monografia - allan nunes callado _versão definitiva_

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS APLICADAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO ALLAN NUNES CALLADO TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA E EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA: ALTERNATIVAS CONTRA A INEFETIVIDADE DA EXECUÇÃO FISCAL BRASILEIRA RIO BRANCO 2011

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Page 1: Monografia - Allan Nunes Callado _Versão Definitiva_

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

ALLAN NUNES CALLADO

TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA E EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA: ALTERNATIVAS CONTRA A INEFETIVIDADE DA EXECUÇÃO FISCAL

BRASILEIRA

RIO BRANCO 2011

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ALLAN NUNES CALLADO

TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA E EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA: ALTERNATIVAS CONTRA A INEFETIVIDADE DA EXECUÇÃO FISCAL

BRASILEIRA

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Acre como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito, sob orientação do Prof. M. Sc. Alysson Maia Fontenele.

RIO BRANCO 2011

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CALLADO, A. N, 2011. CALLADO, Allan Nunes. Transação tributária e execução fiscal administrativa: alternativas contra a inefetividade da execução fiscal brasileira. Rio Branco: UFAC, 2011. 105f.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da UFAC.

Marcelino G. M. M. Monteiro – CRB 11 - 258

C156t Callado, Allan Nunes, 1990 -

Transação tributária e execução fiscal administrativa: alternativas contra a inefetividade da execução fiscal brasileira / Allan Nunes Callado --- Rio Branco : UFAC, 2011.

105f : il. ; 30cm.

Monografia (Bacharel em Direito) – Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Acre.

Orientador: Prof. MSc. Alysson Maia Fontenele.

Inclui bibliografia

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ALLAN NUNES CALLADO

TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA E EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA: ALTERNATIVAS CONTRA A INEFETIVIDADE DA EXECUÇÃO FISCAL

BRASILEIRA

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito junto ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Acre pela Banca

Examinadora composta pelos seguintes membros:

____________________________________________________ Prof. M. Sc. Alysson Maia Fontenele

Juiz Federal da 18ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal

____________________________________________________ Rubem Cesar Costa Guerra

Procurador-Chefe da Procuradoria da Fazenda Nacional no Acre

____________________________________________________ Prof. Esp. Josialdo Aparecido Batista

Procurador da Procuradoria da Fazenda Nacional no Acre

RIO BRANCO 2011

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AGRADECIMENTOS

Sou grato a muitos.

Carlos e Rose, meus pais, foram os maiores responsáveis por esta caminhada de

sucesso desde os primeiros passos. Meus pais, pessoas de bem, que me ensinaram tudo a partir

da maior das lições: amar ao próximo. Seus ensinamentos e amor incondicional foram fatores

decisivos para a minha formação pessoal, acadêmica, profissional, enfim, tudo na minha vida.

Alex e Andrêssa souberam compreender este irmão às vezes calmo, às vezes tenso,

amando-me apenas. Somos certamente os melhores amigos que se pode ser. Alex, um

verdadeiro segundo pai, sempre me ensinando a agir certo sobre tudo. Aprendi e aprendo

muito com você. E Andrêssa, a mais amorosa de toda a família. Nela me vejo e nela me

surpreendo sobre como o amor pode ser grande.

Minha amada, Aninha, que sempre esteve e estará ao meu lado, apoiando-me com todo

o amor possível, o qual, sem dúvida, é recíproco e eterno. Agradeço por Deus ter te enviado na

minha vida e tenho certeza de que este é somente o começo das nossas conquistas juntos.

Alan e Tuanne, dois irmãos que ganhei durante a longa jornada, os quais

compartilharam comigo os bons e maus momentos ao longo dos cinco anos. Obrigado por

tornar tudo mais fácil. Tenho grande carinho e consideração por vocês. Agradeço também a

todos os colegas da turma que participaram dessa fase incrível da minha vida.

Ao Professor Anastácio Filho, pelas incríveis lições de direito e de vida. Ao Professor

Alysson, por me fazer dar sempre o máximo e evoluir cada vez mais. Especialmente ao

Professor Francisco Raimundo, além de tudo, pela amizade, mas também pela dedicação e

humildade perante os alunos. Ao Cosmo, um verdadeiro companheiro de quase todas as noites

no velho bloco de Direito.

Às pessoas que também contribuíram para o meu crescimento, ajudando-me das mais

variadas formas, principalmente o Dr. Luís Mourão e o “Seu” Cláudio. Que nós

compartilhemos sempre os altos e baixos da vida com o bom humor o qual temos o privilégio

de ter.

E acima de tudo, ao meu Deus, que colocou todas essas pessoas em meu caminho e

sempre me abençoou fortemente durante toda essa passagem. Obrigado, meu Deus, e peço que

continue iluminando sempre o meu caminho, pois sei que o dom que recebi serve e servirá para

fazer o bem a todos.

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“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma de nosso corpo, e esquecer os

nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares.

É o tempo de travessia: e, se não

ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.”

(Fernando Pessoa)

Page 7: Monografia - Allan Nunes Callado _Versão Definitiva_

RESUMO

A presente tese visa demonstrar a inefetividade do modelo pátrio de execução fiscal,

bem como apresentar alternativas para tal situação, especificamente a transação em matéria

tributária e a execução fiscal administrativa. Com efeito, o trabalho estrutura-se em quatro

capítulos. No primeiro, apresenta-se o atual modelo de constituição e cobrança do crédito

tributário, especificando-se do lançamento à execução judicial do crédito tributário. No

segundo capítulo, demonstra-se a inefetividade do referido modelo, apresentando-se

estatísticas e argumentando-se sobre as poucas vantagens e numerosas desvantagens, sem

olvidar as causas dos problemas que surgem do paradigma adotado, dentre essas se destacando

a evasão fiscal e a morosidade do Judiciário. No terceiro capítulo, como alternativa aos litígios

entre o Fisco e os contribuintes, apresenta-se a transação em matéria tributária como um

instituto possível e eficaz na melhoria da relação obrigacional tributária e na arrecadação de

receitas. Destaca-se a harmonia do instituto com o postulado do interesse público, bem como

as experiências de sucesso obtidas neste e em outros ordenamentos. Por derradeiro, o quarto

capítulo traz a apresentação da execução fiscal administrativa, focando-se na sua

constitucionalidade por conformar-se com os princípios de separação dos poderes, de reserva

de jurisdição, do juiz natural, entre outros. Abordam-se, ainda, as experiências no Direito

Comparado, além de acompanhar o estudo uma proposta para um modelo ideal de execução

fiscal para o Direito Brasileiro. Conclui-se que as alternativas da transação tributária e da

execução fiscal administrativa demonstram-se viáveis e constitucionais, inclusive

recomendando-se a sua implementação.

Palavras-chave: Inefetividade da execução fiscal judicial. Execução fiscal administrativa.

Transação em matéria tributária.

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ABSTRACT

The present thesis aims to demonstrate the ineffectiveness of the pattern model of tax

foreclosure action, and to present alternatives to this situation, specifically the transaction in

tax discipline and an administrative collection procedure. Indeed, the work is divided into four

chapters. At first, we present the current model of constitution and execution of the tax credit.

In the second chapter, it’s demonstrated the ineffectiveness of this model, presenting statistics

and arguing about the few advantages, numerous disadvantages, without forgetting the causes

of the problems that arise from the paradigm adopted, among these stood out tax evasion and

the slowness of the Judiciary. In the third chapter, as an alternative to disputes between tax

authorities and taxpayers, the transaction is presented as an institute possible and effective in

improving the tax obligational relationship and the revenue collection. There is the harmony of

the institute with the postulate of public interest, as well as the successful experiences gained

in this and other jurisdictions. Finally, the fourth chapter brings the presentation of

administrative tax collection, focusing on its constitutionality and conformation with the

principles of separation of powers, reservation of jurisdiction, natural judge, among others. It

addresses also the experience in Comparative Law, and follows the study a proposal for an

ideal model of tax enforcement for the Brazilian Law. It is concluded that the alternative of tax

transaction and administrative collection procedure demonstrate viable and constitutional,

including recommending its implementation.

Keywords: Ineffectiveness of the judicial tax foreclosure action. Administrative collection

procedure. Tax transaction.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8

1 CONSTITUIÇÃO E COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO: DO

LANÇAMENTO À EXECUÇÃO FISCAL ......................................................................... 10

1.1 Noções gerais ................................................................................................................ 10

1.2 Fase administrativa ..................................................................................................... 22

1.3 Fase judicial ................................................................................................................. 29

2 EXECUÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO NO BRASIL E EFETIVIDADE.... 38

2.1 Vantagens e desvantagens do sistema brasileiro ...................................................... 38

2.2 A inefetividade do modelo brasileiro: números e causas do problema .................. 44

3 TRANSAÇÃO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA ....................................................... 50

3.1 Transação e interesse público ..................................................................................... 50

3.2 Experiências com o instituto e o Projeto de Lei 5.082/2009 ..................................... 56

4 EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA ........................................................... 65

4.1 Apresentação do modelo e constitucionalidade ........................................................ 65

4.2 A experiência no Direito Comparado ........................................................................ 79

4.3 O modelo ideal de cobrança para o Direito Brasileiro ............................................. 87

CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 94

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 96

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INTRODUÇÃO

O Direito Tributário, conforme Rubens Gomes de Souza (1975, p. 40) apud Luciano

Amaro (2009, p. 2) surgiu como forma de adequar a relação entre Estado e particular,

protegendo este de possíveis excessos, a partir de suas normas e princípios norteadores. Sendo

assim, possui o Estado o direito de cobrar tributos, na medida em que cabe ao indivíduo pagar

tais tributos. Da mesma forma, é imputado ao Estado o dever de cobrar corretamente os

tributos, o que para o contribuinte se revela como um direito.

A trajetória do tributo, desde a sua previsão legislativa até a sua cobrança executiva, é

assunto de importância ímpar do ponto de vista teórico e prático. Deve-se, portanto, à luz de

doutrinas precursoras da reflexão jurídica, debater sobre as instituições que rodeiam tal

caminho. Tais doutrinas, que tem Roberto Mangabeira Unger como um de seus principais

autores, visam revigorar no Direito o seu caráter de instrumento de transformação social.

Para ele, há uma visão errônea de que o Direito, tal como conhecido, é fruto de uma

evolução histórica, representado, portanto, nas melhores instituições que se pode imaginar

(GODOY, 2011, p. 4). Deve-se esquecer de um possível fetichismo institucional de que está

arraigado no pensamento atual sobre os institutos estatais. Nesse sentido, Roberto Mangabeira

Unger (2004, p. 18-19) apud Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2011, p. 3) apresenta o

referido fetichismo como obstáculo ao desenvolvimento da democracia:

“Um dos inimigos do experimentalismo democrático é o fetichismo institucional: a crença de que concepções institucionais abstratas, como a democracia política, a economia de mercado e um sociedade civil livre, têm uma expressão institucional única, natural e necessária. O fetichismo institucional é um tipo de superstição que permeia a cultura contemporânea. Ele penetra cada uma das disciplinas mencionadas anteriormente, e informa a linguagem e os debates da política comum. A ideia de esclarecimento, ora antiquada, seria, hoje, mais bem aplicada a esforços para afastar o fetichismo institucional que vicia doutrinas ortodoxas em cada uma das disciplinas sociais. Afastá-lo seria o trabalho em tempo integral de uma geração de críticos sociais e cientista sociais.”

Deve-se abandonar a ideia de que a imaginação institucional é prejudicial. A reflexão

jurídica deve ser este instrumento de transformação das instituições que tanto necessita o

Estado. Devem-se entender as instituições conjunturalmente, levando-se em conta tanto

procedimentos como resultados. O estudo de práticas que logram sucesso ao redor do mundo é

metodologia bastante proveitosa no desenvolvimento do Estado como um todo.

Nesse sentido, as diversas propostas que se colocam em cena como alternativas sofrem

com o fetichismo institucional relatado por Unger e com a percepção de que não se é possível

construir melhores práticas. Por exemplo, ainda sofrem críticas as inúmeras prerrogativas de

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que se mune a Fazenda Pública para concretizar a arrecadação da receita necessária à prestação

dos serviços públicos e dos direitos sociais ao cidadão, principalmente devido à fechada

perspectiva dos doutrinadores sobre a conformação de tais prerrogativas e o Estado

Democrático. O equilíbrio entre o interesse da Fazenda e os direitos e garantias dos

contribuintes é um dos cernes da presente discussão.

Inicialmente, prima o estudo por identificar o modelo institucional de constituição e de

cobrança do crédito tributário no Brasil, destacando-se a maior parte de suas peculiaridades. O

primeiro capítulo, assim, permite a elucidação das fases administrativa e judicial por que passa

o crédito tributário, frisando-se a execução fiscal judicial nos moldes como hoje é prevista.

Posteriormente, critica-se tal sistemática baseando-se, principalmente, em dados

estatísticos e questões de eficiência constitucional. São destacadas, assim, no segundo capítulo,

as vantagens e desvantagens do sistema brasileiro, avaliando-se, de igual modo, as causas do

pequeno montante na arrecadação e do grande tempo e dinheiro que se desperdiça com o atual

modelo de execução judicial.

No terceiro capítulo, apresenta-se a primeira das alternativas aqui propostas, qual seja a

transação em matéria tributária, opção muito mais relacionada com a constituição do que com

a cobrança do crédito tributário, mas que acima de tudo pode ser utilizada na melhoria das

relações entre o Fisco e o contribuinte. Intenta-se demonstrar a sua consonância com o

postulado do interesse público e seus corolários de supremacia e indisponibilidade, bem como

analisar, assim como em todo o estudo, as melhores práticas estrangeiras e as propostas dentro

da prática legislativa pátria.

Por fim, o quarto e último capítulo apresenta a execução fiscal administrativa. Como

parte do estudo, avalia-se a sua constitucionalidade, sua retrospectiva no que se refere ao

Direito Comparado, propondo-se, ao final do capítulo, mediante a análise das propostas

legislativas, um modelo ideal a ser adotado pela processualística brasileira.

Importante elucidar que não se almeja, de forma alguma, esgotar o tema e dar como

únicas as alternativas aqui apresentadas. Objetiva-se tão somente contribuir para o atual e

relevante debate sobre as instituições do Direito Processual Tributário, a partir da metodologia

já descrita. Nesse sentido, a doutrina da imaginação institucional de Unger, afinal, permeia as

considerações finais do presente trabalho, às quais se seguem as referências bibliográficas.

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1 CONSTITUIÇÃO E COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO: DO

LANÇAMENTO À EXECUÇÃO FISCAL

1.1 Noções gerais

Sabe-se que na medida em que houve o crescimento populacional da sociedade, exigiu-

se a criação de um sistema de organização necessário à solução dos conflitos do homem

“natural”, aquilo que para Jean-Jacques Rousseau conceitua-se como Estado. Tal instituição

forma-se pelo pacto social entre particulares, mediante o seu consentimento mútuo e livre, para

a criação da entidade solucionadora de conflitos (NOGUEIRA, 2010).

É um ser político, sobretudo, responsável pela consecução de diversos fins, todos eles,

na verdade, voltados a um só, que é a satisfação das necessidades humanas, necessitando, por

sua vez, de estrutura e verbas para alcançar referido objetivo. Foi justamente no tributo que se

viu a possibilidade de carrear tais recursos para os cofres estatais.

Não obstante o caráter eminentemente arrecadatório do tributo, há que se falar que não

só esse – o de carrear receitas para a finalidade estatal –, mas também, outros, são os

fundamentos da tributação. No entender de Ricardo Alexandre (2011, p. 41-42), a função

meramente fiscal era aplicável apenas ao Estado Liberal dos séculos XVIII e XIX, em que não

haveria de existir intromissão estatal na economia, já que o próprio mercado se regularia, tendo

o tributo o único objetivo de angariar receitas públicas.

Para o referido autor, somente com a origem do chamado Estado do Bem-Estar Social

(Welfare State), e a consequente intervenção estatal no âmbito socioeconômico do particular, é

que o tributo foi empregado como instrumento interventivo. Isto é, para a regulação de certos

setores da economia, passou o tributo a desempenhar função extrafiscal, notoriamente

interventiva (ALEXANDRE, 2011, p. 42).

O autor Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 27) faz menção, ainda, à outra

classificação do Estado, qual seja a de Estado Fiscal, declarando que “a imensa maioria dos

Estados configura-se como Estado fiscal. Isso quer dizer que suas necessidades financeiras são

satisfeitas por meio da arrecadação de impostos (...)”.

A partir disso, pode-se afirmar que o Estado exerce dois tipos de atividade para auferir

seus recursos: a) atividade financeira, que representa a cobrança de tributos; e b) atividade

econômica, que, de modo subsidiário, angaria recursos ao Estado por meio da exploração

econômica. O Estado brasileiro, nesse sentido, é adepto do modelo comum, utilizando-se da

atividade financeira e, excepcionalmente, da atividade econômica, para os fins de custear os

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mais diversos serviços fornecidos pela máquina estatal e necessários para o desenvolvimento

da sociedade.

Colocadas as premissas anteriores, entende-se que é imprescindível idealizar o tributo,

então, como dever fundamental de cada indivíduo, na medida em que serve para a consecução

dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, previstos no artigo 3º, da

Constituição Federal de 1988, bem como para a efetiva prestação dos direitos sociais (como

educação, saúde e segurança, por exemplo).

Marianna Martini Motta (2011), dissertando acerca do assunto, propõe ser o pagamento

de impostos a via de efetivação dos direitos sociais constitucionalmente previstos, concluindo:

“Desse modo, o dever fundamental de pagar impostos é o modo de se efetivar os direitos sociais prestacionais, uma vez que atribui a todos os cidadãos fiscalmente capazes o dever de contribuir para a realização dos deveres estatais. (...) Assim, apesar de não expressa na Constituição Federal de 1988 uma cláusula atributiva do dever de pagar impostos, é uma conclusão que se depreende da própria ordem constitucional e dos objetivos e fundamentos que a acompanham, pois que ninguém duvida que a todos está designado um dever de pagar impostos na medida da capacidade contributiva individual.”

Dessa forma é que deve se entender a natureza do tributo e a importância do seu

pagamento. Quanto à definição, embora seja de costume que a doutrina trabalhe nesse sentido,

a própria lei tentou assinalar um conceito ao termo “tributo”, mesmo que (no entender de

alguns autores) cometendo “alguns deslizes”1. Mesmo assim, convém utilizar, com as devidas

ressalvas, o conceito do artigo 3º, do Código Tributário Nacional, para o qual:

Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Do conceito em questão, mais importante para o estudo é ressaltar a seguinte

expressão: “cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. Tal atividade

descrita é, na verdade, o lançamento que, com a devida vênia, encontra-se bem definido por

Sérgio André Rocha (2010, p. 300), que enuncia em conformidade com o art. 142 do CTN:

“(...) o conceito de lançamento tributário corresponderia ao conjunto de atividades desenvolvidas pela Administração Fazendária, pelos sujeitos passivos dos deveres jurídicos-tributários, ou por ambos, por vezes materializada em ato específico, cuja finalidade é concretizar o comando da norma jurídico-tributária, verificando a ocorrência de sua hipótese no mundo dos fatos e identificando os elementos da relação jurídica da mesma decorrente (sujeito ativo, sujeito passivo e objeto). ” (sic)

_______________ 1 Como, por exemplo, a utilização da expressão “em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir”, que para Luciano Amaro e Mauro Luís Rocha Lopes, dão a entender que o ordenamento tributário aceita tributos in natura (requisição de bens) ou in labore (prestação de serviço eleitoral) (LOPES, 2010) (AMARO, 2009).

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Somente com o lançamento, que é atividade administrativa plenamente vinculada, é

que o cumprimento da obrigação tributária torna-se exigível, já que efetivamente declarada a

obrigação, podendo o Fisco cobrar o adimplemento por parte do contribuinte ou do

responsável.

Aliás, não se pode olvidar que a formação da relação jurídico-tributária é precedida de

algumas situações específicas na fenomenologia do crédito. A primeira delas é justamente a

hipótese de incidência, a qual se conceitua como sendo a situação lícita definida em lei como

necessária e suficiente para a ocorrência da obrigação tributária, ou seja, é a descrição legal da

situação fática ou jurídica tributável, já que signo presuntiva de riqueza.

Por conseguinte, seguindo a clássica classificação de Pontes de Miranda apud Alysson

Maia Fontenele (2001, p. 18), temos o suporte fático da regra, no caso, o fato gerador da

obrigação tributária, como sendo a alteração no mundo dos fatos, sobre a qual se subsume a

previsão abstrata da hipótese de incidência, formando fato juridicamente relevante. É

justamente a esse fato jurídico que chamamos de obrigação tributária. É nesse momento que

nasce a responsabilidade pelo pagamento, mesmo que não exista qualquer prerrogativa de

exigibilidade. Somente da constituição do crédito, transformado em dívida, delimitados todos

os elementos necessários, poderá exigir-se o pagamento do tributo (NOGUEIRA, 1999).

Ou seja, é com o lançamento que se define o montante, o devedor, o prazo e outros

aspectos, de forma a conferir certeza (quanto à existência) e liquidez (quanto ao valor) à

obrigação, constituindo-se o crédito tributário. Por isso mesmo, entende a doutrina mais atual

que o lançamento possui natureza mista, sendo declaratório da obrigação tributária, com

efeitos retroativos, bem como constitutivo do crédito tributário, com efeitos ex nunc

(SABBAG, 2011, p. 760).

Nota-se, nesse matiz, que o crédito tributário não nasce da vontade do particular, ou de

contrato deste com o Poder Público, mas, sim, da força da norma jurídica (lei) matriz de

incidência do tributo, e da consequente atividade administrativa de cobrança (lançamento) que

deve explicitar todos os elementos dessa nova relação, quais sejam: a) material (fato gerador);

b) pessoal (sujeitos); c) quantitativo (base de cálculo e alíquota); d) temporal (momento da

ocorrência da incidência tributária e consequente nascimento da relação); e e) espacial (local

da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária) (LOPES, 2010, p. 164).

A referida atividade de lançamento abriga um conjunto que pode ser basicamente

decomposto em procedimento de lançamento e em ato de lançamento, conceitos distintos,

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sendo, portanto, necessária a precisa delimitação dos seus significados para a exata

compreensão do assunto. James Marins (2010, p. 183) leciona o seguinte sobre o assunto:

“A locução genérica lançamento oculta duas realidades jurídicas distintas. Ato e procedimento administrativo não se confundem, assim como não se podem confundir o procedimento de lançamento (ou, mais precisamente, procedimento preparatório de lançamento) com o ato de lançamento propriamente dito. O procedimento de lançamento é em muitos casos o pressuposto objetivo do ato de lançamento, e incluirá diligências fiscalizatórias e apuratórias que servirão de suporte ao ato de lançamento.

Nessa senda, frise-se que o ordenamento tributário pátrio comporta, hoje, pela sua

norma, três modalidades de lançamento. A doutrina, em peso, classifica tais modalidades em:

a) lançamento direto ou de ofício; b) lançamento por declaração ou misto; c) lançamento por

homologação ou autolançamento.

O lançamento direto é aquele feito exclusivamente pela autoridade administrativa, sem

qualquer colaboração do contribuinte para tanto. Ou seja, o procedimento de lançamento não

conta com a participação do sujeito passivo, sendo, no caso, suficiente a atuação do Fisco para

o acertamento do débito a ser pago. Diga-se que o exemplo mais notório desse tipo de

lançamento é aquele do IPTU, mas outros tributos também são lançados, em regra, sem ajuda

do devedor, a exemplo das taxas e contribuições de melhoria.

Por sua vez, tem-se a figura do lançamento misto, ou por declaração, que é aquele

efetuado pela Administração, com base em declaração do sujeito passivo, que coopera com o

Fisco, desde o início, fornecendo-lhe informações sobre matéria de fato indispensável à sua

efetivação, nos termos do artigo 147, do CTN. Esse tipo de lançamento é marcado pela

imposição legal ao contribuinte de uma obrigação acessória, necessária à apuração dos

elementos da tributação em concreto. É um dever de colaboração do qual não se pode furtar o

sujeito passivo, sob pena de receber multas ou de ter seu lançamento feito de ofício pela

técnica do arbitramento.

Nada obstante, pode o contribuinte até a notificação do lançamento, retificar erros que

tenha cometido em sua declaração, sem prejuízo da competência de ofício do Fisco para

retificar aqueles erros notórios e apuráveis pelo próprio exame da declaração, isto é, erros

grosseiros que podem ser consertados pelo próprio Fisco. É claro, além disso, que o prazo

citado para retificação (até a notificação do lançamento) não influi na possibilidade de

impugnar administrativamente o lançamento (não mais a declaração) ou judicialmente uma

execução fundada em título executivo eivado de vícios devido aos possíveis erros na

declaração. Apenas a título de ilustração, comente-se que este tipo de lançamento é raro, mas

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visível nos casos de ITBI ou Imposto de Importação, quando da entrada de mercadoria no

Regime de Bagagem Acompanhada, por exemplo.

Enfim, mais comum é a terceira modalidade agora apresentada, conhecida como

autolançamento ou lançamento por homologação. Tal modalidade recebe essa denominação,

pois além de necessitar de informações do contribuinte, o tributo já se considera lançado

mediante a simples declaração ao fisco acompanhado do respectivo pagamento, estando o ato

sob condição resolutiva de ulterior homologação do Fisco.

Na verdade, refere-se esta modalidade a uma atuação ostensiva do sujeito passivo da

obrigação tributária, que exerce seus deveres de colaboração com o Fisco, prestando não só

informações relativas às matérias de fato, mas também se enquadrando no regime de tributação

que julgar adequado, bem como pagando o tributo calculado.

Após a declaração, acompanhada do pagamento, julgará o Fisco se as informações

prestadas são verídicas, se o pagamento é devido e suficiente, e se estará o crédito tributário

extinto ou se há necessidade de um possível lançamento de ofício de novos créditos

descobertos durante a apuração. Assim, o Fisco deve se manifestar, relativamente a esses

pontos, no prazo de 5 (cinco) anos da ocorrência do fato gerador, em regra, sob pena de

entender-se que houve homologação tácita, nos termos do artigo 150, §4º, do CTN.

É verdade que o referido dispositivo alerta que não se aplica o referido prazo para os

casos de fraude, dolo ou simulação do sujeito passivo, situação em que, para os doutrinadores,

se aplicará o prazo e termo inicial descritos no artigo 173, inciso I, do CTN, para o qual, conta-

se o quinquênio do primeiro dia útil do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia

ter sido efetuado.

Aplica-se, também, o dispositivo acima mencionado (art. 173, I, CTN) nas ocasiões em

que o sujeito passivo não cumpre nem com a sua obrigação principal, nem com a acessória, ou

seja, o mesmo não paga nem mesmo declara o tributo devido. Assim sendo, o lustro

decadencial terá início, também, no primeiro dia útil do seguinte exercício referente ao qual

poderia ter sido realizado o lançamento. Bem, percebe-se que não são simples as inúmeras

questões levantadas acerca do lançamento por homologação.

Outra destas questões diz respeito à declaração não acompanhada de pagamento e a sua

influência no termo inicial de decadência da homologação. Quer dizer, imagine-se um

contribuinte que declarou determinado tributo, cabendo ao mesmo pagar certa quantia a esse

título. Se o sujeito presta a declaração e não realiza o referido pagamento do tributo, entende a

doutrina majoritária, da qual faz parte Eduardo Sabbag (2011, p. 785), que se aplicará o

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supracitado comando do artigo 173, inciso I, do CTN, com o início do prazo a contar do ano

seguinte àquele em que poderia ter sido lançado o tributo.

Importante transcrever os artigos já mencionados para que se consiga visualizar a sua

correta aplicação aos casos descritos:

Art. 150. (...) §4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. (CARRAZA, 2011, p. 255) Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; (...) (CARRAZA, 2011, p. 261)

Não se aplica o entendimento acima aos casos em que a própria legislação do tributo

defina que o não pagamento caracteriza confissão da dívida. No caso, entende a Superior

Jurisprudência que o crédito já está constituído, dispensando-se qualquer providência do Fisco

para tanto, devendo, inclusive, iniciar-se a contagem do prazo prescricional. É o que resume a

Súmula 436, do Superior Tribunal de Justiça (CARRAZA, 2011, p. 1377):

“S. 436/STJ: A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer providência por parte do fisco.”

É o caso, por exemplo, da Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF),

instituída pela Instrução Normativa 1.110/2010 do Secretário da Receita Federal do Brasil, a

qual, por sua vez, tem como base legal o Decreto-Lei n.º 2.124/1984, que preceitua em seu

artigo 5º, §§ 1º e 2º (BRASIL, 2011):

Art. 5º O Ministro da Fazenda poderá eliminar ou instituir obrigações acessórias relativas a tributos federais administrados pela Secretaria da Receita Federal. §1º O documento que formalizar o cumprimento da obrigação acessória, comunicando a existência de crédito tributário, constituirá confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do referido crédito. §2º Não pago no prazo estabelecido pela legislação o crédito, corrigido monetariamente e acrescido da multa de vinte por cento e dos juros de mora devidos, poderá ser imediatamente inscrito em dívida ativa, para efeito da cobrança executiva, observado o disposto no §2º do artigo 7º do Decreto-lei n.º 2.065, de 26 de outubro de 1983.

Em suma, aos casos de lançamento por homologação:

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a) aplica-se o disposto no artigo 150, §4º, CTN, nos casos em que há a declaração

e o pagamento, com o termo inicial dos 5 (cinco) anos sendo a data da ocorrência do fato

gerador;

b) aplica-se o disposto no artigo 173, inciso I, CTN, nos casos em que há dolo,

fraude ou simulação do sujeito passivo, com o termo inicial do 5 (cinco) anos sendo o dia útil

primeiro do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado o lançamento;

c) aplica-se o disposto no item “b” aos casos em que não há nem pagamento, nem

entrega da declaração;

d) aplica-se, também, o disposto no item “b” aos casos em que há declaração, mas

não há pagamento; e

e) aplica-se o teor da Súmula 436, do STJ, aos casos em que a legislação do tributo

defina que a declaração prestada importa em confissão de dívida, caso em que o crédito restará

constituído, não havendo mais que se falar em decadência da homologação (DCTF, Guia de

Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social

- GFIP, Guia de Informação e Apuração do ICMS - GIA/ICMS).

