depende de uma relação parental filial quase

simbiótica72.

Portanto, o adulto que consegue deixar claro, através de inúmeras atitudes,

que o filho não é responsável pela felicidade e o bem-estar de seus pais, de que

ambos os pais são capazes de atendê-lo e estão dispostos a fazê-lo, transmite à

criança a confiança de ser amada e protegida, e que é livre para amar tanto o pai

quanto à mãe, sem que isso cause dano a ninguém. Esta é a base para a formação

de adultos íntegros e seguros, pois são as atitudes cooperativas dos pais que

permitem que uma criança se desenvolva plenamente.

Para OLIVEIRA FILHO, em todas as oportunidades em que os pais

conseguirem superar as discordâncias referentes à fruição da companhia dos filhos,

estar-se-á aplicando a medida ideal. Portanto, a exclusão de pontos de atrito, a

apreensão de que a convivência harmoniosa induz o crescimento sadio dos filhos e

a formação deles como indivíduos aptos a compreender as singularidades

sociofamiliais, os pais estarão abandonando ou compreendendo os traumas

pretéritos. Particularizando com cada um dos genitores um vínculo afetivo, os filhos

saberão preservar a identidade e entender as razões que lavaram ao rompimento

dos genitores. Tornam-se, daí, agentes da própria vida e não espólio negativo de um

fracasso amoroso73.

Nas sábias palavras de LÔBO, quando há o desempenho compartilhado da

responsabilidade parental:

[...] favorece e estimula contatos emocionais mais diretos e profundos entre pais e filhos e propicia, na prática, o exercício da responsabilidade parental e a correta formação psíquica da criança e do adolescente. Assim, a criança, para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade, deve crescer num ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão, sendo educada num espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade e solidariedade, com vistas a prepará-la para viver uma vida individual na sociedade74.

72 BRUNO. Op Cit., 2010. 73 OLIVEIRA FILHO. Op. Cit., 2011. 74 LÔBO, Paulo Luiz Netto. A repersonalização das famílias, Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese/IBDFAM, ano VI, n° 24, jun/jul 2004, p. 138.

37

Nesse contexto, ganha espaço o diálogo e uma considerável melhoria na

relação afetiva entre pais e filhos. A valorização da afetividade no âmbito interno da

família corrobora, mais uma vez, que o patrimônio não é mais o seu valor

fundamental, e sim a pessoa humana.

O que se visa, atualmente, é estabelecer a co-responsabilidade parental, uma

parceria que tende a reaproximação, na ruptura, com a finalidade de proteger o

menor dos sentimentos de desamparo e incerteza que lhe submete a desunião.

Para FRANCISCHETI, todas as decisões pertencem a ambos os genitores,

por meio do exercício conjunto da responsabilidade parental, como existia no lar

conjugal antes da ruptura, porém não se desprezando os sentimentos, desejos,

idade e peculiaridades da prole. Observa a autora, a criação e a educação dos filhos

não traduz apenas a contribuição financeira para o sustento do menor, mas também,

a manutenção moral e emocional do menor, que se dá com a troca de opiniões,

relatos de fatos e experiências que trarão o amadurecimento desejável para o ser

humano em formação75.

Em análise última, faz-se imprescindível, no compartilhamento da guarda, que

todos os aspectos da criação e educação dos filhos sejam discutidos e decididos por

ambos os genitores. Sendo que a criação e a educação dos filhos não traduzem

apenas a contribuição financeira para o sustento do menor, mas também, a

manutenção moral e emocional do menor, que se dá com a troca de opiniões,

relatos de fatos e experiências que trarão o amadurecimento desejável para o ser

humano em formação.

75 FRANCISCHETI. Op Cit., 2008.

38

5 CONCLUSÃO

Conclui-se no primeiro momento desta pesquisa que apesar das influências

do poder patriarcal, com o passar do tempo, o rigorismo do instituto foi modificado,

alcançando o seu verdadeiro e real sentido - de proteção. Evoluiu também o pátrio

poder com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente que passou a vigorar

dois anos depois da Constituição, substituindo o Código de Menores, trazendo

disposição expressa sobre o pátrio poder, em consonância com o preceito de

igualdade entre homens e mulheres.