Após o estudo das modalidades de lançamento, oportuno comentar sobre os efeitos do

mesmo para o crédito tributário e a sua influência na cobrança judicial, revelando-se,

respectivamente, as figuras da exigibilidade e da exequibilidade do crédito2. Quer dizer, apenas

quando formalizada a existência e liquidez da relação jurídico-tributária, é que o Fisco pode

opor o crédito tributário ao contribuinte, dele exigindo o cumprimento da obrigação tributária.

Diz-se, então, que o crédito ganha exigibilidade, no sentido de o Fisco poder agir perante o

contribuinte exigindo-lhe o pagamento.

Na hipótese de inadimplemento por parte do contribuinte, o Fisco pode encaminhar,

como se verá mais adiante, o seu crédito devidamente formalizado e, portanto, exigível, para

inscrição em dívida ativa, de modo a produzir o título executivo extrajudicial que lhe dará

exequibilidade: a certidão de dívida ativa.

_______________ 2 James Marins (2010, p.196) fala em “níveis de exigibilidade”. Na esteira do que dispõe o autor, entende-se que

há duas classificações possíveis desses níveis de exigibilidade: 1) quanto às condições: a) exigibilidade

incondicionada ao lançamento, como nos casos de autolançamento, em que há necessidade de pagamento

antecipado; e b) exigibilidade condicionada ao lançamento, para os casos em que o Fisco precise lançar o tributo e

o pagamento deva ocorrer após essa formalização [pagamento, que recebe alcunha de stricto sensu, como

denomina Paulo de Barros Carvalho (1996) apud James Marins (2010, p.196-197)]. 2) quanto ao âmbito: a)

exigibilidade administrativa, podendo existir com o lançamento feito (condicionada) ou não (incondicionada); e b)

exigibilidade judicial (ou exequibilidade), que somente ocorrerá se formalizado o crédito mediante lançamento.

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Constituído o crédito tributário pelo lançamento, não se admite, no entanto, que a sua

exigibilidade seja perene, cobrando-se o sujeito passivo eternamente. Nesse passo, prevê o

CTN a possibilidade de se alterar a situação do crédito tributário, que poderá ser suspenso,

excluído ou extinto.

A suspensão da exigibilidade aplica-se tão somente às obrigações principais,

sobrevivendo as obrigações acessórias às causas suspensivas. É certo que a suspensão se dará

naqueles casos necessariamente previstos em lei, nos termos do artigo 97, inciso VI, do Código

Tributário Nacional. Entende Hugo de Brito Machado (2009, p. 182) que a suspensão do

crédito tributário pode ocorrer de forma prévia, “operando-se antes do surgimento da própria

exigibilidade, porque no curso no próprio procedimento de constituição do crédito”. Ou seja,

pode suspender-se o crédito previamente à sua constituição, caso em que mais propriamente

deveria se usar a terminologia “impedimento”.

Dentre os casos previstos pelo CTN, cite-se a moratória e o parcelamento como

exemplos de “suspensão posterior” e, de outra forma, a liminar em mandado de segurança, a

tutela antecipada em ação ordinária, a reclamação e os recursos administrativos, e o depósito

integral como exemplos de “suspensão prévia” da exigibilidade do crédito.

Há que se falar que causas suspensivas não obstam o lançamento, devendo a autoridade

fiscal (sob pena de responsabilidade funcional) proceder ao referido ato, observando o prazo

decadencial, mesmo existente qualquer das causas suspensivas, exceto na hipótese em que

decisão judicial proíba o ato de lançamento, hipótese menos frequente na jurisprudência

brasileira. Ademais, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário também não suspende o

curso do prazo prescricional para a inscrição em dívida ativa e cobrança judicial.

De outra forma, há situações em que realmente se impede a constituição do crédito

tributário pelo lançamento, e não mais apenas a sua exigibilidade. São essas as chamadas

hipóteses de exclusão do crédito tributário, resumindo-se estas em isenção e anistia.

Enquanto a isenção traduz-se na dispensa legal prévia (só abrange os fatos geradores

posteriores à lei) do pagamento do tributo devido, a anistia é o perdão legal posterior das

infrações (só abrange as infrações cometidas anteriormente à lei). O objetivo da lei que

determine a isenção ou a anistia é justamente impedir o lançamento do tributo e da penalidade

pecuniária, respectivamente.

Por fim, pode o crédito tributário extinguir-se, ensejando por consequência o fim da

relação tributária, como ocorre nos casos de pagamento, conversão de depósito em renda,

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compensação, transação, entre outras hipóteses devidamente previstas no CTN ou criadas por

lei complementar3.

Caso não ocorra a extinção do crédito tributário, o que é muito comum na prática, o

Fisco deverá inscrever o débito do contribuinte em Dívida Ativa, sendo tal registro um

verdadeiro ato de controle administrativo de legalidade, objetivando a corroboração da liquidez

e certeza da dívida, bem como a constituição do título executivo extrajudicial: a Certidão de

Dívida Ativa – CDA.

A partir desse título é que o representante judicial do ente tributante deverá ajuizar a

ação de execução fiscal, meio próprio para a cobrança das dívidas ativas, tributárias ou não

tributárias, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Ou seja, a execução

fiscal nada mais é do que a ação própria para a Fazenda Pública cobrar débitos inscritos em

Dívida Ativa, sejam eles de natureza tributária ou não tributária.

Trata-se, com efeito, de espécie de execução por título extrajudicial, cujo título

executivo é a CDA, tendo seu procedimento regido por lei especial (Lei 6.830, de 22 de

setembro de 1980 – Lei de Execução Fiscal), – cujo objetivo quando de sua concepção era

dispor sobre uma série de privilégios ao sujeito ativo da demanda, buscando ser mais célere e

segura – e apenas subsidiariamente pelo Código de Processo Civil.

Atente-se para os ensinamentos de Araken de Assis (2007), que preleciona os

pressupostos processuais da ação de execução fiscal: a) título executivo extrajudicial: certidão

de dívida ativa (CDA); b) competência: juiz especializado, em regra; e c) legitimidade ativa e

passiva: credor e devedor.

No tocante ao título executivo, uma vez constituído, frise-se que poderá haver emenda

ou substituição do mesmo até a decisão de primeira instância, caso em que se devolve o prazo

para defesa do executado. Porém, há certa divergência doutrinária se essa defesa poderia ou

não ser sobre toda a matéria conforme o artigo 2º, §8º, da Lei de Execução Fiscal, ou se a

defesa estaria restrita à parte modificada ou substituída da CDA, nos termos da parte final do

artigo 203 do CTN.

Acerca dessa questão, entende Mauro Luís Rocha Lopes (2010, p. 344), o CTN foi

recepcionado pela Constituição com eficácia de lei complementar somente no que se refere às

normas gerais de Direito Tributário. O autor continua o raciocínio dizendo que:

“(...) Assim, possuindo a disposição do art. 203 do CTN nítida natureza processual, a restrição contida em sua parte final teria sido derrogada pela LEF, que é posterior e não estabeleceu limites à nova defesa do executado.

_______________ 3 Conforme entendimento exposado pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões das ADI 1.917-MC e ADI 2.495-MC.

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Assim sendo, o executado terá devolvido o prazo para contestar a emenda ou

substituição – por meio de embargos – de toda a matéria e não só da matéria referente à

emenda ou modificação do título, seja na execução de título tributário ou não tributário.

Quanto à legitimidade no executivo fiscal, importante mencionar que os sujeitos da

execução são definidos, em regra, da análise do ente competente para a cobrança do tributo e o

sujeito passivo previsto na lei do tributo. Em relação ao sujeito ativo, há que se falar que nem

todas as Dívidas Ativas restarão regidas pelo procedimento especial da LEF, conforme

preceitua o seu artigo 1º (CARRAZA, 2011, p. 543), determinando que:

Art. 1º. A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Da leitura do dispositivo entende-se que o legislador quis excluir do regime de

execução fiscal as empresas públicas e sociedades de economia mista, uma vez que somente

citou os entes e suas autarquias – incluídas, entre estas, as fundações públicas. Isso ocorre pelo

simples fato de que tais entes (empresas públicas e sociedades de economia mista) não são

considerados, em razão da função que exercem, entes de direito público e sim de direito

privado. Nas sábias palavras de James Marins (2010, p. 661):

A instituição de privilégios na execução fiscal se deu em atenção principalmente à figura do credor, que por representar o interesse público merece gozar de certas prerrogativas para satisfazer seus créditos. Assim, o que qualifica os créditos sujeitos ao rito especial é sua titularidade, não o crédito propriamente dito.

Nesse sentido, normalmente, figuram no polo ativo da ação as Procuradorias da União

(Procuradoria da Fazenda Nacional), dos Estados, dos Municípios e Distritais, bem como das

autarquias e fundações, cada uma cobrando os créditos correspondentes à sua competência.

No entanto, interessante se fazer menção ao caso específico de uma empresa pública

que pode se utilizar do rito da LEF para a cobrança de suas dívidas. Trata-se da Empresa

Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), empresa pública federal, que presta serviço público

de competência exclusiva da União. Nos dizeres de Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 5), o

Supremo Tribunal Federal já decidiu sobre a extensão dos privilégios fiscais à ECT e, portanto,

equipara-se esta às entidades autárquicas fazendárias, “razão por que há de ser considerada

legitimada, em caráter excepcional (por ser pessoa de direito privado), para a cobrança de seus

créditos através de execução fiscal”.

Ainda no que se refere à legitimidade, especificamente no que toca ao polo passivo, a

própria Lei de Execução Fiscal, em seu artigo 4º, traz um rol taxativo daqueles que podem

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figurar como tal na demanda executiva. Não pode a Fazenda Pública apontar outra figura para

atuar no polo passivo da execução fiscal a não ser os descritos na lei, estando legitimados,

dessa forma, os seguintes: a) o devedor; b) o fiador; c) o espólio; d) a massa; e) o responsável,

nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de

direito privado; e f) os sucessores a qualquer título.

É requisito que o próprio título que aparelha a ação contenha o nome do devedor

devidamente apurado em procedimento administrativo. Aliás, não pode o Fisco, em regra,

incluir certa pessoa como responsável sem fazer o devido acertamento, ou seja, a devida

apuração, em processo administrativo, da certeza e da quantidade de responsabilidade do

indivíduo.

A figura do fiador é mais comum nos casos de dívida ativa não tributária, uma vez que,

segundo as disposições do artigo 123, do CTN, as convenções particulares não tem o condão

de alterar o polo passivo perante o Fisco. Porém, pode ocorrer de ser o fiador chamado na

execução do crédito tributário, respondendo pela garantia dada nos casos de moratória,

parcelamento, entre outros.

Questão interessante é a da execução do responsável tributário e a necessidade de que

seu nome conste da CDA. Os entendimentos mais recentes da jurisprudência são no sentido de

que a execução contra responsável não incluído na CDA fica condicionada à apresentação de

documentos comprobatórios da responsabilidade correspondente, como no caso do artigo 135,

em que se deve comprovar que o sócio-gerente agiu com excesso de poderes ou infração à lei

ou aos estatutos sociais4.

Aliás, quanto ao sócio-gerente há outros entendimentos que devem ser mencionados

(LOPES, 2011, p. 30-33):

− o mero sócio não pode ser responsabilizado, mas, sim, aquele que exerce função

diretiva;

− o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a

responsabilidade solidária do sócio-gerente (Súmula 430/STJ);

− a dissolução irregular da sociedade sem a quitação dos tributos que oneraram

suas atividades gera a responsabilidade do gerente ou diretor pelas dívidas tributárias da

empresa;

_______________ 4 Como se pode ver nos julgados recentes do Superior Tribunal de Justiça (REsp. n.º 272.236-SC, REsp. n.º 278744/SC, EDREsp. n.º 272236/SC e REsp. n.º 621900/MG) citados por Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 27-28).

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− presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu

domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da

execução fiscal para o sócio-gerente (Súmula 435/STJ).

Esgotadas as noções preliminares quanto ao título executivo e aos legitimados sujeitos

da relação jurídico-tributária na execução fiscal, faz-se mister analisar as competências em

matéria processual tributária. Isso posto, a LEF faz uma breve alusão ao assunto no seu artigo

5º, que dispõe:

Art. 5º. A competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário.

O que diz o artigo supra é que a cobrança do crédito fazendário não se submete a

quaisquer juízos universais, como o da falência, o que não quer dizer, porém, que esse crédito

goze de uma preferência absoluta, já que da leitura de outras legislações (como a Nova Lei de

Falências) depreende-se que o mesmo cede diante de créditos trabalhistas, créditos

extraconcursais ou créditos com garantia real, por exemplo.

Mesmo assim, a execução fiscal está imune a modificações de competência resultantes

da superveniência de processos de falência, inventário, dentre outros em que devam concorrer

todos os credores. Assim também está no caso de mudança do domicílio do executado no curso

da execução. Ocorre que incide na execução fiscal, segundo Araken de Assis (2007, p. 1006),

o princípio da perpetuatio jurisdictionis, como o referido autor demonstra no trecho a seguir:

“Inicialmente, convém sublinhar que incide, na execução fiscal, o art. 87 (perpetuatio jurisdictionis). Deste modo, alterações supervenientes do estado de fato e de direito, particularmente a alteração do domicílio do executado, em nada interferem na competência. É o que dispõe a Súmula 58 do STJ.”

A LEF, contudo, não faz qualquer outra menção às competências (material, territorial,

funcional) dos executivos fiscais, aplicando-se, nesse caso, o disposto no artigo 578 do Código

de Processo Civil, e, ainda, o disposto no artigo 127 do Código Tributário Nacional, nos casos

de dívidas não tributárias e tributárias, respectivamente.

Por sua vez, existem certos fenômenos processuais possíveis de acontecer também na

execução fiscal. Trata-se da conexão e da continência, que se caracterizam como institutos que

determinam a reunião de processos que apresentem causa ou pedido comuns entre si

(conexão), ou sempre que, além da identidade de partes, o objeto de uma demanda for mais

amplo que o da outra (continência).

É comum que ocorra a conexão, por exemplo, na cobrança de tributos com certa

periodicidade, como quando da ocasião da cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial

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Rural – ITR, devendo-se, assim, reunir os executivos para dar maior celeridade à cobrança,

bem como impossibilitar decisões divergentes.

Para autores como Araken de Assis e Mauro Luís Rocha Lopes, deve haver a conexão

também entre o executivo e uma possível ação de conhecimento, sempre que houver uma

relação de prejudicialidade ou litispendência entre as duas demandas, para que apenas uma

decisão seja prolatada, evitando-se assim qualquer possibilidade de insegurança jurídica,

podendo, inclusive, o juiz apreciar de ofício possível conexão. Esse também é o entendimento

demonstrado em Conflito de Competência de n.º 105.358/SP, julgado pelo Superior Tribunal

de Justiça (BRASIL, 2011a).

Se houver conflito de competências, utiliza-se o método da prevenção para a

determinação do correto julgador, sendo competente aquele que primeiro citou, no caso de

juízos com idêntica competência funcional, ou aquele que primeiro despachou, no caso de

juízos com idêntica competência territorial.

Assim sendo, restará resolvida qualquer dúvida quanto à competência do juízo da

execução, podendo a mesma prosseguir normalmente para o alcance de seu fim, que é a

excussão dos bens do executado com a satisfação do credor do título executivo fazendário.

1.2 Fase administrativa

Faz-se necessário prosseguir o presente trabalho com a análise mais aprofundada da

constituição do crédito tributário, obviamente em sua faceta administrativa. Nesse passo, como

já comentado, tem-se a atividade do lançamento como marco da constituição do crédito

tributário.

Por outro lado, antes mesmo do lançamento, há atos de fiscalização necessários à

caracterização dos seus elementos (sujeito passivo, fundamentação legal, entre outros). Tais

atos também são conhecidos como ação fiscal, procedimento de ofício ou fase investigatória. O

conjunto de atividades voltadas ao objetivo de formalizar o crédito tributário é sempre

realizado por um legitimado agente (autoridade fiscal) que dispõe de diversos poderes de

fiscalização necessários à elucidação dos elementos da tributação em concreto.

A fiscalização é um poder-dever orientado pela isonomia, se prendendo, inclusive, à

ideia de capacidade contributiva, sendo, então, necessária a ação estatal que deverá identificar

o (des)cumprimento das obrigações tributárias (principal e acessória), punindo o

comportamento indesejado e impelindo o contribuinte omisso a adimplir a obrigação

(ALEXANDRE, 2011).

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Este poder não deve ter um fim em si mesmo, mas sim servir como meio para alcançar

um objetivo maior, que é o lançamento correto do tributo e a aplicação de possíveis

penalidades. A título de ilustração, pode-se citar como poder de fiscalização inerente à

atividade fazendária o poder de requisitar informações de tabeliães, escrivães, serventuários,

bancos, empresas de administração de bens, repartições públicas, entre outros.

A Lei n.º 1.702/2006 (Dispõe sobre a reestruturação do Grupo de Tributação e Fisco da

Secretaria de Estado da Fazenda e Gestão Pública – SEFAZ), por exemplo, especifica em seu

artigo 9º as atribuições dos integrantes da fiscalização tributária acriana (ACRE, 2011):

Art. 9º São atribuições privativas dos integrantes da carreira de fiscalização da SEFAZ, sem prejuízo de outras, as seguintes: I - programar e executar atividades de natureza complexa e qualificada de fiscalização da tributação e arrecadação de tributos estaduais; II - lavrar e assinar auto de infração, termo de apreensão e depósito e demais documentos correlatos; III - orientar a elaboração de normas relativas à fiscalização e tributação previstas na legislação tributária; IV - fiscalizar estabelecimentos comerciais, industriais, extratores, produtores e prestadores de serviços onde se efetuem operações de produção, extração, industrialização e comercialização, bem como prestações de serviços sujeitos aos tributos estaduais; V - examinar escritas contábeis e fiscais, bem como todo e qualquer documento necessário à implementação da ação fiscalizadora; (...) X - executar quaisquer procedimentos fiscais para verificar o cumprimento das obrigações tributárias pelo sujeito passivo, podendo intimar para prestar informações, apreender mercadorias, livros, documentos e quaisquer bens móveis que comprovem indícios de sonegação ou ilícitos fiscais; XI - executar plantão de atendimento fiscal ao contribuinte nos postos de fiscalização e/ou em outros órgãos da administração pública, que atuem em parceria com a SEFAZ; XII - executar a fiscalização em veículo móvel, através de comandos volantes ou unidades de fiscalização informatizada; XIII - elaborar, executar, monitorar e avaliar os projetos e programas de fiscalização e controle da situação cadastral ou econômico-fiscal, facilitando a aplicação dos métodos de gerenciamento das diretrizes e da rotina; (...) (omissão nossa)

Com esses e outros privilégios, aparelha-se a Administração Fazendária de modo a

tornar eficiente a sua atuação. Desde logo, podem as autoridades administrativas proceder a

várias medidas de fiscalização preparatórias (ação fiscal) do lançamento, carreando todas as

informações necessárias à sua precisa delimitação.

Segundo o artigo 7º do Decreto n.º 70.235/72, que regulamenta o processo

administrativo fiscal, o procedimento fiscal tem início a partir de três hipóteses: 1) o primeiro

ato de ofício, escrito praticado por autoridade competente, cientificando o sujeito passivo da

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24

obrigação tributária; 2) a apreensão de mercadorias, documentos ou livros; e 3) o começo do

despacho aduaneiro de mercadoria importada.

Há alguns princípios que informam a atuação estatal quando do início de algum

procedimento de fiscalização, como no caso de análise de livros fiscais da empresa. Um desses

é o princípio documental, previsto no artigo 196 e seguintes do CTN, que determina a

necessidade de se documentar tanto o início do procedimento de fiscalização, quanto os atos e

diligências nela realizados (ALEXANDRE, 2011, p. 536-537).

Sempre que a atividade de lançamento é desenvolvida pela autoridade administrativa

com vistas a exigir o recolhimento de tributo que deixou de ser pago espontaneamente pelo

contribuinte, com a imposição das respectivas sanções, tal atividade vem consubstanciada,

formalizada em um ato administrativo, cuja denominação, praticamente uniforme nas

legislações de todos os entes tributantes, é auto de infração.

Na verdade, o ato materializador do lançamento irá se traduzir a partir de um

documento formal emitido pela autoridade fiscal competente, podendo receber diversas

nomenclaturas de acordo com a legislação correspondente. Em âmbito federal, o Decreto

70.235/1972 regula o processo e o procedimento administrativo fiscal, determinando em seu

artigo 9º (CARRAZA, 2011, p. 524):

Art. 9º A exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito.

Na prática federal, portanto, utilizam-se o Auto de Infração (AI) e a Notificação Fiscal

de Lançamento de Débito (NFLD), para corporificar os atos de imposição, englobando no

mesmo suporte físico vários atos impositivos referentes a diversas relações jurídicas, ora não

sancionatórias, como o lançamento, ou relações jurídicas sancionatórias, como aplicação de

multa por inadimplemento. Embora isso aconteça, deve-se ater ao fato de que o auto de

infração e a notificação de lançamento são dois documentos distintos, com requisitos e

competências diferentes.

Em seu texto, Sérgio André Rocha (2011, p. 346), entende que a diferenciação dos dois

atos está no modo como as autoridades fazendárias tiveram conhecimento da infração

cometida, dispondo que:

“No auto de infração a autoridade toma conhecimento acerca da infração ao cabo de procedimento de fiscalização realizado no contribuinte, no qual se verificam irregularidades em seus recolhimentos ou no adimplemento de deveres de natureza formal. Por sua vez, a notificação de lançamento é decorrente da verificação de uma infração cometida pelo contribuinte, isso no

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25

âmbito de análise realizada pela autoridade a partir de informações que lhe foram fornecidas pelo próprio contribuinte. É o que se tem verificado com grande frequência no âmbito da Receita Federal do Brasil.”

Os referidos documentos informarão, então, a próxima etapa da constituição do crédito

tributário, um processo administrativo, que, em âmbito federal, é regulado pelo Decreto

70.235/1972, inclusive no que se refere aos tributos que antes da Lei 11.457/07 (que unificou

as Receitas Federal e Previdenciária, formando a Receita Federal do Brasil) eram de

competência do INSS e que respeitavam, até a referida Lei, a outra legislação.

É importante, porém, ter em conta que, muito embora o Decreto 70.235/72 regule o

processo administrativo de constituição de créditos tributários federais, nem todas as

peculiaridades processuais envolvidas em tal processo constam de seu texto, aplicando-se, por

exemplo, subsidiariamente a Lei n.º 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo Federal). Há,

também, inúmeros procedimentos que foram adicionados por legislação complementar e que

complementam o regramento do Decreto.

Prosseguindo, tem-se que somente o transcurso in albis do prazo para impugnações

administrativas, após a devida notificação do lançamento, é que dará plena eficácia ao

lançamento, constituindo, finalmente o crédito tributário. Aliás, tais impugnações

administrativas fazem parte de uma etapa da constituição do crédito, denominada de

“contencioso administrativo fiscal”, em que o contribuinte poderá contestar a autuação sofrida,

instaurando-se Processo Administrativo Fiscal (PAF), instrumento de grande importância no

controle da legalidade dos atos administrativos-fiscais (MARINS, 2010).

Para Sérgio André Rocha (2010, p. 328):

“Vista a natureza do ato administrativo de exigência tributária e imposição de sanções denominado auto de infração, é possível assinalar, (...), que o processo administrativo fiscal consiste no instrumento de controle de sua legalidade.” (sic)

A impugnação e os recursos administrativos compõem grande parte das causas

suspensivas da exigibilidade do crédito tributário na prática, não se podendo aplicar

consequências à mora do devedor e outras penalidades. Isso, porque o crédito tributário nem se

encontra definitivamente constituído, devendo passar pelo crivo de diversos órgãos

administrativos julgadores até que encontre sua definitude.

O processo administrativo fiscal não difere muito de todos os outros processos

administrativos aplicados a outros campos da Administração Pública. Inclusive, pode-se dizer

que a ele se aplica um procedimento diferente, mas os seus fundamentos e princípios são

basicamente os mesmos. Citem-se os princípios basilares da Administração Pública,

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26

constitucionalmente previstos, da Legalidade, da Impessoalidade, da Moralidade, da

Publicidade e da Eficiência. Todos esses se aplicam ao processo administrativo fiscal, sem

prejuízo, é claro, de outros princípios não menos importantes, como o Princípio do Devido

Processo Legal, da Ampla Defesa, do Contraditório, entre outros.

Além destes, importa registrar outro princípio que se aplica ao processo tributário como

um todo, bem como a qualquer tipo de processo como instrumento de efetivação de direito

material e solução de conflitos: o Princípio da Razoável Duração do Processo. É um princípio,

previsto no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, que determina que os

processos devam durar o “tempo necessário para o desenvolvimento de um procedimento

contraditório, onde as partes possam exercer as posições ativas necessárias para garantir seu

direito (ampla defesa)” (ROCHA, 2010, p. 84-85), cabendo ao legislador fixar prazos

razoáveis e ao aplicador da lei respeitá-los, sem a perda da qualidade dos procedimentos e da

decisão.

Quanto às normas relativas a esta espécie de processo administrativo, terão

competência todos os entes, podendo cada um instituir, dentro da limitação constitucional e

legal, todas as questões procedimentais. Como ora delineado, o Decreto 70.235/72 é que trata

do processo administrativo fiscal em âmbito federal, sendo subsidiado por outras leis como a

Lei n.º 9.784/99. O decreto previu para o processo tributário federal dois tipos de modalidades

administrativas de procedimento, uma não contenciosa e uma contenciosa.

A princípio, em se tratando de procedimento não contencioso, cite-se a consulta

administrativa sobre a interpretação de legislação tributária (artigos 46 e seguintes, do Dec.

70.235/72), espécie de instrumento preventivo para o contribuinte dirimir dúvidas objetivas

acerca da interpretação e da aplicação da norma tributária, evitando erros por parte da

Administração e, também, por sua parte. O próprio Código Tributário Nacional prevê que a

consulta suspende a fluência dos juros de mora (artigo 161, §2º), sem prejuízo de muitos outros

efeitos benéficos ao contribuinte ou à própria Administração, desde que apresentada em acordo

com as disposições do Decreto.

Além da consulta, há também a denúncia espontânea como espécie de procedimento

administrativo fiscal não contencioso. Prevista, por sua vez, na legislação geral de direito

tributário (art. 138, CTN), a denúncia espontânea é uma oportunidade para o contribuinte

infrator, agindo de boa-fé, livrar-se de multa do Fisco, ao comunicar o cometimento da

infração, pagando, se for o caso, o tributo e os juros de mora devidos.

O contribuinte que até o início de procedimento de fiscalização confessar-se perante a

Administração tributária terá excluída a sua responsabilidade pelas infrações correspondentes.

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27

Apesar de este instituto ser sede de inúmeras discussões, basta para o estudo saber que também

se trata de espécie de procedimento administrativo fiscal, na sua modalidade não contenciosa.

Por outro lado, tem-se a modalidade contenciosa do processo administrativo fiscal. Na

verdade, entende-se por contencioso administrativo tributário toda a atividade administrativa

tendente a solucionar conflitos de natureza fiscal, assegurados ao contribuinte as garantias de

um processo justo – reveladas nos princípios já aludidos. Pois bem, a fase litigiosa do processo

administrativo fiscal inicia-se basicamente pela impugnação pelo contribuinte de algum auto

de infração ou notificação de lançamento com o qual esteja inconformado, apresentando a sua

defesa, na forma do artigo 16, do Decreto 70.235/72 (CARRAZA, 2011, p. 525-526):

Art. 16. A impugnação mencionará: I - a autoridade julgadora a quem é dirigida; II - a qualificação do impugnante; III - os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir; IV - as diligências, ou perícias que o impugnante pretenda sejam efetuadas, expostos os motivos que as justifiquem, com a formulação dos quesitos referentes aos exames desejados, assim como, no caso de perícia, o nome, o endereço e a qualificação profissional do seu perito. V - se a matéria impugnada foi submetida à apreciação judicial, devendo ser juntada cópia da petição. § 1º Considerar-se-á não formulado o pedido de diligência ou perícia que deixar de atender aos requisitos previstos no inciso IV do art. 16. § 2º É defeso ao impugnante, ou a seu representante legal, empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao julgador, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las. § 3º Quando o impugnante alegar direito municipal, estadual ou estrangeiro, provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o determinar o julgador. § 4º A prova documental será apresentada na impugnação, precluindo o direito de o impugnante fazê-lo em outro momento processual, a menos que: a) fique demonstrada a impossibilidade de sua apresentação oportuna, por motivo de força maior; b) refira-se a fato ou a direito superveniente; c) destine-se a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidas aos autos. § 5º A juntada de documentos após a impugnação deverá ser requerida à autoridade julgadora, mediante petição em que se demonstre, com fundamentos, a ocorrência de uma das condições previstas nas alíneas do parágrafo anterior. § 6º Caso já tenha sido proferida a decisão, os documentos apresentados permanecerão nos autos para, se for interposto recurso, serem apreciados pela autoridade julgadora de segunda instância.

Conforme o artigo 17, a matéria que não seja impugnada reputa-se como verdadeira,

aplicando-se, assim, o disposto no artigo 21, §1º, com a formação de autos apartados para

imediata cobrança da parte não contestada. Já o artigo 25, do Dec. 70.235/72 prevê que o

julgamento do contencioso fiscal compete, em primeira instância, às Delegacias da Receita

Federal do Brasil de Julgamento (DRJ), órgãos de deliberação interna e de natureza colegiada

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28

da Secretaria da Receita Federal. O julgamento poderá ser de improcedência ou de

procedência, e não caberá pedido de reconsideração.