Observa-se que o instituto da guarda é um conjunto de direitos e deveres

atribuídos aos pais em relação aos filhos menores, com o objetivo de proteger e

suprir as suas necessidades, cuja responsabilidade é atribuída por lei ou mediante

decisão judicial.

Pode-se, então, entender que o instituto da guarda compartilhada emergiu

com o objetivo de amenizar os reflexos negativos da ruptura matrimonial, como

também visar o melhor interesse da criança e do adolescente garantindo-lhe o

direito de conviver com sua família natural, bem como de ter referências paternas e

maternas em sua formação, visando a preservação dos seus interesses morais e

materiais. Ou seja, a finalidade da Lei n. 11.698/08 - Guarda Compartilhada, é que

os pais dividam a responsabilidade e as principais decisões relativas aos filhos,

impondo uma alternativa adequada à saúde psíquica da criança, pois esse tipo de

guarda diminui o tempo de ausência de um dos pais, garantindo à presença de

ambos na vida da criança, dada a importância peculiar do pai e da mãe para o filho.

Para a criança a união dos pais é física e psicologicamente necessária.

Portanto, na guarda compartilhada, apesar de o casamento ou a união

estável acabarem, a parentalidade se conserva, pois, os vínculos de afeto se

preservarão, minimizando os traumas e as consequências negativas que a

separação possa provocar. Com o consenso entre os genitores separados,

conserva-se os mesmos laços que uniam os pais e os filhos antes da separação,

trazendo equilíbrio e harmonia na rotina daqueles que são os beneficiários dessa

solução.

Assim, a modalidade compartilhada da guarda é a mais conveniente para os

filhos, pois os pais continuarão a conviver, permanentemente, com eles,

39

preservando a continuidade e o fortalecimento dos laços afetivos, deixando de ser

apenas aqueles que visitam os filhos, pois participam da rotina deles. Com isso, os

transtornos psíquicos podem ser reduzidos, desde que os genitores queiram dividir

obrigações e direitos concernentes aos filhos, pois, o convívio dos filhos com os pais

continua, evitando assim, a dor da perda no que tange à falta psíquico-afetiva

provocada pela separação dos genitores.

Na verdade, a guarda compartilhada a figura paterna passa a participar de

forma mais ativa no cuidado com os filhos. Ser pai não é apenas cumprir um papel

distanciado na vida do filho, e sim, participar ativamente.

Vários são os posicionamentos a favor da guarda compartilhada, pois com a

separação do casal, o objetivo é que não haja alterações quanto ao desempenho

das funções parentais dos genitores.

Considera-se respondidos os questionamentos na parte introdutória deste

estudo. Ou seja, a eficácia na aplicabilidade da Lei n. 11.698/2008 depende de

fatores como responsabilidade, cooperação e cordialidade entre o casal, para que as

crianças tratadas como objeto de disputa, não sofra a alienação parental,

acarretando transtornos psicológicos irreversíveis. Como também, critérios que

devem ser levados em consideração pelo Magistrado ao determinar a aplicação da

guarda compartilhada, para que a quebra do vínculo parental cause menos prejuízo

à formação da personalidade do filho e sua relação com o meio social.

Sem a intenção de esgotar o assunto, buscou-se com o presente trabalho

mostrar a importância da presença dos pais na vida de seus filhos, e que com o

instituto da guarda compartilhada diversos fatores poderão vir a refletir positivamente

na criança, estabelecendo confiança e estabilidade e uma convivência harmoniosa

de ambos os genitores com os filhos, cercando-os de amor, carinho, afeto, sendo

um exemplo de referência na formação individual no tocante ao processo de

desenvolvimento emocional.

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