Na hipótese de improcedência, o sujeito passivo poderá se valer do Recurso Voluntário

ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). O artigo 33, §2º do Decreto, em sua

redação original previa o depósito recursal no valor de 30% do valor do débito. O STF

declarou inconstitucional o referido depósito recursal, editando inclusive a Súmula Vinculante

215.

Por sua vez, quando a decisão é desfavorável ao Fisco, o recurso é chamado Recurso de

Ofício. Na forma do artigo 34 do Decreto, o recurso será interposto mediante declaração na

própria decisão e será cabível quando exonerar o sujeito passivo do pagamento de tributo e

encargos de multa de valor total a ser fixado em ato do Ministro da Fazenda ou quando deixar

de aplicar pena – cominada à infração denunciada na formalização da exigência – de perda de

mercadorias ou outros bens.

Apresentados um dos recursos acima citados, o processo é enviado para julgamento no

âmbito do CARF, onde os recursos serão julgados por uma das Turmas que compõem cada

uma das três Seções do CARF, segundo a competência material prevista no Regimento Interno

do órgão.

Das decisões das Turmas das Seções do CARF são cabíveis embargos de declaração,

dirigidos à própria Turma, para sanar obscuridade, contradição ou omissão, bem como pedido

de correção de inexatidões materiais, com o fim de sanear tais inexatidões ou erros de escrita

ou de cálculo existentes na decisão.

Ainda é cabível o Recurso Especial, proposto em 15 (quinze) dias da ciência da decisão

do CARF à Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF). É requisito para a interposição do

Recurso Especial, a existência de divergência de interpretação dada à lei por outras Turmas do

CARF ou da própria CSRF. No caso do sujeito passivo, o recurso é destinado a contestar

decisão de Turma das Seções do CARF que não lhe foi favorável. Já no caso dos Procuradores

da Fazenda Nacional, representantes do sujeito ativo da relação tributária, o recurso é cabível

nos casos de não provimento de recurso de ofício e provimento de recurso voluntário.

Interposto o recurso, o próprio presidente da Câmara da Turma recorrida fará o juízo de

admissibilidade do recurso, que em despacho fundamentado admitirá ou negará seguimento ao

mesmo. Se negar, o juízo de admissibilidade definitivo caberá ao presidente da CSRF, que se

manifestará conclusivamente sobre a questão.

_______________ 5 Súmula Vinculante n.º 21: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo. (CARRAZA, 2011, p. 1340)

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Admitido o recurso, o recorrido terá 15 (quinze) dias para apresentar contrarrazões. No

caso do contribuinte recorrido, ainda lhe será possível, no mesmo prazo, apresentar recurso

especial em relação à parte do acórdão que lhe foi desfavorável. O Recurso Especial, então,

será julgado em última instância por uma das Turmas da CSRF, não cabendo pedido de

reconsideração de ato do Ministro da Fazenda que julgar ou decidir as matérias de sua

competência (artigo 39, Dec. 70.235/72). Da decisão em instância especial caberão apenas

embargos de declaração e pedido de correção de inexatidões materiais.

Com a decisão administrativa final, o crédito tributário é considerado como

definitivamente constituído e passível de imediata cobrança (dada a extinção da causa

suspensiva da exigibilidade prevista no artigo 151, inciso III, do CTN).

De acordo com o artigo 42, do Decreto (CARRAZA, 2011, p. 532):

Art. 42. São definitivas as decisões: I - de primeira instância esgotado o prazo para recurso voluntário sem que este tenha sido interposto; II - de segunda instância de que não caiba recurso ou, se cabível, quando decorrido o prazo sem sua interposição; III - de instância especial. Parágrafo único. Serão também definitivas as decisões de primeira instância na parte que não for objeto de recurso voluntário ou não estiver sujeita a recurso de ofício.

A decisão contrária ao contribuinte será encaminhada a órgão da Administração Fiscal

competente para proceder à cobrança amigável do crédito em 30 (trinta) dias, prazo que, se

esgotado, enseja a declaração de que o sujeito passivo é devedor remisso, encaminhando-se o

processo à autoridade competente para promover a cobrança executiva, nos termos do artigo

21, §3º, do Decreto.

Na seara federal, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional – PGFN é responsável pela

apuração da liquidez e certeza dos créditos da União, tributários ou não, a serem inscritos em

Dívida Ativa (artigo 12, da Lei Complementar n.º 73/93). Esta compreende, além do valor

principal, atualização monetária, juros, multa e demais encargos previstos.

A Dívida Ativa inscrita goza de presunção de certeza e liquidez, e tem equivalência de

prova pré-constituída contra o devedor. O ato da inscrição confere legalidade ao crédito como

dívida passível de cobrança, facultando ao ente público, representado pelos respectivos órgãos

competentes, a iniciativa do processo judicial de execução.

1.3 Fase judicial

A ação de execução fiscal é justamente o procedimento judicial idôneo para cobrar os

créditos devidamente inscritos do devedor. Não deixa, na verdade, de ser uma execução por

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quantia certa contra devedor solvente, aplicando-se, por isso mesmo, alguns dispositivos

específicos do Capítulo IV do Código de Processo Civil que trata sobre a matéria. Apesar

disso, repise-se que a execução judicial do tributo obedece, a priori, à Lei 6.830/80 (LEF) e,

apenas subsidiariamente, ao CPC, com as alterações da Lei n.º 11.382/2006.

Nesse sentido, dispõe o artigo 6º da LEF que o órgão competente para o ajuizamento

do executivo fiscal providenciará a petição inicial, que pode ser preparada por processo

eletrônico, sendo instruída pela própria CDA, que dela fará parte como se nela estivesse

transcrita. A petição indicará tão somente o juiz a quem se dirige, o pedido e o requerimento

para a citação.

Essa possibilidade de se dispensar vários elementos da petição inicial (como, por

exemplo, memória de cálculo dos valores devidos a título do tributo) se dá, em grande parte,

por integrar a inicial a própria CDA, que traz fundamentos suficientes para que se exerça o

direito de ação e a ampla defesa (MARINS, 2010).

O artigo 53, da Lei 8.212/91 autoriza a União, suas autarquias e fundações públicas,

tratando-se de execução das respectivas dívidas ativas, a nomear bens do devedor à penhora, a

ser efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor. O artigo 652, §2º, do CPC,

estendeu essas garantias às Fazendas estaduais e municipais.

A primeira participação do juiz no processo se dá, em regra, com o despacho que defere

ou indefere a inicial. O referido despacho também trará em seu conteúdo ordem para citação,

penhora de bens, arresto – pré-penhora para Araken de Assis (2010) –, registro da penhora ou

do arresto e avaliação dos bens penhorados ou arrestados. O mandado que ordenar esses atos

somente retornará aos autos quando integralmente cumpridos.

A citação se dará, em regra, pelo correio, com aviso de recepção, sendo a regra geral

para a citação do devedor. Embora o artigo 8º, inciso II, da LEF, disponha que a citação postal

considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado ou, se a data for

omitida, 10 (dez) dias após a entrega à agência postal, há autores6 que defendem que a LEF

não dispôs sobre uma citação ficta, mas pessoal, devendo ser entregue a carta pessoalmente ao

devedor, sob pena de violação do devido processo legal.

Frustrada a via postal, a citação será feita por oficial de justiça, preferencialmente, ou

por edital afixado na sede do juízo, publicado só uma vez no órgão oficial, contendo apenas a

indicação da exequente, o nome do devedor e dos corresponsáveis, a quantia devida, a natureza

da dívida, a data e o número da inscrição no Registro da Dívida Ativa, o prazo e o endereço da

_______________ 6 Como, por exemplo, Agostinho Sartin, James Marins, José da Silva Pacheco e Araken de Assis (LOPES, 2011).

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sede do juízo. Importante citar que o Superior Tribunal de Justiça sumulou entendimento7

segundo o qual somente é cabível a citação por edital quando frustradas as demais

modalidades.

A citação por edital também terá cabimento, além dos casos de frustração da citação

pessoal (postal ou por oficial de justiça), nos casos de executado no exterior e naqueles em que

a Fazenda requerer, de acordo com o disposto no artigo 8º, inciso I, da LEF combinado com o

artigo 231, do CPC (local do executado inacessível, incerto ou não sabido, entre outros casos).

O devedor poderá pagar a dívida ou, ainda, garanti-la mediante depósito bancário em

dinheiro, ou mediante fiança bancária. Além disso, poderá nomear bens a penhora observada a

seguinte ordem, presente no artigo 11, da LEF (CARRAZA, 2011, p. 546)

Art. 11 - A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem: I - dinheiro; II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa; III - pedras e metais preciosos; IV - imóveis; V - navios e aeronaves; VI - veículos; VII - móveis ou semoventes; e VIII - direitos e ações. § 1º - Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção. § 2º - A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que trata o inciso I do artigo 9º. § 3º - O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exeqüente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo.

A Fazenda Pública será ouvida em 5 (cinco) dias sobre a nomeação, podendo impugná-

la, desde que motivadamente (art. 656, CPC). Pode a Fazenda, desse modo, reclamar, por

exemplo, da insuficiência do bem para garantir o crédito. Ressalte-se, ainda, o disposto no

artigo 9º, §4º, da LEF, de que somente o depósito realizado com obediência às disposições do

artigo 32 da referida Lei, é que terão o efeito de cessar a fluência de juros e correção monetária

sobre o montante. Por conseguinte, determina o artigo 10, da LEF (CARRAZA, 2011, p. 546):

Art. 10 - Não ocorrendo o pagamento, nem a garantia da execução de que trata o artigo 9º, a penhora poderá recair em qualquer bem do executado, exceto os que a lei declare absolutamente impenhoráveis.

Nesse contexto, a próxima etapa para satisfazer a pretensão do exequente é a penhora

de quaisquer bens do executado, salvo aqueles absolutamente impenhoráveis. A penhora é o

_______________ 7 Súmula 414/STJ. A citação por edital na execução fiscal é cabível quando frustradas as demais modalidades. (CARRAZA, 2011, p. 1376).

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ato pelo qual o órgão judiciário submete a seu poder imediato determinados bens do executado,

fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação. do direito do exequente (LIEBMAN,

1968, p. 124 apud GARCIA REDONDO, 2007, p. 35).

Pode-se dizer, ainda, que a penhora possui alguns efeitos processuais e materiais.

Dentre os processuais está a garantia do juízo, a individualização dos bens que suportarão os

meios executivos e a geração de direito de preferência em favor do exequente. Quanto aos

materiais, a penhora acarreta a ineficácia dos atos de alienação ou oneração dos bens

penhorados, bem como pode ensejar eventual retirada do bem penhorado da posse direta do

executado.

A intimação da penhora se fará por edital, salvo nos casos em que o executado não

tenha sido citado pessoalmente no início da ação. Neste caso, a intimação da penhora deverá

ser pessoal ao executado. Se nesse caso, frustrar-se a intimação pessoal, no entender de Mauro

Luís Rocha Lopes (2011, p. 98), deve-se nomear curador especial ao executado que será

intimado e deverá impugnar qualquer irregularidade, aplicando-se, analogamente, a Súmula

196 do STJ8.

Não se pode deixar de falar que os instrumentos de registro da penhora terão em si a

avaliação dos bens penhorados, ato importante para o procedimento, vez que ajuda a

caracterizar eventual excesso ou insuficiência da penhora, norteia a adjudicação e a remição

dos bens, bem como pode determinar a necessidade de segundo leilão ou anular a arrematação

por preço vil. Ainda assim, há decisões do STJ que entendem que não havendo prejuízo à

Fazenda, não é causa de nulidade a ausência de avaliação nos termos ou autos de penhora9.

É importante esclarecer que a Lei Complementar 118/05 alterou o CTN, tratando, entre

outros, da indisponibilidade universal em seu artigo 185-A. Esta ocorrerá na hipótese de o

devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo

legal, e não forem encontrados bens penhoráveis. Nesse caso, o juiz determinará a

indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio

eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferências de bens e às

autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no

âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial.

Enfim, em sequência à intimação da penhora, caso não sejam apresentados embargos

do executado – meio de defesa a ser analisado mais a seguir – procede-se à intimação de

_______________ 8 Súmula 196/STJ: Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos. (CARRAZA, 2011, p. 1368). 9 Cite-se, por exemplo, o REsp. n.º 77.321-PR, citado por Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 104).

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terceiro que esteja garantindo a dívida com seus bens ou fiança, para remir o bem ou para que

pague a dívida. Não ocorrendo isso, procede-se à publicação do edital de arrematação, nos

moldes do artigo 22, da LEF.

Sobre a arrematação, Antônio Carlos Costa e Silva (s.d., p. 474) apud Mauro Luís

Rocha Lopes (2011, p. 157) leciona que:

A arrematação consiste em ato jurisdicional destinado à transferência coativa da propriedade do bem penhorado, de modo oneroso, a um terceiro, dito arrematante, que oferece o último lanço e que é aceito pelo juízo.

O leilão será realizado no prazo de 10 (dez) a 30 (trinta) dias da publicação do edital.

Pela aplicação subsidiária do artigo 686, VI, do CPC, tem-se que o edital deve ter comunicação

de que, se no primeiro leilão não houver lanço maior do que o da avaliação, realizar-se-á, entre

os 10 (dez) e 20 (vinte) dias seguintes, novo leilão, com alienação pelo maior lanço,

independentemente do valor da avaliação.

Aplica-se subsidiariamente, da mesma forma, o contido no artigo 692, do CPC, que

proíbe a arrematação por preço vil, estando entendido este como aquele diminuído a tal ponto

que não corresponda ao valor da coisa (mesmo que obsoleta, deteriorada), pelo qual o homem

comum não a alienaria.

A arrematação concluir-se-á mediante o pagamento imediato do lanço ofertado (art.

690 do CPC) ou, no prazo de quinze dias, mediante caução. Ademais, é permitido o

parcelamento do produto da arrematação, mediante oferta de, pelo menos, trinta por cento de

tal valor à vista, sendo o restante garantido por hipoteca do próprio imóvel.

O prazo para oposição de embargos à arrematação, nos termos do artigo 738 e 746 do

CPC, é de 5 (cinco) dias, com a alteração dada pela Lei 11.382/2006. Em se tratando de

execução fiscal, o termo inicial para oferecimento desses embargos inicia-se não a partir da

assinatura do auto de arrematação, mas depois de decorridos 30 (trinta) dias referentes ao prazo

que tem a Fazenda Pública para adjudicar o bem leiloado nas mesmas condições daquele que

efetuou o maior lanço.

Frise-se que, conforme o artigo 24 da LEF, poderá a Fazenda Pública adjudicar os bens

penhorados antes do leilão, pelo preço da avaliação, ou depois do leilão, pelo preço da

avaliação, se não houve licitantes, ou em igualdade de condições com aquele que houver dado

o maior lanço, resguardada sua preferência.

Dessarte, a adjudicação se apresenta como o ato judicial através do qual se transfere a

propriedade do bem penhorado para o credor, com a finalidade de quitação do débito objeto do

processo executivo.

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É pacífico o cabimento de embargos à adjudicação na execução fiscal, por aplicação

subsidiária do preceito do art. 746 do CPC, com vistas à alegação de nulidade ou de causas

extintivas da obrigação, desde que ocorridas após o término do prazo para oferecimento dos

embargos à execução. Os embargos à adjudicação deverão ser deduzidos no prazo de 30

(trinta) dias a contar da assinatura, pelo juiz, do auto de adjudicação.

Até a assinatura do auto de arrematação ou adjudicação dos bens, poderá o executado, a

todo tempo, remir a execução, pagando ou consignando a importância devida, mais acréscimos

legais (art. 651, CPC), ocorrendo, neste caso, a extinção do processo por sentença. Sem

prejuízo, pode remir também a execução o cônjuge, os descendentes ou ascendentes do

executado (art. 685-A, §3º, CPC). Por fim, dispõe o artigo 19, inciso I, da LEF (CARRAZA,

2011, p. 548), que:

Art. 19. Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos, no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15 (quinze) dias: I – remir o bem, se a garantia for real; ou (...)

Nesse caso, o terceiro garante deve depositar o valor apurado na avaliação ou o que for

estabelecido pelo juiz, sendo que o prazo de 15 (quinze) dias não é peremptório, não resultando

nenhum prejuízo da remição intempestiva, a não ser para o próprio terceiro que a efetuar, pois

terá de suportar as despesas do leilão, caso já tenham sido realizadas.

Com a alienação do bem penhorado e a satisfação integral da pretensão autora, toma a

ação de execução fiscal um de seus possíveis fins, embora não o mais comum. Isso porque

pode o executado exercer o seu direito de defesa na execução fiscal, apresentando os chamados

embargos à execução.

Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 117) leciona de forma clara quanto aos embargos:

“A defesa do executado, em sede de execução fiscal, assume, como regra, a forma de embargos à execução, que têm natureza de ação autônoma constitutivo-negativa, objetivando a desconstituição total ou parcial do título executivo (termo de inscrição em dívida ativa), materializado na CDA.”

Os embargos são ação autônoma, pois ajuizados em autos distintos dos da execução. E

incidentais, pois incidem na execução fiscal, estando seu conteúdo delimitado ao conteúdo

desta. O prazo para o executado opor embargos é de 30 (trinta) dias, com termo inicial –

conforme o artigo 16 da LEF e na visão sucinta de Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 120),

resumindo os entendimentos jurisprudenciais e doutrinários – a contar:

“a) da data da intimação do devedor quanto à formalização do termo de depósito em garantia do débito;

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b) da juntada aos autos da prova da fiança bancária, pouco importando a data em que contratada a mesma pelo executado com o banco (v. REsp. nº 1. 112.41, 1ª Seção, Min. Herman Benjaminm 2009); e c) da intimação da penhora, pouco importando a data em que juntada aos autos a respectiva prova.”

Embora o CPC tenha sido alterado pela Lei 11.382/2006 no sentido de que não há

necessidade de garantir a execução (civil) para embargá-la, tal modificação não se aplica aos

executivos fiscais, principalmente devido ao metacritério de solução de conflitos de normas lex

generallis posterior non derrogat priori specciali (lei geral posterior (Lei 11.382/2006) não

revoga lei especial anterior (Lei 6.830/1980)10.

Há que se dizer que a Súmula Vinculante n.º 2811 não se aplica aos embargos do

executado. Por isso, é legal a exigência de garantia para a oposição de embargos à execução.

Além disso, em sede de execução fiscal, também pela aplicação subsidiária do CPC (artigo

739-A), a regra é que os embargos não suspendam a execução fiscal, salvo em situações

especiais em que haja relevância da argumentação, grave dano de difícil ou incerta reparação e

garantia integral do juízo.

A seguir, os parágrafos 1º e 2º, do artigo 16, dispõem sobre aquilo que a doutrina

denomina “concentração da defesa nos embargos à execução”. Isso quer dizer que não cabe em

execução fiscal, qualquer outra ação com vistas a apresentar oposição ao título executivo.

Apesar disso, não se pode esquecer de que há uma ressalva para a disposição referida

acima. Trata-se da exceção de pré-executividade, mera oposição, restrita a matérias de ordem

pública, não demandando dilação probatória. Tal exceção é fruto de construção doutrinária e

jurisprudencial e funda-se nas garantias constitucionais de acesso à justiça e devido processo

legal.

Ocorre que existem matérias que viciam a relação jurídica de forma tão proeminente

que seria irrazoável e antijurídico não permitir ao executado alegá-las. Tanto é que a

jurisprudência restringe as hipóteses de cabimento da exceção àqueles casos em que o vício é

questão de ordem pública, não atendendo somente mero interesse do devedor.

Em suma, as hipóteses admitidas pela jurisprudência exemplificam-se, entre outras, nas

seguintes: a) ausência de condições da ação; b) ausência de pressupostos de desenvolvimento

válido do processo; c) nulidade formal ou material da CDA; d) prescrição e decadência; e)

quitação do título; e f) inconstitucionalidade de norma legal, fundamento do título, já declarada

_______________ 10 Entendimento exposado por Mauro Luís Rocha Lopes (2011). 11 Súmula Vinculante n.º 28: É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade do crédito tributário. (CARRAZA, 2011, p. 1341)

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pelo STF. E por fim, diga-se que a exceção deve ser arguida no prazo dos embargos (LOPES,

2011, p. 127) e não exige qualquer garantia à execução (LOPES, 2011, p. 123).

Ainda no tocante aos embargos, recebidos os mesmos, o juiz mandará intimar a

Fazenda, para impugná-los no prazo de 30 (trinta) dias, designando em seguida, audiência de

instrução e julgamento, salvo se os embargos versarem somente sobre matéria de direito, caso

em que o juiz proferirá a sentença também no trintídio (artigo 17, parágrafo único, da LEF).

Decidindo-se a causa podem surgir duas hipóteses: serem julgados improcedentes os

embargos, seguindo a execução até seus ulteriores feitos, ou serem julgados procedentes,

levantando-se a garantia, arcando a Fazenda Pública com os devidos encargos e extinguindo-se

o crédito tributário.

Finalmente, tem-se a situação mais corriqueira dos executivos fiscais: a sua extinção

pela prescrição intercorrente. Para o correto entendimento desse importante instituto, mister se

faz transcrever o artigo 40 da LEF (CARRAZA, 2011, p. 550-551), em sua íntegra, que dispõe:

Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. §1º Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. §2º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. §3º Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. §4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. §5o A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4o deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda.

Da leitura do dispositivo entende-se que não havendo bens penhoráveis ou ausente o

devedor, suspende-se a execução, prazo em que ficará também suspensa a prescrição. Nesse

período, estando a Fazenda Pública de posse dos autos da execução, deverá a mesma

diligenciar em busca de patrimônio do devedor ou do próprio, quando ausente, solicitando ao

juiz a expedição de ofícios aos órgãos correspondentes quando da impossibilidade material e

legal da Fazenda agir por conta própria.

Passado um ano da suspensão, se ainda sem condições de prosseguir o processo, deve o

juiz determinar o arquivamento dos autos, sem baixa nos registros da distribuição. Trata-se de

arquivamento provisório, pois se encontrados bens passíveis de penhora, os autos serão

desarquivados para prosseguimento da execução. Como já dito, o despacho que ordena a

citação do devedor no executivo interrompe a prescrição, a qual nem deveria voltar a correr,

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pois sendo ela a perda do direito de ação e estando este já exercido, não se pode cogitar o seu

retorno.

Acontece que alguns fatores no executivo podem acarretar uma ruptura no seu

procedimento, sucedendo a verdadeiras crises que alteram a sua tramitação normal. O exemplo

mais comum e latente na execução fiscal é a inviabilização da garantia do juízo, seja por

ausência de bens ou do próprio devedor.

Assim, sob pena de eternização do conflito e de possível violação da segurança

jurídica, o executivo não pode permanecer suspenso, podendo vir a sofrer a chamada

prescrição intercorrente.

Com o arquivamento de que trata o artigo 40, §2º, da LEF, volta a correr o prazo

prescricional. Dessa forma, nos termos do §4º do aludido artigo, o juiz poderá de ofício, depois

de ouvida a Fazenda Pública, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato

quando decorrido o prazo prescricional contado da data do despacho de arquivamento. Ou seja,

a decisão que acarreta a prescrição intercorrente independe de provocação do interessado.

Apesar de o comando descrito determinar que o termo inicial de contagem da

prescrição intercorrente é o despacho do juiz que determinar o arquivamento, é cediço em sede

doutrinária e jurisprudencial que a prescrição começa a contar novamente do fim do prazo de

um ano do arquivamento. Nesse sentido, a Súmula 314, do Superior Tribunal de Justiça

(CARRAZA, 2011, p. 1372):

Súmula 314/STJ: Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente.

Ademais, apenas para complementar, diga-se que a manifestação prévia da Fazenda

Pública prevista no §4º do artigo 40 será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor

não ultrapasse a cifra de R$ 10.000,00 (dez mil reais), conforme artigo 40, §5º, da LEF,

regulamentado pela Portaria 227/2010, do Ministério da Fazenda.

O processo de execução fiscal, em geral, submete-se à sistemática recursal do CPC,

cujas regras, a esse respeito, merecem aplicação subsidiária à LEF. Assim, pode-se dizer que

da sentença de embargos e demais decisões cabem os mais diversos recursos, como, apelação,

agravo de instrumento, embargos infringentes, embargos de declaração, entre outros.

Ressalte-se, porém, que o artigo 34, da Lei de Execução Fiscal, restringe tal gama

recursal àquelas execuções cujo valor seja maior que 50 OTN (cinquenta Obrigações do

Tesouro Nacional), que corresponde aproximadamente a R$330,00 (trezentos e trinta reais),

conforme Mauro Luís Rocha Lopes (2011, p. 209). Para as execuções de valor abaixo dessa

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alçada, a LEF permite somente a utilização de embargos infringentes e embargos de

declaração, quando sucumbente uma das partes.

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2 EXECUÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO NO BRASIL E EFETIVIDADE

2.1 A inefetividade do modelo brasileiro: números e causas do problema

Durante muito tempo, o modelo anteriormente descrito de constituição e cobrança do

crédito tributário tem esbarrado na inefetividade da arrecadação dos créditos tributários.

A evasão fiscal, que é o uso de meios ilícitos para evitar o adimplemento da obrigação

tributária é uma das principais causas desse problema, se materializando em diversas práticas

do contribuinte (atos e omissões que evitem o conhecimento do Fisco sobre a real situação

fática do contribuinte) que o Poder Público não tem conseguido combater. Exemplos das

referidas práticas são a sonegação (ocultação de renda tributável ou de transações realizadas) e

fraude (redução da quantia a ser paga por meio de falsificações de documentos, por exemplo).

Também podem ocorrer a simulação absoluta, que corresponde a expressão de ato

jurídico inexistente (como no caso de contribuinte que abate despesas inexistentes de dívidas

também inexistentes) ou a simulação relativa (dissimulação), comum, por exemplo, no caso de

compra e venda do imóvel acobertada ocultada pela celebração de contrato de sociedade, tendo

em vista a imunidade do art. 156, §2º, I, da CF/88.

Sendo assim, apesar de ser notória a alta carga de tributos a que é submetido o

contribuinte brasileiro, nada justifica as condutas ilícitas praticadas por empresas e pessoas

físicas visando falsear ou obscurecer o nascimento da obrigação tributária.

Nada justifica, outrossim, a condescendência do Poder Público para com aqueles que

não cumprem as suas obrigações tributárias. É óbvio que exceções existem, mas diante da

facilidade de evadir-se, da impunidade das condutas ilícitas e da falta de eficiência dos meios

de cobrança do crédito, a maior parte da sociedade (os bons pagadores, pelo menos) prefere ver

os tributos como forma de enriquecimento do governo e o Fisco como o grande empecilho ao

desenvolvimento.

Prosseguindo, soma-se a essa causa a fragilidade da estrutura da Administração, tanto

no que se refere à logística quanto à qualificação de pessoal, acarretando a demora na instrução

e decisão de processos administrativos e na falta de meios eficientes de encontrar bens do

devedor ou o próprio devedor.

Nesse mesmo sentido, preceitua Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 42):

“Aqueles que empreendem fraudes fiscais contam com a fragilidade da Administração Tributária brasileira, que não é dotada dos meios materiais e legais para o adequado desempenho de suas funções, e com a debilidade da legislação, que põe à disposição dos sonegadores uma infinidade de medidas que garantem a impunidade.”

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A própria Constituição Federal dispõe em seu artigo 37, inciso XXII, que a

Administração Tributária exerce atividades essenciais ao funcionamento do Estado, devendo

ter servidores de carreiras específicas, bem como recursos prioritários. Não é o que acontece na

prática, em que a quantidade de recursos materiais e de pessoal utilizadas não basta para

destravar a atividade de constituição, bem como de cobrança de tributos.

Repise-se quanto à falta de estrutura adequada da Administração Fazendária, tomando-

se como exemplo a da União. Em 2007, com a criação da Secretaria da Receita Federal do

Brasil (Lei n.º 11.457/2007), a Procuradoria da Fazenda Nacional ficou responsável, além de

suas rotineiras atribuições, pela cobrança do crédito previdenciário.

A alteração da legislação, porém, não foi acompanhada pela melhoria da estrutura

administrativa, o que acarreta justamente a acumulação de processos e o travamento da

celeridade e da eficiência da cobrança. Isso tudo sem falar da cobrança de dívidas não

tributárias, como é o caso do Convênio entre a PGFN e a Caixa Econômica Federal, para que

aquela cobre as dívidas de FGTS, ex vi da Lei n.º 8.844/1994.

Por outro lado, é preciso esclarecer que existem alguns problemas pontuais de

procedimento que ensejam a inefetividade da execução fiscal. O maior deles é, sem dúvida – e

os números mostram isso –, a ausência de bens penhoráveis por parte do devedor, que por sua

vez mantém bens em nome de outras pessoas (os conhecidos “laranjas”), enganando facilmente

o Fisco e o Poder Judiciário. Do mesmo modo, ao lado da ausência de bens está a ausência do

próprio devedor, sem o qual não poderia prosseguir a execução, sob pena de ferir os princípios

do contraditório e da ampla defesa, corolários do princípio do devido processo legal.

Segundo pesquisa intitulada “Custo Unitário do Processo de Execução Fiscal na Justiça

Federal”, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), somente três quintos (pouco mais da metade) dos

processos de execução fiscal vencem a etapa de citação (BRASIL, 2011c, p. 19).

Ainda conforme a pesquisa, em 47,4% (quarenta e sete inteiros e quatro décimos por

cento) dos processos ocorre pelo menos uma tentativa inexitosa de citação, e em 46,2%

(quarenta e seis inteiros e dois décimos por cento) das tentativas de citação por aviso de

recepção são exitosas, contra 47,1% (quarenta e sete inteiros e um décimo por cento) das

tentativas de citação por oficial de justiça e 53,8% (cinquenta e três inteiros e oito décimos) das

tentativas de citação por edital (BRASIL, 2011c, p. 18-21).

Isso demonstra o desrespeito e a má-fé de boa parte dos contribuintes com a

Administração Fazendária e com o Poder Judiciário, tornando praticamente impossível o

prosseguimento do processo, que terá seu fim, muitas vezes, traçado pelo instituto da

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prescrição intercorrente, realizando mais um desfalque nos cofres estatais, restando aos

contribuintes de boa-fé arcar com alíquotas cada vez maiores e um número de tributos também

crescente.

Mesmo quando o Estado, na sua atividade jurisdicional, consegue ultrapassar a etapa da

citação, o objetivo maior do processo (satisfazer o credor com o resguardo das garantias

constitucionais do devedor) não consegue ser alcançado, pela falta de bens suscetíveis de

penhora, já transferidos a terceiros com vistas a fraudar a execução.

Ademais, percebe-se, pela análise do modelo brasileiro de constituição e cobrança do

crédito, que se repetem demasiadas vezes as mesmas ações, em sede administrativa e em sede

judicial. É inadmissível que, apenas em esfera administrativa, a regularidade do crédito

tributário seja julgada até três vezes (impugnação, recurso voluntário ou de ofício e recurso

especial) estando a sua exigibilidade suspensa enquanto isso, sem a presença de qualquer

garantia, dando tempo e comodidade ao executado para que aliene seus bens de modo a tornar-

se devedor insolvente. Isso, porque só se presume fraude à execução quando a alienação ocorre

após a inscrição em dívida ativa, nos termos do artigo 185, do CTN.

Conforme o estudo da FGV, coordenado Santi (2011) demonstra-se que o tempo

decorrido no processo administrativo fiscal é em média de 5 (cinco) anos, tendo como termo

inicial a data do protocolo da impugnação e como termo final a “baixa” do processo à DRF

após o julgamento em segunda instância.

Após todo esse tempo, poderá ainda o contribuinte, agora executado, defender-se da

ação através de embargos à execução, o que muitas vezes nem ocorre, devido ao fato de a

certeza e a liquidez do título executivo normalmente encontrarem-se em conformidade com os

preceitos legais e constitucionais. Além disso, como a intenção do mau contribuinte é

justamente frustrar a pretensão do credor, não há motivos para o mesmo arriscar-se, garantindo

a dívida, para a oposição de embargos. Mais comum é a hipótese de defesa por meio de

exceção de pré-executividade, que não exige qualquer garantia e serve ao propósito de protelar

a demanda executiva.

Nesse sentido, registre-se o disposto na pesquisa acima citada, no sentido de que

(BRASIL, 2011c, p. 20-21) somente 4,4% (quatro inteiros e quatro décimos por cento) dos

executados apresentam objeção de pré-executividade, as quais são julgadas favoravelmente ao

devedor em 0,3% (três décimos por cento) dos casos. Já os 6,5% (seis inteiros e cinco décimos

por cento) de executados que apresentam embargos obtêm ganho de causa em 1,3% (um

inteiro e três décimos por cento) dos casos.

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Logo, o número de executados que apresentam algum tipo de defesa no executivo fiscal

é muito baixo. Também é baixa a quantidade de ações antiexacionais que obtém algum tipo de

êxito durante o executivo.

Nesse sentido, não há razão para a ineficaz repetição de procedimentos nos âmbitos

administrativo e judicial, oferecendo ao contribuinte demasiadas oportunidades para se

defender de um suposto pagamento indevido.

Por fim, tem-se, também como causa da inefetividade, a morosidade do Poder

Judiciário em realizar os procedimentos de cobrança do crédito tributário, esta sendo, talvez, a

principal daquelas aqui relacionadas. Ocorre que o Poder Judiciário é pouco afeto à realização

de procedimentos meramente executórios, sendo inapto a promover com eficiência a cobrança

forçada dos créditos fazendários.

De acordo com a pesquisa do IPEA (BRASIL, 2011c, p. 24):

“A morosidade não resulta significativamente do cumprimento de prazos legais, do sistema recursal ou das garantias de defesa do executado. Tampouco do grau de complexidade das atividades administrativas requeridas. Fundamentalmente, é a cultura organizacional burocrática e formalista, associada a um modelo de gerenciamento processual ultrapassado (ALVES DA SILVA, 2010), que torna o executivo fiscal um procedimento moroso e propenso à prescrição. Basta lembrar que esta responde pelo segundo maior motivo de baixa, atingindo quase um terço dos executivos fiscais. No trabalho de campo, identificou-se a prevalência de uma forma de organização administrativa que se assemelha ao modelo fordista clássico, caracterizado pela rígida divisão de tarefas excessivamente reguladas, repetitivas e autorreferentes. Este modelo impede a construção de uma visão completa do processo de trabalho, privilegiando o cumprimento de tarefas em detrimento da obtenção de resultados, com impactos relevantes sobre a subjetividade dos trabalhadores da Justiça.”

Do ponto de vista de Nogueira e Pacheco (2011, p. 18):

“(...) a gestão interna das cortes judiciais não é objeto de atenção dos magistrados; isto porque a legitimidade do Poder Judiciário repousa não em sua gestão interna (entendida como os aspectos relativos à hierarquia interna e às operações regulares), mas em fatores relacionados à gestão externa e às ações voltadas à criação de estruturas e institucionalização (isto é, o manejo e enfrentamento das condições do ambiente externo à organização).”

Tendo em vista a inabilidade do Judiciário na gestão de atos executório-

administrativos, indaga-se se há, nesses atos, algum caractere de julgamento, função que o

Judiciário realiza de forma satisfatória. Faz-se mister, nessa linha, aludir ao conceito de

julgamento, nas palavras de De Plácido e Silva (2007, p. 795-796):

“Assim, em sentido exato, tendo em mente o próprio significado de julgar (formar juízo), julgamento é a formação de juízo a respeito do assunto, que

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motiva a contenda. Juízo, aí, deve ser tido como convicção, compreensão, persuasão, capacitação.”

Da leitura acima, questiona-se, com a devida vênia, qual a necessidade de juízo perante

atos meramente executórios, como a avaliação e a penhora. Em verdade, apercebe-se que não

demandam, tais atos, juízo algum, tratando-se, como já dito, de atos meramente repetitivos,

contidos em processos que entulham as prateleiras do Judiciário brasileiro, aumentando os

gastos e retirando o pouco tempo que tem para o julgamento de demandas que realmente

necessitam de sua atuação.

Em verdade, a atuação deficiente do Judiciário nos atos meramente executivos, em

razão de sua gestão inefetiva, dificulta a consecução dos fins constitucionais do tributo,

violando, de certa forma, o Estado Democrático de Direito.

Retratando o pensamento de Roberto Mangabeira Unger e sua teoria experimentalista,

Godoy (2011, p. 20) diz que “a potencialização da voz do judiciário é circunstância que pode

suscitar preocupações, na medida em que eventuais deficiências de democracia podem marcar

o modelo”.

É óbvio que quaisquer questões que demandem o mencionado juízo devem passar pelo

crivo do Poder Judiciário, em respeito à Constituição Federal e, principalmente, ao princípio

do acesso à Justiça. Tais demandas poderiam referir-se a ilegalidades ou irregularidades nos

procedimentos acima descritos, como, por exemplo, uma subavaliação do bem penhorado, ou

mesmo a ilegalidade da constituição do título executivo. Enfim, a questão da ausência de

jurisdição nos atos executivos será abordada em momento oportuno.

Reflexo da atuação do Judiciário nos processos executivos, os números desapontam.

Conforme o Balanço Geral da União (BRASIL, 2011b, p. 7) relativo ao ano de 2009, realizado

pela própria PGFN, foi arrecadado no referido período somente 2,12% (dois inteiros e doze

centésimos por cento) do estoque de dívidas inscritas, o que sem dúvida representa muito

pouco em relação ao que deveria ser efetivamente arrecadado. Comparativamente, em

Portugal, país que tem investido maciçamente na Administração Tributária e que cuida

administrativamente de sua execução, obteve-se também no ano de 2009, conforme o

Relatório de Actividades da Direcção-Geral dos Impostos – DCGI (PORTUGAL, 2011, p.

27), a taxa de arrecadação em relação à dívida ativa de 16,2% (dezesseis inteiros e dois

décimos por cento).

Ademais, ilustrando o referido cenário da ineficiente gestão administrativa do

Judiciário, a pesquisa realizada pelo IPEA (BRASIL, 2011c, p. 33-34) demonstra que o tempo

médio de tramitação da execução fiscal na Justiça Federal de primeiro grau é de 8 (oito) anos,

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2 (dois) meses e 9 (nove) dias, estando a penhora e a localização do devedor entre as atividades

que mais demandam tempo. A penhora, por exemplo, demanda, em média, um tempo absoluto

de 540 (quinhentos e quarenta) dias, praticamente um quinto do processo inteiro, não se

incluindo aqui os atos de leilão, o qual, em média, demora o tempo absoluto de 743 (setecentos

e quarenta e três dias).

Não obstante, a mesma pesquisa estimou o custo médio total de um executivo fiscal em

R$541,11 (quinhentos e quarenta e um reais e onze centavos) (BRASIL, 2011c, p. 34).

Multiplicando-se o referido valor pelo número de causas que totaliza 34,6% dos processos da

Justiça Federal (BRASIL, 2011c, p. 7) nota-se o tamanho do desfalque.

É um tempo longo e um gasto alto que deixa a União, neste específico caso, e a

Fazenda Pública, em geral, sem possibilidades de reaver os valores das receitas que poderiam

certamente ser utilizadas na prestação de mais serviços públicos e de melhor qualidade, ações

congruentes com os objetivos fundamentais do Estado Brasileiro.

Ora, não se pode jamais olvidar qual a grande finalidade do tributo e o tamanho da sua

importância para alcançar os objetivos constitucionais.

Por isso mesmo, deve-se ver o pagamento do tributo como comando ético, moral e

jurídico necessário a cada contribuinte. Há no ato de pagamento do tributo não um interesse

particular, mas interesse público – supremo e indisponível. Pode-se falar até mesmo em

interesse público primário, que se revela como sendo “o resultado da soma dos interesses

individuais enquanto partícipes de uma sociedade, também denominados interesses públicos

propriamente ditos” (MARINELA, 2011, p. 29).

Além disso, há que se falar que apesar de diferentes, os conceitos de interesse público

primário e secundário muitas vezes se aproximam. Nesse sentido, José dos Santos Carvalho

Filho (2005, p. 58-59) apud Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 99):

“Embora a expressão interesse público tenha caráter plurissignificativo e represente um conceito jurídico indeterminado, por estar despido de conteúdo definido e admitir valorações diferenciadas em virtude da visão em que se coloque o autor da valoração, o certo é que, conforme unanimidade dos estudiosos, indica algum tipo de atividade que, direta ou indiretamente, ofereça benefícios primários ou secundários à coletividade. Não importa se se trata de interesse direto do Estado ou da coletividade, o que parte da doutrina tem denominado de interesse público primário ou secundário. Se a atividade alcança diretamente a coletividade é indiscutível que se cuida de interesse público, mas se beneficia diretamente ao Estado é evidente que a coletividade, por ele representada, também vai auferir o benefício, ainda que de modo indireto.”

Não se propugna serem os princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse

público princípios absolutos, não relativizáveis. Somente se almeja demonstrar que no caso de

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confronto entre o interesse público de ter os direitos sociais efetivamente prestados e o

interesse particular de se furtar do pagamento do tributo, prevalece aquele. Trata-se da mera

aplicação, ao caso, dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade.

É vontade de cada indivíduo ter respeitados seus direitos básicos à educação, à saúde, à

segurança e a outros também relacionados à dignidade da pessoa humana. E mesmo que ainda

insuficiente a qualidade dos serviços públicos oferecidos no Brasil, não pode fugir o

contribuinte do pagamento do tributo, quando devido, já que necessário à implementação do

interesse público.

Afinal, se todos adimplissem as suas obrigações tributárias, fica claro que o custeio das

finalidades do Estado diminuiria para cada contribuinte, respeitando, inclusive, de forma mais

coerente o princípio da capacidade contributiva.

Diferentemente da cultura local, vinga nos Estados Unidos o conceito de Voluntary

Compliance (cumprimento voluntário), isto é, o recolhimento de tributo é obrigação que

qualifica dever fundamental do cidadão (GODOY, 2010, p. 83). De tal modo, o ponto de

partida da atuação do Fisco norte-americano é ajudado, especialmente, pelo comprometimento

do contribuinte, no sentido da obrigatoriedade do recolhimento de tributos.

É cultura que deveria ser adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, respeitando-se

os direitos básicos do indivíduo. Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2009, p. 119-120)

comenta sobre o assunto:

“Agentes fazendários infernizam a vida do devedor relapso. Fazem penhora administrativa, arresto de contas bancárias, de salários, de toda sorte de bens, onde quer estejam. Arruína-se a vida comercial do executado. O executado pelo fisco nos Estados Unidos da América deve estar preparado para toda sorte de constrições. Corre, principalmente, risco de responsabilização penal. Legislação penal de tolerância mínima para com crimes fiscais garante o fisco na perseguição de valores não recolhidos a bom tempo. É tema que democratas e republicanos concordam. Ambiente ideológico neoliberal, de fundo conceitual calvinista, não admite evasão e sonegação fiscais. O controle e a fiscalização dos gastos públicos, o comprometimento social e a objetividade da vida cotidiana não dão espaços para os floreios da retórica.”

Por fim, transcreva-se uma síntese das informações da pesquisa do IPEA trazida no

próprio documento (BRASIL, 2011c, p. 33):

“O processamento da execução fiscal é um ritual ao qual poucas ações sobrevivem. Apenas três quintos dos processos de execução fiscal vencem a etapa de citação (sendo que em 36,9% dos casos não há citação válida, e em 43,5% o devedor não é encontrado). Destes, a penhora de bens ocorre em apenas um quarto dos casos (ou seja, 15% do total), mas somente uma sexta parte das penhoras resulta em leilão. Contudo, dos 2,6% do total de processos que chega a leilão, em apenas 0,2% o resultado satisfaz o crédito. A adjudicação extingue a ação em 0,3% dos casos. A defesa é pouco utilizada e é baixo seu acolhimento: a objeção de preexecutividade ocorre em 4,4% dos

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casos e os embargos è execução em 6,4%, sendo seu índice de acolhimento, respectivamente, de 7,4% e 20,2%. Observe-se que, do total de processos da amostra deste estudo, a procedência destes mecanismos de defesa foi reconhecida em apenas 1,3% dos casos.”

Referido cenário aponta para um engessamento da máquina judiciária e causa a

preocupação, principalmente na busca por alternativas eficazes.

2.2 Vantagens e desvantagens do sistema brasileiro

A partir do modelo exposto e dos problemas apresentados anteriormente, pode-se dizer

que o modelo brasileiro de cobrança de créditos fazendários tem seus lados positivos assim

como negativos, pendendo mais para as desvantagens.

De início, cumpre ressaltar o complexo sistema de constituição de créditos que passa

por várias etapas, dando a ambas as partes certa tranquilidade quanto à certeza e a liquidez do

título executivo. Mesmo sendo a CDA título executivo extrajudicial constituído

unilateralmente, resta demonstrado que em vários momentos de sua constituição, pode o

contribuinte buscar provar irregularidades, com o condão de anular o crédito correspondente.

Outrossim, o contribuinte pode fazer o mesmo em sede judicial, valendo-se de uma

gama de meios de defesa até o fim do executivo fiscal, sobre qualquer ato que nele venha a

ocorrer. Tal variedade dá ao contribuinte toda a ampla defesa e contraditório necessários,

porém, mais do que suficientes ao respeito do devido processo legal.

Nas sábias palavras de Hugo de Brito Machado (2009, p. 467):

“O contraditório é uma forma de assegurar-se a ampla defesa, e por isto, sob certo aspecto, com ela se confunde. Por contraditório entende-se o procedimento no qual tudo o que de relevante é praticado no processo por uma das partes deve ser do conhecimento da parte contrária. (...) Ampla defesa que dizer que as partes tudo podem alegar que seja útil na defesa da pretensão posta em juízo. Todos os meios lícitos de prova podem ser utilizados.”

Em verdade, a defesa do contribuinte é essencial para evitar abusos e excessos por parte

do Estado na sua ânsia pela satisfação do crédito. A viabilidade de defesa conferida pelo

modelo de execução atual compreende basicamente, em sede judicial, os embargos do

executado, exceção de pré-executividade, embargos à adjudicação, embargos à arrematação e

demais recursos pertinentes. Assim, restam mais que protegidos os ditames constitucionais a

favor do executado, mesmo que, na maioria das vezes, não se utilize o contribuinte das

garantias postas à disposição.

Pode-se citar, ainda, uma quantidade razoável de facilidades ao contribuinte, criadas,

em regra, pelo Código Tributário Nacional, permitindo ao contribuinte programar-se para o

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pagamento do tributo. São os casos de parcelamentos (PAES, PAEX, REFIS, REFIS da Crise e

demais parcelamentos ordinários), moratórias, remissões, compensações, entre outros.

Sem prejuízo das vantagens elencadas para o contribuinte, a legislação brasileira dá ao

Fisco uma série de privilégios visando a satisfação do crédito, como a indisponibilidade

universal de bens, a inscrição do contribuinte em um cadastro de inadimplentes, a presunção de

fraude pela alienação ou oneração de bens ou rendas após a inscrição em dívida ativa, entre

outras vantagens, as quais, mesmo assim, não são suficientes para desobstruir o Judiciário dos

inúmeros processos de execução fiscal, nem de acelerar a sua tramitação.

Por outro lado, em se tratando de desvantagens, é compreensível a rigorosa exigência

quanto a prévio e regular procedimento de impugnação do crédito. Porém, demonstra-se

exagerado o número de etapas por que passa o tributo até ser constituído e efetivamente

cobrado. Toda essa jornada de constituição creditícia até a sua inscrição em dívida ativa

configura verdadeiro desperdício de tempo e gastos já no âmbito administrativo, o que poderia

ser revertido através de um procedimento mais resumido, garantidas as formalidades

constitucionalmente previstas.

A falta de estrutura da Administração gera uma sensação de desconfiança e uma

relação desarmoniosa entre Fisco e contribuinte. Nesse sentido, Eurico Marcos Diniz de Santi,

em estudo da Fundação Getúlio Vargas (2011), aponta como um dos grandes problemas do

Processo Administrativo Fiscal, a falta de acesso e publicidade de informações sobre vários

aspectos do PAF: desde questões relativas ao andamento dos processos, até o fato dos inteiros

teores das decisões do CARF não estarem em sua totalidade disponíveis para consulta nos

sítios eletrônicos correspondentes.

Aliás, percebe-se, do presente modelo de constituição do crédito que a unilateralidade e

um possível absolutismo exacerbado e mal entendido da supremacia do interesse público ditam

condutas que dificultam uma administração facilitadora dos direitos dos contribuintes e de uma

arrecadação eficiente (GODOY, 2010, p. 137). Exalta-se muito mais os procedimentos do que

propriamente os resultados.

Essa questão esbarra em outro ponto crucial do Sistema Tributário Nacional: a

suspensão da exigibilidade do crédito tributário por impugnações e recursos administrativos.

Ora, mesmo que se entenda serem necessárias tantas etapas para constituição do crédito

tributário, ainda assim, não se pode dar ao contribuinte um privilégio tão grande – qual seja, o

de suspender a exigibilidade do crédito enquanto não se ultrapassa a fase de impugnação

administrativa – para discutir o mesmo, pois além de indisponível, o crédito tributário é

urgente, é estritamente necessário para que o Estado consiga prover seu povo.

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São variados os casos de suspensão do crédito tributário no Código Tributário

Nacional, não se exigindo, em regra, nenhuma garantia de que o devedor pagará ao Fisco, caso

realmente o tributo seja devido.

Por sua vez, mais uma grande desvantagem do modelo atual de execução dos tributos é

a dificuldade em se localizar bens penhoráveis com qualidade e liquidez suficientes a garantir

o crédito reclamado. Embora disponha a lei executiva que cabe ao contribuinte nomear bens

passíveis de penhora, muitas vezes tais contribuintes fogem do referido dever, restando ao

Judiciário e à Administração Fazendária superar tal obstáculo e procurar os bens que servirão

de garantia. Sem falar que, apesar do que preconiza a legislação12, a jurisprudência tem

permitido que o executado oculte seu patrimônio, como não é raro observar-se casos em que a

penhora sobre valores em contas bancárias seja precedida pelo esgotamento, pelo exequente,

de todos os meios para localizar bens em nome do executado.

Há que se falar ainda nas hipóteses em que, mesmo encontrando bens penhoráveis, os

mesmos não despertam interesse de nenhum licitante, por conta de sua especificidade, como no

caso de máquinas ou mercadorias do executado (portões, motores, bombas hidráulicas,

materiais de construção). Com efeito, é o que resta a ser executado, uma vez que houve tempo

suficiente para que o executado transferisse os bens de elevado valor econômico e passíveis de

venda em leilão.

De se ver, também, que o inadimplemento do tributo devido afeta notadamente alguns

princípios que informam não só o Direito Tributário, mas o próprio Direito em si. O atual

sistema de cobrança, graças à sua inefetividade, beneficia devedores que protelam o

pagamento e alteram toda uma estrutura que deveria ser de igualdade e harmonia.

Por isso, em se tratando de princípios, que não deixam de ser fontes para este ramo da

ciência, importa ressaltar especificamente um, que rege todo o ordenamento jurídico e tem

aplicação ímpar na proteção dos contribuintes no âmbito tributário e que, pelo modelo atual de

cobrança de tributos, não vem sendo prestigiado, tanto por falhas na fiscalização tributária

quanto pela ineficiência da cobrança judicial.

Trata-se do Princípio da Igualdade, com sede no artigo 5º, da Constituição Federal de

1988. Tal princípio traduz-se, com base nos ensinamentos de Rui Barbosa, no tratamento igual

daqueles que estão em situação idêntica (acepção horizontal do princípio), bem como na

nivelação dos desiguais através do tratamento diferenciado a eles, diminuindo as suas

desigualdades (acepção vertical do princípio). _______________ 12 Conforme o artigo 600, IV, do CPC, aplicável subsidiariamente à execução fiscal, é ato atentatório à dignidade da justiça, o ato do executado intimado que não indicar ao juiz, no prazo legal, sobre seus bens passíveis de penhora.

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José Maurício Conti apud Rodrigo Aiache Cordeiro (2006, p. 116) idealiza que a

Igualdade chega a ser mais que princípio constitucional, senão um princípio geral de todo o

Direito, que deve existir em um sistema constitucional. Decorre do Princípio da Igualdade, o

Princípio da Isonomia Tributária previsto no Sistema Tributário Nacional, especificamente no

artigo 150, inciso II, da Constituição Federal (CARRAZA, 2011, p. 110):

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente de denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

Para a devida promoção da igualdade material tributária, o legislador e o aplicador

devem levar em consideração as condições concretas de todos os sujeitos passivos da relação

tributária, evitando-se quaisquer privilégios odiosos e discriminações fiscais, como seria o caso

de um indivíduo, nas mesmas condições de outro, deixar de pagar certo tributo, em razão do

cargo que ocupa, por exemplo.

Além disso, outro parâmetro para se alcançar a igualdade em matéria de tributação é a

análise pelo legislador infraconstitucional da capacidade contributiva dos indivíduos

tributados, devendo-se evitar que incida a mesma carga tributária sobre aqueles

economicamente diferenciados, em respeito ao Princípio da Capacidade Contributiva, corolário

do Princípio da Isonomia.

Dessa forma, a partir do momento em que há dois contribuintes de igual capacidade

contributiva, sendo que um deles é inadimplente, o outro se prejudica não só na face abstrata

de desigualdade, mas também na face concreta, no sentido de que paga por serviços públicos

para si e para o outro que não adimpliu a obrigação tributária, suportando sozinho a elevada

carga fiscal, comprometendo seu patrimônio de forma contundente.

Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 31) exalta a importância do referido

princípio na tributação:

“Portanto, ainda que o princípio da capacidade contributiva não possa, a priori, ter o seu conteúdo determinado, deve ser reconhecido como direito fundamental do contribuinte. A capacidade contributiva é o pressuposto, o limite máximo e o parâmetro da tributação.”

Por isso, preceitua o referido autor que a capacidade contributiva não é princípio a ser

respeitado apenas na sua dimensão negativa, como direito de pagar até a respectiva capacidade

econômica, mas também na sua dimensão positiva, como o direito de exigir que os outros

cidadãos arquem com os custos das finalidades estatais.

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50

Outrossim, é possível se afirmar, ainda, que a impunidade e a ausência de efetividade

na cobrança do crédito tributário afeta a atividade econômica em si. Um dos princípios da

ordem econômica e financeira previsto no artigo 170, da Constituição Federal, é o princípio da

livre concorrência, claramente desrespeitado no momento em que parte das empresas suporta a

alta carga tributária, enquanto outras se evadem do pagamento, podendo oferecer seus produtos

e serviços por um preço menor, sem falar da maior margem de lucro.

Ainda no tocante às desvantagens, o tempo e os recursos gastos com a inefetividade do

atual paradigma usado na execução judicial do tributo são as mais visíveis inconveniências

relativamente às demais.

O Poder Judiciário gasta tempo em atos meramente administrativos, de pouca afeição

judicial, como a citação, a penhora, a avaliação, entre outros, além de gastar seus recursos na

tentativa de localização do devedor, na tentativa de penhora de bens do mesmo, sem muitas

vezes sequer obter êxito, restando arquivar o processo, que futuramente terá seu fim decretado

pela prescrição intercorrente.

Voltando a esfera principiológica da questão, é possível concluir que as deficiências

apontadas, sejam do Judiciário, sejam da Administração Fazendária, são verdadeiros

obstáculos à realização do Estado Democrático de Direito, porquanto pecam no resguardo das

disposições constitucionais relativas à eficiência e à razoável duração do processo, trazidas,

respectivamente pelos artigos 37, caput e 5º, inciso LXXVIII, ambos da Constituição Federal

de 1988.

Nas palavras de Fernanda Marinela (2011, p. 43):

“A eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. Consiste na busca de resultados práticos de produtividade, de economicidade, com a consequente redução de desperdícios do dinheiro público e rendimentos típicos da iniciativa privada, sendo que, nessa situação, o lucro é do povo; quem ganha é o bem comum.”

Ora, se como já detectado por pesquisa do IPEA, o próprio método de gestão do Poder

Judiciário é antiquado e se demonstra ineficiente para reduzir o número de processos e

finalizá-los com êxito ao credor e ao interesse público, configura-se verdadeira a afronta ao

princípio supracitado, cuja aplicabilidade pode, sim, ser estendida à função administrativa

exercida pelo Judiciário.

Por outro lado, a celeridade processual e a razoável duração do processo, frutos da

Emenda Constitucional 45/04, podem ser exemplificados e alcançados, no entender de

Alexandre de Moraes (2007, p. 101), pelas seguintes ações:

“(...) a vedação de férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, a proporcionalidade do número de juízes à efetiva demanda judicial e à

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respectiva população, a distribuição imediata dos processos, em todos os graus de jurisdição, a possibilidade de delegação aos servidores do Judiciário, para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório, a necessidade de demonstração de repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para fins de conhecimento do recurso extraordinário, a instalação da justiça itinerante, as súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal.”

Ressalte-se que o próprio autor defende que se retire do juiz a prática dos atos de

administração e de mero expediente, sem caráter decisório, mesmo que, para ele, tais atos

devam ser realizados pelos próprios servidores do Judiciário.

Da análise dos argumentos expostos, percebe-se que a quantidade de dificuldades

encontradas e prejuízos causados pelo modelo de execução fiscal brasileiro é bem maior que o

número de suas vantagens, geralmente ligadas a um “hipergarantismo” ao contribuinte quiçá

dispensável, ou, ao menos, limitável, em detrimento de interesse público maior, que é a efetiva

realização dos direitos sociais.

Não se pode ficar estático diante de verdadeiro malefício à sociedade. Efetivamente, a

busca de alternativas é de natural e necessária importância, como se pretende, desde logo, no

presente trabalho, a partir da análise de novos paradigmas de execução, bem como da análise

de meios alternativos de solução de conflitos, como a transação.

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3 TRANSAÇÃO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA

3.1 Transação e interesse público

Ultimamente, mais e mais expedientes diferenciados vêm surgindo no cenário do

solucionamento de controvérsias, sejam tributárias ou não. Na verdade, é inegável, em que

pese a importância da atuação do Judiciário, que há cada vez mais a fuga da vala comum dos

tipos ordinários, ou tradicionais, de solução de conflitos. Nesse mesmo sentido, em notícia

veiculada no sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal (BRASIL, 2011d):

“Ao abrir o Seminário sobre Mediação e Conciliação de Conflitos Judiciais hoje (28), em São Paulo, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Cezar Peluso, afirmou que a noção de acesso à Justiça já não pode limitar-se ao ingresso no sistema oficial da chamada solução adjudicada de conflitos, ou seja, o Poder Judiciário.”

Em outra notícia, desta vez veiculada no Portal do Conselho Nacional de Justiça,

intitulada “Semana da Conciliação já supera R$ 1 bilhão em acordos”, demonstra-se como

recentemente os institutos alternativos vêm ganhando força e alcançando resultados

expressivos. De acordo com a referida notícia (BRASIL, 2011e):

“A 6ª Semana Nacional de Conciliação superou a marca de R$1 bilhão em valores de acordos homologados. De acordo com os números enviados até a manhã desta quarta-feira (14/12) pelos 53 tribunais que participaram da Semana, foram realizadas 339.608 audiências e efetuados 163.906 acordos, em valores que somam R$ 1.051.073.270, 27. (...) De acordo com a ministra Eliana Calmon, (...) ‘A primeira solução dos litígios tem de partir da conciliação. Só assim poderemos ter um Judiciário do tamanho que um país democrático deve ter’.”

Ainda conforme a notícia, de 339.608 (trezentos e trinta e nove mil seiscentos e oito)

audiências realizadas, houve aproximadamente 50% (cinquenta por cento) de acordos

(BRASIL, 2011e).

As alternativas ao atual cenário de obstrução do Poder Judiciário, se é que é possível

falar-se assim, vem aparecendo por consequência da maior conscientização dos direitos, da

facilidade do acesso à Justiça, entre outros motivos. Fato é, porém, que a morosidade da

prestação jurisdicional torna a busca pela efetivação dos direitos fundamentais um permanente

desafio.

O crescimento da litigiosidade e a inefetividade das opções tradicionais sugerem

algumas alternativas que, claro, não coloquem em risco as garantias fundamentais do

contribuinte. Uma dessas alternativas, sendo introduzida aos poucos na esfera do Direito

Público, é a transação.

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De início, quanto à sua natureza, alguns autores tributaristas – dentre eles, Eduardo

Sabbag, Mauro Luís Rocha Lopes e Hugo de Brito Machado – entendem a transação nos

moldes da concepção do Direito Civil (precisamente de acordo com o artigo 840, do Código

Civil). Com isso, referidos autores conceituam a transação como acordo entre interessados que,

mediante concessões mútuas e recíprocas previnem (não no âmbito tributário) ou terminam

litígios (SABBAG, 2011), (LOPES, 2011) e (MACHADO, 2009).

De Plácido e Silva, na mesma linha, conceitua transação da seguinte forma:

“(...) No conceito do Direito Civil, no entanto, e como expressão usada em sentido estrito, transação é a convenção em que, mediante concessões recíprocas, duas ou mais pessoas ajustam certas cláusulas e condições para que previnam litígio, que se possa suscitar entre elas, ou ponham fim a litígio já suscitado.

Para Ricardo Alexandre (2011, p. 461), “transação é o negócio jurídico em que as

partes, mediante concessões mútuas, extinguem obrigações, prevenindo ou terminando

litígios”. Ressalva o referido autor justamente que “em direito tributário, não existe a figura da

transação preventiva”.

Por sua vez, entende Aliomar Baleeiro (2007, p. 904-905) que, com a devida vênia aos

demais autores, a melhor proposta para a natureza do instituto é a seguinte:

“O próprio art. 171 conceitua a transação, empregando o vocábulo no sentido jurídico e não vulgar de negócio qualquer, como, p. ex., a compra e venda, mas com o mesmo conteúdo do art. 1025 do Código Civil, isto é, de ato jurídico específico no qual um litígio entre os interessados pode ser regulado e extinto mediante ajuste de concessões recíprocas. Ato jurídico, porque modifica e extingue obrigações preexistentes, e não contrato, apesar de prestigiosas opiniões em contrário, porque não cria tais obrigações.”

Frise-se que, no sentido do artigo 171, do Código Tributário Nacional, pelo menos na

forma como hoje está inserta no ordenamento jurídico tributário brasileiro, a transação em

matéria tributária somente se presta a terminar litígios, ou seja, é pressuposto do instituto que

haja litígio instaurado.

Interessante lição dá Paulo de Barros Carvalho (2007, p. 479-480) apud Arnaldo

Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 42) sobre o assunto, diferenciando a transação para o

direito público e para a tradição civil, bem como explicitando acerca do vocábulo “litígio”:

“(...) O processo de transação tão-somente prepara o caminho para que o sujeito passivo quite sua dívida, promovendo o desaparecimento do vínculo. Tão singela meditação já compromete o instituto como forma extintiva de obrigações. Ao contrário do que sucede no direito civil, em que a transação tanto previne como termina o litígio, nos quadrantes do direito tributário só se admite a transação terminativa. Há de existir litígio para que as partes, compondo mútuos interesses, transijam. Agora, divergem os autores nas proporções semânticas do vocábulo litígio. Querem alguns que se trate de

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conflito de interesses deduzido judicialmente, ao passo que outros estendem a acepção a ponto de abranger as controvérsias meramente administrativas.”

Para o aludido autor, a transação não é forma de extinção do crédito tributário, mas

sim, o mero caminho para a mais importante das espécies, o pagamento. Ademais, registre-se

que, da leitura em apreço, conclui-se a necessidade de existência de dúvida, litígio. A despeito

da divergência doutrinária, o CTN não faz qualquer restrição quanto à abrangência dos litígios

a serem terminados pela transação.

Luís Inácio Lucena Adams e Luiz Dias Martins Filho (2008, p. 38) entendem a

transação tributária da seguinte forma:

“A transação em matéria tributária consiste em proposta de um acordo/consenso estabelecido pela Administração Pública/Tributária, com base em uma norma legal, em que se objetiva por fim a um litígio, seja judicial ou administrativo, que verse sobre o pagamento de crédito tributário envolto em controvérsia. Poderiam, nessas situações, ser feitas concessões por parte da Administração Pública, sempre tendo em vista o interesse maior, ou seja, o interesse público, consubstanciado numa efetiva e justa satisfação do crédito tributário.”

De tudo isso, o melhor entendimento é de que a transação pode ser usada somente

como forma de extinção de litígios, assim entendidos como pretensão resistida em processo

administrativo ou judicial, salvo antes do lançamento (o que caracterizaria transação

preventiva). Resumidamente, a transação em matéria tributária refere-se ao ato jurídico

realizado entre Fisco e contribuinte que, mediante concessões mútuas, acordam sobre o fim de

uma controvérsia, aperfeiçoando a sua relação e alcançando o desígnio da supremacia do

interesse público ao aumentar a arrecadação tributária, atingindo-se, assim, uma “justiça fiscal

consensual” (GODOY, 2010).

A vontade do Estado é manifestada pela lei, que acoberta a concessão estatal. Quanto

ao particular, este terá direito de escolha quanto a transacionar ou não, preservando-se seu

direito de defender-se administrativa e judicialmente quanto ao litígio.

Enfim, as polêmicas sobre o assunto não pairam somente sobre a natureza jurídica da

transação, mas também sobre a possibilidade de sua aplicação ao Direito Público. Cumpre

ressaltar que tal instituto deve ter sua aplicação ao Direito Público diferenciada do âmbito

privativista. A publicização do instituto deve enfrentar a figura do interesse público, conceito

indeterminado que rege esse ramo da ciência jurídica.

Para o estudo, necessário, então, apreender dos ensinamentos da doutrina os conceitos

que envolvem o interesse público. Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, 69-73) assim

conceitua os princípios da supremacia e da indisponibilidade do interesse público:

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“a) Supremacia do interesse público sobre o privado (...) Trata-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito Público. Proclama a superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o do particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento deste último. É pressuposto de uma ordem social estável, em que todos e cada um possam sentir-se garantidos e resguardados. (...) b) Indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos (...) A indisponibilidade dos interesses públicos significa que, sendo interesses qualificados como próprios da coletividade – internos ao setor público –, não se encontram à livre disposição de quem quer que seja, por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los – o que é também um dever – na estrita conformidade do que predispuser a intentio legis.”

É verdade que a concepção de acordos sobre patrimônio público passa uma percepção

de violação aos princípios basilares do Direito Público. Contudo, há que se ressaltar que a

transação nada tem de divergente à supremacia ou à indisponibilidade do patrimônio público.

Pelo contrário, consubstanciada no princípio constitucionalmente previsto da eficiência,

a transação vem a ser uma real alternativa à pouquíssima efetividade experimentada pelo

modelo atual de arrecadação de tributos e de solução de conflitos, este sim divergente ao

interesse público, porquanto contrário à política de evitar os desperdícios de dinheiro público.

Segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2006, p. 90) apud Arnaldo Sampaio de

Moraes Godoy (2010, p. 103), há no interesse público um sentido de finalidade.

Vejamos o trecho citado:

“(...) A lei capta e identifica um determinado interesse geral, define-o como um interesse público e, com isso, prioriza-se atendimento sobre os demais interesses, em certas condições. Portanto, a norma legal, ao enunciar interesse público específico, comete ao Estado, PR qualquer de suas entidades, ou órgãos, ou mesmo a particulares, o encargo finalístico de satisfazê-lo, definindo, em consequência, as competências, as condições de proteção, os direitos e os deveres jurídicos correlatos (...) Em decorrência, a Administração não pode desistir de agir para a satisfação dos interesses que lhe forem confiados, embora isso não a tolha de escolher, nos limites da própria lei com outros, igualmente protegidos, mas que lhes sejam concorrentes, visando a uma mais justa e melhor realização do Direito.”

Ou seja, quando a lei designa certo interesse público a ser protegido pelo Estado, este

assume referido encargo finalístico, podendo, inclusive sobrepor, com razoabilidade e

ponderação, um interesse a outro. Em verdade, deve-se abordar o interesse público a partir

dessa perspectiva finalística, colocando ao seu lado o princípio constitucional da eficiência,

previsto no art. 37 da Constituição, a seguir transcrito (CARRAZA, 2011, p. 53):

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)

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No momento em que se busca a eficiência da arrecadação, devido a comando

constitucional, busca-se, também, alcançar os objetivos fundamentais da República e a

adequada prestação dos direitos sociais, também de acordo com a Carta Maior. A transação,

assim, aparece como instituto viável para a consecução de tais fins.

No sentir de Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy o princípio da eficiência relativiza os

princípios corolários do interesse público, justamente com o fim de respeitar esse postulado.

Sem prejuízo de uma visão econômica e mais eficiente do Direito e com pujante influência da

doutrina de Mangabeira Unger, Godoy (2010, p. 129) preceitua:

“A ideia de eficiência, (...), vincular-se-ia, em princípio, à redução dos desperdícios de dinheiro público, mediante a execução dos serviços prestados à comunidade com presteza, perfeição e rendimento funcional. No entanto, a redução do desperdício do dinheiro público também pode ser obtida mediante alocação mais adequada dos recursos do Estado. Esta circunstância pode ser alcançada, entre outros, pela diminuição da litigância entre os entes da Administração, o que enseja a proposta do modelo aqui estudado. Não seria essa a percepção com a qual acena a análise econômica do Direito?”

Fazendo coro à Godoy, Heleno Taveira Tôrres (2008, p. 328) coloca a eficiência

administrativa lado a lado com o princípio da praticidade da tributação, dispondo que:

“O princípio jurídico e técnico da praticabilidade ou praticidade da tributação, que se deve estender aos meios de resolução de controvérsias, deve ser repensado e posto como condição de eficiência administrativa, tal como o exige o art. 37 da Constitiução. Adam Smith, já nos idos de 1776, enfatizava a importância da garantia da certeza e praticabilidade dos tributos, como meio de igualdade e segurança jurídica para os contribuintes.”

O interesse público, como visto, sugere supremacia, expressão que está associada, por

sua vez, ao bem-estar geral da coletividade, ao alcance das finalidades dos indivíduos em uma

sociedade. Coaduna-se não com os objetivos próprios de cada um, mas com as expectativas de

toda a sociedade. Nesse mesmo sentido, explana Odete Medauar (2007, p. 128) apud Arnaldo

Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 101):

“(...) é invocado [o princípio da supremacia do interesse público] em outros ramos do direito público. A expressão pode ser associada a bem de toda a coletividade, à percepção geral das exigências da vida em sociedade. Esse princípio vem apresentado tradicionalmente como o fundamento de vários institutos e normas do direito administrativo e, também, de prerrogativas e decisões, por vezes arbitrárias, da Administração Pública. Mas vem sendo matizado pela ideia de que à Administração cabe realizar a ponderação dos interesses presentes numa determinada circunstância, para que não ocorra sacrifício a priori de nenhum interesse; o objetivo dessa função está na busca de compatibilidade ou conciliação dos interesses com a minimização de sacrifícios. O princípio da proporcionalidade também matiza o sentido absoluto do preceito, pois implica, entre outras decorrências, a busca da providência mais gravosa, na obtenção de um resultado.”

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Novamente, falar-se em violação da supremacia do interesse público não serve de

argumento contrário à utilização da transação tributária, tendo em vista a sua finalidade de dar

eficiência à arrecadação tributária, e, por consequência, de alcançar a realização do referido

princípio. Finalizando, Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 126) determina que:

“A busca do interesse público, em todas essas dimensões, é um dever da Administração. Deveria orientar a produção normativa do Poder Legislativo. Deveria fixar os parâmetros da ação e dos projetos do Poder Executivo. É o referencial para toda a atuação do Poder Judiciário. O conceito é indefinido, do ponto de vista linguístico, nas variáveis de dicionários de equivalência. Mas é percepção de ampla inspiração democrática, de balizamento para a eficiência da Administração. Transita no tempo. Mas permanece, intuitivamente, pelo menos, como advertência para o que não se pode fazer. Vincula-se, ainda, à ideia de eficiência. Definitivamente, não há nenhuma pista ou orientação que confirme que o interesse público, o que quer que seja, fosse categoria ameaçada por regime de transação tributária. Pelo contrário ideia de eficiência sufragaria o uso de técnicas de transação fiscal.”

Por sua vez, em se tratando do choque entre transação tributária e indisponibilidade do

interesse público, lembre-se que há requisito para a possibilidade de transação que impõe o

CTN: a dependência de lei específica, indicando a autoridade competente para autorizar o

acordo em cada caso, e encobrindo o ato jurídico subjacente, que identifique a concessão feita

pelo Fisco ao sujeito passivo, como, por exemplo, parcelamento do débito, dação em

pagamento, entre outros.

Isso quer dizer que não pode a autoridade administrativa, principalmente por ser caso

em que pode haver diminuição do patrimônio público, transigir sem autorização de lei. A

transação somente pode ser celebrada com base em previsão legal, sob pena de ferir o princípio

da indisponibilidade do interesse público, como se verá adiante.

Ora, se o próprio instituto da transação pressupõe uma lei que autorize os contornos do

ato jurídico, inclusive as possíveis concessões a serem feitas pelo Poder Público, está

preservada a indisponibilidade do interesse público. Trata-se da mera aplicação do princípio

constitucional da legalidade ampla (não se faz ou se deixa de fazer algo senão em virtude de

lei). A disponibilidade em meio à transação é plenamente justificável por ser meio viável para

se alcançar o interesse público.

3.2 Experiências com o instituto e o Projeto de Lei 5.082/2009

Há que se falar que não existe até hoje, apesar de que há esforço para isso, uma lei

geral sobre transação em matéria tributária, que a coloque incisivamente na prática cotidiana

de todas as Fazendas.

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Há, no entanto, disposições em algumas leis esparsas que genericamente permitem a

transação para término dos conflitos tributários, como é o caso da Lei 9.469/1997, que dá ao

Advogado-Geral da União poder para autorizar a realização de transações, em juízo, para

terminar litígio, nas causas de valor até R$500.000,00 (quinhentos mil reais), conforme seu

artigo 1º e seguintes.

Outro exemplo da situação acima citada é a Lei de Criação dos Juizados Especiais

Federais (Lei n.º 10.259/2001), que no seu artigo 10, parágrafo único, confere aos advogados

públicos poder para conciliar, transigir ou desistir de processos da competência dos referidos

Juizados, ou seja, processos cujo valor da causa não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos.

Além disso, importa mencionar que alguns Estados e Municípios já legislaram e vem

aplicando a transação tributária. É o caso do Estado de Pernambuco, cuja Lei Complementar

n.º 105/2007, regulamentada pelo Decreto n.º 32.549/2008, fixou modelo de transação judicial

e extrajudicial, nos moldes a que aduzem.

Já o modelo do Rio Grande do Sul, consubstanciado na Lei n.º 11.475/2000, que

alterou a Lei n.º 6.537/1973, prevê transação somente quando já houver litígio judicial,

respeitando a previsão de transação tributária terminativa de conflitos do CTN.

Do mesmo modo, alguns municípios também já possuem suas leis sobre transação,

aplicando o instituto e desafogando as instâncias judiciais, como se pode citar Campinas,

Curitiba, Angra dos Reis e Belo Horizonte.

A título de jurisprudência sobre o assunto, destacam-se apenas algumas decisões que

reconhecem que a decisão homologatória de transação é sentença de mérito contra a Fazenda e,

portanto, passível de reexame necessário, nos moldes do artigo 475, do CPC (REsp.

895.700/MT e REsp. 929.121/MT). Tais decisões, apesar de não tratarem da validade ou

legitimidade da transação tributária realizada no caso concreto, dão conta, junto a diversos

outros fatores, de que a transação é realidade no direito tributário brasileiro.

Diante do mencionado cenário, em 20 de abril de 2009, foi encaminhado ao Congresso

Nacional, para sua apreciação, o Projeto de Lei 5.082/2009, assinado pelo atual Ministro da

Fazenda, Guido Mantega e atual Ministro do STF, José Antônio Dias Toffoli, este, na época do

encaminhamento do PL, então Advogado-Geral da União.

O Projeto tem por escopo, detalhado em seu encaminhamento, “o de constituir nova

relação entre a administração tributária e os contribuintes, possibilitando que as duas partes,

mediante entendimento direto, alcancem uma aplicação mais homogênea da legislação

tributária” (BRASIL, 2011f, p. 22).

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59

Em verdade, a busca por novos meios de composição dos conflitos tributários, como a

criação da referida Lei Geral de Transação, enseja a análise de outras experiências que não

aquelas aqui já mencionadas.13 Diga-se que alguns países, não obstante suas diferentes

constituições e legislações tributárias, têm obtido sucesso na implantação do instituto e

incremento nas suas receitas.

Na Itália, por exemplo, tem-se a figura do accertamento con adesione, um acordo para

o correto acertamento do crédito tributário (principalmente a definição de valores de tributos

como imposto de renda), finalizando o enfrentamento entre os sujeitos da relação tributária.

Em várias comunas da Itália, há a utilização da transação no tocante aos seus tributos

específicos.

Tem início sempre com um convite da Administração e uma petição do contribuinte,

esta informando o período de tempo dos impostos que se pretende abranger no pacto e o lugar

do prazo para apresentação da resposta. Após a apresentação da proposta, haverá uma fase de

contraditório onde se aportarão dados concretos que possam auxiliar na concretização da

proposta e, finalmente, caso seja aceita a proposta, haverá o pagamento e posterior liquidação

do imposto devido, com a extinção das obrigações tributárias decorrentes daquela situação.

O acordo não poderá ser modificado, salvo se viciada a vontade dos agentes. Já os

impostos referidos no pacto não poderão ser objeto de novas verificações e controle por parte

da autoridade fiscal, garantindo a segurança jurídica do acordo. Além disso, o accertamento

com adesione extingue a punibilidade do agente no campo penal e permite a diminuição das

sanções pelo descumprimento das obrigações acessórias a um valor correspondente a um

quarto do original.

Na Espanha, por sua vez, utilizam-se as actas con acuerdo. O interessado encaminha

proposta à Administração, para que se possa alcançar um acordo sobre a regra aplicável ao

caso. O documento que formaliza a pretensão deve vir instruído de diversos elementos, como,

fundamento da aplicação, elementos de fato, fundamentos jurídicos, entre outros.

Exige-se um depósito por parte do interessado, substituível por aval de entidade de

crédito ou seguro de caução, na quantia do valor discutido. Após a concordância das

autoridades fiscais espanholas, o contribuinte e a Administração discutem a melhor proposta

para a transação, que terá que ser autorizada por órgão superior para a inteira formalização do

acordo, que poderá incluir redução de valores a título de sanção.

_______________ 13 Isto é, aquelas relativas aos casos isolados de utilização da transação em matéria tributária no Brasil, como, por exemplo, o caso dos Juizados Especiais Federais.

Page 62: Monografia - Allan Nunes Callado _Versão Definitiva_

60

Por fim, nos Estados Unidos, há os chamados closing agreements, que são os acordos

entre Fisco e contribuinte para acertamento do crédito tributário. O agente fiscal americano,

competente para a transação, aprovará o acordo (caso haja delegação do Secretário do Tesouro

para tanto), que transita administrativamente, não podendo ser discutidas novamente as

matérias atingidas pelo pacto.

Há também outra espécie de transação na legislação americana. Trata-se do

compromise, caracterizada por um número maior de formalidades, e que envolve, inclusive,

matéria penal de fundo tributário. Nesse caso, há exigência de autuação do procedimento,

instruindo-o com parecer do procurador do fisco federal e identificando-se razões e

características que informam o acordo, bem como a quantia efetivamente paga.

Importante citar o que dispõe Godoy (2010, p. 86) sobre o tratamento que o agente

fiscal dá à proposta, bem como a importância que a legislação americana dá à participação do

contribuinte na definição do melhor modo a pagar o tributo:

“Há regras especiais que regem o tratamento que o agente fiscal deve dar às propostas. Proíbe-se que o servidor público rejeite proposta de devedor de baixa renda, levando em conta somente o fato de que a oferta seja de pequeno valor. (...) O modelo também prevê revisão administrativa de propostas rejeitadas, inclusive de parcelamento, antes que a aludida recusa seja informada ao contribuinte-proponente. Há também disposição que garante que o contribuinte recorra administrativamente das negativas das propostas de transação que fizer.”

A aplicação da transação nesses países parece ter objetivo precípuo de determinação da

quantidade de tributo a ser pago, chegando-se nos acordos à melhor interpretação de situações

fáticas, concluindo ou não pela ocorrência de algum fato gerador, mormente quando este

contém em sua norma legal conceito jurídico indeterminado.

Apesar disso, ressalte-se que a transação americana não ocorre somente no acertamento

do tributo de forma preventiva. Aliás, segundo Arnaldo Sampaio de Morais Godoy (2010, p.

87), “boa parte das transações ocorrerá no Appeals Division, em tradução livre, Divisão de

Apelação.” Ainda segundo o referido autor, tal órgão “tem por missão resolver controvérsias

com contribuintes, administrativamente, em regime de imparcialidade, em comprometimento

com a confiança pública na integridade e eficiência da agência do imposto de renda”

(GODOY, 2010, p. 87). Terminam-se, dessa forma, os litígios administrativos e judiciais que

estejam ocorrendo, economizando-se tempo e gastos para a Administração e para o

contribuinte.

Ora, apreende-se, então, que a transação é instituto com presença marcada nos países

cujos modelos de administração tributária tem sido eficientes no seu objetivo de arrecadação

Page 63: Monografia - Allan Nunes Callado _Versão Definitiva_

61

dos tributos. Por isso mesmo, voltando-se a analisar o Projeto de Lei 5.082/2009, busca-se no

Direito Brasileiro, sair de um paradigma de litigiosidade excessiva, sem resultados e ruim para

a economia e para a sociedade.

Assim, faz-se necessária, ao presente estudo, a análise dos principais pontos do referido

Projeto, que visa, nos moldes das experiências estrangeiras e da inovação institucional, uma

maior aproximação do contribuinte à Administração Fazendária.

Antes da análise da Lei Geral de Transação, cumpre ressaltar, porém, a necessidade de

alteração no Código Tributário Nacional, para a devida conformação deste com a nova

legislação sobre transação.

Nesse sentido, encontram-se no Congresso Nacional para votação, assim como o

Projeto da Lei Geral de Transação, um projeto de lei complementar com o fim de alterar o

CTN, especificamente os artigos 151, 156 e 171. Atente-se que tais alterações, juntamente com

outras aqui mencionadas, compõem o II Pacto Republicano, conjunto de medidas reformadoras

com o objetivo de dar mais efetividade ao Poder Judiciário.

Assim, tal lei complementar incluiria ao CTN três novas hipóteses de suspensão do

crédito tributário: a) a garantia administrativa; b) a decisão de autoridade administrativa

legalmente incumbida da cobrança da dívida (no caso da execução fiscal administrativa); e c) a

admissão de proposta para habilitação em procedimento de transação. Além disso, seria

incluída mais uma forma de extinção do crédito tributário, qual seja, o cumprimento do termo

de transação (GODOY, 2010, p. 138).

Nos termos das alterações propostas, o artigo 171 teria a seguinte leitura, de acordo

com Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 138-139):

“Propõe-se modificação na redação do art. 171 do CTN, dispondo-se que a lei, geral ou específica, pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que importe em composição de conflito ou litígio, visando a extinção do crédito tributário. Ainda, propõe-se a redação de parágrafo único, dispondo que a lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso, podendo prever hipóteses de delegação.” (sic)

Já o Projeto da Lei Geral de Transação especificamente prevê para o ordenamento

brasileiro a existência de quatro tipos de transação:

1) transação em processo judicial;

2) transação em insolvência civil, recuperação judicial e falência;

3) transação por recuperação tributária; e

4) transação administrativa por adesão.

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62

A transação em processo judicial, como fica óbvio, tem por objeto o litígio judicial

entre as partes, mas só será admitida para créditos devidamente constituídos por lançamento de

ofício ou por homologação, até a data de publicação de despacho de admissibilidade ou não de

recurso especial, interposto por qualquer das partes, ou, havendo execução fiscal em curso, até

o julgamento em primeira instância dos embargos, salvo se não opostos, caso em que poderá

ser realizada até a publicação da decisão que designar a data do leilão (artigo 30, do PL da Lei

Geral de Transação) (BRASIL, 2011f, p. 10).

Já a transação no caso de insolvência civil, falência ou recuperação judicial, prevê o

requisito de ser realizada somente por juiz, podendo ser proposta pela Fazenda Nacional, nos

termo de resolução de uma Câmara Geral de Transação e Conciliação, prevista no artigo 4º, do

referido PL. Tal modalidade é regulada, ainda, pelo artigo 33, que determina (BRASIL, 2011f,

p. 11):

Art. 33. O sujeito passivo que se submeter à transação por insolvência tributária, caso sobrevenha sua recuperação, com extinção da insolvência ou da falência, deverá firmar termo de ajustamento de conduta e manter, pelos cinco anos seguintes, regularidade fiscal em todos os tributos federais, sob pena de cobrança da diferença dos débitos objeto da transação, acrescidos dos encargos legais.

Por conseguinte, tem-se a transação por recuperação tributária, cujo objetivo, segundo

seu artigo 35 (BRASIL, 2011f, p. 11) é viabilizar a superação de situações transitórias de crise

econômico-financeira do contribuinte, preservando a empresa, sua função social e estimulando

a atividade econômica.

Para se fazer jus à transação por recuperação tributária, o sujeito passivo deve, nos

termos do artigo 36 (BRASIL, 2011f, p. 11-12), respeitar cumulativamente aos seguintes

requisitos:

a) não ser insolvente e, se o foi, que estejam declaradas extintas, por sentença

transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

b) não haver, há menos de cinco anos, concluído outra transação que, nos termos da

Lei Geral de Transação ou de outra lei aplicável à Fazenda Nacional, tenha implicado, direta

ou indiretamente, redução do montante devido a título de tributo, juros de mora ou outros

acréscimos pecuniários; e

c) não haver sido condenado, há menos de cinco anos, por fraude contra credores,

fraude de execução ou por qualquer dos crimes contra a ordem tributária.

Percebe-se, pela leitura do PL, que os seus autores se preocuparam em fazer da

transação um instituto realmente alternativo, sendo o pagamento, por evidente, o desejo maior

do Fisco. Assim, considera-se a transação ainda uma exceção, e não regra.

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63

Dessa forma, previne-se a concessão de oportunidades e benefícios exagerados àqueles

que não mantêm sua regularidade fiscal. Quer dizer, não se almeja, com a regulamentação da

transação, que os contribuintes utilizem-se estritamente dela, mas que seja ela uma alternativa

a momentos financeiros complicados para a empresa ou a dúvidas sobre a aplicação da

legislação tributária em relação à determinada situação fática.

Postura diversa poderia ferir os princípios da isonomia, da capacidade contributiva e da

livre concorrência.

Ainda tratando sobre a transação por recuperação tributária, tem-se que o plano de

recuperação tributária da empresa transigente deve ter sua viabilidade econômica demonstrada,

sem prejuízo da exposição das causas da crise econômico-financeira do sujeito passivo e de

outras formalidades. O prazo para pagamento dos créditos objeto da transação não poderá ser

maior do que 60 (sessenta) meses.

Por fim, a modalidade que mais tem semelhanças com aquelas analisadas em âmbito de

direito comparado. Trata-se da transação administrativa por adesão, que prevê um modelo de

transação visando dirimir conflitos acerca do crédito tributário quando se está perante

controvérsias jurídicas.

De novo, quem cuidará dessa modalidade de transação será a referida Câmara Geral de

Transação e Conciliação, encaminhando, a partir da análise das solicitações de transação, ao

Ministro de Estado da Fazenda, as hipóteses identificadas como suscetíveis de transação por

adesão (artigo 43, §1º, do PL da Lei Geral de Transação) (BRASIL, 2011f, p. 15).

Além disso, dispõe o §2º do artigo 43 do supracitado PL (BRASIL, 2011f, p. 15) sobre

o alcance do efeito das decisões que sejam tomadas em âmbito de transação por adesão,

dispondo:

Art. 43. (...) §2º A resolução administrativa de adesão, que disciplinará todos os requisitos e condições para que os interessados possam habilitar-se e aderir aos seus termos, terá efeitos gerais e será aplicada a todos os casos idênticos e que tempestivamente sejam habilitados, mesmo quando suficiente apenas a solução parcial de determinados litígios.

Além dos referidos dispositivos, é importante ressaltar as seguintes disposições

advindas do mencionado PL:

a) o contribuinte deverá prestar todas as informações que lhe forem solicitadas para

esclarecimento dos fatos e solução efetiva dos litígios (artigo 2º, parágrafo único);

b) a transação só alcançará multas, de mora e de ofício, juros de mora, encargos de

sucumbência, demais encargos de natureza pecuniária, valores oferecidos como garantia ou

situações em que a interpretação da legislação seja conflituosa ou litigiosa (artigo 6º);

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64

c) a transação não poderá implicar em negociação do montante do tributo devido,

nem afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob

fundamento de inconstitucionalidade, salvo exceções, e nem dispor sobre matéria de fato ou de

direito sem observar os limites do conflito ou litígio (artigo 7º);

d) o sujeito passivo, ao transigir, renuncia ao direito sobre o qual se funda a ação ou

recurso, administrativo ou judicial, no que se refere ao mérito das questões deduzidas como

objeto no termo de transação (artigo 11);

e) a transação será nula se comprovados prevaricação, concussão, ou corrupção

passiva na sua formação, bem como se ocorrer dolo, fraude, simulação, erro essencial quanto à

pessoa ou quanto ao objeto do conflito, entre outros casos (artigo 12);

f) é condição para assinatura do termo de transação que o sujeito passivo comprove

que tenha cumprido todas as obrigações tributárias acessórias quando essas não sejam

especificamente objeto do conflito ou litígio (artigo 17);

g) a autoridade administrativa competente pode admitir ou recusar a proposta de

transação, mediante motivação explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração

de concordância com fundamentos de pareceres anteriores, informações, decisões ou

propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato (artigo 19);

h) a transação não autoriza restituição ou compensação de importâncias já pagas,

compensadas ou incluídas em parcelamentos cuja opção tenha se verificado anteriormente à

celebração do respectivo termo (artigo 23);

i) a transação em processo judicial não poderá ocorrer em ações de mandado de

segurança ou em ações cautelares (artigo 30);

j) na transação por recuperação tributária, a autoridade administrativa pode solicitar o

afastamento de administrador inidôneo, que será substituído na forma prevista nos atos

constitutivos da empresa ou do plano de recuperação tributária, sem prejuízo dos efeitos de

solidariedade sobre o patrimônio do substituído (artigo 42).

As observações acima não chegam perto de esgotar as numerosas disposições trazidas

pelo Projeto de Lei em questão. Porém, afiguram-se como as mais importantes para ilustrar o

presente estudo. Além delas, conveniente fazer alusão à Câmara Geral de Transação e

Conciliação, doravante CGTC, com importantes competências dentro da proposta apresentada.

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2010, p. 145) resume de forma brilhante a maior

parte das funções da CGTC nos moldes apresentados pelo Projeto de Lei em análise. A seguir,

a citação do referido autor, que, embora longa, assaz útil:

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65

“A esta Câmara Geral caberá decidir sobre a progressiva implantação das modalidades de transação, editar, sob a forma de resoluções, regulamentos necessários à execução da LGT, editar resoluções específicas relativas à definição de requisitos, forma e parâmetros de propostas de transação, conhecer, por meio de unidade da PGFN ou da SRFB, de incidente de divergência entre termos de transação, assessorar o Procurador-Geral da Fazenda Nacional em todas as atividades relativas ao cumprimento da LGT, decidir sobre incidente de divergência em 30 dias e indicar à autoridade administrativa competente para que promova ajustes no termo de transação considerado inadequado, desde que expedido a menos de 120 dias, de forma a ajustá-lo ao termo de transação definido como referencia. A Câmara também conhece e decide de todas as questões relativas a transação, desde a admissão do processamento da proposta até a conclusão de procedimento, com a assinatura do termo, ou designa autoridade administrativa para este fim. Aprova previamente transações, podendo encaminhá-las para formalização por Procurador da Fazenda Nacional, expressamente designado pelo Procurador-Geral da Fazenda Nacional (art. 4º, parágrafo 1º, LGT). À Câmara caberá também indicar Procurador para representar a Fazenda Nacional na assinatura do termo de transação (art. 24, §3º, LGT), opinar sobre a fixação de critérios de transação para a hipótese de cobrança extrajudicial em casos que envolvam valores inferiores ao limite mínimo para ajuizamento da respectiva execução fiscal (art. 4º, parágrafo 4º, LGT), decretar, de ofício, nulidade de termo de transação, depois de notificado o sujeito passivo (art. 12, LGT), orientar a revisão, por parte da autoridade competente, de termo de transação fundado em lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo STF ou aplicação ou interpretação contrária à jurisprudência dos tribunais superiores e do próprio STF (art. 12, §6º, I e II da LGT). O conjunto de competências da Câmara é extenso. Também deverá fixar, por resolução, competência da autoridade administrativa para processar proposta de transação (art. 19, LGT), confeccionar termo de transação, alcançada a solução para o conflito ou o litígio (art. 23, §1º, LGT), fixar modelo de procedimento para a prova de regularidade, por parte do sujeito passivo, na transação por recuperação tributária (art. 41, parágrafo único, LGT), conhecer e decidir de todas as questões relativas a transação, da admissão de processamento da proposta até a conclusão do procedimento (art. 46, §2º, LGT), analisar requerimentos de transação, no regime de transação administrativa por adesão, e encaminhá-las para exame do Ministro da Fazenda (art. 43, §1º, LGT), estabelecer requisitos, por resolução, para confecção e encaminhamento de proposta de adesão (art. 44 da LGT), definir, em resolução, normas complementares sobre cabimento, tempo e modo de celebração do termo de transação (art. 49, §6º, da LGT).”

Dada a importância do referido órgão, seus membros serão designados pelo Ministro da

Fazenda entre servidores membros da carreira de Procurados da Fazenda Nacional e de

Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil nos termos de critérios a serem estabelecidos pelo

próprio Poder Executivo.

No entanto, há exigência de reputação ilibada, conhecimentos jurídicos, contábeis e

econômicos, de mais de 10 (dez) anos de exercício funcional, bem como habilitação em cursos

de formação específicos nas práticas de mediação e de transação, conforme se extrai do artigo

49, §1º, do PL. O mandato é de 4 (quatro) anos, renovável por igual prazo, uma única vez,

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66

desde que comprovada a participação em cursos de atualização e observada a avaliação de

resultados alcançados no exercício da função (art. 49, §2º, LGT).

Nota-se, da análise em tela, que a transação trazida pelo PL 5.082/2009 é bem diferente

daquela prevista hoje no CTN, exigindo-se por isso mesmo a alteração deste Código, como

referido acima. É uma alternativa possível para o atual cenário de obstrução e inefetividade que

enfrenta o Judiciário.

A transação é instituto cuja aplicação é convergente aos princípios de democracia,

igualdade e justiça, devendo-se pressupor desde sempre a transparência e a honestidade

daqueles que serão responsáveis pela sua implementação. Além disso, confere nova visão ao

princípio de indisponibilidade do patrimônio público, relativizando-o de modo a cumpri-lo.

Acompanha a tese, o autor Ricardo Lobo Torres (2008, p. 110):

“A transação, a conciliação, a arbitragem e outros processos alternativos de fixação e apuração do crédito tributário servem para aproximar o direito brasileiro dos grandes modelos do direito comparado. Facilitaria o ingresso do País em uma nova processualidade fiscal, inspirada pela ideia de processo equitativo, plenamente compatível com os princípios de liberdade, de justiça (capacidade contributiva) e segurança jurídica (legalidade, tipicidade, proteção da confiança, defesa do interesse público e indisponibilidade do crédito fiscal) e superadora da ideologia positivista da legalidade absoluta e da tipicidade fechada.”

Entretanto, como já exposto, a melhoria da arrecadação dos tributos e a solução para os

demais problemas causados pela inefetividade da execução fiscal tal como se encontra não

decorrerá somente da adoção de um modelo de transação tributária, mas também, e

principalmente, da modificação do paradigma de cobrança do ineficiente Judiciário, para a

própria Administração credora.

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67

4 A EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA

4.1 Apresentação do modelo e constitucionalidade

O panorama até agora visto dá conta de que o modelo de cobrança brasileiro, ainda de

1980, não opera os efeitos a que foi inicialmente proposto, obtendo resultados pífios na tarefa

constitucional de arrecadação tributária. Exigem-se alternativas conjunturais constituídas por

modelos mais céleres e efetivos, que respeitem a capacidade contributiva e insiram na

sociedade, através de melhoria das relações, a ideia do dever cívico de pagar tributos.

Muitos autores (Antônio Souza Prudente, Leon Fredja Szklarowsky, Gustavo Caldas

Guimarães de Campos, Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy) defendem a adoção de um

modelo administrativo de execução dos créditos vencidos e não pagos, inscritos em dívida

ativa. Tais autores entendem que o novo modelo delega à ação administrativa a feitura dos atos

que não demandam força judicante, como a citação, a penhora, a avaliação, o leilão, entre

outros atos.

Restaria ao Poder Judiciário, nessa linha, somente o controle da legalidade e

regularidade dos atos administrativos praticados, objetivando-se uma atuação mais condizente

com as suas atribuições. Além disso, preserva-se ao contribuinte o seu direito de defesa pela

manutenção dos embargos à execução, sem prejuízo de outras impugnações e exceções.

A ideia de uma execução fiscal administrativa não é nova no Direito Tributário.

Algumas vezes já se tentou introduzir o instituto no processo tributário. Inclusive, durante a

própria feitura da atual Lei de Execução Fiscal, a Comissão de Reforma Tributária resistiu às

tentativas de uma execução fiscal administrativa justificando nas palavras de Gilberto Ulhôa

Canto (1964) apud Carmina Alves Silva (2010, p. 97):

“5.1.1 Tem sido frisado que a atual sistemática do processo tributário brasileiro, no âmbito federal, importa em superposição de fases administrativas e judicial, nesta se podendo proceder a uma recomposição completa daquela, e, em cada qual, havendo condições suficientes para espantoso alongamento. [...] 5.1.3 É de toda evidência que uma tão emperrada e lenta sistemática não pode subsistir. Dentre as possíveis soluções, afastada a que consistiria na supressão da interferência do Judiciário, em face administrativa, ou o da judicial. Foi lembrado que uma instância única administrativa com duas judiciárias daria maior celeridade ao processo. A nós, porém, essa maneira de abreviar o curso da discussão parece a menos indicada. Com efeito, pelo crivo técnico dos julgadores administrativos, muita controvérsia chega ao fim, de sorte que é mais conveniente outorgar ao contribuinte o ensejo de submeter a sua pretensão a dois níveis de jurisdição administrativa, do que a um só, ainda que lhe reservado a dualidade de etapas do Judiciário.” (sic)

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68

Atualmente existem alguns projetos de lei que tratam da execução fiscal administrativa,

dentre os quais serão abordados o Projeto de Lei 5.615/2005, do Deputado Celso Russomano,

o Projeto de Lei n.º 2.412/2007, do Deputado Régis de Oliveira e o Projeto de Lei n.º

5.080/2009, elaborado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Conselho da Justiça

Federal e acadêmicos da área jurídica, este, inclusive, fazendo parte das medidas do II Pacto

Republicano, cujos objetivos são a efetivação do acesso à justiça, a prestação jurisdicional

célere e efetiva, entre outros.

Os projetos em questão têm suas semelhanças e diferenças, as quais serão analisadas

posteriormente, com o escopo de avaliar sobre um modelo ideal para o Direito Brasileiro.

Para o momento, cabe conceituar o instituto da execução fiscal administrativa, o qual,

basicamente, define-se pela realização dos atos de citação, de pesquisa de bens, de constrição

e/ou de alienação pelos próprios órgãos competentes para exigir o pagamento do tributo, bem

como a realização da própria instauração e extinção da execução (CAMPOS, 2009).

Uma parte das críticas quanto à execução administrativa diz respeito justamente ao fato

de possuir o Estado Brasileiro um sistema de controle judicial, onde somente haverá coisa

julgada em tribunal judiciário, fora do espaço administrativo. Nessa linha, os críticos vêem na

execução administrativa uma espécie de contencioso administrativo, com lide e coisa julgada

administrativa, ou seja, uma “jurisdição administrativa”.

Por sua vez, dentre os autores que defendem a execução fiscal administrativa, a maior

convergência e primeiro argumento é justamente os de que os atos de execução – exceto no

caso de incidentes (nulidade do título, excesso de penhora, entre outros) – não possuem

natureza judicial, mas sim administrativa, não demandando jurisdição.

Analisa-se, aqui, tão somente a questão da impossibilidade de se falar em um

contencioso administrativo, não se adentrando na questão da reserva jurisdicional

constitucionalmente prevista pelo princípio da separação de poderes, assunto a ser analisado

posteriormente.

Diante da questão, atente-se para os conceitos clássicos de “jurisdição” trazidos por

Alexandre Freitas Câmara (2008, p. 66):

“Para Chiovenda, pode-se definir jurisdição como ‘função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos, há no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la, praticamente, efetiva’. (...) Outra concepção bastante conhecida sobre o tema é a de Carnelutti, que defendia ser a jurisdição uma função de busca da ‘justa composição da lide’. Como é por demais conhecido, Carnelutti construiu todo o seu sistema

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jurídico em torno do conceito de lide, instituto de origem metajurídica que o mesmo definia como conflito de interesses degenerado pela pretensão de uma das partes e pela resistência de outra.”

Percebe-se que a função precípua da jurisdição é dar fim ao litígio, o que se resume à

sentença do juiz, declarando, constituindo ou condenando uma das partes do processo.

Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 63-64) escreve sobre a jurisdição no

processo de execução, analisando, ainda, uma possível classificação da execução não como

processo, mas como procedimento:

A doutrina não é unânime quanto à natureza jurisdicional do processo de execução. Há quem não reconheça na execução sequer a natureza de processo, classificando-a como procedimento stricto sensu, diante da inexistência de contraditório.

Nesse sentido, atente-se rapidamente para as diferenças entre processo e procedimento,

sendo este o conjunto de atos que obedecem a uma regra e que vão culminar em uma sentença,

enquanto aquele é o modo como se executam os referidos atos. O processo é o resultado da

soma de diversos fatores, um dos quais é exatamente o procedimento (e os outros são o

contraditório e a relação jurídica processual).

Carnelutti entende que a execução forçada é processo, mas não é jurisdição, afastando,

assim, o entendimento de que um instituto estaria ligado ao outro (CAMPOS, 2009, p. 63).

Já Nuno Lumbrales, autor português, defensor da execução fiscal administrativa,

entende, por sua vez, que esta se trata meramente de procedimento strictu sensu, após a

composição da lide, para, expropriando o patrimônio do devedor, satisfazer o crédito do

exequente (CAMPOS, 2009, p. 64-68).

Importante a lição de José Carlos Barbosa Moreira apud Mauro Luís Rocha Lopes

(2011, p. 208) no sentido de que não há procedência ou improcedência da execução,

corroborando o entendimento da natureza administrativa dos atos executivos:

“O processo de execução está nitidamente distinguido e separado do processo de conhecimento, e não visa à emissão de uma sentença; visa à prática de certos atos materiais, concretos, para a satisfação de determinados direitos. O que pode acontecer é que o título executivo se veja atacado através de embargos, (...). Mas veja-se bem: não há a confundir a ação de embargos, que dá lugar à instauração de um processo cognitivo incidente, com o próprio processo de execução; portanto, não se deve chamar decisão de improcedência da execução à decisão que julgue procedentes os embargos.”

Conclui-se, assim, que a execução nada mais é do que o meio (procedimento) a ser

utilizado pelo particular ou pelo Poder Público para a satisfação de um direito já declarado ou

constituído por sentença ou por título extrajudicial com força executiva. Se não há litígio, já

que anteriormente decidido por sentença ou solucionado por título com força executiva, não há

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que se falar em lide, em processo, nem tampouco em jurisdição. Sobre a questão, Gustavo

Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 77) ressalta que “a execução não se destina à resolução

de conflito de interesses, mas à realização prática de direito previamente reconhecido”.

Observe-se, contudo, que essa análise parte do pressuposto de um procedimento

executivo regular, sem incidentes, ou seja, aquele em que somente são realizados atos

administrativos como: diligências por bens, penhora, leilão, arrematação, adjudicação, entre

outros. Em verdade, a ocorrência de quaisquer ilegalidades, excessos e irregularidades no

âmbito executivo deve ter a apreciação do Judiciário, haja vista a necessidade de provimento

decisório para solucionar a questão.

Comente-se, ademais, o entendimento de Humberto Gomes de Barros que, diante dos

argumentos acima, revela uma verdadeira contradição no caso de atuação jurisdicional em

âmbito executivo, analisando paralelamente o instituto da desapropriação, que prescinde da

referida atuação. Para Barros (2007, p. 7):

“O Estado-Administração é capaz de, visando a interesses sociais, expropriar um proprietário que nada lhe deve. No entanto, se o proprietário é inadimplente, na sagrada obrigação de honrar dívidas para com o Erário, a Administração queda-se impotente. Nesse caso, é necessário acionar o Estado-Juiz, fazendo com que este efetive a desapropriação. Em tal hipótese, o juiz desenvolverá mero procedimento. É que a execução por desapropriação envolve apenas relação linear, em cujos extremos estão o Estado e seu devedor.”

O argumento acima defendido é de conhecimento de muitos autores, sendo utilizado

muitas vezes como regra de interpretação, sempre no sentido de que “quem pode o mais, pode

o menos”. Assim, concluindo o pensamento acima demonstrado, Barros (2007, p. 8) proclama:

“Fazer da execução um processo jurisdicional não é, data vênia, atitude feliz. Não faz sentido demitir o administrador de sua competência expropriatória para que o juiz (também agente estatal) execute o ato administrativo. (...) A execução administrativa não relega o Poder Judiciário à inutilidade, nem o desprestigia. Como diz o eminente juiz e professor Antônio Souza Prudente, ‘desprestígio é ocupar o juiz como cobrador do Fisco, em atividade enervante e sem futuro para a imagem institucional do Poder Judiciário’.”

Por tudo isso, não se relaciona a execução administrativa com um contencioso

administrativo, como podem alguns afirmar, em que os atos da Administração teriam um

conteúdo decisório e não poderiam ser impugnados judicialmente. Pelo contrário, a

Administração meramente realiza os atos executivos de natureza administrativa e qualquer

fuga do ato administrativo ao princípio da legalidade será levada ao conhecimento do Estado-

Juiz para que exerça sua função precípua.

Outro ponto que reforça a tese é o fato de terem os atos administrativos algumas

qualidades intrínsecas à sua natureza, afastando precipuamente a existência favorecimentos ou

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desfavorecimentos. São elas: a) presunção de legitimidade, legalidade e veracidade; b)

imperatividade; c) autoexecutoriedade; e d) tipicidade.

Fernanda Marinela, autora administrativista, escreve sobre os atributos dos atos

administrativos. Para ela a presunção de legitimidade, legalidade e veracidade decorre do

princípio da legalidade que informa toda a Administração Pública. Marinela (2011, p. 279)

complementa definindo cada uma das qualidades desse atributo:

“Segundo esse atributo, os atos administrativos presumem-se: legais, isto é compatíveis com a lei, legítimos, porque coadunam com as regras da moral, e verdadeiros, considerando que os fatos alegados estão condizentes com a realidade posta. Essa presunção permite que o ato produza todos os seus efeitos até qualquer prova em contrário.”

Por conseguinte, a imperatividade caracteriza-se pela possibilidade da Administração

Pública, independentemente de concordância do administrado, impor-lhe obrigações ou

restrições. Decorre a mesma do poder extroverso do Estado, expressão que significa a

prerrogativa que o poder público tem de praticar atos que extravasam sua própria esfera

jurídica, impondo unilateralmente obrigações a terceiros.

Já Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 413) dispõe quanto à executoriedade, no

sentido de que “é a qualidade pela qual o Poder Público pode compelir materialmente o

administrado, sem precisão de buscar previamente as vias judiciais, ao cumprimento da

obrigação que impôs e exigiu”.

Já a tipicidade é o atributo por meio do qual o ato administrativo deve corresponder a

figuras definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados, como,

por exemplo, a inscrição em dívida ativa, com previsão legal no CTN e na LEF.

A própria CDA, como resultado de ato administrativo que é, possui a sua presunção de

legitimidade, legalidade e veracidade advinda dos atributos dos atos administrativos em geral.

Pelo menos é o que coloca Ricardo Alexandre (2011, p. 546):

“No ato de inscrição, a Fazenda Pública unilateralmente declara que alguém deve e elabora um documento que dá presunção de liquidez e certeza da existência de tal débito. Trata-se de mais uma manifestação da presunção de legalidade, legitimidade e veracidade, atributo presente em todos os atos administrativos, inclusive o de inscrição de débito em dívida ativa.”

Por outro lado, Aliomar Baleeiro (2007, p. 1014-1015) entende que a inscrição em

dívida ativa é um ato jurídico em geral, dispondo que:

“A presunção de legitimidade (acarretando a consequente validade) dos atos administrativos (de fundo fiscal) é presunção inerente aos atos jurídicos em geral, que não guarda nenhuma excepcionalidade. É que os atos jurídicos em geral, a lei, a sentença, o ato administrativo, o contrato e o negócio jurídico, presumem-se legítimos (portanto válidos) em geral até que sejam declarados não válidos ou nulos. O princípio da certeza das relações jurídicas (a

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segurança, enfim) enforma e conforma a presunção de validade ou de legitimidade dos atos jurídicos.” (sic)

Já Hugo de Brito Machado (2009, p. 260-261) conclui que a presunção da CDA

decorre do fato de a inscrição ter sido precedida de regular processo administrativo, em que

assegurada a ampla defesa.

Ora, o que se almeja inferir disso tudo é que a inscrição em dívida ativa é ato

administrativo, fazendo jus aos seus atributos, e a CDA possui sua presunção de certeza e

liquidez graças a esses atributos da inscrição.

Do mesmo modo, os atos de execução, meramente atos administrativos, também

estariam qualificados com a referida presunção, embora relativa, passível de prova em

contrário. Quer dizer, desjudicializariam-se os atos de execução, administrativos como são,

mas a sua presunção de legitimidade poderia ser ilidida por prova em contrário perante o Poder

Judiciário, que finalmente exerceria a sua função judicante.

Antônio Souza Prudente (2001, p. 14), autor que defende a execução fiscal

administrativa, determina que:

“A execução administrativa do crédito da Fazenda Pública afigura-se juridicamente possível na força dos atributos dos atos administrativos, que se revestem da presunção de legitimidade, decorrente do princípio da legalidade da Administração, da imperatividade impositiva de seu cumprimento coercitivo e da auto-executoriedade consistente na possibilidade desses atos serem imediata e diretamente executados pela própria Administração, no uso de sua supremacia de Poder Público, independentemente de ordem judicial.”

No mesmo sentido, arremata Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 194):

“A prática de atos executivos pela Administração revela-se, mais do que possível, quase natural, pois a Administração realiza, no curso do processo de execução fiscal, uma série de atos administrativos que, como tais, são dotados de presunção de legitimidade e legalidade e sujeitam-se ao controle jurisdicional.”

Isso faz inferir que não se pode alegar qualquer tipo de imparcialidade da

Administração na realização dos atos executivos, apenas porque também é credora e

exequente. Deve-se ter em vista que tudo que for feito em sede executiva estará adstrito ao

princípio da legalidade, e, portanto, passível de controle judicial. Além disso, a consolidação

de “um corpo técnico formado por servidores públicos concursados, garante que o exercício do

poder não seja arbitrário, não se confundindo o interesse público com os interesses dos

governantes de ocasião” (CAMPOS, 2009, p. 69).

Continuando, há autores que defendem de modo mais contido a execução fiscal

administrativa. Exemplo disso é Leon Fredja Szklarowsky, que sugere uma execução fiscal

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administrativa em sentido estrito, entendendo-se a mesma, não como a retirada de todos os atos

da execução do Judiciário para o Executivo, mas somente da fase da penhora, realizando uma

constrição administrativa preparatória do executivo fiscal em âmbito judicial, afastando a

necessidade de, em juízo, pesquisar bens e gastar tempo e dinheiro com referido ato.

Dessa forma, a execução forçada seria levada a cabo pelo próprio credor, até a fase da

penhora. Efetuada a penhora administrativa, o Fisco teria o dever de ajuizar a execução fiscal,

restando ao executado impugnar os atos que julgar ilegais ou a própria execução, através de

embargos.

Sobre o assunto, interessante a posição de um advogado tributarista, que enquanto tal

supostamente busca atender aos interesses do contribuinte. Porém, como jurista, Kyioshi

Harada (2007) defende a penhora administrativa como pré-requisito para o ajuizamento da

ação fiscal, sendo bem incisivo como se pode notar do trecho a seguir:

“O objetivo é obrigar a cobrança judicial do crédito tributário sob o prisma qualitativo. A idéia é só permitir bater às portas do Judiciário as execuções fiscais bem aparelhadas, com a localização dos devedores, e instruídas com os respectivos autos de penhora. (...) Aos opositores da penhora administrativa, pergunto: A penhora de um imóvel X, ordenada pelo juiz competente causa constrangimento menor ao devedor do que a penhora do mesmo imóvel X, ordenada pela autoridade administrativa competente? Claro que não! A penhora efetivada por ordem da autoridade administrativa competente oferece maior dificuldade de defesa do que aquela ordenada pelo juiz competente? A resposta negativa se impõe!”

Em verdade, se os outros atos da execução, tanto quanto a penhora, possuem caráter

meramente administrativo, é insuficiente esse modelo que apenas desloque do Judiciário para o

Administrativo a função de pesquisa e constrição preparatória de bens, porquanto

contraditório, ao permanecer travando o Judiciário com atos como leilão, alienação, entre

outros.

Prosseguindo, reforçam o presente estudo alguns exemplos de execuções extrajudiciais

que se encontram implantadas no direito brasileiro, corroborando o caráter administrativo dos

atos executivos. Em primeiro lugar, tem-se a execução extrajudicial da Lei n.º 9.514/1997, que

dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), institui a alienação fiduciária de

coisa imóvel e dá outras providências. Nesse sentido, o SFI tem por objetivo promover o

financiamento imobiliário em geral.

A alienação fiduciária de bem imóvel serve no caso do financiamento de garantia para

o pagamento do valor devido. Ou seja, realiza-se um contrato de compra e venda de bem

imóvel concomitantemente ao financiamento do valor do imóvel. Assim, em garantia ao

financiamento é feita a alienação fiduciária do próprio bem imóvel adquirido.

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Assim sendo, o proprietário-devedor institui a favor do credor alienação fiduciária.

Logo, o devedor torna-se fiduciante e o credor, isto é, a entidade financiadora, passa a ser

fiduciário. A alienação é o negócio jurídico pelo qual o devedor, com objetivo de garantia,

contrata a transferência da propriedade ou outro direito sobre o bem previsto na própria Lei n.º

9.514/1997, com condição resolutiva de quitação da dívida.

Caso o devedor-fiduciante pague integralmente a dívida resolve-se a propriedade

fiduciária do imóvel e cabe ao credor-fiduciário entregar termo de quitação ao devedor. Na

ocasião de não pagamento após o devido vencimento inicia-se aqui a execução extrajudicial.

Dessa forma, a sequência de atos a ser realizada está explicada em detalhes nos artigos 26 e 27,

da Lei n.º 9.514/1997, ocorrendo, assim, a intimação do fiduciante para satisfazer em quinze

dias o valor da dívida vencida e vincendas até o pagamento. Paga a dívida, nesse período,

continua-se o contrato de alienação fiduciária até a quitação do valor total. Caso continue sem

realizar o pagamento, o Registro de Imóveis consolida a propriedade em nome do fiduciário

(BRASIL, 2011g).

Com isso, o credor-fiduciário promoverá as demais diligências descritas na citada Lei,

com o objetivo de levar a leilão o imóvel e então, receber todo o valor da dívida vencida e das

parcelas do saldo devedor que, por conta do inadimplemento do devedor, tiveram seu

vencimento antecipado.

Ou seja, mais uma vez percebe-se que os atos de constrição e alienação de bens de um

devedor não precisam em um primeiro momento da atuação jurisdicional do Estado. Todo o

processo da Lei n.º 9.514/1997 é feito pelo particular – entidade financiadora (geralmente

caixas econômicas, bancos e outras instituições de crédito) –, cabendo ao Judiciário no caso

apurar eventuais regularidades, em respeito ao princípio do acesso à Justiça.

Outro exemplo de execução extrajudicial, não menos importante, é o caso da Lei n.º

5.741/1971, que trata da proteção do financiamento de bens imóveis vinculados ao Sistema

Financeiro de Habitação (SFH) e autoriza ao credor hipotecário, em seu art. 1º, a executar

extrajudicialmente os devedores inadimplentes, nos termos do artigo 31 e seguintes do

Decreto-Lei n.º 70/1966.

Do mesmo modo que na Lei 9.514/1997, o supracitado Decreto-Lei n.º 70/1966

autoriza o credor, no caso de dívida hipotecária em razão de financiamento de bem imóvel, a

realizar o leilão e consequente alienação desse mesmo bem, visando à satisfação do valor não

pago em seu vencimento, sem prejuízo de demais valores componentes da dívida.

O juiz somente atuará no momento em que o arrematante requerer imissão na posse do

imóvel, momento este, inclusive, em que o executado poderá apresentar defesa.

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O Supremo Tribunal Federal já vem decidindo há algum tempo sobre a

constitucionalidade da execução extrajudicial, como se pode ver em algumas ações (AI 678256

AgR / SP, RE 523966 ED / SP, AI 663578 AgR / SP, AI 709499 AgR / PR, entre outros).

Os precedentes já são bastantes, mas é primordial citar um em específico, o Recurso

Extraordinário n.º 223.075-1/DF, em cujo voto o Relator Ministro Ilmar Galvão explicita

alguns pontos sobre a constitucionalidade das execuções em questão, enquanto execuções

extrajudiciais.

O acórdão da referida ação ficou assim ementado (BRASIL, 2011i, p.1):

EMENTA: EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DECRETO-LEI Nº 70/66. CONSTITUCIONALIDADE. Compatibilidade do aludido diploma legal com a Carta da República, posto que, além de prever uma fase de controle judicial, conquanto a posteriori, da venda do imóvel objeto da garantia pelo agente fiduciário, não impede que eventual ilegalidade perpetrada no curso do procedimento seja reprimida, de logo, pelos meios processuais adequados. Recurso conhecido e provido. (RE 223075, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 23/06/1998, DJ 06-11-1998 PP-00022 EMENT VOL-01930-08 PP-01682 RTJ VOL-00175/02 PP-00800)

Nesse sentido, trechos do voto do Ministro Ilmar Galvão (BRASIL, 2011i, p. 3):

“(...) pode-se afirmar que a alienação extrajudicial por agente fiduciário é uma forma especial de alienação fiduciária em garantia, destinada à pronta recuperação dos créditos com garantia imobiliária, havendo sido instituída como um instrumento indispensável a um funcionamento razoável do sistema nacional de habitação, do mesmo modo que a alienação fiduciária permitiu a explosão construtiva do crédito do consumidor”

Ora, imagine-se se, em casos como esse, precisasse a instituição financiadora bater às

portas do Judiciário para executar um crédito já garantido pela alienação fiduciária. Seria mais

um amontoado de procedimentos a serem realizados pelo Judiciário sem a menor natureza

jurisdicional, cabendo ao atarefado juiz tão somente cumprir a tarefa de expropriação pela

alienação do bem já determinado.

Ademais, fundamentando seu voto, o Ministro Ilmar Galvão cita outro julgado em MS

n.º 77.152, cujo relator era o Ministro Décio Miranda, do extinto Tribunal Federal de Recursos.

Segue a transcrição do que frisou o Ministro Ilmar Galvão (BRASIL, 2011i, p. 4-7):

“(...) a matéria foi longamente estudada em várias decisões do antigo TFR, destacando-se o julgamento do MS nº 77.152, Min. Décio Miranda (Rev. Forense, 254/247), em cujo voto afirmou o eminente julgador, posteriormente abrilhantou esta Corte, verbis: ‘O DL nº 70, de 21.11.66, no art. 29, autoriza o credor hipotecário no regime do Sistema Financeiro da Habitação, a optar pela execução do crédito na forma do C. Pr. Civil, ou na forma dos arts. 31 a 28 do mesmo Decreto-lei. (...) Nesse regime a intervenção judicial só se dá para o fim de obter o arrematante imissão de posse do imóvel, que lhe será liminarmente concedida pelo juiz. A defesa do executado, salvo se consistir em prova de pagamento

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ou consignação anterior ao leilão, será debatida após a imissão na posse. (...) Não houve, porém, supressão do controle judicial. Estabeleceu-se, apenas, uma deslocação do momento em que o Poder Judiciário é chamado a intervir. No sistema tradicional, ao Poder Judiciário se cometia em sua inteireza o processo de execução, porque dentro dele se exauria a defesa do devedor. No novo procedimento, a defesa do devedor sucede ao último ato da execução, a entrega do bem executido ao arrematante. No procedimento judicial, o receio de lesão ao direito do devedor tinha prevalência sobre o temor de lesão ao direito do credor. Adiava-se a satisfação do crédito, presumivelmente líquido e certo, em atenção aos motivos de defesa do executado, quaisquer que fossem. No novo procedimento, inverteu-se a ordem, deu-se prevalência à satisfação do crédito, conferindo-se à defesa do executado não mais condição impediente da execução, mas força rescindente, pois, se prosperarem as alegações do executado no processo judicial de imissão de posse, desconstituirá a sentença não só a arrematação como a execução, que a antecedeu. (...) Essa mudança, em termos de política legislativa, pôde ser feita, na espécia, sem inflição de dano irreparável às garantias de defesa do devedor. Tem este aberta a via da reparação, não em face de um credor qualquer, mas em relação a credores credenciados pela integração num sistema financeiro a que a legislação confere específica segurança. Se, no novo procedimento, vier a sofrer detrimento o direito individual concernente à propriedade, a reparação pode ser procurada no Poder Judiciário, seja pelo efeito rescindente da sentença na ação de imissão de posse, seja por ação direta contra o credor ou o agente fiduciário. Assim, a eventual lesão ao direito individual não fica excluída da apreciação judicial. (...) a execução extrajudicial não vulnera o princípio da igualdade perante a lei (todos, que obtiveram empréstimo do sistema, estão a ela sujeitos) nem fere o direito de propriedade (a excussão não se faz sem causa, e esta reside na necessidade de satisfazer-se o crédito, em que também se investe direito de propriedade, assegurado pela norma constitucional). Por outro lado, também não prospera a alegação, feita em casos análogos, de que a execução extrajudicial vulnera o princípio da autonomia e independência dos Poderes (art. 6º da Constituição). O novo procedimento não retira do Poder Judiciário para o agente fiduciário parcela alguma do poder jurisdicional O agente fiduciário executa somente uma função administrativa, não necessariamente judicial. (...) O litígio eventualmente surgido entre credor e devedor fica, num como noutro caso, separado do procedimento meramente administrativo da excussão.’ (...) Nessas condições, é fora de dúvida que não cabe falar, como fez o acórdão recorrido, em ofensa às normas dos incisos XXXV, XXXVII e LIII do art. 5º da Constituição, nem, tampouco, em inobservância dos princípios do devido processo legal, do contraditório ou da ampla defesa.

Ora, se há decisões no STF que reconhecem que a proteção do sistema de

financiamento habitacional enseja medidas que transfiram a defesa do executado do começo

para o final do procedimento, quem dirá no caso dos tributos, cuja natureza e funções

pressupõem proteção muito maior.

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Ademais, se confia-se ao agente fiduciário a execução de atos que, como vistos, são

meramente administrativos, não há motivos para não se deslocar ao Procurador da Fazenda,

representante de notório saber, previamente aprovado em concurso público, a realização dos

atos de execução do devedor.

Outrossim, se é presumivelmente líquido e certo o crédito do Sistema de Financiamento

Habitacional, mais o é a Certidão de Dívida Ativa, que passa por verdadeiro processo de

análise e controle de sua legalidade e regularidade até a sua constituição definitiva.

Apenas complementando, transcreva-se ilustre prova de que a execução fiscal

administrativa não é instituto novo no Direito Brasileiro, colhida da referência feita pelo

Ministro Ilmar Galvão, ainda do voto do referido Recurso Extraordinário (BRASIL, 2011i, p.

7):

“Nem é, aliás, por outro motivo que prestigiosa corrente doutrinária, com vistas ao desafogo do Poder Judiciário, preconiza que a execução forçada relativa à dívida ativa do Estado seja processada na esfera administrativa, posto reunir ela, na verdade, na maior parte, uma série de atos de natureza simplesmente administrativa. Reservar-se-ia ao Poder Judiciário tão-somente a apreciação e julgamento de impugnações, deduzidas em forma de embargos, com o que estaria preservado o princípio do monopólio do Poder Judiciário.”

Dos argumentos mais recentes trazidos à tona no julgamento do assunto, tem-se o

seguinte. O ministro Dias Toffoli afirma que não há incompatibilidade com a Constituição

Federal, pois entende que as regras do DL não representam uma supressão do processo de

execução do efetivo controle judicial, mas tão somente um deslocamento do momento em que

o Poder Judiciário é chamado a intervir. Segue o entendimento o ministro Ricardo

Lewandowski, que se preocupa com o volume de processos judiciais existentes no país. Já o

ministro Gilmar Mendes, que pediu vista dos processos, ressalta que em países que respeitam o

Estado de Direito é muito comum a prática de execução nos moldes do DL 70/66. Frise-se, por

fim, que o plenário analisa a constitucionalidade da execução extrajudicial do Decreto 70/66,

conforme informação noticiada, em 18 de agosto de 2011, no portal do Supremo Tribunal

Federal (BRASIL, 2011h).

Aliás, em se tratando de controle da constitucionalidade, outras questões se põem à

prova na execução fiscal administrativa, principalmente no que se refere às previsões

constitucionais dos princípios da separação e divisão de poderes – e seu corolário, a reserva de

jurisdição –, do devido processo legal, do acesso à Justiça, do juiz natural e de outros direitos e

garantias fundamentais do contribuinte executado. Portanto, imperiosa a análise dos referidos

pontos acerca da constitucionalidade do instituto da execução fiscal administrativa.

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No tocante à separação de poderes, primeiro observe-se a lição de Canotilho (2003,

p.250) apud Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 62) para que se possa fazer a

análise de sua convergência com a execução administrativa:

“A constitucionalística mais recente salienta que o princípio da separação de poderes transporta duas dimensões complementares: (1) a separação como ‘divisão’, controlo e limite do poder – dimensão negativa; (2) a separação como constitucionalização, ordenação e organização do poder do Estado tendente a decisões funcionalmente eficazes e materialmente justas (dimensão positiva). O sentido referido em (1) corresponde, em rigor, à ideia de divisão de poderes. O princípio da divisão como forma e meio de limite do poder (divisão de poderes e balanço de poderes) assegura uma medida jurídica ao poder do Estado e, consequentemente, serve para garantir e proteger a esfera jurídico-subjectiva dos indivíduos e evitar a concentração de poder. O princípio da separação na qualidade de princípio positivo assegura uma justa e adequada ordenação das funções do estado e, consequentemente, intervém como esquema relacional de competências, tarefas, funções e responsabilidades dos órgãos constitucionais de soberania. Nesta perspectiva, separação ou divisão de poderes significa responsabilidade pelo exercício de um poder.”

Em suma, como observa Canotilho, sobre o postulado formulado por Montesquieu, há

uma dimensão positiva pela qual se tem a ordenação das funções estatais, bem como uma

dimensão negativa, segundo a qual a divisão dos poderes evita a criação de um “superpoder”,

que exercite todas as funções do estado (legislativa, administrativa e jurisdicional),

assegurando-se assim os direitos e garantias fundamentais dos indivíduos.

Dessa forma, o referido princípio, previsto constitucionalmente no artigo 2º da

Constituição Federal de 1988, divide os Poderes do Estado em Legislativo, Executivo e

Judiciário, sendo eles independentes e harmônicos entre si, exercendo um controle recíproco

ou comumente como se diz um “sistema de freios e contrapesos” necessários a atuação estatal

constitucional.

Ora, é possível se concluir pelo estudo do modelo que não há violação de nenhuma

faceta (positiva ou negativa), tendo, ainda, em vista os argumentos anteriormente expostos de

que a execução, enquanto procedimento formado por atos meramente administrativos, não

demanda qualquer ato decisório, isto é, não demanda jurisdição.

A transferência de atos administrativos de excussão de bens do devedor para o

Executivo, resguardando-se os incidentes à apreciação do Judiciário, como ora se propõe, não

fere a ordenação das funções estatais (dimensão positiva), pois simplesmente dá ao Estado-

Administração algo que é de sua competência.

Da mesma forma, essa desjudicialização dos atos administrativos não cria um

“superpoder”, tendo em vista que os referidos atos, ainda que realizados pela administração,

poderão ser plenamente controlados pelo Judiciário, no que se refere a sua legalidade, sem

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prejuízo da presunção de que goza o ato em razão de sua natureza administrativa. Respeita-se,

com isso, a dimensão negativa do princípio da separação dos poderes: a separação visando ao

controle das funções entre si.

Por tudo isso, atinge-se também o entendimento de que resta preservada a reserva de

jurisdição, corolário do princípio da separação de poderes – junto à reserva de legislação e à

reserva de administração –, uma vez preservada a função do Judiciário de controlar sua

regularidade, bem como de julgar eventuais incidentes que apareçam na execução.

Ainda em conformidade com os mencionados argumentos, afasta-se uma possível

violação ao princípio do juiz natural (previsto pelo artigo 5º, inciso XXXVII, da CF/88), visto

que não há jurisdição nos atos de execução. Se não há jurisdição, não há necessidade da

garantia do juiz natural. Como visto, não se propõe um contencioso administrativo, como no

modelo francês. Não existe jurisdição nos atos que serão praticados pela Administração. Além

disso, como já dito, não há possibilidade de imparcialidades, tendo em vista a vinculação dos

atos administrativos aos princípios norteadores do Direito Administrativo.

Do mesmo modo, não é possível se falar em violação do acesso à justiça, uma vez que

não se intenta tirar do executado a sua possibilidade de defesa, podendo o mesmo exercê-la do

mesmo modo que atualmente exerce, seja por embargos, seja por exceção de pré-

executividade, seja por impugnação do ato administrativo. Não há supressão do controle

judicial, apenas presume-se não ser necessário que a execução seja feita pelo Judiciário para

que a defesa do executado seja apreciada.

O importante no entender de Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p. 75),

citando entendimento do Tribunal Constitucional Português, “não é que o Judiciário tenha a

primeira palavra, mas a última”.

Outro aspecto constitucional devidamente respeitado pela execução fiscal

administrativa é o princípio do devido processo legal. Alexandre de Moraes (2007, p. 100)

conceitua o referido princípio:

“O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado-persecutor e plenitude de defesa (...).

Dentre as garantias que se assegura ao indivíduo, pode-se citar o direito à defesa

técnica, a proibição de apresentação de prova ilicitamente obtida, a publicidade dos atos

judiciais, a imparcialidade, a obrigatoriedade de fundamentação das decisões, o contraditório, a

ampla defesa, o duplo grau de jurisdição, o juiz natural, entre outros.

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Ocorre que não é possível se falar em afronta a esse princípio pelo fato de que a própria

Constituição Federal de 1988 traz em seu artigo 5º, inciso LV, a previsão de que essas mesmas

garantias aplicam-se aos processos administrativos.

Se a execução não serve à solução de conflitos, mas senão à mera realização de direito

já declarado, “o que se mostra relevante para a observância do devido processo legal no

processo executivo é assegurar o direito à citação e ao conhecimento dos atos praticados,

garantido-se ao executado o acesso aos meios de impugnação legalmente previstos”

(CAMPOS, 2009, p. 77). A ampla defesa e o contraditório poderão, então, ser exercidos

através desses mesmos meios de impugnação.

Por derradeiro, cumpre apreciar a execução fiscal administrativa sob o viés das

garantias fundamentais do contribuinte, este enquanto indivíduo dotado de direitos e deveres.

Indaga-se: a constrição em âmbito administrativo adentraria a intimidade do indivíduo, como

seria o caso da violação ao sigilo bancário sem ordem judicial? E mais, a alienação em esfera

administrativa violaria o direito de propriedade do mesmo?

Cabe mencionar aqui que a teoria geral dos direitos fundamentais prevê e autoriza a

existência de limitações aos mesmos. Sobre a disciplina, discorrem brilhantemente Mendes,

Coelho e Branco (2007, p. 304), citando teoria denominada teoria do “limite dos limites”:

“Da análise dos direitos individuais pode-se extrair a conclusão direta de que direitos, liberdades, poderes e garantias são passiveis de limitação ou restrição. É preciso não perder de vista, porém, que tais restrições são limitadas.”

Os referidos autores apresentam no conteúdo da teoria acima assinalada a existência de

um núcleo essencial dos direitos fundamentais a ser protegido, evitando-se limitações

absurdas, sem a menor razoabilidade. Isto é, não se pode alterar a essência – teoria absoluta –

do direito fundamental, mas apenas limitar-lhe a aplicação com vistas à razoabilidade e

proporcionalidade.

Nesse sentido, ressaltam os referidos autores Mendes, Coelho e Branco (2007, p. 306):

“(...) enquanto princípio expressamente consagrado na Constituição ou enquanto postulado constitucional imanente, o princípio da proteção do núcleo essencial destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental decorrente de restrições descabidas, desmesuradas ou desproporcionais.”

Vale dizer que os direitos de propriedade e de inviolabilidade da intimidade (inclusive

do sigilo bancário) são direitos fundamentais sem reserva legal, ou seja, sua previsão

constitucional supostamente não abre espaços para que o legislador infraconstitucional

restrinja-os. No entanto, de acordo com a teoria ora estudada, até esses direitos podem sofrer

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limitações, desde que tal restrição se assente também em norma constitucional (MENDES,

COELHO E BRANCO, 2007, p. 304), bem como em critérios de proporcionalidade.

A teoria dos limites dos limites impõe, igualmente, que a restrição seja genérica e

abstrata, não sendo casuística ou discriminatória e nem esvaziando a essência do direito a ser

limitado (núcleo essencial do direito fundamental). Em suma, deve a limitação do limite ao

direito fundamental pressupor a proteção do núcleo essencial do direito fundamental que se

está limitando, fundamentando-se, ainda, em critérios de proporcionalidade, e aparecendo

como restrição genérica e abstrata.

Apenas a título de ilustração, Renata Martins Sena (2011), abordando o tema dos

limites aos direitos fundamentais, preceitua que a proporcionalidade é parâmetro para a

restrição a direitos fundamentais. Segundo a autora, a proporcionalidade se divide em

adequação (análise dos meios para atingir os fins visados), em necessidade (inexistência de

meio menos gravoso) e em proporcionalidade em sentido estrito (ponderação da relação custo-

benefício, verificando se a limitação é capaz de produzir algum bônus).

Dessa forma, justifica-se a limitação dos direitos individuais de propriedade e

intimidade a partir do dever fundamental de pagar tributo implícito nos objetivos fundamentais

da República Federativa do Brasil (art. 3º, da CF/88), já que estes necessitam do tributo para

obter efetiva implementação. Logo, pode-se dizer que a justa causa para que os direitos

fundamentais dos contribuintes sejam relativizados e limitados é justamente este dever que

fomenta a implementação dos direitos sociais.

Há limitação das restrições impostas ao direito de propriedade e intimidade, não se lhes

esvaziando o núcleo essencial, bem como obedecendo a critérios de proporcionalidade e

generalidade.

Dessarte, restam demonstrados os aspectos constitucionais da execução fiscal

administrativa. É forçoso reconhecer a sua conformação com as normas constitucionais,

privilegiando a efetividade e a consecução do interesse público em detrimento de garantias

fundamentadamente limitáveis.

4.2 A experiência no Direito Comparado

A análise do Direito Comparado neste momento, até como opção metodológica,

demonstra que vários países, com variados modelos normativos, adotaram a execução fiscal

administrativa, em que pese não serem todos os modelos idênticos.

Como bem assevera Sérgio André Rocha (2010, p.151):

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82

“(...) o estudo comparatístico do Direito viabiliza uma melhor análise das previsões do ordenamento nacional, possibilitando a solução de problemas internos a partir das medidas adotadas alhures, bem como o conhecimento quanto a alternativas que, empregadas em outros sistemas, trouxeram mais problemas do que soluções.”

Não se deseja adotar soluções alienígenas ao direito pátrio sem a devida adequação.

Busca-se, tão só, analisar os modelos que países como Espanha, Chile, Estados Unidos da

América e Portugal abraçam e como tais modelos interferem para a efetividade da arrecadação

tributária e preservação dos direitos fundamentais do executado.

Em primeiro lugar, o modelo da Espanha, chamado procedimento de apremio, que trata

de uma execução fiscal substancialmente administrativa, incumbindo-se à Administração a

condução do procedimento, especialmente no que se refere à penhora e demais atos de

constrição, tudo com base em uma questão de autotutela.

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2009, p. 20) apresenta um panorama do modelo

espanhol, sem adentrar nos detalhes procedimentais:

“O modelo de execução fiscal que o direito espanhol conhece tem natureza administrativa. É a administração fiscal quem conduz o procedimento. Detém amplo conjunto de poderes. São prerrogativas que transitam da penhora para o leilão, da intervenção nos negícios do executado para a constrição de salários, aposentadorias e rendimentos do devedor. Atenta-se, no entanto, para conteúdo amplo de direitos fundamentais, inclusive em âmbito não liberal, que concebe a solidariedade como valor político. Entende-se que a disponibilidade de informações administrativas é direito fundamental do administrado, nos termos do art. 105 da Constituição da Espanha, circunstância que fomenta modelo de execução pragmático, livre de enigmas e de sutilezas formais, em que pese conduzido pela Administração tributária daquele país, sem que se registre papel relevante para o judiciário, no que toca especificamente à condução das execuções fiscais.”

O documento que formaliza o débito (providencia de apremio) constitui título com

idêntica força executiva que a sentença judicial para investir contra bens e direitos dos

obrigados (VELLOSO, 2011, p. 36), o que justifica a possibilidade da penhora administrativa.

O procedimento é regulado pela Ley General Tributaria, e sua formulação administrativa

fundamenta-se na autotutela da Administração.

Existem, assim, duas fases no procedimento, um período voluntário, no qual o

contribuinte recolhe o que a Administração lhe exige, de acordo com os termos da lei. A

segunda fase é denominada de executivo, iniciando-se com o vencimento dos prazos para

pagamento voluntário. Pedido de alargamento de prazo para pagamento, requerimento de

parcelamento ou pretensão formalizada de compensação, bem como interposição de recursos

ou reclamações administrativos, impedem o início do período executivo (GODOY, 2009, p.

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83

32). Somente a partir do período executivo que começam a correr juros de mora e demais

encargos, bem como as custas dos gastos da Administração com a cobrança.

Com efeito, a Administração Tributária daquele país tem algumas prerrogativas,

principalmente no que se refere à investigação patrimonial, que assim como a constrição e

alienação, se dará em âmbito administrativo. Possibilita-se o uso de medidas cautelares e de

vários mecanismos de investigação, como a inspeção de bens e quaisquer outras informações

que facilitem ao fisco executar.

Frise-se que se há proteção constitucional em favor do local sob investigação, como,

por exemplo, no caso do domicílio, deve-se buscar autorização judicial (GODOY, 2009, p. 23).

A cobrança executiva espanhola “se inicia e se desdobra de ofício, em relação a todos

os seus passos e trâmites e, uma vez iniciada, suspende-se, tão somente, em circunstâncias

indicativas da suspensão da exigibilidade do crédito tributário” (GODOY, 2009, p. 24).

Há previsão de “multas” no caso de não pagamento voluntário do tributo, denominadas

essas de recargos del período ejecutivo (recargo ejecutivo, recargo de apremio reducido e o

recargo de apremio ordinário).

Algumas desvantagens da execução espanhola referem-se a uma possível submissão a

concorrência de credores, bem como o fato de ser a Administração a detentora da primeira e da

última palavra no que se refere a incidentes. Sobre o assunto, Arnaldo Sampaio de Moraes

Godoy (2009, p. 24):

“A execução fiscal no direito espanhol tem feição exclusivamente administrativa; indica-se que a Administração é competente para apreciar e resolver todos os incidentes que se desdobram em âmbito de execução fiscal. Dispõs-se que a execução fiscal administrativa não pode ser processada judicialmente, bem como não pode ser cumulada com outros procedimentos de execução.”

Assim, mesmo que diante do órgão administrativo, pode o executado exercer seu

direito de defesa por meio de reclamações e recursos, inclusive por meio daquelas a que os

espanhóis chamam de econômico-administrativas. Durante as reclamações e recursos a

execução administrativa restará suspensa, independentemente de garantias. Há também a

suspensão no caso de execução fundada em título com erro material, ou aritmético, ou de fato,

ou cuja dívida já tenha sido compensada, parcelada, ou que esteja prescrito. Além disso, há

também a suspensão no caso de terceiro prejudicado pela penhora que ajuíze reclamación de

tercería.

Há que se falar que há uma ampla limitação às circunstâncias que possam servir de

defesa ao executado, podendo o mesmo apontar algumas falhas no procedimento de execução

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84

(falta de notificação do leilão), erro ou omissão no título executivo ou, aunda, outras questões,

como a inexigibilidade do crédito (dívida extinta, prescrita, parcelada, compensada).

Ressalte-se que os demais atos de penhora, leilão, alienação (adjudicação ou

arrematação) e extinção do procedimento também são realizados pela Administração. O

procedimento deve seguir, na mesma linha do direito brasileiro, o caminho menos oneroso ao

executado. Mesmo ocorrido o leilão, a “arrematação ou a adjudicação dependem do trânsito

em julgado da decisão administrativa, relativa à execução fiscal que se dá fim” (GODOY,

2009, p. 30). Do mesmo modo, encerra o autor (GODOY, 2009, p. 30):

“O procedimento de execução fiscal administrativa na Espanha encerra-se com o recolhimento do débito, com constatação de que o crédito fiscal seja incobrável, por consequência da declaração da falência ou insolvência dos obrigados ao pagamento.”

Na Espanha, embora a Administração exerça verdadeiras funções de julgamento, deve-

se atentar especificamente para o fato de que os procedimentos meramente administrativos são

executados pela Administração, com maior efetividade nos atos de constrição e alienação de

bens.

Alternativamente, tem-se o modelo de execução fiscal administrativa do Chile, que

conta com duas fases bem distintas, a administrativa e a judicial, as quais conferem ao modelo

chileno uma natureza híbrida de execução fiscal. Nesse sentido o cobro ejecutivo de las

obligaciones tribunarias de dinero é regido basicamente pelo Código de Processo Civil

chileno.

Da mesma forma que ocorre no direito brasileiro, é um título executivo extrajudicial

que instrui e fomenta a execução fiscal no Chile. O título é extraído de uma lista de devedores

assinada pelo Tesorero General de la Repíblica.

Cabe ao Tesorero Comunal, autoridade fazendária local, a condução dos atos em esfera

administrativa, os quais desenrolam-se basicamente pela pesquisa de bens e penhora dos

mesmos, podendo chegar ao leilão de bens ou conversão em renda. Saliente-se que é permitido

a esta autoridade dispensar a execução de dívidas de valor tão pequeno que não compensem a

cobrança. É a política do custo-benefício. É possível a penhora de salários mediante

notificação ao empregador, podendo ser feita em uma vez ou várias suscessivas.

Assiste a essa autoridade uma série de prerrogativas, assim como no direito espanhol. A

penhora é ampla, autorizando-se, inclusive, a penhora do salário do executado, com limites,

garantindo-se ao devedor o mínimo para sobrevivência.

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85

Godoy (2009, p. 63) esclarece que contra “a ordem que deu início à execução, bem

como contra a penhora, não há, neste estágio do procedimento, nenhuma possibilidade de

insurgência, mediante recurso”.

Aliás, a penhora administrativa deverá ser registrada no órgão competente quando se

tratar de bem imóvel ou outro que necessite de registro e controle, como no caso de ações,

propriedade literária, industrial.

A citação é realizada pelo agente fiscal e poderá ser feita até mesmo não se

encontrando pessoalmente o devedor, inclusive mediante afixação no estabelecimento de aviso

de cobrança. Além disso, cabe ao devedor informar os bens que possua, sob pena de

requerimento de prisão pelo advogado provincial.

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy explicita o procedimento após a penhora, inclusive

no que se refere a defesa administrativa do executado (2009, p. 65):

“Realizada a penhora, o agente fiscal deverá elaborar documento certificando circunstanciadamente o conjunto de bens penhorados, assinando o expediente. Este auto de penhora também deverá ser assinado pelo devedor ou por qualquer adulto encontrado no domicílio do executado. (...) O executado pode contestar administrativamente a execução junto ao órgão local competente, contados 10 dias da determinação para o pagamento (...). Trata-se de oposição, (...). Há conjunto limitado de matérias que o devedor pode deduzir em sua peça de contestação. (...) Não lhe será permitido discutir o mérito da questão.”

O recurso será apreciado pelo Tesorero Comunal que se manifestará no prazo de 5 dias,

os quais se passando sem a manifestação, ensejam o prosseguimento da execução e entrega dos

autos para o advogado provincial, que se manifestará acerca de exceções e alegações

invocadas pelo executado. Não acolhendo essas alegações, “o advogado provincial tem cinco

dias para encaminhar os autos de execução para a justiça comum, um Tribunal Ordinário”

(GODOY, 2009, p. 69), requerendo a decisão do Juiz de Letras (juiz de primeira instância)

sobre a matéria aludida pelo devedor executado, passível de recurso à segunda instância.

Não havendo recurso do executado, ou sendo ele improcedente, prossegue-se a

execução por condução do magistrado, que ordenará a entrega dos bens penhorados,

realizando-se leilão, após requerimento do advogado provincial.

Do mesmo modo que o modelo espanhol, a execução chilena encontra um de seus

possíveis fins com a adjudicação pelo fisco ou arrematação dos bens penhorados, com a

consequente satisfação do crédito na sua integralidade. No Direito Tributário chileno também

são vistas as figuras do parcelamento, da compensação, da remissão, da prescrição e outros

institutos em semelhança àqueles aqui regulamentados.

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86

Percebe-se do estudo, que é um modelo mais repleto de formalidades, com uma atuação

do advogado provincial muito mais como seria a atuação do Ministério Público no Brasil, do

que propriamente uma Procuradoria da Fazenda. Ressalte-se que o modelo chileno tem certa

identidade com a proposta de penhora administrativa de Leon Fredja Szklarowsky, bem como

com o modelo previsto pelo Projeto de Lei 5.080/2009.

Ainda, temos o modelo dos Estados Unidos da América. A execução norte-americana

pode ser administrativa (administrative collection procedure) ou judicial (foreclosure action).

Como já visto, o pagamento de tributos nos Estados Unidos constituem dever

fundamental, respeitado pelos contribuintes, existindo uma cultura de pagamento voluntário e

uma série de prerrogativas e poderes discricionários ao agente fiscal – principalmente no que

se refere a deixar de cobrar tributos cujos custos não compensem o benefício.

Tendo em vista as consequência patrimoniais – e muitas vezes, penais – o devedor

americano evita a todo custo a execução.

Após o lançamento do tributo (assessment of tax), o fisco tem 60 (sessenta) dias para

notificar o contribuinte para pronto pagamento e da iminência de penhora em contas bancárias,

salários ou quaisquer outros bens seus. O contribuinte, ao receber a notificação, terá 10 (dez)

dias para recolher os valores cobrados.

Deve-se atentar para certas garantias do contribuinte, como, por exemplo, não ser

cobrado com descortesia, com linguagem obcena, sob pena de ação visando indenização do

contribuinte pelo Estado.

Pode o contribuinte parcelar a dívida, e no caso de não cumprimento, poderá ainda

suscitar uma última chance pagamento, de forma mais formal, porém, desta vez.

Interessante a explicação de Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy (2009, p. 123) sobre

esse parcelamento:

“O contribuinte simplesmente comprova o quanto pode pagar, como pagará e de onde vêm os recursos que utilizará. Deve preencher formulário (form 656), dando pormenorizada conta ao fisco de sua condição material. Respeita-se tão somente margem de valores para que o interessado possa sustentar a si e sua família (basic living expenses). Valendo-se de ampla discricionariedade e convencido de que não há outro meio de cobrança o fisco federal defere o pedido e mantém o interessado sob cerrada vigilância.”

Silente o contribuinte e não havendo pago o tributo, procede-se a uma pré-penhora

(lien) do bem, tornando-o inalienável, podendo a mesma ser desfeita mediante quitação da

obrigação. Antes da implementação da penhora (levy) e do arresto (distraint), pode o

contribuinte ser ouvido para “invocar direitos do cônjuge ou oferecer alternativos mios de

pagamento, a serem aceitos na discricionariedade do fisco” (GODOY, 2009, p. 128).

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87

É possível, alem de bastante comum, a penhora de salários, contas bancárias,

faturamento da empresa, entre outras formas, que por vezes foram consideradas no Brasil

como ofensivas aos direitos do contribuinte. O leilão (sale) implementa-se após notificação do

devedor, entre 10 (dez) e 40 (quarenta) dias da publicação do edital que dá publicidade ao ato.

As vendas são sempre eficazes, tendo em vista a ampla publicidade do leilão e dos bons

negócios que podem ser feitos em sua sede.

Nota-se um procedimento célere e efetivo para a satisfação do crédito tributário. Tanto

é que raras as vezes se cogita a utilização da via judicial. Nesse mesmo tom, preceitua Arnaldo

Sampaio de Moraes Godoy (2009, p. 121) para o qual a “execução fiscal judiciária

(foreclosure action) nas poucas vezes que é utilizada presta-se para administrar conflitos de

interesse entre credores”.

Dando fim a análise da execução fiscal no Direito Comparado, temos o modelo de

Portugal, que também se caracteriza pela eficiência de sua cobrança praticamente

administrativa em sua totalidade. Nesse sentido, Andrei Pitten Velloso (2011, p. 37) introduz a

sua análise do modelo português dizendo que:

“Em Portugal, estabelece-se que o processo de execução fiscal tem natureza judicial, mas admite a atuação dos órgãos da administração ‘nos actos que não tenham natureza jurisdicional’. Esses atos, materialmente administrativos, são praticados pela Administração Tributária, sujeitando-se à apreciação judicial mediante o exercício do direito de reclamação para o juiz da execução fiscal (art. 103º da Lei Geral Tributária – Decreto-Lei 398/98).”

O modelo português já se mostra eficiente desde a constituição do crédito tributário,

fazendo-se esta por meio de autoliquidação ou autolançamento, após o qual se abre o período

para pagamento.

Não pago o tributo no período concedido, abre-se prazo para reclamação graciosa

(recurso administrativo) ou impugnação judicial da cobrança, não se suspendendo a cobrança

até que o crédito esteja garantido. Aliás, findo o prazo para pagamento, já pode o Fisco

português proceder à confecção da certidão que tem força de título executivo.

Em comparação ao modelo brasileiro, Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009, p

54-55) afirma que:

“Em relação ao procedimento brasileiro, há, desde logo, algumas diferenças a destacar: 1) a instauração da execução fiscal, a citação, a penhora e a venda de bens realizam-se no âmbito administrativo; e 2) a apresentação de reclamação graciosa ou de impugnação judicial não impede a extração da certidão de dívida (título executivo) e a instauração da execução fiscal.”

Instaurada a execução, cita-se o executado (em regra, pessoalmente) para apresentar em

30 (trinta) dias a oposição (defesa semelhante aos embargos do executado do sistema

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brasileiro), pagar o débito parceladamente ou oferecer bem para dação em pagamento. A

citação também pode se dar via correio ou por edital.

Encerrado o prazo previsto na citação, no caso de improcedência da oposição ou no

simples caso de não pagamento, nem impugnação, prossegue a execução com a expedição do

mandado de penhora, tudo em via administrativa. Frise-se que, mesmo frustrada a citação,

prossegue-se a execução com a penhora de bens. A venda do bem também será realizada pela

Fazenda Pública, em regra, mediante propostas em cartas fechadas. A arrematação é presidida

pelo órgão da execução fiscal que conduziu o procedimento. A inexistência de propostas

autoriza a pronta adjudicação dos bens.

Todos os incidentes são julgados por Tribunais Tributários de primeira instância,

principalmente os atos da Administração que firam direitos e interesses legítimos do executado

ou de terceiro. O Poder Judiciário, nesse caso, atua somente na solução de reais conflitos,

cabendo à Administração Fiscal a condução dos atos administrativos de execução.

Para Arnaldo Sampaio de Morais Godoy (2009, p. 258) a “execução fiscal

administrativa portuguesa qualifica modelo célere que contrabalança adequadamente

pretensões do fisco e dos contribuintes”. Gustavo Caldas Guimarães de Campos (2009) no seu

estudo comparativo entre o modelo português e o modelo brasileiro, identifica duas questões

fundamentais presentes no modelo estrangeiro e necessárias ao sistema brasileiro para a efetiva

arrecadação tributária. Trata-se da celeridade e da garantia. Aquela por meio da realização de

atos executivos pelo correlato Poder, ou seja, a Administração, enquanto esta se dá pela

rapidez nas constrições, por um paradigma mais duro de responsabilização dos sócios, menos

hipóteses de suspensão do crédito tributário, entre outros requisitos.

Da análise dos modelos supracitados, nota-se uma grande diferença ao modelo

brasileiro, principalmente no que se refere à realização dos atos de citação, pesquisa de bens,

penhora. Do mesmo modo, possuem as administrações fazendárias estrangeiras amplo espectro

de poderes a serem utilizados na cobrança coerciva do tributo.

Diante disso, vejamos agora os projetos existentes no ordenamento jurídico brasileiro,

além de uma sugestão sobre qual dos exemplos melhor se encaixa na sistemática do Direito

Processual Tributário atual.

4.3 O modelo ideal de cobrança para o Direito Brasileiro

De início, comentou-se sobre a transformação social que cabe ao Direito realizar.

Mangabeira Unger, como visto, apoia justamente o abandono dos velhos modelos a partir de

uma perspectiva de reflexão jurídica e imaginação institucional (GODOY, 2011).

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89

Nesse sentido, faz-se último esforço no sentido de identificar a melhor proposta de

execução fiscal administrativa para o ordenamento jurídico brasileiro. Dos projetos existentes,

analisar-se-ão as semelhanças e diferenças entre os Projetos de Lei n.º 5.615/2005, n.º

2.412/2007 e n.º 5.080/2009, todos tratando, é claro, de proposta de execução fiscal

administrativa.

Em termos de competência, os projetos mais antigos versam sobre execuções fiscais

plenamente administrativas, cabendo à Administração Fazendária a efetivação de todos os atos

executivos (da citação à alienação do bem), cabendo ao Judiciário tão somente os incidentes

que porventura aconteçam durante o executivo. Este modelo aplicar-se-ia a todos os entes.

Já a ideia do PL 5.080/2009 é a de uma constrição administrativa preparatória da

execução fiscal judicial. Ou seja, a Fazenda realiza os atos de citação, pesquisa de bens e

efetiva uma constrição preparatória, sem a qual não poderá ajuizar a correspondente execução

fiscal no juízo competente.

Ressalte-se que este PL prevê o modelo administrativo somente para a União, Distrito

Federal, Estados, suas Autarquias e Fundações Públicas, deixando a livre escolha dos

Municípios e suas Autarquias e Fundações Públicas efetuar a execução nos moldes dos demais

entes.

Além disso prevê o PL 5.080/2009, segundo Carmina Alves Silva (2010, p. 106):

“As Fazendas Públicas realizarão os atos executivos e os agentes fiscais, denominados de oficiais da Fazenda Pública no projeto de lei 5.080/09, os responsáveis pelas diligências de localização dos bens passíveis de constrição, realizando assim os atos de execução. O mandado executivo será expedido pela própria Fazenda Pública, o qual será instruído com a Certidão da Dívida Ativa a integrando.”

Quanto à legitimidade passiva, os projetos nada trazem de muito novo, exceto o PL

5.080/2009 que dispõe sobre a possibilidade de a qualquer tempo aditar-se o termo de inscrição

em dívida ativa para a inclusão de corresponsáveis. Tal medida daria um norte para as atuais

controvérsias sobre o assunto tão polêmico da responsabilização dos sócios e a necessidade de

inclusão do seu nome na CDA para a cobrança executiva.

Outro ponto primordial a se demonstrar é a previsão no Projeto n.º 5.615/2005 e no

Projeto n.º 2.412/2007, de uma regra determinando a permuta de informações entre todas as

Fazendas Públicas, assistindo-se mutuamente e melhorando a qualidade e a quantidade das

informações, na busca pelo devedor e pelos seus bens.

Por sua vez, destaca-se dentre os projetos, a proposta do PL n.º 5.080/2009, que dá

conta da criação de um Sistema Nacional de Informações Patrimoniais do Contribuinte –

SNIPC, um sistema virtual de informações, alimentado por informações de diversas bases, isto

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90

é, tanto de órgãos públicos como privados que controlem e registrem bens, não excluindo o

dever desses de prestar atendimento sobre informações adicionais.

É um investimento que se mostra estritamente necessário para que se possa pensar na

implantação da execução fiscal administrativa, pois sem o devido aparelhamento da Fazenda

Pública, nos moldes constitucionalmente previstos, não surtirá efeitos práticos, o simples

deslocamento das funções executivas à Administração. Esse cadastro prévio e constantemente

atualizado das empresas e pessoas físicas, fundado no cruzamento de dados entre os mais

diversos órgãos, permite ao Fisco obter cada vez mais êxito na citação do contribuinte revel.

Ademais, tal cadastro evita os males das fraudes à execução, mantendo relação atualizada dos

bens dos contribuintes, os quais serviriam para garantir o crédito.

Além disso, prevê o PL 5.080/2009 a possibilidade de realização dos atos de

comunicação e práticas executivas mediante meios eletrônicos. Os autores do Projeto

5.080/2009 assim justificam a disposição (BRASIL, 2011j, p. 16):

“Ao prever a possibilidade da prática e comunicação dos atos processuais por meios eletrônicos, a proposta incorpora, à execução fiscal, a utilização de recursos tecnológicos, com promissores reflexos em celeridade e economia processual.”

Indo mais além, vejamos como se realizam os atos posteriores de notificação do

executado, bem como arresto e penhora de bens. Quanto a isso, os projetos mais antigos

versam praticamente da mesma forma, prevendo que o despacho do Procurador importa em

notificação do executado para pagar a dívida, impugná-la administrativamente ou opor

embargos à execução no prazo de 15 (quinze) dias, estes recebidos com efeito suspensivo da

execução e julgados pelo juiz competente. A regra para notificação do devedor executado,

nesses casos, é a forma pessoal, realizada pelo oficial da Fazenda Pública, podendo inclusive

se dar a notificação por hora e dia marcados. Os demais modelos de notificação (postal e

editalícia) serão usados subsidiariamente.

Além disso, tal despacho determina: a) arresto de bens, quando o executado não tiver

domicílio certo ou dele se ocultar, bem como nos casos de embargos protelatórios e condutas

caracterizadoras de má-fé; b) penhora de bens bastantes para garantir a dívida, caso não seja

impugnada ou embargada, ou caso sejam rejeitados tais embargos e impugnações; c) registro

do arresto e/ou penhora; e d) avaliação dos bens arrestados ou penhorados.

De forma diversa, prevê o PL 5.080/2009, segundo o qual a notificação da execução

administrativa dá ao devedor o prazo de 60 (sessenta) dias para efetuar o pagamento, solicitar

parcelamento do valor do débito ou prestar garantia integral, por meio de depósito

administrativo, fiança bancária ou seguro-garantia.

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91

Ainda nos termos do PL 5.080/2009, a notificação acima aduzida interrompe a

prescrição nos termos de lei complementar. A justificativa do projeto traz dois objetivos para

tal medida (BRASIL, 2011j, p. 15):

“Intenta-se com tal disposição (...): a) desobrigar o Fisco do ajuizamento de execuções fiscais destinadas apenas a obstar a consumação da prescrição, como atualmente ocorre; e b) interrompida a prescrição a partir da notificação administrativa, propiciar aos órgãos fazendários o tempo necessário à identificação do patrimônio penhorável do devedor, de forma a viabilizar, se for o caso, a execução forçada. Retira-se tal atividade da esfera judicial, que, portanto, somente será chamada a atuar se houver indicação, pela Fazenda credora, dos bens a serem penhorados.”

Continuando, reza o PL 5.080/2009 que o despacho que determinar a notificação do

devedor também ordenará efetivação de constrição preparatória e avaliação dos bens do

devedor, tantos quantos bastem para garantir a dívida, devendo-se, ainda, intimar o devedor da

referida constrição, bem como registrá-la nos órgãos competentes.

Em todos os projetos há previsão de que o devedor responderá pela dívida com a

universalidade de seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei, como,

por exemplo, bens absolutamente impenhoráveis. Aliás, destaque-se que o PL 5.080/2009

prevê a constrição administrativa de dinheiro em conta bancária e faturamento da empresa14.

Por conseguinte, mais uma questão a se analisar é a defesa do executado. Esta poderá

ser exercida de várias formas, desde os já conhecidos embargos à execução, à arrematação e à

adjudicação e por meio de exceção de pré-executividade administrativa ou, ainda, por

impugnação administrativa dos atos da execução (previsão exclusiva do PL 5.080/2009), a ser

deduzida perante o juízo competente para a execução e para os embargos15.

Frise-se que o devedor também poderá valer-se de ações autônomas – como as já

conhecidas ações declaratórias, anulatórias, entre outras – para tentar desconstituir o crédito,

perante o juízo competente para o processamento da execução fiscal.

Não havendo quaisquer impugnações ou embargos, ou sendo os mesmos rejeitados,

prossegue-se a execução para os atos finais de alienação dos bens penhorados. Como já visto,

somente nas disposições dos projetos mais antigos é que todos os atos, exceto aqueles que

demandem força judicante, serão processados administrativamente. Portanto, segundo os

projetos de n.º 5.615/2005 e n.º 2.412/2007 a arrematação do bem penhorado será precedida de

_______________ 14 Os artigos 17 e 18 do Projeto de Lei n.º 5.080/2009 preveem tal disposição, destacando-se o fato de que o Juiz da execução fiscal é quem arbitrará o percentual do faturamento a ser penhorado periodicamente ou em única constrição. 15 Esclareça-se que o PL 5.080/2009 prevê que, no caso de não haver execução ajuizada ou oposição de embargos, a impugnação somente poderá ser deduzida após citação inicial da execução. Caso contrário, poderá ser deduzida no prazo de 15 (quinze) dias da ciência do ato impugnado.

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92

edital para realização de leilão público, organizado pelo órgão administrativo responsável pela

condução do executivo. No projeto mais recente, por sua vez, o juízo da execução fiscal é que

será competente para leiloar o bem, alienando-o para satisfação do crédito e extinção da

execução.

Quanto às possíveis crises do procedimento que podem afetar o executivo fiscal, mais

uma vez preveem diversamente os projetos mais antigos (5.615/2005 e 2.412/2007) e o projeto

5.080/2009. Este prevê a possibilidade de suspensão do ajuizamento da execução caso não se

encontrem bens, podendo o processo acabar em prescrição intercorrente, porém em âmbito

administrativo, não mais entulhando o Judiciário. Já em relação aos projetos anteriores há a

previsão de que não correrá a prescrição contra o executado que fraudar a execução e realizar

condutas que demonstrem má-fé.

Carmina Alves Silva (2010, p. 114) analisando os projetos em questão, identifica que:

“Caso a autoridade administrativa incumbida de promover a execução fiscal não localizar bens do devedor, sob os quais possa recair a constrição preparatória, o ajuizamento será suspenso e, decorrido um ano da notificação administrativa do executado, sem a localização dos bens haverá o arquivamento dos autos do processo administrativo, quando iniciará a marcha do prazo prescricional. Ou seja, a suspensão e o arquivamento provisório não mais se efetuarão perante o Poder Judiciário como hoje ocorre, conforme estabelecido pelo art. 40 e parágrafos da Lei 6.830/80, mas sim na esfera administrativa. (...) Diferentemente do projeto acima citado, os projetos de Lei nº 5.615/2005 e Projeto de Lei nº 2.412/2007, prescrevem ainda que não corre a prescrição a favor do executado que fraudar a execução, opor-se maliciosamente aos atos executivos, empregando meios ardis e artificiosos, resiste injustificadamente às ordens executivas e não indica ao Agente Fiscal onde se encontram os bens sujeitos à execução.”

Nota-se, outrossim, da análise dos projetos supracitados, a amplitude das atribuições da

Administração Fazendária, munindo o Procurador da Fazenda e os outros servidores com

prerrogativas correspondentes à importância de suas atividades.

O oficial da Fazenda Pública age, nesse modelo, como um verdadeiro oficial de justiça,

realizando atos de comunicação, registro e, principalmente, investigação patrimonial. Por sua

vez, o Procurador da Fazenda passa a conduzir e fiscalizar a execução, verificando a legalidade

dos atos nela praticados, podendo, inclusive, apreciar incidentes que, de fato e de direito,

poderiam ser apreciadas por qualquer da administração pública, por se tratarem de questões de

ordem pública16. Não há, portanto, qualquer possibilidade de estar o Procurador da Fazenda

usurpando funções jurisdicionais dos magistrados.

_______________ 16 Ora, se os órgãos administrativos são dotados de autotutela em relação ao seus atos, nada impede o Procurador Fiscal de proceder ao reconhecimento de questões de ordem pública para anulá-los. Da mesma forma, pode fazer tal controle o Poder Judiciário.

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Encerrando-se a análise dos aspectos fundamentais dos projetos, entende-se que

nenhum deles apresenta uma proposta completa para o direito brasileiro. Pode-se, no entanto,

conjugar os melhores aspectos de cada um para se tentar chegar ao modelo ideal de execução

fiscal administrativa no Brasil.

Por exemplo, a utilização do Sistema Nacional de Informações Patrimoniais do

Contribuinte – SNIPC mostra-se como uma viável alternativa contra as mazelas da ausência de

localização de bens ou do próprio contribuinte. Tal alternativa, conjugada com uma atuação

efetiva do oficial da Fazenda Pública pode municiar a Administração Fazendária contra as

fraudes empregadas pelos contribuintes. A utilização da tecnologia na prática dos atos de

comunicação e demais atos no procedimento executivo também é opção da mais alta sensatez.

Por conseguinte, da análise dos projetos de lei acima estudados, percebe-se que são

variadas as formas de impugnações previstas nos projetos, respeitando-se o devido processo

legal do executado e seus corolários de ampla defesa e contraditório, tendo em vista a extensa

gama de vias – que vão desde impugnações administrativas, passando por ações autônomas,

até os já conhecidos embargos do executado.17 Todo o conflito de interesse, que

justificadamente demandar a jurisdição e a força judicante do magistrado estará, dessa forma,

acobertado pelo manto do acesso à justiça. Dá-se ao executado os meios, para que na exata

medida de sua pretensão, consiga provar uma possível injustiça.

A interrupção da prescrição pela notificação administrativa prestigia a atuação das

instituições democráticas na consecução dos fins estatais, pois, como visto na justificação do

projeto, confere ao Fisco a possibilidade de não prosseguir com execuções fiscais irregulares,

bem como conferindo-lhe tempo para encontrar bens que possam satisfazer o crédito.

Enfim, faz-se necessário comentar, principalmente, sobre a competência para execução

dos atos executivos. E sobre isso, há uma ressalva a ser feita no que se refere ao Projeto de Lei

n.º 5.080/2009. A proposta de transferência para a Administração tão só dos atos de pesquisa,

avaliação, arresto e penhora dos bens, excetuando-se a alienação dos mesmos, apresenta uma

contradição de difícil solução. Como procederia o juiz se percebesse que a constrição

preparatória da execução era irregular, ou que era insuficiente para garantir o juízo, ou, ainda,

que o bem era absolutamente impenhorável? E mais, e se simplesmente o bem não fosse

vendido? O processo judicial ficaria suspenso e a Administração voltaria a atuar na

investigação patrimonial e na constrição preparatória? Haveria, então, uma atuação conjunta do

Fisco e do Poder Judiciário? Seria uma execução fiscal híbrida? Nesse sentido, apresentam-se _______________ 17 Somente o PL 5.080/2009 prevê que os embargos passariam a respeitar a regra geral do CPC, não dependendo de garantia e com a excepcionalidade do efeito suspensivo, podendo o juiz atribuí-lo aos embargos somente mediante relevância dos fundamentos e perigo de dano de difícil ou incerta reparação.

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mais coerentes os projetos que transferem os atos executivos em sua totalidade à

Administração, deixando a cargo do Poder Judiciário tão somente a apreciação de incidentes.

Sobre a proposta de penhora administrativa, Andrei Pitten Velloso (2011, p. 40) tece o

seguinte comentário, entendendo que a proposta ainda é tímida frente aos problemas que

enfrenta a execução fiscal:

“Verifica-se que tal proposta inova pouco, limitando-se a abrir ao Fisco a possibilidade de proceder à penhora administrativa, caso repute mais conveniente que a judicial. Nada dispõe acerca dos atos executórios posteriores à penhora administrativa, aparentando impor à Fazenda Pública o ônus de ajuizar a ação de execução fiscal tão-somente para proceder à alienação dos bens constritos. Ademais, traz consigo relevante inconveniente prático, pois ao abrir ao Fisco a possibilidade de proceder à penhora na esfera administrativa sem extinguir a penhora judicial acabaria por duplicar os órgãos responsáveis pela identificação e penhora dos bens do executado, criando uma sobreposição injustificada de funções estatais.”

Por outro lado, nada impede, por exemplo, uma atuação do Judiciário dando a

derradeira palavra sobre a execução, como deve ser. Ou seja, independentemente de

provocado, faz-se necessária a atuação ulterior do magistrado, no sentido de homologar ou

invalidar os atos realizados em sede administrativa. A homologação conferiria, em última

instância, a legalidade e a regularidade dos atos praticados pela Fazenda, atestando a sua

imparcialidade e correição durante todo o procedimento administrativo.

Dessa forma, novamente propugnando-se pela reflexão jurídica reformadora das

instituições, indaga-se se não seria mais democrática tal atuação complementar, tendo em vista

a busca incessante pelos valores de justiça e igualdade. Isto é, não haveria diferenças entre o

executivo daquele que provocou o Judiciário pelos incidentes e o executivo daquele que não o

fez. Em atuação judicante do magistrado se daria um fim justo ao processo executivo. Portanto,

o ideal é que a Administração realize todos os atos de execução e o Judiciário julgue os

possíveis e eventuais incidentes. Ou ainda, mesmo não havendo incidentes, que o Judiciário

controle os atos realizados por meio de uma espécie de homologação, validando a sua eficácia

e legalidade.

Ademais, a reflexão dos juristas deve levar em conta também os aspectos positivos da

doutrina estrangeira no uso da execução fiscal administrativa. Deve-se analisar o que de

melhor há em cada legislação e amoldá-la ao ordenamento brasileiro. É necessário, por

exemplo, cominar ao pagamento de tributo o status constitucional que merece, inserindo na

sociedade brasileira o mesmo sentimento de Voluntary Compliance existente na sociedade

norte-americana.

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É imperioso enxergar, outrossim, o crescimento da efetividade e da arrecadação em

países europeus como Portugal e Espanha, bem como refletir acerca do posicionamento dos

Tribunais daqueles países sobre a harmonia existente entre a execução fiscal administrativa e

os direitos fundamentais do contribuinte. Da análise de outras realidades é possível notar, da

mesma forma, que o aparelhamento da Administração Fazendária é outra medida

imprescindível para dar à sociedade a concretude das previsões constitucionais, assim como

oferecer ao Fisco condições de sempre manter a arrecadação tributária nos melhores níveis,

desenvolvendo os serviços públicos de forma adequada à dignidade dos cidadãos.

Tais proposições encerram o que seria, por fim, um modelo ideal para a cobrança do

crédito tributário no ordenamento brasileiro.

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CONCLUSÃO

De tudo que foi pesquisado no caminho metodológico descrito na prévia deste trabalho,

pode-se concluir não só quanto à possibilidade de utilização da transação em matéria tributária

e da execução fiscal administrativa como alternativas ao atual modelo de execução fiscal no

Brasil. Mais que possível, recomenda-se a aplicação de tais alternativas, tendo em vista o seu

sucesso perante outras realidades normativas. A baixa efetividade que se demonstra enseja

novos caminhos para as instituições democráticas, o que se coaduna com o pensamento do

ativista político Roberto Mangabeira Unger. A realidade dos fatos requer que a ciência jurídica

coloque em prática a sua função de transformação social.

Ao longo da pesquisa, muito se escreveu sobre o dever fundamental do pagamento do

tributo. Considerando-se isso, deve-se conjugar às proposições aqui apresentadas vontade

política no sentido de conscientizar o cidadão do seu papel e da importância de sua

participação na arrecadação estatal. É necessário evitar-se um “hipergarantismo” fiscal do

contribuinte que seja negativo à coletividade, devendo-se dar à obrigação tributária a sua

devida importância.

No mais, resta ressaltar os argumentos que levaram à corroboração da hipótese inicial

de que a transação tributária e a execução fiscal administrativa são meios para se combater a

inefetividade da execução fiscal brasileira.

São os seguintes: 1) o resultado da pesquisa encomendada pelo Conselho Nacional de

Justiça demonstra a inefetividade do atual modelo de execução fiscal brasileiro, justificando-se

os números pela inabilidade do Judiciário em realizar atos materialmente executivos; 2) o custo

e o tempo gastos na atual execução fiscal, fato também demonstrado pela pesquisa citada; 3) os

problemas da sistemática atual, englobados fundamentalmente na sonegação fiscal e na fraude

à execução, ou seja, problemas como a evasão, a ocultação de bens passíveis de garantia, ou do

próprio devedor, corroboram o panorama de inefetividade; 4) o sucesso obtido por outros

países na utilização da transação tributária, especialmente na composição de conflitos

tributários e na melhoria da relação Fisco-contribuinte; 5) a conformação da transação com os

princípios de direito público, especificamente o da supremacia e da indisponibilidade do

interesse público; 6) os atos de execução fiscal são materialmente administrativos, não

demandando qualquer jurisdição; 7) a execução fiscal administrativa está em conformidade

com os ditames constitucionais de separação dos poderes, do juiz natural, do acesso à justiça,

do devido processo legal, e demais direitos e garantias fundamentais do contribuinte; 8) a

realização dos atos executivos pela Administração, outrossim, nada obsta à reserva de

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jurisdição para os possíveis incidentes em sede executiva, respeitando-se, também, por isso, o

princípio do acesso à justiça; 9) a execução fiscal se coaduna com os ideais de justiça

(capacidade contributiva) e igualdade (livre concorrência); 10) a própria jurisprudência já

considerou constitucionais outros exemplos de execução fiscal administrativa; 11) a

efetividade conseguida através da utilização da execução fiscal administrativa em voga no

Direito Comparado, especificamente na Espanha, no Chile, nos Estados Unidos da América e

em Portugal; e 12) os projetos existentes no ordenamento jurídico para implementação de uma

execução fiscal administrativa não têm só pontos positivos, mas se aproximam daquilo que

seria supostamente ideal.

Conjuga-se à presente conclusão o pensamento de que de nada adiantam alternativas

jurídicas se não houver a preocupação de se aparelhar concretamente a Fazenda Pública,

respeitando-se estritamente a previsão constitucional.

Portanto, propõe-se ao lado da inserção, no ordenamento brasileiro, da transação em

matéria tributária e da execução fiscal administrativa, a melhoria estrutural dos órgãos

fazendários, a fim de propiciar melhorias na constituição e na cobrança do crédito tributário,

engrandecendo-se, assim, a perspectiva não só dos procedimentos, mas, também, dos

resultados.

Por fim, bom relembrar que o intuito do presente estudo não chega perto de esgotar o

tema, nem mesmo de apresentar um modelo perfeito para a constituição e cobrança do tributo.

Intentou-se, de forma contundente, apresentar argumentos para a reflexão jurídica e reforma de

uma instituição notoriamente em crise.

Mesmo assim, propugna-se por um modelo de constituição do crédito baseado em uma

melhor relação entre Fisco-contribuinte e de solução alternativa de conflitos pela transação,

além de mais rápido e sem tantas etapas. Da mesma forma, defende-se um modelo de cobrança

administrativa com atuação mais célere e efetiva da Fazenda, resguardando-se a última palavra

ao Poder Judiciário, por meio de um processo de homologação dos atos executivos.

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do aludido diploma legal com a Carta da República, posto que, além de prever uma fase de controle judicial, conquanto a posteriori, da venda do imóvel objeto da garantia pelo agente fiduciário, não impede que eventual ilegalidade perpetrada no curso do procedimento seja reprimida, de logo, pelos meios processuais adequados. Recurso conhecido e provido. Relator Ministro Ilmar Galvão, Brasília, DF, 23 jun. 1998. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=250300>. Acesso em: 30 nov. 2011. CAMPOS, Gustavo Caldas Guimarães de. Execução fiscal e efetividade. Análise do modelo brasileiro à luz do sistema português. São Paulo: Quartier Latin, 2009. CANTO, Gilberto Ulhôa. Anteprojeto da Lei Orgânica do Processo Tributário Federal. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1964. CARRAZA, Roque Antônio (org.). Código Tributário Nacional. Código de Processo Civil. Constituição Federal. Legislação Tributária e Processual. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. ____. Curso de direito constitucional tributário. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 16. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário. Fundamentos jurídicos de incidência. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. ___. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. ___. Curso de direito tributário. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. CORDEIRO, Rodrigo Aiache. Princípios constitucionais tributários. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2006. DE SANTI, Eurico Marcos Diniz (coord). Relatório final NEF 2009. Reforma do Processo Administrativo Fiscal (PAF). Excelência, celeridade e eficiência. Disponível em: <http://invente.com.br/nef/files/upload/2011/05/19/relatorio-final-completo-nef-2009-v-1-0.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2011. FONTENELE, Alysson Maia. O fato jurídico tributário à luz da teoria geral dos fatos jurídicos. 2001. 52 f. Dissertação (Pós-Graduação) – Universidade Cândido Mendes (UCAM), Rio de Janeiro, 2001. GARCIA REDONDO, Bruno. Penhora. Exposição sistemática do procedimento, de acordo com as Leis 11.232/05 e 11.382/06, bens passíveis de penhora, impenhorabilidade absoluta, relativa e o bem de residência. São Paulo: Método, 2007. GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. A execução fiscal administrativa no direito tributário comparado. Belo Horizonte: Fórum, 2009. ____. Transação tributária. Introdução à justiça fiscal consensual. Belo Horizonte: Fórum, 2010.

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